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Insuficiência venosa crônica

Ana Luiza Oliveira de Souza Guelere (Medicina UNIDEP 3º período)

1. Etiologia, fatores de risco, fisiopatologia, manifestações clínicas e complicações

→ efeito fisiopatológico da hipertensão venosa persistente sobre a estrutura e função do sistema venoso dos membros
inferiores
 ⨂ fluxo sanguíneo unidirecional efetivo e esvaziamento das veias profundas
 se as bombas musculares forem ineficazes, o sangue pode seguir em direção retrógrada

ETIOLOGIA
 Aumento da pressão venosa hidrostática (permanência em pé por longos períodos)
 Insuficiência das válvulas nas veias
 Obstruções venosas profundas (TVP)
 Diminuição da função das bombas musculares esqueléticas
 Processos inflamatórios
 Disfunção endotelial
 Varizes: veias dilatadas e tortuosas nos membros inferiores que podem levar a problemas secundários de
insuficiência venosa
- varizes primárias: têm origem nas veias safenas superficiais
- varizes secundárias: resultam do comprometimento do fluxo nas veias profundas

FATORES DE RISCO
 Predisposição genética (síndrome de Klippel-Trénaunay, CADASIL, mutação no gene FOXC2, síndrome de
Ehlers-Danlos etc.)
 Histórico de trombose venosa profunda  Aterosclerose
 Uso de contraceptivos orais  Obesidade
 Estilo de vida sedentário  Hipertensão
 Doenças imunes  Idade avançada
 Diabetes  Lesão na perna

FISIOPATOLOGIA
  estresse de cisalhamento  ruptura da célula endotelial e comprometimento do glicocálix
células endoteliais liberam agentes vasoativos, selectinas, moléculas
inflamatórias e precursores pró-trombóticos (produção de óxido nítrico comprometida)
ativação de células inflamatórias ↔ resposta inflamatória
produção de espécies reativas de oxigênio (EROs)
recrutamento de leucócitos, monócitos, macrófagos, linfócitos T,
mastócitos, quimiocinas, fatores de crescimento tecidual, metaloproteinases etc.
EROs podem reagir com proteínas da matriz extracelular e oxidá-las
metaloproteinases digerem proteínas da matriz extracelular
degradação da matriz extracelular
mudanças nos componentes estruturais do colágeno e da
elastina da parede da veia
redução da resistência e da elasticidade
disfunção das válvulas venosas
refluxo sanguíneo e/ou obstrução do fluxo
retenção de sangue nas veias das pernas
aumento da pressão venosa
 com o tempo, a pressão venosa
aumentada pode causar danos às
paredes das veias e às válvulas,
resultando em um ciclo de
deterioração da função das
válvulas e aumento da pressão
venosa. Esse ciclo continuo pode
levar ao aparecimento de
sintomas como dor nas pernas,
inchaço, cãibras, formigamento,
úlceras venosas e alterações na
cor da pele
 retenção de sangue nas veias das
pernas também pode levar a um
aumento da permeabilidade
capilar, resultando em vazamento
de líquido para os tecidos
circundantes e edema, o que pode
levar a uma inflamação crônica
nas pernas e um aumento na
produção de radicais livres, o que
pode resultar em um aumento do
dano celular e acelerar o processo
de envelhecimento nas pernas
CLASSIFICAÇÃO CEAP
Classificação da ICV de acordo com sinais e sintomas de distúrbios venosos crônicos para avaliar sua gravidade

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
 Insuficiência venosa primária: consequência de uma anormalidade intrínseca estrutural ou funcional na
parede venosa ou nas válvulas, levando ao refluxo valvar
 Insuficiência venosa secundária (pós-trombótica): causada por obstrução e/ou incompetência valvular por
trombose venosa profunda
- síndrome de May-Thurner: veia ilíaca esquerda é ocluída ou estenosada por compressão extrínseca
por sobreposição da artéria ilíaca comum direita
 Comprometimento do fluxo sanguíneo
 Congestão tecidual  edema  comprometimento da perfusão dos tecidos
- edema exagerado pela permanência prolongada em pé
 Necrose dos depósitos de gordura subcutânea  atrofia cutânea
- pode haver pigmentação marrom na pele causada pelos depósitos de hemossiderina que resultam da
degradação de hemácias
 Insuficiência linfática secundária com esclerose progressiva dos vasos linfáticos decorrente do aumento da
demanda por remoção do líquido intersticial
 Aumento da circunferência da perna
 Enrijecimento da articulação do tornozelo
 Perda de massa e de força muscular
 Comprometimento da nutrição tecidual causa dermatite por estase e desenvolvimento de úlceras por estase
ou ulceração venosa
- dermatite por estase: pele fina, brilhante, marrom-azulada com pigmentação irregular e descamação,
sem suporte de tecidos subcutâneos adjacentes
- a perna é particularmente propensa ao desenvolvimento de dermatite por estase e úlceras venosas
- a maior parte das lesões localiza-se medialmente, acima do tornozelo e na parte inferior da perna,
com mais frequência logo acima do maléolo medial
COMPLICAÇÕES
 Veias varicosas
 Hiperpigmentação na pele devido ao acúmulo de hemossiderina
- lipodermatoesclerose (hiperpigmentação e endurecimento da pele envolvendo a panturrilha
 Veias tortuosas e dilatadas
 Valvas venosas disfuncionais e com insuficiência
 Hipertensão venosa
 Linfedema
 Conforme a doença progride, a microcirculação afetada e o enfraquecimento da pele podem culminar em
úlceras venosas

2. Tratamento farmacológico
Drogas venoativas podem ser consideradas para o tratamento de varizes sintomáticas, inchaço do tornozelo e úlceras
venosas. Muitos compostos foram testados com sucesso variado, mas as drogas mais promissoras são as saponinas
(por exemplo, extrato de semente de castanha da Índia [escina]), gama-benzopirenos (flavonoides) (por exemplo,
rutosídeos, diosmina e hesperidina, a fração flavonoide purificada micronizada (MPFF), e outros extratos de plantas
(por exemplo, extrato de casca de pinheiro marítimo francês). O princípio do uso dessas drogas venoativas é melhorar
o tônus venoso e a permeabilidade capilar, mas o mecanismo preciso de ação dessas drogas é desconhecido. Uma
meta-análise Cochrane concluiu que não há evidências suficientes para apoiar o uso global de drogas venoativas no
tratamento da IVC.

Diuréticos: os diuréticos são medicamentos que ajudam a eliminar o excesso de líquidos do corpo, o que pode ajudar
a reduzir o inchaço nas pernas causado pela insuficiência venosa crônica
 podem reduzir o edema, mas com risco de depleção de volume e comprometimento na função renal
 outros medicamentos que podem reduzir o edema: diosmina, dobesilato de cálcio, rutina, rutosídeos

Anti-inflamatórios não esteroides: podem ser usados para aliviar a dor, a inflamação e o inchaço nas pernas causados
pela IVC. São exemplos o ibuprofeno, a aspirina e o naproxeno

Venotônicos: ajudam a melhorar a circulação sanguínea nas pernas. Eles podem ser usados para reduzir a dor e o
inchaço nas pernas e para prevenir o desenvolvimento de novas varizes

Flebotônicos: melhoram a função venosa e reduzem a inflamação. Podem ser usados em diferentes estágios da IVC e
incluem substâncias como diosmina, hesperidina, oxerutinas, rutosídeos entre outros

Anticoagulantes: ajudam a prevenir a formação de coágulos sanguíneos nas veias. Eles são geralmente usados em
casos mais graves de insuficiência venosa crônica para prevenir complicações, como a trombose venosa profunda. São
exemplos a heparina, a varfarina e a enoxaparina

Cremes tópicos: cremes tópicos contendo ingredientes como heparina, ácido hialurônico e extrato de castanha da
Índia podem ser usados para aliviar a dor e o inchaço nas pernas
 esteroides tópicos podem ser usados por um curto período de tempo para tratar a inflamação associada com
dermatite de estase.

Vários suplementos herbários – como extrato de semente de castanha-da-índia (escina); flavonoides incluindo
diosmina, hesperidina ou ambos combinados como fração flavonoide purificada micronizada; e extrato da casca de
pinho-marítimo – são recomendados por ter propriedades venoconstritoras e anti-inflamatórias. Embora metanálises
tenham sugerido que a escina reduz o edema, o prurido e a dor e que a fração flavonoide purificada micronizada junto
com a terapia de compressão facilitam a cicatrização de úlceras venosas, não há evidências suficientes para
recomendar o uso geral dessas substâncias em pacientes com insuficiência venosa crônica

3. Tratamento não farmacológico


→ consiste em reduzir o desconforto e o edema, estabilização da aparência da pele, diminuição da dor causada por
veias varicosas e curar úlceras
→ inclui terapia compressiva com curativos e bandagens inelásticas ou elástica

 sintomas frequentemente diminuem quando as pernas são elevadas periodicamente, quando se evita ficar de
pé por muito tempo e quando se usam meias elásticas de compressão
- compressão externa com meias elásticas ou bandagens equilibram a pressão hidrostática nas veias,
melhorando os sintomas, mas não impedem a progressão das veias varicosas
- meias de compressão graduada com pressões de 20 a 30 mmHg são adequadas para a maioria dos
pacientes com veias varicosas simples, embora pressões de 30 a 40 mmHg possam ser necessárias
para pacientes com manifestações de insuficiência venosa como edema e úlceras, pois são mais
eficazes para a cicatrização de úlceras venosas
 terapia de compressão graduada – meias elásticas ou bandagens de compressão de múltiplas camadas, são o
padrão de cuidados para a insuficiência venosa crônica avançada caracterizada por edema, alterações
cutâneas ou úlceras venosas definidas como classe clínica CEAP C3 a C6
 treinamento com exercícios, incluindo o fortalecimento dos músculos das pernas, pode melhorar a função de
bomba muscular da panturrilha e o fluxo venoso anterógrado, além de reduzir a gravidade da insuficiência
venosa crônica
 pacientes com úlcera venosa também podem ser tratados com curativos absorventes de baixa aderência que
absorvem os exsudatos enquanto mantêm um ambiente úmido
 antibióticos não são indicados a não ser que a úlcera esteja infectada
Anotações
 Causa multifatorial
 Mudanças no estresse de cisalhamento têm um papel importante no desenvolvimento da inflamação da
parede do vaso
 Há evidências de que o estresse de cisalhamento normal promove efeitos antiinflamatórios, enquanto o
estresse de cisalhamento baixo ou outras alterações hemodinâmicas – especialmente o refluxo – levam ao
aumento da liberação de mensageiros pró-inflamatórios
 O endotélio e o glicocálix, via receptores especializados, são críticos na detecção de alterações no estresse de
cisalhamento, e a expressão de moléculas de adesão permite a ativação de leucócitos levando à fixação
endotelial, diapedise e transmigração para a parede venosa/válvulas, resultando em lesão da parede venosa
e células inflamatórias nos tecidos intersticiais. Existe um complexo de citocinas, quimiocinas, fatores de
crescimento, proteases e proteinases, produzidas por leucócitos ativados, que são expressas e desequilibradas
resultando em um ambiente de inflamação persistente com as alterações clínicas comumente observadas,
consistindo de varizes a apresentações mais avançadas de alterações cutâneas e ulceração venosa. A
integridade estrutural da proteína e da matriz extracelular é alterada, potencializando os eventos progressivos
de ICV
 Pacientes com ICV têm aumento na expressão de ICAM-1, VCAM-1 e moléculas de adesão de leucócitos, que
são expressas em células endoteliais e ativam o recrutamento de leucócitos e iniciam a transmigração
endotelial, configurando uma cascata inflamatória
 Fisiopatologia ↔ refluxo sanguíneo ou à obstrução do fluxo sanguíneo venoso
 Aproximadamente 80 a 90% do sangue venosos dos membros inferiores são transportados pelas veias
profundas
 Lipodermatoesclerose: espessamento da pele devido à fibrose e gordura subcutânea
 CADASIL: doença vascular causada por uma mutação no gene NOTCH3
 Selectinas: moléculas que promovem adesão de leucócitos ao endotélio vascular na cascata de eventos que
levam aos processos de inflamação
 Estresse de cisalhamento ↔ perturbação na microcirculação
 Initiating events likely involve altered shear stress and mechanical stress forces on the endothelium and its
glycocalyx. In addition, the endothelial glycocalyx is an important structure that prevents leukocyte adhesion,
inflammation, and thrombosis. However, altered shear stress, mechanical forces on the vein wall causing
leukocyte adhesion, and inflammation lead to injury and loss of the glycocalyx
 O objetivo das meias de compressão é fornecer compressão externa graduada à perna e se opor às forças
hidrostáticas da hipertensão venosa
 L-selectina e E-selectina
 Mecanismo de ação metaloproteinases: hiperpolarização e inibição da mobilização extracelular de cálcio
(regulados pelo fator induzível de hipóxia – HIF)
 Apoptose da parede da veia
 A insuficiência venosa profunda ocorre após a trombose venosa profunda, uma vez que os delicados folhetos
valvulares tornam-se espessados e contraídos e não podem mais impedir o fluxo retrógrado de sangue, e a
própria veia torna-se rígida e espessada.
 Tratamento inicial deve ser a elevação de perna, exercícios físicos, redução do peso e terapia compressiva
 A
 GAG = glicosaminoglicano
 Veias: vasos de baixa pressão e com paredes finas que dependem da ação auxiliar de bombas do músculo
esquelético e de alterações nas pressões abdominal e intratorácica
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