Você está na página 1de 5

UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL

CURSO DE FILOSOFIA

FP: O FORMALISMO DA MORAL KANTIANA E A ETICIDADE EM HEGEL

A VONTADE LIVRE NA FILOSOFIA DO DIREITO HEGELIANA

KAUANA MACHADO NUNES

CAXIAS DO SUL
2022
De Anaximandro a Hegel temos o início e o fim da filosofia. Costuma-se dizer
que a filosofia começa com a introdução do indeterminado, o apeiron,e termina,
então, em Hegel, como um ouroboros filosófico. Contudo, é evidente que a filosofia
não segue tal rumo. Mas é alimentando-se desse início que surge a resposta
hegeliana sobre o problema do princípio, que é indeterminado, i.e, dentro da sua
dialética se tem o ser e o nada. O ser deve se determinar, assim como qualquer
outro conceito que se desdobra no sistema cíclico hegeliano.

A vontade livre é um conceito fundamental a ser conhecido e bem compreendido


para entender todo o escopo da filosofia do direito hegeliana. A vontade livre é o
início deste como princípio fundador, como algo já premeditado na ideia do sistema
hegeliano e também é o fim desta ciência filosófica do direito.

Ao investigar o conceito de vontade livre se tem concomitantemente uma


investigação da natureza humana, relação de indivíduos, suas vontades, desejos e
liberdade. O que inevitavelmente nos leva ao direito e Estado, nesta, situação
também a dialética da necessidade-contingência, uma mediação entre a
individualidade e universalidade, o racional e passional, o particular e o ethos.

1.ESPÍRITO OBJETIVO E LIBERDADE

1.1 Espírito Objetivo

Na dialética compreende-se as partes através do todo, como um recorte


ainda que amplo. A filosofia do direito dá-se no espírito objetivo, que é um dos três
espíritos propostos por Hegel, a saber: subjetivo, objetivo e absoluto. O espírito aqui
deve ser entendido como humanidade ou consciência pensante.

E é nesse espírito que se dá a liberdade, seu reconhecimento e determinação. A


liberdade ainda que seja o princípio e fim, precisa-se ainda se realizar, sair do
abstrato e ir ao concreto, i.e, sua determinação, isso se dá através de estruturas
jurídicas no espírito objetivo.

É na mediação através do direito e Estado supracitados que a liberdade se realiza,


o mero querer não basta e não é liberdade e por isso que o âmbito do direito é a
vontade livre e a sua realização.

“§257- O Estado é a realidade em ato da Ideia moral objetiva, o espírito como


vontade substancial revelada, clara para si mesma, que se conhece e se pensa, e
realiza o que sabe e porque sabe. No costume tem o Estado a sua existência
imediata, na consciência de si, no saber e na atividade do indivíduo, tem a sua
existência mediata, enquanto o indivíduo obtém a sua liberdade substancial
ligando-se ao Estado como à sua essência, como ao fim e ao produto da sua
atividade.” (Hegel,1997)

1.2 Liberdade

A liberdade é o fio condutor da filosofia do direito, este princípio desdobra-se


em momentos e daí se segue diferentes formas de direito, resultado da liberdade e
suas determinações.

É papel da filosofia do direito expor tais determinações que começam no abstrato


até a sua última e mais concreta determinação - que está no social. Estes são os
momentos da vontade livre e seu desdobrar no espírito objetivo.

“§4 - O domínio do direito é o espírito em geral; aí, a sua base própria, o seu ponto
de partida está na vontade livre, de tal modo que a liberdade constitui a sua
substância e o seu destino e que o sistema do direito é o império da liberdade
realizada, o mundo do espírito produzido como uma segunda natureza a partir de si
mesmo.” (Hegel,1997)

O conceito de liberdade hegeliano busca abraçar diversos sentidos já antes dados à


palavra e também a liberdade em todos os sentidos possíveis.

“A noção essencial de liberdade é esta: algo é livre, especialmente uma pessoa,


se, e somente se, for independente e autodeterminante, não determinado por,ou
dependente de alguma outra coisa que não de si mesmo.” (Inwood, 1997)

2. LIVRE ARBÍTRIO E LIBERDADE

Como já fora dito, o direito busca realizar a liberdade ou a vontade livre, a


vontade livre é a liberdade no nível conceitual, como ideia filosófica. A liberdade
e/ou vontade livre só se realiza mediante o ethos, na sociedade, através das
instituições, a liberdade não se constitui como um mero querer. Livre-arbítrio é a
vontade livre imediata e isto, é um momento de liberdade. A liberdade se constitui
na escolha que se dá através das mediações que são ferramentas para a superação
da contradição liberdade e arbítrio.

A liberdade passa por instâncias mediadoras, que são: direito, moralidade e


eticidade, por isso se diz que a liberdade não é fazer o que se quer. A liberdade se
dá na autogovernança, i.e, escolher, ter poder de escolha, isto é o arbítrio.

Por uma necessidade lógica a liberdade exige a sua determinação, seja pelo seu
conteúdo, como vontade imediata - que é o conteúdo desta - seja através das
mediações. No fim, a liberdade no cenário que surge inevitavelmente se exerce
desta única forma possível e só assim ela se realiza.

“§11- A vontade que ainda só em si é vontade livre é a vontade imediata ou natural.


As determinações diferenciadoras que o conceito, ao determinar-se a si mesmo,
situa na vontade surgem na vontade imediata como um conteúdo imediato, são os
instintos, os desejos, as tendências, nos quais a vontade se encontra determinada
por sua natureza.” (Hegel,1997)
“§12 - A estrutura deste conteúdo, tal como imediatamente se apresenta na
vontade, apenas consiste num conjunto e numa diversidade de instintos; cada um
deles é absolutamente o meu ao lado de outros, e é ao mesmo tempo geral e
indeterminado, dispondo de toda a espécie de objetos e de meios para se
satisfazer.” (Hegel,1997)

3. A VONTADE

Em Hegel há a distinção entre Wille e Willkür. Wille é dividido em três, que


são os momentos da liberdade, são estes: Universal, particular e individual. Estes
três compõem a nossa natureza e a no que se constitui a liberdade humana. Nesta
distinção está a opção que temos de abstrair nossos desejos, optar entre o que
temos já como conteúdo e criar um curso de ação e por fim, a vontade mesma
sendo seu objeto.

É na universal que nossos desejos são abstraídos, na particular que escolhemos


entre o conteúdo que já fora dado e é na universal onde temos a superação das
duas anteriores, onde é essencialmente racional e puramente livre.

É nesse processo do eu pensante que se exerce a liberdade, partindo do particular,


da nossa vontade, instintos, desejos etc. Através dessas mediações que o indivíduo
filtra o conteúdo e passa para então o Espírito Objetivo, de onde se realiza, se
concretiza a sua liberdade e é reconhecido esse exercício no Estado. Assim se
formula a vida ética. A vida ética pode ser entendida como a moralidade em
conjunto com o direito abstrato e a sua fase final é o Estado, é onde então o
conceito está plenamente realizado. O direito abstrato é imediato e o conceito de
direito, por fim, é a estrutura da vontade.

É no imediato que temos então a primeira natureza, a segunda diz respeito ao


processo e todo processo é racional e isto se opõe a imediatez e indeterminação,
por isso que no processo, ao escolher, é que a liberdade se torna determinada e
realizada, daí a importância do arbítrio e todo este processo se dá no concreto, na
externalização, aí por fim, o reconhecimento onde entra o papel do Estado.
“A vontade é o conceito de direito que, em conjunto com a REALIDADE do direito,
forma a IDÉIA de direito. As três partes principais de FD (o direito abstrato de
PROPRIEDADE e PESSOA, moralidade e vida ética) correspondem às três fases
da vontade e são estágios na EFETIVAÇÃO do livre arbítrio. A liberdade da vontade
e a liberdade sócio-política estão, pois, profundamente interligadas.” (Inwood,1997)

“§57-Mas para que o espírito objetivo, o conteúdo do direito deixem de ser


concebidos através das correspondentes noções subjetivas, para que, por
conseguinte, se deixe de conceber como um puro dever-ser isto de o homem em si
e para si não estar destinado à escravatura, é preciso reconhecer-se que a ideia da
liberdade só existe verdadeiramente na realidade do Estado.” (Hegel, 1997)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Hegel, Georg Wilhelm Friedrich. Principios Da Filosofia Do Direito. 1ª ed., Martins


Fontes, 1997.

Inwood, Michael. Dicionário Hegel. 1ª ed., Jorge Zahar, 1997.

Você também pode gostar