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Trauma

Trauma
Cranioencefálico (TCE)
Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

ÍNDICE

INTRODUÇÃO 4

FISIOPATOLOGIA 4

ANATOMIA 7

ABORDAGEM INICIAL AO TCE 10

- AVALIAÇÃO PRIMÁRIA 10

- ESCALA DE COMA DE GLASGOW E PUPILA 11

- HIPERTENSÃO INTRACRANIANA 15

- HERNIAÇÃO CEREBRAL 17

- AVALIAÇÃO SECUNDÁRIA 21

LESÕES DO TRAUMATISMO CRANIOENCEFÁLICO 24

- LESÕES DE COURO CABELUDO 24

- FRATURAS DO CRÂNIO 25

- LESÕES INTRACRANIANAS FOCAIS 27

- LESÕES INTRACRANIANAS DIFUSAS 35

CONDUTAS DE ACORDO COM A GRAVIDADE 37

- TCE LEVE 37

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- TCE MODERADO 39

- TCE GRAVE 40

TCE NA INFÂNCIA 45

- AVALIAÇÃO INICIAL 46

- AVALIAÇÃO POR EXAME DE IMAGEM 48

MORTE ENCEFÁLICA 50

- PRÉ-REQUISITOS 51

- EXAMES CLÍNICOS 51

- TESTE DA APNÉIA 54

- EXAMES COMPLEMENTARES 55

Bibliografia 59

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INTRODUÇÃO

Já viemos aquecidos do capítulo 1 e vamos passar a um dos temas mais


importantes de trauma nas provas de residência: Trauma
Cranioencefálico (TCE). Só para trazermos um pouco de dados e
epidemiologia, 90% das mortes pré-hospitalares envolvem trauma
cerebral. Não é pouca coisa!

As quedas são a principal causa de TCE, e os acidentes de trânsito são a


segunda. Cerca de 50 milhões de pessoas sofrem TCEs ao redor do
mundo anualmente, e a incidência é crescente em países em
desenvolvimento.

Sabemos que a prevenção é uma palavra mágica no trauma… Mas e se a


lesão já aconteceu? Aí vamos prevenir as lesões secundárias! Já
conversamos um pouco no capítulo de atendimento inicial, mas quando
falamos em TCE, devemos evitar a lesão secundária por edema,
hipoperfusão e hipóxia.

Para que conceitos essenciais sejam fixados e compreendidos,


precisamos voltar um pouco na graduação e reviver conceitos de física e
anatomia. Relembraremos o necessário para darmos passos para frente
sem sofrimento.

FISIOPATOLOGIA

Vejamos alguns conceitos fundamentais do funcionamento do SNC:

• A pressão intracraniana (PIC) normal é de aproximadamente 10


mmHg;

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• O aumento da PIC leva à queda da pressão de perfusão cerebral


(PPC);

• Valores de PIC>20 mmHg são classificados como hipertensão


intracraniana grave;

Aumento da PIC pode levar a isquemia cerebral.

PPC: pressão de perfusão cerebral. PAM:pressão arterial média. PIC: pressão intracraniana.

Para os próximos passos, entenderemos a doutrina de Monro-Kellie. Ela


descreve um fenômeno compensatório na tentativa de não elevar a
PIC.

O crânio é uma caixa óssea que não permite expansão, ou seja, o volume
intracraniano é sempre o mesmo. Imaginem que estamos diante de
um sangramento intracraniano (um volume “inédito” naquele espaço). O
efeito de massa resultante desse sangramento levaria a um aumento do
volume intracraniano se não tivéssemos uma compensação por
diminuição do volume venoso e do líquido cerebroespinhal. Entra de
um lado, tem que sair de outro para caber tudo dentro da calota craniana.

Para tentar deixar um pouco mais visual um conceito que parece


abstrato, reparem nas torneiras abaixo (sim, isso mesmo, torneiras!).

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Legenda: Doutrina de Monro-Kellie Fonte: Wilson MH. Monro-Kellie 2.0: The dynamic

vascular and venous pathophysiological components of intracranial pressure. J Cereb

Blood Flow Metab. 2016;36(8):1338-1350. doi:10.1177/0271678X16648711

Entretanto, a redução destes volumes tem um limite, que é o ponto de


descompensação do TCE. Quando o aumento do volume da massa
persiste, esse mecanismo de botar para fora sangue e líquido vai se
esgotar, resultando na diminuição da PPC e herniação cerebral. Saiu o
líquor, saiu o sangue, chega uma hora que vai sair o cérebro (herniação).

E qual o problema de herniar algum componente do cerébro? Pessoal,


abaixo do cérebro a gente tem a tenda/tentório do cerebelo
compactando em um espaço diminuto o cerebelo e as estruturas do
tronco encefálico. E o que que tem no tronco? Os centros de nossas

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funções vitais (especialmente os centros respiratório e controle


pressórico). Se alguma coisa hernia pela tenda do cerebelo vai comprimir
o tronco encefálico e isso é um desastre, nossas funções vitais estarão
ameaçadas e a morte é iminente.

Legenda: Vocês podem ver que a PIC não se altera com o crescimento em volume da

massa até o ponto de descompensação em que a PIC se eleva rapidamente. Esse é o

momento em que tudo vai ladeira abaixo! Fonte: Wilson MH. Monro-Kellie 2.0: The

dynamic vascular and venous pathophysiological components of intracranial pressure. J

Cereb Blood Flow Metab. 2016;36(8):1338-1350. doi:10.1177/0271678X16648711

ANATOMIA

Já entendemos os conceitos de “entradas” e “escapes” de volume no


SNC, agora precisamos ressuscitar alguns conhecimentos anatômicos

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fundamentais ao entendimento do TCE. Vamos puxar pela memória lá


nos primeiros semestres da graduação.

Fundamentalmente, o que precisamos saber, e o que pega muita gente,


é a anatomia das meninges e os espaços entre elas.

As meninges nada mais são do que membranas que envolvem o


encéfalo e a medula espinhal, protegendo-os.

• Dura-máter: mais externa, constituída de tecido conjuntivo denso,


sendo a mais espessa e dura das meninges (meninge fibrosa). É
constituída de dois folhetos: um externo, ou periosteal, aderido e
ancorado a calota craniana; um interno, em contato com a
aracnóide.
• Aracnóide: membrana serosa entre a dura-máter e a pia-máter. É
um tecido fino e impermeável, com organização que lembra uma
teia de aranha. Entre a aracnóide e a pia-máter circula o líquido
cefalorraquidiano.
• Pia-máter: a membrana mais delicada e interna das três, em íntimo
contato e com o SNC, sendo firmemente aderida ao cérebro e a
medula.

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Legenda: Esquema topográfico das meninges

Vamos aos espaços delimitados em relação às meninges e suas


particularidades em relação do TCE:

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ABORDAGEM INICIAL AO TCE

AVALIAÇÃO PRIMÁRIA

A investigação neurológica na avaliação primária está na letra D, e


consiste na avaliação do nível de consciência, pela escala de coma
de Glasgow e na avaliação das pupilas.

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Como médicos responsáveis pelo primeiro atendimento na sala de


emergência, não temos como resolver a lesão cerebral que o
paciente já teve (lesão primária), mas devemos impedir que o
paciente tenha lesão secundária por piora do edema cerebral,
hipóxia e hipoperfusão cerebral.

Objetivos da avaliação primária no que diz respeito ao TCE:

• Manter o paciente bem oxigenado. Intubação para proteção


de via aérea em pacientes com Glasgow menor ou igual a 8.
• Manter o paciente bem perfundido. Atenção às causas de
choque. O cérebro precisa de sangue e PAS mínima de 100-110
mmHg para manter a perfusão cerebral (por isso é
contraindicada a hipotensão permissiva quando há TCE
associado).
• Evitar hiperventilação (manter paCO2 ao redor de 35 mmHg).
• Avaliação de Glasgow e pupilas.
• Reconhecer sinais de hipertensão intracraniana e iminência
de herniação.
• Administrar ácido tranexâmico. Já discutimos isso no
capítulo de avaliação primária: o estudo CRASH-3 mostrou
melhora da sobrevida dos pacientes com TCE moderado
(Glasgow 9-12). Para TCE grave (Glasgow ≤ 8) e leve com
sangramento (Glasgow ≥ 13) não tiveram benefício estatístico,
mas considera-se a administração aceitável.

ESCALA DE COMA DE GLASGOW E PUPILA

Demos uma pincelada sobre TCE no capítulo de abordagem inicial


ao politraumatizado, mas aqui iremos aprofundar e enriquecer a
nossa discussão! Antes de tudo, antes de qualquer informação
nova, devemos ter claro na nossa mente a Escala de Coma de
Glasgow e os preceitos da avaliação pupilar. Segue o fluxo:

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Quanto ao exame da pupila, devemos avaliar o diâmetro das


pupilas (se midriáticas ou mióticas), a similaridade entre as pupilas
(se há anisocoria) e o reflexo fotomotor (se fotorreagente ou não).

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Legenda: Alterações Pupilares. Fonte: Acervo Medway.

Lembrando que existe a nova escala de coma de Glasgow que


inclui as pupilas: o paciente perde 1 ponto se uma pupila não reage
à luz e 2 pontos se ambas estiverem sem reação.

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Legenda: Reação pupilar após estímulo luminoso. Fonte: Acervo Medway.

Sigamos por último com a classificação clínica da gravidade do


TCE, de acordo com a escala de Glasgow:

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HIPERTENSÃO INTRACRANIANA

Conversamos logo acima sobre quadros de hipertensão


intracraniana (HIC). Clinicamente, o que nos alertará para a HIC no
cenário do trauma são as náuseas e vômitos. Agora fica o
questionamento: existem achados de exame físico que nos fazem
suspeitar de hipertensão intracraniana (independentemente da
causa básica)?

Sim, claro que sim! E precisamos reconhecê-los precocemente nos


nossos pacientes e prontamente nas provas de residência: Tríade
Cushing e Papiledema. .

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A hipertensão é uma resposta do organismo para tentar manter a


pressão de perfusão cerebral em um cérebro com PIC aumentada.
Pela fórmula que acabamos de ver (PPC = PAM - PIC), se
aumentarmos a PIC a PAM deve subir na tentativa de manter a
PPC próxima à normalidade.

Quando falamos “alteração do ritmo respiratório”, entendam


bradipneia ou ritmo de Cheyne-Stokes. Na imagem abaixo vemos
uma alternância entre períodos de apneia (linha reta), seguidos por
hiperpneia crescente e decrescente, até uma nova apneia (apneia,
aumento da frequência respiratória, diminuição da frequência
respiratória, apneia).

Legenda: Ritmo de Cheyne-Stokes. Fonte: Adaptado de Dispneia. Medicina, Ribeirão

Preto, 37: 199-207, jul. /dez. 2004

O principal achado de hipertensão intracraniana ao exame físico é,


contudo, o papiledema. É uma alteração percebida durante o
exame de fundo de olho, caracterizada pela perda dos contornos do
disco óptico. O paciente pode se queixar de turvações visuais com
resolução espontânea.

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Legenda: Papiledema. Fonte: Papilledema Grades. EyeRounds.org - Ophthalmology - The

University of Iowa (uiowa.edu).

HERNIAÇÃO CEREBRAL

A hipertensão intracraniana, se não controlada, termina por


compelir o sistema nervoso central pelos espaços e forames da
calota craniana, as herniações, um evento final e letal do quadro. A
porção do cérebro mais comumente herniada é o uncus.

“Mas afinal, o que é o uncus?”

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Vamos relembrar um pouco mais de anatomia. O uncus é uma


estrutura localizada na porção medial do lobo temporal.
Geralmente, essa é a estrutura que hernia (através da incisura
tentorial). Não se preocupem! Não vamos reviver toda a
neuroanatomia!

Dentre os achados que presumem herniação do uncus temos:

• Anisocoria: definida por diferença entre os diâmetros


pupilares maior do que 1 mm. Resulta da compressão do III
par craniano (oculomotor), com perda do estímulo
parassimpático da pupila. Se não temos estímulo
parassimpático de constrição pupilar (fechamento, miose), as
pupilas ficaram midriáticas (dilatadas), uma vez que o sistema
simpático perde oposição. Como o nervo oculomotor inerva a
pupila do mesmo lado de sua emergência, a pupila que dilata
é a do lado da herniação.

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Legenda: Anisocoria com evidência de midríase em pupila esquerda Fonte: ATLS 10 edição

• Déficit motor: um sinal de herniação do uncus. O déficit é


contralateral à alteração pupilar. A herniação pode comprimir
o trato corticoespinhal (piramidal) do mesencéfalo. Como as
fibras desse trato cruzam na altura do forame magno, teremos
déficit motor contralateral a herniação e contralateral à
alteração pupilar.

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AVALIAÇÃO SECUNDÁRIA

No TCE, a avaliação secundária significa exame clínico


completo e avaliação por imagem:

• Avaliar déficits neurológicos (se paciente em condições de


colaborar) e reflexos;
• Procurar sinais de fratura de base de crânio (sinal da batalha,
sinal do guaxinim, otorreia ou otorragia, rinorreia);

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Legenda: Sinal da batalha. Fonte: Battle sign definition, causes, diagnosis & treatment

(healthjade.net).

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Legenda: Sinal do guaxinim. Fonte: Shutterstock.

Legenda: Achados no exame físico que sugerem fratura de base de crânio.

• Tomografia (exame inicial de escolha, quando indicado);


• Ressonância e/ou outros: geralmente realizados num
segundo momento da internação, para investigação de lesão
axonal difusa, por exemplo.

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LESÕES DO TRAUMATISMO
CRANIOENCEFÁLICO

O tema é extenso! Por isso, falaremos em partes sobre cada uma


dos “grandes tipos” de lesões e vamos abrindo o leque à medida
que avançamos. Nossa ordem será a seguinte:

• Lesões de couro cabeludo;


• Fraturas de crânio;
• Lesões intracranianas difusas (aqui está o tema preferido nas
provas e, por isso, nele iremos investir ainda mais atenção).

LESÕES DE COURO CABELUDO

Se vocês já suturaram couro cabeludo, vocês sabem qual o principal


problema associado: sangra muito e dá trabalho conter! Faz sentido
sangrar muito, afinal a irrigação é abundante e, em casos graves, o
paciente pode evoluir para choque hemorrágico e óbito por
lacerações no couro cabeludo! Não desprezem sangramentos desse
tipo!

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Legenda: Sangramentos de couro cabeludo podem promover sangramento intenso.

Fonte: ATLS, 10ª edição.

FRATURAS DO CRÂNIO

Atenção para as fraturas de crânio, não podemos subestimá-las:


estão associadas a lesões intracranianas graves. Um paciente com
fratura de crânio tem 400 x mais chance de ter lesão intracerebral
do que um que não tem.

Podemos dividir as fraturas do crânio em 2 grandes grupos:

• Abóbada craniana: podemos nos deparar com lesões lineares


ou estreladas, com ou sem afundamento, fechadas ou
expostas. A abordagem cirúrgica estará indicada diante dos

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seguintes achados:
◦ Afundamentos maiores que a espessura da calota
craniana adjacente (se afundou tanto assim, tem alguma
estrutura sendo comprimida)
◦ Sinais de hipertensão intracraniana (como já discutimos)
◦ Perda de líquido cerebroespinhal
◦ Fraturas expostas
• Base do crânio. Discutimos os achados do exame físico
sugestivos de fratura de base de crânio: o sinal do guaxinim
(equimose periorbital), o sinal de Battle (equimose
retroauricular), otorreia/otorragia e rinorreia. Também
podemos citar a disfunção dos sétimo e oitavo nervos
cranianos (paralisia facial e perda de audição). Para batermos o
martelo da fratura, nosso principal exame é a tomografia
computadorizada. O tratamento, por sua vez, na maioria dos
casos, é conservador.

Vamos lembrar quais são os ossos da base do crânio: frontal,


esfenoide, etmoide, temporal e occipital.

“E se houver fístula liquórica: o tratamento é o mesmo?”

Moçadinha, as provas não irão cobrar nesse nível de detalhe (pelo


menos para acesso direto), então fiquem tranquilos! Mas, para
acalmar o coração de vocês, o tratamento de fístula liquórica PODE
SER CONSERVADOR, consistindo em repouso absoluto, cabeceira
elevada a 30°, antibioticoprofilaxia e, na presença de aumento da
PIC, podemos associar o manitol. Na ausência de melhora,
indicamos cirurgia.

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LESÕES INTRACRANIANAS FOCAIS

Agora é hora de foco total, integral, absoluto, exclusivo, ímpar! Sim,


gastamos sinônimos porque esse é o ponto crítico da aula! Antes
de nossos alunos terem contato com nossas aulas, não é incomum
ouvirmos frases, como:

• “Eu nunca entendo nada de tomografia de crânio”;


• “Eu tenho trauma com neurocirurgia”;
• “Eu sempre confundo os achados”.

Sabemos que esse tema balança muita gente. Só que a partir de


agora vamos resolver essa insegurança! E não se preocupem,
pessoal, o aluno Medway não passa aperto. Em breve vocês terão
acesso a um curso de imagens radiológicas detalhado!

Hematoma Epidural (ou Extradural)

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Antes de começarmos, saibam que é uma lesão rara “na vida


prática” (0,5% dos casos). A despeito disso, cai muito em provas! Não tem
como não dominar o assunto!

Habitualmente, o sangramento é arterial, mas um terço dos casos


podem ser causados por ruptura de um seio venoso ou associado a
sangramento e fratura de crânio). A lesão clássica é a fratura de temporal
com lesão da artéria meníngea média.

Na tomografia, o hematoma se apresenta com um aspecto BICONVEXO


(lembrando um disco voador), porque fica entre 2 estruturas “duras” e
com ponto de fixação entre si: a dura máter e o osso. O sangue vai
empurrando e descolando a dura máter do osso.

Clinicamente esse tipo de lesão tem uma coisa que as bancas adoram
explorar: o “intervalo lúcido”. A vítima de trauma fica lúcida logo após o
trauma e, depois de um intervalo de minutos a horas, tem rebaixamento
de nível de consciência. Por isso, a observação neurológica pós TCE é
importantíssima (ainda mais se não tivermos disponibilidade de TC). O
manejo é cirúrgico e precoce.

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Legenda: Hematoma Epidural à esquerda Fonte: Rincon S, Gupta R, Ptak T. Imaging of

head trauma. Handb Clin Neurol. 2016;135:447-477. doi:10.1016/B978-0-444-53485-9.00022-2

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Hematoma Subdural

Essa lesão é muito mais prevalente do que o hematoma epidural (30%


dos casos), mas tem a mesma importância no cenário de provas.
Costuma se apresentar nos pacientes com quedas repetidas (em
especial, etilistas e idosos). Em oposição ao hematoma epidural, o
sangramento se deve à ruptura dos vasos da ponte (plexo venoso).
Guardem essa diferença em relação ao epidural desde já! Habitualmente
não há intervalo lúcido.

Na tomografia, veremos um aspecto de CRESCENTE (OU CÔNCAVO-


CONVEXO) acompanhando o contorno da calota craniana. O prognóstico
dessa lesão é mais reservado, dado que tem maior associação com
lesão parenquimatosa subjacente.

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Legenda: Hematoma Subdural Fonte:Rincon S, Gupta R, Ptak T. Imaging of head trauma.

Handb Clin Neurol. 2016;135:447-477. doi:10.1016/B978-0-444-53485-9.00022-2

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Hemorragia Subaracnoide (HSA)

Na imensa maioria dos casos, a HSA é causada por evento não


traumático (ruptura de aneurisma). Mas também pode ser decorrente de
trauma, com ruptura de pequenos vasos da pia-máter, ou por
sangramentos intraventriculares que se estendem ao espaço
subaracnóide. Na tomografia, o sangue ocupa os sulcos e “desenha” o
parênquima cerebral.

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Legenda: Hemorragia subaracnóide. Fonte: Subarachnoid Haemorrhage (SAH) | Overview |

Geeky Medics.

Contusões e hematomas intracerebrais

Galera, vamos fazer uma pausa e refletir sobre alguns pontos. Por mais
que os hematomas epidural e subdural sejam os preferidos nas provas
como gabarito das questões, contusões e hematomas intracerebrais (ou
intraparenquimatosos) sempre estão nas alternativas. Muita gente os
despreza na hora do estudo, mas é um erro gravíssimo!

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Como o próprio nome diz, a lesão e o sangramento ocorrem dentro do


parênquima.

As contusões são lesões menores, mais pontuais, localizadas no


parênquima cerebral e sem grandes repercussões clínicas. Do ponto de
vista anatômico, a maior parte dessas contusões ocorre nos lobos frontal
e temporal.

Num período de horas ou dias, as contusões podem evoluir para um


hematoma intracerebral, lesões de maior tamanho, com repercussões
clínicas diversas e potencialmente fatais em razão do efeito de massa
(hipertensão intracraniana e herniação cerebral, em especial),
eventualmente com necessidade de abordagem cirúrgica. Esse evento é
observado em 20% dos doentes com contusão identificada na TC da
admissão. Por isso, além da vigilância neurológica, devemos repetir a TC
em 24 horas. De novo a importância de observação neurológica e exame
de imagem seriado no TCE.

A imagem típica é de fácil reconhecimento “só de bater o olho”. Reparem


que em absoluta oposição aos hematomas epi e subdural e a HSA
(periféricos e fora do parênquima), as lesões encontradas estão DENTRO
DO PARÊNQUIMA CEREBRAL!

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Legenda: C - Contusões bilaterais com hemorragia. D - Hemorragia intraparenquimatosa

direita, com desvio de linha média para esquerda e hemorragias biventriculares

associadas. Fonte: ATLS, 10ª edição.

LESÕES INTRACRANIANAS DIFUSAS

Novamente, mais um diagnóstico diferencial que aparece dentre as


alternativas! O mecanismo de trauma associado se deve a aceleração e
desaceleração do encéfalo dentro do crânio. Precisamos fixar conceitos
em relação a 2 tipos de lesão:

Concussão cerebral

Caracteriza-se por um distúrbio neurológico NÃO FOCAL, TRANSITÓRIO


e, classicamente, envolve PERDA DE CONSCIÊNCIA. Clinicamente, o
paciente pode se apresentar confuso, desorientado, com quadro de
amnésia anterógrada e retrógrada. Na TC, inicialmente, podemos não ter
achados ou então ter edema difuso, demonstrado por perda da
distinção habitual entre as substâncias branca e cinzenta.

Em linguagem simples, corresponde ao nocaute do boxeador. Uma


contusão cefálica gera um desarranjo temporal no funcionamento do
SNC, com um “blackout”, um apagão. O paciente se recupera sem lesões
focais ou alterações neurológicas outras, geralmente em menos de 6h.

Lesão Axonal Difusa (LAD)

Moçadinha, para essa lesão, temos alguns termos-chave. O primeiro


deles é que se relaciona a trauma de alta energia, com mecanismo de
CISALHAMENTO (aceleração rotacional da cabeça). Isso leva ao
aparecimento de hemorragias pontilhadas ao longo dos dois

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hemisférios cerebrais, concentradas nos limites entre as substâncias


branca e cinzenta.

Clinicamente o paciente está ruim, muito ruim, em flexão ou extensão


anormais, com disautonomia, em estado comatoso prolongado. E isso
gera uma estranheza, porque a TC é normal, ou seja, temos uma
dissociação clínico-radiológica importantíssima. Para esses casos,
devemos realizar uma ressonância nuclear magnética, exame com maior
sensibilidade para diagnóstico de LAD. Encontraremos hipersinal do
corpo caloso.

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Legenda: Hipersinal do corpo caloso Fonte: Journal of Trauma and Injury Volume 31,

Number 2.Korean Society of Trauma), 2018

A diferença entre uma concussão e uma LAD nem sempre é clara em um


primeiro momento, sendo a demora na recuperação do nível neurológico
um alerta para LAD.

CONDUTAS DE ACORDO COM A


GRAVIDADE

Se vocês pensaram “finalmente vamos estudar o que é importante”,


o equívoco é grande! Questões de TCE cobram, recorrentemente, as
indicações e o reconhecimento da lesão pela tomografia. Com o
que discutimos acima, tenham certeza, acertaremos a maior parte
das questões de TCE.

Tenham em mente a classificação de gravidade de TCE. Ela será


fundamental para nossos próximos degraus, quando discutirmos
individualmente as condutas.
Só para construirmos um raciocínio padronizado, temos 4
perguntas que SEMPRE devem ser respondidas no cenário de TCE.

TCE LEVE

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

Como vimos, a maioria absoluta dos TCEs são classificados como


leves (75%). Contudo, cerca de 3% dos pacientes podem evoluir com
piora clínica “inesperada”, resultando em disfunção neurológica
grave se não diagnosticada e tratada de forma precoce. Por isso,
mesmo em quadros de TCE leve, a tomografia computadorizada
deverá ser solicitada em casos específicos.

“O exame será com ou sem contraste?”

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

Em todos os casos de TCE, o exame será sem contraste! O sangue


adquire um aspecto “branco” (hiperdensidade) na tomografia. Se
estivermos diante de uma alteração tomográfica ou de paciente
persistentemente sintomático, devemos proceder com internação e
solicitar avaliação pela equipe da neurocirurgia.

“E se não tiver como pedir uma tomo?”

Nesse caso, devemos observar o doente. O paciente assintomático,


completamente acordado, alerta, sem alterações neurológicas poderá ser
observado por algumas horas na unidade de saúde, com posterior alta e
observação em casa por 24 horas.

Nem doeu, moçadinha! Já passamos pelo TCE leve e foi muito suave!

TCE MODERADO

Os pacientes com TCE moderado ainda são capazes de obedecer ordens


simples mas, em geral, estão confusos ou sonolentos e podem
apresentar déficit neurológico focal. Por isso, necessitam SEMPRE de
TC, de avaliação pela neurocirurgia e internação pelas primeiras 12-24
horas.

Após essas condutas iniciais, recomenda-se repetir a TC nessas 3


situações:

• Em 24 horas, se a primeira TC estiver alterada;

• Paciente com piora clínica;

• Antes da alta, o paciente melhorou.

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

Caso o paciente apresente piora clínica ou tomográfica, imediatamente


devemos manejá-lo como um TCE grave, nosso próximo tópico!

TCE GRAVE

Aqui está a menina dos olhos das questões de manejo de TCE. As 4


perguntas aqui são importantes, mas temos que nos aprofundar mais,
construir uma base mais larga de conhecimentos.

Os pacientes com TCE grave não conseguem obedecer a comandos


simples mesmo após a estabilização hemodinâmica e respiratória.
Avaliação pela neurocirurgia e TC são mandatórias, uma vez que lesões
focais deverão ser descomprimidas e lesões difusas acompanhadas em
unidade de terapia intensiva.

A lesão primária no tecido nervoso já ocorreu, de forma que devemos


tomar condutas para oferecer um ambiente ótimo que permita que os
neurônios possam recuperar o seu funcionamento normal, isto é, evitar
lesões secundárias por isquemia ou hipóxia em um cérebro já
comprometido.

• Intubação e ventilação mecânica. Ter como alvo uma


SatO2 > 95%, PaO2 mínima de 80 e PaCO2 na normalidade
(35-45).

O excesso de oxigênio deve ser evitado pelo potencial de lesão pela


hiperóxia (nada demais é benéfico pessoal). A normocapnia é preferida
na maioria dos doentes. Conseguem imaginar o porquê? A

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

hiperventilação “lava” o CO2 (reduz a PaCO2), levando à vasoconstrição


cerebral. A vasoconstrição reduz o fluxo sanguíneo cerebral e,
consequentemente, a PIC. Contudo, essa redução da PIC às custas da
perfusão cerebral, se mantida uma hiperventilação prolongada e
agressiva, leva a ISQUEMIA do SNC e prejudica a recuperação dos
neurônios (tudo que a gente não quer). A hiperventilação pode ser
indicada por períodos CURTOS em pacientes com deterioração
neurológica súbita enquanto outras medidas não são associadas.
Percebam que hiperventilação é uma ponte para o tratamento efetivo.

• Manter estabilidade hemodinâmica. Alvo pressórico de PAS >


100-110 mmHg e PAM > 80-90 mmHg para manter boa PPC.

Não pensem que é só chegar mandando volume e “tá tudo bem”.


De fato, podemos fazer uso de fluidos IV (intravenosos) e
hemocomponentes de acordo com a necessidade do doente para a
normovolemia. Se necessário, faremos uso de drogas vasopressoras
(menor risco de sobrecarga hídrica). Lembre-se: O TCE
CONTRAINDICA HIPOTENSÃO PERMISSIVA.

Outras medidas que devem ser tomadas e fazem parte dos


cuidados clínicos do TCE:

• Glicemia entre 140-180 mg/dL: devemos evitar tanto a hipo


(principalmente) quanto a hiperglicemia pelo risco de
agravamento da lesão neurológica.
• Monitorar níveis séricos de sódio. Manter o sódio sérico
dentro da normalidade.

A hiponatremia é comum no cenário de PIC elevada,


particularmente em conjunto com a hemorragia subaracnóide. A
natremia tem relação com volume intravascular. Os pacientes
devem ser mantidos euvolêmicos e normo a hiperosmolares.

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

Entenda o motivo: qualquer condição que diminua a osmolaridade


sérica (hipervolemia, hiponatremia), faz com que o SNC fique com a
osmolaridade alta em relação ao sangue, chupando água para
dentro do cérebro, resultando em edema do SNC e elevação da PIC.
Uma das formas de evitar que isso aconteça é usando apenas
fluidos isotônicos (como solução salina 0,9% ou Ringer Lactato),
sem excessos. A osmolalidade sérica deve ser mantida> 280 mOsm/
L, e frequentemente é mantida na faixa de 295 a 305 mOsm/L.

• Tratar a febre / hipertermia. Almejar normotermia e evitar


temperatura superior a 36,5ºC. Em estados de temperatura
elevada, a demanda metabólica se eleva no cérebro, e isso
resulta em aumento do fluxo sanguíneo cerebral, aumentando
o volume de sangue dentro da abóbada craniana, elevando a
PIC. Por outro lado, diminuir a demanda metabólica pode
diminuir a PIC, reduzindo o fluxo sanguíneo.
• Cabeceira elevada >30°. Aqui é física pura, galera. Temos que
usar a gravidade a nosso favor. Queremos evitar uma PIC alta,
então a cabeceira elevada “ajuda” a não ter congestão venosa
(pensem que “é mais fácil pro sangue descer”). Mas, tenham
cuidado: tal medida é contraindicada se o paciente apresentar
lesão de coluna vertebral.
• Monitorização invasiva contínua da PIC: o nosso valor alvo
é 5-15 mmHg. Em alguns centros, essa monitorização é
procedimento padrão no manejo do paciente com TCE grave.
• Correção de anticoagulação e antiagregação plaquetária:
se o paciente for usuário de antiagregantes ou
anticoagulantes, é importante realizar a reversão dessas
medicações, quando possível.

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

Particularizando um pouco mais, do ponto de vista de controle da


PIC (evitar seu aumento), precisamos levar para o dia da prova:

• Uso de bloqueadores neuromusculares ou aumento da


sedação: sabemos que a agitação psicomotora leva a
aumento da PIC.
• Manitol: indicado em quadros de deterioração neurológica
aguda (dilatação de uma das pupilas, hemiparesia ou perda
de consciência), desde que o paciente esteja
NORMOVOLÊMICO. Não tem efeito em pacientes
hipotensos e, por ser um diurético osmótico, pode exacerbar a
hipotensão e, ainda pior, predispor nosso paciente a isquemia
cerebral.
• Salina hipertônica 3%: também usamos para reduzir a PIC
elevada. É nosso agente de escolha para pacientes
hipotensos, uma vez que não age como diurético.

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

Para concluirmos o raciocínio e vocês não vacilarem em questões


de prova, cuidado com medidas controversas (ou seja, sem
evidência) no manejo do TCE grave:

• Hipotermia (32ºC - 34ºC): possui efeito neuroprotetor, mas


não melhora prognóstico;
• Fenitoína: até pode ser utilizada na primeira semana após o
trauma para profilaxia de convulsões precoces, mas não
diminui mortalidade;
• Barbitúricos: indicados em casos de hipertensão
intracraniana refratária por meio da diminuição do
metabolismo cerebral (coma barbitúrico). Contudo, tem efeito

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

hipotensor e é contraindicado se hipotensão ou hipovolemia.


Além disso, não diminui mortalidade;
• Corticoide: não tem indicação!

Pessoal, falamos sobre os principais pontos sobre TCE no cenário de


provas de residência! Agora nos falta responder a última pergunta:
quais as indicações cirúrgicas no TCE grave?

TCE NA INFÂNCIA

Galera, infelizmente o TCE em crianças é uma das queixas que mais


atendemos nas emergências pediátricas e está entre as maiores
causas de óbito entre crianças de 5 a 14 anos. As causas mais
comuns são atropelamentos, acidentes de bicicleta, quedas de
altura e lesões decorrentes de esportes. Casos que merecem mais
cuidados são os de TCE por abuso ou maus-tratos, nos quais pode
ocorrer a síndrome do bebê sacudido (shaken baby), seja por
trauma direto, por lesão compressiva ou penetrante.

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

Depois de nos assustarmos um pouco, vem a informação boa: a


maior parte dos TCEs em crianças são leves, sem lesões cerebrais
ou sequelas, apenas 10% dos quadros são graves, com limitações
permanentes.

Um ponto importante é entendermos que crianças terão mais


frequentemente lesões cerebrais difusas que os adultos. A
desproporção do tamanho da cabeça em relação ao tronco, o maior
conteúdo de água, e a mielinização incompleta, são fatores que
potencializam os efeitos das forças traumáticas.

AVALIAÇÃO INICIAL

O atendimento inicial é o clássico ABCDE. Vamos começar com a


estabilização da coluna cervical e garantindo a perviedade da via
aérea. Se na nossa avaliação o Glasgow for menor que 8 ou na
rebaixamento rápido do nível de consciência (queda maior que dois
pontos no Glasgow durante o exame), é indicada a intubação.

Na avaliação da circulação (C) devemos lembrar que crianças


desidratam rapidamente e vamos avaliar o estado de hidratação
com atenção, palpando pulsos, verificando a pressão arterial (PA) e
a frequência cardíaca (FC). Aqui, vamos solicitar a punção de dois
acessos periféricos para reposição volêmica, com parcimônia e de
acordo com os princípios mais recentes do ATLS de não dar volume
demais para os pacientes. A importância disso para as crianças
vítimas de TCE é a adequada manutenção da PA objetivando um
bom fluxo sanguíneo cerebral, diminuindo a morbidade.

A avaliação de disfunções (D) vai se seguir com busca ativa de


sinais e sintomas que nos alertem para possíveis lesões cerebrais,
como a presença de amnésia pós-trauma (exceto em lactentes e
crianças muito jovens pela limitação cognitiva), perda da

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

consciência, convulsões, cefaléia, vômitos, instabilidade


postural, zumbidos ou alteração de comportamento.

Ao realizarmos o exame físico vamos nos preocupar em fazer um


exame neurológico minucioso, utilizando a escala de coma de
Glasgow adequada para idade e buscando sinais de lesões focais.
Se forem lactentes ou bebês pequenos, é essencial a palpação da
fontanela, e sempre vamos avaliar sinais de fratura da base do
crânio.

E não esqueceremos da Exposição (E), com procura de outras


lesões, lacerações ou fraturas. Durante todo esse atendimento, a
cabeça da criança deve permanecer elevada a 30° e centrada, para
diminuir a PIC, melhorando o retorno venoso.

Quanto à ECG para pacientes pediátricos menores de 2 anos, vimos


no nosso material de abordagem inicial ao trauma que ocorrem
mudanças no quesito “resposta verbal”. Reveja a tabela:

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

Legenda: Escala de Coma de Glasgow pediátrica.

Uma outra particularidade na infância é que o TCE em crianças


pode ser classificado como mínimo, leve, moderado ou grave.

• TCE mínimo: exame neurológico normal, sem déficits focais,


escala de coma de Glasgow: 13-15, sem evidências de fraturas.
• TCE leve: Glasgow entre 13-15 e relato de perda da consciência,
desorientação ou vômitos.
• TCE moderado: Glasgow entre 9-12
• TCE grave: Glasgow igual ou menor que 8.

Muito cuidado com crianças menores de 2 anos, elas podem ter


fraturas e lesões graves, mesmo sem alterações clínicas.

AVALIAÇÃO POR EXAME DE IMAGEM

Seguindo as orientações da Academia Americana de Pediatria, devemos


realizar a tomografia em pacientes com Glasgow menor ou igual a 14 E
alteração do estado mental. Outras situações que devemos pensar em
solicitar uma neuroimagem são a deterioração do quadro clínico ou piora
dos sintomas, com o surgimento de sinais focai (parar de mexer a mão),
cefaléia progressiva, perda da consciência documentada, presença de
convulsões, fraturas ou lesões penetrantes. Lembrando que pacientes
com aumentado risco de sangramento, como hemofílicos, também
precisam de uma imagem para garantirmos que nada sangrou!

Nas crianças menores de 2 anos, essa avaliação é mais difícil, devido


a limitação da idade, então a sociedade americana orienta
considerar irritabilidade, abaulamento da fontanela, vômitos
persistentes e hematomas, como sinais de gravidade, com
indicação de imagem.

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

Os pacientes com ausência total de sinais ou sintomas duas horas


após o trauma e quedas menores de um metro necessitam apenas
de observação por um período de quatro a seis horas. Quando
liberados para casa, os pais devem ser orientados a retorno para
avaliação caso a criança apresente quaisquer novos sintomas
neurológicos.

Nos casos de pacientes em que suspeitarmos de abuso, devemos


investigar e notificar. As alterações que sugerem lesões
intencionais são: hemorragia retiniana; hematoma subdural crônico
bilateral; fraturas múltiplas de crânio ou de ossos longos;
queimaduras e lesões em diferentes estágios de evolução. Para
estas crianças, vamos solicitar imagens gerais como tomografia de
crânio e radiografias de ossos longos, à procura de fraturas novas ou
consolidadas em outras partes do corpo.

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

MORTE ENCEFÁLICA

Moçada, mais um tema que vez por outra aparece nas provas de
residência! Nos últimos anos, tivemos atualizações sobre o assunto
e trouxemos o que tem de mais novo.

As provas não são muito criativas na hora de montar questões:


cobram a ordem dos exames, alguns detalhes sobre quando já está
permitido (ou não) abrir o protocolo e, se querem dificultar um
pouco mais, cobram detalhes sobre os testes feitos à beira do leito!

“Por que vamos falar de morte encefálica na apostila de trauma?”

Pessoal, o trauma é a principal causa de lesão encefálica irreversível! Faz


total sentido discutirmos esse assunto! Nesse tópico, nossa palavra-chave
é “AUSÊNCIA” e vocês já vão entender o porquê!

Morte encefálica (ME) é a perda irreversível de todas funções


encefálicas, incluindo as de tronco encefálico, e equivale a morte
clínica e legal (Resol. CFM 1480/1997). Para darmos continuidade,
precisamos ter claro o seguinte conceito:

Ou seja, não é qualquer paciente em coma arreflexo que vai entrar


no protocolo. Se você não identifica a causa compatível que levou o
paciente a esse estado, não tem como prosseguir. A história clínica,

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

o exame físico e exames complementares nos dando uma etiologia,


abrimos o protocolo.

Mas, e a irreversibilidade? Como podemos “bater o martelo”? Esse é


o ponto crítico da aula.

PRÉ-REQUISITOS

Antes de mais nada, a pergunta que se faz é qual o momento certo


para abrirmos o protocolo de Morte Encefálica? Não basta
suspeitarmos de qualquer paciente rebaixado, grave e sem reflexos
de tronco que temos na UTI. Temos uma série de pré-requisitos
para abrirmos o protocolo:

EXAMES CLÍNICOS

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

Cumpridos os pré-requisitos e aberto o protocolo, deverão ser


realizados 2 exames clínicos por 2 médicos que não podem ser das
equipes de captação de órgãos ou de transplante, sendo um deles,
preferencialmente, especialista em uma das seguintes áreas:
medicina intensiva, neurocirurgia, neurologia, medicina de
emergência. Na ausência de um desses profissionais, um médico
capacitado pode realizar esses exames: 1 ano de experiência no
atendimento de pacientes em coma, que tenham acompanhado
ao menos 10 protocolos de ME, ou que realizaram o curso de
diagnóstico de morte cerebral.

Na avaliação, deveremos observar os seguintes pontos:

• Nível de consciência: o paciente deverá estar em Glasgow 3;

• Ausência de reflexos de tronco cerebral;

◦ Reflexo pupilar: pupilas sem reação ao estímulo luminoso;

◦ Reflexo córneo-palpebral: não vemos fechamento palpebral


ao toque das córneas com dispositivo não-traumático (gota de
NaCl 0,9% ou algodão);

◦ Reflexo óculo-cefálico: nosso paciente terá olhos com


aspecto de olhos de boneca, ou seja, o desvio da cabeça para
um lado e os olhos ficam voltados para o outro lado, como se
os olhares estivessem “fixos”;

◦ Reflexo vestíbulo-ocular: consiste em irrigarmos um dos


condutos auditivos com solução gelada (cerca de 50 ml) e não
percebermos nenhum tipo de movimentação ocular. O
esperado seria que ambos os olhos se deslocassem para o
lado irrigado;

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

Legenda: Teste dos olhos de boneca e vestíbulo-ocular (com soro frio). Fonte: Uptodate,

adaptado de: Bateman DE. Neurologic assessment of coma. J Neurol Neurosurg

Psychiatry 2001; 71 Suppl 1:13.

◦ Reflexo de tosse: introduzimos uma sonda de aspiração


pelo tubo orotraqueal, objetivando estimular a carina (de
forma delicada), sem que isso induza tosse.

São 2 exames clínicos por profissionais diferentes e, obviamente,


deveremos respeitar um intervalo mínimo entre eles. Se fizermos
um logo após o outro teremos um viés temporal altíssimo e
poderemos chamar de “irreversível” um quadro “potencialmente
reversível”.

53
Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

De acordo com a idade do paciente, temos um intervalo padronizado


para seguir. De forma simples, “quanto maior for a idade do paciente,
menor o tempo entre os exames clínicos”, uma vez que crianças se
recuperam muito mais de lesões cerebrais extremamente graves do que
os adultos.

TESTE DA APNÉIA

Abaixo replicamos diversos valores, mas vocês não devem se


preocupar! Contudo, é essencial que vocês tenham uma ideia geral
sobre as etapas.

• Pré-oxigenação com O2 a 100% por 10 minutos;


• Solicitar gasometria arterial idealmente apontando hiperoxia
(PaO2 ≥ 200 mmHg) e normocapnia (PaCO2 35-45 mmHg);
• Desconectar ventilação mecânica;
• Observar ausência de movimentos respiratórios por 10
minutos;
• Nova gasometria arterial com PaCO2 > 55 mmHg (vemos
ausência de movimento respiratório na presença de
hipercapnia, configurando um teste positivo);

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

• Reconectar ao ventilador mecânico.

EXAMES COMPLEMENTARES

São exames menos disponíveis e extremamente específicos, por


isso vocês não devem se preocupar com interpretação gráfica de
nenhum deles. Como já dissemos, a banca dificilmente vai além de
solicitar qual o(s) exame(s) adequado(s) no momento. São três as
possibilidades e você precisa de apenas um para firmar o
diagnóstico:

• Eletroencefalograma (EEG): laudo de ausência de atividade


elétrica encefálica;
• Arteriografia ou USG Doppler transcraniano: laudo de ausência
de perfusão sanguínea encefálica;
• Cintilografia cerebral: laudo de ausência de atividade
metabólica encefálica.

Após seguirmos todos os passos preconizados, a declaração de


óbito (DO) deverá ser preenchida com o horário do último exame
realizado para preencher o protocolo. Se a morte se dever a causas
externas, a DO deverá ser preenchida pelo médico do IML (Instituto
Médico Legal), e o médico assistente deverá preencher o Termo de
Declaração de Morte Encefálica.

Só trazendo um algo a mais, que de repente até aparece na prova:


diante de um caso de morte encefálica, devemos notificar de forma
compulsória a Central de Notificação, Captação e Distribuição de
Órgãos (CNCDOs), independentemente do desejo de doação.

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

E é isso pessoal. Passamos pelos principais pontos no TCE. Agora é


sentar e resolver questão, questão e mais questão. Bora pra cima!

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Trauma Cranioencefálico (TCE) CIR

Bibliografia

1. AMERICAN COLLEGE OF SURGIONS COMMITTEE ON


TRAUMA . Advanced Trauma Life Suport - ATLS. 10 ed, 2018
2. MEDICINA DE EMERGÊNCIA - ABORDAGEM PRÁTICA. Velasco,
Brandão Neto, Marino, Marchini, De Alencar, De Souza. 14 ed,
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4. SABISTON TRATADO DE CIRURGIA. Towsend, Beauchump,
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5. ROON & CHRISTIANSEN,1979 - The Journal of Trauma: Injury,
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6. CIRURGIA CRANIOMAXILOFACIAL E CIRURGIA DE CABEÇA E
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7. TERAPIAS ATUAIS EM CIRURGIA BUCOMAXILOFACIAL.
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8. Rincon S, Gupta R, Ptak T. Imaging of head trauma. Handb Clin
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11. CLÍNICA CIRÚRGICA. Gama-Rodrigues, Machado, Rasslan. 1 ed,
2008.

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