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AULA 03

Nefropatia por IgA (Doença de Berger)


• Definição e Epidemiologia
• Síndrome glomerular com alterações urinárias assintomáticas.
• Mais comum em homens (proporção de dois para cada mulher),
afetando principalmente adultos jovens entre 10 e 40 anos.
• Histórico e Descoberta
• Jean Berger, patologista francês, identificou padrões de hematúria
intensa e isolada sem causas externas evidentes.
• Descoberta de depósitos de IgA no mesângio glomerular como
característica distintiva.
• Manifestações Clínicas
• Episódios de hematúria recorrente, muitas vezes desencadeados
por infecções, vacinações ou exercício físico.
• Analogia com asma, chamada de "asma glomerular" devido à
natureza episódica das manifestações.
• Formas da Condição
• Hematúria Macroscópica Recorrente: Visível, esporádica,
episódica.
• Hematúria Microscópica Persistente: Constante, apenas
detectável por exames específicos, indica lesão glomerular
contínua.
• Diagnóstico
• Hematúria dismórfica sem sintomas completos de síndrome
nefrítica.
• Biópsia renal como padrão ouro para confirmação.
• Avaliação de IgA sérica e possível presença de IgA em outros
tecidos.
• Tratamento
• Inespecífico inicialmente, com gestão de sintomas e proteção da
função renal.
• Uso potencial de corticosteroides em casos graves com proteinúria
significativa ou outras indicações de mau prognóstico.
• Nefroproteção com IECAs ou BRA para pacientes com proteinúria
ou hipertensão.
• Prognóstico
• Maioria (60%) com evolução benigna e função renal estável.
• Cerca de 40% podem evoluir lentamente para insuficiência renal.
• Menos de 5% alcançam remissão completa.
• Fatores de Mau Prognóstico
• Idade avançada no diagnóstico, comorbidades, sexo masculino,
níveis elevados de creatinina, hipertensão no diagnóstico,
proteinúria persistente, e depósitos de IgA fora do mesângio.
Conexões com Outras Condições
• Púrpura de Henoch-Schönlein
• Vasculite sistêmica que pode compartilhar manifestações renais
com a nefropatia por IgA.
• Questionamento sobre se é uma manifestação sistêmica da
nefropatia por IgA ou vice-versa.
Diagnóstico Diferencial
• Síndrome de Alport
• Diferencia-se pela presença de perda auditiva neurosensorial
juntamente com hematúria.
Abordagem Acadêmica
• Enfase na importância de identificar características distintivas para o
diagnóstico preciso e eficaz manejo clínico, bem como para a preparação
para exames e avaliações clínicas.
Neste segmento, abordaremos uma categoria específica de síndrome
glomerular, caracterizada por alterações urinárias assintomáticas. Uma condição
relevante para nossa discussão é a doença de Berger, também conhecida como
nefropatia por IgA.
Jean Berger, patologista francês e uma figura proeminente no campo, viveu
entre a Inglaterra e a França, com sua formação acadêmica sendo realizada na
Inglaterra. Sua expertise estava em lesões glomerulares, e ele se tornou uma
referência enquanto residia em Paris. Berger foi pioneiro em identificar um
padrão clínico intrigante em crianças e adultos jovens: episódios recorrentes de
hematúria intensa que ocorriam isoladamente, sem sinais de cálculo renal ou
infecção. Este sintoma era de origem glomerular.
Intrigado por esses episódios isolados de hematúria intensa, Berger analisou
amostras de biópsia de vários pacientes. Ele descobriu consistentemente
depósitos de IgA no mesângio glomerular, um achado que se tornou a
característica distintiva dessa doença. Em sua homenagem, após seu
falecimento, essa condição foi nomeada como doença de Berger.
Durante a aula, enfatizamos a importância do mesângio, uma região crítica que,
quando afetada, pode resultar em dano glomerular significativo, mesmo que os
sintomas sejam mínimos ou inexistentes, criando uma síndrome. A hematúria,
que discutimos, é mais um sinal do que um sintoma, indicando um grupo de
alterações urinárias assintomáticas. Esta é uma descoberta laboratorial que,
embora subclínica, é crucial para o diagnóstico.
É importante notar que a doença de Berger é a forma mais comum de
glomerulopatia primária, isto é, uma condição que se origina no próprio
glomérulo sem causas externas. Enquanto a glomerulonefrite pós-estreptocócica
(GNPE) é a causa mais comum de síndrome nefrítica em geral (secundária),
entre as doenças glomerulares primárias, a doença de Berger predomina.

Finalizamos enfatizando o perfil epidemiológico da doença de Berger, que afeta


predominantemente homens na proporção de dois para cada mulher,
especialmente entre os 10 e 40 anos de idade. Destacamos a importância de
considerar a doença de Berger nas avaliações clínicas, devido ao seu impacto
significativo e à possibilidade de ser subestimada em comparação com outras
doenças nefríticas.
Vamos aprofundar nosso entendimento sobre uma condição específica que
envolve episódios de hematúria recorrente, observada em pacientes que, na
maioria das vezes, não apresentam outros sintomas. Esses episódios são
macroscópicos e visíveis, com a urina assumindo uma coloração vermelha
intensa. Estes eventos podem ser esporádicos e são influenciados por certos
fatores como infecções, vacinação ou exercício físico vigoroso, que parecem
desencadear a condição.
A condição se manifesta predominantemente em crianças e adultos jovens, onde
tais episódios são desencadeados por uma sequência de eventos que resultam na
recorrência da hematúria. Esses gatilhos atuam de forma similar à
hiperreatividade observada em pacientes com asma, onde a doença subjacente
permanece estática até ser ativada por estímulos externos. Assim como a crise
asmática resulta em broncoconstrição, o estímulo em pacientes com essa
condição renal ativa o processo patológico no mesângio do glomérulo.

De forma didática, pode-se comparar esta condição a uma "asma glomerular",


onde a doença existe latente e se manifesta episodicamente em resposta a
estímulos que perturbam a homeostase glomerular. Entre os episódios, o
glomérulo retorna ao seu estado normal, demonstrando um ciclo de crises e
calmaria.
Existe também uma segunda forma da condição, caracterizada por hematúria
microscópica persistente. Este tipo é paradoxal porque a hematúria é constante,
mas apenas detectável por meio de exames específicos de urina. Esta forma é
mais grave, pois indica uma lesão glomerular contínua, sem períodos de
remissão, o que pode levar a uma deterioração mais rápida da função renal. A
presença de proteinúria mais acentuada pode ser um indicativo de um
prognóstico mais preocupante nesta variante da doença.
Essa constante agressão ao glomérulo, mesmo que menos intensa em aparência,
resulta em um impacto prolongado sobre a saúde renal, contrastando com a
primeira forma, onde os intervalos de calmaria permitem uma recuperação do
tecido glomerular. A compreensão dessas duas formas é crucial para o manejo
adequado da condição e para antecipar o curso clínico da doença nos pacientes
afetados.

A hematúria macroscópica recorrente, manifesta-se claramente mas se resolve


temporariamente, sem deixar sintomas residuais. Por outro lado, a hematúria
microscópica persistente opera de maneira mais insidiosa, continuamente ativa
sem sinais externos óbvios, tornando-a mais traiçoeira.
Isso nos leva a introduzir a síndrome nefrítica como uma terceira forma
possível, caracterizada por uma resposta aguda a infecções, semelhante à
nefrite pós-estreptocócica (GNPE), mas com diferenças críticas como a
normalidade dos níveis de complemento.
Os conceitos importantes destacados incluem a persistência de hematúria
microscópica e a possibilidade de episódios agudos induzidos por fatores
desencadeantes. Essas condições podem evoluir para formas mais severas de
doença renal, incluindo síndromes nefríticas e, potencialmente, nefróticas, e até
insuficiência renal. Essa progressão ilustra a importância de entender a natureza
recorrente e potencialmente exacerbante das diferentes formas de hematúria
glomerular.

Essa condição é frequentemente associada a episódios recorrentes de hematúria,


que podem ser precedidos por infecções do trato respiratório superior. A
abordagem diagnóstica para a doença de Berger combina avaliações clínicas e
laboratoriais, com a biópsia renal servindo como um confirmador definitivo da
doença.
Clinicamente, a doença de Berger pode ser indicada por hematúria dismórfica
sem os sintomas completos da síndrome nefrítica, complemento sérico normal,
e desregulação do metabolismo do IgA, que pode ser evidenciado por níveis
elevados de IgA no soro e, ocasionalmente, depósitos de IgA em outros tecidos
como a pele. Esses indícios podem algumas vezes evitar a necessidade de uma
biópsia renal.
No entanto, a biópsia renal permanece como o padrão ouro para confirmação
diagnóstica, especialmente em casos que desviam das apresentações típicas ou
quando o quadro clínico não é conclusivo. Por exemplo, se um paciente
desenvolve uma síndrome nefrítica clássica com complemento normal – um
padrão não típico para a doença de Berger – a biópsia se torna justificada para
excluir outras condições possíveis ou para confirmar a suspeita de nefropatia
por IgA.

Quanto ao tratamento, ele geralmente começa de forma inespecífica, focando


em manejar os sintomas e proteger a função renal. O uso de corticosteroides
pode ser considerado em situações mais graves, como em pacientes com
proteinúria significativa (superior a 1g por dia), hipertensão, retenção hídrica,
creatinina elevada, ou achados biópsicos indicativos de um prognóstico
desfavorável, como lesões crescentes. Esses tratamentos são adaptados para
conter a progressão da doença e minimizar o dano renal.
Em resumo, a abordagem para a doença de Berger é multifacetada, combinando
diagnóstico clínico e laboratorial com tratamento personalizado baseado na
severidade e nas características individuais da doença em cada paciente.
A nefroproteção na gestão da doença de Berger, destaca-se o uso de inibidores
da enzima conversora de angiotensina (IECA) ou bloqueadores dos receptores
da angiotensina II (BRA) para pacientes que apresentam proteinúria acima de 1
grama por dia ou que estão desenvolvendo hipertensão arterial sistêmica.
O papel destes medicamentos é central no manejo da função renal ao moderar a
dinâmica vascular dentro do rim. A angiotensina II, um vasoconstritor potente,
normalmente atua para aumentar a pressão dentro do glomérulo ao contrair a
arteríola eferente, ajudando a manter a filtração em situações de perfusão renal
reduzida. No entanto, essa mesma ação pode ser prejudicial em estados
crônicos, onde a pressão glomerular elevada pode acelerar a progressão do
dano renal.

IECAs e BRAs atuam diminuindo essa pressão glomerular, ao bloquear os


efeitos da angiotensina II, permitindo que a arteríola eferente relaxe e,
consequentemente, reduzindo a filtração glomerular. Isso ajuda a preservar a
função renal ao longo do tempo, principalmente em pacientes com condições
que já predispõem a uma sobrecarga renal, como proteinúria e hipertensão.
Além disso, o trecho aborda o prognóstico da doença de Berger, indicando que
a maioria dos pacientes (60%) apresenta um curso benigno com função renal
estável, enquanto 40% podem evoluir lentamente para insuficiência renal ao
longo de décadas. Menos de 5% dos pacientes podem ter uma remissão
completa, indicando uma possível resolução total da doença.
Essas informações são cruciais para entender a importância de monitorar e
gerenciar ativamente a função renal em pacientes com nefropatia por IgA,
adaptando o tratamento para minimizar a progressão da doença e maximizar a
qualidade de vida do paciente.
A progressão e os fatores de mau prognóstico associados à doença de Berger,
ou nefropatia por IgA é enriquecida com nuances clínicas e epidemiológicas
que orientam o raciocínio diagnóstico e as estratégias de manejo.
Progressão da Doença: A nefropatia por IgA é caracterizada como uma doença
crônica com uma variabilidade considerável na evolução clínica. A maioria dos
pacientes apresenta um curso benigno, com uma minoria evoluindo
rapidamente para insuficiência renal. A preocupação está principalmente nos
casos que progridem de forma mais acelerada, o que é raro, mas
significativamente preocupante.

Fatores de Mau Prognóstico: Os fatores que podem indicar um pior


prognóstico na nefropatia por IgA incluem:
1. Idade Avançada no Diagnóstico: Pacientes mais velhos tendem a ter um
prognóstico pior, possivelmente devido a uma exposição prolongada à
doença sem diagnóstico e manejo adequados.
2. Comorbidades Associadas: A presença de outras condições de saúde
pode complicar o manejo da doença e acelerar sua progressão.
3. Sexo Masculino: Curiosamente, embora a doença seja mais comum em
homens, eles também apresentam um prognóstico pior em comparação
com mulheres.
4. Níveis Elevados de Creatinina: Indicativo de comprometimento renal já
no momento do diagnóstico > 1,5
5. Hipertensão Arterial Sistêmica: Como a pressão elevada pode
exacerbar o dano renal, sua presença no diagnóstico sugere um risco
aumentado de progressão da doença.
6. Proteinúria Persistente: Níveis acima de 1 a 2 gramas por dia, mesmo
após tratamento, indicam um risco maior de deterioração renal.
7. Depósitos de IgA nas Alças Capilares: A presença de IgA fora do
mesângio, como nas alças capilares, pode sugerir uma forma mais
agressiva da doença.
Conexões com Outras Condições: A discussão aborda também a púrpura de
Henoch-Schönlein, uma vasculite sistêmica que pode compartilhar
manifestações renais com a nefropatia por IgA. Ambas as condições podem
apresentar depósitos de IgA no mesângio, levantando questões sobre a relação
entre essas doenças, seja a púrpura uma manifestação sistêmica da nefropatia
por IgA ou vice-versa.

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