Você está na página 1de 15

DOENÇA RENAL CRÓNICA

Etiologia e Patogenia

Contrariamente à insuficiência renal aguda (IRA), a doença renal crónica (DRC) é uma doença
irreversível, definida por alterações estruturais e/ou funcionais de um ou de ambos os rins há
mais de 3 meses, havendo uma perda no número de nefrónios funcionais.

A DRC tem uma prevalência de 1 a 3% em gatos e de 0,5 a 1,5% em cães e é mais comum em
animais mais velhos, apesar de poder ocorrer em qualquer idade.

Pode afetar até 30 a 40% dos gatos com mais de 10 anos.

Algumas etiologias da DRC descritas são a pielonefrite, amiloidose, linfoma renal, doença renal
poliquística, urolitíase, infeções por FIV, FeLV ou PIF e IRA.

A maioria das vezes, a sua causa primária é desconhecida, sendo a nefrite tubulointersticial
crónica a alteração patológica encontrada com maior frequência nas biópsias renais.

Porém, esta é uma alteração que se vai desenvolvendo com a progressão da DRC, não
refletindo a sua causa primária.

É uma patologia irreversível e progressiva, pois verifica-se uma perda gradual de nefrónios.
Inicialmente, a diminuição da taxa de filtração glomerular leva a uma hiperfiltração glomerular
compensatória por parte dos nefrónios saudáveis, que acaba por contribuir para a progressão
da doença com perda de mais nefrónios

Ou seja, quando há um certo número de nefrónios destruídos, a doença renal tende a ser
progressiva, sendo a hiperfiltração um dos fatores que mais contribui para que isto aconteça.

A hiperfiltração ocorre como consequência da tentativa, por parte dos nefrónios


remanescentes, em manter a taxa de filtração glomerular total (TFGT), apesar do número de
nefrónios funcionais estar diminuído.

Por conseguinte, há um aumento da filtração de proteínas, levando a proteinúria e esclerose


glomerular, que contribuem para a progressão da doença.
A proteinúria pode ser usada como um marcador de disfunção tubular, estando associada a
fibrose intersticial e hipertrofia glomerular.

Os danos renais podem progredir para uma situação em que os mecanismos compensatórios
não são suficientes para preservar a função excretora, reguladora e endócrina dos rins,
resultando na retenção de metabolitos tóxicos, na excreção diminuída de solutos orgânicos, na
desregulação da excreção de eletrólitos e de água, na falha do balanço ácido-base e na falta de
produção de certas hormonas.

Apesar de, no início da doença, o aumento da filtração dos nefrónios remanescentes ser
suficiente para manter a TFGT, com o avanço da destruição do tecido renal, esta taxa acaba
por diminuir.

Alguns solutos orgânicos, como a ureia e a creatinina, não são reabsorvidos a nível
tubulointersticial, sendo a sua concentração sérica regulada apenas pela filtração glomerular,
aparecendo, por isso, aumentados numa fase mais precoce da DRC, comparativamente com a
maioria dos outros compostos.

As concentrações de certos eletrólitos, como o sódio e o potássio, só aparecem alterados


numa fase mais avançada da doença, uma vez que a sua regulação é mantida tanto pela
filtração glomerular como pela reabsorção e secreção tubular, podendo apresentar valores
normais até uma TFGT de 10% do normal.

A ureia e a creatinina não são toxinas urémicas, mas pensa-se que sejam um bom indicador, e
que reflitam a concentração sérica dessas toxinas.

Uma das consequências da DRC é o hiperparatiroidismo: à medida que a TFGT diminui, a


retenção de fósforo vai aumentando. A hiperfosfatemia leva a uma diminuição da
concentração de cálcio ionizado, o que vai estimular a paratiroide a produzir paratormona
(PTH).

Além disso, a hiperfosfatemia vai inibir a produção renal de calcitriol, promovendo ainda mais
a produção da PTH, que aumenta a libertação de cálcio e de fósforo dos ossos, a excreção de
fósforo pela urina, a produção de calcitriol e, consequentemente, a absorção intestinal de
cálcio.

O aumento crónico da PTH pode levar à desmineralização óssea. Com o avanço da lesão renal,
os rins deixam de ter a capacidade de produzir calcitriol.
Sinais clínicos

A uremia é a síndrome clínica que resulta da perda das funções renais.

Poliúria e polidipsia são os primeiros sinais clínicos da DRC. A poliúria ocorre devido à
incapacidade de os rins concentrarem a urina. Isto deve-se ao aumento da filtração
glomerular, por parte dos nefrónios remanescentes, à perda do gradiente osmótico da medula
renal, bem como à perda de resposta dos rins à ADH.

A PU e PD compensatória ocorrem quando 67% dos nefrónios estão afetados, estando a


capacidade de concentrar urina prejudicada, pois existe um aumento da carga de solutos por
nefrónio saudável, levando a uma diurese osmótica.

Os sinais clínicos associados à DRC não são específicos, sendo os mais comuns a poliúria e a
polidipsia, letargia, anorexia, perda de peso, vómitos, náusea, diarreia, incontinência urinária e
halitose.

Pode ser encontrada diarreia hemorrágica, devido ao sangramento causado pelos elevados
níveis de amônia produzidos por bactérias do TGI, isquemia por lesões vasculares e aumento
da gastrina pela excreção renal prejudicada.

No exame físico podem apresentar uma pelagem seca e opaca, uma má condição corporal,
desidratação, taquicardia, taquipneia, mucosas pálidas, doença periodontal, gengivite e
úlceras orais (mais comum nos cães).

A palidez das mucosas pode ser evidente se existir anemia, pois o rim é o principal produtor de
eritropoietina no animal adulto, uma hormona responsável pela regulação da produção de
glóbulos vermelhos pela medula óssea.

A anemia na DRC é tipicamente normocrómica, normocítica e não regenerativa.

A hipertensão sistémica secundária à DRC pode ser encontrada em 50-93% dos casos, uma vez
que a isquemia renal resulta na ativação do sistema renina-angiotensina e no aumento da
atividade do sistema nervoso simpático.

Esta é uma das consequências mais comuns da DRC, podendo ser encontrada em qualquer
estadio.

Quando crónica, a hipertensão pode causar danos nos tecidos, como lesões oculares e lesões
cardíacas.
Diagnóstico

Como o quadro clínico é inespecífico, devem ser realizados testes de diagnóstico para
confirmar e estadiar a doença.

No hemograma pode estar presente uma anemia não regenerativa, mais frequentemente
observada em animais em estadios avançados da doença. Isto deve-se principalmente ao facto
de os rins não serem capazes de produzir eritropoietina, que é uma hormona reguladora da
produção de eritrócitos.

Porém a anemia pode ser mascarada pela desidratação, pelo que deve ser avaliado em
simultâneo com a concentração proteica total.

Neutrofilia e linfopenia podem também estar presentes, visto ser uma doença crónica.

Azotemia é o achado mais frequente na bioquímica sérica e é verificável quando 75% dos
nefrónios não estão funcionais.

Sendo o aumento sérico da creatinina, um indicador da diminuição da TFG, e


consecutivamente da função renal, contudo com baixa sensibilidade.

Pode observar-se hipoalbuminémia, causada pela perda de proteína glomerular e pela má


nutrição.

No ionograma sérico, pode ser detetável uma hiperfosfatemia, que ocorre quando 85% dos
nefrónios não estão funcionais (pois os rins são responsáveis pela excreção de PO4).

É mais frequente detetar-se hipercalcemia (cálcio total) mas em casos mais avançados pode
verificar-se hipocalcemia, encontrando-se o cálcio ionizado, geralmente, normal ou diminuído.
18 a 30% dos gatos com DRC apresentam hipocalemia, sendo a DRC a causa mais comum deste
desequilíbrio iónico.

Animais com DRC podem ainda apresentar acidose metabólica.

Deve também ser realizada uma urianálise, que inclui densidade urinária, análise da tira
reativa da urina, sedimento urinário, cultura da urina e P/CU.

Com o avançar da doença, os animais deixam de ser capazes de conseguir concentrar ou diluir
a urina, apresentando isostenúria (USG=1,008 e 1,012).

A isostenúria aparece quando há destruição de pelo menos 67% dos nefrónios nos cães. Nos
gatos, só se atinge, geralmente, em percentagens maiores de lesão do tecido renal.

O P/CU é o melhor indicador de proteinúria, uma vez que a tira reativa da urina dá muitos
falsos positivos e negativos (avalia a proteinuria causada pela hipertensão intraglomerular).
O RPUC deve ser realizado após serem descartadas outras causas que levem ao aumento do
mesmo, como por exemplo infeção/inflamação e hemorragia do trato urinário, pelo que
devem ser descartadas através da realização do sedimento e cultura urinária.

É aconselhada a realização de cultura microbiológica da urina, mesmo quando o sedimento


está negativo, uma vez que 15 a 30% dos gatos com DRC apresentam infeção do trato urinário
inferior associada.

É também importante medir as pressões arteriais, dado a DRC ser a causa mais comum de
hipertensão em cães e gatos. Os principais mecanismos a contribuir para a hipertensão são a
retenção de fluídos, a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona e o aumento da
atividade do sistema nervoso simpático.

A sua manifestação clínica mais comum são as retinopatias.

A hipertensão sistémica pode piorar os danos renais ao induzir hipertensão glomerular e


proteinúria.

A ecografia pode ser útil no diagnóstico da DRC, podendo ser observada uma perda de
diferenciação córtico-medular e rins hiperecogénicos. Porém, rins normais na ecografia não
descartam DRC.

Sendo a DRC progressiva, a sua deteção precoce é fundamental para iniciar o tratamento por
forma a retardar a progressão da doença e aumentar o tempo de vida destes doentes

A concentração sérica de SDMA (proteína que é eliminada 90% pelos rins), é considerado um
biomarcador mais preciso e sensível para a TFG, comparativamente à concentração de
creatinina.

Os níveis de creatinina podem ser afetados pela idade, sexo, quantidade de proteína na dieta e
a quantidade de massa muscular, ao passo que o SDMA não.

Para além disto, o valor de SDMA sérico aumenta quando 30% da função renal está afetada,
enquanto que o valor de creatinina apenas aumenta quando 75% está afetada.

O SDMA é considerado um indicador precoce da perda da função renal.


A International Renal Interest Society (IRIS) estabeleceu um sistema de estadiamento da DRC,
com o intuito de determinar qual a melhor abordagem terapêutica e de monitorização, de
acordo com o estadio do paciente.

Este sistema é baseado nos valores séricos, em jejum, da creatinina e/ou do SDMA de doentes
hidratados.

A IRIS criou 4 estadios, sendo o estadio 1 o menos severo e o 4 o mais severo.

Para além disso, criou também subestadios baseados na proteinúria, medida através do P/CU,
e na pressão arterial sistólica.
Tratamento e Prognóstico

Como a DRC é irreversível, a terapia não vai curar, mas tem em vista melhorar o quadro clínico
e bioquímico do animal e reduzir a progressão da doença.

O primeiro passo é a hidratação do animal, uma vez que os pacientes com DRC têm a
capacidade de concentrar urina comprometida, pelo que devem ter sempre água à disposição,
e quando se verifica desidratação, esta deve ser corrigida com uma solução cristalóide, como o
Lactato de Ringer.

Em estadios avançados, é comum os animais desidratarem rapidamente, e pode ser útil


recorrer à fluidoterapia subcutânea.

Todos os medicamentos nefrotóxicos devem ser suspensos e identificadas e tratadas todas as


potenciais causas reversíveis de lesão nefrotóxica

Deve-se tratar a causa primária, caso seja identificada, e tratar fatores reversíveis que possam
estar a agravar a doença, como a hipertensão, infeções do trato urinário e desequilíbrios
eletrolíticos ou de ácido-base.

O maneio nutricional é muito importante na prevenção da progressão da doença. Deve ser


instituída uma dieta renal, restrita em fósforo e proteínas.

Para além disso, normalmente apresentam também uma densidade calórica aumentada, são
suplementadas com potássio, vitamina B, ómega 3, antioxidantes e agentes alcalinizantes, e
restritas em sódio.

Pacientes que consumem dietas renais têm um tempo de sobrevivência 3 vezes superior,
comparativamente aos que consumem dietas não renais

Uma restrição antecipada no fósforo pode reverter o hiperparatiroidismo secundário à DRC.

Muitas vezes a hiperfosfatemia é muito marcada, e a inclusão de um ligante de fosfato na


alimentação pode ser vantajosa.

Também está indicado a redução crónica da ingestão de fósforo na dieta, principalmente no


estadio 2, 3 e 4, com o intuito de manter este ião numa concentração inferior a 4.6mg/dl.

Se a concentração de fósforo no plasma permanecer elevada mesmo com a dieta renal, está
indicada a administração de quelantes de fósforo entérico, como o hidróxido de alumínio e o
carbonato de alumínio.

Caso sejam verificados sinais de toxicidade pelo alumínio como fraqueza muscular, o quelante
de fósforo deve ser alterado.

O uso hidróxido de alumínio tem a desvantagem de poder contribuir para a ocorrência de


obstipação, especialmente em gatos. Podendo ser tratada pela adição de polietilenoglicol ou
lactulose.
Deve-se também monitorizar a hipercalcémia sempre que o quelante de fósforo contém
cálcio.

É também muito importante tratar os sinais gastrointestinais presentes, como náuseas,


anorexia e vómitos. Para tal, podem ser usados antieméticos, como o maropitant, mirtazapina,
ondasetron e dolasetron.

A mirtazapina é especialmente vantajosa, uma vez que atua também como estimulante de
apetite nos gatos.

A utilização de tubos de alimentação também é uma opção, quando os animais recusam a


alimentação.

A hipergastrinémia está frequentemente associada à DRC, contribuindo para um aumento da


acidez gástrica, que pode ser combatido com a administração de omeprazol ou famotidina.

Em caso de anemia, pode ser vantajosa a realização de uma transfusão sanguínea ou usar
agentes estimulantes de eritrócitos (ESAs), como a eritropoietina recombinante humana
darbepoietina alfa ou epopoetina alfa que, juntamente com suplementação de ferro, pode ter
efeitos bastante benéficos no aumento do hematócrito.

Os animais em estadio 2 a 4 e com pressões arteriais sistólicas iguais ou superiores a


160mmHg são candidatos a tratamento da hipertensão, contribuindo este tratamento para a
diminuição da proteinúria. Além da redução do teor de sódio da dieta, deve-se iniciar
tratamento com um inibidor da enzima de conversão da angiotensina (IECA), como o
benazepril.

Caso necessário pode-se combinar o IECA com um bloqueador dos canais de cálcio (BCC),
como a amlodipina e, em último caso, pode ainda ser adicionado um bloqueador de
angiotensina (BRA), como o telmisartan.

Para tal, podem ser usados inibidores da enzima conversora da angiotensina, como o enalapril
ou o benazepril, bloqueadores dos recetores da angiotensina, como o telmisartan (apenas
para gatos), e bloqueadores de canais de cálcio, como a amlodipina (apenas para gatos).

O tratamento da proteinúria passa pela alimentação com uma dieta renal e a administração de
um IECA, pois são renoprotetores e diminuem a vasoconstrição arteriolar eferente, diminuindo
a hipertensão intraglomerular e a proteinúria. No caso de não ser suficiente, pode-se adicionar
à terapêutica um BRA
A frequência de reavaliação depende muito de cada caso e varia com a severidade da doença,
com as complicações presentes, com o tratamento instituído e com a resposta ao mesmo.

O prognóstico varia muito e os animais podem sobreviver entre meses a anos. Gatos em
estadio 4, apresentam uma taxa média de sobrevivência de 35 dias.
Referências Bibliográficas

1. DiBartola SP, Westropp JL (2019). Acute kidney injury and chronic kidney disease. In Nelson
RW & Couto
CG (Eds.). Small Animal Internal Medicine (6th Ed, pp 686-703). Elsevier.
2. Polzin DJ (2017). Chronic Kidney Disease. In Ettinger SJ, Feldman EC & Cótê E (Eds.).
Textbook of
Veterinary Internal Medicine: Diseases of the Dog and the Cat (8ª Ed, pp 4693-4739). Elsevier.
3. Brown CA, Elliott J, Schmiedt CE, Brown SA (2016). Chronic Kidney Disease in Aged Cats:
Clinical Features,
Morphology, and Proposed Pathogeneses. Veterinary Pathology 53(2): 309-326.
4. Sparks AH, Caney S, Chalhoub S, et al. (2016). ISFM Consensus Guidelines on the Diagnosis
and
Management of Feline Chronic Kidney Disease. Journal of Feline Medicine and Surgery 18:219–
239.
5. Reynolds BS, Lefebvre H (2013). Feline CKD: Pathophysiology and risk factos – what do we
know?. Journal
of Feline Medicine and Surgery 15: 3-14.
6. IRIS (2019). Staging of CKD. Consultado em http://www.iris-kidney.com/, a 10.06.2021.
7. Quimby JM. Update on Medical Management of Clinical Manifestations of Chronic Kidney.
Disease.
Veterinary Clinics of North America: Small Animal Practice 46(6):1163-1181
Casos Clínicos

1. 484240

Identificação do animal e motivo da consulta:


O Kiko é um gato macho inteiro, Europeu Comum, com 6 anos de idade, que veio à
consulta devido a vómitos, prostração e anorexia total há 24 horas.
À chegada pesava 4,620Kg.

Anamnese:
O Kiko é um gato estritamente indoor, que coabita com outro gato saudável.
Não está vacinado, nem desparasitado, e não apresenta teste FIV/FeLV.
Faz uma alimentação seca, comercial, de boa qualidade.
Os tutores do Kiko viram um vómito líquido de cor amarelada no chão de casa e notaram
que o Kiko tinha deixado de comer, encontrando-se mais prostrado.
Desconhecem se tem consumido mais água, ou se anda a urinar mais ou menos.
Não verificaram a presença de diarreia.
O Kiko tem história de atropelamento, quando era jovem, mas nunca mais teve problemas
aparentes.

Exame físico geral e dirigido (aparelho urinário):


Apresentava-se alerta, responsivo a estímulos e com temperamento equilibrado.
Tinha uma condição corporal de 4/9.
Os movimentos respiratórios eram costoabdominais, regulares, rítmicos, e com uma
relação inspiração-expiração de 1:1,2.
Tinha uma frequência respiratória de 28rpm.
O pulso era forte e com uma frequência de 160bpm.
Tinha uma temperatura retal de 37,8ºC, mucosas rosadas e secas e com TRC inferior a 2
segundos, apresentando ainda os globos oculares afundados.
A prega de pele permanecia durante 3 segundos.
Não se detetou aumento dos gânglios linfáticos, não apresentava dor à palpação e estava
tudo normal na auscultação cardíaca.

No exame físico dirigido ao aparelho urinário, a bexiga era palpável, encontrando-se tensa.
Não se notaram mais alterações evidentes no exame dirigido.

Lista de problemas:
Vómitos, anorexia, prostração e desidratação.

Diagnósticos diferenciais:
Indiscrição alimentar, pancreatite, lipidose hepática, colangite, doença renal crónica,
doença do trato urinário inferior felino (FLUTD), diabetes mellitus, hipoadrenocorticismo.

Exames complementares:
Colheu-se sangue para hemograma, bioquímica e ionograma séricos.
No hemograma verificou-se a presença de neutrofilia e na bioquímica havia uma ligeira
hiperglicemia, um aumento severo da ureia (>140mg/dL) e da creatinina (15,82mg/dL), e
no ionograma observou-se uma hipocalemia e uma hiperfosfatemia muito marcada

Também se recolheu urina por cistocentese para tira reativa da urina e densidade, onde se
verificou a presença de leucócitos (+3), proteínas (+1) e uma densidade de 1,010
(isostenúrica).
Foi enviada uma amostra de urina para análise do sedimento urinário, do rácio
proteína:creatinina (P/CU), bem como cultura bacteriológica.
O sedimento não apresentava alterações, a cultura veio negativa e o rácio igual a 1.

Mediu-se a pressão arterial sistólica que era de 160mmHg.

Foi realizada também uma ecografia abdominal, onde se visualizaram rins diminuídos de
tamanho e muito irregulares, com perda de diferenciação córtico-medular e sem sinais
inflamatórios.

Diagnóstico final: Doença renal crónica.

Terapêutica e acompanhamento:
O Kiko foi internado com fluidoterapia com Lactato de Ringer a 3 taxas de manutenção
(26mL/h).
Começou um tratamento com omeprazol (1mg/Kg IV BID) e hidróxido de alumínio
(30mg/Kg BID PO).
Iniciou também uma dieta renal húmida.
Mediram-se as pressões arteriais (160mmHg).
No 2º dia, o Kiko estava menos desidratado, tendo-se reduzido a fluidoterapia para 2 taxas
de manutenção.
Começou-se a medir a frequência respiratória a cada 4 horas, que se manteve estável
durante todo o período de internamento.
No 3º dia voltou-se a medir a pressão sistólica (130mmHg), as concentrações séricas de
ureia, creatinina e fósforo, e ionograma sérico.
Reavaliou-se a creatinina a cada 2 dias até à alta, verificando-se uma diminuição
progressiva da sua concentração no sangue.
No 4º dia iniciou-se a administração de telmisartan (1mg/Kg PO SID).
Ao 6º dia interrompeu-se a toma de hidróxido de alumínio, iniciando-se a administração
de Pronefra® (suplemento com carbonato de cálcio e de magnésio, quitosano e
oligopeptídeos marinhos; 0,25mL/Kg PO SID) e de mirtazapina (3,8mg PO QOD), à qual
reagiu positivamente, tendo recuperado o apetite.
No 10º dia estava mais prostrado, com as mucosas mais pálidas e com algum esforço
respiratório.
Repetiu hemograma, onde se detetou uma anemia (hematócrito de 11%).
Fez tipificação do sangue (tipo A) para realização de transfusão sanguínea.
No dia seguinte estava com mais apetite e com um microhematócrito de 16%, tendo alta
hospitalar com telmisartan (1mg/Kg PO SID), Pronefra® (0,25mL/Kg PO SID) e mirtazapina
(via transdérmica, SID, durante 14 dias), e com indicação de manter uma dieta renal
húmida em casa ou, caso rejeite, uma dieta mais palatável.
O controlo foi marcado para 3 semanas depois.
2. 49888

Identificação do animal e motivo da consulta:


A Bia é uma cadela de 14 anos, esterilizada, Yorkshire Terrier e com 1,645 Kg de peso vivo.
Apresentou-se à consulta por prostração, anorexia, vómitos e perda de peso.

Anamnese:
A Bia encontra-se devidamente vacinada e desparasitada.
Habita num ambiente interior com acesso a exterior público e sem coabitantes.
É alimentada com ração seca e húmida de gama comercial.
Sem historial de viagens recentes.
Sem história clínica prévia.
Quando foi apresentada à consulta não tomava qualquer medicação.
As fezes encontravam-se normais.
A tutora referiu que anteriormente a Bia pesava 2,0 Kg mas não sabia precisar há quanto
tempo tinha iniciado a perda de peso.
Acrescentou que apresentava anorexia total há 2 dias e vómitos biliares desde o dia
anterior.

Exame do estado geral:


Estado mental alerta e temperamento equilibrado.
Condição corporal normal (4/9).
Movimentos respiratórios regulares, rítmicos, costoabdominais, com relação
inspiração:expiração de 1:1,3 e com frequência de 16 rpm.
O pulso era forte bilateral, simétrico e com frequência de 116 ppm.
Temperatura corporal era de 38,3ºC, sem alterações nas fezes aderidas ao termómetro.
Mucosas rosadas e ligeiramente secas, com TRC inferior a 2 segundos.
Grau de desidratação de 6%.
Os restantes parâmetros do exame geral encontravam-se normais.
Apresentava sinais de náusea.

Lista de problemas:
Prostração, vómitos, perda de peso, náusea, anorexia.

Diagnósticos diferenciais:
Doença gastrointestinal (ex. gastroenterite por indiscrição alimentar, doença inflamatória
intestinal, linfoma/carcinoma, linfangiectasia, ingestão de corpo estranho, etc),
hepatopatia (ex. hepatite, colangite, neoplasia), hipoadenocorticismo, doença renal
crónica, diabetes cetoacidótica.

Exames Complementares:
Bioquímica sérica e ionograma: azotemia, hiperfosfatemia
Hemograma: sem alterações;
Ecografia abdominal: Rim direito com diminuição de diferenciação corticomedular e
mineralização do sistema colector; rim esquerdo com diminuição de dimensão e
diferenciação corticomedular e mineralização do sistema colector
Densidade urinária:1.013 (antes de fluídos);
Tira urinária:+1 proteína, resto normal;
Sedimento urinário: presença de raras células escamosas e de transição
Cultura urinária: negativa;
Rácio Proteína:Creatinina Urinária (RPCU): 1.3;
Pressão arterial sistólica (PAS): 170 mmHg.

Diagnóstico:
Doença renal crónica (DRC).

Tratamento:
A Bia permaneceu hospitalizada por 4 dias, para estabilização dos valores de ureia e
creatinina.
Foi colocado um cateter intravenoso na veia cefálica esquerda e foi iniciada fluidoterapia
com Lactato de Ringer a 7.84 ml/h, omeprazol (1mg/kg IV BID) e maropitant (0.1mg/kg IV
SID).
A PAS foi avaliada nos dois primeiros dias de internamento, obtendo-se uma média de 4
medições de 170mmHg, indicando que a Bia estava hipertensa e foi iniciado benazepril
2.5mg (0.4 mg/kg PO SID).
No segundo dia de internamento, chegou o resultado do rácio UPC, que confirmou a
proteinúria.
Como a Bia não estava a comer foi iniciada alimentação forçada com Royal Canin Renal
Canine.
Uma vez que apresentava hiperfosfatemia foi introduzido Pronefra® 0.32 ml duas vezes ao
dia, com comida.
Porém, ficava nauseada após as tomas, pelo que foi substituído por hidróxido de alumínio,
Pepsamar® (39mg/kg TID PO) com as refeições.
No terceiro dia de internamento, o valor de creatinina diminui (2.78mg/dl) e foi iniciado
um desmame de fluídos.
No 4ºdia de internamento teve alta condicionada por ainda não se encontrar a comer,
tendo sido prescrito famotidina 10mg (1.6 mg/kg PO BID), benazepril 2.5mg (0.4 mg/kg PO
SID) e Pepsamar® duas vezes ao dia e foi recomendado a continuação da alimentação com
uma dieta renal.

Acompanhamento:
Passada 1 semana, a Bia veio à consulta de controlo e estava com apetite normal e
creatinina a 2,84 mg/dl.
Foi indicado parar a famotidina.
Passado 15 dias, regressou e foi realizado controlo de peso (1,670 Kg), medição do fósforo
(3.3 mg/dl) e da creatinina (2,71 mg/dl) bem como análise do sedimento urinário e
determinação do rácio UPC

Você também pode gostar