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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2013.0000059123

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº


0214956-23.2012.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é agravante V. A.
CONSULTORIA EM GESTÃO EMPRESARIAL E PARTICIPAÇÕES LTDA, é
agravado BANCO BMC S/A.

ACORDAM, em 21ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de


São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de
conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores MAIA DA


ROCHA (Presidente sem voto), ITAMAR GAINO E VIRGILIO DE OLIVEIRA
JUNIOR.

São Paulo, 4 de fevereiro de 2013.

Mauro Conti Machado


RELATOR
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

VOTO Nº: 20.002


AGRV. Nº: 0214956-23.2012.8.26.0000
COMARCA: São Paulo
JUIZ 1ª INST.: Rogério Marrone de Castro Sampaio
AGTE. : V.A. Consultoria em Gestão Empresarial e Participações Ltda
AGDO. : Banco BMC S/A
INTDOs.: Ponto Sul Veículos e Peças Ltda e Outros

AGRAVO DE INSTRUMENTO Execução Título


Extrajudicial Desconsideração da personalidade jurídica
inversa Possibilidade Existência de elementos concretos
que demonstram a prática de atos capazes de ensejar a
adoção da medida Execução que perdura mais de dez
anos, com diversas diligências em busca de bens do
devedor Executado que figura como administrador da
empresa agravante Indícios de utilização do nome da
pessoa jurídica para esconder e acobertar a existência de
bens pessoais de seu sócio Decisão mantida Recurso
improvido.

Cuida-se de agravo de instrumento respondido por meio do


qual quer ver a agravante reformada a r. decisão de primeiro grau que deferiu o
pedido de desconsideração da personalidade jurídica inversa da empresa, em
virtude de confusão patrimonial.

Em preliminar, a agravante alega cerceamento de defesa, ao


argumento de que foi incluída no polo passivo da demanda sem que lhe fosse
oportunizado o exercício do contraditório e da ampla defesa. No mérito, sustenta,
em apertada síntese, não ser caso de desconsideração da personalidade jurídica, eis
que não houve abuso ou confusão patrimonial.

O recurso processou sem concessão do efeito ativo (fls. 1078).


Agravo de Instrumento nº 0214956-23.2012.8.26.0000 - São Paulo - Voto nº 20.002 – Flavia 2
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É o relatório.

A preliminar de cerceamento de defesa fica afastada, já que,


após ter sido formalizado o bloqueio, a agravante ingressou em Juízo, dando-se por
intimada e apresentando defesa.

Ademais, não há configuração de violação ao contraditório e à


ampla defesa pela ausência de intimação da desconstituição da personalidade
jurídica e o bloqueio pelo sistema Bacen-Jud, quando o objetivo da medida é
assegurar direito que está sendo violado.

No mérito, o recurso não prospera.

Trata-se de execução de título extrajudicial promovida em face


de Ponto Sul Veículos e Peças e outros (fls. 27/30), que se processa há mais de
treze anos. Após tentativas frustradas de localização de bens dos executados, a
agravada requereu a desconstituição inversa da personalidade jurídica de diversas
empresas, inclusive a da empresa ora agravante (fls. 554/559).

Com base nos fundamentos invocados pela agravada e a prova


documental produzida, foi proferida decisão pelo juiz singular, acolhendo o pedido
de desconsideração inversa da personalidade jurídica das empresas indicadas.

Acertada se mostra a decisão.

O artigo 50 do atual Código Civil assim dispõe: “Em caso de


abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela
confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do

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Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas
e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos
administradores ou sócios da pessoa jurídica”.

Por outro lado, a desconsideração inversa da personalidade


jurídica é medida excepcional e tem sido admitida nas hipóteses em que a pessoa
física, com o escopo de não responder por suas obrigações ou de prejudicar direitos,
transfere seu patrimônio para a pessoa jurídica.

Para desconsiderar a personalidade jurídica é necessária a


existência, no mínimo, de indícios veementes de fraude, má-fé ou simulações, com
uso da sociedade de forma ilícita, em favor dos sócios e em prejuízo dos credores, o
que precisa estar claro nos autos.

No caso em exame, há sólidos elementos de convicção que


apontam para esse desvio e intenção de ocultar bens. Ao decidir, o douto
Magistrado assim dispôs: “como demonstram os documentos acostados pelo
exequente, o co-executado Flavio Modica Tosello vem se valendo de pessoas
jurídicas para ocultar seu patrimônio e, com isso, furtar-se à responsabilidade
patrimonial que tem neste processo. Mantém relações com Empreendimentos
Imobiliários SPE Ltda., figurando como administrador na condição de procurador
da empresa V.A. Consultoria e Gestão Empresarial e Participações (fls. 401/402).
Em relação a esta última pessoa, embora não componha seu quadro societário,
integrado por seus filhos, intitula-se, ostensivamente, ser seu sócio gerente (fls.
408). Nesse estágio, o quadro retratado indica nítida confusão patrimonial gerada
entre a pessoa jurídica natural do executado e as pessoas jurídicas ora declinadas
(...)” (fls. 578/579).

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Com efeito, restou cabalmente demonstrado que a empresa


Ponto Sul encontra-se insolvente e que nenhum bem foi encontrado em nome de
seus sócios. Por outro lado, há elementos que demonstram que Flávio Modica
Tosello, sócio da empresa executada, integra quadro societário de outra empresa
(FFG Empreendimentos Imobiliário SPE Ltda.).

Convém pontuar que: a) a agravante (V.A. Consultoria)


também consta como sócia da empresa FFG, juntamente com o executado Flávio
Flávio Modica Tosello; b) além de figurar como sócio da empresa FFG, Flávio se
apresenta como administrador e procurador da agravante; c) apesar de exercer tal
encargo, todas as diligências perpetradas em busca de ativos financeiros em nome
do executado Flávio restaram negativas, o que causa grande estranheza, pois não é
crível que não haja qualquer repasse financeiro em seu favor; d) tanto o executado
Flávio quanto a empresa agravante têm como seus o mesmo endereço, qual seja:
Rua Professor Filadelfo de Azevedo, 344, Vila Nova Conceição, São Paulo; e) a
sociedade agravante é constituída pelos filhos do executado Flávio, que também
indicam como seu o mesmo endereço mencionado.

Tudo isso comprova a confusão patrimonial existente entre


essa suposta 'nova firma' com a atual devedora, pois: 1) coexistem no mesmo
endereço; 2) os sócios são pertencentes à mesma família dos sócios da devedora; e
3) o próprio executado Flávio Modica Tosello, embora não figure como sócio
direto, se apresenta como seu administrador, conforme noticiado e comprovado às
fls. 568.

Convém acrescentar que é do conhecimento dos executados a


existência de obrigação de sua responsabilidade, contudo, não formularam qualquer
manifestação para ver solucionada a questão.

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Percebe-se, assim, diante das informações e documentos


juntados aos autos, a existência de indícios suficientes de abuso por parte da
empresa, bem como de seus sócios, a demonstrar a necessidade de desconsideração
da personalidade jurídica.

Nesse sentido, cita-se, dentre outras, jurisprudência deste


Egrégio Tribunal de Justiça.

“Desconsideração inversa da personalidade jurídica -


Legitimidade passiva. Pretensão de reforma da decisão que,
em execução de título extrajudicial, reconheceu a legitimidade
passiva da empresa agravante, por força de desconsideração
inversa da personalidade jurídica. Descabimento. Hipótese em
que há sólidos elementos de convicção, inclusive anterior
relatório do Conselho Gestor de Ações Conjuntas de Combate
à Evasão Fiscal, que apontam para o acerto da decisão ora
agravada, no sentido de que a pessoa jurídica recorrente teria
sido utilizada como instrumento para a prática de fraude ou
abuso de direito pelo executado. Decisão de primeiro grau que
deve ser integralmente mantida. Precedentes desta Colenda 13ª
Câmara Recurso desprovido.” (A.I. nº 0120005-37.2012, 13ª
Câmara de Direito Privado, Rel. Desembargadora Ana de
Lourdes Coutinho Silva, j. 29.08.2012).

“Prestação de serviços. Execução. Encerramento das


atividades da executada. Pendência de dívidas. Inexistência de
bens passíveis de penhora. Desconsideração da personalidade
jurídica. Admissibilidade. Constatado o encerramento das

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atividades da empresa devedora, sem que existissem bens para


garantir a execução referente ao crédito cobrado, é possível a
desconsideração da pessoa jurídica, possibilitando o alcance
dos bens pessoais dos sócios. Recurso provido. (A.I. nº
1187364009, 34ª Câmara de Direito Privado, Rel.
Desembargador Emanuel Oliveira, j. 02/07/2008).

Por fim, cabe observar que a agravante refuta apenas


genericamente as declarações da parte contrária, não sendo os argumentos por ela
utilizados suficientes para afastar a desconsideração.

Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso.

MAURO CONTI MACHADO


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