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Cuidados Gerais ao doente Neurocrítico

Instrutora: Marta Carvalho


martenf711@gmail.com

Barcarena, março de 2022


Cérebro Humano
O fluxo sanguíneo cerebral nos humanos é de cerca de
50ml/100g/min

O cérebro é metabolicamente muito ativo: consome cerca


de 3,5 a 4 ml/100g/min de O2

Consumo cerebral Glicose: 5 mg/100 g tecido cerebral/minuto

A atividade elétrica consome cerca de 50% do total da energia


• 2% peso corporal total produzida pelos neurónios

• 15% débito cardíaco A restante energia é utilizada para manter a homeostasia celular
basal
• 20% utilização corporal total O2
Homeostasia cerebral
TAM – FSC mantém-se constante para 50>TAM<150 mmHg – autorregulação
PaO2 – apenas aumenta o FSC para valores de hipóxia < 50 mmHg
PaCO2 – vasorreatividade – provoca grandes variações no FSC
Lesão Cerebral
• Lesão primária
Definida como morte ou disfunção dos neurónios centrais, secundária ao impacto traumático inicial
Ocorre no momento do trauma inicial
Nada pode ser feito para mitigar a lesão primária, que, por definição, já ocorreu

• Lesão Secundária
Desenvolve-se após o trauma inicial
Causada por insultos inflamatórios, isquémicos e/ou citotóxicos que podem ser secundários ou
modulados por processos intracranianos e sistémicos
Lesão Cerebral
• Lesão Secundária – lesão neuronal progressiva

Principais fatores fisiológicos envolvidos na lesão cerebral secundária:


• Hipotensão
• Hipóxia
• Hipertensão intracraniana
• Pressão inadequada de perfusão cerebral

ISQUEMIA CEREBRAL
Lesão Cerebral

PIC
PPC

Isquemia Cerebral ou Hérnia Cerebral

Lesão secundária
Zona de Penumbra
• Corresponde à área com condições hemodinâmicas instáveis que circundam a região lesada

Esta porção de tecido cerebral está em risco de destruição completa e deve ser tratada durante o
período crítico
Lesões Neurológicas
• Traumatismo cranioencefálico
• Hemorragia subaracnóideia
• Hemorragia cerebral
• Enfarte cerebral
• Infeções do SNC
• Mal epilético
• Traumatismo vertebromedular
• Tumores cerebrais
• Morte cerebral
Fluxo Sanguíneo Cerebral
O fluxo sanguíneo cerebral (FSC) é definido como o volume de sangue que circula através da
circulação cerebral num período de tempo

Sofre influência de vários fatores:

• PaCO2
• PaO2
• PIC
• Taxa de metabolismo cerebral de O2
• Taxa de metabolismo cerebral de glicose
• Capacidade de autorregulação cerebral
• Temperatura cerebral e taxa de consumo de O2
Fluxo Sanguíneo Cerebral
Pressão de Perfusão Cerebral (PPC) é um substituto do FSC

PPC = Pressão Arterial Média (PAM) – Pressão Intracraniana (PIC)


Pressão Intracraniana
• A PIC é fator chave que influencia a PPC

Determinada pela interação dinâmica entre sangue, líquido cefalorraquidiano (LCR) e parênquima
cerebral

Variações num dos componentes fixos do cérebro ou introdução de um quarto elemento (massa, p.e)
provocam uma diminuição correspondente compensatória no volume dos outros componentes para
manter a mesma pressão
Compliance Cerebral
• A PIC é fator chave que influencia a PPC

O sistema tem alguma capacidade para compensar


novas lesões de massa intracraniana, diminuindo o
volume de sangue venoso e/ou o volume do LCR

• Uma vez superadas as medidas compensatórias,


há um aumento inevitável da PIC
Compliance Cerebral
Autorregulação Cerebral

O FSC é mantido num nível relativamente constante, mesmo em variações normais na


PAM, pelo mecanismo de autorregulação cerebral

• Mecanismo vascular fisiológico de vasoconstrição e vasodilatação:

PPC Vasodilatação cerebral

PPC Vasoconstrição cerebral

Ajustes regulados pela demanda metabólica, pela inervação simpática e


parassimpática e pela concentração de algumas substâncias tais como PaO2 e PaCO2
Autorregulação Cerebral após lesão
Cuidados Gerais ao Doente
Neurológico
História clínica
• Hora do início dos sintomas ou da lesão traumática
• Tipo de sintomas e sua caracterização
• Circunstâncias do acidente no caso de traumatismo
• Estado neurológico do doente
• Sinais vitais
• Antecedentes pessoais e farmacológicos
• Suspeita de efeitos tóxicos de fármacos, álcool ou drogas
• Estimativa da perda sanguínea
• Tipo de tratamento efetuado (local e durante o transporte)
Cuidados Gerais ao Doente Neurológico
Avaliação Neurológica
• Consciência
• Pupilas
• Movimentos oculares espontâneos
• Reflexos dos Pares Cranianos
• Exame motor
• Padrão respiratório
Cuidados Gerais ao Doente Neurológico
Avaliação da Consciência

Doente consciente

• Nível de consciência

• Pupilas - tamanho, simetria e reatividade à luz

• Avaliação motora – força, simetria, movimentos anormais


Cuidados Gerais ao Doente Neurológico
Avaliação da Consciência

Doente inconsciente

• Nível de consciência

• Pupilas - tamanho, simetria e reatividade à luz

• Avaliação motora – movimentos apresentados, simetria, movimentos anormais após estímulo


doloroso

• Padrão respiratório

• Sinais vitais
Cuidados gerais ao doente Neurológico
Estado de Consciência e Sedação

• Escala de Coma de Glasgow


• Richmond Agitation-Sedation Scale - RASS
Varia entre valores de -5 a +4 (valor mais baixo corresponde ausência de resposta a
qualquer tipo de estímulos; valor mais elevado corresponde a doente combativo e violento;
valor neutro corresponde a doente acordado e calmo)

Avaliar dor
Avaliar necessidade de curarização
Avaliar presença de shivering
Cuidados gerais ao doente Neurológico
Ventilação

• Boa adaptação ventilatória e ausência de esforço


respiratório
• Bólus de O2 antes e após aspiração ET
• Aspiração de secreções (SOS)
• Risco de aspiração

PaO2 >/= 60 mmHg


PaCO2 35 - 40 mmHg (Prevenir vasodilatação cerebral)
PaCO2 30 - 35 mmHg (Promover vasoconstrição cerebral ligeira que resulta em redução da PIC)
PEEP fisiológica
FiO2 </= 60 mmHg
Cuidados gerais ao doente Neurológico
Cardiovascular

• Controlo rigoroso da TA
• Administração de vasopressores vs antihipertensores
• Administração de fluídos - cristalóides

Evitar hipotensão arterial pela relação com a PPC e consequentemente o FSC


Evitar hipertensão arterial pelo risco de complicações associadas
Cuidados gerais ao doente Neurológico
Temperatura e infeção

• Febre (Temp. corporal central > 38,3°)


• Risco de infeção aumentado (PAV, CVC, CA…)
• Causa do aumento da temperatura (central?; infeção?)

Mantas de arrefecimento
Colchões de arrefecimento
Soros frios
Arrefecimento natural
Cuidados gerais ao doente Neurológico
Distúrbios Hematológicos

• Avaliar presença de anemia


• Identificar distúrbios na coagulação

Gasimetria vs hemograma
Hemoglobina > 8 g/dl
Lactatos
Cuidados gerais ao doente Neurológico
Renal

• Lesão renal aguda (LRA) é comum em UCI, geralmente secundária a choque, nefrotoxinas
(por exemplo, agentes de contraste ou outros medicamentos) ou sépsis

Hipovolémia
Diuréticos
Diálise
Cuidados gerais ao doente Neurológico
• Electrólitos

• Manuseamento semelhante a doente geral – exceção Sódio


A hiponatremia pode ser causada pela secreção inadequada de hormona antidiurética (SIHAD)
ou síndrome perdedor de sal

• Intimamente relacionado com desenvolvimento de edema cerebral

Restrição de água
Administração de solução salina hipertónica
Cuidados gerais ao doente Neurológico
• Electrólitos

• Em doente neurológicos a hipernatrémia pode ocorrer secundária à condição do paciente


(por exemplo, diabetes insípida) ou tratamento com solução salina hipertónica, utilizada
para o tratamento da hipertensão intracraniana.

Não administrar soluções hipotónicas pelo risco de aumentar o edema cerebral


Administração de água por via entérica/oral
Avaliar necessidade de administração de desmopressina (DDAVP)
Cuidados gerais ao doente Neurológico
• Endócrino

• Manter glicemia capilar entre 70 a 180 mg/dl.


• Tratar insuficiência adrenal

Correção urgente da hipoglicemia


Valores perto de 70 mg/dl prejudiciais para doente neurológico??
Cuidados gerais ao doente Neurológico
• Prevenção TVP/TEP

• Maior risco de eventos de TVP/TEP devido à imobilidade, condições de saúde que causam
hipercoagulabilidade e lesão vascular pelo uso de cateteres centrais.

Uso de dispositivos mecânicos (compressão pneumática intermitente)


Uso de heparina de baixo peso VS heparina subcutânea
Cuidados gerais ao doente Neurológico
• Nutrição

• Aumento do catabolismo com aumento das necessidades metabólicas


• Iniciar nutrição entérica dentro de 24 a 48 horas após a admissão
• Suporte nutricional completo em 72 horas

SNG vs Disfagia
Resíduos gástricos
Risco de intolerância alimentar vs uso de procinéticos
Sonda Pós-pilórica??
Eliminação intestinal
Cuidados gerais ao doente Neurológico
• Profilaxia Úlcera Gástrica

• Risco de desenvolver ulcerações por stresse


• Risco de hemorragia clinicamente significativa

Alimentação gástrica vs protetor gástrico


Cuidados gerais ao doente Neurológico
• Outros Cuidados

• Elevação da cabeceira da cama entre 30 a 45 graus


• Manter posição neutra da cabeça (maximiza fluxo sanguíneo venoso)
• Evitar flexão do quadril
• Adaptação do colar cervical (retorno venoso cerebral)
• Necessidade de terapia hiperosmolar (Manitol 20% vs NaCl 20 %)
Cuidados gerais ao doente Neurológico
• Outros cuidados

• Tratamentos de segunda linha


• Bloqueio neuromuscular
• Hipotermia ligeira
• Coma induzido por barbitúricos
• Hiperventilação
• Craniectomia descompressiva
Conclusão
• Controlo apertado de alterações a vários níveis de intervenção

• Identificação precoce de alterações/riscos

• Prevenção de lesão secundária

• Grande área de intervenção dos profissionais de saúde


Obrigada pela atenção

Questões?
Bibliografia

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