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TERAPIA NUTRICIONAL NA

DOENÇA RENAL CRÔNICA


M. V. Ana Paula Judice Maria
Mestre em Nutrição de cães e gatos
O que é a Doeça Renal Crônica?
• O termo Doença Renal Crônica (DRC) é utilizado para definir a
presença de lesão renal persistente, caracterizada pela perda
definitiva e irreversível de massa funcional e/ou estrutural de um
ou de ambos os rins, podendo-se observar redução significativa
da taxa de filtração glomerular
(Polzin, 2011; DiBartola e Westropp, 2014).
DRC
•Causas
•Congênitas – Nefropatia familiar
•Adquiridas – Doenças imunológicas, neoplasias, causas inflamatórias
entre outras
•Prevalência
•Frequentemente diagnosticada em cães e gatos, com prevalência de
0,5 a 7% e 1,6 a 20%, respectivamente
• Cães: 65% - idade superior a 7 anos (Polzin, 2000)
•Gatos: 63% - Idade superior a 10 anos (Lulich, 1992)
•Acima de 15 anos: 1 em cada 3 gatos apresentam DRC (Adams, 1995)
Tubulo distal
Tubulo proximal Controle da concentração:
Fisiologia Controle da reabsorção:
• 70% do volume filtrado
• Sódio e Potássio (mediados pela
Aldosterona)
Renal • Aminoacidos, glicose, HCO3 e
proteínas filtradas
• Cálcio (mediado pela PTH)
• Íons de Higrogênio (mediado
• Fosfatos (mediado pelo PTH) pela Aldosterona)

Cápsula de Bowman Túbulo coletor


O ADH permite controlar:
• Permeabilidade a água
• Unidade funcional: nefron
Alça de Henle • Permeabilidade a urea
Responsável por: • Agua é reabsorvida através
• Gerar um gradiente medular do gradiente hiperosmótico
hipertônico (NaCl) + ureia
• Permitir concentrar a urina
DRC
azotemia + uremia

 capacidade de concentrar a urina

 densidade urinária

desequilíbrio hidroeletrolítico

alteração nas concentrações de Ca/P/Na/K
DRC
 Densidade Urinária (cães1,025, gatos 1,035)

Poliúria
K
 Na
Vômito
diarréia
Azotemia
•Azotemia é o aumento da concentração sérica de creatinina
e de outras substâncias nitrogenadas não-protéicas
•Uréia (15 a 75mg/dL)
•Sintetizada no fígado a partir da amônia
•Aumenta com a ingestão de dietas ricas em proteínas
•Aumenta em estados catabólicos
•Creatinina (0,5 a 1,4mg/dL)
•Formada através do metabolismo muscular
•Produção constante e proporcional a massa muscular
•Excretada exclusivamente pelos rins
Hiperfosfatemia
•Aumento da concentração sérica de fósforo
•Na DRC:

Taxa de filtração Fósforo no


v PTH
v
glomerular Organismo

• Hiperparatireoidismo secundário
Cálciov e • Desmineralização dos ossos (especial em filhotes)
Vitamina D • Calcinose de órgãos
• PTH  toxina urêmica
Acidose metabólica
• Menor habilidade dos rins excretarem H+ e ressintetizarem
bicarbonato, devido a diminuição da função renal

Excreção renal Excreção de íons H+


TFG Sulfato Ressintetize de
Fosfato bicarbonato
Anemia
•Fatores que acarretam na Anemia
•Hiporexia/ anorexia nutricional
•Rim  principal sítio de produção de Epo, principal
estímulo da eritropoese
•Meia vida de hemacias menor em DRC
•Perdas gastrointestinais  Hemorragia gastrointestinal
•Toxinas urêmicas  Aumento de PTH suprime a
eritropoese
Manifestações clínicas
• Anamnese
Anorexia, perda de peso, perda de massa muscular, fraqueza, letargia,
halitose, náuseas, vómitos, diarreia, melena, poliúria e polidipsia
• Exame físico
Palidez das mucosas, desidratação, hipotermia, estomatite, úlceras na
boca, pelame seco e opaco, rins pequenos e irregulares à palpação
abdominal
Alguns pacientes apresentavam polidipsia e poliúria como único
sinal clínico
Estadiamento – IRIS 2015
• International Renal Interest Society (IRIS, 2015) a doença renal
crônica em cães e gatos pode ser dividida em quatro estágios

• I - classificado como paciente não azotêmico podendo


apresentar alguma anormalidade renal, tais como inadequada
concentração urinária, palpação renal ou imagens renais
anormais, proteinúria de origem renal, anormalidades em
biópsias renais (creatinina sérica inferior a 1,4mg/dL para cães
e inferior a 1,6mg/dL para gatos)
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Estadiamento – IRIS 2015
•II - pacientes com ligeira azotemia e sinais clínicos moderados
ou ausentes (creatinina sérica entre 1,4 a 2,0mg/dL para cães
e entres 1,6 a 2,8mg/dL para gatos)

•III - moderada azotemia e sinais extra renais podem estar


presentes (creatinina sérica entre 2,1 a 5,0mg/dL para cães e
entre 2,9 a 5,0mg/dL para gatos)

•IV -risco aumentado de sinais clinicos sistêmicos e crise


urêmica (creatinina superior a 5,0mg/dL para cães e gatos).
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Sub estadiamento - Proteinúria

Valor UP/C
Sub estágio
Cão Gato
<0,2 <0,2 Não proteinúria
0,2 a 0,5 0,2 a 0,4 Limite proteinúria
>0,5 >0,4 Proteinúria

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Sub estadiamento – Pressão Sanguínea
Arterial
Pressão Sanguinea Pressão Sanguinea Risco futuro de
Sistólica mmHg Sub estágio danos ao órgão alvo
<150 Normotenso Minimo
150 a 159 Limite Hipertenso Baixo
160 a 179 Hipertenso Moderado
≥180 Severamente Ato
Hipertenso

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Tratamento de suporte na DRC
1 - Fluidoterapia
2 - Correção da Oligúria
3 - Correção do Balanço do Potássio
4 - Tratamento da Acidose Metabólica
5 - Correção da Hipertensão
6 - Tratamento das Complicações Gastrintestinais
7 - Prevenção de Infecções
8 - Tratamento da Anemia e/ou Hemorragia
9 - Tratamento da Hiperfosfatemia
10 - Manejo da Anorexia
11 – Terapia Nutricional
Terapia Nutricional - Objetivos
•Garantir adequada ingestão energética, protéica e dos demais
nutrientes
•Nos estágios I e II - o objetivo do tratamento nutricional é aliviar
os fatores que contribuem para a progressão do dano renal e da
perda de néfrons funcionais
•Nos estágios III e IV – o objetivo do tratamento nutricional é
melhorar a qualidade de vida do paciente, aliviar os sinais
clínicos e da intoxicação urêmica.
Dietas Renais
“Dietas comerciais para doença renal (baixo fósforo) são
a única abordagem terapêutica comprovada por estudos
científicos controlados que prolonga a expectativa e
melhora a qualidade de vida de cães e gatos”

(Polzin et al 2009; Roudebush et al 2009; Jacob et al 2002, 2004; Ross et al


2006)
Água
• Rim - redução da capacidade de concentrar a urina

• Polidpsia é compensatória devido a perda excessiva de liquido


associada a poliúria por osmose

• Indesejável
• Desidratação, diminuição volume, hipoperfusão renal e
ingestão de sal  estimulam concentração urinária
• Se ocorre concentração urinária  Aumenta a carga para o rim
doente  Agravamento da função renal
Água - Manejo
•Reduzir a ingestão de solutos a serem concentrados (Proteína e
Sal) ou Amentar a ingestão de água  Redução do trabalho
osmótico

•Métodos aumentar a ingestão de água e manter o equilíbrio de


fluidos.
•Uso de dietas que contêm 70-85% de umidade (lata, sachê)
•Adição de água à dieta
•Fácil acesso a água limpa e fresca
Fluidoterapia
•Alguns pacientes não conseguem consumir água suficiente para
prevenir a depleção de volume

•Fluidos de manutenção podem ser administrados por via


subcutânea diariamente pelo cuidador do animal
•Solução Fisiológica ou Ringer Lactato

•Crise Uremica  Via parenteral


Energia
•Energia suficiente deve ser fornecida para
•Impedir o catabolismo da proteína endógena evitando a
exacerbação de azotemia
•Prevenir a desnutrição

•Necessidades energéticas ideais não são conhecidas

•O cálculo da Necessidade Energética de Manutenção (NEM)


• 95 x (peso corporal)0,75 kcal por dia (cães)
• 100 x (peso corporal) 0,67 kcal por dia (gatos)
Energia
•Gorduras e carboidratos devem ser usados para atender as
necessidades energéticas
•São fontes de energia não proteica
•Gordura fornece 2x mais energia por grama comparada ao
carboidrato
•Vantagens:
• Redução do catabolismo tecidual
•Manutenção do peso e condição corporal
•Redução do acúmulo de resíduos nitrogenados
Proteína
• A proteinúria pode estar presente em qualquer estágio da DRC

• Dieta com restrição de proteína e redução controlada de


aminoácidos não essenciais diminui o acúmulo de resíduos
nitrogenados e a ingestão de fósforo (mas sem deficiência
protéica ou de aa essenciais)

• A restrição de proteína tem demonstrado diminuir a taxa de


progressão da doença renal em ratos e pessoas através da
redução do fluxo sanguíneo renal, taxa de filtração glomerular e
proteinúria  NÃO COMPROVADO EM CÃES E GATOS
Proteína
•É menos certo se a restrição de proteína altera progressão da
insuficiência renal em cães ou gatos (Adams, Polzin, Osborne et
al. 1993; Finco, Brown, Brown et al. 1999; Finco, Brown, Brown et
al. 1998; Finco Brown, Crowell et al. 1994; Finco, Brown, Crowell
et al. 1992a, 1992b; Finco, Crowell et al. 1985; Polzin, Leininger et
al. 1988; Robertson et al. 1986)

•A restrição de proteína não aliviou a hipertensão glomerular,


hipertrofia, hiperfiltração, ou a progressão da insuficiência renal
induzida em cães (Brown, Finco, Crowell et al 1990;. Brown,
Crowell, Barsanti et al., 1991)
Redução protéica
• IRIS recomenda - dieta restrita em fase III / IV da doença (IRIS
2015)  Objetivo diminuir a azotemia

• Melhora a azotemia,pois minimiza a retenção de resíduos


nitrogenados  Diminui os sinais clínicos da uremia

• Inibe secreção de TGF-b (citocina envolvida na progressão DRC)

• Potencialmente reduz hiperfiltração glomerular (+Na), reduz


amoniagênese renal e a excreção renal de ácidos
Proteína
• Abordagem nutricional da proteinúria
• Restringir proteína, suplementar n3 e Inibidor da ECA
• Acompanhar albumina, peso corporal, escore corporal – Precisam
ficar estáveis
• Ajustar a proteína para as necessidades do paciente

• Diminuição da proteína  Diminui severidade da anemia


• Resíduos de produtos nitrogenados tem sido incriminados pela
hemólise, encurtamento da sobrevivência das células vermelhas do
sangue e da perda sanguínea por ulcerações gastrintestinais e pela
função plaquetária prejudicada
Proteína
Risco da redução de proteína na dieta
• Pode gerar baixa palatabilidade da dieta
• Menor ingestão da dieta
• Catabolismo proteínas teciduais e má-nutrição (caso haja
ingestão insuficiente de aa essenciais)

Monitorar albumina plasmática, peso corporal e escore


corporal do paciente
Proteína
Recomendações
• Azotemia leve (creatinina entre 1,4 a 2,0 mg por dL)  2,5 – 4,0
g por Kg PC (15 a 25% PB ) ao dia
• Azotemia moderada (Creatinina entre 2,1 a 5,0 mg por dL) 
2,0 – 3,0 g por Kg PC (10 a 15% PB ) ao dia
• Azotemia severa (Creatinina acima de 5,0 mg por dL)  1,25 –
1,75 g por Kg PC (8 a 10% PB ) ao dia

Os teores ideais de proteína não estão bem estabelecidos em


estudos clínicos
Recomendações de proteína
GATOS - AZOTEMIA
3,8-4,4g por Kg de PC ao dia – 24-32%

•Deve ser instituída no início da DRC


• potencial efeito na limitação da progressão da lesão
• sinais clínicos da uremia nos gatos são menos pronunciados
• maior resistência do gato em mudar a alimentação
Restrição de fósforo
•Objetivo do manejo dietético
• Normalizar a concentração de fósforo sérico
• Minimizar a retenção de fósforo e a hiperfosfatemia
• Minimizar o hiperparatireoidismo secundário renal pela
limitação do consumo e absorção intestinal de fósforo
•A restrição de fósforo previne o desenvolvimento do
hiperparatireoidismo secundário renal e protege a
função renal
Restrição de fósforo

Estudo em cães
Ruterford et al, 1977
Restrição de fósforo

Estudo em cães
Brown et al, 1991
Restrição de fósforo
•Recomendação mínima do NRC (2006)
•Cães – 0,3% da matéria seca
•Gatos – 0,26% da matéria seca

•Teores fosfato recomendáveis na dieta


•Cães com DRC variam de 0,2 a 0,5% na MS
•Gatos com DRC e 0,3 a 0,6% na MS
•Dieta renal comercial (baixo fósforo)
Restrição de fósforo
•Após 2 ou 4 semanas da implementação da dieta restrita em
fósforo, reavaliar a concentração sérica de fosfato
•Após a estabilização da concentração sérica de fosfato, reavaliar
a cada 12 semanas

•IRIS – Concentração sérica de fosfato


• Concentração de fosfato deve ser mantido a 2,7-4,6 mg/dl para a
fase II
• Concentração de fosfato deve ser mantido <5 mg/dl para a fase III
• Concentração de fosfato deve ser mantido e <6 mg/dl para a
doença em estágio IV.
Restrição de fósforo
• Fases finais da doença renal crônica (estágios III e IV) -
introdução de agentes quelantes de fósforo alimentar
• carbonato de alumínio, hidróxido de alumínio ou óxido de alumínio
• carbonato de cálcio, acetato de cálcio ou carbonato de lantânio

•Dose inicial: 30-90mg/kg/dia - ajustada de acordo com a


concentração sérica de fosfato – hidróxido de alumínio
Sódio
• “IRIS 2015 - Não há nenhuma evidência de que a redução de Na
dietético vai reduzir a pressão sanguínea”

•Não há estudos publicados que demonstraram que a restrição de


sódio diminui a hipertensão ou a favorecem a não progressão da
doença em cães e gatos.
Sódio
• DRC => excreção fracionada Na aumenta para manter volume
extracelular

Retenção de liquido,
Edema e hipertensão
Intervalo tolerado
Estreitamento ingestão Na sem
Na dos limites DRC

Desidratação, retração
fluido extracelular
hipoperfusão
Sódio
•Recomendação mínima do NRC (2006)
•Cães – 0,08% a 1,5 da matéria seca
•Gatos – 0,096% a da matéria seca

•Doses recomendadas (empírico)


•Cães – <0,3%
•Gatos – <0,4%
Potássio
•Hipocalemia (<3,1mEq/L)
•O mecanismo de ação não é claro e inclui a ingestão inadequada
de potássio, dietas acidificantes ou aumento das perdas urinárias.
•Pode ocorrer
•Em qualquer fase da doença
Syme (2003)
•Ocorre em cerca de 20% dos gatos com DCR
•Ocorre em cerca de 14% dos cães com DRC
Segev et al. (2010)
Potássio
•Hipocalemia pode causar
•Fraqueza muscular generalizada
•Dor apresentando ventro flexão cervical e postura rígida
•Hipocalemia
•Prejudica a síntese de proteínas
•Promove a perda de peso
•Contribui para a poliúria, diminuindo a capacidade de
resposta renal ao ADH
Potássio
•Suplementação de Potássio é indica quando a concentração
sérica deste eletrólito é <4mEq/L
•Fontes de Potássio que não acidificam a dieta
•Gluconato de potássio
•Citrato de potássio
•Os teores dietéticos de potássio recomendados para
pacientes com DRC variam de 0,4 a 0,8% na ms para cães e
de 0,7 a 1,2% na ms para gatos
Antioxidantes
•Um importante fator que contribui para progressão da doença
são as espécies reativas de oxigênio (EROs)
•EROs presentes em excesso no organismo causam lesões a
lipídios, proteínas, carboidratos e DNA celular, gerando
alterações estruturais e funcionais, com consequente apoptose e
necrose
•Pacientes com DRC apresentam relativa deficiência de
antioxidantes, o que resulta em maior risco de lesões e perda
tecidual.
Antioxidantes
• A dieta para cães com DCR deve conter teores ≥ 400UI de
vitamina E/kg ms
• A dieta para gatos cm DRC deve conter teores ≥ 500UI de
vitamina E/kg ms

Teores superiores são favoráveis


Ácidos graxos polinsaturados - ômega 3
• A suplementação dos ácidos graxos ômega-3 (ácido eicosapentaenóico
[EPA] e ácido docosahexaenóico [DHA]) podem apresentar papel
interessante sobre a fisiologia renal, pois competem com o ácido
araquidônico e assim alteram a produção de eicosanóides renais (Bauer
et al. 1999).
• O EPA e o DHA aumentam a produção dos eicosanoides de série 3, que
induzem menor vasoconstrição e agregação plaquetária e dessa forma
produzem benefícios clínicos
• Um estudo em cães com DRC avaliou os efeitos da suplementação dos AG
ômega-3 e encontrou redução da proteinúria, prevenção da hipertensão
glomerular e redução na produção de eicosanóides pró-inflamatório
Ácidos graxos polinsaturados - ômega 3
• Não se sabe a proporção correta entre ômega-6: ômega-3 para a
dieta de pacientes com DRC (Brown, Brown, Crowell et al. 1998).
• Alguns autores encontraram bons resultados ao suplementar a
dieta de cães com 0,41% na ms de ômega-3 na proporção 5:1 de
ômega-6: ômega-3.
• Na prática recomenda-se a suplementação de 1000mg de óleo
de peixe para 4-5Kg de peso corporal, a partir do estagio III,
administrado com a dieta.
Fatores nutricionais principais
Fatores nutricionais principais

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