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INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO TUNDAVALA

DISCIPLINA DE PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO III

Tema 1 - O que é Desenvolvimento Humano?


A noção de desenvolvimento está atrelada a um contínuo de evolução, em que
nós caminharíamos ao longo de todo o ciclo vital. Essa evolução, nem sempre
linear, se dá em diversos campos da existência, tais como afectivo, cognitivo,
social e motor.

Este caminhar contínuo não é determinado apenas por processos de


maturação biológicos ou genéticos. O meio (e por meio entenda-se algo muito
amplo, que envolve cultura, sociedade, práticas e interacções) é factor de
máxima importância no desenvolvimento humano.

Os seres humanos nascem “mergulhados em cultura”, e é claro que esta será


uma das principais influências no desenvolvimento. Embora ainda haja
discordâncias teóricas entre as abordagens que serão apresentadas adiante
sobre o grau de influência da maturação biológica e da aprendizagem com o
meio no desenvolvimento, o contexto cultural é o palco das principais
transformações e evoluções do bebé humano ao idoso. Pela interacção social,
aprendemos e nos desenvolvemos, criamos novas formas de agir no mundo,
ampliando nossas ferramentas de actuação neste contexto cultural complexo
que nos recebeu, durante todo o ciclo vital.

1.1. Perspectivas de Estudo do Desenvolvimento humano (Ribeiro,


2005):
As teorias geralmente abrangem amplas perspectivas que enfatizam diferentes
tipos de processos de desenvolvimento e assumem diferentes posições sobre
as questões descritas no segmento anterior. Essas perspectivas influenciam as
perguntas feitas pelos pesquisadores, os métodos que eles usam e o modo de
interpretar os dados. Para avaliar e interpretar a pesquisa, é importante
reconhecer a perspectiva teórica em que ela se baseia.

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Cinco grandes perspectivas sustentam boa parte das teorias influentes e da
pesquisa sobre desenvolvimento humano:
a. Psicanalítica: que se concentra nas emoções e nos impulsos
inconscientes;
b. Aprendizagem: que estuda o comportamento observável;
c. Cognitiva: que analisa os processos do pensamento;
d. Contextual: que enfatiza o impacto do contexto histórico, social e
cultural;
e. Evolucionista/sociobiológica: que considera as bases evolucionistas e
biológicas do comportamento.

Apresentamos uma visão geral das posições básicas, métodos e ênfase causal
de cada uma dessas perspectivas e alguns dos seus principais teóricos.

Ø Tema 2 - Perspectiva 1: Psicanalítica


Sigmund Freud (1856 – 1939), médico vienense, foi o criador da perspectiva
psicanalítica, segundo a qual o desenvolvimento é moldado por forças
inconscientes que motivam o comportamento humano. A psicanálise, o método
terapêutico desenvolvido por Freud, procura favorecer nos pacientes a
compreensão sobre seus conflitos emocionais inconscientes, fazendo-lhes
perguntas destinadas a evocar lembranças há muito esquecidas. Segue um
resumo da teoria de Freud do desenvolvimento psicossexual.

Desenvolvimento psicossexual: Freud acreditava que as pessoas nascem


com impulsos biológicos que devem ser redireccionados para tornar possível a
vida em sociedade. Ele dividiu a personalidade em três componentes
hipotéticos: id, ego e superego. Os recém-nascidos são governados pelo id,
que opera sob o princípio do prazer – o impulso que busca satisfação imediata
de suas necessidades e desejos. Quando a gratificação é adiada, como
acontece quando os bebés precisam esperar para serem alimentados, eles
começam a ver a si próprios como separados do mundo externo. O ego, que
representa a razão, desenvolve-se gradualmente durante o primeiro ano de
vida e opera sob o princípio da realidade. O objectivo do ego é encontrar
maneiras realistas de gratificar o id que sejam aceitáveis para o superego, o

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qual se desenvolve por volta dos 5 ou 6 anos. O superego inclui a consciência
e incorpora ao sistema de valores da criança “deveres” e “proibições”
socialmente aprovados. O superego é altamente exigente; se os seus padrões
não forem satisfeitos, a criança pode sentir-se culpada e ansiosa. O ego
intermédia os impulsos do id e as demandas do superego.

Para Freud, a personalidade forma-se através dos conflitos inconscientes da


infância entre os impulsos inatos do id e as exigências da sociedade. Esses
conflitos ocorrem em uma sequência invariável de cinco fases de
desenvolvimento psicossexual baseadas na maturação em que o prazer se
desloca de uma zona corporal para outra – da boca para o ânus e depois para
os genitais. Em cada fase, o comportamento, que é a principal fonte de
gratificação (ou frustração), muda – da alimentação para a eliminação e
posteriormente para a actividade sexual.

A teoria de Freud trouxe contribuições históricas e inspirou toda uma geração


de seguidores, alguns dos quais levaram a teoria psicanalítica para novas
direcções. Algumas das ideias de Freud, como a noção de crise de Édipo, hoje
são consideradas obsoletas. Outras, como os conceitos de id e superego, não
podem ser cientificamente testados. Embora Freud tivesse aberto nossos olhos
para a importância dos primeiros impulsos sexuais e agressivos em detrimento
de outras motivações. No entanto, vários dos seus temas centrais “resistiram
ao teste do tempo” (Westen, 1998, p. 334):
• Freud nos fez perceber a importância dos pensamentos, sentimentos e
motivações inconscientes;
• O papel das experiências infantis na formação da personalidade;
• A ambivalência das respostas emocionais, especialmente as respostas
aos pais;
• O papel das representações mentais do eu e dos outros no
estabelecimento das relações íntimas;
• O curso do desenvolvimento normal partindo de um estado imaturo e
dependente para um estado maduro e independente. Freud deixou uma
marca indelével na psicanálise e na psicologia do desenvolvimento.

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Ø Tema 3 - Erik Erikson: desenvolvimento psicossocial
Erik Erikson (1902 – 1994), psicanalista alemão que originalmente fez parte do
círculo de Freud em Viena, modificou e ampliou a teoria freudiana, enfatizando
a influência da sociedade no desenvolvimento da personalidade. Erikson foi
também um pioneiro ao assumir a perspectiva do ciclo de vida. Enquanto Freud
sustentava que as primeiras experiências na infância moldavam
permanentemente a personalidade, Erikson afirmava que o desenvolvimento
do ego se estende por toda a vida.

A teoria do desenvolvimento psicossocial de Erikson abrange oito estádios


ao longo do ciclo de vida. Cada estádio envolve aquilo que Erikson chamou de
crise na personalidade – um grande tema psicossocial, particularmente
importante naquele momento e que até certo ponto continuará sendo um tema
pelo resto da vida. Esses problemas, que emergem segundo um cronograma
maturacional, devem ser satisfatoriamente resolvidos para o desenvolvimento
de um ego saudável.

Cada estádio requer o equilíbrio entre uma tendência positiva e uma tendência
negativa correspondente. A qualidade positiva deve ser dominante, mas
também é necessário um pouco da qualidade negativa para um
desenvolvimento ideal. O tema crítico da primeira infância, por exemplo, é
confiança básica versos desconfiança. É preciso confiar no mundo e nas
pessoas. No entanto, também é preciso um pouco de desconfiança para se
proteger do perigo. O êxito em cada estádio é o desenvolvimento de uma
determinada virtude, ou força – nesse caso, a virtude da esperança. Uma
solução bem-sucedida para uma crise deixa o indivíduo em boa posição para
lidar com a próxima.

A teoria de Erikson é importante devido a sua ênfase nas influências sociais e


culturais e no desenvolvimento para além da adolescência. Talvez ele seja
mais conhecido pelo seu conceito de crise da identidade, que tem produzido
muita pesquisa e debates públicos.

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Ø Tema 4 - Perspectiva 2: Aprendizagem
A perspectiva da aprendizagem sustenta que o desenvolvimento resulta da
aprendizagem, uma mudança duradoura no comportamento baseada na
experiência ou adaptação ao ambiente. Os teóricos da aprendizagem procuram
descobrir leis objectivas que governam as mudanças no comportamento
observável e vêem o desenvolvimento como algo contínuo.

Os teóricos da aprendizagem ajudaram a tornar o estudo do desenvolvimento


humano mais científico. Seus termos são definidos com precisão e seu foco em
comportamentos observáveis significa que as teorias podem ser testadas em
laboratório. Duas importantes teorias da aprendizagem são o behaviorismo e a
teoria da aprendizagem social.

Behaviorismo
O behaviorismo é uma teoria mecanicista que descreve o comportamento
observado como uma resposta previsível à experiência. Embora a biologia
estabeleça limites para o que as pessoas podem fazer, os behavioristas
consideram a influência do ambiente muito maior. Eles sustentam que os seres
humanos, em todas as idades, aprendem sobre o mundo do mesmo modo que
os outros organismos: reagindo a condições ou aspectos do ambiente que
consideram agradáveis, dolorosos ou ameaçadores. A pesquisa behaviorista
concentra-se na aprendizagem associativa, quando um vínculo mental é
formado entre dois eventos. Os dois tipos de aprendizagem associativa são o
condicionamento clássico e o condicionamento operante.

• Condicionamento clássico: o fisiologista russo Ivan Pavlov (1849 –


1936) elaborou experimentos em que cães aprendiam a salivar ao som
de um sino que tocava na hora da comida. Esses experimentos
formaram a base do condicionamento clássico, segundo o qual uma
resposta (neste caso, a salivação) a um estímulo (o sino) é evocada
após repetidas associações a um estímulo que normalmente a alicia
resposta (comida).

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O behaviorista norte-americano John Watson (1878 – 1958) aplicou
essas teorias de estímulo – resposta a crianças, alegando que poderia
moldar qualquer bebé do jeito que quisesse. Seus escritos influenciaram
toda uma geração de pais a aplicar os princípios da teoria da
aprendizagem à criação dos filhos. Em uma das primeiras e mais
conhecidas demonstrações de condicionamento clássico em seres
humanos (Watson e Rayner, 1920), Watson ensinou um bebé de 11
meses, conhecido como “Pequeno Albert”, a ter medo de objectos
brancos peludos.

Nessa experiência, Albert foi exposto a um barulho intenso quando


começou a golpear o rato. Assustado com o barulho, ele começou a
chorar. Depois de várias ocorrências do rato com o barulho, Albert
choramingava de medo quando via o rato. Albert também começou a
apresentar respostas de medo a coelhos e gatos brancos, e à barba de
homens mais velhos. Embora o estudo tivesse falhas metodológicas e
nos dias de hoje seria considerado altamente antiético, sugeriu que o
bebé podia ser condicionado a ter medo de algo que antes ele não
temera.

O condicionamento clássico ocorre durante a vida toda. As preferências


e aversões a determinados alimentos podem ser resultado da
aprendizagem condicionada. Respostas de medo a objectos como
carros ou cães podem ter origem num acidente ou numa má
experiência.

• Condicionamento operante: Angel repousa em seu berço. Quando ele


começa a balbuciar (“ma-ma-ma”), a mãe sorri e repete as sílabas.
Angel aprende que seu comportamento (balbucio) pode produzir uma
consequência desejável (a atenção carinhosa de um dos pais); e assim
ele continua balbuciando para atrair a atenção da mãe. Um
comportamento originalmente acidental (balbucio) tornou-se uma
resposta condicionada.

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Este tipo de aprendizagem chama-se condicionamento operante
porque o indivíduo aprende com as consequências da sua “operação”
sobre o ambiente. Diferentemente do condicionamento clássico, o
condicionamento operante envolve o comportamento voluntário, como o
balbucio de Angel, e envolve as consequências e não os preditores do
comportamento.

O psicólogo norte-americano Skinner (1904 – 1990), que formulou os


princípios do condicionamento operante, trabalhou principalmente com
ratos e pombos, mas sustentava que esses princípios aplicavam-se
também aos seres humanos (Skinner, 1938). Ele descobriu que um
organismo tenderá a repetir uma resposta que foi reforçada por
consequências desejáveis e suprimirá uma resposta que foi punida.
Assim, reforço é o processo pelo qual um comportamento é fortalecido,
aumentando a probabilidade de que seja repetido. No caso de Angel, a
atenção da mãe reforça o balbucio. Punição é o processo pelo qual um
comportamento é enfraquecido, diminuindo a probabilidade de repetição.

Teoria da aprendizagem social (social cognitiva)


O psicólogo norte-americano Albert Bandura (1925) desenvolveu boa parte dos
princípios dessa teoria. Enquanto os behavioristas vêem a acção do ambiente
sobre a pessoa como o principal impulso para o desenvolvimento, Bandura
(1977, 1989) sugere que o ímpeto para o desenvolvimento é bidireccional. Ele
chamou esse conceito de determinismo recíproco – a pessoa age sobre o
mundo na medida em que o mundo age sobre a pessoa.

A teoria da aprendizagem social clássica sustenta que a pessoa aprende o


comportamento social apropriado principalmente observando outras pessoas,
como os pais, os professores ou os heróis dos desportos. Esse processo é
chamado de aprendizagem observacional ou modelação. As pessoas
tendem a escolher modelos que tenham prestígio, controlem recursos ou que
sejam recompensados pelo que fazem – em outras palavras, aqueles cujo
comportamento é percebido como valorizado na cultura. A imitação de modelos
é o elemento mais importante para a criança aprender uma língua, lidar com a

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agressão, desenvolver um senso moral e aprender os comportamentos
apropriados de género. A aprendizagem por observação pode ocorrer mesmo
se uma pessoa não imitar o comportamento observado.

A versão mais actualizada da teoria da aprendizagem social de Bandura (1989)


é a teoria social cognitiva. A mudança no nome reflecte uma ênfase maior
nos processos cognitivos como essenciais para o desenvolvimento. Os
processos cognitivos operam à medida que as pessoas observam modelos,
aprendem “fragmentos” de comportamento e, mentalmente, juntam esses
fragmentos em novos e complexos padrões de comportamento.

Ø Tema 5 - Perspectiva 3: cognitiva

A perspectiva cognitiva concentra-se nos processos de pensamento e no


comportamento que reflecte esses processos. Essa perspectiva abrange tanto
teorias mecanicistas quanto teorias organicistas. Inclui a teoria dos estádios
cognitivos de Piaget e a teoria sociocultural do desenvolvimento cognitivo de
Vygotsky. Também inclui a abordagem do processamento de informação e as
teorias neopiagetianas, que combinam elementos da teoria do processamento
de informação com a teoria piagetiana.

A teoria dos estádios cognitivos de Jean Piaget


Nossa compreensão de como as crianças pensam se deve muito ao trabalho
do teórico suíço Jean Piaget (1896 – 1980). Com sua ênfase nos processos
mentais, a teoria dos estádios cognitivos foi a precursora da actual
“revolução cognitiva”. Piaget, que era biólogo e filósofo por formação, tinha
uma visão organicista do desenvolvimento como o produto dos esforços da
criança para entender e agir em seu mundo.

O método clínico de Piaget combinava observação com indagação flexível. Ao


perguntar põe que as crianças respondiam as perguntas da maneira como o
faziam, ele percebeu que crianças da mesma idade cometiam tipos
semelhantes de erro em lógica. Assim, por exemplo, ele descobriu que uma
criança típica de 4 anos acreditava que moedas ou flores eram mais

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numerosas quando dispostas em filas do que quando empilhadas. A partir de
suas observações acerca de seus próprios filhos e de outras crianças, ele criou
uma abrangente teoria de desenvolvimento cognitivo.

Piaget propôs que o desenvolvimento cognitivo começa com uma capacidade


inata de se adaptar ao ambiente. Ao procurar o seio da mãe, pegar uma pedra
ou explorar as fronteiras de um quarto, a criança pequena desenvolve um
quadro mais preciso de seus arredores e maior competência para lidar com
eles. Esse crescimento cognitivo ocorre através de três processos inter-
relacionados: organização. Adaptação e equilibração.

• Organização: é a tendência a criar categorias, tais como pássaros,


observando as características que membros individuais de uma
categoria, como pardais e cardeais, têm em comum. Segundo Piaget, as
pessoas criam estruturas cognitivas cada vez mais complexas
chamadas esquemas, que são modos de organizar informações sobre o
mundo, que controlam a maneira como a criança pensa e se comporta
numa determinada situação. Na medida em que a criança adquire mais
informações, seus esquemas tornam-se cada vez mais complexos. Por
exemplo, o acto de sugar. O recém-nascido tem um esquema simples
para sugar, mas logo desenvolve esquemas diversos de como sugar o
peito, o biberão ou o dedo.

• Adaptação: é o termo de Piaget para o modo como a criança lida com


as novas informações à luz do que ela já sabe. A adaptação ocorre por
intermédio de dois processos complementares: assimilação, que é
absorver informação nova e incorporá-la às estruturas cognitivas
existentes, e acomodação, que é ajustar as próprias estruturas
cognitivas para encaixar a informação nova. Exemplo: o bebé que mama
no peito ou no biberão e que começa a sugar o canudinho de uma
caneca para crianças está demonstrando assimilação – usando um
velho esquema para lidar com uma situação nova: a caneca.

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• Equilibração: um esforço constante para atingir um equilíbrio estável –
estabelece a passagem da assimilação para a acomodação. Quando a
criança não consegue lidar com novas experiências dentro das
estruturas cognitivas existentes, ela experimenta um estado motivacional
desconfortável conhecido como desiquilíbrio. Assim, assimilação e
acomodação operam juntas para produzir equilíbrio. Durante toda a vida,
a busca pelo equilíbrio é a força motivadora por trás do conhecimento
cognitivo.
As observações de Piaget produziram muita informação e alguns insights
surpreendentes. Piaget mostrou-nos que a mente da criança não é uma
miniatura da mente adulta. Saber como a criança pensa facilita aos pais e
professores entendê-la e ensiná-la. A teoria de Piaget forneceu referências
aproximados sobre o que esperar da criança em várias idades e ajudou os
educadores a elaborar currículos apropriados aos diversos níveis de
desenvolvimento.

Piaget, porém, parece ter subestimado seriamente as capacidades dos bebés e


das crianças pequenas. Alguns psicólogos contemporâneos questionam seus
estádios, apresentando evidências de que o desenvolvimento cognitivo é mais
gradual e contínuo (Courage e Howe, 2002). Além disso, pesquisas
transculturais indicam que o desempenho em tarefas de raciocínio formal é
tanto uma função da cultura quanto do desenvolvimento; pessoas de
sociedades industrializadas que participaram de um sistema de educação
formal demonstram um desempenho melhor nessas tarefas (Buck-Morss,
1975). Por último, a pesquisa com adultos indica que o foco de Piaget na lógica
formal como o ápice do desenvolvimento cognitivo é por demais estreito. Não
explica a emergência de habilidades maduras como a resolução de problemas
práticos, a sabedoria e a capacidade de lidar com situações ambíguas.

Teoria sociocultural de Lev Vygotsky


Vygotsky nasceu em 1896 na Bielo-Rússia, que depois (em 1917) ficou
incorporada à União Soviética, e mais recentemente voltou a ser Bielo-Rússia.

x
Nasceu no mesmo ano que Piaget (coincidência?!), mas viveu muitíssimo
menos que este último, pois morreu de tuberculose em 1934, antes de
completar 38 anos.

Foi o primeiro psicólogo moderno a sugerir os mecanismos pelos quais a


cultura torna-se parte da natureza de cada pessoa ao insistir que as funções
psicológicas são um produto de actividade cerebral. Conseguiu explicar a
transformação dos processos psicológicos elementares em processos
complexos dentro da história.

Vygotsky enfatizava o processo histórico-social e o papel da linguagem no


desenvolvimento do indivíduo. Sua questão central é a aquisição de
conhecimentos pela interacção do sujeito com o meio. Para o teórico, o sujeito
é interactivo, pois adquire conhecimentos a partir de relações intra e
interpessoais e de troca com o meio, a partir de um processo denominado
mediação.

As principais obras de Vygotsky traduzidas para o português são "A formação


social da mente", "Psicologia e pedagogia" e "Linguagem, desenvolvimento e
aprendizagem", “A Construção do Pensamento e Linguagem” (obra completa),
“Teoria e Método em Psicologia”, “Psicologia Pedagógica”. Vygotsky morreu
em 1934, e sua obra permaneceu desconhecida no Ocidente até os anos 60,
principalmente por razões políticas. Teve dois artigos publicados em periódicos
americanos nos anos 30, e apenas em 1962 saiu nos Estados Unidos o livro
Pensamento e Linguagem, edição a partir da qual foram feitas outras –
inclusive a brasileira, mas que na verdade é uma compilação que corresponde
a apenas um terço da obra.

Vygotsky trouxe uma nova perspectiva de olhar às crianças. Ao lado de


colaboradores como Lúria, Leontiev e Sakarov, entre outros, apresenta-nos
conceitos, alguns já abordados por Jean Piaget, um dos primeiros a considerar
a criança como ela própria, com seus processos e nuances, e não um adulto
em miniatura.

xi
O teórico pretendia uma abordagem que buscasse a síntese do homem como
ser biológico, histórico e social. Ele sempre considerou o homem inserido na
sociedade e, sendo assim, sua abordagem sempre foi orientada para os
processos de desenvolvimento do ser humano com ênfase da dimensão sócio
histórica e na interacção do homem com o outro no espaço social. Sua
abordagem sócio-interacionista buscava caracterizar os aspectos tipicamente
humanos do comportamento e elaborar hipóteses de como as características
humanas se formam ao longo da história do indivíduo (Vygotsky, 1996).

Vygotsky et. al. (1988) acredita que as características individuais e até mesmo
suas atitudes individuais estão impregnadas de trocas com o colectivo, ou seja,
mesmo o que tomamos por mais individual de um ser humano foi construído a
partir de sua relação com o indivíduo.

Suas maiores contribuições estão nas reflexões sobre o desenvolvimento


infantil e sua relação com a aprendizagem em meio social, e também o
desenvolvimento do pensamento e da linguagem.

• Desenvolvimento e Aprendizagem: a Zona de Desenvolvimento


Próximo: Para J. Piaget, dentro da reflexão construtivista sobre
desenvolvimento e aprendizagem, tais conceitos se inter-relacionam,
sendo a aprendizagem a alavanca do desenvolvimento. A perspectiva
piagetiana é considerada maturacionista, no sentido de que ela preza o
desenvolvimento das funções biológicas – que é o desenvolvimento -
como base para os avanços na aprendizagem. Já na chamada
perspectiva sócio-interacionista, sócio-cultural ou sócio-histórica,
abordada por L. Vygotsky, a relação entre o desenvolvimento e a
aprendizagem está atrelada ao fato de o ser humano viver em meio
social, sendo este a alavanca para estes dois processos. Isso quer dizer
que os processos caminham juntos, ainda que não em paralelo.
Entenderemos melhor essa relação ao discutir a Zona de
Desenvolvimento próximo.

xii
Os conceitos sócio-interacionistas sobre desenvolvimento e aprendizagem se
fazem sempre presentes, impelindo-nos à reflexão sobre tais processos. Como
lidar com o desenvolvimento natural da criança e estimulá-lo através da
aprendizagem? Como esta pode ser efectuada de modo a contribuir para o
desenvolvimento global da criança?

Em Vygotsky, ao contrário de Piaget, o desenvolvimento – principalmente o


psicológico/mental (que é promovido pela convivência social, pelo processo de
socialização, além das maturações orgânicas) – depende da aprendizagem na
medida em que se dá por processos de internalização de conceitos, que são
promovidos pela aprendizagem social, principalmente aquela planejada no
meio escolar1. Ou seja, para Vygotsky, não é suficiente ter todo o aparato
biológico da para realizar uma tarefa se o indivíduo não participa de ambientes
e práticas específicas que propiciem esta aprendizagem. Não podemos pensar
que a criança vai se desenvolver com o tempo, pois esta não tem, por si só,
instrumentos para percorrer sozinho o caminho do desenvolvimento, que
dependerá das suas aprendizagens mediante as experiências a que foi
exposta.

Neste modelo, o sujeito – no caso, a criança – é reconhecida como ser


pensante, capaz de vincular sua acção à representação de mundo que constitui
sua cultura, sendo a escola um espaço e um tempo onde este processo é
vivenciado, onde o processo de ensino-aprendizagem envolve directamente a
interacção entre sujeitos.

Essa interacção e sua relação com a imbricação entre os processos de ensino


e aprendizagem podem ser melhor compreendidos quando nos remetemos ao
conceito de ZDP. Para Vygotsky (1996), Zona de Desenvolvimento Próximo
(ZDP), é a distância entre o nível de desenvolvimento real, ou seja,
determinado pela capacidade de resolver problemas independentemente, e o
nível de desenvolvimento próximo, demarcado pela capacidade de solucionar
problemas com ajuda de um parceiro mais experiente. São as aprendizagens
que ocorrem na ZDP que fazem com que a criança se desenvolva ainda mais,
ou seja, desenvolvimento com aprendizagem na ZDP leva a mais

xiii
desenvolvimento, por isso dizemos que, para Vygotsky, tais processos são
indissociáveis.

É justamente nesta zona de desenvolvimento próximol que a aprendizagem vai


ocorrer. A função de um educador escolar, por exemplo, seria, então, a de
favorecer esta aprendizagem, servindo de mediador entre a criança e o mundo.
Como foi destacado anteriormente, é no âmago das interacções no interior do
colectivo, das relações com o outro, que a criança terá condições de construir
suas próprias estruturas psicológicas (Creche Fiocruz). Vejamos que esta
diferença de concepções entre Piaget e Vygotsky se dá, em grande parte, pelo
fato de que, para Piaget, desenvolvimento ´maturação’, e para Vygotsky, o
termo também compreende o desenvolvimento psicológico.

É assim que as crianças, possuindo habilidades parciais, as desenvolvem com


a ajuda de parceiros mais habilitados (mediadores) até que tais habilidades
passem de parciais a totais. Temos que trabalhar, portanto, com a estimativa
das potencialidades da criança, potencialidades estas que, para tornarem-se
desenvolvimento efectivo, exigem que o processo de aprendizagem, os
mediadores e as ferramentas estejam distribuídos em um ambiente adequado
(Vasconcellos e Valsiner, 1995).

Temos portanto uma interacção entre desenvolvimento e aprendizagem, que


se dá da seguinte maneira: em um contexto cultural, com aparato biológico
básico interagir, o indivíduo se desenvolve movido por mecanismos de
aprendizagem provocados por mediadores. Para Vygotsky, o processo de
aprendizagem deve ser olhado por uma óptica prospectiva, ou seja, não se
deve focalizar o que a criança aprendeu, mas sim o que ela está aprendendo.
Em nossas práticas pedagógicas, sempre procuramos prever em que tal ou
qual aprendizado poderá ser útil àquela criança, não somente no momento em
que é ministrado, mas para além dele. É um processo de transformação
constante na trajectória das crianças. As implicações desta relação entre
ensino e aprendizagem para o ensino escolar estão no facto de que este
ensino deve se concentrar no que a criança está aprendendo, e não no que já

xiv
aprendeu. Vygotksy firma está hipótese no seu conceito de zona de
desenvolvimento próximo (ZDP) (Creche Fiocruz, 2004).

Tema 6 - Reuven Feuerstein: “Experiência de aprendizagem mediada”

Reuven Feuerstein nasceu na Romênia, em 1921, e reside em Israel desde


1944. Em 1965, tornou-se director do “Hadassah-Wizo-Canada Research
Institute”. Hoje é director do actual “International Center for the Enhancement of
Learning Potencial”, fundado em 1993. É professor, desde 1970, na Escola de
Educação da Universidade Bar llan, em Ramas Gan, em Israel, e na Escola de
Educação da Universidade Vanderbilt, em Nashville, nos Estados Unidos.

Em 1970, Feuerstein concluiu sua tese de doutorado na Sorbonne/Paris, na


área de Psicologia, com o título: Les differences de foncionnement cognitif dans
lês grupes sócio-ethniques differents. Leur nature, leur etiologie er les
pronostics de modifiabilité (Diferenças do funcionamento cognitivo em
diferentes grupos sociais e étnicos. Sua natureza, sua etiologia e prognósticos
de modificabilidade).

Reuven Feuerstein baseia-se no facto de não se poder nunca prever limites


para o desenvolvimento psicológico, nem simplesmente classificar pessoas
sem conhecimento prévio da propensão de aprendizagem das mesmas. O
autor, metodologicamente, caminha numa direcção oposta às teorias que, ao
abordarem a relação desenvolvimento/ aprendizagem, localizam a origem dos
problemas ora nos indivíduos, ora nas condições de estímulo oferecidas aos
indivíduos pelo meio em que vivem.

Para Feuerstein, a Experiência de Aprendizagem Mediada (EAM) é importante


porque acontece, justamente, em interacções sociais nas quais as pessoas
produzem processos de aprendizagem que lhes possibilitam apropriar-se de
conhecimentos e reelaborá-los, chegando a elevados patamares de
entendimento. Simples exposição a estímulos ou experiências físicas e
cognitivas com os objectos não proporcionaria aos sujeitos o mesmo nível de
conhecimento. (...) uma interacção qualitativa entre o organismo e seu meio

xv
ambiente. Esta qualidade é assegurada pela interposição intencional de um ser
humano que medeia os estímulos capazes de afectar o organismo. Este modo
de interacção é paralelo e qualitativamente diferente das modalidades de
interacção generalizadas e difusas entre o mundo e o organismo, conhecido
como contacto directo com o estímulo (Feuerstein, 1994, p. 7).

Este autor argumenta que a modificabilidade do sujeito é, necessariamente, a


modificação da relação do sujeito consigo próprio no - e com o - seu entorno.
Feuerstein (1980, p.9) propõe que “há uma relação dinâmica constante do
sujeito com o ambiente, estando ambos em movimento e interagindo com a
realidade sociocultural”. Feuerstein (1997) rompe paradigmas inatistas no
campo do estudo cognitivo, contestando, por exemplo, a crença de que a idade
e as anomalias cromossomicas sejam determinantes irreversíveis que
impedem, no ser humano, o desenvolvimento pleno dos processos mentais
complexos.

De acordo com Feuerstein, para se produzir uma aprendizagem significativa


torna-se imprescindível a dupla ‘mediador-mediado’ que, ao desenvolver os
critérios de mediação, possibilita a interacção e a modificabilidade, já que é
somente por meio da interacção do sujeito com outros sujeitos capazes de
mediar informações necessárias, estando estes sujeitos integrados a um meio
ambiente favorável e estimulante, que o desenvolvimento cognitivo acontece.
Desta forma, a interacção é influenciada por determinadas características do
organismo (incluindo aquelas de hereditariedade, maturação e similares) e
qualidades do meio ambiente (oportunidades de educação, status
socioeconómico, experiência cultural, contactos afectivos e emocionais com
outros significantes). Estes factores, podem, em situações adversas, provocar
o que Feuerstein (1997) denomina de “Síndrome de Privação Cultural”,
entendida, aqui, como característica de um sujeito que não foi, de forma plena,
integrado à cultura de seu meio.

A privação humana pode ocorrer de muitos modos, uns mais remediáveis do


que outros. Na abordagem do desenvolvimento humano, a questão da privação
cultural pode manifestar-se desde o analfabetismo e falta de cuidados com a

xvi
saúde até ao desemprego e à indigência. As dimensões culturais do
desenvolvimento humano exigem cuidadosa atenção por três razões.

• Categorias de Mediação de acordo com Feuerstein

Feuerstein (1994) afirma que duas são as formas de aprendizagem humana.

Uma delas é a experiência directa de aprendizagem – que é a interacção do


organismo com o meio ambiente; a outra é a Experiência de Aprendizagem
Mediada – que requer a presença e a actividade de um ser humano para
organizar, seleccionar, interpretar e elaborar aquilo que foi experimentado.
Esse autor sustenta que os fatos ambientais e aqueles relacionados ao
organismo é determinante distal do desenvolvimento cognitivo causando
respostas diferenciadas em relação ao meio ambiente, enquanto a EAM
constitui o determinante próximo que influencia o desenvolvimento cognitivo
estrutural e o potencial da adaptabilidade e da modificabilidade.

Para que a EAM aconteça, um mediador deve colocar-se, intencionalmente,


entre o estímulo e o sujeito. Para Feuerstein (1994), isto é mediação no sentido
de que a situação (estímulos e respostas) é modificada pela intensidade da
qualidade, pelo contexto, pela frequência e pela ordem e, ao mesmo tempo,
desperta, no indivíduo, a vigilância, a consciência e a sensibilidade.

A aprendizagem mediada é o caminho pelo qual os estímulos são


transformados pelo mediador, guiado por suas intuições, emoções e sua
cultura. O mediador avalia as estratégias, selecciona as que são mais
apropriadas a determinada situação, amplia algumas, ignora outras, faz
esquemas. É por meio desse processo de mediação que a estrutura cognitiva
da criança adquire padrões de comportamento que determinarão sua
capacidade de ser modificada.

É importante que todos os sujeitos que queiram se envolver em um processo


de Experiência de Aprendizagem Mediada que implique transmissão e
elaboração cultural (pais, educadores, directores de Recursos Humanos e
xvii
outros) sejam conhecedores dos princípios básicos que Feuerstein, em seu
livro “Don´taccept me as I am”, (1988) aponta:

1) O ser humano é modificável – a modificabilidade é própria da espécie


humana.

2) O sujeito que eu vou mediar é modificável – para que a intervenção


seja eficaz torna-se necessário que se projecte um processo com
intencionalidade e motivação positiva. Por mais dificuldades que o
sujeito apresente, a mediação com significado e intencionalidade
proporcionar-lhe-á condições favoráveis ao estabelecimento de relações
e transcendência com o contexto de seu quotidiano.

3) Eu, enquanto mediador, sou capaz de produzir modificações no


sujeito – o mediador deve sentir-se confiante e consciente ao mesmo
tempo que desenvolve mediação de competências e habilidades para
provocar modificabilidade cognitiva no sujeito mediado.

4) Enquanto pessoa (mediador) também devo modificar-me – todo


processo de desenvolvimento exige do mediador um investimento
pessoal em suas habilidades e performance, atributos que perpassam e
alcançam uma auto modificação permanente.

5) A sociedade e a opinião pública são modificáveis e devem ser


modificadas – as práticas educativas de quem medeia produzem
impacto social, e quando o mediador atribui significado e
intencionalidade, interagindo com seu mediado, exerce influência no
processo de desenvolvimento histórico-cultural dos sujeitos que, por sua
vez, repercutirão nos seus espaços de relações sociais. Embora
sabendo-se que a modificação de atitudes, de práticas e normas sociais
seja sempre um processo longo e demorado é sempre possível ocorrer
modificabilidade quando há persistência nas acções promotoras de
mudanças.

xviii
Estes cincos princípios, quando interiorizados e contextualizados no processo
da Experiência de Aprendizagem Mediada, provocam um envolvimento denso
e profundo no mediador e no seu trabalho com sujeitos histórico-culturais
modificáveis. Assim, descortinam-se aspectos de modificabilidade no
movimento histórico dos sujeitos – mediador e mediado. Ambos passam a
acreditar na proposta, inserindo-se no contexto sociocultural de seu tempo
mas, entendendo que, para isso, necessitam modificar-se constantemente.

A Experiência de Aprendizagem Mediada pode ter inúmeras explicações e


aplicações, desde a educação até a formação profissional ao longo da vida.
Certamente, mediar informações é possibilitar interacções de forma a conduzir
o sujeito a pensar, a ser inteligente; é ensinar que inteligência não é, apenas,
um dom inato, mas sim o produto de um novo olhar sobre o ser humano. Só
nesta perspectiva poder-se-á alterar o rumo da sociedade, das relações
educacionais e de produção. Motivar os sujeitos a produzirem experiências de
mediação na perspectiva de mudanças nos contextos socioculturais materializa
uma possibilidade optimista e de prosperidade individual e colectiva.

Tema 7 - Abordagem do processamento de informação


Essa abordagem procura explicar o desenvolvimento cognitivo analisando o
processo envolvido na compreensão da informação recebida e no desempenho
eficaz de tarefas: processos como a atenção, memória, estratégias de
planeamento, tomadas de decisão e estabelecimento de metas. A abordagem
do processamento de informação não é uma teoria única, mas um
enquadramento teórico que sustenta um amplo espectro de teorias e de
pesquisas.

Alguns teóricos do processamento de informação comparam o cérebro de um


computador: existem dados de entrada (as impressões sensoriais) e os dados
de saída (o comportamento). Os teóricos do processamento de informação
estão interessados no que acontece no meio. Como o cérebro utiliza
sensações e percepções, digamos, de uma palavra não familiar, para
reconhecer essa palavra numa segunda vez? Porquê os mesmos dados de
entrada às vezes resultam em diferentes dados de saída? Boa parte dos

xix
pesquisadores do processamento de informação utiliza dados observáveis para
inferir o que acontece entre um estímulo e uma resposta. Por exemplo, eles
poderão pedir a uma pessoa que recorde uma lista de palavras e depois
observar diferenças no desempenho se a pessoa repetir a lista várias vezes
antes de lhe pedirem para recordar as palavras ou se for impedida de fazê-lo.
Por meio desses estudos, alguns pesquisadores desenvolveram modelos de
computador ou mapas de fluxo que analisam cada etapa em que a pessoa
colecta, armazena, recupera e utiliza a informação.

Assim como Piaget, os teóricos do processamento de informação vêem as


pessoas como indivíduos que pensam activamente sobre seu mundo.
Diferentemente de Piaget, eles geralmente não falam em termos de estádios
de desenvolvimento. Em vez disso, vêem o desenvolvimento como algo
contínuo e cumulativo. Observam aumentos relacionados à idade, velocidade,
complexidade e eficiência do processamento mental, e quantidade e variedade
do material que pode ser armazenado na memória. A pesquisa com
neuroimagem sustenta aspectos importantes dos modelos de processamento
de informação, tais como a existência de estruturas físicas separadas para
processar memória consciente e inconsciente (Schacter, 1999; Yingling, 2001).

A abordagem do processamento de informação tem aplicações práticas. Ao


avaliar certos aspectos do processamento de informação de uma criança
pequena, os pesquisadores são capazes de fazer uma estimativa da
inteligência futura de um bebé. Isso possibilita aos pais e professores ajudar a
criança a aprender, tornando-a mais consciente de seus processos mentais e
de estratégias para incrementá-los. Psicólogos geralmente fazem uso dos
modelos de processamento para testar, diagnosticar e tratar problemas de
aprendizagem.

Tema 8 - Teorias neopiagetianas


Em resposta às críticas à teoria de Piaget, alguns psicólogos do
desenvolvimento procuraram integrar elementos de sua teoria com a
abordagem do processamento de informação. Em vez de descrever um único
sistema geral de operações mentais cada vez mais lógicas, esses

xx
neopiagetianos concentram-se em conceitos, estratégias e habilidades
específicos, tais como quantidade de conceitos e comparações de “mais” e
“menos”. Eles sugerem que a criança desenvolve a cognição tornando-se mais
eficiente no processamento de informação. Em virtude dessa ênfase na
eficiência do processamento, a abordagem neopiagetiana ajuda a explicar as
diferenças individuais na capacidade cognitiva e o desenvolvimento desigual
em vários domínios.

Ø Tema 9 - Perspectiva 4: contextual


Segundo a perspectiva contextual, o desenvolvimento pode ser entendido
apenas em seu contexto social. Os contextualistas vêem o indivíduo não como
uma entidade separada interagindo com o ambiente, mas como parte
inseparável deste último. A teoria sociocultural de Vygotsky, que discutimos
como parte da perspectiva cognitiva, também pode ser classificada como
contextual.
A teoria bioecológica (1979, 1986, 1994; Bronfenbrenner e Morris, 1998) do
psicólogo norte-americano Urie Bronfenbrenner (1917 – 2005) identifica cinco
níveis de influência ambiental, variando do mais íntimo para o mais amplo:
• Microssistema;
• Mesossistema;
• Exossistema;
• Macrossistema;
• Cronossistema.
Para entender a complexidade das influências sobre o desenvolvimento,
devemos ver a pessoa dentro do contexto desses múltiplos ambientes.

1. Microssistema: é o ambiente do dia-a-dia no lar, na escola, no trabalho


ou na vizinhança, incluindo relacionamentos face a face com o cônjuge,
filhos, pais, amigos, colegas de classe, professores, empregadores ou
colegas de trabalho. Como um novo bebé afecta a vida dos pais? Como
as atitudes de um professor afectam o desempenho de uma jovem na
faculdade?

xxi
2. Mesossistema: é o entrelaçamento de vários microssistemas. Poderá
incluir vínculos entre o lar e a escola (como as reuniões de pais e
professores) ou entre a família e o grupo de colegas (como as relações
que se desenvolvem entre famílias de crianças que brincam juntas numa
vizinhança). Por exemplo, um mau dia de um dos pais no trabalho
poderá afectar as interacções com o filho de um modo negativo no final
do dia. Apesar de nunca ter ido ao local de trabalho, mesmo assim a
criança é afectada.

3. Exossistema: consiste em vínculos entre um microssistema e sistemas


de instituições externas que afectam a pessoa indirectamente. Como o
sistema de trânsito de uma comunidade afecta as oportunidades de
trabalho? A programação na televisão que encoraja o comportamento
pró-social torna as crianças mais prestativas?

4. Macrossistema: consiste em padrões culturais abrangentes, como as


crenças e ideologias dominantes, e sistemas económicos e políticos.
Como um indivíduo é afectado por viver numa sociedade capitalista ou
socialista?

5. Cronossistema: adiciona a dimensão do tempo: a mudança ou


constância na pessoa e no ambiente. Isso pode incluir mudanças na
estrutura da família, no lugar de residência ou no emprego, e também
mudanças culturais abrangentes, como guerras e ciclos económicos
(períodos de recessão ou de relativa prosperidade).

Segundo Bronfenbrenner, a pessoa não é meramente uma resultante do


desenvolvimento, mas também alguém que molda esse desenvolvimento por
meio de suas características biológicas e psicológicas, seus talentos,
habilidades, deficiências e temperamento.

Ao observar os sistemas que afectam os indivíduos na família e além dela,


essa abordagem bioecológica nos ajuda a ver a variedade de influências sobre

xxii
o desenvolvimento. A perspectiva contextual também nos adverte que as
descobertas sobre o desenvolvimento de pessoas numa determinada cultura
ou num grupo dentro de uma cultura (como norte-americanos brancos e de
classe média) talvez não se aplique igualmente a pessoas de outras
sociedades ou grupos culturais.

Ø Tema 10 - Perspectiva 5: Evolucionista/Sociobiológica


A perspectiva evolucionista/sociobiológica proposta por E. O. Wilson (1975)
concentra-se nas bases evolucionistas e biológicas do comportamento.
Influenciada pela teoria da evolução de Darwin, recorre às descobertas da
antropologia, ecologia, genética, etologia e psicologia evolucionista para
explicar o valor adaptativo, ou de sobrevivência, do comportamento para um
indivíduo ou uma espécie.

1) Segundo Darwin, as espécies desenvolveram-se através dos processos


de sobrevivência dos mais adaptados e selecção natural. Indivíduos
com traços herdados melhor adaptados a seus ambientes sobrevivem e
se reproduzem mais do que aqueles menos adaptados. Assim, através
do sucesso na reprodução diferencial, indivíduos com características
mais adaptativas transmitem seus traços para as gerações futuras em
níveis mais altos que indivíduos menos adaptados. Desse modo,
características adaptativas, basicamente codificadas em seus genes,
são seleccionadas para serem transmitidas, e os menos adaptados são
extintos.

2) Mecanismos evolutivos são comportamentos que foram desenvolvidos


para resolver problemas de adaptação a um ambiente primitivo. Por
exemplo, a súbita aversão a certos alimentos durante a gravidez pode
ter evoluído originalmente para proteger o feto vulnerável de substâncias
tóxicas (Profet, 1992). Esses mecanismos evolutivos podem continuar
existindo mesmo que não sirvam mais a um propósito útil (Bjorklund e
Pellegrini, 2000, 2002), ou podem evoluir ainda mais em resposta a
mudanças nas condições ambientais.

xxiii
3) Etologia é o estudo dos comportamentos adaptativos distintivos das
espécies animais. Os etólogos sugerem que, para cada espécie, certos
comportamentos inatos, como aquele do esquilo que enterra as nozes
no Outono e das aranhas tecendo suas teias, evoluíram para aumentar
as chances de sobrevivência. Outro exemplo é o instinto dos patinhos
recém-nascidos de Lorenz em seguir a mãe. Ao observarem os animais,
geralmente em seu ambiente natural, os etólogos procuram identificar
quais são os comportamentos universais e quais são específicos de uma
determinada espécie ou modificados pela cultura. O psicólogo britânico
John Bowlby (1969) aplicou os princípios etológicos a aspectos do
desenvolvimento humano. John Bowlby nasceu em 1907 e, por
influência de seu pai cirurgião, estudou Medicina e Psicologia na
Universidade de Cambridge. No terceiro ano da sua licenciatura,
interessou-se pelo que mais tarde viria a chamar-se Psicologia do
Desenvolvimento. Terminou a sua licenciatura médica em 1928 e ao
mesmo tempo especializou-se em Psiquiatria Infantil e em Psicanálise.
Prestou trabalho voluntário numa escola para crianças delinquentes, o
que influenciou o rumo da sua carreira, frequentou o British
Psychoanalytic Institute onde teve contacto com as ideias psicanalíticas
de Klein, entre outros. Fez a sua pós-graduação na London Child
Guidance Clinic, com um interesse teórico e clínico na transmissão
intergeracional das relações de “apego”. O contacto com uma obra de
Konrad Lorenz desperta em Bowlby o interesse pela etologia onde vai
procurar novas pistas e explicações para a relação de vinculação entre
mãe e filho.

O interesse e as pesquisas de Bowlby, psiquiatra inglês com formação


psicanalítica e etologista, começaram a partir da sua experiência como
assessor da Organização Mundial de Saúde na área de saúde mental.
Realizou estudos sobre crianças órfãs, institucionalizadas utilizando
preferencialmente observação naturalística.

John Bowlby, seguindo os estudos de Spitz, iniciou a sua carreira


dedicando-se ao estudo dos efeitos que a carência afectiva e a perda de

xxiv
ligação maternal, ocorridas no decurso da primeira infância, provocam
no desenvolvimento somático e psicológico das crianças. Este autor é
pioneiro, em 1958, em utilizar a expressão “vinculação”
(attachment), isto é, a necessidade de estabelecimento de contacto
e de laços emocionais entre o bebé e a mãe e outras pessoas
próximas, como um fenómeno biologicamente determinado, de
procura de suporte e protecção. Considerando a necessidade de
vinculação como algo intrínseco ou primário, Bowlby afasta-se das
concepções psicanalíticas clássicas que admitem a origem e natureza
do vínculo afectivo a partir da satisfação da necessidade de alimento,
isto é, com natureza secundária.

Acreditando que a influência das experiências relacionais das crianças


com os seus pais tem sido grandemente subestimada na
responsabilidade pelos distúrbios de personalidade e neuroses, Bowlby
seleccionou as respostas de muitas crianças sujeitas a breves ou longas
separações dos seus pais como um foco para a investigação. A grande
conclusão a que Bowlby chegou, tendo ocasionado a formulação da
Teoria Etológica da Vinculação, foi que “para crescer mentalmente
saudável as crianças deveriam experimentar uma relação
agradável, íntima e contínua com a mãe na qual ambas devem
encontrar satisfação e bem-estar”. Logo, para Bowlby, da qualidade
da vinculação dependeriam, entre outras coisas, a possibilidade de
termos adultos mais ou menos saudáveis, equilibrados e adequados na
relação consigo próprios e com os outros.

A primeira apresentação formal da Teoria da Vinculação foi feita à


Sociedade Psicanalítica Britânica em três artigos: “A natureza da ligação
da criança com a mãe”, “A ansiedade de separação” e “Dor e luto nos
bebés e crianças”.

Depois da 2ª Guerra Mundial Bowlby foi convidado para dirigente do


departamento de crianças na Clínica de Tavistock, tendo-a associado ao
Instituto de Relações Humanas de Tavistock, onde trabalhou a tempo

xxv
inteiro como clínico, professor e investigador na psiquiatria infantil e
familiar, entre 1946 e 1972. Esta sua associação Tavistock tem-se
prolongado.

Em 1951, insatisfeito com as teorizações psicológicas e psicanalíticas


como formas de compreender o desenvolvimento social e emocional das
crianças, Bowlby começou a desenvolver uma nova estrutura
conceptual, esboçando uma teoria de controlo e mais tarde uma
psicologia cognitiva, assim como, a psicanálise.

Tendo como ponto de partida a Teoria da Vinculação e o estudo de


numerosos casos clínicos, Bowlby em 1980 desenvolveu uma teoria
sobre perda e luto, sendo considerada uma das mais compreensivas
sobre a resposta à perda. Foi, por isso, com este autor que se lançaram
as bases para compreender o fenómeno do luto. Neste mesmo ano,
edita um volume designado Loss, Sadness and Depression onde
destaca as semelhanças entre o luto nos adultos e as reacções à
separação apresentadas pelas crianças e onde também salienta quatro
fases de luto respectivamente: Choque e Negação; Protesto; Desespero
e Desorganização e Reorganização. Bowlby argumentou igualmente que
a forma como o indivíduo responde à perda encontra-se fortemente
associada à forma como o seu sistema de vinculação se organizou ao
longo do desenvolvimento. De acordo com a Teoria da Vinculação, as
formas atípicas do luto podem surgir ao longo de um contínuo que vai
desde o luto crónico até à ausência prolongada de luto consciente.

4) A psicologia evolucionista aplica os princípios de Darwin ao


comportamento humano. Os psicólogos evolucionistas argumentam que
assim como as partes do nosso corpo físico são especializadas em
certas funções, partes de nossa mente são da mesma forma produto da
selecção natural e também têm funções específicas. De acordo com
essa teoria, as pessoas inconscientemente lutam não apenas pela
sobrevivência pessoal, mas também para perpetuar seu legado
genético. E elas o fazem procurando maximizar suas chances de ter

xxvi
uma prole que herdará suas características e sobreviverá para se
reproduzir. No entanto, uma perspectiva evolucionista não reduz
necessariamente o comportamento humano totalmente aos efeitos de
genes procurando se reproduzir, nem implica que o desejo de perpetuar
os genes seja consciente ou deliberado. Também coloca um grande
peso no ambiente ao qual a pessoa deve se adaptar.

Tema 11 - Adopção e família adoptiva

A adopção é entendida como o acto de aceitar de forma voluntária e legal


perante a lei uma criança que por algum motivo foi rejeitada ou abandonada
pelos pais biológicos formando com esta, laços sócio afectivos. Adoptar uma
criança é muito mais do que cuidar e educar, é um compromisso de
responsabilidade, cuidado e consciência com este sujeito.

A adopção de crianças é buscada pelos mais diferentes motivos, entre eles a


infertilidade, a saída dos filhos de casa, a morte dos filhos, medo da solidão
entre outros. Diante destas motivações, segundo Sonego (2007), destaca-se a
infertilidade como principal motivo, uma vez que o impedimento da gravidez
para a mulher pode ser sentido como uma ferida narcísica que impede esta de
exercer a maternidade e dar continuidade ao nome da família por laços de
consanguinidade, abalando assim suas referências identificadoras, visto que a
maternidade é considerada pela mulher um forte elo na construção da
subjectividade feminina.

Em contrapartida ao casal que busca pela adopção, temos a mãe que


abandona o filho, abrindo mão de assumir o pátrio poder sobre o seu filho (a),
suas causas são as mais variadas. Entre elas podemos destacar a pobreza, a
falta do desejo de exercer a maternidade, a pressão da família, o abandono em
virtude da gravidez etc. Neste sentido, pretende-se destacar nesta revisão de
literatura alguns aspectos relacionados à como esta mãe é vista pela
sociedade ao longo dos anos, e como o fenómeno da adopção ocorre nos dias
actuais. Também se busca compreender o fenómeno da parentalidade
adoptiva e suas repercussões ainda nos dias de hoje (Sonego, 2007).

xxvii
O Significado social da adopção

A formação de famílias adoptivas é caracterizada por uma construção familiar


que envolve diversos aspectos, jurídicos, sociais e psicológicos implicados.
Este processo ocorre de forma diferente em cada época, adaptando-se as
necessidades actuais da sociedade. A constituição das famílias adoptivas é
formada por uma complexa teia, onde de um lado existem os pais da criança
que por algum motivo abrem mão de assumir o pátrio poder sobre seu filho,
gerando uma criança abandonada. De outro lado temos os casais
impossibilitados de gerar filhos biológicos, mas com forte desejo de exercer a
parentalidade. Nesta perspectiva, segundo o autor, o processo de adopção foi
considerado por muitos anos sob a influência de uma dupla maldição: O
abandono da criança e a ferida narcísica dos pais inférteis (Chaves, 2002).

A maioria dos casais, ao descobrir a infertilidade, traça uma hierarquia de


possibilidades entre as novas técnicas de reprodução assistida. A fertilização in
vitro oferece varias possibilidades, entre elas a possibilidade de uma
fertilização com os próprios gâmetas, em segunda opção a adopção de
gâmetas. Seguindo esta noção de hierarquias de escolhas para a procriação,
acredita-se que a adopção encontra-se em último lugar, ocorrendo se houver
falha nas tentativas anteriores de reprodução (Chaves, 2002).

Pode-se perceber que embora pais e filhos adoptivos sempre houverem


existido o tema “adopção” parece ter ainda certo um grau de obscuridade em
sua realidade. Pesquisas apontam que casais que buscam pela criança a ser
adoptada acreditam que a adopção é uma forma de compensar suas
expectativas que foram frustradas quando o filho biológico não veio, ou quando
o filho legítimo morreu. Em sua maioria as famílias acreditam que “quem possui
filhos biológicos não precisa adoptar” ou ainda que “a adopção serve para
casais que não podem ter seus filhos biológicos” (Weber, 2009).

xxviii
xxix
O mesmo autor aponta que não existem diferenças entre filhos biológicos e
adoptivos, nem este segundo está mais predisposto a desenvolver alguma
patologia relacionada com a adopção ao longo da vida sendo este mito um
factor negativo para que os casais optem pelo filho adoptivo. O relacionamento
entre pais e filhos está sujeito a constantes entraves e é em suma desafiador.
O que parece ocorrer, é que os casos em que há dificuldade de relacionamento
entre pais e filhos adoptivos ou quando a criança apresenta alguma dificuldade
são tomados como modelos, desta forma tendencial de forma leviana este
processo tão delicado, mas que não difere de uma parentalidade onde há laços
de sangue. Parece haver uma pressão por parte da cultura que induz a
sociedade e consequentemente os pais adoptantes a uma ambivalência em
relação aos seus filhos adoptivos. Se por um lado estão felizes e satisfeitos
com seus filhos por outro parece haver uma dificuldade em assumir um status
de família feliz e normal. Tal ambiguidade se dá pelas generalizações
quotidianas sobre os fatos, falta de preparo para receber um filho etc.
Tendências que assumem um papel de fortalecer o mito dos laços de sangue
como naturais e verdadeiros, transmitindo esta mistificação ao filho adoptado
selando assim, um acordo de preconceito entre pais e filhos (Weber, 2009).

Diferentemente do rótulo que a adopção possuía na antiguidade, hoje este


processo deve permear a ideia de “dar pais a quem não tem” e não “filhos a
quem não os pode ter”. Assim, Weber (2009) destaca o tema da adopção como
um processo que deve ser muito bem reflectido e planejado por quem o deseja
fazer. A adopção nos dias actuais carrega a missão de englobar os interesses
em defesa da criança que foi deixada pelos pais biológicos, logo, pensar a
adopção é reflectir sobre as reais motivações de quem adopta. Embora se
saiba que a infertilidade seja um factor relevante para que casais tomem a
decisão de adoptar uma criança, é necessário que os adoptantes tenham a
consciência de não considerar a adopção somente como um meio de alcançar
os seus desejos de exercer a parentalidade. Nestes casos é necessário que o
casal, após constatar a infertilidade e optar pelo filho do coração possa
elaborar este luto pelo filho que não vaio e resolver-se diante desta
incapacidade para que assim, esteja mais bem preparado para receber esta
criança adoptada. Preparação esta que deve ocorrer em qualquer caso aonde

xxx
uma criança chegar à vida de uma mãe ou de um casal seja ela da barriga da
mãe ou do coração.

Tema 12 - Os conceitos de negligência doméstica

Passa-se agora a examinar os diversos conceitos de negligência tratados pela


literatura internacional e nacional. Com a intenção de facilitar a compreensão
do leitor sobre a diversidade dos conceitos de negligência apresenta-se a
seguir:

Autores Conceito
Feldman et al. citados É um padrão de comportamento constante e um
por Azevedo e Guerra estado inadequado da paternidade/maternidade
(1989) quando comparada às normas da comunidade.
Éthier et al. citados por Grave omissão que coloque em risco o
Azevedo e Guerra (1989) desenvolvimento da criança.
Baily et al. citados por Consiste em falha ao cuidar das necessidades de
Azevedo e Guerra (1989) uma criança, falha raramente propositada,
tratando-se de uma inabilidade de comportamento
dos pais.
Chaffin et al. citados por Quando os pais deixam crianças muito novas sem
Azevedo e Guerra (1989) supervisão por extensos períodos de tempo,
fornecem cuidados e alimentação inadequados
para a criança.
Mouzakitis et al. citados É uma situação na qual o responsável pela
por Azevedo e Guerra criança, seja deliberadamente, seja por total falta
(1989) de atenção, permite que ela experimente
sofrimento e/ ou ainda não preencher para ela os
requisitos geralmente considerados essenciais
para o desenvolvimento das capacidades físicas e
emocionais de um ser humano.
Egami et al. citados por A negligência é a única modalidade de violência
Azevedo e Guerra (1989) contra a criança que se define não pela acção,

xxxi
mas pelo contrário pela sua omissão.
National Information Fracasso em prover as necessidades básicas da
Clearinghouse citado por criança, podendo ela ser física, educacional ou
Gonçalves (2003) emocional.
Azevedo e Guerra (1989) A negligência se configura quando os pais (ou
responsáveis) falham em termos de alimentar, de
vestir adequadamente seus filhos, etc., e quando
tal falha não é o resultado das condições de vida
além do seu controle.
Day (2003) A negligência é a omissão de responsabilidade de
um ou mais membros da família em relação a
outro, sobretudo àqueles que precisam de ajuda
por questões de idade ou alguma condição física,
permanente ou temporária.

A partir desses estudos sobre negligência, considera-se que a negligência


doméstica é um tipo de violência que ocorre no âmbito familiar que se
caracteriza pelo ato de abandono ou omissão por parte dos pais ou pessoa
responsável pela criança pequena no que se refere a sua saúde, alimentação,
educação e amparo emocional. Tais omissões podem estar associadas ao
estado de pobreza, mas a pobreza não é tomada como causa explicativa para
o quadro de negligência. A negligência revela que as relações afectivas entre
pais e filhos não estão adequadas, tendo em vista o padrão considerado
positivo pela própria sociedade de pertença da família.

Ponderando que a qualidade do vínculo afectivo mãe-filho é um dos factores


que contribui para a negligência cometida contra crianças pequenas, buscou-se
em Donald Woods Winnicott elementos que permitem compreender a formação
dos vínculos afectivos entre a mãe e o bebé.

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exclusiva e seu impacto na depressão pós-parto. Psicol. Reflex. Crit.
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13. http://www.brazilpednews.org.br/dec2000/bnp0026.htm

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