Você está na página 1de 14

My Research Folder

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001039-89.2020.4.04.7212/SC
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO
JÚNIOR
APELANTE: EDELAR ANTONIO BENINI (AUTOR)
ADVOGADO(A): CLEDIANA MARIA MARTELLO ANDOGNINI (OAB SC036126)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso em face de sentença proferida em


18/10/2020, nestes termos:

Em face do exposto, ratifico a decisão de antecipação da tutela e


JULGO PROCEDENTE o pedido deduzido na inicial, com
resolução de mérito, com fulcro no art. 487, I, do CPC, para:

a) declarar a inexigibilidade do crédito cobrado pelo INSS referente


aos valores percebidos pelo autor a título do benefício assistencial
NB 87/138.878.788-9, no importe de R$ 74.776,14 (setenta e quatro
mil, setecentos e setenta e seis reais e quatorze centavos;

b) determinar ao INSS que restabeleça o benefício de prestação


continuada (NB 138.878.788-9) à parte-autora (EDELAR
ANTONIO BENINI, CPF 430.575.279-49) desde a DCB,
em 01.03.2020, com renda mensal de um salário mínimo;

c) condenar o INSS a pagar à parte-autora mediante requisição a ser


expedida pelo Juízo, as diferenças vencidas de 01.03.2020 até a data
da efetiva implantação do benefício na via administrativa, devendo
cada uma ser corrigida desde a data do respectivo vencimento,
considerando-se a renda mensal do benefício apurada. O débito
deverá ser corrigido monetariamente, a contar do vencimento de
cada parcela, segundo a variação do INPC, e acrescido de juros
moratórios não capitalizáveis, a contar da citação, no índice
aplicado à caderneta de poupança;

d) condenar o INSS, também, ao ressarcimento dos honorários


periciais e ao pagamento de honorários advocatícios, que desde já, e
tendo em vista o valor atribuído à causa, os vetores do art. 85, § 2º,
do CPC, bem como o disposto no § 3º, I, e § 4º, do citado artigo,
arbitro provisoriamente em 10% sobre o valor da condenação.

Mantenho o benefício da justiça gratuita ao autor (evento 3).

Sem custas (art. 4°, I, da Lei 9.289/96).


Considerando que a condenação não ultrapassará valor equivalente
My Research Folder a 1.000 (uns mil salários-mínimos), ou R$ 880.000,00 (oitocentos e
oitenta mil reais) em valores atuais, fica dispensada a remessa
necessária (art. 496, § 3º, I, CPC).

Como prejudicial de mérito arguiu o INSS a prescrição das


parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o
ajuizamento da ação, nos termos do art. 103, parágrafo único, da Lei n.
8.213/91.

No mérito, alega o INSS, em síntese, que não restou


provado o requisito econômico, inexistindo vulnerabilidade. Sustentou
que o benefício titulado pela genitora do autor (R$ 1.206,71) deve entrar
no cômputo da renda familiar. Requereu a improcedência do pedido.

Oportunizada as contrarrazões, vieram os autos para esta


Corte para julgamento.

O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento


do recurso de apelação.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

A apelação preenche os requisitos legais de


admissibilidade.

Preliminar - Prescrição

O art. 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213, determina que


prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter sido
pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer
restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social.

O art. art. 240, §1º, do CPC/2015, que reproduz o disposto


no art. 219, §1º, do CPC/73, ressalva que a interrupção
da prescrição retroage à data da propositura da ação.

Além disto, no período de trâmite do processo


administrativo, há suspensão da prescrição quinquenal.

No caso, o benefício assistencial foi suspenso em


29/02/2020 e o ajuizamento da ação ocorreu em 01/06/2020. Não há,
portanto, parcelas prescritas.

Afasto a preliminar aventada.


Premissas
My Research Folder
O benefício assistencial encontra-se previsto no art. 203,
inciso V, da Constituição Federal e regulamentado pelo artigo 20 da Lei
nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis nº 12.435, de 06/07/2011, e
nº 12.470, de 31/08/2011.

Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o


preenchimento dos seguintes requisitos:

1.a) Idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou


mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor do
Estatuto do Idoso) ou 1.b) condição de deficiente (incapacidade para o
trabalho e para a vida independente, conforme redação original do artigo
20, da LOAS, e, após as alterações da Lei nº 12.470, de 31-10-2011,
tratar-se de pessoa com impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas
barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas);

2)Situação de risco social (ausência de meios


para, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família).

Requisito etário

Tratando-se de benefício requerido na vigência do Estatuto


do Idoso, é considerada idosa a pessoa com 65 (sessenta e cinco) anos
ou mais que comprove não possuir meios de prover a própria
manutenção nem de tê-la provida por sua família. O requisito é objetivo,
ou seja, comprovado o atributo etário, a análise do requisito
incapacitante é desnecessária, bastando apenas verificar a situação de
vulnerabilidade socioeconômica a que submetido o idoso.

Condição de deficiente

Mister salientar, por oportuno, que a incapacidade para a


vida independente a que se refere a Lei 8.742/93, na redação original,
deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma
maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica
jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min.
Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n.
2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto
Silveira, DJU de 19-04-2006).

Desse modo, a incapacidade para a vida independente:

a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou


seja incapaz de se locomover; b) não significa incapacidade para as
atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a
higiene pessoal e vestir-se sozinho; c) não impõe a incapacidade de se
My Research Folder
expressar ou se comunicar; e d) não pressupõe dependência total de
terceiros.

Situação de risco social

No que se refere à questão de risco social, tendo em vista a


inconstitucionalidade dos artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e do artigo
34, § único, da Lei 10.741/2003, reconhecida no julgamento dos REs
567985 e 580963 em 18.04.2013, a situação de vulnerabilidade social é
aferida não apenas com base na renda familiar, que não deve ser
considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não
possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família. cabe ao julgador, na análise do caso concreto,
identificar o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família.
Deverá ser analisado o contexto socioeconômico em que a autora se
encontra inserida.

Nesse sentido, os cuidados necessários com a parte autora,


em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade, que
acarretarem gastos - notadamente com medicamentos, alimentação
especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e
fisioterápico, entre outros -, configuram despesas a ser consideradas na
análise da condição de risco social da família do demandante (TRF4,
APELREEX 5002022-24.2011.404.7012, Sexta Turma, Relator p/
Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 27/06/2013).

A jurisprudência desta Corte Regional, bem como do


Superior Tribunal de Justiça, é pacífica no sentido de que qualquer
benefício de valor mínimo recebido por idoso de 65 anos ou mais (salvo
quando recebido por força de deficiência, quando então o requisito
etário é afastado) deve ser excluído da apuração da renda familiar, bem
como essa renda mínima não é o único critério a balizar a concessão do
benefício, devendo ser examinado juntamente com outros meios de
aferição do estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou
situação de desamparo do autor e de sua família (Pet n.º 7203/PE - 3ª
Seção - Unânime - Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura - DJe 11-
10-2011; TRF4 - AC n.º 0019220-88.2012.404.9999 - 6ª T. - unânime -
Rel. Des. Celso Kipper - D.E. 22-03-2013; REsp n.º 1112557/MG - 3ª
Seção - unânime - Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho - DJe 20-11-
2009).

Também, o fato de a parte autora ser beneficiária e


perceber renda proveniente do Programa Bolsa Família, não só não
impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da
Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade
familiar se encontra em situação de risco social (TRF4, APELREEX
2009.71.99.006237-1, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper,
D.E. 07/10/2014).
Logo, em linhas gerais, para efeito de concessão do
My Research Folder
benefício de prestação continuada, a situação de risco social a que se
encontra exposta a pessoa idosa ou portadora de deficiência e sua
família deve ser analisada em cada caso concreto (TRF4, EINF
0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do
Valle Pereira, D.E. 29/05/2015).

Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao


exame da situação específica dos autos.

A sentença deve ser mantida por seus próprios


fundamentos:

-----------------------------------------------------------------------
---------

A parte-autora pretende o restabelecimento do benefício assistencial


de prestação continuada à pessoa portadora de deficiência NB
138.878.788-9, cessado em 01.03.2020, após apuração de indícios de
irregularidade pela autarquia.

Quando da análise do pedido liminar, assim restou decidido:

O deferimento da tutela de urgência, nos termos do art. 300 do


Código de Processo Civil, exige a presença de elementos que
evidenciem a probabilidade do direito, o perigo de dano ou o risco ao
resultado útil do processo.

Os pressupostos foram atendidos na presente hipótese.

Ao autor foi concedido o benefício assistencial em 31.03.2006. Na


ocasião, foi declarado que o grupo familiar era composto pelo autor
e sua genitora, com rendimento mensal advindo de pensão no valor
de R$ 429,48, sendo que este já estava acima do salário mínimo na
época (fls. 3-4, PROCADM16, evento 1).

O fato de a renda familiar ser superior ao limite legal ficou bem


estampado no parecer social anexado ao processo administrativo (fls.
9-10, PROCADM16, evento 1).

Porém, ora, por meio do Ofício nº 202000070395,


de 29.02.2020 (OFIC11, evento 1), o INSS comunicou o que segue:
Assim, nota-se que atualmente não houve qualquer alteração no
My Research Folder quadro fático desde a concessão do BPC. A condição de deficiência
do autor não é contestada e o grupo familiar e a renda permanecem
iguais aos da época da concessão.

Não se ignora a possibilidade de revisão bienal do benefício de


prestação continuada prevista no art. 21 da LOAS:

Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto a


cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das
condições que lhe deram origem.

§ 1º O pagamento do benefício cessa no momento em que


forem superadas as condições referidas no caput, ou em caso
de morte do beneficiário.

§ 2º O benefício será cancelado quando se constatar


irregularidade na sua concessão ou utilização. (...)

No caso, na visão do INSS, houve uma irregularidade na concessão


do benefício. No entanto, é evidente a ausência da má-fé da parte-
autora, que declarou as exatas condições financeiras no momento do
requerimento administrativo.

Desse modo, passados mais de 10 anos desde a concessão do


benefício, resta configurada a decadência do direito de revisão pelo
INSS, pelo menos enquanto perdurarem as mesmas condições fáticas
presentes naquele momento.

Neste sentido, cito os seguintes precedentes do TRF da 4ª Região:

PREVIDENCIÁRIO. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL


CIVIL. REVISÃO DE BENEFÍCIO. DECADÊNCIA CONTRA
A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. MÁ-FÉ NÃO
DEMONSTRADA. DEVOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
CONSECTÁRIOS. 1. Para os benefícios deferidos antes do
advento da Lei 9.784/99 o prazo de decadência deve ser
contado a partir da data de início de vigência do referido
Diploma, ou seja, 01.02.1999. 2.O prazo decadencial somente
será considerado interrompido pela Administração quando
regularmente notificado o segurado de qualquer medida de
autoridade administrativa para instaurar o procedimento
administrativo. 3. Na hipótese, o Benefício Assistencial por
idade foi concedido ao autor DIB 17/09/2002 e a sua revisão,
que importou na cessação, ocorreu em 06/08/2014, sem
qualquer indicativo de fraude ou má-fé, tendo transcorrido
mais de 10 anos, restou configurada a decadência do direito
do INSS revisar a concessão do benefício. 4. O Supremo
Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão
geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, determinando, no
recurso paradigma, a adoção do IPCA-E para o cálculo da
correção monetária. 5. Considerando que o recurso que
originou o precedente do STF tratava de condenação da
Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza
administrativa, o Superior Tribunal de Justiça, no REsp
1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a
inconstitucionalidade da TR como fator de atualização
monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária,
em relação aos quais, com base na legislação anterior,
My Research Folder determinou a aplicação do INPC. 6. Os juros de mora, a
contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-
06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o
efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de
remuneração básica aplicado à caderneta de poupança. (TRF4
5000465-09.2015.4.04.7126, SEXTA TURMA, Relator JULIO
GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, juntado
aos autos em 29/01/2020) (grifou-se).

PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO


PREVIDENCIÁRIO. REMESSA EX OFFICIO.
INEXISTÊNCIA. AUDITORIA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL
AO IDOSO. ERRO ADMINISTRATIVO EVIDENCIADO.
VALORES PERCEBIDOS DE BOA-FÉ. RESSARCIMENTO
AO ERÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. DECADÊNCIA DO
DIREITO DE REVISÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA
CONDENAÇÃO. RE Nº 870.947/SE. EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO. INDEFINIÇÃO.
DIFERIMENTO PARA A FASE DE CUMPRIMENTO.
CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. 1. Hipótese em que a
sentença não está sujeita à remessa ex officio, a teor do
disposto no artigo 496, § 3º, I, do Código de Processo Civil. 2.
A Administração possui o poder-dever de anular seus próprios
atos, quando eivados de ilegalidade, assegurado o
contraditório e ampla defesa. 3. A jurisprudência do STJ e
também deste regional são uniformes no sentido de, em face do
princípio da irrepetibilidade e da natureza alimentar das
parcelas, não ser possível a restituição de valores pagos
indevidamente a título de benefício previdenciário, por força
de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro
administrativo, e cujo recebimento deu-se de boa-fé pelo
segurado. 4. Admitida a relativização do art. 115, II, da Lei nº
8.213/1991 e art. 154, §3º, do Decreto nº 3.048/1999,
considerando o caráter alimentar da verba e o recebimento de
boa-fé pelo segurado, o que se traduz em mera interpretação
conforme a Constituição Federal. 5. Não comprovada a má-fé
não há como afastar a fluência do prazo decadencial para
anulação do ato administrativo de que decorra efeitos
favoráveis para o beneficiário, nos termos do art. 54 da Lei
9.784/1999 e art. 103-A da Lei 8.213/1991. 6. Interrompe-se a
decadência apenas a partir notificação do segurado sobre a
instauração do procedimento administrativo tendente a
cancelar o benefício. 7. Diferida para a fase de cumprimento
de sentença a definição sobre os consectários legais da
condenação, cujos critérios de aplicação da correção
monetária e juros de mora ainda estão pendentes de definição
pelo STF, em face da decisão que atribuiu efeito suspensivo aos
embargos de declaração opostos no RE nº 870.947/SE,
devendo, todavia, iniciar-se com a observância das disposições
da Lei nº 11.960/09, possibilitando a requisição de pagamento
do valor incontroverso. 8. Confirmada a sentença no mérito,
majora-se a verba honorária, elevando-a de 10% para 15%
sobre o valor da causa atualizado, consideradas as variáveis
dos incisos I a IV do § 2º e o § 11, ambos do artigo 85 do CPC.
(TRF4, AC 5011528-12.2015.4.04.7003, TURMA REGIONAL
SUPLEMENTAR DO PR, Relator MARCELO MALUCELLI,
juntado aos autos em 04/11/2019) (grifou-se).
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO.
My Research Folder DECADÊNCIA. RESTABELECIMENTO DE AMPARO
SOCIAL AO IDOSO. POSSIBILIDADE. CORREÇÃO
MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE
CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. 1. A Administração, em
atenção ao princípio da legalidade, tem o poder-dever de
anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os
tornem ilegais (Súmulas 346 e 473 do STF). 2. Na hipótese de
sucessão de leis, o entendimento doutrinário é no sentido de
que se aplica, em caso de lei mais nova estabelecendo prazo
decadencial maior que a antiga, o novo prazo, contando-se,
porém, para integrá-lo, o tempo transcorrido na vigência da
lei antiga. 3. Para os benefícios concedidos desde o início da
vigência da Lei n. 9.784/99, o prazo decadencial a incidir é o
de dez anos (MP n. 138, de 2003), contados da data em que
foi praticado o ato administrativo (ou da percepção do
primeiro pagamento, conforme o caso), salvo comprovada
má-fé. Entendimento pacificado pelo STJ. 4. O prazo
decadencial de dez anos também deve ser aplicado quando o
ato administrativo foi praticado anteriormente à vigência da
Lei 9.784/99 (e depois da revogação da Lei 6.309/75), desde
que não se perfaça violação ao princípio da segurança
jurídica. Nessa hipótese, conta-se o prazo a partir da entrada
em vigor da Lei 9.784/99, ante a impossibilidade de sua
retroação, conforme entendimento do STJ. 5. Embora vedada a
cumulação de pensão por morte e benefício assistencial (art.
20, § 4º, da Lei 8.742/93), entendo que não restou
comprovada a má-fé da demandante na percepção conjunta
dos referidos benefícios, mas, sim, erro administrativo do
INSS, que pagou o benefício assistencial por mais de quinze
anos, mesmo constando de seus cadastros o pagamento da
referida pensão à parte autora. 6. Logo, operou-se a
decadência do direito à revisão, com suporte no art. 103-A da
Lei de Benefícios. 7. Restabelecido o benefício de amparo
social ao idoso desde a época da indevida cessação. 8.
Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de
juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a
iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009,
de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-
se a expedição de precatório pelo valor incontroverso,
enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão
sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do
STJ e do TRF da 4ª Região. (TRF4 5006038-
65.2013.4.04.7104, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK
DE ALMEIDA, juntado aos autos em 27/01/2017) (grifou-se).

Ademais, consolidou-se na jurisprudência pátria o entendimento de


que, em se tratando de benefício previdenciário ou assistencial
indevidamente pago, face ao caráter alimentar, imprescindível é a
comprovação da má-fé do beneficiário para que o INSS possa buscar
a cobrança dos valores. A esse respeito:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS À


EXECUÇÃO FISCAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
RECEBIMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ CONFIGURADA. É
certo que o Instituto Nacional do Seguro Social tem direito de
promover a execução dos seus créditos inseridos em dívida
ativa. Todavia, para a cobrança de valores pagos
indevidamente a título de benefício previdenciário, ou
assistencial, em face do caráter alimentar dessas verbas e, em
My Research Folder decorrência, da sua irrepetibilidade, é imprescindível a
demonstração da má-fé do beneficiário em processo judicial
próprio com a observância do contraditório e ampla defesa.
(TRF4, APELREEX 0001585-94.2012.404.9999, Terceira
Turma, Relator Fernando Quadros da Silva, D.E. 20/04/2012).

Também, de acordo com a jurisprudência, não caberia a restituição


dos valores indevidos se reconhecido nas vias ordinárias que o
segurado estava de boa-fé, mormente se o ato concessório decorreu
de erro administrativo:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PAGO A


MAIOR. ERRO ADMINISTRATIVO. RECEBIMENTO
DE BOA-FÉ. NATUREZA ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO
INDEVIDA. 1. Em face do caráter social das demandas de
natureza previdenciária, associada à presença da boa-fé do
beneficiário, afasta-se a devolução de parcelas pagas a maior,
mormente na hipótese de erro administrativo. 2. Agravo
regimental improvido. (AgRg no Ag 1318361/RS, Rel. Ministro
Jorge Mussi, 5ª T, DJe 13/12/2010) (grifou-se).

Resta demonstrada, destarte, a probabilidade do direito, assim como


o perigo de dano, em face do caráter alimentar do benefício.

Neste momento, da análise dos autos, tenho que não há motivos para
alteração da decisão liminar.

A fim de verificar a situação de vulnerabilidade social do grupo


familiar do requerente foi determinada a realização de perícia
socioeconômica (evento 24), da qual se extrai a informação de que o
grupo familiar é formado pelo autor (57 anos) e sua mãe, Elides
Augustinha Benini (86 anos), atualmente cadeirante.

A renda familiar advém da pensão por morte recebida pela mãe do


autor, no valor de R$ 1.206,71, e da ajuda de R$ 200,00 de um dos
seus irmãos, porém o mesmo naõ consegue enviar todos os meses.

A residência é própria, de madeira, com 80m² e não está em bom


estado de conservação, necessitando de reparos. O imóvel está
guarnecido com móveis simples e básicos. As fotos anexadas ao
laudo evidenciam as condições de habitabilidade em que vivem autor
e sua genitora. Observa-se que não há acessibilidade necessária para
a mãe do autor.

Observo, também, que os gastos mensais relatados com alimentação.


luz, água, gás, farmácia se mantêm dentro da realidade de
miserabilidade retratada.

Desse modo, confirmou-se que as condições relatadas no momento da


concessão do benefício mantêm-se inalteradas atualmente.

Passados mais de dez anos desde a concessão do benefício, resta


configurada a decadência do direito de revisão pelo INSS, enquanto
perdurarem as mesmas condições fáticas presentes naquele momento.
Indevida, portanto, a cessação do benefício assistencial do autor, bem
My Research Folder como inexigível o crédito relacionado, cobrado pelo INSS (OFIC11,
evento 1).

-----------------------------------------------------------------------
-----------

A autarquia previdenciária se insurge alegando


inexistência vulnerabilidade ou risco social pelo fato da genitora do
autor ter uma renda de R$ (R$ 1.206,71) e R$ 200,00 de eventual ajuda
de um irmão.

Ora, não se perca de vista que no tocante ao requisito


econômico, importa referir que a situação de vulnerabilidade social é
aferida não apenas com base na renda familiar, que não deve ser
considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não
possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família. Deverá ser analisado o contexto
socioeconômico em que a autora se encontra inserida.

Importa trazer à baila nota à imprensa de 06/07/2022


expedida pelo Dieese - Departamento Intersindical de Estatística e
Estudos Socioeconômicos
(https://www.dieese.org.br/analisecestabasica/2022/202206cestabasica.p
df):

Em junho, o valor do conjunto dos alimentos básicos


aumentou em nove das 17 capitais onde o DIEESE (Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) realiza
mensalmente a Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos. Entre
maio e junho, as maiores altas ocorreram no Nordeste, nas cidades de
Fortaleza (4,54%), Natal (4,33%) e João Pessoa (3,36%). Oito cidades
apresentaram reduções, sendo que as mais expressivas foram registradas
no Sul: Porto Alegre (-1,90%), Curitiba (-1,74%) e Florianópolis
(-1,51%). São Paulo foi a capital onde o conjunto dos alimentos básicos
apresentou o maior custo (R$ 777,01), seguida por Florianópolis (R$
760,41), Porto Alegre (R$ 754,19) e Rio de Janeiro (R$ 733,14). Ainda,
segundo o Departamento Intersindical o salário mínimo ideal e
necessário para manter uma família de quatro pessoas deveria ser
equivalente a 5,27 vezes o piso nacional.

Deflui do estudo socioeconômico que se trata de grupo


familiar composto pelo autor (57 anos) e sua mãe, Elides Augustinha
Benini (86 anos) A única fonte de renda decorre da pensão por morte
titulada pela genitora no valor de R$ 1.206,71, e da eventual ajuda de
R$ 200,00 de um dos seus irmãos.

Ora, basta subtrair o valor de uma cesta básica da renda do


grupo familiar do autor, para se tornar evidente que sobra muito pouco
para os demais custos. Não se perca de vista as necessidades especiais
do autor e da genitora idosa, cadeirante que não podem ser
My Research Folder
mitigadas, pois configuram circunstâncias adicionais, que exasperam as
despesas próprias ao longo do tempo.

Diante deste quadro, entendo despicienda maiores ilações


sobre a vulnerabilidade da família, que de sobejo restou comprovada.

Dessa forma, face às considerações aduzidas, observada a


razoabilidade ao considerar o valor numérico da renda, conjugado com
outros fatores indicativos da situação de risco social, e considerando
ainda que o direito ao benefício de prestação continuada não
pressupõe a verificação de um estado de miserabilidade extremo -
bastando estar demonstrada a insuficiência de meios para o beneficiário,
dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua
família, tenho por configurada a situação de risco social a que está
exposta a parte autora.

Por tudo exposto, comprovados ambos os requisitos, a


decisão recorrida merece ser mantida hígida.

Termo inicial

À mingua de recurso no ponto, resta mantido como fixado


na sentença:

a) declarar a inexigibilidade do crédito cobrado pelo INSS referente


aos valores percebidos pelo autor a título do benefício assistencial
NB 87/138.878.788-9, no importe de R$ 74.776,14 (setenta e quatro
mil, setecentos e setenta e seis reais e quatorze centavos;

b) determinar ao INSS que restabeleça o benefício de prestação


continuada (NB 138.878.788-9) à parte-autora (EDELAR
ANTONIO BENINI, CPF 430.575.279-49) desde a DCB,
em 01.03.2020, com renda mensal de um salário mínimo;

Dos consectários

Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do


Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis
aos consectários:

Correção Monetária

Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal


Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE 870.947),
e dos embargos de declaração opostos contra a decisão, rejeitados e com
afirmação de inexistência de modulação de efeitos, deve a atualização
monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que
estabelece para as condenações judiciais de natureza previdenciária o
que segue:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza
My Research Folder
previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção
monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei
11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Assim, a correção
monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será
calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam
conforme a incidência ao período compreendido na condenação o IGP-
DI, (de 5/1996 a 3/2006 (artigo 10 da Lei 9.711/1998, combinado com o
artigo 20, §§5º e 6º, da Lei 8.880/1994), e o INPC a partir de 4/2006
(artigo 41-A da Lei 8.213/1991).

O Superior Tribunal de Justiça (REsp 149146) - a partir da


decisão do STF e levando em conta que o recurso paradigma que
originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao
pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício
assistencial) - distinguiu os créditos de natureza previdenciária para
estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR
como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a eles, o
INPC, que era o índice que os reajustava à edição da Lei n. 11.960/2009.

É importante registrar que os índices em questão (INPC e


IPCA-E) tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido
desde 7-2009 até 9-2017 (mês do julgamento do RE n. 870.947):
64,23% contra 63,63%. Assim, a adoção de um ou outro índice nas
decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas
sobre o valor da condenação.

A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação,


a partir de 4-2006, do INPC aos benefícios previdenciários e o IPCA-E
aos de natureza assistencial.

Juros moratórios

No que pertine aos juros de mora, deverão incidir a contar


da citação (Súmula 204 do STJ), na taxa de 1% (um por cento) ao mês,
até 29/06/2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios
serão computados, uma única vez (sem capitalização), segundo
percentual aplicável à caderneta de poupança, conforme Lei
11.960/2009, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei 9.494/1997,
considerado constitucional pelo STF (RE 870.947, com repercussão
geral).

A partir de 9/12/2021, para fins de atualização monetária e


juros de mora, deve ser observada a redação dada ao artigo 3º da EC
113/2021, a qual estabelece que haverá a incidência, uma única vez, até
o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial
de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.

Honorários advocatícios
Tratando-se de sentença publicada já na vigência do novo
My Research Folder
Código de Processo Civil, aplicável o disposto em seu art. 85 quanto à
fixação da verba honorária.

No tocante ao cabimento da majoração de que trata o §11


do art. 85 do CPC/2015, assim decidiu a Segunda Seção do STJ, no
julgamento do AgInt nos EREsp nº 1.539.725-DF (DJe de 19-10-2017):

É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na


forma do art. 85, §11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os
seguintes requisitos, simultaneamente:

a) vigência do CPC/2015 quando da publicação da decisão


recorrida, ou seja, ela deve ter sido publicada a partir de 18/03/2016;

b) não conhecimento integralmente ou desprovimento do


recurso, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente;

c) existência de condenação da parte recorrente ao


pagamento de honorários desde a origem no feito em que interposto o
recurso.

No caso concreto, estão preenchidos todos os requisitos


acima elencados, sendo devida, portanto, a majoração de que trata o §11
do art. 85 do CPC/2015.

Assim, impõe-se a majoração dos honorários advocatícios


em 50% sobre o percentual anteriormente fixado.

Tutela Específica

Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação


para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do
CPC, devendo o INSS fazê-lo em até 20 dias, conforme os parâmetros
acima definidos, facultada à parte autora a manifestação de desinteresse
quanto ao cumprimento desta determinação

Dados para cumprimento: ( ) Concessão ( x ) Restabelecimento ( ) Revisão


NB NB 87/138.878.788-9
Espécie Benefício Assistencial
DIB 01.03.2020
DIP No primeiro dia do mês da implantação do benefício
DCB
RMI a apurar
Observações

Conclusão

Afastada a preliminar aventada. Negar provimento à


apelação do INSS. Majorar os honorários advocatícios em 50% sobre o
percentual anteriormente fixado. Determinada o imediato
restabelecimento do benefício, via CEAB.
My Research Folder
Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação


do INSS e determinar o imediato restabelecimento do benefício, via
CEAB.

Documento eletrônico assinado por HERMES SIEDLER DA CONCEICAO JUNIOR,


Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro
de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da
autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico
http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código
verificador 40003696476v7 e do código CRC 3c75878e.

Informações adicionais da assinatura:


Signatário (a): HERMES SIEDLER DA CONCEICAO JUNIOR
Data e Hora: 22/2/2023, às 19:39:56

5001039-89.2020.4.04.7212 40003696476 .V7

Você também pode gostar