Você está na página 1de 9

As neoplasias plasmocitárias são doenças caracterizadas pela proliferação de

um clone maligno de plasmócitos, que leva à produção de uma proteína


imunologicamente homogênea chamada paraproteína. Esta proteína pode ser
detectada no sangue e/ou na urina de um doente com uma gamopatia monoclonal, e
ela pode ser composta por uma imunoglobulina intacta, a cadeia pesada isolada, ou a
cadeia leve isolada.
Existem diversos tipos de neoplasias plasmocitárias (Tabela 1), sendo
o mieloma múltiplo (MM) o tipo mais frequente e importante na prática clínica. O MM
se caracteriza pelo acúmulo de plasmócitos anômalos na medula óssea e pela
produção de paraproteínas, levando a destruição óssea, osteopenia, hipercalcemia,
insuficiência renal, citopenias e fraturas patológicas. Além do MM, existem outros tipos
de mais raros, como a amiloidose AL.

Tabela 1: Neoplasias plasmocitárias.


Gamopatia monoclonal de
significado indeterminado (GMSI)
Variantes: mieloma assintomático (smoldering);
mieloma múltiplo mieloma não secretor; leucemia de células plasmáticas
Plasmacitoma solitário do osso; plasmacitoma
Plasmocitoma extramedular
Doença de depósito de Amiloidose primária (AL); doença de depósito de
imunoglobulina cadeias leves e pesadas
Mieloma osteosclerótico
(síndrome POEMS)
Doença de cadeia pesada

O MM representa cerca de 1% de todas as neoplasias malignas e corresponde à


aproximadamente 10% dos casos de neoplasias hematológicas, com incidência anual
de 5 casos por 100.000 habitantes segundo dados norte-americanos. É uma doença
que acomete sobretudo indivíduos idosos, com uma idade mediana de diagnóstico de
66 anos, e apenas 10% dos doentes com MM têm menos de 50 anos de idade. Tem
ocorrência e distribuição universal, sendo um pouco mais comum em homens do que
em mulheres, e a prevalência em negros é quase o dobro da prevalência em brancos.
A sobrevida média em 5 e 10 anos de um paciente com MM é de 31% e 10%,
respectivamente.

FATORES DE RISCO
A fisiopatologia do mieloma múltiplo ainda não é completamente conhecida e,
com base em dados epidemiológicos, acredita-se que fatores genéticos, idade
avançada, imunodeficiência e exposição ambiental podem estar envolvidos na sua
patogênese. Dentre os inúmeros fatores de risco estudados, podem ser citados:

radiação;
benzeno;
inseticidas;
infecção pelo vírus HHV-8 (Human Herpes Virus 8);
fatores genéticos;
estimulação antigênica crônica (p.ex., infecção crônica, doenças inflamatórias
crônicas etc.).
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Os pacientes portadores de MM podem apresentar sinais e sintomas variados
(Tabela 2) e que podem ser decorrentes de vários mecanismos fisiopatológicos:

doença óssea;
doença renal (etiologia multifatorial);
doença neurológica (etiologia multifatorial);
efeito da secreção da paraproteína;
infiltração da medula óssea;
imunossupressão;
formação de plasmacitomas.

Tabela 2: Sinais e sintomas em mieloma múltiplo.


Sintoma mais frequente, visto em cerca de 60% dos doentes. Em
Dor óssea geral, a dor se localiza em região lombar e arcabouço torácico.
Muito comum (cerca de 30% dos doentes) e associada com a
Fraqueza presença de anemia.
Observado em ¼ dos doentes, pode chegar a > 9 kg em muitos
Perda de peso casos.
Achado físico mais frequente, em geral associado com a presença
Palidez de anemia.
Febre Raro aparecer isolada no MM; quando presente, indica infecção.
Hepatoespleno
megalia Vista em menos de 5% dos pacientes,
Complicações Pacientes podem ter sintomas por hipercalcemia, insuficiência
do MM renal, compressão medular etc. (ver a seguir)

Doença Óssea do Mieloma Múltiplo


Acomete principalmente o esqueleto axial e porções proximais dos ossos longos.
A doença óssea do MM pode evoluir com fraturas patológicas, desabamento de
corpos vertebrais (levando a cifose e diminuição da altura do paciente) e com
compressão medular, que constitui uma emergência médica e pode levar a paraplegia
irreversível. O sintoma mais comum da doença óssea do mieloma múltiplo é a dor,
presente em mais de 2/3 dos doentes. Costuma ocorrer principalmente na coluna
vertebral por fratura das vértebras e infiltração do mieloma, e nas costelas, levando à
dor intensa com características pleuríticas que pode comprometer a ventilação. O
crânio também é comumente afetado, apresentando lesões em até 60% dos doentes
com a radiografia simples. Esta é o exame inicial para detecção de doença óssea do
mieloma. Deve-se pesquisar principalmente crânio, ossos longos (porção proximal),
coluna vertebral e costelas. As principais alterações são lesões líticas, osteoporose e
fraturas, que demonstram alterações radiológicas em até 80% dos pacientes no
momento do diagnóstico. A cintilografia com tecnécio não tem boa sensibilidade para
detecção de lesões ósseas do mieloma e não deve ser utilizada para este fim.
Recentemente, tem crescido o papel da ressonância nuclear magnética (RNM) como
exame de rastreamento de lesões ósseas, por apresentar maior sensibilidade na
detecção de doença óssea, além de fornecer dados de importância prognóstica.

Efeito da Secreção de Paraproteínas


Níveis elevados de paraproteína podem levar ao aumento da viscosidade
sanguínea e causar a chamada síndrome de hiperviscosidade. Esta síndrome se
manifesta com confusão mental, tontura, turvação visual e rebaixamento do nível de
consciência. No exame de fundo de olho, pode-se observar hemorragia retiniana. O
diagnóstico e o tratamento baseiam-se na anamnese e no quadro clínico, sendo que a
aferição da viscosidade não deve ser utilizada como parâmetro isolado. A
hiperviscosidade é mais comum em doentes com paraproteína IgM (como na
macroglobulinemia de Waldenström). A síndrome de hiperviscosidade constitui uma
urgência médica e deve ser tratada inicialmente com plasmaférese, além do
tratamento direcionado para a doença de base.
Além da hiperviscosidade, em alguns raros doentes com mieloma múltiplo, a
doença pode se manifestar com amiloidose AL associada, em que há o depósito de
cadeias leves monoclonais em tecidos formando depósito amiloide. O depósito
amiloide é progressivo e os órgãos mais acometidos são coração (insuficiência
cardíaca congestiva), rim (síndrome nefrótica e insuficiência renal), fígado
(insuficiência hepática), sistema nervoso (neuropatia periférica, hipotensão ortostática)
e trato gastrintestinal (má absorção, diarreia). O diagnóstico de certeza se faz com
biópsia do tecido afetado demonstrando depósito amiloide pela coloração vermelho-
congo.

Falência de Medula Óssea


A anemia costuma ocorrer em pacientes portadores de MM, sendo observado
em mais de 95% dos doentes durante o curso da doença. O acometimento das outras
séries hematopoiéticas é incomum e está geralmente relacionado ao uso de
quimioterapia mieloablativa.

Plasmocitoma
Formação tumoral de células plasmáticas, idêntico ao que é encontrado na
biópsia de medula óssea no MM. Pode ser solitário ou concomitante ao MM, e pode
ser medular ou extramedular. As localizações mais comuns são coluna vertebral,
costelas e esterno. Os locais extramedulares mais comuns são o trato respiratório
superior e a pleura.

Infecções Recorrentes
São uma causa importante de morbimortalidade no doente com MM. Os germes
clássicos são bactérias encapsuladas (p.ex., pneumococo), porém, recentemente tem-
se dado uma maior atenção a infecções por bactérias Gram-negativas. As infecções
virais e fúngicas são relativamente incomuns, exceto no curso de altas doses de
corticooides ou após transplante de medula óssea (TMO). Os mecanismos
responsáveis pela imunossupressão do MM dependem, além de uma diminuição da
síntese de imunoglobulinas normais, de uma diminuição da resposta imune do
hospedeiro frente a antígenos externos.

Doença Renal
Em cerca de 50% dos portadores de MM, a creatinina sérica está aumentada no
momento do diagnóstico, e em 20% dos casos é maior do que 2 mg/dL. A doença
renal no MM geralmente é multifatorial, sendo os fatores etiológicos mais comuns
descritos a seguir.

Rim do Mieloma
A excreção de cadeias leves leva ao depósito das mesmas nos túbulos renais,
lesando as células tubulares e formando grandes cilindros céreos que levam a
obstrução tubular. É a causa mais comum de doença renal no MM, e depende
primordialmente da quantidade de cadeia leve que é excretada (proteinúria de Bence
Jones). Pode ser exarcebada por outros fatores concomitantes (desidratação,
nefropatia por contraste iodado, etc.). Deve-se suspeitar de rim do mieloma em
pacientes idosos com quadro de insuficiência renal sem grandes alterações de
sedimento urinário e com proteinúria de fita negativa.

Hipercalcemia
Leva a poliúria e desidratação, com consequente insuficiência renal.

Amiloidose AL
Causa síndrome nefrótica com predomínio da excreção de albumina sobre as
cadeias leves.

Síndrome de Fanconi Adquirida


Filtração de certas cadeias leves pode levar à lesão seletiva do túbulo renal
proximal, com acidose tubular renal tipo II, aminoacidúria, glicosúria, fosfatúria,
hipofosfatemia e osteomalácia.

Doença do Sistema Nervoso Central


A alteração neurológica mais comum em doentes com mieloma múltiplo é uma
radiculopatia compressiva por um plasmocitoma ósseo ou lesão lítica. Em geral,
acomete região lombar e torácica. Além disto, outras manifestações neurológicas em
pacientes com MM incluem as que seguem.

Neuropatia Periférica
Apesar de infrequente, as proteínas monoclonais podem levar a um quadro de
polineuropatia sensitivomotora com predomínio distal. São mais comumente vistos em
doentes com a síndrome POEMS (MM com lesões osteoscleróticas
– Polineuropatia, Organomegalia, Endocrinopatia, M protein, Skin changes). Em geral,
a causa mais comum de neuropatia periférica nos pacientes com MM decorre do uso
de medicações neurotóxicas no tratamento, como talidomida e bortezomibe.

Compressão Medular
Ocorre por plasmocitoma ou fratura de coluna vertebral; caracteriza-se por dor
em coluna associada a sintomas neurológicos e disfunção esfinctérica. É
uma emergência médica, e o paciente deve ser encaminhado para neurocirurgia ou
radioterapia para tratamento de emergência para evitar paraplegia.

EXAMES COMPLEMENTARES
Após avaliação clínica detalhada, devem-se solicitar exames complementares
com objetivo de avaliar as funções orgânicas, possíveis complicações relacionadas à
doença e estadiamento para estabelecer o prognóstico e a necessidade de
tratamento. Os exames mais utilizados são de três grupos básicos.

Avaliação Geral do Paciente


Hemograma
Mostra anemia normocítica e normocrômica em até 97% dos pacientes durante
algum momento da doença. O esfregaço pode mostrar macrocitose em cerca de 10%
e hemácias em rouleaux em 50% dos casos. Observa-se leucopenia em 20% e
trombocitopenia em 5%.

Velocidade de Hemossedimentação (VHS)


Costuma estar aumentada nos pacientes com MM, sendo maior que 20 mm/h
em 84% dos casos e maior que 80 mm/h em até 30%.

Função Renal e Eletrólitos


Podem estar alterados em até 50% dos doentes no momento do diagnóstico. A
insuficiência renal é importante causa de morbimortalidade nos doentes com MM e
pode ser a apresentação inicial da doença em alguns casos (vide item “Doença
Renal”, já descrito).

Beta-2 Microglobulina, Proteínas Totais e Frações, Desidrogenase


Lática
Exames relevantes por terem correlação direta com o prognóstico do doente.

Radiografia de Ossos Longos, Coluna e Crânio


Busca de lesões líticas.

Diagnóstico da Proteína Monoclonal


Eletroforese de Proteínas (EFP) Séricas
É o exame feito inicialmente que detecta o pico monoclonal e levanta a suspeita
de uma gamopatia monoclonal. Na EFP, observa-se um pico monoclonal elevado com
base estreita, em geral na zona de mobilidade gama, mas pode ter mobilidade beta
em alguns casos (p.ex., MM por IgA). Até 82% dos doentes com MM tem pico
monoclonal. Aproximadamente 10% dos doentes com MM podem ter
hipogamaglobulinemia na EFP, que é mais comumente vista em MM produtores de
cadeia leve isolada. A EFP, embora seja o exame inicial, pode fornecer muitos
resultados falso-negativos e falso-positivos. É importante notar que a ausência de pico
monoclonal na EFP sérica não descarta que o paciente tenha uma gamopatia
monoclonal. Portanto, se há suspeita clínica, deve-se prosseguir com exames mais
sensíveis, como a imunofixação (IFX) e/ou pesquisa de cadeia leve livre, que é um
exame capaz de detectar a presença de paraproteínas em até 60% dos casos tidos
como MM não secretor pelos estudos convencionais. A EFP também serve para
acompanhar a resposta ao tratamento da doença.

Imunoeletroforese de Proteínas (IEFP)/Imunofixação (IFX)


São exames essenciais na avaliação de um doente com suspeita de gamopatia
monoclonal, pois confirmam a monoclonalidade de uma proteína vista em EFP e
determinam o tipo e a classe desta imunoglobulina (p.ex., IgG Kappa). Ambos os
exames têm o mesmo propósito, sendo a IFX mais sensível para detectar pequenas
quantidades de proteína M, sendo, portanto, o melhor exame. Deve-se realizar um
destes exames sempre que houver suspeita de GMC ou presença de pico monoclonal
na EFP. A IEFP/IFX mostra uma cadeia monoclonal no sangue em até 93% dos
doentes com MM.

Quantificação da Imunoglobulina
Importante para quantificar a cadeia monoclonal produzida e detectar diminuição
recíproca das imunoglobulinas não monoclonais, evento que ocorre em até 91% dos
doentes com MM.

Exames para Detecção de Cadeia Leve Urinária


Análogo ao que se faz no sangue, investiga a excreção de cadeias leves
monoclonais na urina do paciente por meio de exames semelhantes. A excreção de
cadeias leves não é detectada pela proteinúria de fita do exame comum de urina, de
modo que este exame não serve para tal propósito. Deve-se realizar inicialmente uma
coleta urinária de 24 horas e realizar uma EFP urinária de uma alíquota desta coleta
de urina. A EFP pode mostrar um pico monoclonal, mas a ausência deste não
descarta a excreção urinária de cadeia leve. Deve-se seguir então com uma IEFP/IFX
urinária, que são os melhores exames e demonstram cadeia leve monoclonal em 73%
dos casos.

Avaliação da Medula Óssea


Mielograma
Deve-se realizar mielograma e biópsia de medula óssea em todos os doentes
com suspeita de MM. Observa-se, em geral, > 10% de plasmócitos, mas este valor
pode variar bastante, pois o acometimento do MM pode ser regional. Igualmente
importante são estudos de imuno-histoquímica que confirmem a monoclonalidade dos
plasmócitos e imunofenotipagem. Recentemente, tem sido incorporada na avaliação
inicial do paciente com mieloma múltiplo a realização de estudos de citogenética
convencional e hibridização in situ por fluorescência (FISH), que têm importante
correlação prognóstica.

DIAGNÓSTICO
Os critérios estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde para o
diagnóstico de gamopatia monoclonal de significado indeterminado (GMSI) e mieloma
múltiplo (MM) estão nas Tabelas 3 e 4 a seguir:

Tabela 3: Critérios diagnósticos para gamopatia monoclonal de significado


indeterminado estabelecidos pela OMS.
Critérios diagnósticos de GMSI
Pico monoclonal < 3 g/dL.
Plasmocitose clonal < 10% e baixo nível de infiltração plasmocitária na biópsia de
medula óssea.
Ausência de lesões em órgãos-alvo (ausência de anemia, hipercalcemia, insuficiência
renal ou lesões ósseas).
Ausência de doença linfoproliferativa de células B.

Tabela 4: Critérios diagnósticos para mieloma múltiplo estabelecidos pela


OMS.
Mieloma sintomático
Pico monoclonal sérico ou urinário (em geral encontram-se > 3,5g/dL (IgG), > 2,5g/dL
(IgA), ou cadeia leve urinária > 1,0 g/24h)
Plasmocitose ou Plasmacitoma na biópsia de MO (em geral > 10% de plasmócitos, mas
cerca de 5% dos casos apresentam < 10%).
Presença de lesões em órgãos alvo (anemia, Hipercalcemia, insufuciência renal ou lesões
ósseas).
Mieloma Assintomático (“Smoldering”)
Pico monoclonal > 3,0 g/dL
E / OU
Plasmocitose > 10%
Ausência de lesões em órgãos alvo (ausência de anemia, Hipercalcemia, insufuciência
renal ou lesões ósseas).

O diagnóstico diferencial de MM se faz principalmente com outras gamopatias


monoclonais, como pode ser visto na Tabela 5. Além disto, outras neoplasias
malignas linfoproliferativas podem cursar com proteínas monoclonais (como a
leucemia linfocítica crônica e o linfoma linfoplasmocítico).

Tabela 5: Diagnóstico diferencial do mieloma múltiplo.


Doença Comentário
Causa mais comum de gamopatia monoclonal, visto em até
Gamopatia 3% de pessoas > 70 anos de idade. Até 25% podem progredir para
monoclonal de significadoMM ou outras neoplasias malignas. Devem-se acompanhar estes
incerto (GMSI) doentes anualmente com EFP sangue e urina.
Não há benefício em iniciar tratamento em doentes neste
estágio. Estes pacientes devem ser acompanhados atentamente
mieloma múltiplocom pesquisa de lesões de órgão-alvo, que levaria à indicação de
assintomático iniciar tratamento.
Linfoma
linfoplasmocítico Pico de IgM, ausência de lesões líticas, sintomas de
(macroglobulinemia dehiperviscosidade, anemia e hepatoesplenomegalia. Presença de
Waldenström) infiltração por células linfoplasmocitárias na medula óssea.
Poucos plasmócitos na medula óssea (< 20%), cadeia
lambda, presença de síndrome nefrótica e insuficiência cardíaca
restritiva. Pode evoluir muito raramente para MM ou aparecer
Amiloidose AL sobreposta ao MM.

TRATAMENTO
O mieloma múltiplo ainda é considerado uma doença incurável. Entretanto,
enormes avanços no seu tratamento têm sido feitos nos últimos anos, com expressivo
aumento na quantidade de opções terapêuticas, propiciando aumento das taxas de
resposta, sobrevida livre de progressão e sobrevida global.
A escolha do tratamento inicial do MM baseia-se em 2 principais fatores:
estratificação de risco e elegibilidade para o transplante de células hematopoiéticas
(TCH).

Estratificação de Risco
Atualmente, é recomendada a realização de testes genéticos e moleculares para
estratificação de risco e prognóstico dos pacientes com diagnóstico de MM. Os
principais fatores de risco considerados adversos são a detecção por FISH da t(4;14),
t(14;16) e del 17p ou del 13 e hipoploidia pela citogenética convencional.

Elegibilidade para TCH


O TCH autólogo é uma modalidade de tratamento que resulta em aumento de
sobrevida livre de progressão e sobrevida global quando oferecido a pacientes
adequadamente selecionados. Em geral, pacientes com menos de 65 anos de idade e
sem comorbidades graves são considerados candidatos a esta modalidade de
tratamento. Entretanto, recentemente, pacientes com mais de 65 anos de idade que
apresentem bom desempenho clínico também podem ser considerados para esta
terapêutica. Fatores que constituem contraindicações clássicas são: idade (> 75 anos),
bilirrubina direta > 2 mg/dL, creatinina sérica > 2,5 mg/dL (exceto se função renal
estável), desempenho clínico (ECOG) 3 ou 4 e insuficiência cardíaca classe funcional
III ou IV.
Todos os pacientes devem receber tratamento de indução visando a
citorredução, controle de sintomas e melhora das lesões de órgãos-alvo. O tratamento
pode incluir uma série de agentes antineoplásicos, a depender de características do
paciente e se o paciente será encaminhado posteriormente para o TCH. Os principais
regimes e modalidades para o tratamento do MM são os seguintes.

Pacientes Não Candidatos ao TCH


Antes do desenvolvimento de agentes mais eficazes, o tratamento de pacientes
não candidatos ao TCH envolvia o uso de melfalam e prednisona (MP). Mais
recentemente, com a adição de talidomida e bortezomibe, observou-se um aumento
das taxas de resposta, sobrevida livre de eventos e sobrevida global. Os principais
regimes de tratamento são:

1. Melfalan, prednisona e talidomida (MPT): é um dos regimes de escolha


para o tratamento inicial. Uma série de estudos randomizados demonstraram a
superioridade deste esquema sobre o regime padrão (MP).
2. Bortezomibe, Melfalam e Prednisona (VMP): também é regime que pode
ser empregado no tratamento inicial de pacientes não elegíveis para TCH. O
bortezomibe é uma droga que age como inibidor de proteassoma, que foi
recentemente incorporada no tratamento do mieloma múltiplo, tanto nos casos
refratários como no tratamento inicial. O esquema VMP também demonstrou
superioridade ao regime MP, inclusive com benefício em pacientes com insuficiência
renal. Como não há dados de segurança do uso de talidomida em pacientes com
insuficiência renal, regimes com bortezomibe são considerados de escolha neste
subgrupo de pacientes. Não há estudos randomizados comparando MPT com VMP
até este momento. A associação das 4 drogas mencionadas anteriormente (VMPT)
está sendo avaliada em estudo de fase III, com resultados preliminares demonstrando
aumento das taxas de resposta e na sobrevida livre de progressão, mas sem benefício
em sobrevida global com curto período de seguimento. O valor desta combinação
ainda é incerto e devem-se aguardar resultados de longo prazo de eficácia para que
se possa recomendar seu uso.
3. Lenalidomida: a lenalidomida é uma droga promissora no tratamento do
mieloma múltiplo por ter demonstrado grande atividade e baixo perfil de efeitos
colaterais em comparação à talidomida. Estudos de fase III com regimes baseados
nesta droga (melfalam, prednisona e lenalidomida – MPR) estão em andamento e os
resultados são aguardados para que se possa fazer recomendação para o uso desta
droga no tratamento inicial do MM.
4. Quimioterapia agressiva: pode ser utilizada nos casos refratários ou com
progressão aos regimes citados anteriormente. As principais drogas que podem ser
utilizadas são: ciclofosfamida, carmustina, vincristina, doxorrubicina, entre outras.
5. Bisfosfonados: devem ser utilizados como tratamento complementar nos
pacientes com doença óssea, com objetivo de redução de eventos ósseos associados
à doença. Os principais agentes desta classe são o ácido zoledrônico, o pamidronato
e o clodronato.
Pacientes Candidatos ao TCH
Os principais regimes utilizados no tratamento de indução antes do TCH são:
talidomida e dexametasona (TD), bortezomibe e dexametasona (VD), bortezomibe,
talidomida e dexametasona (VTD) e lenalidomida e dexametasona (RD). Deve-se
buscar realizar o TMO autólogo para todos os doentes elegíveis para este tratamento.
O TCH autólogo não é uma terapêutica curativa, porém aumenta a sobrevida livre de
doença e a sobrevida global em até 1 ano quando comparada com a quimioterapia
usual. O TMO alogênico tem alta mortalidade, e recentemente tem sido estudado o
uso de TMO alogênico não mieloablativo (“minitransplante”).

TÓPICOS IMPORTANTES
O mieloma múltiplo (MM) é uma gamopatia monoclonal caracterizada pela
presença de paraproteinemia, lesões líticas ósseas, hipercalcemia, insuficiência renal
e anemia.
Acomete sobretudo idosos e negros.
Doença de etiologia desconhecida, e ainda não se sabe muito a respeito dos
fatores de risco para o seu aparecimento.
Os principais sintomas são cansaço, dores ósseas, perda de peso e
infecções recorrentes.
O diagnóstico deve ser feito com base na demonstração de pico monoclonal
no sangue e/ou urina, plasmacitose medular e presença de lesão em órgãos-alvo
(anemia, hipercalcemia, lesões líticas, insuficiência renal). Faz-se diagnóstico
diferencial com outras neoplasias plasmocitárias, especialmente a GMSI.
O tratamento envolve o uso de esquemas quimioterápicos para reduzir a
massa tumoral, e transplante autólogo quando possível. Em alguns casos, a doença
está em um estágio inicial e pode-se optar apenas pela observação.

Você também pode gostar