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INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS E EDUCAÇÃO A DISTANCIA

Departamento de ciências e educação

Curso de licenciatura em ensino de Hermenêutica e interpretação do texto.

Titulo:

A FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA COMO O MEIO DE COMPREEÇÃO E


INTERPRETAÇÃO DE NORMAS JURÍDICAS.

Nome: Dioclêncio Augusto Nhamposse

Xai-xai, Setembro de 2021


Índice.

Índice…………………………………………………………………………………..3

A Fundamentação Jurídica como o principal meio de Compreensão.………………...5

Interpretação das Normas Jurídicas…………………………………………………...8

Preceito e norma, uma distinção temporal……………………………………………8

Interpretação em sentido amplo vs. Interpretação em sentido restrito……………….11

Interpretação doutrinal vs. Interpretação autêntica…………………………………..11

Elementos de interpretação…………………………………………………………..12

Interpretação Conforme à Constituição……………………………………………...13

Conclusão…………………………………………………………………………….15

Bibliografia…………………………………………………………………………...16
Introdução.

A interpretação das leis em geral visa focalizar determinada relação jurídica, identificando de
forma clara e exata a norma estabelecida pelo legislador e que deve ser aplicada ao caso
concreto. E esta não se confunde com a hermenêutica jurídica que corresponde à parte do
Direito enquanto ciência que tem por objeto o estudo e a sistematização dos processos que
devem ser utilizados para que a interpretação se realize. Portanto, a interpretação consiste em
aplicar as regras, que a hermenêutica perquire, sistematiza e ordena, para bom entendimento e
aproveitamento dos textos legais. Em verdade a interpretação dos textos legais e de normas
jurídicas se relaciona diretamente com a eficácia do ordenamento jurídico. Conveniente
lembrar que tanto a hermenêutica como a interpretação não se restringem aos estreitos termos
da lei ou da norma jurídica posto que em razão de sua generalidade em sua forma possui
naturalmente suas limitações. Obviamente que a definição do direito não apenas corresponde
àquilo que a lei exprime e, que se deve endereçar tanto a hermenêutica como a interpretação,
num esforço em alcançar finalmente o que o legislador não conseguiu bem expressar de forma
clara e segura. Tal atividade nem sempre foi do intérprete.

Lembremos que no passado remoto, existiam sérias restrições à interpretação, vide o terceiro
parágrafo do Digesto, onde Justiniano determinou a proibição de haver comentários
interpretativos à sua compilação tipificando o crime de falso condenando tais obras a
apreensão e destruição. Aliás, etimologicamente a interpretação vem do latim interpretatio, do
verbo interpretar que significa explicar, traduzir, comentar ou esclarecer. Na acepção jurídica
corresponde a tradução do sentido ou do pensamento que seja contido em lei, na decisão
judicial, no ato ou contrato. Através da interpretação o que se procura é sondar a intenção ali
embutida na norma, ou seja, fixar a inteligência verdadeira do que se interpreta para que assim
se possa cumprir fielmente o pensamento ou a intenção do legislador.

Interpretar serve para esclarecer ou explicar por outras palavras, o exato sentido do escrito e,
não deve ir além da intenção objetivamente positivada. Portanto, não deve a interpretação
pender mais para a anulação do que para a validade. Interpretar significa remontar de um
signo ao seu significado, parece indicar o modo de perceber, de entender algo apresentado
pelo mundo externo. A interpretação na Idade Média se expressou através de Boécio que
comentou o tratado de Aristóteles, e encontra-se também em Tomás de Aquino, prendia-se à
gramaticalidade do texto, onde a retórica foi rapidamente substituída pela dialética. Desta
forma, interpretar significa trazer a lume um sentido oculto, o que acentua ainda mais o
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humanismo principalmente por algumas obras de pensadores como Marsílio Ficino e Pico
dela Mirandola, permitindo o maior acesso das pessoas do âmago do texto interpretado.
Portanto, juridicamente a interpretação exprime uma tradução, revelação, determinação
contida na intenção do escrito para que afinal se encontre a exata aplicação, originariamente
desejada.

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A Fundamentação Jurídica como o Principal Meio de Compreensão e Interpretação das
Normas Jurídicas.

 A Fundamentação Jurídica como o principal meio de Compreensão.

Conveniente lembrar que tanto a hermenêutica como a interpretação não se restringem aos
estreitos termos da lei ou da norma jurídica posto que em razão de sua generalidade em sua
forma possui naturalmente suas limitações. Obviamente que a definição do direito não apenas
corresponde àquilo que a lei exprime e, que se deve endereçar tanto a hermenêutica como a
interpretação, num esforço em alcançar finalmente o que o legislador não conseguiu bem
expressar de forma clara e segura. Tal atividade nem sempre foi do intérprete. Lembremos
que no passado remoto, existiam sérias restrições à interpretação, vide o terceiro parágrafo do
Digesto, onde Justiniano determinou a proibição de haver comentários interpretativos à sua
compilação tipificando o crime de falso condenando tais obras a apreensão e destruição.
Aliás, etimologicamente a interpretação vem do latim interpretatio, do verbo interpretare que
significa explicar, traduzir, comentar ou esclarecer. Na acepção jurídica corresponde a
tradução do sentido ou do pensamento que seja contido em lei, na decisão judicial, no ato ou
contrato. Através da interpretação o que se procura é sondar a intenção ali embutida na norma,
ou seja, fixar a inteligência verdadeira do que se interpreta para que assim se possa cumprir
fielmente o pensamento ou a intenção do legislador. Interpretar serve para esclarecer ou
explicar por outras palavras, o exato sentido do escrito e, não deve ir além da intenção
objetivamente positivada. Portanto, não deve a interpretação pender mais para a anulação do
que para a validade. É o que se deduz do brocardo.(quando houver dúvida, preferencialmente
se deve aceitar a interpretação para a validade do ato do que o anular). Isto significa que a
interpretação não deve admitir o absurdo, e deve procurar fixar a intenção que se quer
traduzir, sem o invalidar. Também se recomenda diante da causa ambígua deve interpretar-se
de tal sorte que a coisa fique a salvo para o autor. Diante de expressões ambíguas, deve-se
atender mais particularmente à intenção de quem ater-se mais ao sentido do que às palavras, e
observando ainda que qualquer variante nos fatos faz variar também o direito. Interpretar
significa remontar de um signo ao seu significado, parece indicar o modo de perceber, de
entender algo apresentado pelo mundo externo.

A interpretação na Idade Média se expressou através de Boécio que comentou o tratado de


Aristóteles, e encontra-se também em Tomás de Aquino, prendia-se à gramaticalidade do
texto, onde a retórica foi rapidamente substituída pela dialética. Desta forma, interpretar
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significa trazer a lume um sentido oculto, o que acentua ainda mais o humanismo
principalmente por algumas obras de pensadores como Marsílio Ficino e Pico dela Mirandola,
permitindo o maior acesso das pessoas do âmago do texto interpretado.

Portanto, juridicamente a interpretação exprime uma tradução, revelação, determinação


contida na intenção do escrito para que afinal se encontre a exata aplicação originariamente
desejada. Inicialmente se concluiu só devia interpretar o que não está claro, o que justificava
plenamente outro brocardo: interpretatio cessat in claris. Porém, contemporaneamente a
necessidade da interpretação principalmente a jurídica foi ratificada assim sempre deve
ocorrer a fim de prestigiar os valores supremos tutelados pela ordem jurídica, especialmente
os direitos fundamentais, as garantias constitucionais e, particularmente o respeito à dignidade
humana.

A preocupação com a fundamentação das decisões judicias, com a metodologia jurídica


utilizada pelos juízes para chegar a um veredito ou com a interpretação e a argumentação
adotadas nas sentenças aparece em diversos dispositivos do novo CPC. Contudo, o epicentro
da nova regulação legislativa da decisão judicial é inegavelmente o art. 489, §§ 1.º e 2.º, do
texto legal. 3 Tem-se dito que esse conjunto de dispositivos legais impõe ao juiz um "dever de
fundamentação analítica", mas a minha impressão é que essa leitura não explica
suficientemente a mudança radical de concepção teórica acerca da natureza da decisão
judicial embutida nas diretrizes normativas do novo Código. Esses dispositivos contêm uma
série de comandos diretivos da fundamentação judicial, que podem ser compreendidos como
deveres ou proibições que incidem sobre a fundamentação das decisões judiciais. O texto
utiliza uma redação negativa para instituir esses comandos diretivos. A oração "não se
considera fundamentada" quer significar ou que o juiz não pode fundamentar de determinadas
formas, ou que está obrigado a fundamentar de acordo com determinadas exigências. Na
redação desses enunciados legais transparecem preocupações muito mais complexas e
ambiciosas em relação à fundamentação das decisões judiciais do que aquelas que
mobilizaram a lei processual anterior. Proponho a seguinte reconstrução analítica dos deveres
de fundamentação prescritos no art. 489:

• A construção da premissa maior do raciocínio judicial não pode se limitar à mera referência
genérica ao dispositivo legal que o juiz entende incidente no caso sub judice. O juiz deve
explicar por que entende que incide no caso o dispositivo que está aplicando e qual o

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significado que atribui ao texto desse dispositivo. A explicação deve ser feita mediante
argumentos racionais e objetivos;

• Quando aplicar conceitos jurídicos particularmente indeterminados, como dignidade


humana, solidariedade, culpa, boa-fé, função social da propriedade ou dos contratos, o juiz
deve determinar o significado que está atribuindo ao conceito mediante argumentos racionais
e objetivos e deve explicitar as razões pelas quais o caso concreto é uma instância de
incidência do conceito.

• A fundamentação de uma decisão judicial não pode se manter no nível da generalidade e da


abstração. O juiz deve demonstrar que os argumentos que está empregando para decidir se
ajustam aos fatos objeto do processo que está julgando. Ao utilizar enunciados legais ou
precedentes judiciais como fundamentos jurídicos da decisão, o juiz deve explicitar
analiticamente por que eles se ajustam às circunstâncias jurídicas e factuais do caso.

• O juiz deve observar regras de ética discursiva na construção da decisão, respeitando as


partes e intervenientes do processo judicial como agentes racionais e razoáveis que
apresentam propostas legítimas de interpretação dos fatos, dos textos legais e de precedentes
judiciais merecedoras de cuidadosa consideração. O juiz deve compreender o processo
judicial como uma prática institucional dialógica e respeitosa da autonomia argumentativa dos
seus participantes.

• Ao recorrer ao método da ponderação de bens, valores, fins ou interesses na decisão judicial


para resolver casos de colisão entre normas ou direitos, o juiz deve também utilizar uma
fundamentação analítica, que esclareça por que razões jurídicas, técnicas ou fáticas uma
norma ou um direito deve ser protegido e o outro sacrificado, procurando reduzir ou eliminar
a subjetividade da escolha realizada. Como se pode constatar, trata-se de um cenário
completamente diferente do subjacente ao CPC/1973. O novo Código parte de uma
compreensão muito mais complexa e refinada da decisão judicial. A nova concepção pode ser
examinada desde vários ângulos, desde a teoria do direito até a dogmática do processo civil.
Há dois aspectos, contudo, que chamam a atenção desde o ponto de vista da teoria do direito.
O primeiro refere-se a uma melhor compreensão da pervasividade (perdoem-me o anglicismo)
da indeterminação semântica dos textos legais. Diferentemente do Código anterior, que se
satisfazia com uma concepção formalista e cognitivista da decisão judicial, o novo estatuto
reconhece que os enunciados normativos dos textos legais sempre contêm algum nível de

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indeterminação e que o seu significado abstrato e concreto é sempre determinado pelo juiz ao
interpretá-los.

Interpretação das Normas Jurídicas.

Interpretação É um fenómeno comunicativo que estabelece relação de conhecimento entre o


intérprete e o objeto, uma atividade inteligência dirigida à apreensão do sentido de um objeto.
Ao interpretar, capta-se o sentido de algo. É uma tarefa que existe em todas as áreas do saber.
Para o que nos interessa, é um processo tendente à identificação de um ou mais signos
jurídicos.

Em que se distingue a interpretação jurídica das demais? A interpretação jurídica pretende a


extração de um propósito normativo que traz consigo um comando dirigido à ação ou à
abstenção. (Exemplo: a associação de cores constitui um sistema normativo no tráfego
rodoviário – atribui-se às cores um comando de permissão e proibição, comandos esses que
acabam por significar regras jurídicas: o vermelho, por exemplo, é uma norma proibitiva. No
fundo, as cores, por si, não possuem significância jurídica, só com a junção de um sistema
normativo triangular, o tal propósito normativo, que só se extrai mediante interpretação –
jurídica - é que ganharam normatividade jurídica).

A interpretação jurídica é, então, um sistema lógico e complexo marcado por uma intenção
normativa sob um enunciado linguístico. Procura conferir um sentido normativo para ser
aceite com plausibilidade. A interpretação jurídica pretende, a partir da fonte, chegar à regra.
A casa de partida é uma fonte, um enunciado linguístico, e a casa de chegada, o resultado é
uma norma o caminho percorrido entre as duas casas é a interpretação.

A interpretação é o movimento fundamental que caracteriza toda a ordem jurídica.

 Preceito e norma, uma distinção temporal

O preceito é o enunciado linguístico que contém o objeto da interpretação; a norma é a


consequência, o resultado da interpretação do preceito, é algo a posteriori, decorre da
atribuição de um significado jurídico ao preceito. É por isso que se diz não haver coincidência
entre enunciado (preceito) e norma – e um enunciado pode conter várias normas.

1. Direito de fruir dos bens;

2. Direito de transmitir a propriedade;


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3. Direito de não ser privado da propriedade;

4. Dever de observar as restrições legais.

Mas, pelo contrário, existem normas sem respetiva proveniência de enunciado linguístico:
podemos considerar, para o efeito, as normas consuetudinárias, ainda que há quem argumente
que provêm de enunciados verbais. Mas é o caso, sobretudo, do exercício interpretativo no
âmbito da interpretação enunciativa (que mais à frente se desenvolve). Aqui, constrói-se uma
norma a partir de um processo lógico-formal. Exemplo: proibição de escrita com caneta
vermelha nos documentos entregues à FDUNL. Desta norma, por meio da interpretação
enunciativa, podem ser retiradas outras (por processo lógico-formal) que não constavam
diretamente do enunciado linguístico: permissão de escrita a verde, permissão de escrita a
azul, - Interpretação/Argumento a contrario (um argumento perigoso… muito utilizado em
duas áreas jurídicas: Direito Penal, no âmbito do que é postulado no art. 29º CRP, só os
comportamentos vedados estão efetivamente vedados, as penas têm de estar expressamente
previstas, por motivos de certeza e segurança jurídica – logo, o que não é proibido, tem-se por
permitido; e Direito Fiscal).

Outro exemplo: uma lei que proíbe os professores universitários de alugar/arrendar o seu
património aos alunos. Através de um processo lógico-formal, podemos deduzir que também
não podem vender (segundo a máxima de que quem não pode o menos, não pode o mais).
Nota: o termo alugar aplica-se a bem móveis; arrendar é para bens imóveis.

A questão da interpretação é complexa: um enunciado linguístico pode ter espaço para várias
interpretações, todas elas diferentes entre si e com consequências diversas. Exemplo:
proibição de estar ao telemóvel enquanto se conduz. Alguém para num sinal vermelho e
resolve mandar uma mensagem.

Para além disso, no âmbito da interpretação, não podemos olhar de forma estática para a
fonte que contém o enunciado que estamos a analisar. É necessário interpretar uma fonte
tendo em conta as outras. Exemplo: art. 36º CRP tem de ser interpretado em consonância com
a Convenção Europeia dos Direitos Humanos (não obstante ser esta uma fonte
infraconstitucional). E, aqui, a jurisprudência ganha relevância. Há na nossa ordem jurídica
cada vez mais conceitos indeterminados, preceitos abertos que valem ao juiz a tarefa de
desenvolver o direito, ou mesmo por meio de lacunas na lei. O juiz não é, não pode ser, só a
boca que diz a lei (Montesquieu).

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Nota: conceitos indeterminados – os conceitos claros são essenciais para garantir a certeza e
segurança da nossa ordem jurídica, é certo; mas, por outro lado, e sobretudo nos tempos
atuais, precisa de se abrir à mudança das conceções sociais e às alterações da vida trazidas
pela sociedade técnica, ou seja, precisa de se adaptar e de se fazer permeável aos seus
próprios fundamentos ético-sociais. Fá-lo através dos conceitos indeterminados e das
cláusulas gerais, a parte “movediça” do nosso ordenamento, dado servirem para ajustar e fazer
evoluir a lei no sentido de a levar ao encontro das mudanças e das particularidades das
situações da vida. Exemplos: conceitos carecidos de preenchimento valorativo como boa-fé,
bons costumes, caso de urgência, justa causa. A utilização destes conceitos indeterminados e
o recurso a cláusulas gerais é vital para garantir a adaptação da norma à complexidade da
matéria a regular, às particularidades do caso ou à mudança das situações. Contribuem para a
individualização da solução – “cada caso é um caso”.

Quando interpretamos determinada fonte, precisamos de lhe extrair alguma regra, porque é
esta o intermediário indispensável para se chegar à solução dos casos concretos.

 Interpretação em sentido amplo vs. Interpretação em sentido restrito:


 Interpretação em sentido amplo – abrange a integração de lacunas e a interpretação
em sentido restrito. O objetivo é chegar à solução do caso concreto. Busca, dentro do
ordenamento, da regra aplicável numa situação concreta. Se se encontra, fixa-se na
fonte e completa-se a interpretação em sentido restrito; se não se encontra, deverá
proceder-se à integração dessa lacuna.
 Interpretação em sentido restrito – opõe-se à integração de lacunas. O objetivo é
determinar o sentido de uma fonte.

 Interpretação doutrinal vs. Interpretação autêntica:


 Interpretação doutrinal – não tem qualquer repercussão sobre as fontes em causa –
interpretação realizada por qualquer pessoa ou pelo julgador.
 Interpretação autêntica – realizada por uma fonte que não é hierarquicamente
inferior às fontes interpretadas. Quando uma lei – a lei interpretativa - nos dá o
critério da interpretação. Há interpretação autêntica quando a nova lei se integra na lei
interpretada (materialmente). Quem confecionou a norma, esclarece o seu sentido
originário, interpreta tendo em conta o pressuposto de que elaborou o que está a
interpretar.

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A interpretação é sempre necessária: não é válido o brocardo in claris non fit interpretatio,
porque é contraditório – para sabermos que determinado enunciado é evidente tivemos de o
interpretar. Tem sempre de haver uma tarefa intelectual, por mais simples que seja, como
condição para extrair da matéria o espírito que a matéria encerra. É, pois, compreensível que
tal tenha de acontecer porque, como já vimos, a interpretação é condição imprescindível da
determinação de toda a regra.

A interpretação é necessária para fixar o sentido e o alcance com que o texto legal deve valer.

 Elementos de interpretação

Elementos literais e extraliteral têm sempre de ser utilizados conjuntamente.

 Elemento literal (letra da lei): tem em conta a letra da lei, o que está escrito no
enunciado linguístico. O art. 9º CC é claro: não nos podemos afastar da letra da lei – a
letra não é só o ponto de partida da interpretação como um elemento irremovível. Mas,
se esta for elástica, é possível argumentar em vários sentidos, afastarmo-nos um pouco
de uma interpretação unicamente literal. Contudo, se prescindimos totalmente do
texto, já não há interpretação da lei, pois já não estaremos a pesquisar o sentido que se
alberga numa dada exteriorização. Apesar de tudo, é preciso cuidado com a
polissemia/ambiguidade dos termos da letra da lei. Exemplo: a palavra "direito" vem
referenciada nos textos legislativos inúmeras vezes, contendo significações distintas.
A literalidade, só por si, é insuficiente para elucubrarmos o sentido da norma. A letra
não permite mais do que traçar um catálogo de sentidos à partida possíveis. Mas pode
afirmar-se que o entendimento literal será tendencialmente aquele que virá a ser aceite,
porque se presume que o legislador consagra as soluções mais acertadas e que se
soube exprimir nos termos mais adequados – art. 9º/3 CC. O processo interpretativo
não termina aqui, é necessária uma tarefa de interligação e valoração, que excede o
domínio literal:
 Elementos extraliterais (espírito da lei):
 Elemento sistemático - pensar no direito como um sistema (uno). Há que olhar para
um preceito e estabelecer com outros que se lhe relacionem concatenações

Permanentes – a interpretação de uma fonte não se pode fazer isoladamente, toda a fonte se
integra numa ordem. Este elemento tem um alcance larguíssimo, e é muito valorizado.
Obriga-nos a fazer um exercício de relação normativa que, na estratificação hierárquico-

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normativa, nos leva de baixo até cima para depois voltarmos para baixo, já com os elementos
suficientes para conseguirmos interpretar corretamente, isto é, com todos os dados
relativamente a categorias hierárquico-jurídicas superiores. Dentro do elemento sistemático,
temos três tipos de relações:

 Relação de subordinação: ligar a proposição a princípios mais vastos, gerais, que lhe
atribuem um conteúdo. Aqui se enquadra o princípio da interpretação conforme à
constituição.

Nota: Se se trata de normas internas... Interpretação conforme à Constituição. Se se trata de


normas de Direito da U.E. Interpretação conforme ao Direito da U.E., mesmo que isso vá
contra o Direito Português.

Princípios gerais de direito – um sistema tem de ser travejado e percorrido por orientações
fundamentais, de que resulta justamente a sua unidade. Estes princípios correspondem às
grandes coordenadas do ordenamento jurídico, merecendo o mesmo respeito e
obrigatoriedade da própria lei. Estes princípios não são normas, têm um caráter mais flexível.
Exemplos: princípio da boa-fé, princípio da conservação dos negócios jurídicos. Um princípio
é algo a meio caminho entre um valor e uma regra: concretiza através de uma opção por uma
regulação material o valor, mas não dispensa a mediação ulterior da regra. É um passo na
concretização de valores, que não dispensa nova concretização ulterior, através de uma regra.
Subdividem-se em materiais e formais.

Interpretação Conforme à Constituição:

Como sabemos, a Constituição está no topo da ordem jurídica interna, todas as normas se lhe
subordinando - elemento hierárquico-formal.

É a Constituição que alberga os princípios fundamentais do sistema jurídico, e estes


parametrizam a interpretação. Logo, a Constituição está sempre presente na atividade do
intérprete-aplicador, porque os princípios fundamentais que apresenta são omnipresentes no
alcance e sentido da ordem jurídica.

A interpretação conforme à Constituição é um critério, com dois propósitos hermenêuticos


(hermenêutica = exegese = interpretação) fundamentais:

 Existindo várias interpretações possíveis de um preceito legal, deve optar-se por


aquela que leva mais longe a concretização das finalidades, dos objetivos

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constitucionais. Ou seja, maximização das normas constitucionais - Postulado de
Maximização das Normas Constitucionais ou Interpretação Orientada para a
Constituição.
 Existindo várias interpretações possíveis de um preceito legal, devemos optar por uma
interpretação constitucionalmente conforme, ou seja, pelo sentido que não permita
inconstitucionalidades. Escolher o modo de interpretação que, de todos, seja o que
ofereça menos dúvidas em relação às questões de inconstitucionalidade.

Pode suceder a entrada em conflito destes dois postulados. Exemplo: um Decreto-lei do


Governo que permite a aquisição de 10% de uma sociedade por quem já possuía 90%.
Olhando para esta norma da perspetiva do primeiro postulado, a maximização de normas
constitucionais obtém-se através da não obrigatoriedade de venda por parte dos acionistas
minoritários; mas, analisando o DL com a perspetiva do segundo postulado, a Constituição é
maximizada se entendermos que a norma é da reserva absoluta da A.R., não podendo ser
objeto de legislação por parte do Governo (a norma é inconstitucional).

É por isto que existem situações de declaração de inconstitucionalidade, ainda que hajam
opções de interpretação que não originem esta situação.

Na interpretação conforme, temos também situações de interpretação de normas


constitucionais em relação a outras do mesmo tipo. Critério de ponderação dos bens em
conflito - quando há direitos constitucionais em conflito num caso. Não existem, portanto,
direitos superiores. Deve estabelecer-se uma sã convivência entre direitos. O nosso CC fala
sobre esta questão: art. 335º CC. Aplica-se o princípio da proporcionalidade - "devem os
titulares ceder na medida do necessário.

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Conclusão.

O objetivo desta síntese de três concepções modernas diferentes acerca da interpretação


jurídica e da decisão judicial foi tentar explicar por que se justifica a preocupação do novo
Código de Processo Civil em adotar o dirigismo interpretativo acerca da fundamentação das
decisões judiciais. Trata-se, portanto, de oferecer uma contribuição à dogmática do processo
civil brasileiro a partir da teoria do direito. Como se viu ao longo do ensaio, há, atualmente,
uma clara consciência de que a interpretação jurídica é um fenômeno muito diferente e mais
complexo do que parecia supor o CPC/1973. Seja a decisão judicial uma atividade total ou
parcialmente discricionária, que envolve essencialmente uma escolha entre diversas
possibilidades de interpretações dos textos legais, seja uma atividade de construção holística
de respostas moralmente certas, é certo que o raciocínio dedutivista e silogístico não reflete a
fenomenologia da interpretação jurídica. Nesse sentido, deve ser compreendido como um
importante avanço na disciplina das decisões proferidas por juízes e tribunais brasileiros. No
mínimo parece ser um definitivo abandono do formalismo ingênuo e redutor do sistema
anterior e um estímulo para que os dogmáticos e os atores judiciais admitam que somente uma
fundamentação responsável e adequada das decisões pode legitimar os julgamentos judiciais,
sejam eles pura criação de direito novo, sejam refinadas construções de um direito ideal.
Muito mais do que impor uma "fundamentação analítica", o Código exige dos juízes que
aceitem e assumam consciente e ativamente a extrema complexidade do processo
interpretativo que precede toda decisão judicial. Ou seja, o dever de fundamentação analítica
deve ser compreendido não como um fim em si mesmo, mas como uma determinação legal
dirigida aos juízes para explicitarem responsavelmente as razões das escolhas ou das
construções interpretativas que precedem suas decisões. Assim entendido, o art. 489 e seus
parágrafos são uma importante contribuição para a consolidação de uma jurisdição ajustada
ao ideal de Estado Democrático de Direito adotado pela Constituição Federal de 1988.

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