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Profª. Elsa Maria L. S.

Ferreira Pepino 1
OAB-ES n. 4.962
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TEORIA GERAL DO PROCESSO

PONTO 8 COMPETÊNCIA: conceito; distribuição; órgãos judiciários diferenciados;


atribuição das causas aos órgãos; Competência absoluta e relativa: prorrogação da
competência; prorrogação da competência e prevenção.

1. COMPETÊNCIA

Viu-se que a jurisdição é o poder, a função e atividade estatal de aplicar o direito, que
atua por meio dos juízes e tribunais de modo a obter a pacificação das lides. Apesar de
una e indivisível, por razões organizacionais e práticas, a jurisdição é exercida por
vários órgãos (juizes e tribunais). Cada um destes órgãos é investido de Jurisdição, isto
é, recebe abstratamente a prerrogativa de exercer a função jurisdicional. No entanto, a
multiplicidade e variedade de processos, bem como a multiplicidade de órgãos
jurisdicionais, torna clara que para uma evolução racional do trabalho, essa pluralidade
de processos tem de ser repartida pelos múltiplos órgãos investidos de Jurisdição.
Significa dizer que, apesar de investido de Jurisdição, um juiz não está habilitado a
resolver todos os conflitos, mas apenas aqueles que a lei lhe atribui competência para
julgar, ou seja, cada órgão jurisdicional exerce a Jurisdição dentro de determinados
limites, os limites da sua habilitação, ou seja, da sua competência.

Assim, a Jurisdição “[...] que é uma só e atribuída abstratamente a todos os órgãos


integrantes do Poder Judiciário, passa por um processo gradativo de concretização, até
chegar à determinação do juiz competente para determinado processo” (CINTRA,
GRINOVER e DINAMARCO, 2004, p. 230).

1.1 CONCEITO;

Competência, portanto, “[...] é o poder que tem um órgão jurisdicional de fazer atuar a
jurisdição diante de um caso concreto” (GRECO FILHO, 2003, p. 170). Por outras
palavras, competência é o mecanismo que vai permitir in concreto o exercício da
jurisdição, especificando a esfera de atuação de cada órgão jurisdicional.

É um poder limitado previamente pela Constituição e pela lei, de modo que cada órgão
jurisdicional é habilitado para resolver especificamente determinado grupo de litígios.
Desse modo, “[...] cada órgão judicial só poderá concretizar o exercício jurisdicional na
exata medida que as regras de competência determinarem se ele é ou não competente
para julgar a demanda” ( RODRIGUES, 2003, p. 182).

A distribuição de competência pela multiplicidade dos órgãos jurisdicionais que


integram a estrutura do Poder Judicial é levada a cabo por meio de critérios variados –
os critérios determinadores de competência.

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No Brasil, dada a forma federativa do Estado, a distribuição da competência é feita em


diversos níveis jurídico-positivos:

1- na Constituição Federal é feita a distribuição de competência de cada uma das


Justiças e dos Tribunais Superiores da União;
2- na lei federal (CPC, CPP, CLT etc) principalmente as referentes ao foro
competente (comarca);
3- nas Constituições estaduais é determinada a competência dos tribunais locais;
4- nas leis de organização judiciária estão as regras de competência de juízo
(varas especializadas) (CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO, 2004, p. 231).

1.2 DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA

São diversos os critérios de distribuição de competência utilizados pelo legislador,


como, por exemplo, a matéria objeto do litígio, o sujeito demandado, o pleito
formulado, o local do fato que deu origem à ação e o valor da causa. Tais critérios
é que vão permitir descobrir qual o órgão jurisdicional competente para julgar um
determinado caso concreto.

A estrutura da organização judiciária brasileira caracteriza-se:

a) pela existência do Supremo Tribunal Federal (STF) e Superior Tribunal de Justiça


(STJ), dois órgãos jurisdicionais isolados, acima de todos os outros órgãos;
b) pela existência de diversos organismos jurisdicionais autônomos entre si (as
diversas "Justiças");
c) pela existência, em cada "Justiça", de órgãos judiciários superiores e órgãos
inferiores (o duplo grau de jurisdição);
d) pela divisão judiciária, com distribuição de órgãos judiciários por todo o território
nacional (comarcas, seções judiciárias);
e) pela existência de mais de um órgão judiciário de igual categoria no mesmo lugar
(na mesma comarca, na mesma seção judiciária);
f) pela instituição de juízes substitutos ou auxiliares, com competência reduzida.
(CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO, 2004, p. 232),

Em face dessas características, a distribuição de competências pelos órgãos


jurisdicionais faz-se no plano vertical, mas também no plano horizontal.

Assim, perante um caso concreto faz-se necessário descobrir qual o órgão competente
para julgar essa ação. Tal descoberta faz-se por etapas sucessivas, segundo um
processo lógico de eliminação gradativo. Tais etapas são as seguintes:

1) Definição da competência da Justiça Brasileira face aos demais Estados


Soberanos.

Consiste esta primeira etapa em responder à questão: é competente a Justiça


brasileira para julgar tal ação? Trata-se, pois, de saber se a jurisdição brasileira
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pode atuar sobre a causa em questão. Para isso é necessário saber quais são os
casos sujeitos à jurisdição nacional e a resposta se encontra nos artigos 21 a 23 do
NCPC, que tratam especificamente dos limites da jurisdição nacional, que no CPC/73
era designado de competência internacional 1.

2) Definição da justiça competente (competência “de jurisdição”)

Viu-se que nossa estrutura judiciária se reparte em órgãos judiciários federais e


estaduais, além do STF e do STJ, órgãos de cúpula cuja finalidade principal é a
preservação do direito positivo. Nesta etapa impõe-se descobrir se a causa se
submete à jurisdição federal ou à jurisdição estadual, sem esquecer que a justiça
federal, além da competência comum, comporta três ramos especiais – trabalhista,
eleitoral e militar -, definidos segundo critérios materiais (natureza da relação jurídica
material controvertida) pela própria Constituição Federal.

Assim, para determinar qual a justiça competente, o primeiro passo é verificar se a


causa se encaixa na competência das “justiças” especiais que se encontra definida na
CF/88 (art. 114, competência da Justiça do Trabalho; art. 121, a competência da
Justiça Eleitoral; art. 124, a competência da Justiça Militar e art. 125, §§ 3º e 4º, a da
Justiça Militar Estadual). Não sendo da competência de nenhuma delas, há que se
analisar a competência da Justiça Federal Comum, também definida pela
Constituição (art. 109, CF/88). Finalmente, não sendo da competência da Justiça
Federal (comum), a lide é da competência da Justiça Estadual, a justiça mais comum
de todas.

É de notar que há situações específicas que não se integram na competência de


nenhuma das Justiças, pois são atribuídas pela CF/88 originalmente ao Supremo
Tribunal Federal (art. 102, I) ou ao Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I), devido,
principalmente, à condição das partes ou à natureza do processo.

3) Definição do órgão, superior ou inferior, que é competente (competência


originária).

Como na organização de cada uma das “Justiças” existem órgãos jurisdicionais


superiores (tribunais) e inferiores (juízes) impõe-se saber quem deve conhecer
originalmente a lide. Em regra, a competência originária é dos órgãos inferiores, ou
seja, os órgãos judiciários de primeiro grau de jurisdição ou de “primeira instância”. As
exceções a essa regra são sempre apontadas, seja na CF/88, no que se refere à
competência originária do STF (art. 102, I), do STJ (art. 105, I) e dos Tribunais
Superiores de cada uma das Justiças. Por sua vez, a competência originária dos
tribunais de cada justiça (trabalhistas, eleitorais, militares) é estabelecida por lei federal
(CF, arts. 113, 121 e 124, § único) e pelas Constituições dos Estados, a competência
originária dos Tribunais de Justiça dos Estados (CF, art. 125, § 1º).

1
Segundo Cintra, Grinover e Dinamarco (2004, p. 231), a questão não diz respeito a um problema de competência,
mas de jurisdição, pois quando se diz que nenhum juiz brasileiro é competente para conhecer a ação, o que se está a
dizer na verdade é que falta à autoridade brasileira o próprio poder a ser exercido.
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4) Definição da comarca ou da Seção Judiciária competente (competência


territorial)

Definida a Justiça competente e eliminada a competência originária dos seus órgãos


superiores, é necessário identificar o local onde a lide deve ser proposta, ou seja, é
necessário encontrar o foro competente, a sede do juízo, a circunscrição brasileira
habilitada a conhecer a lide.

Foro é o espaço geográfico onde o juiz exerce a sua jurisdição. Na Justiça dos Estados
chama-se comarca; na Justiça Federal chama-se seção judiciária. Assim, por exemplo,
o foro do Tribunal de Justiça do Espírito Santo é todo o território do Estado do Espírito
Santo. Já o foro do juiz da 1ª Vara de Família de Vitória é a comarca de Vitória.

A competência de foro (territorial) é disciplinada pormenorizadamente pelas leis


processuais (CPC, CPP, CLT etc).

5) Definição da Vara competente (competência de juízo)

Encontrado o foro é necessário descobrir o juízo competente, isto é, o órgão judicial


competente, já que num mesmo foro há comumente vários juízos. As regras de
determinação do juízo competente são estabelecidas pelas leis de organização
judiciária dos Estados.

1.3 CRITÉRIOS DE DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA

Para cada uma das etapas de verificação de competência analisadas acima o


legislador nacional utilizou critérios para determinação da competência, estudam-se
agora esses critérios.

1.3.1 Competência Justiça Brasileira – critério espacial

Como a competência da Justiça Brasileira é uma questão de jurisdição, pois se trata de


saber se o Poder Judiciário pode atuar em determinada lide, o critério básico utilizado
pelo legislador para definir a competência é o critério espacial, o poder jurisdicional é
exercido nos limites do território, o que se prende à própria soberania nacional.

A matéria é regulada, como se disse, pelos arts. 21 a 23 do NCPC, que indicam as


situações em que a jurisdição brasileira deve prevalecer sobre qualquer outra jurisdição
estrangeira.

A competência internacional pode ser exclusiva ou concorrente. É exclusiva quando


somente a autoridade brasileira (NCPC, art. 23) pode julgar a lide, excluindo o poder
jurisdicional de qualquer outro Estado Nacional; é concorrente quando a jurisdição

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brasileira pode ser aplicada conjuntamente com a jurisdição estrangeira (NCPC, arts.
21 e 22).

Nos casos de competência concorrente, a sentença obtida no estrangeiro pode ter


validade no Brasil, desde que devidamente homologada pelo STJ (CF, art.105, I, “i” e
NCPC, arts. 960 a 965).

1.3.2 Competência interna. Critérios múltiplos.

É de lembrar que a organização judicial brasileira conta com órgãos jurisdicionais


federais (Justiça federal) e com órgãos jurisdicionais estaduais (Justiça estadual) e que
a justiça federal, por sua vez, se subdivide em comum e especial, composta, esta
última, pelas justiças trabalhista, eleitoral e militar.

Partindo-se da análise da justiça federal especial para a justiça estadual vê-se que o
legislador lançou mão de critérios diversos. Utilizou-se

1) do critério material para distinguir dentro da Justiça federal as Justiças


especiais (trabalhista, eleitoral e militar) e a Justiça federal comum. Assim, para
determinar a competência das Justiças especiais, o legislador levou em
consideração o conteúdo (natureza) da relação jurídica material
controvertida (lide). Desse modo, uma ação que diga respeito a matéria
trabalhista deve ser julgada pela Justiça do Trabalho, tal qual uma lide que se
relacione com as eleições políticas tem de ser julgada pela Justiça eleitoral e
uma ação que se funde em direito penal militar e na Lei de Segurança Nacional
deve ser solucionada pela Justiça Militar.
2) do critério pessoal e material na determinação da competência da Justiça
Federal comum. Excluída a competência das Justiças especiais a lide cai na
competência comum. Há, então que se analisar a competência da Justiça
Federal (comum), já que esta precede a Justiça comum estadual. Também a
competência da Justiça Federal comum é determinada pela Constituição (arts.
106 a 110) e a análise do texto constitucional, principalmente dos arts 108 e 109,
revela que o critério preponderantemente utilizado pelo legislador na
determinação da competência da Justiça Federal (comum) foi a qualidade das
pessoas (critério pessoal). O art. 45 do NCPC também trata desta
competência pessoal. Assim, se na lide intervier a União, uma autarquia federal
ou uma empresa pública a competência é da Justiça Federal (comum). Além do
critério pessoal, o legislador ainda lançou mão do critério material para a
determinação da competência da Justiça Federal (comum), como, por exemplo,
as causas relativas a direitos humanos (art. 109, V-A) e os crimes contra a
organização do trabalho (art. 109, VI).
3) Do critério residual na determinação da Justiça Estadual. Somente depois de
afastada a competência da Justiça Federal comum se cai na competência
comum geral da justiça estadual. Por isso se diz que a competência da
Justiça estadual é uma competência residual, composta pelas lides que

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sobram depois da especificação das Justiças especiais e da Justiça Federal


comum.

1.3.3 Competência de foro (competência territorial). Critérios múltiplos.

Na determinação da competência de foro mais uma vez o legislador lançou mão de


critérios diferentes e que variam consoante a organização e as particularidades de
cada Justiça. De todo o modo, qualquer que seja a Justiça competente impõe-se
verificar qual o foro competente, ou seja, a circunscrição judiciária em que deve ser
proposta a ação. Entre os critérios adotados destacam-se:

1) o critério geográfico (territorial), cujo objetivo é aproximar o mais possível o


Estado-juiz dos fatos ligados à pretensão do autor;
2) o critério material, que considera a natureza da causa;
3) e o critério em razão da pessoa (demandante ou demandado).

De modo geral, a doutrina aponta que a competência de foro se divide em foro geral
(ou comum) e em foro especial (ou privilegiado). As regras de foro especial
prevalecem sobre as de foro comum e protegem algumas situações ou pessoas
específicas, logo as regras de foro geral só não valem quando houver uma regra de
foro especial.

No processo civil, a competência de foro geral (comum) é disciplinada no art. 46 do


CPC, que determina como regra geral o lugar do domicilio do réu, utiliza, portando, o
critério geográfico. Entretanto, o próprio artigo admite, em seus parágrafos, situações
de competência concorrente (§§ 1º, 3º e 4º) e de competência subsidiária (§ 2º). A
competência territorial especial ou privilegiada, por sua vez, é determinada pelos
artigos seguintes e, como se disse, é adotada por razões de política legislativa e com o
intuito de proteger determinadas situações e pessoas.

No processo penal a regra geral é a do lugar da consumação do crime (CPP, art.


70) e no processo do trabalho a regra é a do local da prestação do serviço (CLT,
art. 651).

1.3.4 Competência de juízo. Critérios múltiplos.

Dentro de um foro (comarca ou seção judiciária) pode haver apenas um juízo, uma
vara, que exerce toda a atividade jurisdicional (competência cumulativa), ou existirem
vários juízos. Nesse processo de distribuição dos processos pelos órgãos jurisdicionais
dentro do mesmo foro, o legislador, novamente, utiliza vários critérios determinantes,
principalmente:

1) o critério material, ou seja, a natureza da relação jurídica discutida, por meio


do qual na Justiça comum estadual se delimita se o juízo competente é o juízo
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penal ou o juízo cível, ou, se dentre estes existem varas especializadas com
relação à matéria discutida na lide (consumidor, meio-ambiente, família, falência,
registros públicos etc);
2) o critério do valor da causa, que determina a competência em consideração do
valor da causa. Por exemplo, os Juizados Especiais Cíveis competentes para
decidir os conflitos civis de valor patrimonial não superior a 40 salários mínimos
(Lei n. 9.099/95, art. 3º), os Juizados Especiais Federais (Lei 10.259/2001, art.
3º, I) e os Juizados especiais da Fazenda Pública (Lei 12.153/2009, art. 2º)
competentes para dirimir os conflitos de valor até 60 salários mínimos.
3) o critério pessoal, o que leva em conta a condição das pessoas. É o caso das
varas privativas da Fazenda Pública
4) havendo pluralidade de juízos com igual competência, a competência é
determinada pela distribuição dos processos – arts. 284 e seguintes do NCPC.

1.4 A Perpetuação da jurisdição (perpetuatio jurisdictionis)

A competência para julgamento de determinada ação é determinada no momento de


ajuizamento da demanda, pelo registro ou pela distribuição (onde houver mais de uma
vara) da petição inicial e se perpetua até a prolação da decisão (CPC/15, art. 43)
independente de eventuais modificações do estado de fato (ex. mudança de domicílio
do réu) ou de direito (ampliação da competência do órgão). Essa é a regra, mas há
exceções: nos casos de extinção do órgão judiciário e nos casos de alteração
superveniente da competência absoluta do órgão judicial.

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