Trata-se de recurso extraordinário interposto por Gean Lima da Silva,
com fundamento no art. 102, III, a, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pela Primeira Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios.
No recurso extraordinário, a parte recorrente alega violação dos arts. 1º,
parágrafo único; 37, caput ; 58, § 2º, inciso I; e 65, da Constituição Federal.
Quanto à repercussão geral, sustenta que
“o ponto principal tem impacto em pelo menos duas questões
relevantes, e de âmbito nacional: a primeira delas diz respeito à alegação de inconstitucionalidade da Lei nº 13.654/18, cujo ponto fulcral é de ter havido vício procedimental na tramitação do projeto no âmbito do Senado Federal. Tal lei alterou a tipificação do crime de roubo e suas formas circunstanciais, em especial aquela praticada mediante o uso de arma, objeto do caso em exame. É latente a repercussão da referida questão, ainda mais, para aqueles processos já julgados em primeira instância, e aqueles transitados em julgado. Neste caso, a repercussão geral é implícita, nos moldes do artigo 1.035, § 3º, inciso III do Código de Processo Civil. A segunda questão diz respeito aos efeitos e limites da declaração incidental de inconstitucionalidade de norma federal contestada diante da Constituição Federal , uma vez que determinada Arguição de Inconstitucionalidade julgada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal limitou seus efeitos inter pars e ex nunc , ou seja, não poderia produzir efeitos imediatos e diretos no julgamento de outros processos equivalentes ou similare s” (grifos do autor)
No mérito, defende
“não [ser] possível o controle jurisdicional em relação à
interpretação de normas regimentais das Casas Legislativas, bem como não há vício formal capaz de infirmar a higidez constitucional da Lei nº 13.654 de 2018, razão pela qual não mais se considera como causa de aumento o emprego de arma branca no crime de roubo”.
1 Pleiteia, portanto, o
“reconhecimento da violação ao artigo 58, §2°, inciso I, da Carta
Política Brasileira, afastando da dosimetria da pena a causa de aumento do uso de arma e reajustando a reprimenda estatal imposta pelo acórdão ora combatido.”
Em suas contrarrazões, o Ministério Público do Distrito Federal e
Territórios defendeu o não acolhimento do extraordinário, mantendo-se
“o acórdão recorrido, pois a revogação do inciso I do § 2º do art.
157 do Código Penal (art. 4º da Lei nº 13.654/2018) realmente foi fruto de um processo legislativo viciado, que não observou o devido processo legislativo constitucional, bem como afrontou materialmente a Constituição Federal”.
Aduz o Parquet , a esse respeito, que,
“embora o PLS nº 149/2015 e a Emenda Aditiva nº1 tenham sido
aprovados pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania – CCJ nos exatos termos em que foram propostos, ou seja, contendo a revogação do inciso I do § 2º do art. 157 do Código Penal, o Texto Final elaborado pela CCJ para ciência do plenário e publicação no Diário do Senado Federal, para fins do disposto no art. 58, § 2º, inciso I, da Constituição Federal não correspondeu ao que efetivamente foi aprovado pela CCJ, pois não constou do Texto Final, assinado pelo Presidente da CCJ, Senador Edison Lobão, a supressão da aludida majorante. A submissão de texto diverso aos membros do Senado, retirando- lhes a oportunidade de apresentar recurso contra o artigo que previa a revogação do inciso I do §2º do artigo 157 do Código Penal, feriu de morte o disposto no artigo 58, § 2º, inciso I, da Constituição Federal, bem assim os princípios da Legalidade e da Publicidade. A publicidade deficiente usurpou qualquer possibilidade de recurso por parte dos Senadores que eventualmente poderiam se opor à revogação do inciso I do § 2º do art. 157 do CP. Tal defeito no processo legislativo constitui nulidade absoluta por descumprir a ordem constitucional prevista no art. 58, § 2º, inciso I, da CF/88, e, por óbvio, nada que depois ocorra pode convalescê-lo. Não se pode negar, ainda, a ofensa ao princípio da publicidade (art. 37, caput, da Constituição Federal) que também rege o processo legislativo, porquanto o Texto Final do PLS nº 149/2015, publicado no Diário do Senado Federal na data de 10/11/2017, não correspondia, em 2 sua integralidade, ao que restou aprovado na 49ª Reunião Ordinária da CCJ”.
Prossegue argumentando, ainda, sobre
“a inconstitucionalidade material do artigo 4º da Lei nº 13.654
/2018, pois a retirada da majorante do emprego de arma do artigo 157 do Código Penal violou uma das faces do princípio da proporcionalidade, que decorre da proibição do retrocesso e da proteção insuficiente de direitos fundamentais”.
Em 17 de dezembro de 2020, reconheci a existência da repercussão geral
da matéria aqui em discussão, tendo o Plenário Virtual desta Corte referendado essa decisão (DJe de 18/2/21).
Eis o teor da ementa:
“Recurso extraordinário. Matéria criminal. Utilização de arma
branca no roubo majorado (CP, art. 157, § 2º, inciso I). Exclusão da causa de aumento decorrente da revogação promovida pelo art. 4º da Lei nº 13.654/2018. Declaração de inconstitucionalidade formal do artigo em tela pelo Órgão Especial do TJDFT. Possibilidade de controle jurisdicional em relação à interpretação de normas regimentais das Casas Legislativas. Relevância da matéria constitucional. Existência de repercussão geral.”
Instado a se manifestar, o Ministério Público Federal, em parecer da
lavra do Procuradora-Geral da República, Dr. Augusto Aras , opinou pelo não provimento do recurso extraordinário, com a fixação das seguintes teses de repercussão geral:
“I – No âmbito da interpretação do regimento interno das Casas
Legislativas (ato interna corporis), é defeso ao Poder Judiciário exercer controle jurisdicional. II – Os atos praticados sem ou contra expressa previsão regimental são suscetíveis de controle de constitucionalidade e de legalidade por vício formal. III – O controle jurisdicional abstrato de constitucionalidade por vício material somente é admissível após o encerramento da tramitação da proposição legislativa. IV – É passível de controle jurisdicional a violação ao princípio da publicidade na tramitação de projeto de lei quando inviabilizar o 3 exercício de prerrogativa constitucionalmente assegurada aos parlamentares, a exemplo do direito a recurso previsto no art. 58, § 2º, I, da Constituição Federal.”
Devidamente instruído, o feito vem a julgamento Plenário.