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O ESTABELECIMENTO COMERCIAL

1. Noção de estabelecimento comercial

O Estabelecimento comercial é o instrumento de que se utiliza o empresário para exercer suas


actividades. Com efeito, pela teoria da empresa, ele não se confunde tanto do empresário como da
própria empresa.
É o conjunto de bens que o empresário comercial reúne para a realização efectiva da sua
actividade empresarial, correspondendo àquela unidade dos elementos constitutivo da actividade
comercial a que alude o artigo 69 do nosso Código Comercial. Um complexo de bens organizado,
para exercício da empresa, por empresário comercial em nome individual, ou por sociedade
empresária.

Essa organização do empresário comercial - conjunto de elementos do empresário, por si


organizados para exercer a sua actividade comercial e empresarial, de produção ou circulação de
bens ou prestação de serviços - pressupõe:

a) Existência de um titular: pois, ele é um conjunto de meios predestinados pelo empresário


comercial, titular de um determinado direito sobre ele, para exercer a sua actividade;
b) Existência de um acervo patrimonial: pois, ele compreende um conjunto de bens e direitos, das
mais variadas categorias e naturezas, que têm em comum a afectação à finalidade coerente a
que o empresário comercial os destina;
c) Existência de um conjunto de pessoas: que podem reduzir-se à pessoa do empresário o seu
suporte humano, nas formas mais embrionárias da estrutura empresarial. Mas, normalmente
engloba uma pluralidade de pessoas, congregadas por diversos vínculos jurídicos
(trabalhadores), para actuarem com vista à prossecução da finalidade comum da empresa;
d) Uma organização: um conjunto de elementos entre si conjugados, interrelacionados,
hierarquizados, segundo as suas específicas naturezas e funções específicas, para que do seu
conjunto possa emergir um resultado global: a actividade empresarial visada;
e) Uma organização funcional: um objecto específico, correspondente a uma actividade de
determinado ramo da economia, que permite dar estrutura e configuração próprias ao exercício
da empresa comercial.

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2. Elementos do estabelecimento comercial

a) Elementos corpóreos

Nesta categoria devem considerar-se as mercadorias que são bens móveis destinados a ser
vendidos, compreendendo as matérias-primas, os produtos semiacabados e os produtos acabados.
Incluem-se também as máquinas e utensílios, ou seja, a maquinaria e os veículos. Faz também
parte o imóvel onde se situem as instalações, quando o seu dono seja o empresário comercial, pois
se o não for, apenas integrará o estabelecimento o direito ao respectivo uso. O dinheiro em caixa,
incluído.

b) Elementos incorpóreos ou imateriais

Aqui deve-se considerar os direitos, resultantes de contrato ou outras fontes, que dizem respeito à
vida do estabelecimento, designadamente:
 o direito ao arrendamento;
 os direitos reais de gozo;
 os créditos resultantes das vendas, empréstimos, locações, etc;
 os direitos emergentes de variados contratos, ex. concessão, prestação de serviços,
fornecimento de bens, etc;
 as obrigações do empresário comercial a ele relacionado.

c) Clientela

O nosso ordenamento consagra o direito à clientela, direito do estabelecimento, abrangendo a


clientela certa e clientela potencial, pode ser deferido por acções de concorrência desleal que
tutelam elementos gerais da empresa.
Clientela é um conjunto de pessoas que têm com a empresa relações contínuas de aquisição de
bens ou serviços ou que potencialmente possam justificar a expectativa de nela irem adquirir
serviços, produtos ou mercadoria.
Existe um direito à clientela quando assenta em contratos de fornecimento, ou quando resulta de
cláusulas de protecção específica (cláusulas de não-estabelecimento ou de não-concorrência),

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consagradas em contratos de trespasse ou cessão de exploração, bem como em contratos de
trabalho, de concessão comercial, etc, conforme estabelece o artigo 76 do Código Comercial.
Refira-se que a clientela constitui um elemento juridicamente distinto e relevante do
estabelecimento.

d) O aviamento

Aviamento do estabelecimento comercial é a capacidade lucrativa da empresa, a aptidão para


gerar lucros resultantes do conjunto de factores de produção ou de circulação de bens ou de
serviços nela reunidos.
O aviamento resulta do conjunto de elementos da empresa, mas também de certas situações
de factos que lhe potenciam a lucratividade, como são as relações com os fornecedores de
mercadorias e de crédito, as relações com os clientes, a eficiência da organização, a reputação
comercial, a posição mais ou menos forte no mercado, etc.
O aviamento exprime, pois, a capacidade lucrativa e esta confere ao estabelecimento uma mais-
valia em relação aos elementos patrimoniais que o integram, a qual é tida em conta na
determinação do montante do respectivo valor global.
Note-se, porém, que as situações de facto acima referidas são elementos do estabelecimento,
mas o aviamento não é em geral considerado propriamente como um elemento, mas sim
como uma qualidade do estabelecimento, à imagem do que acontece com a fertilidade de um
terreno.
Não se confunda, pois, o aviamento com a clientela, já que esta é um elemento do
estabelecimento e pode, quando muito, ser utilizada pragmaticamente como índice
significativo do aviamento.

3. Negócios à volta do estabelecimento

A identidade jurídica do estabelecimento como, simultaneamente, universalidade de direito e bem


móvel incorpóreo, fornece uma base conceptual adequada para a estruturação do regime jurídico
dos negócios jurídicos que o tomam como um todo.
Ora, de acordo com o disposto no artigo 71 do Código Comercial, o titular de um estabelecimento
comercial pode dispor do seu estabelecimento mediante:

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a) Contrato de locação

Locação de estabelecimento comercial consiste na transferência temporária e onerosa do gozo de


um estabelecimento comercial (artigos 1022 e 1023 do Código Civil). É o contrato pela qual uma
das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de um estabelecimento mediante
retribuição, nos termos do artigo 1085 do Código Civil.
As regras relativas à duração (artigo 74 do Código Comercial), denúncia, resolução e oposição à
renovação dos contratos de arrendamento para fins não habitacionais são livremente estabelecidas
pelas partes, aplicando-se, na falta de estipulação, o disposto quanto ao arrendamento para
habitação (artigos 1087, 1095 e ss, 1093, todos do Código Civil).
No entanto, nas relações contratuais que envolvam locação do estabelecimento comercial, o
locatário deve administrar o estabelecimento, preservando a unidade dos seus elementos
constitutivos, sem lhe modificar o fim a que se destina, de modo a manter a eficiência da
organização. Com efeito, é legalmente obrigado a zelar pelos bens integrantes do estabelecimento
comercial, assumindo as responsabilidades próprias do administrador de bens de terceiros,
inclusive pela sua guarda, podendo, na hipótese de alienação indevida vir a responder como
depositário infiel.

b) Usufruto

O usufruto atribui ao usufrutuário um direito real limitado de gozo, constituído sobre coisa alheia.
Significa que o usufrutuário adquire o direito à exploração do estabelecimento comercial,
atribuindo-lhe poderes de uso directo (exploração) do estabelecimento e também poderes de
utilização indirecta, contrariamente de alguém que tenha o mero direito de uso, quem tenha
usufruto pode locar também.
O artigo 1439 do Código Civil estabelece que o usufruto é um direito de gozar temporária e
plenamente uma coisa ou direito alheio, sem alterar a sua forma ou substância, que pode ser
constituído por contrato, testamento, usucapião ou disposição da lei (artigo 1440 do Código Civil).
No entanto, nas relações contratuais que envolvam usufruto do estabelecimento comercial, o
usufrutuário deve administrar o estabelecimento, preservando a unidade dos seus elementos
constitutivos, sem lhe modificar o fim a que se destina, de modo a manter a eficiência da
organização. Com efeito, é legalmente obrigado a zelar pelos bens integrantes do estabelecimento
comercial, assumindo as responsabilidades próprias do administrador de bens de terceiros,

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inclusive pela sua guarda, podendo, na hipótese de alienação indevida vir a responder como
depositário infiel, nos termos do artigo 78 do Código Comercial.

c) Trespasse

É uma figura jurídica que abrange uma pluralidade de modalidades e não um negócio uniforme.
Diz-se trespasse todo e qualquer negócio jurídico pelo qual seja transmitido definitivamente e inter
vivos um estabelecimento comercial, como unidade. Ao alienante chama-se trespassante, e ao
adquirente trespassário.
Ficam porém, excluídos do âmbito do conceito os casos de transmissão mortis causa.
Mas, o que é essencial, para que haja trespasse, é que o estabelecimento seja alienado como um
todo unitário, abrangendo a globalidade dos elementos que o integram. Pode, no entanto, algum ou
alguns desses elementos ser especificamente dele retirados e subtraídos à transmissão, que ainda
assim haverá trespasse.
Trata-se pois, de um acto de comércio objectivo, pois está regulado na lei comercial, e em termos
que se destina a satisfazer as necessidades específicas das actividades e empresas comerciais.
O primeiro aspecto do regime do trespasse focado na lei é o da forma, já que o artigo 73 do
Código Comercial, condiciona a validade deste negócio jurídico à sua celebração por escritura
pública, da qual evidentemente, devem constar todos os seus elementos essenciais.
Relativamente às dívidas do empresário comercial inerentes ao estabelecimento comercial, o
adquirente do estabelecimento comercial responde pelos débitos derivados da respectiva
exploração e anteriores ao trespasse, sem que o alienante fique libertado, salvo se nisso
consentirem os credores. Consequentemente, haverá que respeitar, para que se transmitam as
dívidas, a exigência da concordância do credor de cada uma, como resulta do disposto na lei civil
quanto à transmissão de dívidas (artigos 595 e 596 Código Civil) e quanto à novação subjectiva
por substituição do devedor (artigo 858 Código Civil).
O trespasse faz nascer para o trespassante, independentemente de estipulação contratual, a
obrigação de não concorrência (desleal) ao trespassário, isto é, de não exercer uma actividade
análoga, em condições de local, tempo e outras, que constituam uma forma eficaz de retomar a
clientela do estabelecimento alienado.
A violação deste dever constituirá concorrência ilícita, cuja sanção consistirá na responsabilidade
de indemnização pelos danos causados, bem como na aplicação de uma sanção pecuniária
compulsória ao violador, enquanto persistir a conduta ilícita, isto é, a exploração concorrencial
desleal (artigo 76 do Código Comercial).

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