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CEO

Italiano

Marcelle Oliveira
Copyright © 2019 Marcelle Oliveira
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Lara Martinelli é uma gaúcha de personalidade forte, autêntica,
bonita e sonhadora. Disposta a reerguer a vinícola de seu pai, nos pampas
gaúchos, a moça sai em busca dos sonhos para a Toscana, num encontro de
negócios com o CEO italiano Vincenzo Gatti, dono da vinícola referência
naquela região da Itália.
O que ela não imaginava era que o poderoso empresário das uvas
fosse um moreno de olhos sérios azul turquesa, gostoso, sedutor e
extremamente carinhoso. E Vincenzo, por sua vez, não esperava que, por trás
da personalidade impetuosa e arredia de Lara, havia uma moça virgem e
romântica.
Estaria Lara Martinelli disposta a deixar os seus sonhos no Brasil
para viver uma aventura amorosa ao lado de um CEO dominador e cheio de
mistérios?
Até quando Lara resistirá aos encantos do CEO italiano?
– Estou decidida. Eu vou para a Toscana. – digo, empurrando as
malas em direção à porta. Meu pai estava sentado à poltrona e, num
sobressalto, me olha nos olhos, abaixando o jornal num ímpeto de fúria.
– Lara, como você dá um susto desses no seu velho pai?! – então,
ele se levanta, vem até mim, deixando o jornal sobre o sofá. – Não podemos
ter gastos com viagens infundadas, neste momento. Não estamos no tempo de
dar ao luxo de gastar com passeios para o exterior!
Dou um longo suspiro e fecho os olhos, buscando as palavras certas
que poderiam convencer a meu pai.
– Senta aqui, papai. – puxo seus dedos enrugados e nos
aconchegamos em uma daquelas poltronas. – Eu pesquisei muito sobre as
empresas italianas, e há uma na Toscana que está passando por dificuldades
por conta de sua plantação de uvas. Estão constantemente enfrentando pragas
e, por isso, eles buscam a parceria de alguma empresa brasileira. Não
podemos perder essa oportunidade, pai. Por favor, confie em mim.
Meu pai me olha nos olhos com um ar complacente, diferente do
impetuoso com que me encarava há alguns segundos.
– Você sabe muito bem, Lara, que os sócios nos abandonaram na
nossa empreitada. – observo nossos dedos entrelaçados. – Quando estava
tudo de vento em poupa, simplesmente aderiram aos nossos ideais e projetos,
vestiram a nossa camisa. E, agora, só restam apenas eu, você e alguns
colonos, e por isso fico extremamente emocionado por você tomar essa
iniciativa, filha.
Olho nos olhos marejados de papai e, logo em seguida, desvio o
olhar para as malas. Eu estava partindo, completamente decidida, mas meu
coração estava terrivelmente em pedaços.
– Pai, eu não vou desistir do empreendimento da nossa família. Não
vou. – me levanto e caminho até as malas. – Desculpa por não ter te
comunicado da minha decisão antes, mas eu precisava agir dessa maneira, ou
o senhor poderia fazer de tudo para me impedir.
Papai se levanta e vem até mim, segurando mais uma vez em minha
mão.
– Lara. Eu confio em você. Eu apenas temo ver seu sofrimento e
decepção...
– Mas eu acredito que se eu não arriscar, será bem pior. – observo
papai concordando comigo. – E não precisa ficar preocupado, pai. Já morei
em Milão para os cursos de capacitação, na época em que a empresa estava
em seu auge, então, além das minhas experiências em solo milanês, acredito
também que meu italiano ainda esteja na ponta da língua.
Meu pai sorri e uma lágrima escapole de seus olhos esverdeados.
– Guria, vá conquistar seus sonhos. Mande notícias. – e ele me
envolve num abraço terno e já repleto de saudades.
– Eu vou conquistar os meus sonhos, pai. Os nossos sonhos...
Foi difícil fechar a porta naquela tarde. Deixar para trás a
comodidade da casa de meu pai, o conforto, a segurança, o carinho. Agora,
eu estava prestes a desvendar novos rumos em minha vida, sozinha. Ou
melhor, eu, meus sonhos e a gana imensurável para poder ver o sorriso de
meu pai novamente, entregando-lhe, assim, outra vez o sucesso.
O ônibus deslizava na estrada pelos pampas gaúchos rumo ao
aeroporto de Porto Alegre, e meu coração era só esperanças, enquanto uma
saudade louca de meu pai já abraçava todos os meus sentidos.
Miro novamente, em minhas mãos, a revista que me dava todas as
dicas sobre a Toscana. Observo aquelas vinícolas, os cachos de uva bonitos
que se desprendiam das parreiras, além de uma garrafa de vinho brilhosa, ao
lado de duas taças, que instintivamente me dava água na boca, apenas de
olhar. Isso tudo completava o enredo da minha história. Desde pequena
convivendo com esses singelos detalhes. Sempre foram apenas eu, meu pai e
nossos sonhos. E, agora, não poderia ser diferente.
Eu estava disposta a recomeçar.

***

Algumas horas depois, o avião alça voo. Coloco o fone em meus


ouvidos com uma canção bonita de Maria Bethânia preenchendo os meus
pensamentos. Ela me lembrava do meu pai e, também, dos momentos felizes
ao seu lado e ao lado de meus primos. Esse era o meu acalento nessa parte tão
difícil da minha história.
Miro a grande Porto Alegre agora tão pequena. Mas os sonhos
agora tão gigantes dentro de mim.
E as esperanças, igualmente.

***

Era verão na Itália e o clima estava completamente convidativo.


Assim que cheguei à estação, os ares toscanos balançaram os meus cabelos
negros e desfez, como num cumprimento de boas-vindas, a minha franjinha
perfeita.

Abro em meu celular o e-mail que havia recebido da vinícola Gatti.


Eu não era tão louca a ponto de partir do Brasil sem alguma situação
consolidada com a empresa. Eu havia enviado fotos dos nossos produtos, um
relato completo no qual descrevia minunciosamente os detalhes da plantação
e colheita de nossas uvas. E, a princípio, demostraram interesse e
imediatamente me convidaram para uma reunião que aconteceria amanhã, à
tarde.

Estava completamente ansiosa. Teria que dar certo.

Peço um café ao rapaz loiro, que me encara de volta, na lanchonete


daquela estação de trem, quando, de repente, ele me pergunta:

– Brasileira?

Limpo o bigode de café expresso com o guardanapo.

– Sim, de Porto Alegre.

Então, ele para de esfregar o balcão que já estava mais brilhante que
uma pérola.

– Aqui na Toscana sempre recebemos brasileiros. Você gosta de


Carnaval?

Reviro os olhos extasiada com o mesmo repertório de perguntas


que me abordava sempre que estava por aqui.

– Não, por que deveria? Apenas porque sou brasileira?

De repente, o rapazinho se encolhe e sai de cabeça baixa para o


outro lado do balcão, me encarando pelo canto dos olhos, então,
constrangida, percebo que deveria controlar melhor a minha língua. O povo
daqui era bastante educado, e Lara Martinelli e sua ferradura afiada
contrastavam naquele ambiente.

Minutos depois, já adentro o saguão do hotel. Fiz o caminho a pé da


estação até aquele belo casarão. A fachada era de pedras, de onde se
destacavam belíssimas jardineiras de bougainville roxo.

Assim que preenchi os papéis do check in e subi as escadas em


direção ao quarto, junto a um rapaz simpático que me ajudava com as malas,
recebi uma ligação no celular. Era curioso, pois havia acabado de falar com
papai há minutos atrás. E meu coração pulou uma batida assim que percebi
que era um número aqui da Itália. Oras, só poderia ser a empresa.

– Alô, pois não?! – digo, já retirando os sapatos e me jogando sobre


a cama.

– Srta. Lara Martinelli?

– Sim.

– O Sr. Vincenzo Gatti pediu que eu antecipasse a reunião com a


senhorita, para hoje, às 17h. Existe essa possibilidade?

Dou um pulo e me sento imediatamente sobre a cama.

– Sim, sim. Claro. Eu vou. Acabei de chegar do Brasil, e já vou me


preparando para a reunião, sem problemas.

A secretária agradece e, em seguida, desliga. Jogo meu corpo para


trás, caindo sobre os travesseiros. Passo as mãos pelo rosto, sentindo um leve
desespero consumir o meu ser.

– Chegou a hora, Lara. Vai dar certo.

Corro para um banho e, minutos depois, visto uma saia lápis preta,
com uma blusa bonita estampada de cores sóbrias. Os scarpins já estavam
enfiados em meus pés.

Passo o batom e, após amassar os lábios para pintá-los por


completo, me encaro no espelho e ajeito mais uma vez a minha franja.

– Você está linda, mulher de sucesso! – sibilo sorridente.

***

Enquanto estava no táxi em direção à empresa Gatti, repetia


mentalmente o meu discurso. Imaginava as possíveis perguntas do Sr.
Vincenzo e já procurava respostas para todas elas. A ansiedade tão pungente,
em meu ser, nem parecia de uma mulher de trinta anos. Recostei a cabeça na
poltrona do carro e imediatamente visualizei aquele CEO como um velho
rabugento e bigodudo, fazendo de tudo para me constranger na frente de sua
equipe e parceiros. Sim, as inseguranças me perturbavam demasiadamente.

E, assim que o carro estaciona em frente à empresa, meus olhos


contemplam um casarão gigantesco de metros e mais metros de largura, todo
revestido de pequenos tijolinhos. A vinícola Gatti funcionava no que era uma
encantadora construção medieval.

Assim que me despedi do taxista, subi as escadas de pedra daquele


monumental empreendimento. E as borboletas em meu estômago
surpreendentemente haviam dado uma pausa.

– Boa tarde, eu tenho uma reunião agendada com o Sr. Vincenzo


Gatti.
A mocinha faz um olhar estranho, percorrendo os olhos curiosos
por minha figura. Talvez, tivesse percebido o meu sotaque.

Então, ela me entrega um formulário, enquanto fala.

– Por favor, preencha, depois suba aquelas escadas e dobre no


corredor. Imediatamente irá deparar com o hall e, logo em seguida, a
secretária irá chamá-la.

Entrego a ela o papel já preenchido.

– Obrigada.

Chegando ao local indicado, me deparo com um hall gigantesco.


Imediatamente me encaminho para um sofá bonito de couro. Sentei, cruzei as
pernas e passei os meus dedos na franja. Era estranho estar ali sozinha.
Parecia uma sala de tortura, pois a ansiedade e o silêncio estavam prestes a
me sufocar.

Olho para o lado e uma janela imensa de madeira apresenta um belo


pôr-do-sol no horizonte. Os raios adentram aquela sala, deixando o chão de
madeira ainda mais brilhoso. Tudo limpo, bonito, elegante, organizado.

De repente, a porta se abre. Sai de lá uma mulher de coque e óculos


verdes.

– Srta. Lara Martinelli?

Levanto imediatamente, equilibrando as pastas nos braços, enfiando


a bolsa no ombro. Respiro fundo e caminho elegantemente até aquela sala.

A secretária faz um gesto com as mãos, me convidando a adentrar o


local da reunião. Então, eu agradeço e me encaminho para o meio daquelas
pessoas, mirando, ao mesmo tempo o rosto daqueles senhores e senhoras
elegantes. E, sem eu esperar, imediatamente o meu queixo vai ao chão,
quando, surpreendentemente, vejo um homem lindo, não, não era lindo, era
perfeito, muito perfeito. Olhos azul turquesa, sobrancelhas grossas. Rosto de
homem-com-agá-maiúsculo.

– Não, por favor, a senhorita vai se sentar aqui, deste lado.

Nem me dou conta e já estava hipnotizada indo em direção àquele


CEO italiano.

– Ah sim, claro. Boa tarde a todos. – digo e me sento, depositando o


dossiê sobre a mesa.

– Srta. Lara, muito prazer. Eu sou Vincenzo Gatti.

Gato. É gato. Digo comigo mesma enquanto esboço um olhar frio.

– Muito prazer, senhor. Estou feliz por ter aceitado minha proposta
de apresentação da vinícola brasileira Martinelli.

Vincenzo me olha e dá um leve sorriso, em agradecimento. Aqueles


olhos eram tão sobrenaturais de tão lindos. Estou impactada com a maneira
que as duas pedras turquesa me encaram curiosas. E, na realidade, nem ao
menos memorizei quem está naquela mesa de reunião, pois meus olhos pretos
estão magnetizados por aquela perfeição da natureza humana.

– Então, me diga... Lara, – ele faz um movimento casual de ir-e-vir,


em sua cadeira. – sobre o seu projeto. Achei extremamente interessante a
maneira como cultiva a uva moscatel, enfim... as videiras vitis vinífera. Os
negócios de sua família são referência no Brasil, no que tange a produção de
vinho, não é mesmo?

Debruço os cotovelos sobre a mesa para demonstrar segurança, e


inacreditavelmente estava confiante, de fato.

– Sim. Vivemos das uvas há muito tempo. É uma tradição que foi
passando de geração a geração. Inclusive chegamos ao topo do mercado há
uns cinco anos atrás. – vejo Vincenzo concordar com os olhos sobressaltados.
– A fase da vinificação, onde as uvas são esmagadas, processadas, como os
senhores conhecem como maceração é atualmente toda feita de forma
mecanizada, diferentemente da época dos meus avós, em que existia o
contato humano. Ao mesmo tempo em que ocorre a maceração, acontece a
primeira fermentação, a alcoólica, assim que o açúcar das uvas se converte
em álcool e, então, já temos a garantia do sabor nos vinhos devido à
qualidade das nossas frutas.

– Eu tenho uma pergunta. – um senhor pomposo e de rugas largas


na testa, me chama a atenção de repente. Ele mexe em umas folhas. –
Pesquisei sobre a iminente falência da vinícola Martinelli e, por isso, a
senhorita estaria aqui, neste momento?

Um silêncio se instaura. Oscilo meus olhos nos olhos daquele


senhor e nos de azul turquesa. Um ódio genuíno inflama por dentro.

Que deselegante!

– A falência aconteceu de maneira generalizada. – falo esboçando


um ar blasé. – O Brasil apresentou queda na economia há poucos anos atrás e
isso reverberou em nossa vinícola. Mas eu acredito nos nossos insumos, no
nosso potencial, enquanto empresa, tenho certeza de que essa parceria com a
Gatti vai ser extremamente relevante para alavancar os negócios de ambos os
empreendimentos. – miro nos olhos enrugados e antipáticos. – Acredito que
por isso o convite de Vincenzo foi feito, pelo nosso histórico, pelo sucesso
que acumulamos durante gerações.

Olho novamente para o belo CEO italiano e ele, perturbadoramente,


me encara de volta com um olhar fixo e tentador. Imediatamente me sinto
incomodada e me ajeito na cadeira, mirando meus olhos exclusivamente no
dossiê.

– Eu concordo com você, Lara. Mas ainda não ouvi o bastante.


Quero que me apresente mais dos seus negócios. – Vincenzo me fala.

Engulo em seco e me levanto, ajeitando a saia em meu corpo. Vou


em direção ao data show e tenho certeza de que minha bunda marca a saia,
sensualmente, atraindo os turquesas de Vincenzo. Mas eu estava ali para os
negócios, os negócios, Lara!
– Bem, eu trouxe algumas imagens dos nossos empreendimentos no
Brasil. – enquanto falo, observo alguns desatentos que mexem nos
smartphones, mas não me importo, pois o CEO italiano detinha toda sua
atenção exclusivamente a mim.

A noite já invadira o céu e tudo que tínhamos naquele momento era


a luz do projetor sobre alguns rostos curiosos à minha frente.

Explico detalhadamente tudo o que Vincenzo e seus parceiros


gostariam de ouvir. Não havia brecha para que me questionassem exatamente
mais nada, no que tangessem dúvidas ou incompletude de informações.

Em seguida, todos aplaudem a minha apresentação e imediatamente


começam a se movimentar para se retirarem da sala.

– Lara, você pode ficar mais um pouco? – enquanto desconecto o


meu pen drive, imediatamente ouço a voz grave bem perto de mim. Os pelos
de meu braço inconvenientemente eriçam.

– Claro.

Então, vou até meus papéis e cato meus pertences sobre a mesa de
reunião. O CEO italiano vem em minha direção, num lindo terno cinza. A
gravata era preta e extremamente elegante.

– Pode me acompanhar, por favor. – Vincenzo faz um gesto para


que eu siga na sua frente, então, segundos depois, já estamos no hall outra
vez.

Estava extremamente nervosa, pois eu já presumia que Vincenzo


iria me dar uma resposta.

Positiva, positiva, positiva.

– Pode entrar. – ele diz, abrindo a porta.


Assim que eu entro em sua sala, meus olhos vislumbram um quadro
imenso de uma vinícola, na parede por trás da mesa. As uvas desciam em
cascatas de suas parreiras.

– Pode se sentar, Lara.

Ui, já percebi intimidade em sua fala.

– Obrigada. – sento e cruzo as pernas. As mãos suadas e geladas,


mas o meu olhar era o mais seguro do mundo inteiro.

– Eu gostei. Eu realmente gostei do que você me apresentou. – ele


estala os dedos, ajudando a quebrar o silêncio naquela sala. – Mas,
infelizmente, ainda não é o suficiente para fecharmos essa parceria.

Meu coração aperta dolorosamente, enquanto meus olhos arregalam


apavorados.

– Por que não, senhor? O que faltou?

Vincenzo, então, debruça os cotovelos sobre a mesa. Ele me olha


nos olhos e sua íris preta destoa no meio da imensidão azul.

– Pode me chamar de Vincenzo. – ele me encara tão


perturbadoramente que eu nem ao menos sei se meu coração está
desgovernado pela decepção ou pela excitação.

– Vincenzo, por favor, me fale logo o que aconteceu! Se eu posso


reverter e fazer algo para...

– Lara, ouça, é tudo muito prematuro ainda. – ele se levanta e vai


até a cômoda, encostando a bundinha na superfície. Meus olhos gulosos
acompanham aquele gesto, então, imediatamente, me recomponho e volto à
sanidade, ouvindo suas palavras duras. – Sua empresa está falida. E eu
simplesmente não posso deixar que ela se escore nos meus negócios,
revertendo lucros que poderiam ser investimentos para mim. Eu preciso de
algo grandioso que me dê segurança.
Fecho os olhos e de repente vejo o rosto de meu pai. Uma lágrima
escapole.

Enxugo antes mesmo que Vincenzo perceba minhas fragilidades.

– Eu entendo, entendo completamente. – sibilo, enquanto ele se


senta outra vez à sua mesa.

Então, num gesto abrupto, Vincenzo estica a mão e segura na


minha.

Esse CEO italiano era um pouco saliente.

– Você é muito capacitada, inteligente, Lara. Você surpreendeu a


todos com o seu potencial e conhecimento diante dos assuntos relacionados à
vinícola. Eu vejo que não te falta experiência nesses assuntos...

– Obrigada, Vincenzo, – o interrompo. – mas eu não vim até aqui


para receber elogios, você sabe disso. – e imediatamente retiro minha mão
por debaixo da dele. – Eu saí do Brasil porque vocês queriam conhecer os
projetos, os negócios da minha família e...

– Mas infelizmente não deu certo, Lara. – ele conclui, um pouco


ríspido.

Então, imediatamente me levanto.

Vincenzo olha em meus olhos, compenetradamente, ainda sentado


em sua cadeira máster-blaster. Eu sentia que ele não queria que eu saísse dali,
naquele momento.

– Lara, por favor, fica. Eu não terminei.

– Se for para fins de conforto, eu prefiro voltar para o hotel e em


seguida para o Brasil.
Ele se levanta e vem em minha direção, enquanto organizo meus
pertences nos braços.

– Não seja tão prematura nas suas decisões, Lara. Eu vejo potencial
em você. Queria sinceramente tê-la na minha empresa e, na verdade, foi para
isso que te chamei para esse particular.

Paro de organizar as pastas e olho em seus olhos. Nossos rostos


estavam perto, muito perto.

– Não. Eu vou voltar para o Brasil, Vincenzo. – balbucio orgulhosa,


exatamente como eu era. – O meu sonho é reerguer os negócios do meu pai e,
por isso mesmo, eu concluo que eu não tenho exatamente mais nada para
fazer aqui.

Saio e bato a porta, sem ao menos dá-lo chance de mais nada.


Caminho apressadamente em direção às escadas, enquanto algumas pessoas
me olham em estranhamento.

Um bolo imenso insistia em permanecer em minha garganta. E meu


coração estava submerso em decepção e mais decepção.

Estou na escada, fitando meus sapatos vibrarem urgentes naquele


piso amadeirado, quando, de repente, uma moça me alcança.

– Ei! Está tudo bem? – sinto sua mão em meu ombro. Então, paro e
me viro, encontrando um rosto bonito a me fitar no degrau de cima.

– Sim, está. Obrigada. Preciso tomar um ar, apenas isso. – quem me


via, nem imaginava o turbilhão de emoções que me afogava. Eu estava
completamente fria e segura de minhas palavras.

E assim que acabo de descer os dois últimos degraus, a moça


simpática se coloca estrategicamente à minha frente.

– Vamos tomar um café?


Acabo cedendo. Não seria uma má ideia saborear aquele líquido
amargo, para me relaxar, após o massacre de palavras dolorosas proferidas
pela boca gostosa de Vincenzo.

– O que houve? O Vincenzo fez alguma coisa com você? – a moça


é direta e eu estranho um pouco, mas como eu precisava desabafar, apenas
engulo o café e logo em seguida digo:

– Infelizmente, a primeira impressão que tive daquele homem foi a


pior possível. Um arrogante.

A mulher me encara com seus olhos marrons, engolindo com


dificuldade o café.

– Você é a brasileira?

Mastigo um biscoitinho de polvilho.

– Sim, cheguei hoje do Brasil. Prazer, Lara. – sorrio, forçando


simpatia. – E você, trabalha aqui? – emendo a xícara mais uma vez nos
lábios.

– Sim e sou a namorada do Vincenzo, Ana Giulia.

O café desce imediatamente rasgando a minha garganta.

– Desculpas, eu fui completamente antipática nas minhas palavras


sobre o seu namorado. – é o que consigo dizer, esperando uma reação
daquela mulher magra e elegante.

Após dar um sorrisinho amarelo, Ana deposita a xícara vazia no


pires de louça.

– Vincenzo não fez com intenção, tenho certeza. Ele é


completamente responsável, precisa estar tudo muito bem claro, para que
possa tomar decisões. – e ela relaxa casualmente em sua cadeira. Os brincos
azuis bonitos me fazem lembrar imediatamente dos olhos do CEO italiano.
– Você tem razão, Ana. – e só me resta concordar. Chega de furos
por hoje, Lara! – Talvez a minha gana em fechar o negócio tenha cegado o
meu lado racional.

Então, ela me olha nos olhos.

– Mas eu acredito que voltar para o Brasil seja uma boa saída, Lara.

Ana Giulia demora seus lábios num biscoitinho esperando que eu


lhe coloque a par de meus planos.

– Não! Devo esperar um pouco. – sorrio, mas era um sorriso de


decepção. – Poxa, cheguei hoje... e quem sabe eu possa repensar minhas
decisões. Inclusive o Vincenzo me fez uma proposta.

– Proposta?

Acho que falei demais e me odeio no mesmo minuto.

– Sim, de trabalhar nessa empresa... – então começo a empilhar as


pastas, para ir finalmente embora daquele interrogatório sufocante. – mas eu
preciso antes conversar com o meu pai, afinal não vim com esse intuito para
cá.

Então, Ana Giulia segura uma de minhas mãos, chamando minha


atenção para ela.

– Se sua impressão de Vincenzo não foi boa, então, é melhor


retornar aos seus sonhos.

Analiso aquela mulher com desconfiança. Ela estava querendo me


desviar dos planos de Vincenzo? E por que veio até mim? A troco de quê?

– Você costuma consolar os clientes e parceiros que se


decepcionam com as atitudes de seu namorado? – digo, colocando a minha
ferradura afiada para jogo.
– Não... imagina... – está completamente sem graça. – foi uma
delicadeza, apenas... e você me chamou a atenção, porque Vincenzo estava
ansioso para o encontro com a tal brasileira, então foi apenas a nível de
curiosidade. Ele também depositou esperanças em você, Lara.

Cruzo os braços.

– E eu o decepcionei? A nossa possível parceria é uma perfeita faca


de dois gumes!

– Sim, que seja, mas cabe a você decidir agora. Ficar ou partir.

Arqueio as sobrancelhas e analiso a tal da Ana Giulia. Ela era


magra, bonita apenas porque era elegante. Talvez num conjunto de moletom
surrado fosse um rosto comum no meio da multidão.

– Eu vou ligar para o meu pai. Apenas ele vai me deixar agir.

De repente, Vincenzo aparece no café. Os olhos percorrem todo o


local, talvez à procura da namorada. Então, finalmente ele nos vê e chega
com as mãos nos ombros de Ana.

– Vocês duas?! – um sorriso de estranhamento contamina seus


belos lábios.

– Sim, Lara saiu um pouco atordoada e vim abordá-la para oferecer


ajuda.

Fofoca. Apenas fofoca e curiosidade dessazinha.

– A Lara está ainda digerindo minhas propostas e eu torço


sinceramente para ter uma resposta positiva. – e ele sorri, mostrando os
dentes perfeitos para mim.

Em resposta, sorrio forçada, enquanto observo o irritante casal


estampado à minha frente.
– Bom, eu preciso ir embora, fiz uma longa viagem hoje e sinto
necessidade de descansar. – levanto e agradeço à Ana o café. Despeço-me
dos dois e, então, assim que me viro, uma mão segura o meu braço. Me viro
num ímpeto.

– Vamos conhecer a vinícola amanhã pela manhã? – de repente,


Vincenzo me surpreende com aquela pergunta.

Pretendo negar o convite, mas o olhar ciumento de Ana é


impagável.

– Que horas?

Após checar a agenda eletrônica, Vincenzo me responde.

– Às 10h?

– Sim. – sorrio constrangida com o clima que se instaurara entre o


casal. – Com licença.

E vou imediatamente para a calçada, à espera do táxi.

– Lara! – Vincenzo me chama mais uma vez. – O motorista vai


levá-la ao hotel.

Então, o belo moreno imediatamente solicita pelo celular que a


secretária avise ao motorista, sem eu ao menos dar respostas. Um pouco
impositivo esse CEO italiano.

E infernalmente tentador.
Coloquei mais um pedaço de bolo no prato e refleti se havia feito a
escolha correta em ter aceitado o convite de Vincenzo. Olhei pela janela e o
dia estava simplesmente lindo e morno. O céu completamente azul, apenas
com poucas nuvens brigadeiro enfeitando alguns espaços.
Estava numa roupa confortável. Tênis e cabelos presos, com o
intuito de soltá-los depois. Eu me achava mais bonita assim, e certeza de que
Vincenzo também notaria o momento em que soltaria meus cabelos,
chamando, dessa maneira, a sua atenção para a minha beleza. Mordo o bolo e
me pergunto por que deveria estar tão preocupada em me reafirmar para o
belo CEO italiano?!
Ora! Simplesmente porque Vincenzo era o sonho de qualquer
mulher.
Ele era um CEO poderoso e milionário. Essa história de que não
aceitava parceria com empresa falida, é apenas para ter o gostinho e o prazer
de negar propostas e, dessa maneira, se sentir superior aos seus lacaios. Aff.
Reviro os olhos, apenas por imaginar a petulância daquele deus-
grego. Deus deu asas àquela cobra, agora eu deveria aturar, enquanto
estivesse tentada por aquela proposta.
Meu pai, obviamente concordou. Disse que se desse tudo certo,
venderia sua vinícola e viria morar comigo. Ou eu repassaria uma boa quantia
para ele lutar junto aos colonos pela reascensão de sua vinícola. Sim, os
salários da empresa de Vincenzo não eram baixos, e eu imediatamente pedi a
papai que não se precipitasse. Aquela vinícola era a sua vida, a sua história. E
eu não queria que ele deixasse seus sonhos morrerem.
Finalmente, saio do hotel e, quando me dou conta, um belo carro
está parado exatamente ao pé da escada.
Assim que desço mais um pouco, completamente desconfiada, o
vidro da janela se abaixa e os olhos azuis brotam lá dentro acompanhados de
um sorriso branco e galanteador.
– Pode vir, Lara. Eu não mordo.
Sorrio por dentro imaginando que aquele belo homem insistia em
estreitar intimidades.
– Bom dia! – respondo contrariando a vontade de respondê-lo que
eu mordia. E mordia com força. – Como soube do hotel?
– Foi o contato que deixou no formulário da recepção.
Abro a porta e me sento ao carona.
– Entendo, Vincenzo. Você é realmente muito astuto.
Então, partimos em direção à vinícola Gatti.
Enquanto estávamos dentro daquele carro luxuoso, meu coração era
massageado por uma espécie de satisfação. Sim, era inevitável assumir que,
apesar de tudo, a companhia de Vincenzo era de fato agradável.
– Olha esse céu. Perfeito para o nosso passeio na vinícola, não
acha?
– Passeio? Não seria um encontro de negócios?
Então, ele me olha meio de lado.
– E você se arrumou com o intuito de fazer um encontro de
negócios? Tênis e moletom, Lara?
No mesmo instante sorrio amarelo, puxando o zíper do meu casaco
até o pescoço, e na verdade queria que ele subisse até a minha testa para tapar
a minha cara de tacho.
– Vincenzo, sua família é daqui? – desconverso.
– Não. Somos do Norte da Itália, fronteira com a França. Essas
terras foram herança de meu avô materno. Mas, minhas raízes estão um
pouco longe daqui, no Valle D’Aosta. – observo seus turquesas atentos à
estrada.
– Você foi ousado em deixar sua história para trás...
Vincenzo sorri.
– E eu tenho certeza de que você também deveria fazer o mesmo. –
o tom autoritário faz vibrar meu coração.
Engulo em seco, ao mesmo tempo em que me animo ao ver a
insistência daquele belo CEO na proposta de eu ficar em sua empresa.
– Lara, o mercado precisa de profissionais como você. – ouço
atentamente, enquanto estou prestes a ceder à sua proposta tentadora. Aos
seus encantos. – Eu quero muito mais além que uma parceria de uvas. Eu
quero você atuando diretamente com suas ideias, quero sua colaboração para
o cultivo e plantio das nossas uvas aqui, nessa cidade. – ele fala
completamente obstinado em sua proposta.
E a ficha de repente cai. Vincenzo era muito, muito esperto. Ele iria
lucrar muito mais se trouxesse minha experiência para a sua empresa, ao
invés de importar as uvas brasileiras. Que danado.
– Você me surpreende com seu olhar visionário para os negócios. –
confesso, sem perceber.
Ele faz mais uma curva e eu imagino que já poderíamos estar perto
da vinícola Gatti.
– E seu pai? – de repente, Vincenzo me pergunta.
– Meu pai? Quem te falou sobre o meu pai? – estou surpresa.
– Ana. Eu pedi que ela fosse te abordar, Lara. – respiro fundo num
susto. – Eu não queria ser um estúpido com você. Fazê-la vir de um lugar tão
distante, para simplesmente ignorar suas propostas e você partir sem
expectativas. E Ana conseguiu para mim tudo o que eu queria de fato saber. –
e ele me olha apreensivo.
Eu estava completamente boquiaberta. Mas ao mesmo tempo
notava a sinceridade com que Vincenzo tratava daquele assunto comigo.
Embora tenha feito Ana Giulia me “usar”, eu via intenções corretas
em seus propósitos.
– Então você... você usou a mim, usou a Ana...
– Não. Não pense por esse lado. – a voz é crua e séria. – Você
jamais se abriria comigo daquela maneira, menina. Apenas me mantive firme
em minhas intenções e uma delas é contratá-la.
Dou um sorriso incrédulo e olho pela janela. Vincenzo além de
lindo, inteligente, poderoso, era um articulador de situações. Óbvio, se elas
dissessem respeito às suas intenções.
Vincenzo era determinado, é isso, além de um sedutor nato!

***

Assim que pisamos naquele chão de terra, o meu queixo caiu em


surpresa. Aquela vinícola não chegava a um terço das terras de papai. Havia
colonos para todos os lados, trabalhando incansavelmente. As plantações
perdiam-se de vista.
– Está surpresa? – Vincenzo me analisa, enquanto caminhamos lado
a lado.
– Sim, estou. Jamais poderia imaginar essa imensidão de frutas,
tudo tão organizado e bem cuidado. Como ainda conseguiram desenvolver
pragas?
Então, passo os dedos pelas uvas, da mesma maneira que fazia
quando era criança.
– Não precisa me perguntar, Lara. Eu sei que você tem essa
resposta.
Ele sai e me deixa plantada junto a um pé de azaléa.
Aperto os passos para alcançá-lo e inevitavelmente observo como
sua bunda marca a calça jeans sedutora.
– Vincenzo. É tudo seu? – ele retira uma fruta do pé e faz menção
de colocar em minha boca. Mas não permito. Pego a uva de seus dedos e
provo aquela delícia.
– Tudo. Não tenho irmãos. – ele me olha nos olhos e seu rosto era
tão lindo. Não me cansava de admirar.
Na verdade, eu nunca havia visto um homem assim. Bem-sucedido,
inteligente, gentil, lindo, lindo, lindo.
Eu já disse lindo?
Sempre presa aos negócios do meu pai, nunca tive a oportunidade
de me envolver com os rapazes da minha cidade. Vivia na zona rural e era
tudo muito complicado, para socializar, sair, ver gente bonita. Foi na
temporada que passei em Milão que pude de fato me envolver e me apaixonar
de verdade. Sim, um outro italiano atravessou o meu caminho no passado.
Namoramos, mas não deu certo. Afinal, precisei retornar ao Brasil e
infelizmente o namoro à distância se tornou insustentável.
Vincenzo ainda mastiga algumas uvas enquanto me observa calado.
Fico constrangida e decido soltar o meu cabelo. Balanço e ajeito minha
franja, tendo a certeza de que o perfume de meus fios avançava por suas
narinas.
O italiano apenas dá um sorriso tímido e altamente sedutor, me
observando. A boca ainda em movimento mastigando as frutas e eu
imediatamente me perco em seus gestos, em seu charme.
– Sr. Vincenzo, bom dia! – nos sobressaltamos com aquela
abordagem.
Era um colono e ele estava com um cesto repleto de uvas frescas.
– Meu amigo, bom dia! – então, Vincenzo gentil e educado como
de costume, resolve me apresentar, demonstrando muita simpatia. – Essa é a
Lara, brasileira, sommelier, especialista em plantação e colheita de uvas.
Quem sabe a nossa nova companheira de trabalho?! – ele não desiste.
Sorrio e estendo a mão ao rapaz de olhos verdes.
– Prazer.
Após ele sorrir para mim, o colono se dirige ao CEO.
– As parreiras da parte de baixo do terreno estão com as folhas
amareladas. Vamos ter prejuízo.
Vincenzo respira fundo e passa uma das mãos pelo rosto, num
acesso de raiva.
– Cazzo! – ele xinga. Imediatamente, eu e o colono nos
entreolhamos apreensivos.
Ali, eu me sentia completamente na obrigação de ajudar Vincenzo.
Sim, eu sabia como evitar aquelas malditas pragas. Entretanto eu precisava
pensar muito bem antes de tomar qualquer atitude quanto ao contrato na
Gatti. Afinal, se eu aceitasse, teria que ficar aqui na Toscana por longos anos.
Ou quem sabe para sempre?
– Calma, Vincenzo. Vamos dar uma olhada nas folhas! – digo,
levando minhas mãos em seus ombros, enquanto o colono recolhe sua cesta
de uvas e se afasta totalmente desolado.
O belo moreno apenas concorda com a cabeça. Os olhos baixos, as
sobrancelhas franzidas em chateação. Fizemos o percurso até a parte de baixo
do terreno, completamente mudos. Vez ou outra escutava um suspiro do
CEO, que fazia meu coração orgulhoso apertar.
– Lara, olha essa lama. – então, ele mira meus pés. – Errou na cor
do tênis.
Observo meus tênis brancos e dá um dó tremendo de seguir em
frente.
– Eu posso te ajudar? – ele me pergunta.
– Como?
Então, sem eu ao menos esperar, ceder, permitir, Vincenzo me
enlaça nos braços e me coloca em seu colo.
Parece que vou desmaiar, tamanho constrangimento.
– Vincenzo, não precisava. – digo, envergonhada, as bochechas
quentes como labaredas.
– Relaxa, Lara.
Meu corpo inteiro colado ao dele. Meu rosto perto de sua barba mal
feita. O perfume de banho tomado também me enlouquece. Sinto os braços
fortes, um em minhas costas, o outro em minhas pernas flexionadas. E eu
agora torcia inclusive para que aquele trecho de lama tivesse quilômetros ou
milhas.
Estou apavorada com tamanha gentileza.
Assim que Vincenzo me coloca no chão, ele segue como se nada
tivesse acontecido. Eu continuo paralisada, sentindo o seu perfume em minha
roupa.
– Vem, Lara. Já estamos chegando.
Recupero a sanidade e sigo em direção àquele homem alto,
elegante, forte.
Lara, o que está acontecendo com você? Simplesmente, me
pergunto.
Assim que caminhamos mais um pouco, já vislumbro à minha
frente as imensas videiras com as folhas pintadas de amarelo e imediatamente
já noto o ataque da pérola-da-terra, um inseto alado e altamente ameaçador ao
desenvolvimento saudável das parreiras.
– Olha, olha isso, Lara! – Vincenzo caminha por entre as plantas
dando pequenos tapas nas folhas, completamente desolado.
– Vincenzo, ouça. Isso é pérola-da-terra.
Ele se vira para mim, com um ar curioso.
– O quê?! – ele sibila em estranhamento.
– É um inseto. – então, chego bem perto do belo rapaz e lhe mostro
uma folha completamente afetada pela praga. – O período mais indicado para
avaliar a presença desse bicho no parreiral é no início da brotação,
arrancando as plantas fracas e observando a presença das ninfas nas raízes.

Vincenzo imediatamente sorri incrédulo. Seus olhos brilham de


uma maneira tão intensa que mal posso distinguir o céu por detrás de sua
cabeça, pois eles se confundem.

– Lara... – ele sibila bem perto de mim. – você descobriu o que


ninguém nesse lugar foi capaz, até agora. – então, o belo moreno estica os
dedos até meu rosto e acaricia minhas sardas.

– Plantas com estes sintomas, geralmente têm baixo vigor, entrenós


curtos, entram em declínio e morrem. – sibilo com os olhos perdidos nos
dele. – A solução, Vincenzo, é fazer análise do solo, corrigir e adubar a área,
de acordo com as recomendações para a cultura, utilizando, sempre que
possível, adubo orgânico. Evitar, também, a utilização de equipamentos como
a enxada rotativa, porque aumenta a dispersão do inseto.
Então ele, numa atitude impensada talvez, me abraça.
Vagarosamente levo minhas mãos até suas costas largas. A maneira em como
ele me abraça me faz perceber toda a sua gratidão. Eu havia salvado sua
lavoura, o trabalho dos colonos, seus lucros.

– Por favor, Lara, pense com carinho na minha proposta.

Vincenzo se afasta.

Fico apenas o observando caminhar com todo o porte entre as


parreiras. Conforme Vincenzo se infiltra no meio das uvas, a luz do sol brinca
de intensificar ainda mais o preto de seus cabelos. A camisa social azul
bonita, a calça jeans perturbadora, a gentileza, a gratidão e só me resta
suspirar perdida, completamente perdida em minhas decisões.

***

Estamos de volta à vinícola Gatti, após a manhã agradável junto aos


colonos e a beleza das parreiras de uva. Almoçamos por lá mesmo, numa
imensa mesa de madeira, repleta de massas e pães. As cozinheiras daquela
espécie de alojamento de colonos trataram logo de caprichar na refeição,
assim que souberam da presença de Vincenzo Gatti.

– Que bom que você aceitou o convite para visita à vinícola, afinal,
pude conhecer ainda mais o seu potencial, Lara.

Subíamos as escadas lado-a-lado.

– Imagina, Vincenzo. É apenas experiência. Não há como crescer e


conviver diariamente com uvas, folhas, terra, plantações e não adquirir algum
tipo de conhecimento.

E assim que chegamos ao hall, somos surpreendentemente


abordados.
– Vocês dois?! – Ana Giulia se intromete no meio de mim e de
Vincenzo, e beija num grude enjoativo a boca do belo moreno. – Tudo bem,
meu amor?

Me afasto da cena patética e miro os meus tênis que já não estavam


nem mais tão brancos.

– Ana, hoje Lara conseguiu identificar a praga que vem erradicando


a plantação. – Vincenzo diz, fazendo um gesto para que eu me aproxime. –
Não sei nem como agradecê-la pelas dicas, as orientações que repassou a
mim e aos colonos...

– Então, agora ela já pode voltar para o Brasil, não é mesmo? –


então Ana Giulia sorri, dando um tom de brincadeira ao que era uma indireta
idiota para mim.

– Não... ela acabou de me dar uma resposta! E estamos aqui para


isso. – Vincenzo sorri e imediatamente vejo os seus olhos gratos
completamente marejados. – Lara, finalmente, vai assinar o contrato com a
vinícola Gatti!

O CEO italiano sorri esperando uma atitude igualmente


entusiasmada de Ana Giulia, mas a magricela apenas faz uma cara
debochada.

– Sério? – é o que apenas ela consegue perguntar.

– É sério, sim, Ana. Eu decidi que vou ficar para ajudar Vincenzo
nos negócios e, principalmente, a tratar da plantação.

Vejo os lábios da namorada do belo italiano entreabrirem


perplexos. Ana está consternada, e certeza de que prestes a pular em meu
pescoço.

– Além de ajudar com as uvas, Lara também pretende auxiliar a


equipe na degustação dos vinhos, no processo de fermentação, enfim, tudo o
que for preciso, Lara estará disposta a ajudar com o seu conhecimento.

Ana Giulia fecha a cara ainda mais, formando umas ruguinhas no


meio de suas sobrancelhas pretas.

– E seu pai? – ela me pergunta.

– Receberá parte das minhas finanças para tocar seus negócios no


Brasil. – sorrio consciente de que incomodava Ana Giulia. – Não poderia ser
mais perfeito, não é mesmo?

Vincenzo, então, dá um beijo no alto da cabeça de sua namorada,


enlaça um dos braços em meu ombro e seguimos em direção a sua sala para a
assinatura do tão esperado contrato.

Olho disfarçadamente para trás e não gosto do que vejo. Ana Giulia
nos encara com um olhar maligno, vingativo, ao mesmo tempo em que meu
coração batia diferente quando estava perto do CEO italiano.

Desliguei o computador, após fazer o planejamento da colheita da


próxima safra. Vincenzo estava a cada dia mais satisfeito com o meu
trabalho, inclusive a exportação de vinhos havia aumentado
consideravelmente nas últimas semanas.

– Já está indo, Lara?

Uma moça bonita e alto astral, com a qual fiz amizade nas últimas
semanas, vem me abordar.

– Sim, Paola. – organizo as folhas e grampeio o calhamaço. – Hoje,


vou sair mais cedo porque preciso ver um lugar para alugar. Morar
eternamente num hotel é bastante dispendioso.

Então, ela vem com os olhos pretos imediatamente dentro dos


meus.

– Mas hoje é dia de polo! Nosso chefe vai estar lá, competindo!

– Vincenzo?

– Não, Barak Obama! – e Paola bufa, impaciente.

Enquanto fico paralisada olhando a tela apagada do computador,


imagino aquele homem no uniforme de polo, sedutoramente sobre o cavalo,
dando aqueles golpes de taco, e os braços fortes fazendo aqueles movimentos
bruscos e excitantes.

– Eu vou. – sibilo.

– Vai mesmo? – ela pergunta e sorri.

Então, completamente rendida, reitero para a minha amiga.

– Sim, eu vou, Paola.

Em seguida, ela me mostra as chaves.


– Quer uma carona?

– Claro. – estava triste em como Vincenzo sempre derrubava os


meus planos.

Assim que descemos as escadas da empresa, vimos mais à frente


Vincenzo e Ana Giulia adentrando no carro de luxo. Eles estavam discutindo.
A mulher falava alto, gesticulando, enquanto o CEO italiano apenas fechava
o rosto em descontentamento aturando as sandices de Ana.

– Olha, Lara, olha só como a serpente grita!

Paola já trabalhava na vinícola há algum tempo. Ela conhecia bem


as peripécias de Ana Giulia. A magricela conheceu Vincenzo naquela
empresa. Era secretária, passou a assessora e depois a namorada. Ela só não
dava nó em pingo d’água porque víboras não têm mãos.

– Que vexame. – me sento no carro. – Morro de pena do Vincenzo,


por ele ter que passar por esses constrangimentos diante de seus funcionários.

– Ele já conhecia o gênio dessa mulher, Lara. – então ela dá partida


no carro. – Não é nenhum inocente e imaculado! Ele gosta do veneno, pelo
jeito.

Estico os olhos por trás do vidro fumê e vejo Ana num diálogo
agressivo com o namorado, enquanto ele levava as mãos no rosto num gesto
impaciente.

– Vamos ver até quando Vincenzo vai aturar o veneno de Ana


Giulia, não é mesmo?!

– Hm, isso quer dizer alguma coisa?! – ela me olha com um sorriso
safado nos lábios.

– Quero dizer que Vincenzo abrirá os olhos, e finalmente verá


quem realmente é Ana Giulia. – adorava falar essas frases clichê, bem ou mal
eram frases de efeito e estavam sempre carregadas de verdades.
Então, na próxima curva que Paola faz, ela me relembra uma
situação que envolveu a megera há algum tempo.

– Amiga, lembra que eu te contei que Ana Giulia perseguiu uma


funcionária, apenas porque ela não deixava barato nenhuma afronta da
víbora? Coitada, Mirna sofreu, mas Vincenzo direcionou a menina ao
trabalho de campo, pois estava insuportável a relação das duas.

Abro o vidro e sinto o vento da tarde em minha pele.

– Pelo menos Vincenzo não chegou a demiti-la.

– Sim, ele é justo, e sabe muito bem que a namorada não é flor que
se cheire.

Concordo com Ana assim que ela estaciona em frente ao clube de


polo.

Era a primeira vez em que eu ia a um lugar desses, chique, da alta


sociedade, ainda mais que vivia recrutada naquela fazenda, podia contar nos
dedos as vezes em que saí para a capital. Ainda bem que morar em Milão, por
um tempo, me ajudou a abrir meus horizontes. A partir dali, amadureci, e
acredito que se eu não tivesse vivido essa experiência, talvez não estivesse
aqui, longe de meu pai e das minhas raízes, neste momento.

Assim que nos acomodamos naquela arquibancada, esticava os


olhos curiosa para identificar qual dos quatro rapazes era Vincenzo.

– Toma, amiga. – Paola, prevenida como de costume, me entrega


um binóculo e imediatamente analiso o rosto de cada um. – É o do cavalo
marrom! – ela me dá uma dica de ouro.

Então, percorro o binóculo no corpo de Vincenzo. Eles estavam a


postos e não haveria momento ou oportunidade melhor de analisar cada
detalhe do corpo do CEO italiano, sem que ele percebesse a minha
indiscrição.
Olho suas botas perfeitamente encaixadas nas pedaleiras. Subo mais
um pouco e seu joelho flexionado marca os músculos do início de sua coxa.
Estou inflamada em volúpia. Vincenzo era o meu desejo mais oculto. E eu
guardava esse segredo a sete chaves. Não poderia misturar as coisas, pessoal
e profissional. Tenho certeza de que tudo o que sentia não passava de meros
delírios de uma mulher de trinta anos carente e tarada por morenos de olhos
azuis.

Assim que levanto o binóculo mais um pouco, antes de analisar o


abdômen que, mesmo Vincenzo estando sentado, era tão reto quanto uma
tábua, o volume gostoso me chama a atenção. Abro a boca e estou prestes a
suspirar, quando Paola me recobre a realidade.

– Você está vendo Ana Giulia?

– Não me atrapalhe agora, por favor. – digo, com os olhos grudados


naquele corpo.

– Mas o jogo ainda nem começou, Lara!

– É por isso mesmo...

Assim que miro as lentes no rosto de Vincenzo, uma paz me acolhe.


Os olhos azuis me surtiam uma espécie de hipnose que acalentavam todos os
meus anseios. Seu semblante sério e compenetrado me transmitia sentimento
de proteção. Eu sabia com quem contar caso precisasse de ajuda ou caso me
encontrasse em algum apuro. Paola era doida e não confiava naquela moça
como em Vincenzo. Depois que concordei em assinar o contrato, nossa
relação estreitou ainda mais, mas não passava das reuniões de horas naquela
sala, dos telefonemas surpresa no meio da noite para auxiliá-lo em algum
projeto urgente. Ele estava sempre valorizando minhas qualidades e, dessa
maneira, conquistava a minha confiança, ainda mais.

Vincenzo era maravilhoso, em todos os sentidos. Profissional,


amigo, e certamente bom de cama.
De repente, o jogo começa.

– Acho que ela não veio. – mal escuto Paola, por conta da torcida
em polvorosa.

– Ana? – pergunto.

– Não! A duquesa de Sussex!

Reviro os olhos e sorrio. Paola não valia a água que bebia.

Assim que os cavalos avançam em direção à bola, os rapazes


começam a disputar o gol. Vincenzo dá a primeira tacada na bola e ela vai em
direção a um outro jogador que revida o gesto para fora do campo.

– Vincenzo é muito bom para estar nessa equipe. – digo comigo


mesma, mas Paola escuta.

– Lara, ele só deu uma tacada em dois minutos que o jogo começou
e você já tirou as suas conclusões sobre o time? Precipitada, diga-se de
passagem...

– Fica quieta, Paola, me deixa, vai. – digo, brincando com a minha


amiga, que me olha com aquele ar jocoso de costume.

Por mais que eu quisesse ocultar a minha paixão por Vincenzo, já


estava praticamente impossível. Os sentimentos transbordavam por minha
boca e saíam em forma de suspiros e palavras sem eu ao menos perceber.

– Está apaixonada, eu sei. – Paola conclui de repente, enquanto


pressiono as mãos ansiando pela próxima tacada do CEO italiano.

– Do que você está falando? – pergunto com os olhos presos ao


binóculo.

– De você e Vincenzo. – Paola dessa vez não opta por suas


piadinhas sem graça, e faz uma observação direta, que me retira
imediatamente do eixo, mas eu a ignoro.

Perco meus olhos no italiano que desliza em seu cavalo em busca


da bola, e na próxima tacada, a pequena esfera vai como uma flecha em
direção ao gol. Levanto e vibro junto com a torcida. Paola me abraça e sorri,
afundando meu rosto em seus cabelos cacheados.

– Não precisa me responder. – ela grita, porque a torcida


praticamente ocultava a sua voz. – Seus olhos e seu sorriso já me
responderam.

Sugo a Coca-Cola e olho compenetradamente nos olhos pretos


daquela italiana. Se ela havia percebido meus sentimentos assim, com tanta
facilidade, deveria tomar cuidado para que Vincenzo não visse o mesmo
dentro dos meus olhos.

Uma paixão ardente me consumia como uma praga faminta.

Olho para o campo e o CEO italiano galopa em seu cavalo, e em


seguida, me faz um aceno. Respiro fundo e respondo ao cumprimento,
enquanto Paola me dá uma cotovelada e sorri, já imaginando sandices em sua
cabecinha de vento.

***

Após os minutos animados que passamos na torcida da equipe de


Vincenzo, o jogo finalmente acaba. O italiano fez um gol que foi o suficiente
para dar a vitória ao seu time de polo.

Assim que descemos as laterais da arquibancada, mesmo com Paola


falando descontrolavelmente em meus ouvidos, ouço alguém me chamar.

– Lara!

Olho curiosa para trás e surpreendentemente vejo Vincenzo


segurando pelas rédeas o seu cavalo. Ele me olha ofegante.

– Oi, Vincenzo!

– Vem cá, por favor. – ele é sério e quem vê assim até imagina que
é um durão arrogante.

– Paola, você me espera? – me viro para a minha amiga.

– Claro que não, besta. – ela dá um tapa atrevido em meu braço. –


Você vai estar a pé e consequentemente ele vai te oferecer uma carona.

Paola me empurra as costas enquanto eu vou em direção a


Vincenzo com um sorriso sem graça desenhado na boca.

– Entra por lá! – ele me aponta um portão.

Assim que observo os saltos altos de meu scarpin e a grama fofa na


qual Vincenzo queria que eu pisasse, uma insegurança me arrebata. Eu tinha
certeza absoluta de que iria cair estatelada como um cacho de bananas
maduras, assim que desse o primeiro passo em direção ao gostosão do polo.

– Já vou.

Dou o primeiro passo e já faço um pequeno esforço para retirar o


salto de dentro da terra. Dou o segundo e é inevitável. Minhas pernas
dançam, meus sapatos prendem e meu pé dobra. Torção na certa!

– Ai! – caio no chão, segurando o meu tornozelo.

– Lara! – Vincenzo corre em minha direção, deixando o bicho


marrom com o rapaz que cuida dos cavalos. – Está tudo bem?

O italiano flexiona as pernas se abaixando bem perto de mim. Ele


coloca uma das mãos por baixo de minha nuca. Meu tornozelo lateja, mas
ainda não sinto dor, embora tenha certeza de que torci.
– Acho que torci meu pé.

Vincenzo imediatamente estica a mão até meu pé e aperta. Além da


dor, sinto uma mistura louca de prazer e desejo. Sua mão era grande e quente
e ele consegue praticamente envolver todo o meu delicado tornozelo em sua
palma.

– Dói?

– Ahã. – gemo, concordando e fechando os olhos.

Vincenzo, então, sem me questionar ou pedir permissão, me pega


no colo, mais uma vez.

Há pouco tempo que eu estava aqui, na Toscana, havia sido


carregada mais vezes no colo pelo CEO italiano, do que comido macarronada
com almôndegas.

– Vincenzo, o que você vai fazer? Todos estão olhando! – digo,


envergonhada, fitando seus lábios vermelhos.

– Calma, Lara. Sem momentos para orgulho ou constrangimentos.


Você precisa colocar um gelo nesse pé e repousar. Nada mais além disso. – a
voz autoritária reverbera em meu ouvido.

Mesmo suado, Vincenzo exalava um cheiro entorpecente


amadeirado.

– Agora, além de mega empresário de uvas é socorrista com


especialidade em pés torcidos?

Ele sorri.

– Existe isso?

– Acho que exagerei. – digo, repousando minha mão em seu


peitoral, como se fosse sem querer.
– Então, deixa eu ser seu socorrista com especialidade em pés
torcidos. Confie em mim.

Assim que ele me coloca com cuidado no chão, estou prestes a


apoiar o pé.

– Não apoia. – Vincenzo me recrimina com o ar autoritário de


sempre. E antes de me ajudar até a porta do carona, ele joga meus sapatos no
banco de trás.

– Vincenzo, a troco de que torci o meu pé?! – coloco as mãos sobre


o carro, em apoio.

– Eu ia te chamar para ver o meu cavalo. Você já me falou que ama


animais e eu achei que iria gostar.

Meu coração acelera apenas por Vincenzo considerar os meus


gostos, lembrar desses detalhes. Sem querer, me sentia lisonjeada com tanto
apreço.

O CEO italiano me ajuda a sentar ao carona. A dor começa a


intensificar, conforme o sangue vai esfriando. Então, ele dá partida e
imediatamente saímos do clube de polo.

– Fui uma estabanada. Desculpa por causar esse transtorno... aliás,


o meu hotel é para o outro lado da cidade. – digo, observando ele pegar uma
outra estrada, no cruzamento.

– Você vai para a minha casa, Lara. – então, ele me olha. – Você já
fez tanto por mim nessas últimas semanas! Não posso simplesmente
abandoná-la num hotel ou com a louca da Paola.

Sorrio, imaginando que eu estava certa quando pensava que


Vincenzo era sim meu porto-seguro ali, na Toscana.

Olho pela janela e sentimentos bons me encontram. Eu não estava


completamente desamparada naquela cidade desconhecida. Eu tinha o
carinho de Vincenzo. Não que fossem carinhos com os intuitos que tanto
desejava, mas já era um começo.

Quem sabe um dia, Vincenzo, eu, e uma bela história de amor?

Assim que ele abre a porta do carro, mais uma vez ele me pega no
colo. A casa de Vincenzo era uma mansão típica italiana, de tijolinhos e
flores pelas janelas.

– Você mora sozinho? – logo tratei de perguntar, não queria passar


desconfortos, de adentrar aquela mansão no colo de Vincenzo e me deparar
com alguém.

– Sim, moro sozinho, como eu te disse, minha família é do Valle


D’Aosta e meus pais vivem lá.

Assinto, enquanto inspiro o seu perfume bom invadindo o meu


olfato. Observo como seus olhos azuis percorrem os corredores conforme ele
avança com a bela encomenda no colo. Sorrio por dentro, talvez ansiosa,
talvez feliz por me encontrar na intimidade de Vincenzo.

– Você fica aqui, Lara, no quarto de hóspedes. – ele abre a porta e,


então, adentramos aquele belo cômodo. – Vou pedir à governanta, Sra.
Verbicário, para trazer gelo.

Ele me pousa delicadamente entre os travesseiros. Seus olhos me


observam por segundos, e eu sinto que Vincenzo deseja dizer algo, mas opta
pelo silêncio, me irritando profundamente.

– Lara, eu vou chamar a governanta. Só um minuto.

Ele sai, com aquele jeito completamente introspectivo, com um ar


gélido e de poucos amigos, mas Vincenzo adquirira aquela capa apenas para
desempenhar o seu papel de CEO e às vezes trazia para a sua realidade fora
da empresa, pois o italiano não era tão frio como aparentava ser. Ele era
quente, humano, empático.
Vincenzo era uma caixinha de surpresas e eu estava a fim de
desvendá-la.

Assim que me sento sobre a cama e olho para o meu pé, ele está
completamente inchado e roxo.

Aperto os olhos assim que sinto uma dor terrível me alcançar,


apenas por tentar movimentá-lo.

Então, surpreendentemente, ouço um grito.

– Cadê ela? Cadê? – era a voz de Ana Giulia.

– Lara está repousando e isso, na verdade, não te interessa!

– Desde quando essa brasileira, essa... essa vadia colocou os pés na


nossa empresa que o nosso relacionamento não é mais o mesmo.

– Ana, você sabe muito bem que não estamos bem há um tempo.

– Vincenzo, você já contou para ela sobre o seu passado? Seu fundo
de poço foi realmente vergonhoso! – a megera gargalha. – Sua ambição é a
sua ruína!

– Ana! Vamos para o seu carro, agora! – Vincenzo grita e um


silêncio se instaura.

Pisco os olhos diversas vezes tentando assimilar as palavras tortas e


ameaçadoras de Ana. Não, eu não queria acreditar. Seria Vincenzo um
mafioso em pele de cordeiro?

Rolo para o lado e me aconchego entre os travesseiros. Toda a


segurança que sentia ao ter Vincenzo por perto acabara de cair por terra. O
que será que Ana quis dizer com passado? Fundo de poço? Eu não sabia
quem ele era. Realmente não conhecia verdadeiramente aquele belo moreno
de olhos azuis turquesa. A maneira com que ele tem me tratado nos últimos
dias tem sido tão inédita na minha falida história amorosa. Eu era um desastre
completo nas histórias do coração. Meu ex-namorado, um religioso
fervoroso! Nossas ideias não combinavam. Assim que parti de Milão, ainda
tentamos sustentar o namoro à distância, mas agora reconheço que foi até
bom não ter durado.

Então, sempre fomos eu e meu pai. Sempre assim. Até Vincenzo e


toda a sua proteção atravessarem a minha vida.

Meu pai é descendente de italianos. Assim que uma colônia se


instaurara, no final dos anos 80, próximo às nossas terras, meu pai conheceu
mamãe no meio de todos aqueles imigrantes. Sustentaram um romance breve,
o suficiente para que me gerassem. Então, após o fracasso dos negócios da
família de mamãe, eles decidiram retornar à Itália. E ela, por sua vez, optou
cruelmente em me deixar recém-nascida com papai, visto que sua família era
extremamente tradicional, e mamãe não queria sofrer preconceitos por criar
solteira uma criança, então decidiu partir, escrevendo linhas cruéis na minha
história e na história de meu pai.

– Lara?!

Olho para a porta e uma senhora caricatural, nos seus quilinhos a


mais, me encara próxima ao batente, com os olhos grandes azuis.

– Sou eu, muito prazer.

– Verbicário. – ela diz com a voz rouca e grave, vindo ao meu


encontro com o cenho franzido, e uma bolsa de gelo nas mãos. – Onde dói?

– Não, não... pode deixar que eu coloco. Obrigada! – me sento


sobre a cama e faço menção de pegar os gelos de sua mão.

Entretanto a italianona é extremamente impaciente. Com a mão


leve como uma bigorna, aperta os gelos no meu roxo. Eu vou até Marte e
volto numa fração de segundos.

Mordo os lábios segurando o choro.


– Dona Verbicário! – Vincenzo adentra apressadamente pelo
quarto, pois já imaginava o que a delicadeza de mãos de gorila poderia estar
fazendo em minha torção. – Pode deixar que eu ajudo a Lara. – então, ele
retira o gelo do meu tornozelo. – Eu falei que era apenas para entregá-la a
bolsa!

A tal da governanta sai arrastando o chinelo, enquanto praguejava


Vincenzo entre os dentes.

– Desculpa, Lara. Não queria mesmo que Dona Verbicário te


aplicasse os primeiros socorros. – e ele sorri lindamente me olhando nos
olhos.

Meu coração acelera, com tanta delicadeza, e por segundos me


esqueço de que Vincenzo poderia ser uma pessoa cruel, com valores
destruídos. Observo seus cílios pretos e longos cobrirem seus olhos abaixados
em direção ao meu tornozelo. Um ar sereno, tranquilo, que não entregava que
o CEO italiano havia acabado de ser insultado por Ana Giulia.

– Ana esteve aqui. – conforme ele aperta delicadamente o gelo em


meu roxo, ele diz com os olhos baixos. E após um suspiro, confessa. –
Terminamos.

– Mentira? – estou perplexa e talvez feliz com a boa-nova.

– Sim... estava insustentável, Lara. – então, enquanto Vincenzo


fala, percebo que já trocou o seu uniforme de polo, por uma camisa branca e
uma calça jeans. Igualmente lindo como num terno.

– Imagino. – sou monossilábica. Não poderia transparecer minha


satisfação e a ansiedade de contar logo a Paola.

– Ana é uma pessoa arrogante, calculista.

– Então, por que se envolveu com ela? – digo, num fio de voz, mas
não poderia deixar de perguntar.
Ele sorri de lado.

– Carência? Já ouviu falar?

Aperto os olhos em estranhamento observando Vincenzo ainda


pressionando gelo em meu tornozelo. Aquele um metro e noventa de beleza e
poder, carente?! Reviro os olhos com a tremenda cara de pau do CEO
italiano.

Então, coloco minha mão por cima da dele, cessando os seus


cuidados comigo. Ele me olha.

– Por que está fazendo isso tudo por mim? – sinto meu coração
dançar tarantela em meu peito. Estava surpresa com minha impetuosidade.

– Lara... – ele fala com uma voz sedutora, mesmo que não tivesse
intenções de seduzir, Vincenzo era naturalmente assim. – eu vou ser sincero
com você. – então suas mãos envolvem as minhas. Imediatamente eu arrepio,
quando sinto os seus dedos gelados tocarem a minha pele. – Você é a mulher
mais bonita, inteligente e forte que eu já conheci. Difícil não me abalar, não
me sentir atraído.

Perco o ar e recupero novamente. Vincenzo me olha nos olhos tão


compenetradamente, com tanta amabilidade, que aquele gesto já é o
suficiente para acalmar a dor em meu pé. O silêncio no quarto é
ensurdecedor. Por pouco, não ouço às batidas de meu coração. Mas a fala
ameaçadora de Ana reverbera em minha mente como uma coça de açoites.

– Obrigada, Vincenzo. Eu jamais imaginaria que...

– Que eu poderia estar encantado por você, Lara? – ele oscila os


turquesas em meus olhos e em minha boca.

Abaixo o rosto. Minha vontade é de pular em seu pescoço e lhe


enfiar um beijo quente na boca. Mas apenas faço o papel da menina tímida e
recatada.
– Você é meu chefe... – finalmente falo e volto a encará-lo.

– E?

– E não pode dar certo. – então, me ajeito na cama e viro de costas


para ele, querendo fugir dos olhos azuis, da tentação inteira que estava ali, à
minha frente.

Então, de repente, ele se levanta e apenas ouço o barulho da chave


girar. Estou apreensiva, completamente envolvida num misto de luxúria,
alegria, ansiedade.

Imediatamente, sinto Vincenzo se deitar por trás de mim. Seu corpo


colado inteiro atrás do meu. Cada centímetro do corpo do CEO italiano
aconchegava cada parte de mim. Sua respiração roça em minha nuca e meu
sexo inflama em desejo. Mas estou imóvel, como uma pedra.

– Lara, eu só fechei para a governanta não vir espiar pela fresta. –


sorrimos juntos, enquanto entrelaçamos as mãos.

– Ela é estranha. Onde você achou esse tipo?

– Verbicário trabalhava na empresa. Caprichosa, proativa... e eu


estava precisando de uma governanta exatamente com as características dela,
então, fiz o convite e ela prontamente aceitou. Não se fez de difícil como
você, Lara.

Gargalho.

– Viu, Sra. Verbicário não é tão insubordinada quanto eu...

Então, em resposta, Vincenzo leva uma de suas mãos em meus


cabelos. Ele faz um carinho tão gostoso que derreto imediatamente como lava
vulcânica. Fecho os olhos mentalizando apenas aqueles dedos brutos entre os
meus fios.
Sinto sua respiração intensificar. Seu corpo esquenta o meu como
numa troca de energia. Estávamos colados naqueles poucos centímetros, mas
era como se fôssemos apenas um só, sem ao menos termos consumado.

– Lara, desde o primeiro dia em que eu vi você, naquela sala... na


verdade imaginava uma velha chata e antipática! – eu sorri, porque imaginava
exatamente o mesmo dele. – E quando você começou a falar, genuinamente
brotou um sorriso em meus lábios. Nem me dei conta e estava feito bobo
ouvindo todos os seus conhecimentos e experiências que nenhum especialista
demonstrou antes ter. – então, sua mão desce por meu ombro, meu braço e
para em minha cintura, num afago. Desfaleço com aquela sensação
anestesiante. – Você mostrou tanta capacidade e inteligência. E quando você
sorria, as covinhas em sua bochecha me desviavam a atenção. Lara, suas
sardas parecem lácteas de tão perfeitas.

Fecho os olhos e dou um longo suspiro. Queria muito confessá-lo


do meu encantamento com as turquesas perfeitas que carrega no olhar. Mas
não posso, não agora, afinal, já não sei mais quem é Vincenzo Gatti.

– Eu só posso dizer que você é um homem belo, que obviamente


me chamou a atenção, mas que também me irritou demasiadamente. –
sorrimos, então pressiono sua mão em minha barriga. – Estar aqui agora é
estranho, porque parece que já nos conhecemos há tanto tempo...

Então, ele aperta seus lábios em meu rosto, num beijo. A barba roça
em minha pele e imediatamente vejo estrelas no teto do quarto.

– Preciso acessar uns e-mails. – Vincenzo se levanta, deixando


apenas um gostinho de quero mais, após aquele momento tão acalentador. –
O banheiro ao lado já está preparado para você. Suas roupas estão na sala.

– Na sala? – minhas sobrancelhas se unem num perfeito ponto de


interrogação.

Vincenzo sorri.

– Eu conheço o Francesco, dono do hotel Campane d’oro, então


pedi ao motorista que buscasse todos os seus pertences. A camareira
organizou tudo.

– Uau, não se pode brincar com um CEO poderoso como você.

Ele sorri e, em seguida, sai pela porta.

Pego um dos travesseiros e pressiono em meu rosto num grito


abafado.

Estava feliz, apesar de tudo.

– Pai, está tudo bem, não se preocupe.

Após papai ter me contado das vitórias alcançadas para a sua


vinícola, nesta semana, ele não economizou palavras para me chamar a
atenção.

– Onde você está, filha? Liguei diretamente para o hotel, como


comumente faço e disseram que haviam levado seus pertences para a casa do
tal Vincenzo Gatti...

Que bando de fofoqueiros, nesse hotel! Estou pasma.

– Entenda, pai, por favor. Eu apenas torci meu pé e o Vincenzo é a


pessoa mais próxima de mim, depois de Paola.

– Juízo, minha filha. Ele é seu chefe! Não se deve confiar na fala-
mansa desses milionários.

Sorrio.

– Pai, eu te amo. Obrigada por sua preocupação, mas eu sei me


cuidar. Confie em mim.

– Te amo, filha. Fique com Deus.

– Amém.

Havia acabado de sair do banho e estava ao telefone com papai.


Assim que desliguei e saí mancando do banheiro, meus olhos se
intrometeram curiosos por uma porta semiaberta. A luz estava acesa e meus
pés caminharam silenciosamente por aquele carpete. De repente, vi Vincenzo
deitado em sua cama, apenas de cueca boxer preta. Minha visão alcançava
apenas até seu umbigo. Mordo os lábios e praticamente babo me deliciando
com o CEO praticamente pelado no meio dos lençóis.

Aquela imbecil da Ana era uma tremenda sortuda! Aff.

Olho à minha volta e o imenso corredor, que tinha apenas uma


janela imensa ao final, estava completamente deserto. Então, sorrateiramente
dou um pequeno passo à frente, daí consigo ver o italiano em seu notebook,
altamente concentrado. A luz da tela fazia com que ele franzisse as
sobrancelhas de maneira sedutora. As pernas e a barriga eram amontoados de
músculos, e eu só quero me jogar agora naquele oásis de prazer.

Eu não iria aguentar por muito tempo segurar meus instintos, nessa
casa. Apenas eu e ele.

E Verbicário.

– Precisa de alguma coisa, senhorita?

Dou um pulo e as roupas caem dos meus braços. Já estava em meu


hobby e as roupas de trabalho se espalham pelo chão afora.

– Assustada? – além de tudo, ela tem uma verruga peluda em uma


das maçãs do rosto.

– Senhora Verbicário, fale baixo, por favor.

Então, a governanta simplesmente me ignora, se abaixando e


catando minhas roupas. A senhora mal encarada me olha nos olhos e empurra
os pertences sobre mim.

– Toma. – a voz grossa e assustadora. Ela deveria fumar e muito!

Vou arrastando meu pé até o quarto de hóspedes, e amanhã pela


manhã já iria retornar ao hotel e ao trabalho. Certeza de que estaria novinha
em folha, afinal, nem foi tão grave assim.

***

Estava lendo um livro que encontrei na cabeceira do quarto. Apenas


um abajur aceso. Dentes escovados, hidratante nas mãos e nos pés e agora
restava apenas o sono chegar.

De repente, ouço um toc toc.


– Tudo bem aí? – olho para a porta e uma figura linda me observa
com um sorriso curioso. – Posso entrar? – Vincenzo insiste.

Fecho o livro e o coloco sobre a cabeceira. Me sento na cama e o


italiano vem até mim, sem me esperar dar alguma permissão.

– Estou melhor, Vincenzo.

– Deixa eu ver esse pé.

Então, ele já de pijama, short e camisa de malha LV, levanta o


edredom, segura delicadamente no meu tornozelo e faz movimentos
circulares em meu pé. Observo como Vincenzo está sério e concentrado.

– Ai, para, para. Está doendo aí.

– Aqui? – ele pressiona o seu polegar. – Você vai ter que ir ao


médico amanhã, Lara.

– Eu não vou. Eu vou trabalhar de tênis ou sapatilha, mas vou.


Depois, voltarei para o hotel.

Então, Vincenzo caminha lentamente até mim. As pernas


musculosas se desenhavam a cada passo em minha direção.

– Não tem mais hotel.

– Como assim, não tem mais hotel? – dou uma risadinha com medo
de sua resposta.

– Eu pedi ao motorista que encerrasse a sua estadia. Fechasse a


conta e todo o necessário para que você tivesse apenas a minha casa como
saída. – então, ele se senta em minha cama como se me contasse a mais
trivial das novidades.

– Eu não acredito que você fez isso, Vincenzo! Que autoritário,


arrogante! Eu não suporto homens assim!

– Lara, eu...

– Eu não terminei. Amanhã eu estarei indo embora da sua casa. –


sim, eu estava gritando, completamente possuída. – Você pensa que tem
poder sobre mim! Mas não tem, entendeu?

Me jogo na cama e apago o abajur, praticamente rodopiando o


objeto na superfície de madeira, tamanho ódio daquele macho alfa.

Quem ele achava que eu era?

Um brinquedinho?

Uma boneca de corda que ele controlava para lá e para cá?

Então, apenas sinto, naquela escuridão do quarto, a mão de


Vincenzo em meu ombro. E seus lábios que me beijam a bochecha outra vez.

– Fera indomável, durma bem.

Ele bate a porta e eu fico tentando, inutilmente, controlar as batidas


desvairadas do meu coração.

***

O galo cantou, e eu imediatamente olhei em meu relógio. Marcava


6h15 da manhã. Abri melhor os olhos e imediatamente me dei conta de que
me encontrava na casa do CEO italiano.

Apesar de todo o carinho e cuidado de Vincenzo comigo, duas


coisas me incomodavam demasiadamente. Primeiro, o passado de Vincenzo.
O que Ana poderia ter insinuado naquela discussão. E segundo, a
superproteção que estava prestes a sufocar os meus passos.
Sentei na cama e estava completamente decidida em partir, voltar
para o hotel e para a minha independência.

Era inevitável afirmar que eu estava completamente louca por


Vincenzo. E ele por mim, pelo que me disse ontem, nesta cama. Mas apesar
dos nossos corpos estarem sedentos um pelo outro, havia essas pendências
que me freavam muito mais que os conselhos de meu pai, para eu não me
envolver com chefes, milionários e nada mais nesse contexto.

– Bom dia, minha felina furiosa. Mais dócil hoje?

Vincenzo adentra, de repente, o quarto com uma bandeja de


quitutes nas mãos.

– Dócil, eu? – ajeito minha franja um pouco comovida com aquele


gesto carinhoso.

– Eu trouxe para você, Lara. – ele deposita a bandeja ao meu lado.


O perfume do café e das carolinas de chocolate me enchem a boca d’água. –
Eu sei que não poderá sair da cama pelo resto do dia.

– Eu?! – sorrio sarcasticamente, calçando as minhas pantufas lilás.


– Mas é claro que eu vou sair dessa cama, dessa casa, do seu domínio e...

Vincenzo me abraça assim que me levanto. Ainda não encostei o pé


colidido no chão.

Nossos rostos estão colados, muitos colados. Nossas íris se


encontram e se enfrentam. O corpo de Vincenzo está completamente junto ao
meu. Ele, de terno. Eu, num baby-doll de seda marfim.

Ele não diz nada. Meu olhar apreensivo já confessa tudo.

Vincenzo me olha nos lábios com vontade, muita vontade de me


beijar. Os olhos azuis são hipnotizantes. Acalentadores, envolventes. E eu
sou apenas um poço de desejos e sentimentos por tudo o que Vincenzo
significava, no momento, para mim.

Ele era doce, irritante, carinhoso, dominador, misterioso. E eu era


apenas a garota que ajudara a salvar os seus negócios.

Fecho os olhos e os lábios tentadores encostam nos meus,


juntamente com um abraço forte e excitante que me envolve todo o corpo.
Sinto a língua de Vincenzo alcançar a minha e preencher em segundos toda a
minha boca. Meus pelos eriçam, meu corpo esquenta. Eu cravo minhas unhas
em seu paletó preto, pretendendo rasgá-lo. Vincenzo passa as mãos por baixo
da minha camisetinha de baby-doll e eu já estou louca para dar para ele neste
exato momento.

– Lara... – ele balbucia em meu ouvido. – io te voglio tanto bene...

Praticamente derreto em seus braços com aquela voz rouca ao pé do


ouvido. Vincenzo era tão forte, cheiroso, sedutor. Estou rendida,
completamente rendida.

Então, ele segura minha bunda num impulso, e eu pulo no seu colo.
Entrelaço minhas pernas nas costas de Vincenzo. Nossas bocas não se
desgrudam por nenhum segundo sequer, era como se fosse vital aquela troca
de desejo, de salivas.

Vincenzo me encosta na parede e finalmente olhamos um nos olhos


do outro. Ofegantes, exauridos de tesão. Ainda estávamos perfeitamente
encaixados. Minhas pernas em suas costas, suas mãos em meu rosto.

– Você é tão linda. – ele me olha sério, porém a voz repleta de


carinho.

Suas sobrancelhas pretas são a moldura perfeita para seus


turquesas.

– Você é um homem lindo, poderoso... uma perdição, Vincenzo... o


que deu na gente... – balbucio.
Ele beija lentamente a minha boca e me pressiona o pênis ereto,
quente, delicioso. Reviro os olhos inebriada.

Vincenzo continua friccionando em mim, a melhor parte de seu


corpo. Fecho os olhos, enquanto o italiano lambe minha orelha, sem parar de
me apertar com aquela delícia de volume...

Meus dedos estão em seus cabelos, e ele me aperta contra a parede.


Estou tão excitada que não seria muito difícil de gozar assim mesmo, com
suas investidas, seu corpo, perfume, beijos.

– Quero você... – sua boca já está em meus seios. – ...bella ragazza.

Eu estava completamente rendida, eu também precisava muito de


Vincenzo dentro de mim, me levando ao ápice do prazer, mas... eu precisava
confessá-lo. E, determinada como de costume, não reluto dizer:

– Eu... eu sou virgem. – confesso em seu ouvido.

De repente, como se eu jogasse um balde de água fria no meio de


nós dois, Vincenzo me encara em estranhamento.

– Você o quê, Lara? – ele pergunta, me colocando no chão.

– Pode parecer estranho, uma garota de trinta anos virgem hoje em


dia, mas é verdade. – digo, olhando seriamente em seus olhos.

Tento caminhar até a cama, mas o meu pé dói. Vincenzo, então,


percebendo a minha dificuldade, me ampara até a cama.

– Você nunca namorou? Uma garota tão interessante como você,


Lara? – ele cruza os braços e está em pé exatamente à minha frente. O
volume perturbador me encara de volta.

– Sim, eu já namorei, mas meu namorado era extremamente


religioso e, por isso, queria se casar virgem, enfim... e como eu já te disse,
Vincenzo, sempre morei naquela fazenda, longe da vida agitada, dos homens
interessantes, de qualquer oportunidade tão gostosa quanto essa. – e estico a
minha perna acariciando o belo italiano que estava bem à minha frente.

Vincenzo sorri incrédulo, levando uma das mãos à boca e olhando


para o lado. Então eu vejo em como o seu pescoço está vermelho dos meus
beijos quentes e urgentes.

– Lara, – ele debruça em mim, depositando as mãos sobre minhas


coxas. – não deixe de lanchar. Dona Verbicário estará à sua disposição.

Ele me beija a boca e sai pela porta, coçando a nuca. Talvez minha
surpresinha tivesse incomodado Vincenzo.

Deito na cama, rebobinando em minha mente cada beijo, cada


toque, cada sussurrar em meus ouvidos. Esse CEO poderoso tinha o domínio
de me retirar, inclusive, todo o juízo.

***

Após o delicioso almoço feito por Dona Verbicário, – sim, apesar


de não parecer, ela cozinhava como fadas. – sentei-me na sala de televisão
para assistir a um filme. Meu pé estava uma bola de sinuca e eu realmente
não poderia me ver livre de Vincenzo nem tão cedo.

E até parece que eu queria.

Durante a manhã, já havia resolvido, em meu notebook, todas as


pendências e planilhas repassadas por Vincenzo, referentes à vinícola Gatti.
Agora, eu estava momentaneamente livre para uma catarse.

– Srta. Lara, uma amiga sua está aqui. – a governanta surge como
um fantasma na porta, então a destrambelhada dá um grito de onde está,
surtindo um eco insuportável que faz vibrar meus tímpanos. – Pode entrar!!!

Paola aparece com um olhar desconfiado mirando a cara amarrada


de Dona Verbicário.

– O que é isso?

Sorrio, chamando a morena de cabelos cacheados para se sentar ao


meu lado.

– É uma governanta. Já teve uma dessas? – ligo a televisão.

– Parece que acabei de entrar num filme de terror.

– Fala baixo, Paola.

Então, ela me abraça.

– Aquele setor fica tão sem graça sem você, Lara! Mas, me conta!
O que deu no Vincenzo para te hospedar aqui?!

Sorrio e balanço a cabeça em suspiros.

– Ei, que olhar é esse?! – ela me pergunta, abraçando uma


almofada, ao mesmo tempo em que cruzava as pernas.

– Nada, amiga. Vincenzo é gentil, me quer bem... – então, me


aproximo dela, cochichando praticamente, com medo da governanta estar
ouvindo atrás da porta.

– Aumenta o volume da TV! – Paola, já percebendo a iminente


fofoca, pega o controle de minha mão e aperta nas alturas, como se estivesse
na sua própria casa.

– Tem algo estranho. Ontem, inevitavelmente ouvi Ana e nosso


chefe discutindo.

– Novidade. – Paola está ansiosa e me interrompe o tempo inteiro. –


Não acredito que a fofoca era apenas mais do mesmo!
– Escuta, – respiro fundo, perdendo a paciência. – no meio da briga,
Ana perguntou a Vincenzo se ele já havia contado para mim sobre o seu
passado. E que ele chegou ao fundo do poço e foi completamente
vergonhoso. E Ana concluiu com uma gargalhada, dizendo que a ambição de
Vincenzo é a sua ruína!

Paola está com as duas jabuticabas arregaladas, por pouco não


saltam de seu rosto.

– Quanto mistério, Lara! O que será que houve?

Fecho os olhos e passo as mãos no rosto.

– É exatamente isso que preciso saber.

Ficamos em silêncio por um tempo. As perguntas pairavam no ar,


incomodando a mim e à minha amiga. Estávamos curiosas com tudo o que
foi dito por Ana.

– Tive uma ideia. – de repente, Paola se sobressalta, jogando a


almofada no chão. – Não é muito ético o que eu vou sugerir, mas se for para
descobrir o passado do cara pelo qual você está apaixonada, eu acho
completamente válido.

– Eu não estou apaixonada. – digo com feição de poucos amigos.

– Sei.

– Anda, desenvolve, Paola, o que ia me falar!

Ela olha para os lados, temendo a presença da governanta, então


cola seu rosto no meu, talvez para certificar que eu prestava totalmente a
atenção às suas sandices.

– Você está na mansão de Vincenzo Gatti. Apenas vocês dois.

– E Dona Verbicário.
– Putz, havia me esquecido da versão feminina do Frank Stein. –
ela desarma, relaxando o corpo esguio entre as almofadas. Então, em poucos
segundos, minha amiga retorna à posição inicial. – Mas o que eu quero dizer
é que você pode buscar no escritório dele algum indício, alguma anotação,
algum recorte de jornal que seja! Você nunca viu nos filmes? Os ricaços
sempre guardam seus segredos naqueles escritórios imensos, como
bibliotecas.

– É uma boa ideia. – estava surpresa, pois a cabeça sem parafusos


ainda estava em pleno funcionamento.

– Assim que a tal da Verbicário brotar nessa sala, eu a levo para a


cozinha em desculpa. E você age, ouviu, Lara?

Respiro fundo, mordendo o canto das unhas e sentindo meu coração


completamente descompassado. Estava com medo, ansiosa, mais com o que
poderia vir a encontrar sobre Vincenzo, do que alguém descobrir minha
atitude inconveniente, censurável.

Olho ao redor e estávamos numa sala repleta de janelas grandes de


vidro. Era uma casa antiga, então eram janelas de ferro pintadas de branco e,
ao lado de fora, víamos a imensa varanda repleta de folhagens e samambaias.
As montanhas toscanas ao longe.

– Estou sentindo cheiro de café fresco. Ela já deve estar vindo. –


olho de maneira ansiosa a porta.

– Vou derrubar a bandeja no chão, não se assuste, Lara. – minha


amiga diz, estalando os dedos e alongando os braços.

– Não acredito que você vai fazer isso, Paola! Nível de maturidade
zero!

Minha amiga revira os olhos, me dando leves tapas no ombro.

– Você pediu minha ajuda, agora está me criticando? Menos, Lara!


– Desculpa, vai. Estou nervosa. Ai... ela está vindo.

Assim que Dona Verbicário adentra a sala, Paola se levanta, e eu,


mais devagar um pouco, vou ao lado dela. Minha amiga falava gesticulando
com as mãos, como a típica italiana que era, e no meio do girar de mãos, a
última giradinha que ela faz, é a que encosta na bandeja, que imediatamente
desaba das mãos de Sra. Verbicário. As xícaras e o bule de louça espatifam, o
café esparrama, os biscoitinhos de polvilho dão pulinhos pelo tapete e a
tragédia está instaurada.

Nos entreolhamos assustadas, uma para outra e para Dona


Verbicário.

A anciã morde os lábios, enruga a testa, fecha os punhos e sai pela


porta como uma ventania de agosto.

– Espera, senhora, eu te ajudo!!! – Paola sai correndo atrás da


governanta, piscando os olhos para mim, como num tique nervoso. Nem era
necessário tanto, eu já havia entendido o recado.

Saí da sala, ainda mancando. Minha vontade era de correr, mas o


que me restavam eram os passos de formiga.

Assim que adentrei na terceira porta, finalmente vi o que


exatamente Paola havia me descrito. Uma estante de livros, não, não era
apenas uma estante, mas uma parede inteira repleta de livros pelos quatro
cantos e, ao centro, uma mesa antiga de madeira escura.

Entrei e fechei a porta imediatamente, trancando à chave.

Prontamente fui até uma cômoda onde havia alguns porta-retratos.


Meus olhos curiosos fitaram um Vincenzo mais jovem, adolescente, na
verdade, sobre um cavalo bonito. O rosto sério, imponente sobre aquele bicho
era exatamente o mesmo de agora. Ao lado, a foto do que poderia ser a sua
família, ele, o pai, um homem sisudo – Vincenzo tinha a quem puxar – e a
mãe. Suspirei com aquelas lembranças, pois estava agonizando de saudades
de papai, da fazenda, das minhas raízes.

Após o momento nostalgia, fui em direção às gavetas, a todas que


eu poderia ver naquele espaço. Abri uma, mexi nuns papéis, num tabuleiro de
xadrez, abri outra cheia de caixinhas decorativas, fotos de viagens e mais
outra onde estava um porta-retrato de Ana Giulia virado com a foto para
baixo. Um sorriso estampa involuntariamente os meus lábios. Quando estava
abrindo a última gaveta, vi uma portinha abaixo da cômoda, decidi olhar ali,
era muito óbvio encontrar alguma coisa dentro de gavetas. Assim que
coloquei a mão no puxador e abri, meus olhos encontraram cartas, jornais e
uma pasta preta.

– Boa, Lara.

Abri a pasta e estava repleta de documentos. Meus olhos


lacrimejaram quando eu vi que era um alvará de soltura de Vincenzo. Ele
havia sido detido em 2005, aos 19 anos e solto aos 25 anos de idade, em
2009.

– Condenado em 2005. – estou pasma, olhando para o nada. O que


poderia significar isso.

Miro alguns jornais e vejo o rosto do belo moreno estampado, além


de um senhor ao seu lado. Estou boquiaberta com tantos mistérios.

De repente, ouço vozes, olho pela janela e surgem Paola e


Verbicário caminhando lado-a-lado, como se fizessem o caminho de volta
para a casa. Imediatamente me escondo embaixo da mesa de Vincenzo, para
que a governanta não me veja, enquanto observo duas caixas de vinho mais
ao canto.

– Melhor eu ir. Mancando desse jeito, corro o risco de ainda ser


pega.

Guardo todos os documentos e saio com a informação de que


Vincenzo havia sido detido durante 4 anos. Estou perplexa, decepcionada.
Ele era um conjunto de coisas boas e era muito difícil de aceitar que ele fez
algo contra a lei, foi julgado, punido, e solto, finalmente, mas... por quê?

Fecho a porta do escritório e o imenso corredor está deserto.


Caminho desolada, com centenas de pulgas atrás da orelha.

No entanto, mais cedo ou mais tarde, iria eu mesma questionar a


Vincenzo, sobre o seu passado. Eu não gostava de coisas mal resolvidas, isso
me consumia a paz terrivelmente. Se meu coração já estava completamente
preso ao dele, eu deveria colocar os devidos pingos nos is. Viver com
incertezas apenas minava os sentimentos, destruía as esperanças do que
poderia vir a ser um relacionamento bonito, verdadeiro.

Chego finalmente à sala principal. Certeza de que meu semblante


não escondia as facas afiadas recém-cravadas em meu coração. E Vincenzo
está de pé me observando seriamente. A pasta na mão, o olhar penetrante e
azulado.

– Lara, onde você estava? Sua amiga e Dona Verbicário estão na


cozinha fazendo focaccias para a tarde.

Estou perplexa com o teatro de Paola.

– Eu fui ao banheiro. Apenas isso. Lembra de que não sou


propriedade sua, Vincenzo?

Então, ele joga a pasta sobre uma das poltronas, desfaz o nó da


gravata, enquanto fala.

– Dona Verbicário disse que você sumiu, depois que a tal bandeja
caiu no chão. Sumiu como?

E, no mesmo instante, odeio com todas as forças a velha maldita.


Língua nervosa. Aff.

– Sumi? Como assim, se eu estou aqui! – debocho, ainda parada no


meio dos sofás.
– Não se faça de desentendida, Lara Martinelli. Você é muito
esperta. – ele diz, se aproximando. O perfume amadeirado já tomava conta de
todo o ambiente.

– Nossa, você está realmente muito preocupado, hein Vincenzo?!


Por que, será?! Tem algum segredo nesse casarão?! – grudo meu rosto no
dele, a cada pergunta.

Ficamos em silêncio por segundos apenas focando no olhar um do


outro.

– Um homem sem mistérios não tem histórias. – ele sibila em meus


lábios.

Então, viro de costas e caminho pelo tapete. Um pé, o outro, um pé,


o outro.

– Saiba que eu ouvi a discussão entre você e Ana Giulia. – me viro


para Vincenzo. – E fiquei completamente encucada com as acusações de sua
ex-namorada.

O CEO italiano, de repente, segura o meu braço. Inevitavelmente,


me viro para ele e grudamos nossos olhares outra vez.

– O que você ouviu? – ele ainda me segura. O olhar turquesa estava


sério e apático. Eu estava apreensiva, mas, mesmo assim, não esmoreço.
Afinal, não era qualquer tempestade que me assustava.

– Você sabe. Não precisa me perguntar.

Saio de suas mãos e vou em direção ao quarto.

– Aonde você vai, Lara?

– Embora! – grito, já entrando pelo corredor.

– Não, você não vai, Lara. Seu pé está cada vez pior... o seu
repouso...

– Vincenzo, – me viro para ele, pela última vez. – eu sou dona da


minha vida, do meu destino, de mim mesma. Já, já o táxi vem me buscar, e eu
retornarei ao hotel, e sua opinião não me importa.

Apenas observo Vincenzo engolindo em seco. Ele tenciona o


maxilar e respira sem ritmo. Talvez, o CEO poderoso nunca havia sido
contrariado dessa maneira. A Lara insubordinada e petulante talvez fizesse
pulsar com mais fervor o coração italiano, afinal, se apaixonar pelo o que é
difícil é muito mais saboroso do que pelo o que já tem facilmente nas mãos.

***

Paola já havia ido embora, antes mesmo de eu me enfurnar no


quarto. Vincenzo não veio mais até mim para conversarmos ou para
simplesmente dar continuidade ao seu interrogatório. Talvez estivesse
envergonhado com as minhas desconfianças das mancadas do seu passado, e
ele nem poderia imaginar que me infiltrei em seus segredos naquele
escritório. Seria, de fato, o final dessa história.

O táxi chegaria em minutos. Arrumei as malas e pedi que Dona


Verbicário me ajudasse a carregá-las. Não vi mais nem rastros do CEO
italiano. Teria ele evaporado junto ao seu jeito irritantemente autoritário?

– Agradeça ao Vincenzo por tudo. – aperto as mãos da governanta


antes de me sentar no táxi.

Vou para o hotel sem saber como seria o clima entre mim e meu
chefe naquela vinícola. Estava triste por ter sido dessa forma, mas eu não
poderia deixar de esclarecer os mistérios que rodeavam a aura misteriosa de
Vincenzo Gatti.

Desci do táxi e o motorista foi extremamente gentil comigo,


carregando minhas bagagens até o saguão.
E enquanto eu mancava até a recepção, um rapaz simpático veio me
abordar.

– Quer ajuda?

– Não, obrigada. O pessoal do hotel já me conhece e já virão me


auxiliar com umas muletas, inclusive. – sorrio, me aconchegando na poltrona.

O rapaz me encara com um ar de estupefação, mas era diferente,


pois eu via algum tipo de encantamento em seus olhos.

– Seu sotaque é tão bonito!

Estico os lábios, em agradecimento, enquanto torcia intimamente


para que o camareiro viesse logo me salvar daqueles olhos verdes curiosos.

– De onde você é?

Meu celular vibra em meu bolso, no mesmo instante. Era meu pai
perguntando por que não estava mais na casa de Vincenzo. As notícias
corriam como pólvora!

– Brasil. – respondo com a atenção inteira ao celular.

– América?

– Do sul. – completo.

Volto a olhar nos olhos verdes daquele rapaz. Se Vincenzo tinha


uns trinta e três anos, mais ou menos, esse ragazzo deveria ter uns vinte e
sete, no máximo.

Então, ele chega mais um pouco perto de mim, naquele sofá. Fico
terrivelmente assustada e irritada, principalmente, com a petulância daquele
rapaz. Eu não me lembrava de ter dado algum tipo de intimidade para o cara
ir roçando seu braço no meu, daquela maneira.
– Qual o seu problema? – pergunto de maneira firme e contérrita.

Ele apenas arregala os olhos em deboche, passando, ao mesmo


tempo, a língua em volta dos lábios pálidos. Além de tudo, não era mais o
rapaz simpático que me abordara há segundos, havia acabado de se
transformar numa criatura enjoativa e petulante.

– Menina, eu posso te pagar bem... – e ele tira uma mecha de cabelo


do meu rosto com um dos dedos.

E já é o suficiente para eu perder as estribeiras! De maneira


instintiva, fecho a minha mão e enfio um soco em seu olho esverdeado, com
toda a força, ódio e repulsa que poderiam existir dentro de mim.

– Ai... meus dedos. – imediatamente, encolho sobre minha mão em


dor, enquanto via o cara sentado no chão, se rastejando para longe de mim. O
olho vermelho prestes a ficar roxo era o meu troféu naquela noite.

– Senhorita, senhorita, o que houve?! – as meninas da recepção vêm


em minha direção, o camareiro e também um senhor elegante e simpático,
talvez fosse o tal do Francesco, dono do hotel, todos se colocam à minha
volta.

– Aquele imbecil me chamou para um programa apenas porque sou


estrangeira. – minha voz sai rasgada de raiva. – Agora, não é somente meu pé
que dói... – miro a minha bola de sinuca dentro do chinelo. – mas meus dedos
todos...

Enquanto me contorcia de dor, vejo o camareiro correndo em


direção ao refeitório, para pegar gelo na cozinha. As recepcionistas estavam
ao meu lado, em apoio, e o Sr. Francesco finalmente fala alguma coisa.

– A senhorita já deve ter ouvido falar de mim. – aperto os olhos e


tenciono o maxilar, pois eu já estava imaginando para onde estava se
encaminhando aquela conversa. – Sou amigo de Vincenzo Gatti. Ele é
praticamente o meu filho. – e conclui com um sorrisinho.
Olho mais uma vez fixamente para o rosto vermelho daquele senhor
de uns sessenta e poucos anos, a barba rala, os olhos castanhos... e – não!!! –
quase caio para trás nas almofadas, quando me dou conta de que ele estava
envolvido no esquema de Vincenzo, pois eu vi sim a foto de Francesco
naquele jornal! Certeza absoluta.

– É mesmo? – pergunto, querendo que o dono do hotel me contasse


mais.

– Sim, Vincenzo me ajudou com essa propriedade. Se não fosse ele,


esse hotel e toda a história do Campane d’oro jamais teriam existido.

Concordo levemente com a cabeça, desconfiada, querendo ligar os


fatos, mas o quebra-cabeça não se encaixava.

– Aliás, menina. Vincenzo já sabe que a senhorita está aqui? – ele


cruza os braços e está exatamente à minha frente.

– Senhor, me perdoe, mas eu apenas sou subordinada à Vincenzo na


vinícola Gatti. Nada mais além disso.

Ele me encara com as sobrancelhas arqueadas, talvez sem respostas


para a minha sinceridade.

– Você está ainda debilitada. – ele fita o meu pé-bola. – Não creio
que meu amigo colocaria a senhorita na rua, nesse estado!

Reviro os olhos. Que tom mais antipático esse italianão usou para
dizer que Vincenzo teria me dispensado!

– Eu me coloquei na rua com minhas próprias pernas. Boa noite!

Me levanto e, ainda nos meus passos mancos, porém decididos,


sigo em direção ao quarto. As malas já estariam na suíte, conforme me
informaram. E, assim que abro a porta, Vincenzo Gatti está sentado em
minha cama.
– Vincenzo, o que você está fazendo aqui? Acho que já
conversamos o suficiente por hoje. – digo, trancando a porta e deixando a
chave por cima da cômoda. Avisto as malas perto do pequeno armário que
ficava numa das paredes daquela suíte confortável.

– Lara, - ele vem em minha direção com os olhos carentes. As mãos


grandes e bonitas imediatamente abrangem o meu rosto. – eu não quero
sustentar nenhum tipo de desconforto entre a gente. – e seu hálito amentalado
tenta me desestabilizar.

– Deve ser por causa dos seus negócios, não é mesmo? Quem
poderá salvar as suas plantações, agora? – digo, abaixando suas mãos de meu
rosto.

– Por que você está falando isso? – a voz séria sai por seus lábios,
não combinando muito com a feição que Vincenzo esboçava no momento. –
Não pretende voltar à Gatti?
Então, me encaminho para a cama, segurando numa das mãos do
belo moreno, que imediatamente se senta ao meu lado.

– Não é isso. Eu só não quero ser apenas uma subordinada a você,


como sou no trabalho, também na nossa relação pessoal.

Vincenzo abaixa os olhos em negativa com a cabeça. Em seguida,


fala, voltando o seu olhar para o meu.

– Lara, não entendi por que você saiu daquela maneira da minha
casa. Eu juro que me esforcei para retribuir tudo o que você significa para
mim.

– Eu não sei o que eu significo para você... – sibilo.

Então, ele segura em meu queixo, com tanta ternura, com tanto
carinho.

– Ragazza, você iluminou a minha vida, desde o primeiro momento


em que entrou naquela sala de reunião.

Meu coração descompassa no mesmo instante em que aquela voz,


aquelas palavras doces adentram o meu coração. Então balbucio mirando os
seus lábios vermelhos.

– Eu só não quero pendências... eu não sei quem você é, Vincenzo


Gatti...

Então, ele bruscamente se levanta do meu lado.

– Fico abismado em como as palavras de Ana têm peso na nossa


relação. Quem garante que o que ela estava gritando, naquele dia, seja
realmente verdade?

Enrugo os olhos em desconfiança, pois minha vontade, no


momento, era falar que eu havia visto todos os recortes, as pastas, todas as
provas. Mas apenas me calo, não poderia confessá-lo no momento que
penetrei na sua intimidade, sendo completamente antiética, para desvendar os
seus segredos.

Então, de repente, Vincenzo segura em minhas mãos.

– O que houve, Lara? – ele fita meus dedos avermelhadas, pretes a


ficarem roxos.

– Um cara me convidou para um programa, após perceber o meu


sotaque.

Vincenzo arregala os olhos azuis em descontentamento. Vejo a


maneira em como ele franze o cenho, irritado.

– Onde está esse figlio di puttana?

– Não me interessa, eu já resolvi. – digo, esfregando os nós dos


dedos.

Vincenzo apenas sorri incrédulo, já imaginando como eu teria feito


justiça com as próprias mãos.

– Agora, eu preciso de um banho, Vincenzo. – viro para o lado em


direção às malas. Mas ele me detém, segurando o meu braço.

– Amigos?

Sorrio com os olhos baixos.

– Amigos.

Antes de sair, Vincenzo deixa uma sacola cheia de pomadas.

– Se cuida, menina.

Ele sai, de repente, e eu fico com uma insegurança tremenda dentro


de mim. Eu queria que fosse diferente, mas eu só iria voltar a confiar em
Vincenzo após eu entender o que aconteceu em seu passado.

Quem era Vincenzo Gatti, além de um belo CEO italiano?

***

Assim que entrei na Gatti, suspirei profundamente buscando


inspirar energias boas. Reconheço que seria inevitável me deparar com Ana
Giulia, hoje, nesta empresa. Não que eu me importasse com a presença
daquela megera, mas certamente ela iria sugar todo o bom humor que me
propus a carregar dentro de mim, nesta manhã.

– Bom dia! – digo, já me sentando à mesa. Ligo o computador,


bebo um pouco de água e começo o meu trabalho, como sempre tem sido,
todos os dias.

– Melhorou, amiga? – olho para o lado e Paola está com um sorriso


sincero, me encarando com alegria.

– Sim... as pomadas que Vincenzo me receitou realmente são muito


eficazes, estou nova em folha, mesmo assim ainda optei por uma mule sem
salto. – e mostro à minha amiga o sapatinho confortável.

– Você ainda está na casa dele, por que agora não vejo mais
necessidade de ficar sob os cuidados do CEO, não é mesmo?

Fecho os olhos num longo suspiro.

– Não estou mais lá. Discutimos e acabei retornando ao hotel.


Acredita que a tal governanta colocou grilos na cabeça do Vincenzo, após
meu “sumiço” dentro daquele casarão?

Paola leva uma das mãos à boca.

– Não acredito. Eu estava me simpatizando por ela...


Sorrio abismada com a inocência da minha amiga.

– Vincenzo ficou incomodado quando se deu conta de que eu


poderia estar perambulando pela sua casa.

– Claro, é um poço de mistérios aquele homem! – Paola diz,


gesticulando as mãos perto do meu rosto.

– Sim... mas ao mesmo tempo ele é tão gentil, amável, protetor...


estou entre a cruz e a espada quando penso em meus sentimentos por ele,
afinal, não sei quem ele é, Paola...

– Converse diretamente com ele!

– Mas o que eu falo? – relaxo em minha cadeira, completamente


sem saída. – Que invadi sua biblioteca e mexi em seus pertences, após ele ter
confiado inteiramente em mim ao ter me hospedado em sua própria casa?

– Não! Mas comente sobre o que ouviu da Ana. – Paola diz em


cochicho.

– Sim, eu comentei, mas ele disse que eu valorizo muito o que Ana
fala e que tudo não passa de mentiras.

– Mentiras? Como, se você viu os recortes? – ela pergunta perplexa.

Mexo no mouse para retirar a proteção de tela. Era uma foto da


fazenda de papai.

– Pois é. Eu nem pude argumentar. Optei por permanecermos


amigos e algum dia a verdade virá à tona, enquanto isso tentarei afogar os
sentimentos que tenho por Vincenzo Gatti, no meu coração.

Paola estica a mão até meu rosto e me encara de maneira


complacente. Me sinto acolhida com aquele carinho, após todos os conflitos
internos os quais estava enfrentando.
***

Minutos depois, após já estar concentrada em meu trabalho


novamente, Vincenzo brota no corredor e entra pelo setor cumprimentando a
todos com um formal “bom dia”.

Imediatamente percebo que ele está tão lindo naquele terno


chumbo. E que se não fossem todos seus cuidados, talvez estivesse ainda
encurralada naquele quarto de hotel com o pé de molho.

Por que Vincenzo não era perfeito?

Assim que ele adentra a sua sala, Ana vem como uma faísca por
aquele espaço e entra pela porta da presidência, indo ao encontro do CEO
italiano.

Mordo o canto das unhas, enrugando os olhos em desconforto. O


que será que a magricela queria com Vincenzo após o ponto final que foi
colocado na história dos dois?

E, para a minha surpresa, enquanto atendo a um telefonema, a


víbora sai da sala no mesmo pé que entrou. Os olhos tristes e ao mesmo
tempo revoltados. Levou um passa-fora, só poderia ser.

Sorrio contida, segurando o deboche nos lábios.

Quando, sem eu esperar, uma mão toca em meu ombro.

– Lara, precisamos conversar.

– Precisamos, Ana? – digo em meio a um bocejo, ratificando a


presença entediante da megera.
Então, ela se abaixa, ajeitando a voz em meus ouvidos.

– Eu te espero no café daqui a quinze minutos.

– Sim, senhora. – respondo sarcasticamente.

Eu não poderia deixar de obedecê-la. Certeza de que Ana teria


muitos assuntos interessantes a tratar comigo. Ainda que eu tivesse que
reforçar o estoque de antídoto, após os possíveis venenos que a jararaca
viesse a destilar em mim, eu não poderia evitar esse encontro.

***

Assim que adentrei o café, Ana já estava bebericando uma xícara


elegante de expresso. Resolvi me atrasar uns cinco minutos para que ela
percebesse que eu não tinha obrigação alguma em obedecê-la, afinal, Ana
Giulia se achava dona da vinícola Gatti, e por tabela chefe dos funcionários
que ali trabalhavam.

– Atrasada? – ela pergunta, em meio a um sorrisinho debochado.

– Estava trabalhando, querida. As planilhas não se preenchem


sozinhas, não é mesmo? – Ana sorri apenas para disfarçar o nojo que sentia
de mim. – Do que você precisa? – pergunto com os olhos presos ao cardápio.

– Eu preciso que você se afaste de Vincenzo Gatti.

Olho seriamente dentro dos olhos daquela mulher. Ela deveria ter
uns trinta e sete anos, era mais velha que Vincenzo, embora não aparentasse,
pois sua magreza e elegância a rejuvenesciam.

– Por quê? Espero que tenha bons argumentos para querer controlar
a minha vida.

Ana arregala os olhos em sarcasmo ao ouvir o meu tom estúpido.


– Vincenzo é um homem incrível, romântico, amável, sério e firme
em suas decisões, mas esse rapaz, que faz brilhar os seus olhos, Lara, carrega
uma mácula grave no seu passado. Ele é uma espécie de cavalo-de-tróia.
Belo, milionário, mas por dentro carrega destemperos, e não é uma menina
como você, criada em fazenda, que vai saber lidar com os erros de Vincenzo.

Coço o queixo e ajeito minha franja, sentindo o veneno correr por


minha corrente sanguínea. Era como se a peçonhenta tivesse acabado de me
cravar suas presas impiedosamente.

– Eu não acredito em você. – decido jogar com ela, para ver se Ana
deixava escapulir mais dos mistérios de Vincenzo.

– Era de se esperar. – então, ela estica a sua mão na minha. – Está


apaixonada, não é mesmo, anjo? Natural que crie barreiras para a verdade.

Reviro os olhos e debruço os cotovelos sobre a mesa, querendo


olhar a píton nos olhos.

– Ana Giulia, então eu não posso me envolver com Vincenzo


porque fui criada em uma fazenda e não sei lidar com mafiosos ou coisas do
tipo?

– Não, Vincenzo não é mafioso, ele apenas...

– Ana Giulia, o que está fazendo aqui? – olhamos sobressaltadas


quando nos damos conta de que o CEO italiano acabara de nos abordar
naquela cafeteria. A ex-namorada de Vincenzo está ruborizada e sem
argumentos, a segurança com que falava comigo, caíra por terra no mesmo
momento.

– Vincenzo, eu e Lara estamos tomando um café. Está servido? –


Ana não consegue nem ao menos encará-lo.

– Não me dê diploma de idiota, Ana. Não acha muita coincidência


eu ter pedido, minutos atrás, para que não me procurasse nunca mais com os
seus intuitos deploráveis e agora está aqui destilando fofocas nos ouvidos de
Lara? – ele diz, gesticulando impacientemente com os braços.

– Sim, Vincenzo, – digo, seriamente. – Ana está me contando sobre


o seu passado manchado por crimes, julgamento, prisão.

– Ei, eu não disse nada sobre isso! – a megera bate a mão no


cardápio. Estava possuída. – Como Lara sabe desses detalhes?! – seus olhos
estão arregalados em fúria.

– Não se faça de sonsa, Ana. – agora eu estava disposta a mostrá-la


a verdadeira inteligência e perspicácia de uma menina criada em fazenda. –
Você acabou de falar que Vincenzo foi detido por quatro anos, mas até agora
não me disse o motivo, por isso, não acredito em suas fofocas.

Tomava cuidado com o meu tom de voz, afinal, não queria que
ninguém escutasse os assuntos sérios que tratávamos naquela mesa de café.

Vincenzo, imediatamente, puxa uma cadeira e se senta entre nós


duas, antes que partíssemos para agressão física a qualquer momento.

– Lara e Ana Giulia. Vamos esclarecer tudo. Não quero mal


entendidos sobre a minha vida. – a voz altamente séria e forte. Então, ele se
vira para mim. – Lara, eu estava esperando a hora certa para me abrir com
você sobre o que de fato aconteceu no passado. Agora, é o momento ideal, já
que Ana está aqui e não poderá vir a confrontar minhas palavras futuramente,
a fim de te ludibriar com fofocas.

– Eu vou embora, cansei desse teatro patético. – Ana se levanta de


maneira abrupta.

– Eu não dei ordens para você sair, Ana Giulia. Sente-se agora. – a
voz grave ecoa pela cafeteria. Um silêncio constrangedor se instaura.

A mulher imediatamente se senta, franzindo a boca, terrivelmente


constrangida, e eu reviro os olhos, agradecida por Vincenzo ser tão incisivo.
– Como eu estava dizendo, eu fui realmente detido durante alguns
anos, Lara. Eu fui completamente enganado por essa mulher. – então ele olha
para Ana. – Ela me ludibriou.

– Como isso?! – estou perplexa.

– Como eu já havia te falado, as terras da Toscana pertenciam à


família do meu avô materno. Assim que vim para cá, assumir essas terras,
realizar sonhos, tocar meus negócios, eu era um garoto emancipado de apenas
dezessete anos de idade. Então, conheci Ana, poucos anos mais velha do que
eu. Imediatamente me apaixonei por essa mulher. – ele abaixa os olhos,
talvez envergonhado ou arrependido. – Confiei todos os meus negócios a ela,
para depois sofrer uma grande decepção, um golpe, na verdade. Assim que
decidi vender uma parte de minhas terras para o dono do Hotel Campane
d'oro, Sr. Francesco, Ana simplesmente agilizou os papéis do terreno, junto a
um comparsa, como se as terras não fossem minhas, e sim dela. – miro
raivosamente os olhos de Ana, e a megera apenas mantém o rosto abaixado,
como a tremenda covarde que era. – Sr. Francesco comprou, inocentemente,
pensando que estivesse ajudando ao pobre garoto adolescente, que acabara de
chegar à Toscana, mas essa mulher conseguiu provar, na documentação, que
as terras pertenciam exclusivamente à sua família e eu estaria dando um
golpe, assumindo os bens que não pertenciam a mim. Por isso, fui preso,
durante longos quatro anos.

Uma lágrima escorre de meus olhos, por eu perceber tanta injustiça.

– E depois que você provou sua inocência, foi libertado, finalmente,


da prisão?

– Exatamente. Sr. Francesco me ajudou muito, foi o pai que não


tive por perto naquele momento, afinal, meu pai e minha mãe souberam de
tudo e não moveram uma palha. – então, Vincenzo dá um pausa, era visível o
esforço que ele estava fazendo para se abrir daquela maneira. – Era como se
não tivessem mais filho e, até hoje, não acreditam em minha inocência.

– Meu Deus. – levo as mãos à boca. – E ainda se envolve com Ana


até hoje, a troco de quê, Vincenzo?
– Chantagem. – então, ele aumenta seu tom de voz. – Conte para a
Lara, Ana!

A megera abaixa os olhos e diz num fio de voz.

– O meu comparsa ameaçou a mim e a Vincenzo de morte, pois ele


foi preso em meu lugar. E eu disse a Vincenzo que caso não me desse
emprego, eu iria depor a favor do mafioso, que então liberto, sequestraria
Vincenzo, na época. Seria um grande escândalo para a empresa que estava
começando a caminhar, a firmar parcerias.

– Não, Ana, você iria pedir a minha morte. Não minta! – Vincenzo
soca a mesa num acesso de raiva.

Ana, apenas aperta os olhos, talvez segurando um iminente choro.


Era uma dissimulada!

– Então, futuramente, pedi a Vincenzo que assumisse um romance


comigo, pois eu estava apaixonada. Caso contrário, o laranja, na época dos
documentos falsos das terras, seria liberto e, como troca de favores, tiraria a
vida de Vincenzo.

Levo uma das mãos ao peito, meus olhos se arregalam em pavor.

– Você é louca! – dou um murro na mesa, mas era para ser na cara-
de-pau de Ana Giulia. – E agora, pilantra? Vai fazer finalmente o
depoimento, se entregando à prisão, para que o comparsa seja liberto e mate
Vincenzo? Afinal, ele não está mais namorando você!

Ana Giulia não me olha, apenas noto suas mãos trêmulas. Então,
Vincenzo, já num tom mais pacífico, continua suas tão tristes confissões.

– O mafioso morreu na prisão, na semana em que você chegou à


Itália, Lara. E eu não acredito em coincidências. Você, sua aura, trouxeram
todas as soluções para os meus piores pesadelos. – consigo, finalmente,
sorrir, no meio de tanta loucura. – E Ana, – ele encara a megera. – eu tentei
poupá-la do pior, pois não seria positivo para a empresa, um escândalo desse
nível, naquela época. Mesmo que as suas chantagens não funcionassem, o
bandido não fosse solto, eu poderia na época te entregar para a polícia,
inclusive! Mas era perigoso correr riscos, na situação em que me encontrava,
então preferi aceitar o seu jogo, imaginando que poderia sofrer redenção
nesse tempo, arrependimento, mas agora eu não vejo saída. Você está
despedida.

Vincenzo se levanta da cadeira, sem dizer mais nada, sai pela porta,
deixando apenas seu perfume em nossa companhia.

Ana, de repente, abaixa o rosto sobre a mesa num choro


desesperado e infantil.

Olho para aquela cena, digerindo todas as maldades e peripécias


daquela mulher imunda, sem valores e sem compaixão. Colocou seus planos
sórdidos em jogo com Vincenzo, logo ele! Um homem bom, íntegro,
apaixonante. Como Ana Giulia teve coragem de dar um golpe num garoto de
apenas dezessete anos, sozinho numa cidade desconhecida? Era muita
crueldade.

Antes de sair, eu digo em seu ouvido:

– Morra com o seu próprio veneno.


Retornei para o setor com uma bolo enorme na garganta. Tudo o
que havia acabado de ouvir me fez realmente muito mal. As injustiças
sofridas por Vincenzo, inclusive de minha parte, ao julgá-lo, apenas por uma
fala fora de contexto proferida naquela discussão por Ana Giulia, tudo isso
era desagradável de se dirigir.

Ao mesmo tempo, uma ponta de alívio me envolvia, pois Vincenzo


era realmente o homem que sempre desejei que ele fosse. Íntegro, batalhador,
carinhoso, um gentleman perfeito, ou melhor, um uomo gentile.

– Que cara é essa, amiga? – Paola se senta ao meu lado com uma
xícara de chá nas mãos.

– Está tudo esclarecido. Vincenzo não tem culpa de nada.

Ela arregala os olhos completamente perplexa.

– Mas eu não entendo, e os recortes, a documentação... – e faz um


biquinho assoprando o chá.
– Uma longa história, Paola. Melhor conversarmos após o horário
de trabalho.

Assim que minha amiga assente à minha proposta, vimos Vincenzo


caminhando em nossa direção. Seu semblante estava cansado e ressaltavam
inclusive algumas olheiras.

– Lara, por favor. – ele apenas diz isso e já é o bastante para o meu
coração voltar a acelerar. Será que eu também seria demitida, depois que
tomei consciência de todos os absurdos feitos pelas mãos podres de Ana
Giulia?

Completamente séria e preocupada, me levanto, deixando também


Paola encucada.

Entro na sala do CEO italiano e ele já está em seu posto de honra,


com um dos dedos próximo à boca, me olhando daquela mesma maneira,
seriamente.

Assim que me sento, Vincenzo ajeita os cotovelos sobre aquela


mesa organizada e diz, olhando em meus olhos:

– Desculpa por ter te envolvido em tantas confissões patéticas sobre


o meu passado com Ana Giulia.

Aperto seus dedos em minhas mãos com um olhar complacente.


Meu coração estava destruído com o rolo compressor de revelações dessa
manhã, e tudo o que eu queria, no momento, era abraçar Vincenzo como se
ele ainda fosse aquele menino de dezessete anos, que caíra na lábia tão cruel
daquela maledita.

– Me surpreende entender, como você conseguiu conviver com Ana


Giulia diante daquelas circunstâncias, Vincenzo?

Ele dá um longo suspiro com os olhos centrados em nossas mãos


entrelaçadas.
– É estranho, Lara, mas eu já estava há tantos anos com Ana, após
ter saído da prisão, que inclusive me esquecia da chantagem cruel que ela
havia me feito a respeito do emprego e depois do compromisso amoroso. É
isso, vivíamos numa espécie de compromisso, pacto, sei lá, nada mais além
disso.

Não consigo dizer mais nada, apenas ouvir a cada lamentação e


arrependimento que certamente Vincenzo sentia por ter se relacionado com
Ana.

– Ela me tratava com carinho e me fazia acreditar, inclusive, que


havia se arrependido, mas infelizmente, sempre nas nossas brigas, Ana
jogava o seu acordo sujo na minha cara, no meio dos malditos desaforos que
não cansava de me dizer.

Fecho os olhos com o coração dolorido. Respiro fundo enquanto


relaxo na cadeira.

– Vincenzo, mas mesmo assim não entendo a sua paciência, a sua


frieza em conviver com esse ser humano imundo!

Ele esfrega os olhos com as duas mãos, talvez tentando disfarçar


que chorava, então ele me fita com os olhos avermelhados, mas a voz ainda
se sustentava firme.

– Lembra de quando Ana me falou que minha ambição é a minha


ruína? É exatamente por isso que não dei prioridades em destruir os planos
daquela mulher. A gana em alavancar os meus negócios, de chegar aonde
cheguei... CEO de vinhos referência na Toscana! Esses sonhos frearam
muitas atitudes minhas contra Ana Giulia. – ele retira o paletó e encaixa no
recosto da cadeira, enquanto fala. – O meu maior medo, Lara, era perder a
vinícola, então, coloquei numa balança, preferi aturar Ana Giulia, a ter que
voltar para o Valle D’Aosta, sem conquistar os meus objetivos, para trabalhar
na fazenda de meus pais, fabricando queijo, por isso, eu aguentei firme as
maldades de Ana, sendo extremamente frio e indiferente com ela e mesmo
assim minha ex estava satisfeita e feliz ao meu lado. – mais uma vez ele
segura as minhas mãos. – Posição social, apenas isso o que Ana queria, além
de se proteger de seu passado, sendo uma pessoa de influência ao meu lado.

– Que pesadelo, Vincenzo. – balbucio.

O belo moreno apenas me observa por segundos e aos poucos vai


brotando um sorriso genuíno em seu rosto. Parecia que minha imagem, minha
presença eram acalento para Vincenzo, ali, naquele momento.

Em resposta, beijo uma de suas mãos, sentindo deliciosamente o


sabor de sua pele. O CEO italiano suspira ao sentir meus lábios maquiando
beijos em seu dorso. Imediatamente Vincenzo se adianta, segurando o meu
rosto e debruçando ao mesmo tempo sobre a mesa, colando, enfim, as nossas
bocas. Seu beijo é tão leve, cheio de carinho, segurança, paixão, que meus
sentimentos se sentem cada vez mais alimentados, naquele breve momento.

Passo uma de minhas mãos em sua barba e nos entreolhamos


desejando um ao outro, mas estávamos no ambiente de trabalho e ali era
impossível de nos deleitarmos um no braço do outro, então o que nos restava
era controlar os nossos mais profundos instintos e vontades.

– Eu vou voltar ao trabalho. – me levanto, olhando com os olhos


caídos para o CEO italiano. Vincenzo, por sua vez, me encara com um olhar
penetrante e avassalador, capaz de me despir e de me fazer entregá-lo a
minha virgindade, apenas com aquele simples gesto.

Era o que eu mais queria.

– Depois, nos falamos. – ele diz, com um tom que pertencia ao


chefe que era.

Saio ainda com olhos presos a ele, fechando lentamente a porta.

Me viro e Paola está com as jabuticabas arregaladas me olhando


curiosa. Então, apenas balbucio para ela.

– Está tudo bem.


***

– Nossa. Imaginava que Ana Giulia fosse louca, mas não a esse
ponto! – Paola diz engolindo uma taça inteira de vinho e um bigode
avermelhado se forma pelos cantos da boca. – Vincenzo é outro louco. Eu
teria denunciado a psicopata à polícia, após as chantagens!

– Sim, mas imagina o escândalo? Vincenzo saiu da cadeia e, em


seguida, com a ajuda do tal Francesco, conseguiu a compra da vinícola e
estruturação da empresa, aí surge Ana Giulia para colocar tudo a perder! Ou
ele se envolveria em mais escândalos, após a poeira ter finalmente baixado,
caindo mais uma vez no jogo da pilantra, perdendo a credibilidade e as
parcerias, ou acataria as chantagens num relacionamento de fachada,
alcançando assim o sucesso e todos os objetivos.

Paola bate a taça vazia sobre a mesa da cantina, onde estávamos em


nosso happy hour, aparentando um pouco de bebedeira.

– Você tem razão. A sina de Vincenzo, durante esses últimos anos,


foi sofrer nas mãos de Ana Giulia, então, cabe a você, amiga, dar chance de
ele viver verdadeiramente um romance.

– Eu?! – bebo o último gole, revirando os olhos.

– Você me irrita quando se faz de mal entendida.

Sorrio, servindo as nossas taças, completamente sem argumentos.

Estava incrivelmente apaixonada, agora era só questão de tempo.

***

Assim que deixamos a cantina, fazíamos o caminho a pé até o hotel,


entre risadas, besteiras saídas pela boca nervosa de Paola e também em meio
a devaneios sobre a nossa crua realidade.

– Obrigada pela companhia de hoje, nessa sexta-feira, Lara. – Paola


se despede de mim, na calçada, em frente ao Campane d’oro.

– Imagina, Paola. – a abraço sentindo o perfume de seus cachos. –


Eu que tenho que te agradecer pelo carinho que sempre teve comigo e
também pelo seu bom humor, você é uma catarse perfeita. – digo, observando
o sorriso sincero de minha amiga, então, nos despedimos e assim que entro
no saguão do hotel, tenho uma surpresa maravilhosamente agradável.
Vincenzo e Francesco dividiam uma garrafa de uísque numa das mesas
daquele elegante hall.

Assim que o CEO italiano me fita adentrar aquele lugar, seus olhos
azuis se perdem nos meus. Ele se levanta, sem ao menos se dar conta, e vem
até mim, deixando Francesco no meio de uma fala não concluída.

– Oi! – ele diz, colocando as mãos nos bolsos e sorrindo para mim.

– Olá, Vincenzo. – olho sua boca, me segurando para não


cumprimentá-lo num beijo sôfrego.

– Eu tenho um convite para você.

– Convite? – observo o moreno e noto que ele está vestido


lindamente num traje casual.

– Sim... eu tenho uma cabana nas montanhas. – então ele coloca


uma de suas mãos por debaixo dos cabelos de minha nuca, sussurrando em
meu ouvido, logo em seguida. – E eu quero você comigo neste final de
semana.

Dou um longo suspiro, perdendo o fôlego por segundos.

– Deixa eu pensar, eu sou um pouco resistente a propostas, não sei


ainda se quero ir.
Vincenzo sorri com meu humor ácido, desenhando a perfeição de
dentes brancos em meus olhos.

Então, me aproximo de seu corpo definido, abraçando Vincenzo e


colando nossos rostos ainda mais.

– Vou fazer minhas malas. – sussurro.

– Isso é um sim?

Então, apenas grudo meus lábios nos dele, em um beijo leve, porém
gostoso e sensual, o suficiente para me deixar em chamas.

Que homem era aquele, madonna mia.

Vou para o elevador, pisando em nuvens. Feliz, completamente


feliz. A porta se fecha, enquanto fito Vincenzo e Sr. Francesco sorrindo com
seus copos de uísque em mãos. E, faltando apenas uma fresta para eu me
trancar por completo naquele elevador, Vincenzo pisca uma das turquesas
para mim. E não dá tempo de responder, pois apenas esboço uma cara de
boba.

Boba apaixonada.

***

Assim que estávamos a caminho das colinas, uma forte chuva se


formou. Já era noite e apenas os raios brilhavam em flashes por aquela
estrada deserta.

Então, Vincenzo, com um semblante um pouco tenso, se vira para


mim e pergunta.

– Está com medo?


Sorrio.

– Não... estou acostumada com tempestades como esta. Fui criada


em meio à natureza. As chuvas e os ventos do Sul não chegam nem perto
dessa garoinha de agora.

– Garoinha? – Vincenzo me pergunta sorrindo. – Lara, você é tão


especial.

Um silêncio se instaura, enquanto uma trovoada escandalosa trata


de nos dar um susto daqueles.

– Você também, Vincenzo, é uma das melhores pessoas que já


conheci em toda a minha vida.

Então, ele simplesmente toca meu joelho com sua mão. Já é o


suficiente para eu me sentir como a lama que escorria pela estrada. Vincenzo
tinha o poder de me derreter com o seu simples toque. Era como se ele fosse
uma espécie de energia nuclear de sensações, assim que os nossos corpos se
tocavam.

– Sério?! – ele me pergunta com um olhar carente. E era


exatamente isso que Vincenzo era, um homem carente, após o
relacionamento de fachada, as ameaças constantes, a rejeição dos pais. E,
mesmo assim, ele venceu. Alcançou brilhantemente os seus objetivos. Agora,
é um milionário bem-sucedido, e o que lhe falta é apenas ser amado
verdadeiramente.

– É sério. Eu admiro tudo o que você se tornou, apenas lutando


incansavelmente pelos seus sonhos e enfrentando barreiras muito difíceis,
você finalmente venceu. – engulo a emoção em minha fala. – Após sofrer
tantas injustiças, você poderia ter se tornado um mafioso, um mal caráter.
Mas não, as decepções serviram apenas de trampolim para o seu sucesso.
Você é incrível.

O belo italiano sorri, com os olhos marejados, presos na estrada.


– Eu nunca ouvi nada parecido, Lara. Ninguém nunca reconheceu o
meu esforço, os caminhos tortuosos pelos quais passei, a minha vitória diante
de tanta desgraça.

Então, afano o seu quadríceps, depositando minha mão casualmente


sobre a sua coxa.

– Mas eu te dou todo o valor do mundo.

Vincenzo, então, segura uma de minhas mãos e beija meu dorso.


Estava me sentindo completa, com a nossa sintonia, com todo o carinho do
CEO italiano.

***

– Não acredito. Não temos energia. – Vincenzo aperta


obsessivamente o interruptor, enquanto me encolho sobre o seu casaco, me
protegendo da tempestade. – Entra, Lara, acho que tenho uma lanterna na
gaveta da cozinha.

A cabana era muito romântica, mesmo na escuridão da noite e em


meio ao temporal, eu via um belo jardinzinho à frente, cheio de flores
vermelhas. As paredes eram de toras, as janelas com cortinas brancas, e
parecia, na verdade, uma casa de boneca.

Assim que me sento em um dos sofás, Vincenzo prontamente pega


a lanterna e acende.

– A noite vai ser mais romântica do que eu planejei. À luz de velas.

– Você é genuinamente romântico, nem precisava de nada disso.

Então, ele se senta ao meu lado, me envolvendo em um de seus


braços.
– Por quê? Não gostou?

Sorrio.

– Não, eu amei!

Me jogo nos braços de Vincenzo enquanto as trovoadas são a trilha


sonora daquela noite. Nos beijamos com muita paixão, à medida que ele me
envolvia completamente em seus braços.

– Obrigado por ter vindo, Lara. – Vincenzo sussurra em meus


lábios, me fazendo sentir o perfume bom de sua boca.

Então, passo o polegar por sua barba mal feita, suas sobrancelhas
pretas e grossas são tão lindas. Bruto e angelical, ele era um contraste de
beleza.

– Eu que te agradeço por me proporcionar momentos tão únicos.

O moreno dá um beijo na ponta do meu nariz, se levantando, logo


em seguida.

– Vou pegar um vinho. – então, ele diz, já procurando o saca-rolha


na gaveta. – A banheira vai ficar para um outro dia.

– Melhor... não estou a fim de reviver Titanic.

Vincenzo sorri com minha piada sem graça.

Assim que o CEO italiano começa a acender as velas, eu ajudo a


arrumar as guloseimas que estavam numa cesta que veio no carro.

Coloco a tábua de salames, queijos e azeitonas, sobre a mesa rústica


de centro. Corto os pães em pequenas cestas e coloco os potes de pastinhas ao
lado. A garrafa de vinho Gatti já está apetitosamente aberta.
– Um brinde a mim, a você, ao nosso reencontro.

Nossas taças tintilam, enquanto um raio entra pela janela,


iluminando a nossa cena romântica.

– Reencontro? – pergunto, me aproximando de Vincenzo.

– Tenho certeza de que eu te conheço de outras vidas, Lara.

Então, ele não me dá oportunidade de dizer mais nada, de dar um


suspiro que fosse, pois sua boca imediatamente avança sobre a minha, me
beijando com tanta doçura, que estou excitada apenas por já estar no meio
daqueles braços fortes, após ter ouvido palavras tão lindas.

Vincenzo, então, pega a taça da minha mão, depositando sobre a


mesa, a minha e a dele. Em seguida, coloca um salame em minha boca.
Enquanto mastigo, ele me faz uma pergunta. A luz das velas dançando em
seu rosto semi iluminado.

– Namora comigo, Lara?

Após ouvir àquele pedido tão emanado de sentimentos, a surpresa


daquela pergunta faz com que um pedacinho de salame passe por minhas vias
respiratórias, me causando um ataque nervoso de tosse.

– Desculpa, Vincenzo. – me afasto tossindo como uma vaca gulosa.


– Por favor, desculpa.

– Toma, bebe o vinho. – pego a taça da mão do italiano e vejo que


Vincenzo está segurando o riso.

A tosse não cessa. Abaixo a cabeça entre as pernas tossindo


loucamente.

Me jogo no sofá, bebendo com pressa aquele líquido delicioso. E,


em seguida, emendamos numa crise de riso.
– Para, Vincenzo, a culpa foi sua... – ele ainda está sorrindo
lindamente. – foi de propósito! Encheu minha boca para me fazer um pedido
tão maravilhoso desses.

Enfim, nos recompomos da cena patética a la Lara Martinelli.

– É claro que eu aceito.

Então, ele segura meu rosto em suas mãos. Estávamos ofegantes de


tanto sorrir.

– Aceita o quê? Eu quero ouvir.

Me ajeito diminuindo o espaço entre nós, naquele sofá.

– Eu aceito namorar você, Vincenzo Gatti.

Selamos aquele compromisso com um beijo tão sufocante que


estava na iminência de desfalecer nos braços do moreno. Ele morde meu
lábio inferior, em seguida, beija minhas maçãs, então eu mordo o seu queixo,
e ele roça a barba em meu rosto. Estou molhada, pronta para Vincenzo.

– Lara.

– Hã... – gemo em resposta. Não queria parar.

– Você, você está preparada, para a sua primeira vez, meu amor?

Finalmente abro os olhos e recobro a sanidade. O CEO italiano


havia me chamado de amor. Os anjos cantam em uníssono em meus ouvidos
e a chuva incrivelmente dá uma trégua.

– Amor?

Imediatamente sinto seus dedos ajeitarem minha franja.

– Sim, você é o meu amor.


Sorrio, emocionada.

Então, já me sentindo completamente preparada para esse


momento, abro delicadamente os botões de minha camisa. Estava nervosa e
ao mesmo tempo acalentada por ser com Vincenzo a minha primeira vez,
numa cabana de toras, nas montanhas toscanas, com um dos homens mais
lindos do mundo inteiro.

E que me amava.

Não poderia ser mais perfeito.

Assim que meus seios brotam no sutiã de renda cor-de-rosa,


percebo os lábios de Vincenzo se entreabrirem. Seus olhos tão expressivos
analisam cada parte de meu corpo.

Então, retiro a camisa do moreno, ele apenas levanta os braços e


quase morro de tesão, eram muitos músculos e perfeição em cada centímetro
de Vincenzo. Passo minhas unhas em seu peitoral, abismada com tanta
beleza, sua pele empola e ele sorri com a sensação inebriante de cada toque
meu.

Em seguida, ele avança em minha boca, beijando os meus lábios,


delicadamente. Os dedos do italiano procuram pelo fecho de meu sutiã,
abrindo-o imediatamente. Meus seios brotam com os mamilos duros,
excitados. Vincenzo repete o gesto que acabei de fazer... ele toca igualmente
em meus seios, me fazendo suspirar de uma maneira que perco
completamente o ar.

Vincenzo segura em minhas mãos e ficamos de pé, um de frente


para o outro. Sinto meu coração acelerado em meus ouvidos. O moreno
igualmente excitado. Então, abro o botão de sua calça jeans. Abaixo as
laterais de maneira ansiosa. Meus olhos arregalam no mesmo momento em
que miram o volume ereto prestes a me preencher. A ansiedade aumenta.
Estou muito nervosa. Eu daria conta daquilo tudo?
Apenas sinto as mãos de Vincenzo em minhas costas. Ele beija meu
pescoço e meu sexo cola no dele. Suas mãos descem até minha bunda, então
ele abaixa mais seus dedos e eles se intrometem por debaixo de minha saia
lápis, Vincenzo aperta deliciosamente as minhas nádegas, enquanto pressiona
o quadril, o Pênis, em mim.

Certeza de que estaria tão encharcada quanto o gramado lá fora,


após a tempestade desta noite.

– Tira minha roupa, Vincenzo... – balbucio completamente louca de


tesão.

O CEO italiano prontamente sorri em meu ouvido, lambendo minha


orelha logo em seguida, ao mesmo tempo em que abre o zíper lateral de
minha saia. Agora, estou apenas de calcinha e ele numa atraente cueca boxer
branca. Então, abaixo a minha calcinha, me permitindo inteira para ele.
Vincenzo me observa por alguns segundos, o olhar terno, os lábios vermelhos
de nossos beijos.

– Você é linda, ragazza. Amore per la mia vita...

Fecho os olhos, enquanto sinto Vincenzo conduzir o meu corpo


para um espécie de puf gigante que ficava ao lado da lareira. Suas mãos
massageiam a minha bunda, enquanto eu espalmo suas costas largas.

A ansiedade percorrendo cada célula do meu corpo.

Assim que me deito naquele puf marrom, Vincenzo se abaixa sobre


mim, ainda de cueca e me olha nos olhos.

– Se doer, me fala.

Assinto, apreensiva, mas o medo do que nunca vivi, não era o


suficiente para me frear ou quebrar o clima delicioso, o tesão intensamente
sentido por aquele belo moreno de olhos azuis.

Apenas vejo as mãos de Vincenzo descerem a sua cueca branca. O


Pênis brota pronto para me possuir. Não consigo evitar os olhos arregalados.

– Calma... – ele sussurra, passeando os dedos em meu clitóris e era


a melhor sensação que já senti em toda a minha vida.

– Não para, por favor.

Estava tão excitada que minhas mãos vão direto para a bunda
durinha de Vincenzo, depois as bolas e por último o membro inteiro está por
minha mão, quente, molhado, delicioso.

– Posso? – ele entorta as sobrancelhas sedutoramente e faz um


rostinho carente.

– Ahã... – gemo, mordendo os lábios.

Então, Vincenzo desliza as mãos por minha coxa, sobe até meus
seios, aperta meus mamilos e abre os meus joelhos. Sua boca está em meu
ouvido.

– Sente, meu amor, todo o desejo que tenho por você, Lara. – a voz
rouca já me faz gozar praticamente.

Sinto a cabeça do pênis de Vincenzo encostar em mim. Tento me


concentrar nos beijos gostosos em minha boca, nas minhas mãos em seu
corpo. Ele pressiona e não penetra. Aperto os olhos sedenta para que se
consumasse logo. Aperta mais um pouco e sinto uma pequena ardência.
Então colaboro com o meu quadril mexendo na ponta de seu membro
gostoso.

– Delícia, Lara... rebola mais...

Assim que me movo mais um pouquinho, Vincenzo consegue


penetrar por completo em mim. Vejo estrelas, mas estava tudo bem. Então,
quando ele começa a se movimentar, num ir-e-vir em cima de mim, que eu
sei realmente o que é prazer.
Ele me come deliciosamente.

– Ai, mais... – sou ousada, peço mais, arranhando suas costas,


cravando meus dedos em sua nuca.

E ele me atende, se demorando naquela foda deliciosa. E após as


investidas de Vincenzo entre as minhas pernas, ele derrete em mim, quente,
preenchendo todo o meu interior.

As mãos do italiano percorrem minha coxa e ele me morde o


queixo, o suficiente para eu sentir uma fúria louca de sensações me
preenchendo inteira, uma espécie de choque que não me permite respirar,
apenas gemer, loucamente. Contorço sob o corpo de Vincenzo. Seus olhos
azuis me analisam brilhantes. Vejo estrelas neles. O céu turquesa a mirar la
petite mort, naquele momento.

Respiro profundamente, sentindo um relaxar gostoso por todo o


meu corpo.

– Delícia, gozei.

Vincenzo sorri e preenche cada pedacinho do meu rosto com beijos


delicados. Estávamos suados, exaustos de paixão.

Fecho os olhos completamente satisfeita com tudo o que tinha


acontecido ali. As mãos entrelaçadas, nós dois, um ao lado do outro, fitando a
janela bonitinha acima de nossos corpos nus. O céu inteiro brilhava após a
tempestade.

O céu de nossas vidas também era apenas estrelas após o tempo


ruim que passou.

***

Assim que meu relógio biológico despertou antes das 7h da manhã,


esfreguei os olhos, espreguiçando o corpo, quando, de repente, minha mão
tocou o braço de Vincenzo.

Ele dormia ao meu lado com a inocência de um anjo, sereno, e


como era bonito de admirar seus cílios longos que combinavam tão
perfeitamente com a sobrancelha grossa e bem feita. A boca semiaberta
ressonava tranquilamente, enquanto o meu coração, apenas por observar tanta
beleza e paz, explodia como fogos de artifício em meu peito, após a noite, a
madrugada perfeitas, repletas de amor, vinhos e carinhos.

Levanto vagarosamente da cama e vou diretamente para o único


banheiro daquela cabana. Era tudo tão lindo e rústico, parecia inclusive que
estava num cenário de filme de romance.

Assim que saí do banho e vesti um moletom confortável, fui


vasculhar o armário da cozinha. Invadi meus olhos curiosos por aqueles
mantimentos e logo encontrei cenoura, cacau em pó, leite e trigo.
Imediatamente, tive uma ideia, iria fazer com que Vincenzo experimentasse o
sabor brasileiro de quitutes, por meio de um delicioso bolo de cenoura com
cobertura de chocolate. E, ao mesmo tempo, eu lamentava por não ter o
bendito leite condensado, infelizmente era inacessível por aqui, pois uma
cobertura de brigadeiro certamente convenceria o italiano que a culinária
brasileira era a melhor do mundo.

Logo que mexo todos os ingredientes e espalho a massa homogênea


na forma de bolo, sem esperar, ouço passos vindo em direção à cozinha. O
bolo já estava assando e agora era questão de tempo. Vincenzo, então, surge à
minha frente apenas com uma toalha branca amarrada ao corpo, enquanto
esfregava outra nos cabelos. O peitoral musculoso me deixava suspirando,
com cara de abobalhada.

– Bom dia, bella. – então, ele vem em minha direção e me dá um


beijo gostoso nos lábios. – Impossível tentar dormir outra vez com esse
cheiro gostoso invadindo o quarto. – ele fala, enquanto abraça minha cintura.

– Você perdeu o sono por um delicioso motivo...


– O que é?

Então, coloco o dedo na calda que estava separada apenas


esperando o bolo assar e passo nos lábios de Vincenzo. Ele lambe o meu
dedo e uma sensação louca de desejo me preenche.

– Carolinas? Bolo de chocolate? – ele tenta adivinhar.

Sorrio.

– Errou. Bolo de cenoura com cobertura de chocolate.

Inevitavelmente, Vincenzo esboça um semblante em


estranhamento.

– Nunca ouvi falar, para mim é novidade.

Então, eu, atrevidamente, pego a pá de chocolate e passo no peitoral


de Vincenzo. Ele sorri com minha atitude louca e divertida.

– Sou sua sobremesa, Lara, é isso?

– Não... – sibilo. – Você é o menu inteiro.

Então, passo sedutoramente meus lábios em Vincenzo com


chocolate, e lambo todo o seu corpo, sentindo, no mesmo minuto o Pênis-
com-pê-maiúsculo acordar de desejo.

O italiano, então, segura em minha cintura e me coloca sentada


sobre a mesa redonda de madeira que ficava entre a cozinha e a sala, beijando
em minha boca como se estivesse com saudades da nossa química. Arranho
suas costas, enquanto sinto a língua do italiano por meu pescoço.

Imediatamente, um cheiro de queimado invade o nosso clima tão


gostoso. Desgrudamos nossas bocas contrariados.

– O bolo! – pulo da mesa, como uma doida desvairada e minha mão


vai em direção à alça do forno. – Será que queimou?!

Vincenzo me olha, segurando o riso.

– Lara, vem cá... deixa o bolo...

Então, detendo minha atenção inteiramente ao que seria o possível


convencimento da melhor culinária do planeta, retiro o tabuleiro quente, com
uma luva bonita numa das mãos, e, sem seguida, corto um pedaço e provo.
Estava perfeito.

– Prova! – digo animada, partido uma fatia e passando a pá de


chocolate sobre o bolo de cenoura.

Vincenzo abre a boca e pega nos lábios o pedaço de minha mão.


Ele mastiga com os olhos azuis curiosos, e seu semblante se transforma em
satisfação e prazer ao saborear um tradicional bolo brasileiro.

– Nossa, Lara. Muito bom! – a fala afetada pela boca cheia. – No


que você não é boa, fala, garota?

Sorrio, tendo certeza de que mostrava a ele, meus dentes escuros de


chocolate.

– Eu não sou boa em apresentar projetos de empresas falidas. –


digo, em tom de brincadeira.

Vincenzo já está no tabuleiro, catando outro pedaço.

– Vou fingir que não ouvi!

Sorrio.

– Desculpa, Vincenzo. – digo, me abraçando a suas costas.

Então, ele se vira, se lambuzando com o bolo. Minhas mãos


repousam em seu tórax.
– Eu te admiro mais que a mim mesmo, mia vita. Rompi a parceria
da Martinelli com a Gatti, apenas nos negócios, porque no amor, somos
sucesso.

– Assim você me convence. – balbucio fitando seus olhos, e nos


abraçamos num beijo com gosto de bolo de cenoura com chocolate.

– Lara, vou acender a lareira. – Vincenzo me diz, dando beijinhos


em meu pescoço. – O que acha de assistirmos a um filme, nesse clima
gostoso... – enquanto fala, o belo moreno projeta o meu corpo em direção ao
puf. Caio estatelada sobre a superfície macia e o italiano vem pelado sobre
mim, me cobrindo de beijos. A toalha ficara pelo meio do caminho.

– Concordo que deva acender o fogo da lareira, Vincenzo, afinal,


acender fogo é sua especialidade!

O moreno sorri, se levantando sedutoramente para organizar as


toras na pequena lareira de pedras, antes ele já havia colocado uma calça de
moletom preta. Apenas ela.

Enquanto isso, eu buscava algo para assistirmos na Netflix. Escolho


Sadece Sen, um filme turco, extremamente romântico que Paola havia me
indicado.

– Escolhi um romance. – digo a Vincenzo, assim que ele se deita ao


meu lado com os músculos todos em contato com o meu corpo.

– Não me importo, não vou prestar atenção mesmo. – então ele se


ajeita em meus braços, me provocando com seus toques libidinosos.

Assim que dei play no filme, Vincenzo acendeu a lareira, para


esquentar, ainda mais, o nosso momento, e deitamos juntos, no puf, que
puxamos para frente da brasa, e, naquele clima quentinho, assistimos
abraçados ao filme. Na verdade, tentamos assistir, pois vez ou outra nos
distraíamos nos beijos e amassos repletos de desejo.
Se eu estava feliz, não existiam palavras para decifrar os meus
sentimentos. Eu apenas sentia, tentando inutilmente entender tanta paixão que
explodia como meteoros em meu peito.

***

O final de semana, tão perfeito, infelizmente chegou ao fim. Assim


que recolhemos nossos pertences e depositamos no carro para estar de volta à
realidade, Vincenzo me entregou, no jardim, um presente. Meu coração
palpitou forte com aquela surpresa.

– Eu sou muito distraído. Era para ter te entregado ontem à noite,


mas como saímos apressados por conta da chuva, acabei esquecendo no
carro.

Meus olhos brilham assim que fitam o envelope verde-musgo. Olho


para Vincenzo curiosa, abrindo com ansiedade o que poderia ser aquela
surpresa.

– Duas passagens para o Brasil? – estou emocionada. Meus olhos


vacilam por aqueles papéis tão emanados de significados, de consideração
por parte do belo italiano.

– Quero conhecer suas raízes, Lara Martinelli. – Vincenzo me diz,


com as mãos entre os cabelos da minha nuca, em seguida, me puxando para
um beijo.

Correspondo me deleitando em seus lábios, sua língua quente que


tinha tanto poder sobre os meus desejos.

– Não sabia que você tinha tanto interesse em mim, assim... – digo,
fitando a sua boca.

Então, o italiano sibila.


– Você fica tão linda sonsa. – sorrio da espontaneidade de
Vincenzo. – E tem outra surpresa, na verdade, uma proposta.

– Não sou tão boa em aceitar propostas também. – provoco e pisco


o olho para ele, me pendurando com os braços em seu pescoço.

Então, de repente, Vincenzo fica extremamente sério. Gelo por


dentro desconfiada com o que poderia vir a ser aquela bendita proposta. E
após um silêncio torturante, ele, finalmente, fala:

– Mora comigo, Lara, por favor.

Os olhos azuis brilham ansiando por uma resposta minha. O rosto


de Vincenzo parecia uma miragem de tão perfeito.

Minhas pernas simplesmente vacilam, meus sentimentos


desmancham como cachoeiras prestes a afogar tudo o que me impedia a viver
para sempre ao lado de Vincenzo, na Toscana.

Então, declamo emocionada.

– Eu moro, namoro, viajo, faço tudo o que você quiser, Vincenzo


Gatti!

Então, rapidamente, ele me aperta em seus braços fortes, me


levantando um pouco do chão. Estava aliviado com o meu sim... o sim de
todas as esperanças.

– Muito bem, Senhorita Lara Martinelli. Está contratada para ser o


eterno amor da minha vida.

Sorrio ainda com os olhos marejados.

– Onde assino? Já tenho o canudo do contrato aqui... – passo meus


dedos assanhados em sua calça.

Vincenzo gargalha tão espontaneamente, que eu fico admirando


cada detalhe daquele sorriso.

– Vamos embora, garota. Mal posso esperar para passar o resto dos
meus dias ao seu lado. – ele diz num tom empolgado, e meu coração estava
igualmente feliz.

Entramos no carro e partimos em direção à mansão Gatti.

Deslizávamos em silêncio por aquelas estradas. A garoa fina ainda


marcava o para-brisa. E, então, minha consciência conversava comigo. Eu era
namorada daquele belo moreno ao meu lado. Saí do Brasil em busca dos
meus sonhos e dos sonhos de papai, mas, se for colocar em uma balança, os
meus desejos foram realizados de uma maneira que nunca antes imaginei, em
toda a minha vida.

Sou uma mulher criada com os pés na terra, bichos e sacrifícios, e


principalmente com o amor de papai. Minha prioridade sempre foi a sua
vinícola, e continua sendo, e por isso os negócios da Martinelli estão
evoluindo dia após dia.

Envio rotineiramente uma mesada a papai, então recebo como


acalento a sua felicidade e suas esperanças que amenizam a distância e o
iminente remanejamento definitivo de minhas raízes para a Toscana. Apenas
concluo que foi a melhor decisão que tomei em toda a minha vida, ter partido
em direção à Itália, em busca de sonhos e realizando muito mais do que
poderia um dia imaginar.

Assim que subimos a estrada em direção à mansão de Vincenzo, ele


sorriu para mim e cantou uns versos.

Ti guardo fisso e tremo


Olho pra ti fixamente e tremo.
All’idea di averti acanto
À ideia de te ter do meu lado.
E sentirmi tuo soltanto
E me sentir somente teu.
Imediatamente agradeci a Deus por tê-lo colocado em minha vida.
Eu estava disposta a fazer Vincenzo feliz, a sermos igualmente felizes, juntos,
companheiros de sonhos, projetos, cúmplices de uma vida inteira.

– Te amo, ragazzo. – confesso, beijando a sua boca, assim que


estaciona na garagem da mansão.

***

– Verbicário?! – Vincenzo grita, deixando nossas malas no canto da


sala. – Dona Verbicário! Trago novidades! – o eco reverbera por aquela
colossal sala de estar.

A governanta desce as escadas segurando a barra da saia, num ar


preocupado, e assim que ela encontra a minha figura de mala e cuia, seus
ombros relaxam numa respiração lamentativa.

– Boa tarde, Dona Verbicário. – digo, e então, ela aperta a minha


mão, em cumprimento.

Vincenzo me envolve nos braços e anuncia a boa-nova.

– Lara é a nova moradora desta casa.

Sorrimos para ela empolgados, em meio a beijinhos.

Então, a governanta apenas sai, resmungando, e inevitavelmente


ouvimos:

– Preferia a italiana dos cabelos cacheados.

Vincenzo e eu imediatamente nos entreolhamos, antes de soltarmos


uma forte gargalhada.

– Ela queria que você namorasse Paola... – digo, ainda sorrindo.


– Deixa ela... sempre do contra.

Então, Vincenzo, em seguida, leva as minhas malas para o seu


quarto.

– Seja bem-vinda, Lara. – ele diz, abrindo a porta da sua suíte.


Estava tão feliz, que se caso alguém me contasse que eu poderia um dia sentir
esse nível de alegria percorrendo minhas células, eu iria sorrir em deboche,
completamente descrente. Era muita felicidade para apenas um coração.

Vincenzo, imediatamente, cola meu corpo no dele, de maneira


abrupta e a sua pegada me excita. Tão logo, me perco em seus braços, em
seus beijos, enquanto encontrava o caminho certo para a felicidade.

Fazia uma semana que já estava morando na casa de Vincenzo.


Após o final de semana perfeito na cabana, entre mimos e declarações de
amor, não pude fazer resistência à sua proposta tão tentadora, pois
contrariaria todos os meus sentimentos, por isso, imediatamente aceitei
àquele lindo pedido.

A convivência com Dona Verbicário até que não era uma das
piores, me restava apenas calar a minha boquinha nervosa e saber obedecer às
suas ordens. Sim, ela era a empregada, mas cismava de repente e mandava
nos outros. Talvez se espelhasse no jeito do CEO dominador, que se apossara
completamente do meu coração.

Estava com a prancheta em mãos, observando cada fruta e fazendo


as anotações pertinentes à colheita das uvas. Essa safra foi um sucesso, afinal,
a pérola-da-terra não se manifestou mais, então os cachos cresceram
saudáveis e agora já estavam prontinhos para passar pelos processos, até,
finalmente, chegar às garrafas de vinho.

– Senhorita Lara, hoje já poderemos levar as uvas para a


maceração, pelo jeito.

Um dos colonos me aborda, então ajeito o boné em meus cabelos.


Era um boné chique, estampado Vinícola Gatti em letras roxas.

– Pode levar, sim, Pietro. Avise aos rapazes que separem as uvas
para o galpão. Lá, já estão todos avisados que hoje será o dia em que daremos
início à nova safra de vinhos Gatti.

Ele assente e, logo em seguida, sai com o cesto entre o braço.

O dia estava lindo, um céu azul intenso, e assim que respiro fundo,
inalando os ares daquele dia agradável, me viro distraída, rumo à próxima
parreira, então, para a minha torrencial decepção, dou de cara com uma
assombração.

Ana Giulia.

Cruzo os braços, segurando a prancheta e a caneta ainda nas mãos.


O olhar maligno com que ela me encarava, embrulhava automaticamente o
meu estômago.
– Lara Martinelli, desfrutando muito do seu emprego, do seu
romance com Vincenzo, de tudo o que a fortuna desse milionário pode te
proporcionar?

Mordo os lábios sentindo a inveja de Ana Giulia trazer um gosto


ácido à minha boca.

– O que você quer aqui? Fala logo! – estava completamente sem


paciência. O sol queimando meus neurônios e eu não via a hora de concluir o
meu trabalho. – Aliás, aqui é propriedade particular, então é melhor você se
retirar logo!

Ana Giulia torce o nariz, um pouco assustada com a minha falta de


delicadeza, mas eu não estava ali para tratá-la bem, pelo contrário, se eu
pudesse retiraria a caninana daquelas terras com as minhas próprias mãos.

– Calma, Lara. – ela vem caminhando lentamente em minha


direção. – Quer um conselho? Não deixe o sucesso subir à cabeça, olha só
como você está tumultuando, com toda a sua arrogância, a colheita dessa
safra.

Seu tom debochado me incentiva a voar em seu pescoço, mas


apenas olho para a megera com o ar mais blasé que poderia esboçar naquele
momento.

– O que você quer? É a última vez que eu te pergunto. – digo,


entredentes, prendendo a raiva em minha garganta.

– Está iludida que Vincenzo quer um relacionamento sério com


você, garota! Uma estrangeira sem berço, sem posses, uma qualquer criada
por um pai falido, incompetente. – meus olhos arregalam. – Você está sendo
usada como um mero passatempo, vadia! – então, ela me contorna o olhar
demoníaco. Continuo, com muito sacrifício, séria, inabalada. – Está vendo
esse belo cacho de uvas? – então, ela se aproxima de mim, os brincos azuis
indo-e-vindo com os seus movimentos. – É isso o que vou fazer com você,
Lara Martinelli. – então, a víbora pressiona as frutas entre os dedos magros, o
caldo e a poupa imediatamente se transformam em farelos entre sua mão, as
unhas grandes de Ana Giulia se pintam com o roxo daquele cacho, e todas as
palavras duras de humilhação, tudo isso já é o suficiente para eu perder o
bom-senso.

Levanto a prancheta numa fúria louca e projeto contra a sua cabeça,


seu rosto, seus braços e por último lhe empurro na terra.

– Vá embora, Ana Giulia!!! Eu não admito que destrua um por


cento do nosso trabalho, do trabalho desses dedicados colonos, que estão aqui
por essas frutas, dia-a-dia, sol-a-sol, incansavelmente. – grito, completamente
fora de mim.

A serpente rasteja pela terra, catando os brincos que se perderam


entre as relvas.

Em seguida, corre em direção ao amplo portão que estava aberto.

– Lara, o que foi isso? Está tudo bem?

Jogo a prancheta no chão, num acesso de raiva. Levo as mãos ao


rosto e choro completamente vítima das emoções, das afrontas, do
desrespeito.

– Calma, senhorita. Dona Ana Giulia já foi embora.

Enxugo o meu rosto transtornado, cato a prancheta no chão e saio


como um meteoro em direção à empresa.

– Ana Giulia, Pietro! Ana Giulia!

Entro no carro e minhas mãos tremem. Suspiro fundo, tentando me


recompor. Não sei o que estava acontecendo comigo, sempre fui forte, fria
para provocações, mas Ana Giulia era completamente intragável, todas as
suas maldades me fizeram tomar repulsa daquela criatura, seu jeito, o
deboche, as afrontas são capazes de me enlouquecer de raiva.
Após meditar um pouco, cheirando o álcool gel que estava no
porta-luvas do carro e de olhar com carinho a foto de papai, em meu celular,
finalmente me acalmo e, então, dirijo em direção à empresa.

Chegando ao setor, vou diretamente para a sala de Vincenzo.


Minhas mãos ainda tremiam um pouco após o mal estar com Ana Giulia.
Bato à porta e abro lentamente, quando avisto o CEO italiano concentrado em
seu computador, então caminho sorrateiramente temendo não poder
interrompê-lo no momento.

Assim que ele nota a minha presença, Vincenzo se levanta


abruptamente da cadeira.

– O que foi, Lara?

Abraço forte o italiano e me sinto completamente protegida


naqueles braços.

– Ana Giulia esteve na vinícola e me ameaçou, humilhou. Mas eu


dei umas boas pranchetadas naquela cobra peçonhenta. Espero que não
retorne nunca mais às suas terras.

Vincenzo está perplexo.

– Nossas terras, Lara. – então, ele caminha pela sala, parando perto
da janela. – Eu não posso viver tranquilo com Ana Giulia assombrando
nossas vidas, nossos negócios, dessa maneira. Ela é capaz de tudo.

Fecho os olhos entendendo que corríamos riscos com a canina solta


em nosso caminho.

Então, ele vem em minha direção, num belo terno preto, segurando
meu rosto em suas mãos.

– Preciso de você, hoje, no galpão, meu amor.

– Sim, estou indo para lá agora. Só vim pegar o restante das


amostras.

Olho compenetradamente em seus olhos.

– Qualquer situação diferente, você me liga, Lara.

Então, me afasto com um bolo na garganta.

– Estou apreensiva, nunca acompanhei o processo de maceração da


Gatti, tão de perto.

Vincenzo volta a sentar em sua cadeira.

– Vá acostumando, ragazza, porque futuramente vai comandar


todos os processos.

Sorrio, era bonito ver a maneira em como o italiano confiava e


acreditava em mim.

Então, vou até perto de Vincenzo e acaricio o seu rosto, sentindo


em minha pele a textura da barba mal feita.

– Boa sorte, Lara. – ele diz, em seguida, beijando a minha mão.

– Obrigada.

Então, me afasto.

– Está linda de boné. – ele me diz, assim que saio da sala. Então,
pisco o olho para o meu namorado, em agradecimento ao elogio.

Em seguida, encosto a porta, e vou em direção a Paola, lhe dando


um beijo nos cabelos.

– Saudades de você, viu? Vamos marcar alguma coisa.

Ela me encara com seus olhos bonitos e expressivos.


– Também, Lara... você anda tão sumida depois que assumiu o
romance com o chefe. – e ela faz muxoxo. – Mas dá para notar o quanto está
feliz.

Então, seguro em uma de suas mãos.

– Sim, estou feliz. – sorrio, sentindo meus olhos brilharem. – Mas,


agora, preciso ir. Muitos compromissos me esperam.

– Isso, vá ser feliz, amiga.

Jogo um beijo para Paola, e depois desço correndo as escadas.


Estava com um pressentimento estranho, talvez fosse apenas insegurança por
ter que lidar com o maquinário e os gigantescos barris de vinho, pela primeira
vez, assim tão de perto. Vincenzo me confiou essa tarefa e eu iria dar o
melhor de mim, afinal experiência não me faltava.

***

No outro dia, de manhã, Vincenzo me acompanhou no galpão, para


verificar se todos os processos haviam acontecido de maneira correta, se os
vinhos já estavam na fase exata de curtição.

Era bem cedo, então estávamos apenas nós dois naquele lugar. Os
barris espalhados pelos corredores chegavam a uns três metros de altura. O
cheiro de vinho se espalhava naquele ambiente e tudo o que eu mais queria
era ouvir de Vincenzo boas notícias e elogios quanto ao meu trabalho junto
aos funcionários, aos colonos.

– Estou tão ansiosa, mal posso esperar para saber o que achou do
primeiro vinho feito por mim, aqui, na vinícola Gatti. – caminhávamos de
mãos dadas por aqueles corredores.

– Certamente o melhor do mundo. – Vincenzo diz, assim que


chegamos perto de um barril, então ele pega um tubo de ensaio em seu bolso
e coloca uma amostra do vinho, ainda em processo. Depois, iria para a
análise, no controle de qualidade.

– Meu pai vai ficar orgulhoso de mim, pois a cada processo


executado, eu me lembrava dele e de todos os seus ensinamentos. – cruzo os
braços e me encosto ao barril.

– Você sente muitas saudades dele, não é mesmo, Lara? – Vincenzo


se aproxima, guardando a amostra em seu bolso.

– Sim, foi em Milão a primeira vez que ficamos durante muito


tempo distantes um do outro, morei lá uns dois anos mais ou menos.

Então, Vincenzo beija a minha mão.

– Você está disposta a viver aqui comigo, para sempre? – ele


pergunta, observando as nossas mãos entrelaçadas.

– Sim, meu amor, é o que mais quero no momento.

Fecho os olhos apenas sentindo a respiração do CEO italiano em


meu rosto. Ele cola seu corpo inteiro ao meu, me pressionando contra o barril
de vinho. Suas mãos deslizam em minha coxa sob a saia lápis, enquanto sua
boca beija a minha num beijo quente.

Imediatamente levo minhas mãos em sua bundinha gostosa e


aperto, já sentindo o seu Pênis em mim. Gemo assim que Vincenzo lambe
meu pescoço e eu, como num instinto, mordo seu lóbulo ansiando por mais.

Então, Vincenzo segura firme nas barras de minha saia e levanta


lentamente, me fazendo perder o ar com aquele gesto ousado, que me matava
de tesão.

O CEO italiano, prontamente desce minha calcinha, acariciando ao


mesmo tempo a minha coxa. Ele beija minha boca, morde o meu queixo e se
abaixa, de repente, quando eu sinto deliciosamente a sua língua tocar o meu
clitóris, me levando a uma loucura de sensação. Cravo minhas unhas em sua
nuca e pressiono seu rosto em mim, babando praticamente de tanto desejo.

Vincenzo lambe, chupa, me lambuza inteira.

Assim que já estou prestes a gozar, ele se levanta outra vez,


nivelando nossos olhares. Puxo seu rosto num beijo.

Vincenzo, antes de abrir a calça, sorri de lado para mim,


sensualmente, meus lábios entreabrem apenas por fitar tanta beleza, então ele
penetra o seu membro ereto na minha parte mais quente e molhada,
movimentando o seu corpo dentro do meu, num ritmo tão delicioso, enquanto
afana seu rosto em meu pescoço e eu marco minhas unhas em seu paletó
preto. Estou inebriada mordendo e lambendo sua orelha ao mesmo tempo.

Assim que ele investe mais um pouco o pau gostoso em mim, eu


gozo, me contorcendo entre seus braços, completamente realizada nas mãos
do CEO italiano. Vincenzo, então, enfia com mais força e demora mais um
pouco em mim, chegando igualmente ao ápice de seus desejos.

Apenas respiramos ofegantes, olhando um no olho do outro.

Vincenzo levanta a minha calcinha e abaixa a minha saia lápis.

– Esse vai ser o melhor vinho da história dessa vinícola. Temperado


com amor. – digo, ainda anestesiada com o que acabara de acontecer ali.

Vincenzo sorri em meus lábios, me beijando a boca e sugando, de


maneira excitante, o meu lábio inferior.

– Não é a toa que deus Baco era o deus do vinho e do prazer. – ele
sussurra em meio a um sorrisinho.

– E você é o meu deus-grego... você é tão lindo, Vincenzo...

Ele me dá mais um beijo. Aquele italiano entendia de sedução


como ninguém.
Então, após nos recompormos da tempestade dos nossos desejos,
saímos por aquela vinícola, abraçados, sorrindo e completamente cheios de
planos.

Satisfeitos por termos um ao outro.

***

Retornamos à empresa, logo após o almoço. Vincenzo e eu


havíamos almoçado um delicioso espaguete à carbonara, numa daquelas
cantinas tradicionais italianas. E eu estava consideravelmente feliz e
esperançosa com o meu possível sucesso na nova safra de vinhos.

– Paola, acho que deu tudo certo, lá na vinícola! – disse


entusiasmada à minha amiga, assim que Vincenzo entrou em sua sala.

– Me conta, como foi hoje mais cedo, você estava tão ansiosa! –
então, ela puxa uma cadeira para eu sentar.

– Ah, fizemos muito mais que pegar amostragem de vinho, fizemos


amor... – disse em sussurros, ao mesmo tempo em que sorria, observando a
cara de trouxa de Paola.

– Uau... quanta ousadia... Vocês dois realmente nasceram um para o


outro! Então, pelo o que vejo, não pretende voltar ao Brasil nem tão cedo. –
ela conclui com os olhos curiosos de sempre.

– Esqueci de te contar... aconteceram tantas coisas boas nessas


últimas semanas... Assim que partimos da cabana, naquele final de semana
maravilhoso, Vincenzo me presenteou com duas passagens para o Brasil.

Paola está boquiaberta.

– E onde está a terceira passagem, meu Deus, eu preciso ir com


vocês!

Gargalho.

– Um dia, eu te levo com a gente, amiga.

Assim que sorríamos, colocando as fofocas em dia, Vincenzo abre a


porta de sua sala, de repente, e me chama, num tom grave e sério.

– Lara, por favor!

Meu coração aperta. Só poderia ser o resultado da amostragem.


Estava extremamente insegura e o tom de voz de Vincenzo me desestrutura
por completo.

Assim que entro em sua sala, vejo Vincenzo de costas à janela. As


mãos nos bolsos.

– O que deu errado, Lara? – ele me pergunta num tom sério, estou
extremamente abalada.

– Errado?

Então, ele se vira para mim. Seu ar fechado me assusta. Noto suas
sobrancelhas unidas em descontentamento.

– O vinho está contaminado. – e ele espalma as mãos sobre a mesa.

Abro a boca, incrédula, perplexa. Meu coração aperta e dói em


decepção.

– Eu não consigo entender, Vincenzo, eu fiz tudo certo, acompanhei


cada detalhe.

– Esse será o maior prejuízo da história dessa empresa, Lara


Martinelli.
Aquelas palavras vão de encontro ao meu coração como uma faca
afiada, estou em pedaços, derrotada.

– Vincenzo, eu...

– Por que você fez isso, Lara? Eu confiei em você! – ele me


interrompe, mantendo o tom de voz ríspido.

Dou passos lentos em direção à cadeira, enquanto rebobino em


minha mente o que poderia ter dado errado. Meu coração estava acelerado
prestes a me emudecer, mas estava disposta a não esmorecer diante das
acusações do CEO italiano.

– A análise apresentou contaminação por agrotóxicos. Mas não


tínhamos vencido a pérola-da-terra?!

– Eu não usei agrotóxico em nenhum momento, Vincenzo. Muito


menos perto dos processos de maceração! Erro primário!

– Lara, por favor... – ele vem e se abaixa ao meu lado. – Não há


necessidade de mentir nesse momento. Eu preciso confiar em você.

– Você, então, não confia em mim? – sorrio incrédula.

Um silêncio se instaura. E eu entendia o silêncio de Vincenzo como


um maldito sim.

– Desculpa, Lara, mas você me decepcionou.

Levanto, no mesmo momento, da cadeira, com as pernas bambas. O


chão havia fugido dos meus pés.

Abro a porta, completamente desnorteada, oca de sentimentos, sou


apenas um vulto de sensações.

– Lara! – Vincenzo me chama, mas eu o ignoro.


– O que foi, amiga? – Paola, me aborda, mas eu saio do seu
alcance, com um olhar perdido.

Desço aquelas escadas com uma decepção enorme envolvendo e


sufocando o meu ser. Vincenzo não foi capaz de acreditar em mim, por conta
de seus negócios. Ele não quis dar uma chance que fosse de acreditar em
minhas palavras, em meu comprometimento. Sim, a ambição de Vincenzo
era, de fato, a sua ruína, cegava os olhos turquesa para qualquer tipo de
possibilidade, fazendo com que a única verdade que existisse fosse a sua.

Seguro o volante do carro, e choro copiosamente, sem coragem


para dar partida. Eu estava me sentindo um lixo, derrotada, como eu iria
provar para Vincenzo que eu não fiz nada de errado?

Eu detestava injustiças.

Meu peito pulsa num ataque compulsivo de choro, dor, raiva de


mim mesma. Chego, às vezes, a duvidar se eu teria colocado algum resquício
de agrotóxicos nas uvas, mas eu tinha certeza absoluta que não havia feito
nada de errado. Eu segui todos os processos rigorosamente, acompanhei tudo
de perto, sendo criteriosa, e realmente eu não entendia por que deu errado!

Dou a partida no carro e vou em direção a casa.

Assim que chego, Dona Verbicário me olha em estranhamento.

– Chegou cedo?!

Sorrio para ela ainda chorando e subo para o quarto. Eu precisava


ficar sozinha, pensar numa solução para reverter o prejuízo de Vincenzo.

Eu queria, na verdade, sumir, desaparecer, voltar no tempo para


viver apenas as coisas boas.

Por que a vida real doía tanto?

Por que a realidade beirava um pesadelo?


Eu não estava suportando tanta decepção, tanta vergonha por ter
falhado com o CEO italiano.

Após um banho demorado e de tantas lamentações, me deito à


cama, fitando o entardecer pela janela.

Me aconchego entre os travesseiros e sinto o perfume de Vincenzo.

Eu era uma decepção para ele.

Então, assim que fecho os olhos me obrigando a dormir, após tantas


tristezas, ouço a governanta à porta.

– Srta. Lara, trouxe um chá calmante.

Dona Verbicário me entrega a xícara. Miro em seus olhos


complacentes e então noto que ela não era tão estranha quanto parecia. Tomo
aquele líquido quente e acolhedor, sentindo imediatamente meus ânimos, que
estavam em colapso, relaxarem.

A governanta sai da suíte, apagando a luz e levando a xícara vazia.

Imediatamente, adormeço até tarde da noite.

Sonho com todas as palavras bonitas que Vincenzo já havia me


dito, nesses últimos meses, e assim que as palavras tortas cismam de
interromper meu sono, acordo com um palpitar em meu peito. Num gesto
abrupto me viro na cama e Vincenzo não está ao meu lado. São 2h da manhã
e ele não voltou para a casa.

Meu coração perde os batimentos.

O que será que aconteceu?

Estou exausta de tantas decepções.


Então, debruço sobre a mesa de cabeceira e pego o celular. Ligo
para o CEO italiano, diversas vezes, até cair na caixa postal.

O sono, então, simplesmente evapora. Me levanto, calçando minhas


pantufas lilás e vou em direção à cozinha. Era estranho andar naquele casarão
no silêncio da madrugada, inclusive um pouco assustador.

Desço as escadas e as janelas grandes do imenso salão dão


oportunidade às estrelas de iluminarem o meu caminho. Vou diretamente à
cozinha. Apenas os bichos noturnos preenchiam o som da madrugada.

Assim que chego à cozinha, abro a geladeira e pego um pouco de


leite. Me sento numa daquelas cadeiras antigas da mesa comprida de madeira
e observo os galhos das árvores que dançavam suas sombras pelas paredes e
móveis.

Quando estou prestes a terminar o meu copo de leite, eis que vejo
um vulto passar pela janela. Imediatamente, me levanto da cadeira, deixando
o copo sobre a mesa. Olho pelo vidro e vejo apenas os quilômetros de grama
verde com árvores espaçadas a sumir de vista. Meus olhos percorrem
lentamente, por trás da janela, aquela solidão deserta à minha frente, quando,
sem eu esperar, um braço perpassa o meu pescoço.

– Eu disse que pegaria você, Lara Martinelli.

Estou sem ar, meus olhos esbugalham pela força que Ana Giulia faz
em meu pescoço. Sim, era ela, como não reconhecer a voz insuportável que
pertencia àquela megera. Tento respirar e o ar não sai. Ela aperta, e não se dá
por satisfeita, pressiona com mais força ainda o meu pescoço. Eu começo a
me debater, rezando para que Dona Verbicário impeça de alguma forma o
estrangulamento iminente, porém tento inspirar e não consigo. A dor que o
seu braço causa em meu pescoço é insuportável, parecia que iria quebrá-lo a
qualquer momento. Ana Giulia me estrangulava com todo o ódio acumulado
em seu âmago. E eu apenas gemo de dor e seguro a sua mão, tentando me
livrar, inutilmente.

Sinto meu corpo adormecer, a cabeça pesar e uma escuridão densa


absorve irreversivelmente todos os meus sentidos.

Então, eu caio, morta.

Num susto, me sento sobre a cama, ofegante, trêmula. Os olhos


turquesa me observam preocupados.

– O que foi, ragazza? – Vincenzo está sentado ao meu lado e segura


uma de minhas mãos.

Então, simplesmente me jogo em seus braços, como num alívio,


num acalento, pois tudo não passava de um maldito pesadelo.

– Calma, Lara. Está tudo bem... – ele sussurra, enquanto repousa


minha cabeça em seu peito. E eu tremia como uma maldita vara verde, dos
pés à cabeça.

Olho melhor para Vincenzo e percebo que ele ainda está com o
terno de ontem.

– Você não dormiu em casa? – digo, tentando engolir o choro.

– Não. – o italiano abaixa os olhos. – Eu queria te pedir desculpas


por ontem à tarde. – então, finalmente ele me olha, com um ar melancólico,
arrependido.

– Você não confia em mim, Vincenzo. – sibilo, ainda sentindo suas


mãos nas minhas.

Então, ele apenas faz um gesto negativo com a cabeça, falando logo
em seguida.

– Eu errei por julgá-la, me perdoe, por favor.

Respiro fundo, tentando organizar as emoções dentro de mim. Jogo


as pernas para o lado e me levanto. Vincenzo com os olhos presos em cada
gesto meu.
– Eu vou voltar para o Brasil. Eu já entendi que não sirvo para os
seus negócios, Vincenzo.

Assim que o CEO italiano ouve as minhas palavras, ele se levanta


de maneira abrupta da cama, vindo em minha direção.

Sinto suas mãos envolverem o meu rosto.

– Lara, por favor, foi no calor do momento que eu te disse aquelas


palavras cruas, vazias de sentido, eu estou completamente arrependido.

– Podem ser vazias de sentido para você, mas, para mim, foram a
gota d’água para eu perceber que, por qualquer detalhe, você pode vir a
perder a confiança em mim. – Vincenzo tira, aos poucos, as suas mãos de
meu rosto. – A que ponto você pode chegar por seus negócios? Aturar uma
chantagem? Viver um relacionamento de fachada com a mulher que destruiu
parte de sua história? Não confiar na mulher que te ama?

Então, caminho apressadamente em direção à porta.

Vincenzo vai à minha frente e consegue trancá-la de imediato.

– Você não vai embora, Lara, sem antes me ouvir.

Cruzo os braços e encaro o belo italiano com os olhos


semicerrados. Não poderia estar surpresa com sua impetuosidade, afinal, já
conhecia Vincenzo como a palma de minha mão.

– Então, ok, eu vou te ouvir. Me diga, logo, Vincenzo, onde você


estava? O que vai usar como argumento para que eu realmente fique, além de
meros pedidos de desculpas? – minha voz sai tremida, estava arrasada.

Em seguida, me sento sobre a cama, esperando que ele fale algo


que me faça mudar de ideia, afinal, eu estava completamente decidida em
partir.
Vincenzo caminha pelo quarto, talvez arrumando as palavras certas.

– Eu passei a noite na vinícola, tentando encontrar pistas.

– Pistas?

Então, ele me lança aquele olhar azul.

– Sim, Lara. Você havia me falado que Ana Giulia esteve mais
cedo nas nossas terras e te ameaçou.

Concordo com Vincenzo, tentando entender aonde ele pretendia


chegar.

– Então, passei a noite revendo os vídeos das câmeras e exatamente


às 17h25, quando todos os funcionários deixaram a vinícola, Ana Giulia
passou sorrateiramente por um dos portões. Ela estava com uma roupa preta
muito parecida com a sua e com um boné da empresa.

Arregalo os olhos e levo uma das mãos à boca. A víbora cumpriu


exatamente com a sua promessa de me destruir. Daí, já imagino quem
borrifou os agrotóxicos nos barris.

– Mas como você descobriu que era ela, afinal estava disfarçada e
poderia ser qualquer pessoa, inclusive eu!

– Olha esses brincos. – Vincenzo tira os brincos azuis de seu bolso.


– Pertencem à Ana Giulia, fui eu que dei para ela, numa noite qualquer de
Natal. – e ele me entrega os malditos brincos.

Fico por uns segundos segurando aquelas joias em meus dedos.


Elas brilhavam, eram de turquesa.

– Como a megera perdeu brincos tão valiosos naquele lugar? –


estico a mão, os devolvendo a Vincenzo.

– Ana Giulia deve ter retirado para que as câmeras não a


identificassem e deixou as joias no basculante feminino.

Então, ele abre a gaveta da cômoda do quarto e joga aqueles


presentes de um Natal qualquer, lá dentro.

– Você entrou no banheiro feminino, Vincenzo? – implico.

– Eu iria até o inferno para provar a mim mesmo que você não teve
culpa de nada, que você é uma profissional por excelência, Lara.

Decido, então, me levantar e ir em direção àquele homem decidido,


inteligente.

– Uma pena você precisar de provas a respeito do meu


comprometimento e responsabilidade.

– Lara, o que é isso? – Vincenzo segura meus braços, talvez


perdendo a paciência. – Você quer que eu te coloque numa redoma? Você
não pode errar? – abaixo os olhos, sem argumentos. – Foi a primeira vez que
você acompanhou um processo de vinhos, nessa vinícola, e eu não poderia
me sentir inseguro, por mais que eu te ame e confie em você? – então, ele vai
até a janela, passa uma das mãos nos cabelos pretos e me olha. – As coisas
poderiam sim dar errado, afinal somos falhos humanos. Eu fui duro com
você, ragazza, mas eu não sosseguei enquanto não achei indícios que
provassem a sua inocência. No fundo, eu sabia que não foi você que vacilou
com os agrotóxicos. Eu uni os fatos, a ameaça de Ana Giulia mais cedo foi o
que me fez passar a noite voltando gravações, procurando uma uva fora do
lugar que fosse! E agora, o que eu mais quero é que você me perdoe.

Seus olhos estão de um azul muito intenso. Na realidade, eu já


havia perdoado Vincenzo, em algum momento, no meio da nossa discussão.

Com os olhos caídos e farta daquele clima ruim que se instaurara


em nosso relacionamento, eu vou em direção ao CEO italiano.

– Eu já te perdoei, Vincenzo.
Em resposta, ele me dá um beijo gostoso nos lábios. Suas olheiras
me chamavam a atenção.

– Lara, você promete nunca mais me ameaçar com suas partidas


para o Brasil?

Sorrio.

– Ao menos que você mereça.

Então, ele me abraça tão forte, me levantando nos braços e me


girando, logo em seguida.

– Eu não quero te perder, Vincenzo. – balbucio em seu ouvido.

Assim que ele me coloca no chão, outra vez, o italiano me fala, com
um ar altamente sério.

– Lara, temos que tomar cuidado para não misturar as questões


pessoais com as profissionais.

Concordo com o CEO italiano, envergonhada. Talvez eu tivesse


feito papel de uma adolescente rebelde.

– Você tem razão. – puxo Vincenzo em direção à cama e me sento


em seu colo. – E Ana Giulia, o que vai fazer com ela?

– O que não fiz durante os últimos anos. – olho para os seus lábios
avermelhados. – Entregarei todas as provas à polícia e ela será detida, além
de obrigada a me pagar cada centavo do nosso prejuízo.

– Perfeito! – falo, enquanto sinto Vincenzo beijar o meu pescoço. –


A megera vai ter que pagar, não apenas pela maldade da contaminação dos
vinhos, mas, também, por todo o histórico de maldades que vem acumulando
na sua podre vida.

– Ela vai e, enfim, poderemos suspirar aliviados, Lara.


Finalmente, selávamos a paz, num beijo quente e sôfrego, além de
sacramentar, ainda, mais o nosso amor, o perdão, a superação dos problemas.

Vincenzo Gatti era o acalento das minhas mais profundas


inquietações.
Assim que Vincenzo vestiu o terno, não entendi muito bem quando
ele guardou os dois brincos azuis turquesa em seu bolso. Ele estava mais
sério que de costume e eu não quis questioná-lo, pois não gostava de parecer
invasiva, mas, ao mesmo tempo, estava disposta a observar o que estava
prestes a acontecer, afinal, Ana Giulia ainda não havia pagado por seus
crimes, conforme Vincenzo me fez entender que, em breve, aconteceria.

– Vamos? – o CEO italiano me chama com um sorriso contido e


bonito desenhado nos lábios. Imediatamente assinto, descendo as escadas de
casa junto a Vincenzo em direção ao café-da-manhã, para, logo após
estarmos à caminho do trabalho.

Logo que adentramos a Vinícola Gatti, avistei o carro de Ana


Giulia estacionado perto das escadas da empresa. Meus olhos enrugaram de
raiva, estava absurdamente possessa com aquela surpresa desagradável.

– Calma, Lara. Eu sei o que estou fazendo. – Vincenzo,


imediatamente me diz, no mesmo momento em que percebe o mal estar
desenhado em meu rosto.

Subo as escadas para o escritório, mais tranquila, pois eu já


entendia o que estava prestes a acontecer ali, e Vincenzo vem ao meu lado.
Mal adentramos o setor e nossos olhos encontraram a figura tétrica de Ana
Giulia sentada à sala de espera. No mesmo instante, a megera se levanta, num
elegante taier vermelho e caminha nos saltos, em nossa direção. Reviro os
olhos apenas por fitar o olhar debochado daquela cobra.

– Bom dia, casal!

– Entra, Ana Giulia. – Vincenzo não dá oportunidade de a víbora


soltar mais nenhum veneno que pretendesse. Num gesto impaciente, ele
espalma as mãos nas suas costas e praticamente empurra a moçoila porta
adentro. E eu apenas queria ser um mosquitinho para presenciar o encontro
dos dois.

– Amiga, o que está acontecendo, me atualize, por favor. – Paola


vem até mim, enquanto ligo o computador.
– Por favor, não comente com ninguém. – puxo suas mãos e nos
sentamos uma perto da outra. – Ontem saí chateada daqui porque deu tudo
errado na safra de vinho. Tivemos um prejuízo enorme!

Paola faz uma cara de choro e de espanto, ao mesmo tempo. Uma


careta, na verdade.

– Calma, – acaricio a sua mão. – afinal já descobrimos o que


aconteceu. Na verdade, Vincenzo descobriu que foi Ana Giulia a culpada de
tudo, e ela pagará cada centavo perdido nesse prejuízo colossal.

– Meu Deus, essa mulher não cansa de fazer burradas! – Paola está
em cólicas. – Então é por isso que os dois estão lá dentro!

– Exato. Hoje, a megera não escapa.

***
Vincenzo Gatti

– Pensei que nunca mais fosse querer olhar na minha cara,


Vincenzo... depois que Lara Martinelli descobriu os seus piores segredos...

Minha ex-namorada era uma mulher interessante, aliás, sempre foi,


desde o primeiro momento em que a vi, naquela estação. Ela estava
absurdamente bonita numa roupa social, e o chapéu azul ajudou a paralisar o
meu olhar naquela imagem, por minutos. Eu era um menino do interior, com
sonhos inteiros dentro da bagagem e eu nunca havia visto uma ragazza tão
bela. Imediatamente, ela sorriu para mim. O seu sorriso me surtiu um pouco
de conforto, de segurança. Ana Giulia se tornou um porto-seguro, ali, naquele
lugar desconhecido, assim que segurou em minha mão e disse que iria me
ajudar a crescer naquela cidade.

Eu, no mesmo instante, tratei logo de confiar naquela jovem mulher


de vinte e poucos anos.
Aos meus dezessete, já havia perdido a virgindade. As moças do
vale, onde eu morava, eram um pouco exageradas e chegavam a discutir entre
si, logo que me encontravam sozinho, com os queijos de meus pais embaixo
do braço. Elas me mandavam bilhetes, beijos e sorrisos, e eu era um
completo idiota, não dava às meninas a atenção que realmente mereciam.
Talvez isso fizesse com que elas ficassem ainda mais encantadas com o
menino de olhos azuis pueril, que eu fora um dia.

E nenhuma delas era igual à Ana Giulia. A maturidade, a


inteligência, a maneira como aquela jovem mulher dava soluções aos meus
problemas infelizmente me encantou. Até o dia em que descobri que seus
sorrisos não passavam de feitiço, a sua inteligência era apenas para a
maldade, e seu olhar humilde, simplesmente falsidade.

Fito Ana Giulia sentada em minha cadeira. Desde quando assumi o


maldito relacionamento de fachada, aquela mulher passou a acreditar que
meus bens também pertenciam a ela.

– É inevitável, precisava desse encontro. – mal falo essas poucas


palavras e já presencio um olhar meloso daquela vigarista. Além de tudo, era
idiota. Cairia em qualquer palavra minha que eu ousasse dizer com um tom
mais afável.

– Estou aqui, Vincenzo, ao seu inteiro dispor. – ela diz, ao mesmo


tempo em que deposita os pés sobre a minha mesa, as pernas esticadas e
cruzadas casualmente. O jeito desaforado de Ana Giulia me irrita ao ponto de
querer sumir rapidamente com ela de minhas vistas.

– Ragazza, eu soube que você ameaçou Lara Martinelli. –


disfarçadamente deposito o celular sobre a mesa. – A troco de quê?!

Vejo a maneira como Ana revira os olhos. Falar sobre Lara era para
ela uma tortura medieval.

– A menininha inocente foi chorar no seu colo? Não bastavam as


pranchetadas que a maluca tratou de me meter?! – ela diz, fazendo um coque
nos cabelos, talvez tentando me seduzir.

– Ameaçou ou não ameaçou, Ana Giulia? – insisto, incisivamente,


espalmando as mãos sobre a mesa e, finalmente, aquela mulher retira os pés
de salto altos de cima dos meus livros de ata. Miro em seus olhos
arregalados.

– Ameacei sim e contaminei todos os barris de vinho, com o intuito


de destruir os sonhos cor-de-rosa daquela mercenária. – a voz tranquila como
se me contasse a mais trivial das novidades. – E faria tudo de novo, se fosse
preciso!

– Você não tem vergonha de ser tão cruel? – grito, e meus olhos
arregalam tamanho ódio da falta de caráter da mulher que estava de pé à
minha frente.

Então, ela se aproxima com passos lentos.

– Você não sente vergonha em namorar uma vadia?!

Perdendo completamente o juízo, seguro o queixo de Ana Giulia.


Minhas mãos tremem reverberando o ódio pungente que saía de dentro.

– Me solta, Vincenzo. – ela pede, com um sorrisinho maldito nos


lábios.

– Você colocou agrotóxico nos barris! Você me ameaçou com suas


chantagens como um pesadelo durante longos anos da minha vida, me
fazendo acreditar que poderia mudar, ser uma pessoa melhor! Mas a ameaça
de morte, logo estava escapulindo por sua boca, em qualquer oportunidade! –
solto o rosto daquela maledita num solavanco.

– Você é lindo, mas um tolo completo, afinal, não tem prova


alguma do que diz. – ela fala, enquanto acaricia as marcas dos meus dedos
em sua pele alva.

Sorrio da inocência patética de Ana Giulia.


Então, pego os brincos azuis e jogo-os por cima da mesa.

– São seus.

No mesmo instante, a sirene da polícia ressoa ao lado de fora da


empresa. Ana Giulia está perplexa, paralisada, completamente horrorizada
com o meu plano sórdido.

Pego o celular por cima da mesa e lhe mostro como bônus, a


gravação em que ela confessava as ameaças à Lara Martinelli.

– Seu figlio di puttana, stronzo!!! – Ana Giulia destila todo ódio em


mim por meio de seu repertório de palavrões, enquanto soca numa fúria
desmedida o meu peito. – Lara acabou com a minha vida, é uma vadia,
estrangeira maledita.

– Não! – dou um grito. – Ela é o amor da minha vida. Uma mulher


tão especial, que mesmo você se arrependendo ou quem sabe nascendo outra
vez, não será capaz de atingir o nível de maturidade, inteligência,
sensualidade daquela ragazza.

Olho para a porta e vejo minhas secretárias e Lara, Paola, Pietro.


Todos observavam ao vexame no qual Ana Giulia sempre tratava de me
colocar, de maneira constrangedora. Um escândalo desse nível já era rotina,
mas certamente seria o último.

Os policiais adentram aquela sala. Giulia, então, se encolhe no


canto como uma ratazana acuada.

– A senhorita está presa. – logo, o delegado se vira para mim. – Por


favor, Sr. Gatti, me acompanhe para esclarecimento das provas.

Saio em direção à delegacia, Ana Giulia vai à minha frente


algemada, cabeça baixa, cabelos no rosto. Uma tremenda covarde. Passo pela
porta olhando nos olhos preocupados de Lara, mas tão logo ela me beija a
boca, como maneira de me desejar boa sorte, eu tenho, no mesmo momento,
total certeza de que iria ficar tudo bem.

***

– Pelo menos Ana Giulia teve o fim que mereceu. – Paola e eu


avistávamos a dissimulada se encaminhando junto aos policiais e ao
delegado, num momento triste de humilhação, atravessando aquela sala.

E, afinal, o que era aquilo ali, perto do que fez Vincenzo passar em
sua juventude?

– Verdade, Paola. Imagino como o nosso chefe deve estar aliviado e


se sentindo ao mesmo tempo justiçado com esse acontecimento. – me sento
na cadeira, sem clima algum para voltar ao trabalho, pois estava
completamente preocupada com o desenrolar da história na delegacia. – Não
vejo a hora de encontrar Vincenzo. Estou apreensiva...

– Com o que, amiga? – a morena de cabelos cacheados se aproxima


segurando minhas mãos geladas.

– Da megera reverter mais uma vez a situação e prenderem


Vincenzo no lugar dela.

Paola sorri contida, com uma ponta de dó desenhada em seus olhos.

– Coisas da sua cabeça, Lara. Vai ficar tudo bem. Daqui a pouco o
seu telefone toca com as boas notícias.

Abaixo os olhos um pouco acalentada, mas ficaria inteiramente


satisfeita, apenas quando mirasse nos turquesas tão bonitos e preciosos à
minha frente.

Paola se levanta, deixando um beijo em meus cabelos.

Por um momento, passa por minha cabeça de ir até a delegacia,


acompanhar de perto o que estava acontecendo, mas já me imaginei
engalfinhando em farpas com a cobra peçonhenta, o que poderia vir a
prejudicar a situação de Vincenzo no caso. Poderíamos perder, inclusive, a
razão.

Relaxo na cadeira, passando as mãos no rosto e os dedos entre a


franja, respiro fundo e me obrigo a trabalhar um pouco, apenas assim
esqueceria por minutos do pesadelo tão presente à minha porta.

Umas duas horas se passaram, ou melhor, se arrastaram e, então, o


meu celular finalmente tocou. Para a minha torrencial alegria e aconchego
para o coração, era Vincenzo.

– Oi, meu amor.

– Lara, a vigarista já está atrás das grades. As provas foram


suficientes e a justiça vai obrigar Ana a reverter o meu prejuízo.

– Que alívio, Deus do céu. Onde te encontro, preciso te ver!

– Vamos almoçar, comemorar, mia vita!

– Sim, precisamos. Não consegui comer nada até agora devido à


ansiedade.

Apenas ouço a um sorrisinho de Vincenzo.

– Em cinco minutos, eu passo aí.

– Ok, beijos.

Desligamos, e eu estava me sentindo preenchida por um misto de


alegria e alívio. Ter Ana Giulia longe dos nossos negócios, de nossas vidas,
era o que mais me entusiasmava. Daqui para frente seríamos apenas eu,
Vincenzo e nossos sonhos.

Finalmente!
***

Mal entramos no restaurante e meu coração vibrou quando


Vincenzo me encaminhou para uma mesa que estava reservada para nós dois.

Um arranjo imenso de flores, no meio de algumas velas sustentadas


em castiçais, dava um ar romântico ao nosso almoço.

Então, me sento à cadeira, depositando o guardanapo de linho em


meu colo.

– Estou encantada com esse lugar.

– Você merece muito mais. – Vincenzo diz, com os olhos


compenetrados nos meus, o seu semblante estava mais leve, talvez tivesse
retirado um piano inteiro de suas costas.

Sorri, apertando uma de suas mãos.

De repente, o maître se aproxima e então solicitamos os pratos e o


tão saboroso vinho Gatti.

– A viagem será na semana que vem. Está animada? – o barulho do


vinho preenchendo a taça reverbera em nossa conversa.

– Nossa, realmente passou muito rápido, e no meio dessa loucura


nem pude ainda dedicar meus momentos vagos aos preparativos da viagem. –
e sentindo o coração acelerado em meu peito, concluo. – Estou muito feliz!

Vincenzo sorri para mim, com os olhos brilhantes.

– Se você está feliz, eu também estou. Sempre quis conhecer o


Brasil, mas jamais imaginei que realizaria ao lado de uma belíssima
brasileira. – então, ele dá uma golada na taça, me olhando de lado.
Sorrio com as maçãs do rosto vermelhas, por conta do teor
alcoólico do vinho, pela emoção que me surtiam as palavras doces de
Vincenzo.

– Você vai gostar do Sul. Tem um quê de Toscana naquelas terras.


– digo, dando uma beliscadinha no queixo do moreno.

– É mesmo? – então ele retira o paletó, possivelmente já acalorado


pelo vinho. – Espero também que você esteja preparada para os nossos
próximos dias juntos.

– Está querendo me deixar ansiosa?!

– Talvez. – ele me olha sério nos olhos.

Então, apenas balbucio, envolvendo as mãos no rosto do italiano.

– Ragazzo misterioso.

Então, Vincenzo sorri, me roubando um beijo logo, em seguida.

Nossos pratos chegam e nos deliciamos com o filé de cordeiro.


Estava divino.

– O chefe daqui é um profissional de excelência. – ele diz, em meio


a garfadas.

Limpo os cantos da boca.

– Você o conhece?

– Conheço sim. Jogamos polo juntos.

Então, respiro fundo de maneira instintiva, pois as lembranças da


figura daquele belo italiano sobre o cavalo, o uniforme, a postura,
prontamente me embambecem.
– Ah, sim. – balbucio, enfiando uma garfada em minha boca. –
Você é uma delícia naquele cavalo, Vincenzo. – confesso, sem ao menos
perceber.

E o moreno sorri, esticando, logo em seguida, um dos dedos e


acariciando minha bochecha.

– Você também é uma delícia, ragazza.

Minhas pernas adormecem. Estava tão apaixonada, que meus olhos


se perdem nas turquesas, ao mesmo tempo em que sensações muito diferentes
envolvem cada parte do meu corpo.

– Eu não vejo a hora de partir para o Brasil com você, Lara. – ele
diz, passando os dedos em minha franja.

– Eu também. – beijo os seus dedos, ainda acariciando minha face.


– Tenho certeza que você e meu pai serão grandes amigos.

– Não duvido disso.

Então brindamos o nosso amor, a vitória sobre as injustiças e


atrocidades de Ana Giulia. A nossa viagem que já batia à porta.

Vincenzo era um combo de coisas boas e eu só poderia agradecer


aos céus por aquele anjo em minha vida.
O céu estava como brigadeiro, assim que adentramos o avião.
Minhas mãos estavam altamente suadas, pelo iminente encontro de papai
com o CEO italiano e, principalmente, por Vincenzo estar prestes a conhecer
a minha história, as minhas raízes.

– Não vejo a hora de estar em solo brasileiro. – o moreno diz,


juntando nossos braços naquela confortável poltrona de primeira classe.

– Eu também não vejo a hora, meu amor. As saudades de meu pai


me sufocam dia-após-dia.

Vincenzo sorri ternamente, acariciando o meu queixo. Talvez ali ele


entendesse o sacrifício prazeroso que era ter assumido um romance com um
italiano, mudando definitivamente para as terras toscanas, longe do Brasil.

– Prometo fazer você feliz, Lara, pois todas as decisões tomadas


para estar ao meu lado só me fazem sentir gratidão.

Sorrio com aquelas palavras tão sinceras, enquanto sentia meu


coração em lavas em meu peito.

– Eu te amo, Vincenzo. – meus olhos analisam os seus.

– Eu também te amo, amore per la mia vita.

Então, finalmente, o avião alça voo. A Itália tão pequena sob nossos
olhos, e apenas agradeci a mim mesma por tudo o que havia conquistado nos
últimos meses. Se não fossem minha impetuosidade e coragem, a história da
minha vida certamente estaria paralisada em capítulos muito mornos e chatos.
Parti do Brasil repleta de anseios, falida, sem um amor, e agora
estava completa. Viro para o lado e observo Vincenzo olhar pela janela.
Como eu amava aquele ragazzo. Ele foi uma espécie de amuleto em minha
vida e tinha certeza de que ele também sentia o mesmo por mim.

O destino nos uniu, para nos ampararmos em nossas complicações,


para que mutuamente vencêssemos os problemas. E, enfim, conseguimos.

Após as longas horas de viagem, acordei com o aviso da cabine.


Iríamos aterrissar em segundos. Apertei a mão de Vincenzo e sorri.

– Chegamos. – balbuciei, um pouco emocionada. O italiano sorriu


com os olhos entusiasmados. Eu via a alegria pura e simplesmente acontecer
naquele olhar azul.

– Não vejo a hora de chegar à fazenda Martinelli. – ele diz.

Já estávamos empurrando nossas malas pelo saguão de


desembarque do aeroporto de Porto Alegre.

– Nem eu. – respondo, com um sorriso que contagiava todos os


meus sentidos.

Alugamos um carro e, finalmente, fomos em direção à fazenda. Eu


via como Vincenzo estava maravilhado com os pampas gaúchos.

– Eu não te disse que o Sul lembra um pouco da Europa? –


pergunto, afagando a mão do italiano e observando seus cabelos se
despentearem com o vento da janela.

– Achei muito mais bonito, sabia? – e ele sorri de lado, me


lançando as turquesas no olhar.

Era quase 11h da manhã e apenas por abrir a janela do carro e sentir
os ares brasileiros entrando por minhas narinas, pude relaxar, como num
acalento, por estar próxima às minhas raízes. Faltavam poucos quilômetros
até a vinícola Martinelli e toda vez que eu me dava conta disso, meu coração
dançava em meu peito de maneira ansiosa.

Vez ou outra, olhava para Vincenzo, e a paz que o italiano me


transmitia invadia o meu coração, sossegando automaticamente os ânimos.

– É na próxima curva. – disse isso com a emoção prestes a avançar


por meus olhos. Que saudades estava de meu pai, de tudo isso aqui.

– Não posso acreditar! – Vincenzo diz animado.

Assim que avistamos a porteira com o letreiro Martinelli, nos


entreolhamos sorrindo um para o outro.

– Que lugar lindo, Lara! Agora vejo que realmente precisou de


coragem para partir rumo aos seus sonhos. – os olhos do CEO italiano
brilham curiosos.

O carro já estava estacionado em frente àquelas terras e estávamos


prestes a adentrar àquele lugar que fazia parte da minha história.

– Você ainda não viu nada. – sibilo, sorrindo e abrindo ao mesmo


tempo a porta do carona.

Corro em direção à porteira, sentindo os meus cabelos esvoaçarem.


Meus pés vibram por aquele chão de terra, levantando poeira, ao mesmo
tempo. O cheiro bom de mato fresco e as borboletas amarelas nas flores roxas
sobre a cerca faziam parte de mim.

Assim que Vincenzo passa pela porteira, ele me espera, então me


jogo ao seu lado, com o sorriso mais imenso que poderia existir no meu
repertório de alegrias.

– Qual o nome daquelas árvores, são extremamente belas! – ele diz,


apontando para longe.

– São araucárias. Meus bisavós plantaram há anos atrás e sempre


que olho para elas, sinto o passado me visitar, pois parecem que essas árvores
espreitam os nossos dias para contar futuramente aos nossos netos os nossos
segredos.

De repente, Vincenzo me olha. Seus azuis me penetram de maneira


intensa.

– Netos? Mas eles só chegam se existirem filhos. – a voz séria e


intensa.

Fico calada por alguns segundos, digerindo em meu coração aquela


feliz possibilidade de um dia me casar com Vincenzo e construir uma família.

Os italianos possuem a fama de serem rodeados por famílias


imensas, de serem totalmente ligados aos seus progenitores, irmãos, primos,
avós. E na estranha história de minha vida e de Vincenzo, éramos apenas nós
dois e nossos pais. No caso dele, o Sr. Francesco era o seu pai de
consideração. E eu estava disposta a mudar essas circunstâncias.

– Eu quero muito ter filhos com você, ragazzo. – digo, acariciando,


ao mesmo tempo, a mão do belo moreno.

Vincenzo concorda comigo, me dando um beijo na bochecha e


assim que me atento às parreiras de uvas que ficavam num imenso terreno em
frente ao casarão, noto algo estranho.

– O que está acontecendo aqui? Onde estão todos eles? – meus


olhos arregalam.

– Eles quem, Lara? O que houve? – o italiano estaciona perto das


parreiras.

– Os colonos! – olho impaciente para Vincenzo. – Eles trabalham


dia e noite nessas parreiras e agora nem vestígio deles. – estou perplexa,
temendo por eles terem ido embora e meu pai estar escondendo que a
Vinícola Martinelli tenha, enfim, falido.
– Vamos falar com o seu pai. Talvez ele saiba o que pode estar
havendo.

A alegria e a tranquilidade por estar de volta, ao lado de Vincenzo,


dão lugar à tristeza e decepção, no mesmo momento em que vejo aquelas
terras desertas. E meu coração apertava apenas por imaginar que os sonhos de
papai, meus sonhos, estavam completamente destruídos, bem ali, à minha
frente.

– Lara, fique calma, meu amor. Olha essas parreiras, estão verdes,
cheias de uvas prestes a se desenvolver. – já havíamos saído do carro e
caminhávamos em direção ao casarão.

Acalmo meus ânimos assim que entendo o que Vincenzo queria


dizer. Ali, não existiam indícios de abandono e descaso.

– Mas eu só vou acalmar assim que ver o meu pai e saber como ele
está.

Assim que espalmo a mão na porta alta de madeira, eu vejo uma


casa escura, fechada, sem vida. O fogão à lenha estava apagado. A cadeira de
papai estava vazia, sem o corpo magro e a cuia de chimarrão ao lado.

– O que está acontecendo aqui?! Pai!!! – grito, assustada. De


repente, olho para o lado e vejo Vincenzo com o rosto abaixado, as mãos nos
bolsos. – Você está rindo?!

Fico perplexa com a tremenda falta de empatia e de sensibilidade


daquele italiano. Ele não é assim!

– Vem comigo! – então, Vincenzo me puxa pela mão, em direção


ao jardim. – Eu só preciso saber onde ficam a baia e o galpão.

Franzo as sobrancelhas em estranhamento e engulo em seco sem


entender exatamente nada o que estava acontecendo.

– Por quê? – digo, assim que corremos em direção às baias.


Estávamos de mãos dadas e apenas ouvíamos os nossos pés amassarem a
relva macia.

– Não me faça perguntas, Lara. – Vincenzo me responde altamente


sério, misterioso e irritante por não me desvendar o que estava prestes a
acontecer ali.

Então, assim que rompemos parte da fazenda com nossas botas de


couro italiano, avistamos o galpão e as baias ao lado.

– Vem comigo. – ele diz e descemos correndo em direção àquele


local. E o que me surpreendia era como Vincenzo estava ansioso. Sim, ele
sabia do meu pai e me escondia alguma coisa.

Assim que adentro aquele galpão, que tinha apenas como intuito a
preparação das uvas para venda, meus olhos arregalam estupefatos e uma
música alta começa a tocar. Vejo muitas pessoas conhecidas e que eu amava,
e daí me dou conta que era uma linda surpresa. Meu pai vem em direção a
nós dois de braços abertos e o sorriso mais lindo que já vi em toda a minha
vida.

Possuía cada vez mais certeza de que Vincenzo era um articulador


de situações.

Uma tarantela bonita vibra alto em meus tímpanos, enquanto abraço


forte o meu pai. Meu coração parece que vai explodir.

Jamme, jamme 'ncoppa, jamme jà!


Jamme, jamme 'ncoppa, jamme jà!
Funiculì, funiculà!
Funiculì, funiculà!
Jamme, jamme 'ncoppa, jamme jà!
Funiculì, funiculà!

– Pai, que saudades!!! – digo, sentindo seu perfume tão familiar. E


ele apenas segura minha cabeça e dá vários beijos em minha franja. Era bom
demais revê-lo e ver que estava tudo bem! Grudamos nossas testas, olhando
por segundos um no olho do outro, e sorrimos. Ali, não era necessário
palavras. Era uma troca mútua de afetividade, de gratidão por termos um ao
outro, apesar das belas circunstâncias.

Logo em seguida, papai abraça Vincenzo. Os dois sorriem com


familiaridade. E como eu amo observar aquela cena, o encontro dos dois
homens mais importantes da minha vida!

Meus olhos encontram muitas pessoas naquele espaço.

– O que é isso, meu Deus, Paola!!! – ela vem ao meu encontro junto
a Sr. Francesco. – O que significa isso?! – minhas pernas estão bambas, o
coração em colapso em meu peito, os olhos já são lágrimas puramente. – Que
surpresa é essa, Vincenzo!!! Meus primos!!! – corro em direção a eles, num
abraço forte e saudoso. Não dou conta de tanta surpresa! – Dona
Verbicário!!! – e solto uma forte gargalhada percebendo o sorriso
emocionado de Vincenzo.

Assim que me recomponho da surpresa, a tarantela silencia. Ouço


apenas ao burburinho das pessoas ali presentes.

Meu pai avança para o meio do galpão, então noto as mesas


ornamentadas de toalhas xadrez vermelha, branca e verde. As cores da Itália.
Todos que eu amava sentados ali, sorrindo, felizes. Uma mesa imensa de
quitutes, pães, com uma caçarola imensa de macarronada estava mais ao lado.
As nonas simpáticas das colônias vizinhas trataram logo de por a mão na
massa, literalmente, para realizar aquele gigantesco almoço.

Aquela maravilhosa surpresa.

– Filha, meu amor. – papai segura em minha mão. – Vincenzo


preparou essa surpresa para você. – sorrio e uma lágrima escapole. – Você
não faz ideia da felicidade que estou sentindo neste momento, ouso até dizer
que estou feliz igualmente quando vi o seu rostinho pela primeira vez, no
colo daquela parteira. – todos sorriem amavelmente. – Você é o amor da vida
de cada um que está aqui. Seus tios, seus primos, sua família e amigos. E
estamos muito felizes por poder viver esse momento e ainda mais saber o
quanto está realizada e completa ao lado do Vincenzo.

Então, todos aplaudem e eu agradeço completamente


envergonhada, com as bochechas vermelhas. Paola acena para mim jogando
um beijo.

– Eu não falo português, – Vincenzo diz um pouco encabulado.


Outra vez, as risadas preenchem o ambiente. –, mas, acredito que a
linguagem do amor é universal.

Então, ele pega algo em seu bolso, se ajoelha no chão de cimento e


me olha apaixonado nos olhos:

– Mi vuoi sposare?

Antes de responder, levo as mãos à boca e choro completamente


afetada por aquele gesto tão incrivelmente lindo e emanado de sentimentos.

– Sim, meu amor, eu caso com você.

Minhas mãos tremem absurdamente. Eu queria chorar, mas não


havia mais lágrimas o bastante para dar conta de toda aquela felicidade, então
apenas recebo a aliança em meu dedo e coloco também no dedo bonito de
Vincenzo Gatti, com um sorriso impresso em meu rosto.

Então, ele me abraça forte, me levantando nos seus braços e me dá


um beijo na boca, em meio a sorrisos. A tarantela começa a tocar de maneira
animada. As pessoas aplaudem e nos abraçam. Meu pai seca seus olhos com
um lenço azul bonito.

Vincenzo dança tarantela para mim, eu o acompanho, sorrindo. As


nonas e minhas primas dançam à nossa volta.

– Essa é a nossa família! – digo, feliz, ao meu noivo.

Jamme, jamme 'ncoppa, jamme jà!


Jamme, jamme 'ncoppa, jamme jà!
Funiculì, funiculà!
Funiculì, funiculà!
Jamme, jamme 'ncoppa, jamme jà!
Funiculì, funiculà!

O belo italiano sorri, ainda dançando. O suor brota em gotas da


testa de Vincenzo. Seus cabelos pretos grudam em sua testa, como numa
brincadeira sedutora. O azul de seus olhos está completamente intenso e
ofusca qualquer um que pudesse estar à sua volta. O seu sorriso, eu nunca
havia visto mais feliz, nem quando ele sorriu para mim, pela primeira vez. Os
botões de sua camisa já estão ligeiramente abertos e meus olhos invadem
pelo peitoral musculoso e suado.

Que bello ragazzo!

E como eu amava o CEO italiano.

Fim

***

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