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Aulas Práticas - Reais 3º TAN [2022-2023] - Prof.

Assistente: Tiago Henrique Sousa

Manual recomendado:
Oliveira Ascensão - Direitos Reais. obs.: alguns pontos estão desatualizados (ex.: arrendamento, para ele é direito real de
gozo, mas o regente acha direito pessoal de gozo).
José Alberto Vieira - recomendado pelo assistente

AVULSO:
Menezes Leitão José Luís Ramos Menezes Cordeiro
Carvalho Fernandes (prof aconselha a parte do registo) Santo Justo
Carlos Mota Pinto

[FOCO DA CADEIRA] Direitos Reais de gozo: nomeadamente de propriedade.


Usufruto: o proprietário, ao abrigo do poder de oneração, vai constituir o usufruto a terceiro; que, por sua vez, pode
usar e usufruir da coisa e o proprietário vai deixar de ter os poderes que tinha = fica despido de poder fruto e fruição.
Ex.: No terreno agrícola recentemente adquirido nas condições supramencionadas, fica o usufrutuário com todas as
maçãs, e não tem que dar nenhuma ao proprietário.
Uso: direito real menor incide sobre prédio rústico: o terceiro apenas tem a fruição de acordo com as suas necessidades
e com as da sua família.
Ex.: No terreno agrícola recentemente adquirido nas condições supramencionadas, pode o terceiro tirar as maçãs de
modo a preencher as suas necessidades e da sua família, mas as restantes maçãs são entregues ao proprietário.

Existem ainda:
Direitos reais de garantia (permitem, e têm como objetivo, que haja o pontual cumprimento de um direito de crédito -
reforçam a garantia de crédito do titular). Na ordem jurídica, nomeadamente no art.601º CC, perante o credor responde
todo o património do devedor sujeito a penhora - é a chamada garantia geral. Garantia real: o titular vê reforçado o seu
direito de garantia.
º Ex.: o banco quando executar a hipoteca tem direito de preferência perante o imóvel, acima dos outros credores -
art.686º CC.
º Ex.: o penhor - relativo a coisas móveis art.666º CC. Na falta do pagamento da coisa penhorada no prazo estipulado, o
proprietário pode vender o bem para ficar com o seu valor; não ficando com a coisa em si.
- Direitos reais de aquisição.

Direitos pessoais de gozo ≠ Direitos Reais de gozo


Direitos reais: gozo de coisa corpórea. Têm eficácia erga omnes. Direitos pessoais de gozo: não deixam de ser direito de
crédito. Gozo de coisa corpórea sem apropriamento.
Ex.: comodato (contrato de empréstimo): eu entrego a alguém uma coisa corpórea para que a pessoa a use
temporariamente. Mas, a pessoa goza a coisa no âmbito de uma situação obrigacional = Existe o gozo da coisa, MAS no
âmbito de uma obrigação, no âmbito de um contrato, há uma relação inter partes AO CONTRÁRIO dos direitos reais de
gozo: fazemos o gozo sem qualquer contrato ou intervenção de terceiro.
Ex.: arrendamento (obrigações contratuais tanto do senhorio como do arrendatário). O gozo da coisa é regulado por
contrato AO CONTRÁRIO dos direitos reais de gozo em que não há qualquer intervenção no gozo].
Ex.: depósito.
NÃO CONFUNDIR USUFRUTO (ex.: usucapião) COM ARRENDAMENTO.
Caso Prático N.º 1
(Características e Princípios dos Direitos Reais)
I
António, proprietário de um imóvel em Lisboa, decide doá-lo, em dezembro de 2015, a Bento, seu primo, mediante
celebração de escritura pública, não registando Bento o seu facto aquisitivo.
Entretanto, António vende a propriedade do mesmo imóvel a Berta, em janeiro de 2016, que regista.
Na escritura pública celebrada entre António e Bento é referido, numa das cláusulas, que Bento não poderia alienar o
imóvel a qualquer terceiro.
Bento, que residira no imóvel desde 2015, decide constituir um usufruto vitalício oneroso do imóvel a favor a de Carlos,
no ano de 2018, não tendo havido registo do facto aquisitivo.
Em janeiro de 2019, Carlos, que se deslocara à Suíça, vê o imóvel de Lisboa ser assaltado por Dário, que arromba o
imóvel, passando a residir no mesmo.
Carlos decide reagir judicialmente contra Dário, tendo este respondido que Carlos nada poderia fazer para ele sair do
imóvel, uma vez que não era o proprietário daquele imóvel.

Resolução do professor:
Relativamente à doação:
O negócio celebrado entre António e Bento é caraterizado por doação, cujo regime está presente nos artigos 940º e
seguintes. Para esta ser válida deve respeitar a forma enunciada no art.947º/1, pelo que, a existência de escritura
pública preenche tal requisito. Sem mais informação no caso concreto relativo aos sujeitos em causa, assumimos que a
doação é válida.
Como um dos efeitos da doação encontramos a transmissão da propriedade e da coisa ou titularidade do direito,
enunciado na alínea
a) do art.954º. Assim, a propriedade transferiu-se para Bento, devido ao princípio da consensualidade associado ao
sistema do título. A efetivação do sistema do título seguido no nosso ordenamento jurídico está previso no art.408º/1,
garantindo, como regra-geral, que a constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se por
mero efeito do contrato.
Temos indicação que Bento não regista o facto aquisitivo. Ora, dispõe o Código do Registo Predial, no seu art.2º/1/a) que
estão sujeitos a registo os factos jurídicos que determinem, entre outros, a aquisição, inclusive o art.8º-A indica a sua
obrigatoriedade, a contrário. O art.5º/1 do mesmo diploma, sublinha ainda que a eficácia erga omnes (contra terceiros)
só se produz após a data do registo supramencionado.
NOTA: É ERRADO DIZER QUE SE REGISTAM DIREITOS, MAS SIM FACTOS JURÍDICOS AQUISITIVOS, MODIFICATIVOS OU
EXTINTIVOS. A LEI OBRIGA QUE A TITULARIDADE SEJA REGISTADA (8º-A).
Resumindo, António transmitiu a propriedade a Bento com a celebração do negócio jurídico da doação, validamente
celebrado. O facto de não ter registado não obsta a que ele seja considerado proprietário do imóvel, pois os direitos
transmitem-se por mero efeito do contrato do ordenamento jurídico português.

NOTA: CV tem efeitos reais e obrigacionais (879º)


Relativamente à venda a Berta:
António já não é proprietário do imóvel, já o doou a Bento, por isso, estaria, à primeira vista, uma venda de bem alheio
prevista no art.892º). Contudo, o negócio celebrado entre António e Berta é válido pois qualquer terceiro interessado
que verifique o registo confirma que António está registado como proprietário. O notário consulta o registo e como este
não estava atualizado, é António que consta, então é lavrado o ato de compra e venda.
Apenas está de má-fé o António, pois sabia da doação a Bento.
Resumindo, existem duas realidades em causa:
A realidade substantiva: em que Bento é proprietário como efeito da doação
A realidade registral: em que António ainda consta como proprietário no registo, na ausência de atualização por parte de
Bento
Assim, estão dois direitos reais em conflito e recorremos ao princípio da prevalência cuja regra-geral determina que
persiste o direito real da ordem substantiva, neste caso o do António com Bento, sobrepondo-se à compra e venda que
se seguiu, sendo o contrato entre António e Berta nulo.
[EXPLICADA MAIS À FRENTE] Aquisição tabular: não podemos alienar um direito real que não está na nossa esfera, mas
por outro lado, não podemos prejudicar terceiro de boa-fé. Se não se verificarem as regras de aquisição tabular (que
protegem a Berta enquanto 3º de boa-fé) o que vai acontecer é a prevalência do direito do Bento. [NOTA] Prevalência
dos direitos reais sobre os direitos de crédito (regra-geral) mas existem situações em que subsiste o direito de crédito
(ex.: arrendamento).

Relativamente à cláusula de proibição de venda a 3º:


Bom, dispõe o art.405º sobre a liberdade contratual, dando a opção às partes poderem recorrer aos contratos típicos, a
contratos mistos ou contratos atípicos, mas sempre dentro dos limites da lei.
Ora, o que limita as normas a que as partes podem se servir é o princípio da tipicidade:
*Princípio da tipicidade: em Portugal, os particulares não são admitidos a criar figuras com natureza real que lhe
aprouver, vendo a sua autonomia privada restringida à possibilidade de escolha de direitos reais previsos na lei. Assim,
há um numérico legalmente finito de direitos reais e uma consequente constituição de restrições ao direito de
propriedade. Só são permitidos direitos típicos, consagrados pelo legislador (art.1306º/1).
Recorrendo ao referido art.1306º, conseguimos extrair duas vertentes:
As partes não podem criar direito real ex novos, tem que estar dentro do catálogo real do ordenamento jurídico (Mas a
forma pelo qual o direito real é redigido é livre ou seja: contrato misto, permuta, etc.);
relevante para o caso: as partes não podem desrespeitar o conteúdo injuntivo típico de um direito real.
Portanto, temos que confrontar os direitos reais: comprovar quais as normas injuntivas, ou seja, as que não podem ser
alteradas. Ver se a pretensão de A que Bento não alienasse a qualquer terceiro, estaria ou não, a violar o princípio da
tipicidade.
A disposição que rege os direitos de gozo do proprietário encontra-se no art.1305º, que consagra os poderes de uso, de
fruição e disposição (transmissão da propriedade, mas também da sua constituição de direitos reais menores quer da
constituição de direitos reais de garantia).
Então, na nossa hipótese, como se tratava de direito de propriedade e a regra do art.1305º é injuntiva, estava a ser
violada.
O que acontece a esta cláusula: como viola a tipicidade, acaba por se manter no contrato que em si não padece de
nulidade; mas terá apenas eficácia inter partes e não erga omnes. Razão essa então pela qual Bento pode sim vender a
terceiro, Carlos como adquirente fica protegido, mas António poderá intentar contra Bento uma ação de
responsabilidade civil.
*[NOTA]: Tipicidade: Vantagens VS. Desvantagens *Ver revista 3 e 4 2021 CIDP
Vantagem: segurança jurídica VS Desvantagem: rigidez do tráfico jurídico imobiliário
Oliveira Ascensão: é contra o princípio da tipicidade. Usufruto a favor de Carlos:
Já sabemos que Bento não pode constituir direito real menor em termos da inter partes (eficácia que resulta da cláusula
de proibição declarada por António), mas em termos erga omnes pode ( a favor de terceiros).
O usufruto, cujo regime se encontra nos art.1439º e seguintes, está sujeito a registo enquanto direito real - art. 2º/1/a)
do Código do Registo Predial).

Dário passa a residir no imóvel e acusa Carlos de não ser proprietário:


Direito de sequela
Dário não tinha razão, Carlos não era proprietário, mas gozava de tutela jurídico-real e por isso podia intentar uma acção
real de reivindicação, de acordo com o art.1311º ex vide art.1315º.
Antunes Varela: nas ações reais têm que ser formulados dois pedidos:
o pedido de reconhecimento de direito por parte do titular - o tribunal reconhece o direito do autor da ação real
a entrega da coisa por parte da coisa de quem a tem
José Alberto Vieira: o autor não tem que formular os dois pedidos, isto porque, a causa de pedir é complexa: ao ser
reconhecido direito, consequentemente pode exigir-se a entrega da coisa (princípio da absolutidade).
Carlos podia ainda intentar a ação de aquisição de posse prevista no art.1263º.
Dário alega que não há registo.
Não há registo, mas o que há? Nas ações reais tende a exigir-se todas as cadeias que tivemos de percorrer até obter
posse.
Quem tem o registo a seu favor, presume-se que é o titular do direito, nos termos em que o registo o define (art.7º do
Código do Registo Predial). Neste caso, Carlos não tem registo. Mas podia provar de outra forma: escritura pública ou
registar o facto aquisitivo, e depois intentava a ação.
Característica da absolutidade: eficácia erga omnes e não interpartes.
Há doutrina que associa isto ao direito de sequela: “Privilégio que assiste ao titular de direito real (v direitos reais) de
executar os bens que lhe servem de garantia para, com o seu produto, pagar-se de seu crédito, bem como de apreendê-
los em poder de qualquer pessoa que os detenha. Segue, persegue, vai à busca do bem que lhe pertença, cabendo ação
contra aquele que o detenha. O seu titular terá o direito sobre o bem, ainda que o mesmo esteja em poder de terceiros
possuidores.”

II
Carlos pretende constituir a favor de terceiros um direito real ex novo, relativo a um imóvel da sua titularidade, por
considerar que o catálogo legal não tutelava, integralmente, os seus interesses, pedindo auxílio ao seu advogado para o
fazer.

Não pode, pois, como supramencionado, o princípio da tipicidade não permite a criação de direitos ex novos, ou seja,
não podem ser criados direitos reais para além dos que estão na lei.

III
Carlos poderá transmitir, a favor de Daniela, o direito de propriedade de um prédio que irá construir no Porto, em 2024?

Não, porque não se pode vender uma coisa que vai ser construída em 2022, não há direito de propriedade sobre coisas
futuras, apenas direitos de crédito.

Nos termos do art.408º/2 se a transferência respeitar a coisa futura, o direito de propriedade só pode ser transferido
quando a coisa for adquirida pelo alienante, neste caso por Carlos.
É possível constituir um direito real sobre coisas futuras, mas o direito real só nasce quando a coisa nascer. Contrato de
compra e venda de uma coisa futura -> derroga a regra geral do princípio da especialidade: art. 880º/1, não se pode
transmitir até se construir.

Caso Prático N.º 2


(Princípios dos Direitos Reais)
António constitui a favor de Bento, em janeiro de 2001, um direito de superfície para que este pudesse construir um
parque de estacionamento subterrâneo, o qual regista o seu facto aquisitivo.
Bento acaba por não construir o parque de estacionamento, exigindo António, em março de 2023, que este abandone
o terreno, o qual recusa, acabando por vender o direito de superfície a Carlos.
Quid juris?
Foi constituído um direito de superfície, cujo regime está previsto no art.1524º e seguintes, dos quais o art.1528º
consagra o seu princípio geral. O direito de superfície outorga, como qualquer direito real, um conteúdo típico de
aproveitamento de uma coisa, que neste caso é sempre um imóvel (terreno). Porém, o superficiário não tem o conteúdo
normal de gozo, nomeadamente, o uso e a fruição do imóvel (estes pertencem ao proprietário do solo, bem como o
direito de constituir a favor de terceiros), sobre todo o prédio enquanto a obra ou plantação não está concluída
(art.1532º) e sobre a parte não ocupada pela obra na existência desta (art.1533º).*
Assim, os poderes típicos do superficiário são: o poder de transformação (construir ou fazer plantação), poder de manter
a obra ou plantação sob solo alheio (durante tempo de duração do direito) e poder de disposição. E, para além do direito
de superfície sob o solo, ainda tem direito de propriedade sobre o implante material (obra) ou vegetal (plantação.
*Princípio da elasticidade - os direitos do sujeito em causa aumentam e diminuem consoante o contrato em causa: os
direitos reais gozo podem ser onerados com direitos pessoais de gozo com duração variável (neste caso, quando a obra
ou plantação é concluída, os leques de poderes do superficiário aumentam).
Nota: quando o direito real menor se extingue, os poderes do proprietário voltam ao início.
Os direitos reais de gozo podem ser onerados.

Art.1534º- transmissibilidade do direito de superfície


Nota: O princípio da transmissibilidade é defendido por alguns autores.

O direito de superfície pode ser perpétuo ou temporário, contudo, a sua perpetuidade não implica que seja imune aos
factos extintivos gerais, tais como o não uso. Neste caso, podemos aferir as diversas causas de extinção no art.1536º/1, e
por sua vez, na alínea a) temos indicação que se extingue “Se o superficiário não concluir a obra ou não fizer a plantação
dentro do prazo fixado ou, na falta de fixação, dentro do prazo de dez anos”
A extinção tem que ser invocada por António, provando que não foi realizada obra no decurso de 20 anos = extinção por
não uso (art.298º/3).

Princípios dos Direitos Reais


Princípio da consensualidade [art.408º] - consenso pelo mero efeito do contrato, não tendo a omissão da inscrição
registral do facto aquisitivo qualquer interferência na eficácia real do contrato (José Alberto Vieira + assistente VS.
Antunes Varela: defende que a eficácia quando estão em causa imóveis depende do registo ⬇ ).
Princípio da publicidade [ Código do Registo Predial] - publicidade espontânea (que resulta da posse) e publicidade
organizada (por registo predial). Vai ter efeitos visíveis relativamente à aquisição tabular.
Princípio da tipicidade [art.1306º] - os particulares não são admitidos a criar figuras com natureza real que lhe aprouver,
vendo a sua autonomia privada restringida à possibilidade de escolha de direitos reais previsos na lei. Assim, há um
numérico legalmente finito de direis reais e uma consequente constituição de restrições ao direito de propriedade. Só
são permitidos direitos típicos, consagrados pelo legislador. 2 vertentes: i) as partes não podem criar direito real ex
novos,
ii) as partes não podem desrespeitar o conteúdo injuntivo típico de um direito real.
Princípio da causalidade – significa que a aquisição do direito real supõe a eficácia do negócio jurídico que lhe está de
base (causa legítima). Se este for nulo, ou vier a ser anulado, a aquisição do direito real não tem lugar.
Princípio da absolutidade: se entendermos uma situação jurídica absoluta como aquela que existe por si, sem
dependência de outra situação de sinal contrário, então, o direito real é uma situação jurídica absoluta (direito subjetivo
absoluto).
Princípio da elasticidade - os direitos do sujeito em causa aumentam e diminuem consoante o contrato em causa: os
direitos reais gozo podem ser onerados com direitos pessoais de gozo com duração variável (ex.: o senhorio prescinde
do seu uso e fruição da propriedade que lhe pertence no decurso da duração do contrato de arrendamento, logo o seu
direito diminuiu).
Princípio da transmissibilidade - implica que os direitos reais possam ser objeto de sucessão por morte e que possam ser
transmitidos por ato inter vivos. Mas há direitos reais que não podem exceder a vida do titular (art. 1444º) e outros
inalienáveis (art. 1488º).
Princípio da especialidade [art.1302º] - a determinação do objeto dos direitos reais: limitam-se às coisas (corpóreas),
certas e determinadas.
Princípio da inerência [NÃO CONFUNDIR COM O ANTERIOR]: cada direito real tem uma coisa determinada por objeto e,
na ausência de causa legal, não pode ser dissociado ou separado dela, nomeadamente para ter outra coisa por objeto.
Ligação íntima entre o direito e a coisa: não há direito real sem coisa nem coisa sem direito real.
Eficácia de erga omnes - eficácia contra terceiros, garante o recurso à ação real do art.1311º - ação de reivindicação.
Professor- assistente: defende a absolutidade.

Posse VS. Detenção


Regra-geral aquele que tem o controle de uma coisa corpórea é considerado possuidor excetuando se existir alguma
norma que descaracterize a sua posse. Á partida está prevista nas várias situações do art.1253º .

Teoria da Causa: não responde às situações em que o sujeito adquire posse sem qualquer título.
Teoria Subjetivista: seguida pela maioria da jurisprudência, em harmonia com os conhecidos autores subjetivistas, Pires
Lima e Antunes Varela (também defendido pelo regente, Rui Pinto).
Teoria Objetivista: prescinde do animus (expressão de vontade), seguida por Oliveira Ascensão.

A diferença entre posse e detenção:


A posse é o exercício de facto de um direito real. A pessoa que tem a posse de um bem tem o controle físico do mesmo e
pode usá-lo e fruí- lo como se fosse seu proprietário. A posse é uma proteção legal contra a invasão do bem por terceiros
e também é um meio para adquirir o direito de propriedade por meio da usucapião.
Por outro lado, a detenção é o exercício precário da posse. A pessoa que detém um bem não tem o direito de usá-lo e
fruí-lo como se fosse seu proprietário, mas apenas tem o controle físico do mesmo por vontade do proprietário. A
detenção é uma situação transitória, uma vez que o detentor deve devolver o bem ao proprietário quando este o exigir.

Caso Prático N.º 3


(Posse)
I
António, proprietário de um imóvel em Braga, decide emprestá-lo ao seu irmão, Bento, em 1980, para que este
habitasse.
Bento reside no imóvel desde essa data, comportando-se como fosse seu proprietário.
António parte para o Brasil em 1980, regressando, em 2020, para gozar a sua reforma, pedindo a sua devolução
imediata.
Bento recusa, alegando que havia usucapido o direito de propriedade.
Quid juris?

Relativamente ao contrato celebrado entre António e Bento:


Foi celebrado entre António e Bento um contrato de comodato. Este é um contrato que se encontra regulado art.1129º
e seguintes, pelo qual alguém (comodante) entrega a outrem (comodatário) certa coisa, móvel ou imóvel, para que se
sirva desta, com a obrigação de a restituir. O contrato de comodato não está sujeito a forma escrita, considerando-se
celebrado pelas declarações negociais das partes (comodante e comodatário) e pela entrega da coisa móvel ou imóvel,
pelo comodante, ao comodatário (contrato real quod constitutionem, ou seja, quanto à constituição).
Pelo art.1137º/2 sabemos que na ausência de prazo para a restituição, esta é imediata assim que seja exigida. E, como
supramencionado, é uma das obrigações do comodatário restituir a coisa (art.1135º/h).
Bento é um mero detentor, cabendo no enunciado pelo art.1253º/c), num âmbito de um direito pessoal de gozo
(art.1252º/1).

Relativamente ao alegado usucapião:


Já sabemos que Bento era um mero detentor pelo art.1253º/c). Assim sendo, devemos consultar o art.1290° que releva
para os casos de usucapião em casos de detenção. Por sua vez, concluímos que não se pode falar de usucapião porque
Bento era simplesmente um detentor e não possuidor. A inversão no título da posse, para usucapião, só começa a contar
a partir do momento da inversão do título da posse, ou seja: os 40 anos passados não contam, para estes efeitos.

II
Abel era proprietário de uma herdade em Beja, com 500 hectares. Bento, desde 1985, utiliza a referida herdade para
dar de beber aos seus animais, uma vez que tal nunca havia causado transtorno a Abel. Abel morre em 2020, tendo o
seu filho, Carlos, de imediato, exigido a Bento que não mais levasse o gado dele à herdade.
Bento não concorda, alegando que tem o direito de dar de beber ao seu gado, uma vez que o faz há mais de 35 anos.
Quid juris ?

Relativamente ao uso de Bento das águas durante a vida de Abel: Estamos perante um caso de mera tolerância. Ao
contrário do contrato de comodado que depende de declaração de vontade, a mera tolerância vem prevista na
alínea b) do art.1253º e considera mero detentor Bento, que se aproveita da tolerância do titular do direito, Abel. Ou
seja, o sujeito detentor beneficia da circunstância do poder do titular de uso das águas, para se servir das mesmas.
Esta situação de mera tolerância pode cessar a qualquer momento, sendo mais precário que o comodato. Mesmo não
havendo contrato, tem que haver consentimento. No caso em questão não há consentimento por parte de Abel, mas
também não há oposição.

Relativamente ao que Carlos pode fazer:


Poderia recorrer à ação possessória do art.1277º de forma a que lhe fosse comprovada a posse, ou ação de reivindicação
do art.1311º para que lhe fosse reconhecido o seu direito de propriedade...

Relativamente à alegação de Bento sobre os 35 anos:


Já sabemos que Bento era um mero detentor pelo art.1253º/b). Assim sendo, devemos consultar o art.1290° que releva
para os casos de usucapião em casos de detenção. Por sua vez, concluímos que não se pode falar de usucapião porque
Bento era simplesmente um detentor e não possuidor. A inversão no título da posse, para usucapião, só começa a contar
a partir do momento da inversão do título da posse, ou seja: os 35 anos passados não contam, para estes efeitos.

[NOTA] Objetividade da posse:


1253/a): São havidos como detentores ou possuidores precários:
a) Os que exercem o poder de facto sem intenção de agir como beneficiários do direito;
Oliveira Ascensão: existe controlo material de uma coisa corpórea, mas a declaração proferida sobre a coisa,
descaracteriza a posse.
Crítica - potestativos factum contesta: o comportamento do sujeito é que releva para efeitos jurídicos e não a declaração
que efetivamente profere. A declaração é antagónica ao comportamento.

Caso Prático N.º 4


(Modos de aquisição da posse)

António, proprietário e possuidor de um imóvel, constitui, em 1990, um usufruto favor do seu filho Bento,
relativamente ao apartamento em Lisboa, tendo-lhe sido entregue a chaves.
Bento vivia no estrangeiro, nunca visitando Portugal.
Carlos e Dália, proprietários do apartamento vizinho, apercebendo-se de que Bento nunca visitara o apartamento,
decidem, em 2000, partir uma parede contígua ao seu imóvel e ocupar o apartamento de Bento, de modo a ficar com
uma casa mais ampla.
As obras feitas por Carlos e Dália são de elevada extensão, sendo do conhecimento de todos os vizinhos do prédio.
Bento, regressa a Portugal, em 2021, decidindo ir viver para o apartamento, sendo certo que o seu pai já havia
falecido.
Quando chega ao prédio, Bento apercebe-se que o mesmo está ocupado por Carlos.
Bento decide procurar um advogado, que o aconselha a intentar uma acção possessória contra Carlos e Dália.

Quid juris?

Art. 1253.º/al c) – o direito de B deriva do direito da A – A é proprietário, mas B é detentor.


Quando caracterizamos a posse, deveremos prosseguir uma regra básica: recorrer aos caracteres legais – titulada –
dizemos que a posse é titulada quando tiver sido fundada num modo legitimo de aquisição – 1258.º

Art. 1259.º - posse titulada – questiona se é preciso haver legitimidade da parte do disponente

Ex: Quando se trata de um contrato de compra e venda de um bem alheio, a posse de quem o adquire é sempre titulada.

Para que a posse seja legalmente titulada, tem que cumprir o modo de aquisição.

No caso, a posse era uma posse titulada.


A posse de boa-fé que está subjacente ao artigo, é uma conceção ética. É considerada boa-fé se o sujeito cumprir os
deveres de cuidado com o bem jurídico.

Caracter legal – a violência é exercida contra a coisa ou contra a pessoa?

JAV + MC – a violência apenas pode ser exercida contra a própria pessoa. Posse violenta é quando existe roubo, por ex.
arrombamento não conta como sendo posse violenta.

Outra doutrina entende que a posse é considerada violenta em casos mesmo com arrombamento – Pires Lima.
Base: 255.º - ‘’fazenda’’ – é entendido como o património do possuidor.

Posse publica ou oculta – corresponde à forma como o sujeito se comporta com a coisa.

A questão da publicidade relaciona-se com o conhecimento de 3º da posse.


Posse oculta – não é suscetível de ser conhecida pelos interessados. Ex: ladrão rouba um relógio, mas guarda-o num
cofre durante 20 anos, nesses 20 anos a posse é oculta.
No caso poderemos considerar a posse como publica. Até agora é uma posse titulada de boa-fé, pacifica e pública.

Posse formal / causal – na posse causal existe uma correspondência direta entre o título possessório e a titularidade do
direito.

O ladrão tem exercício possessório, mas não é o titular do direito real.

Posse interditada – direitos pessoais de gozo – não é considerada uma real posse – 1233.º/2.
Posse civil – engloba usucapião; confere todos os efeitos possessórios. Para o prof MC esta qualificação faz sentido, mas
para o prof JAV não faz sentido nenhum.
Posse efetiva // não efetiva – a posse efetiva é quando o sujeito tem a suscetibilidade de ter o controlo material da coisa.
A posse não efetiva acontece em direitos pessoais de gozo.

Posse mediata // imediata – a posse imediata tem a ver com a poesse efetiva e não efetiva – art. 1252.º

Nos casos de arrendamento a posse é garantida por intermediário.

C e D apossaram-se do imóvel. Estamos perante um facto aquisitivo originário (contrário aos derivados) – apossamento +
inversão do título da posse.

Posse entre C + D – posse não titulada (na posse não titulada presume-se a má-fé), neste caso há má-fé não presumida
porque ambos sabem que estão a lesar um direito de outrem.

Ordem da posse:
Art. 1258.º - 1259.º (posse não titulada) – 1260.º (posse de má-fé);

1262.º - os interessados na posse publica – basta a cognoscibilidade se a pessoa tinha a chave de casa podia ter sempre
entrado lá para ver se foi habitado.

1267.º/1 al. b) – B mantém-se na posse em 2021.


Desmaterialização do corpus possessório – mesmo que não haja controlo material da coisa, o agente pode continuar a
ser o seu proprietário.

Sobreposição de posses – a posse do B é sobreposta à posse do C+D durante 1 ano – 1267.º + 1282.º (prazo de
caducidade). Poderemos ter uma exceção perentória por usucapião.

Caso Prático N.º 5


(Modos de aquisição da posse)

António, usufrutuário, decide emprestar um apartamento a Berta para que esta resida durante a frequência do seu
curso de direito, tendo sido celebrado contrato escrito.
Berta passa a habitar no imóvel, a partir de setembro de 2018, data em que ingressou na FDL. Em março de 2021,
António envia uma carta a Berta, dizendo-lhe que precisava da casa.
Berta, responde a António, dizendo-lhe que não ia abandonar o apartamento.
Perante o comportamento de Berta, e atendendo à sua ingratidão, António decide arrombar o apartamento e mudar
a fechadura, impedindo Berta de entrar.
Berta reage judicialmente, no final de março de 2021.
Em setembro de 2021, Berta, cansada de esperar pelo desfecho da acção, decide arrombar ela própria a porta,
enviando depois um SMS a António, no qual disse que se considerava, a partir daquela data, proprietária do
apartamento.

Quid juris?

INCOMPLETO

António enquanto usufrutuário:


O contrato de usufruto (artigos 1439º e seguintes) é um negócio jurídico através do qual uma pessoa, denominada
usufrutuário, adquire o direito de usar e fruir de um bem, como se fosse o proprietário, mas sem adquirir a propriedade
do mesmo, ou seja, não pode alienar ou onerar o bem sem o consentimento do proprietário. Neste caso, o proprietário
ao imóvel em questão é pessoa indeterminada e António ocupa a posição de usufrutuário.

Relativamente à questão da declaração negocial:


Há autores que entendem que tem que haver declaração de vontade (animus). Contudo, e de em harmonia com o
professor-assistente, a maior parte da doutrina não acha necessário pois a posse tem o elemento essencial corpus
(controlo material da coisa) e a exteriorização de um direito; ora ao existir estes dois elementos não é necessária
exteriorização de vontade (animus).

Inversão do título da posse:


Define o art.1263º/a) que a posse se adquire, entre outras, por inversão do título da posse. Mais à frente, no art.1265º,
vem regulada esta figura sob a seguinte definição: A inversão do título da posse pode dar-se por oposição do detentor
do direito contra aquele em cujo nome possuía ou por ato de terceiro capaz de transferir a posse.
Se aquele que tem a coisa em seu poder (detentor) começa a exteriorizar um direito contra o possuidor anterior
(verdadeiro proprietário), o direito faz corresponder a posse à nova exteriorização (à do detentor). Ou seja, a posse do
detentor é relativa ao direito que este exerce sobre a coisa. A inversão do título da posse impõe que o detentor tenha o
corpus possessório.
Ex: A, arrendatário, deixa de pagar as rendas a B, proprietário, comunicando a este que é ele o dono da casa.

Demonstrando o animus de posse, o detentor só goza da inversão do título, após ocorrerem 2 factos:
Oposição do detentor contra aquele em cujo nome possuía (proprietário): não basta um comportamento não declarativo
do detentor (ex.: parar de pagar rendas, recursar-se a devolver a coisa, etc.), é preciso acompanhar-se de uma afirmação
inequívoca de um direito sobre a coisa (agir como se a coisa fosse sua);
Ato de terceiro: relevante para o caso. O ato de terceiro capaz de transferir posse acontece quando existe um ato que é
idôneo a transmitir a posse. Ou seja, o ato deve ser suscetível de constituir ou transmitir o direito real a que a posse se
reporta. Para a doutrina jusrealista: o detentor passa a possuidor.
-> O professor-assistente discorda da aplicação a casos de contrato de compra e venda: este não é idôneo a transferir a
posse, mas sim a titularidade, principalmente num contrato aferido de invalidade (relembrando que o contrato de
compra e venda não necessita de transferência de posse para garantir a titularidade, depende apenas da validade do
contrato).
Caso Prático N.º 6
(Modos de aquisição da posse)

Abel, proprietário de um apartamento, estando estava numa situação económica difícil, decide vendê-lo ao seu amigo
Bento, em 2002, sob a condição de puder continuar a residir no imóvel, mediante o pagamento de uma renda e
celebração de um contrato para o efeito, com a duração de 20 anos.
Bento aceita a compra e venda nestas condições, tendo a escritura pública sido celebrada, no ano de 2005, e sido
registado o facto aquisitivo.
Bento morre, em 2020, tendo o imóvel sido herdado pelo seu filho Carlos.
Carlos exige que Abel abandone o imóvel porque pretendia residir no mesmo, dizendo ainda ser alheio ao negócio
que este havia celebrado com o seu pai.
Abel opõe-se, dizendo que Carlos não era possuidor, nunca tendo tido o controlo material do apartamento e que não
iria abandonar o apartamento.
Quid juris ?

Resolução do prof + apontamentos pessoais referentes aos manuais indicados

Relativamente aos negócios celebrados entre A e B:


O contrato de compra e venda celebrado em 2002 entre Abel e Bento presume-se válido. A condição determinada por A
e posteriormente aceite por B origina um novo negócio jurídico na esfera de ambos: o contrato de locação, previsto no
art.1022ºCC.
Porque não um contrato compra e venda com reserva de usufruto? Enquanto o usufruto confere ao usufrutuário um
direito real sobre o bem, o contrato de locação confere apenas um direito pessoal de uso e gozo temporário, mediante
pagamento de renda.
No contrato de locação celebrado entre A e B, permite que o último mantenha o direito real da coisa enquanto que o
primeiro mantém o controlo material e desfruta de um direito pessoal de gozo.
Quando se verificam situações como o caso apresentado, estamos perante um constituto possessório.
Este representa a ocasião em que o possuidor passa a detentor, continuando embora a ter a coisa consigo - José Alberto
Vieira. Assim, estão aqui em causa dois atos: o principal, em que se transmite o direito real, e o acessório, no qual se
justifica que a detenção da posse por parte do antigo possuidor, novo detentor.
Esta figura está sujeita ao regime específico do art.1264º que, por sua vez, determina três requisitos:
Um negócio jurídico de transmissão de um direito real de gozo - confirma-se, neste caso, havendo um contrato de
compra e venda entre A e B. Que o transmitente do direito real seja possuidor - A, que transmite o direito real, era o
possuidor. Uma causa jurídica para a detenção da coisa - o contrato de locação celebrado entre ambos. Assim sendo, e
encontrando-se os preceitos do art. 12º/1/m do Código do Registo Predial (período igual ou superior a 6 está sujeito a
registo) considera-se também válido o contrato de locação.

Relativamente à sucessão de C:
Se em causa estivesse um contrato de comodato (contrato intuito personae) este extinguir-se-ia com a morte do titular
principal. Contudo, e de acordo com o regime do artigo 1057º, Carlos não pode obrigar Abel a abandonar o imóvel.

Relativamente à argumentação de A:
A posse do sucessor é a posse do de cuius - José Alberto Vieira. Uma vez que a posse continua nos sucessores, a
apreensão material é desnecessária, por já ter sido consumada anteriormente.
Posição da Regência, que defende que a posse se transmite solo consensus por constituto possessório (artigos 1263.º, c)
e 1264.º), nos mesmos termos que se dá a transmissão dos direitos reais (v. artigo 408.º); C é, com efeito, possuidor do
imóvel, mesmo não tendo o controlo material sobre a coisa corpórea (fenómeno de desmaterialização do corpus
possessório, que nos indica, claramente, que a posse é uma questão de direito - desmaterialização do corpus prevista no
art.1255º - circunstância de regra geral, há posse mesmo sem controlo material da coisa, nos mesmos termos do
anterior proprietário).
Logo, Abel não tem razão no que diz, e Carlos é sim o legítimo possuidor do imóvel em questão.

Questão extra colocada pelo professor:


Imagine que Carlos estava constantemente a ligar a Abel, dizendo para abandonar o imóvel, inclusive referindo que ia
recorrer às autoridades para reaver o imóvel. O que aconselharia a Abel enquanto seu cliente?

O comportamento de Carlos, para além de não sustentado pois Abel estava a agir conforme os preceitos outrora
contratados, configuram- se como uma figura de assédio.

Teríamos que recorrer ao capítulo V do CC que versa sobre a defesa da posse.


Nomeadamente importa distinguir esbulho de perturbação:

Esbulho VS. Perturbação:


Esbulho: consiste na privação da coisa por intervenção de terceiro, contra a vontade do possuidor. Este fica despido do
corpus, sem controlo material da coisa. Uma das formas típicas de esbulho é a inversão do título da posse.
Para este tipo de casos deve recorrer-se a uma ação de prevenção, prevista no art.1276º CC, pois esta requer que não
tenha havido ainda perturbação na posse da coisa.

Perturbação: quando já existem atos materiais praticados sobre a coisa que perturbaram o gozo dela pelo possuidor.
Deve recorrer-se a uma ação de manutenção, prevista no art.1278º
CC. Legitimidade: art.1281º e Caducidade: art.1282º CC.

Caso Prático N.º 7

(Vicissitudes da posse, defesa possessória e frutos na posse)

Abel, proprietário de um automóvel, é um fervoroso adepto de desporto, razão pela qual nunca utiliza o mesmo,
tendo-o estacionado numa praceta próxima de casa.
O carro vai ganhando pó na rua, altura em que Bento, julgando que ninguém queria o mesmo, o arromba, em
Fevereiro de 2023, passando-o a utilizar.
Abel, apercebendo-se de que o carro estava a ser utilizado, decide agir judicialmente no sentido de voltar a ter o seu
carro de volta.
Bento apresenta contestação, dizendo que era facto notório que o carro estava abandonado, não sendo utilizado há
mais de um ano e que, por essa razão, o poderia utilizar.

Quid juris ?
José Alberto Vieira:
Existem diversas formas do possuidor perder a posse da coisa, uma delas é o abandono (1267º/a CC).
O abandono consiste na perda voluntária do corpus pelo possuidor. Esta quebra o controlo material que tinha sobre a
coisa por opção própria.
Menezes Cordeiro defende ser necessário que o abandono tenha um mínimo de publicidade, assemelhando-se ao
apossamento. Contudo, José Alberto Vieira discorda, dizendo que a publicidade não se adequa à maioria das situações
(ex.: televisor abandonado).
Determina-se, portanto, que o animus de não possuir é juridicamente irrelevante se o controlo material da coisa
(corpus) permanecer inalterado. E como, uma vez constituída a posse, ela se conserva com a mera suscetibilidade de
atuação material sobre a coisa (art.1257º/1), tem de haver a quebra efetiva do domínio fático da coisa para que se possa
falar de abandono.
Exemplo ilustrativo de José Alberto Vieira: o proprietário do veículo que o deixa na via pública sem querer saber dele,
mas que conserva consigo as chaves, podendo a todo o tempo retomar a atuação sobre a coisa, mantém a sua posse
(art.1257º/1).
Este exemplo encaixa perfeitamente no caso em questão. Abel não só não expressou qualquer animus de abandonar o
carro, como mantém o domínio sobre o corpus; logo, não se poderia dizer que houve abandono nesses termos.

A questão temporal suscitada por Bento:


Jurisprudência:
No entanto, a jurisprudência portuguesa tem entendido que, para se considerar um bem abandonado, deve verificar-se
a intenção inequívoca do proprietário em renunciar ao bem, conjugada com a sua inutilidade e falta de utilização por um
período de tempo significativo. Em regra, um período de tempo superior a um ano de inatividade pode ser um indicador
relevante para avaliar se houve ou não abandono, mas não é um critério determinante.

Antunes Varela:
Antunes Varela, na sua obra "Manual de Direito das Coisas", aborda o tema do abandono de objetos e defende que, para
que possa ser considerado abandono, é necessário que exista a vontade do proprietário em renunciar ao bem. Segundo
Varela, "para que se possa considerar um bem abandonado, é necessário que o proprietário tenha a intenção de o
abandonar" (pág. 245, 9ª edição).

O autor também refere que a falta de utilização do bem por um período de tempo pode ser um indicador relevante para
a caracterização do abandono, mas não é suficiente por si só. Para que se possa concluir pela existência de abandono, é
necessário que existam outras circunstâncias que demonstrem a intenção inequívoca do proprietário em renunciar ao
bem, como o estado de conservação do objeto, a sua localização e as manifestações do proprietário.

Manuel de Andrade:
Manuel de Andrade, na obra "Noções Elementares de Direito Civil" defende que o abandono é uma forma de extinção
do direito de propriedade, que ocorre quando o proprietário deixa o objeto sem uso e sem cuidados por um período de
tempo significativo, com a intenção de se desfazer dele.

No entanto, Andrade faz a ressalva de que a mera falta de uso ou cuidado com o objeto não é suficiente para
caracterizar o abandono. É necessário que haja uma intenção inequívoca do proprietário em renunciar ao bem,
manifestada de forma clara e objetiva. Além disso, o autor salienta que o abandono não é presumido, devendo ser
provado pelo interessado.

Por isso e de acordo com o supramencionado, para se concluir se um automóvel ou outro bem foi abandonado, é
necessário analisar as circunstâncias específicas de cada caso, incluindo o tempo de inatividade do bem, as
manifestações do proprietário, a sua localização e estado de conservação, entre outros fatores relevantes e o período
temporal invocado por Bento não seria suficiente para justificar as suas ações ilícitas.

Relativamente à ação de Bento para aceder ao automóvel: Apossamento: 1263º CC:


Prática de atos materiais: atos físicos necessários à apreensão da tomada de controlo da coisa. Neste caso, Abel
procedeu ao arrombamento da porta do veículo para se apoderar do mesmo.
Reiteração das práticas de atos: José Alberto Vieira concorda com Oliveira Ascensão que a formulação do preceito induz
falsamente a necessidade de uma repetição de atuação material, quando o que está em causa é somente a tomada de
controlo material da coisa, que se pode consumar num ato único. O tempo não é relevante para o apossamento, o que
conta é a intensidade da atuação para criar o controlo material da coisa pelo sujeito.
Aqui, Bento apenas precisou de arrombar a porta uma vez para ter total acesso ao automóvel.
Publicidade dos atos materiais: Bento passa a utilizar o veículo como seu.

Posse de Bento: não titulada, má-fé, pacífica, pública. Neste caso é também formal: o exercício possessório não
corresponde à titularidade do direito, efetiva (controlo material total da coisa), civil (confere a plenitude possessória) e
imediata (não há intermediário).

Assim sendo, deve Abel recorrer a uma ação de restituição, prevista no art.1278º/1. Isto porque enquanto possuidor foi
privado da coisa pelo esbulho (Bento). O corpus possessório é destruído pela intervenção de um terceiro, que concretiza
um desapossamento da coisa, retirando-a da esfera de poder do possuidor.
Tem Abel legitimidade para intentar a ação de restituição pelo artigo 1281º/2, e deverá ser indemnizado por Bento nos
termos do art.1284º.

Tipos de posse:
[art.1252º] Posse Imediata: aquela em que o possuidor pode atuar diretamente sobre a coisa que controla fisicamente
(é nisto que consiste o corpus possessório).
[art.1252º] Posse Mediata: a coisa é detida por terceiro (detentor), que age em nome do possuidor.
Posse Causal: quando o possuidor é simultaneamente titular do direito a que a posse se reporta.
Posse Formal: quando essa titularidade está em falta (ex: apossamento, inversão do título da posse, etc).

Posse Civil: reporta-se a direitos pessoais de gozo, e segue um regime jurídico especí 昀椀 co. Permite atribuir todos os
efeitos possessórios, incluíndo a usucapião.
Posse Interdital: reporta-se apenas a direitos à atribuição das ações possessórias e, eventualmente, de alguns outros
efeitos da posse, mas nunca usucapião.

Posse Efetiva: o possuidor mantém o controlo material da coisa através do corpus possessório.
Posse Não-Efetiva: quando permanece como mero direito desacompanhada de corpus (ex: art.1267º/d).

[art.1259º/1] Posse Titulada: posse que resulta de um facto aquisitivo válido com e 昀 椀 cácia real (propriedade,
usufruto, etc). Presume-se sempre de boa-fé (art.1260º/2) quando resulte de um título (presunção ilidível) e sempre
existente a contar da data do título (1254º/2).
Posse Não-Titulada: posse que resulta de um facto constitutivo (apossamento, etc).
[art.1260º/1] Posse de Boa-fé:
Posse de Má-fé: resulta dos art.1260º/2 e /3.
[art.1261º/1] Posse Pacífica: posse adquirida sem violência, presume-se pacífica para sempre, mesmo que seja
posteriormente mantida com violência.
[art.1261º/2] Posse Violenta: posse adquirida com violência, presume-se violenta para sempre, mesmo que seja
posteriormente mantida pacificamente. Resulta da coação física ou psicológica (nos termos do art. 255º) sobre a pessoa
do possuidor (esta é a opinião de José Alberto Vieira em harmonia com a jurisprudência; existe doutrina que defende
que o património também goza deste preceito).
[art.1262º + art.1263º/a)] Posse Pública: refere-se ao modo que a posse é exercida, e não adquirida. Considera-se
pública a posse que, mesmo desconhecida para os interessados, possa vir a ser conhecida (ex: com recurso ao registo).
Posse Oculta: quando o caráter oculto se encontra associado ao controlo material da coisa (ex: A furta a carteira de D,
que só se apercebe deste facto em casa). Principalmente para a usucapião, se a posse não for pública não pode ser
invocada.

II
Antónia é usufrutuária de uma quinta em Sintra, usufruto que tinha sido constituído a seu favor pelo seu viúvo,
Bento, pai de Carlos e Dário, os quais herdaram a sua propriedade com a sua morte.
Carlos detestava a sua madrasta, decidindo começar a ligar-lhe, dizendo-lhe que ela tinha de abandonar a quinta,
tendo contratado vários marginais para rondar o local durante a noite, para que Antónia temesse continuar a viver no
local.
Antónia, apesar do medo com que ficou, continuou a viver no local, decidindo, porém, pedir conselho ao seu
Advogado como forma de lidar com a conduta de Carlos.
Meses depois, Dário, que tinha ainda maior ódio pela madrasta, decide invadir a quinta com os capangas contratados
pelo irmão, exigindo que esta saísse da casa, o que esta fez, temendo pela sua integridade.
Recomposta do choque, Antónia contacta o seu Advogado, pedindo- lhe que este atue de imediato para recuperar o
acesso à casa.
Carlos e Dário decidiram, após a saída de António, vender toda a produção de maçãs da quinta a Félix.
Quid juris?

Relativamente ao usufruto constituído:


O usufruto em causa é um direito real sobre uma quinta em Sintra que foi constituído a favor de Antónia pelo seu viúvo,
Bento. Segundo o Código Civil Português, o usufruto é o direito real de usar e fruir temporariamente de uma coisa alheia
(art.1439º), podendo ser constituído por contrato ou por testamento (artigo 1440º). O usufrutuário tem o direito de usar
e fruir a coisa como se fosse proprietário, mas não pode dispor dela, nem alterar a sua substância (artigo 1439º 2ª
parte).

Relativamente à atitude de Carlos:


O comportamento de Carlos viola o direito de uso e fruição que foi concedido a Antónia pelo usufruto. Os artigos 1439º
e 1446º estabelecem que o usufrutuário tem o direito de usar e fruir da coisa como se fosse proprietário, mas não pode
dispor dela nem alterar a sua substância. Assim, o comportamento de Carlos, ao ameaçar Antónia e tentar expulsá-la da
quinta, configura uma violação do direito de uso e fruição concedido pelo usufruto, e pode dar lugar a uma ação judicial.
Como Carlos ainda não conseguiu impedir Antónia de ter acesso à quinta e à sua casa, mas está a ameaçar fazê-lo,
Antónia pode intentar uma ação de manutenção (art.1278º/1) na posse para garantir que o seu direito de uso e fruição
concedido pelo usufruto é respeitado e protegido. A ação de manutenção na posse é uma ação judicial que visa proteger
o possuidor de perturbações na posse e na fruição do imóvel.

Dário e os capangas:
O comportamento de Dário e dos seus capangas configura uma invasão da propriedade de Antónia e uma perturbação
grave e ilegítima da sua posse, o que pode dar origem a várias ações judiciais. Antónia pode intentar uma ação de
restituição na posse para recuperar o acesso à sua propriedade, nos termos do artigo 1278º. Esta ação visa restabelecer
o possuidor na posse do imóvel, quando este tenha sido indevidamente privado da posse por outra pessoa. Neste caso,
Antónia poderá alegar que foi expulsa da sua propriedade de forma violenta e ilegal por Dário e os seus capangas.
Art. 1279º - esbulho violento -> não precisa de ir a audiência. CPC: medida cautelar (377º e 378º)

Advogada de Antónia:
O advogado de Antónia deve aconselhá-la a tomar medidas legais imediatas para recuperar o acesso à quinta e à casa.
Isto pode incluir a apresentação de uma queixa-crime contra Carlos e Dário e seus capangas, uma ação de restituição de
posse, uma ação de indemnização pelos danos causados, bem como uma ação de proteção dos direitos fundamentais de
Antónia.

Venda das maçãs:


Esta venda pode configurar uma violação do usufruto de Antónia, uma vez que o usufrutuário tem o direito de usar e
fruir dos bens que constituem o objeto do usufruto.

Assim, o advogado de Antónia pode aconselhá-la a intentar uma ação de restituição de frutos contra Carlos e Dário. Esta
ação permite que Antónia seja restituída dos frutos da quinta que foram colhidos e vendidos pelos seus enteados,
incluindo o valor correspondente às maçãs vendidas a Félix.
Art.1271º - Antónia pode exigir o valor pelos quais os frutos foram alienados e indemnização pelos lucros cessantes
(imaginando que há um contrato celebrado com uma empresa, por exemplo).

Além disso, Antónia pode também intentar uma ação de indemnização por danos e prejuízos decorrentes da violação do
usufruto. Esta ação permite que Antónia seja compensada pelos danos materiais e morais que sofreu em virtude da
venda ilegal dos frutos da quinta.

Embargos de Terceiro
Está previsto no art.1285º, mas todo o regime adjetivo encontra-se nos art.351º a art.359º do Código de Processo Civil.
É um meio de defesa da posse. Por exemplo, um possuidor que veja a coisa por si possuída a ser objeto de uma penhora
no âmbito de execução que em que não é o executado, pode defender-se deduzindo embargos e assim é possível
proteger o titular do direito real ou pessoal de gozo de, por exemplo, um ato de penhora que coloque em causa o gozo
pleno da coisa corpórea.
Ex.: Imagine que A é proprietário, e adquiriu o imóvel ao banco e a este o paga. Na falta de pagamento das prestações, o
banco vende a casa a C. Mas, A tem contrato de arrendamento com B no imóvel em questão. O C quer o B fora. Como o
direito pessoal de gozo do B é anterior à penhora, no caso de C querer uma ação de reivindicação, B pode invocar
embargo de terceiro.

Caso Prático N.º 8


(Usucapião)

António era usufrutuário vitalício da Herdade do Repasto.


O prédio era da titularidade de Bento, que celebrara com António um usufruto, de natureza vitalícia.
António deixou a Herdade do Repasto, rumo a Lisboa, em 1988, nunca mais tendo lá voltado.
Carlos, sabendo do negócio entre António e Bento, e que o primeiro deixara a Herdade do Repasto, decide invadir,
nesse mesmo ano, aquele prédio rústico, tendo passado aí a residir, utilizando, ainda, as diversas máquinas agrícolas
que aí se encontravam.
Entretanto, em 2018, Bento morre, tendo deixado ao seu filho Ernesto, no seu testamento, o direito de propriedade
sobre a herdade, o qual decide reivindicar, junto de Carlos, o direito que herdara de seu pai.
Carlos, sabendo do sucedido, decide, de imediato, apresentar ação declarativa, invocando a usucapião do direito de
propriedade.
Na contestação desta acção, foi junto por Ernesto aos autos, duas notificações judiciais avulsas, levadas a cabo pelo
Advogado de António e Bento, e endereçadas a Carlos, respetivamente, no ano de 2007 e 2016, nas quais solicitava o
abandono imediato da Herdade do Repasto e afirmado a titularidade daquele prédio rústico, nunca o tendo
abandonado, tendo ambos sempre consigo as chaves do imóvel.
Quid juris?

Relativamente ao usufruto:
O usufruto, previsto no art. 1439º, tem um caráter pleno e temporário. O período pelo qual se estende o usufruto tem
como limite legal a vida do usufrutuário (art.1443º), implicando a sua extinção (art.1476º/1/a). Não existe uma real
enumeração de poderes do usufrutuário, logo contamos com uma universalidade de gozo, neste caso, da coisa imóvel, a
Herdade.
Caracterizar a posse de B: titulada, pacífica, boa-fé, civil
Caracterizar a posse de A: titulada (constituída com base no contrato de usufruto), de boa-fé, pacífica (adquirida sem
coação), pública, imediata, causal, efetiva (suscetibilidade da pessoa titular do direito poder usar a coisa quando quiser),
civil.

Relativamente ao não uso:


O aproveitamento compreendido no tipo legal do usufruto abrange, entre outros, o uso.
Neste caso, o usufruto foi celebrado em 1988 e temos a informação que A não retorna à Herdade. Ora, dispõe o artigo
1476º/1/c) que o usufruto se extingue pelo seu não exercício durante 20 anos, independentemente do motivo. Em 2018
completariam 30 anos desde da celebração do negócio entre A e B, portanto A não seria mais considerado usufrutuário,
e a Herdade seria devolvida a B.
*O USUFRUTO EXTINGUE-SE POR NÃO USO (297º e 298º) MAS TEM
QUE SER INVOCADO PELO NU PROPRIETÁRIO. Mas não é relevante para este caso. *

Apossamento:
1263º CC:
Prática de atos materiais: atos físicos necessários à apreensão da tomada de controlo da coisa. Neste caso, Carlos invade
o prédio e apodera-se do mesmo.
Reiteração da prática de atos: José Alberto Vieira concorda com Oliveira Ascensão que a formulação do preceito induz
falsamente a necessidade de uma repetição de atuação material, quando o que está em causa é somente a tomada de
controlo material da coisa, que se pode consumar num ato único. O tempo não é relevante para o apossamento, o que
conta é a intensidade da atuação para criar o controlo material da coisa pelo sujeito.
Aqui, Carlos apenas precisou de arrombar o prédio uma vez para ter total acesso.
Publicidade dos atos materiais: Carlos passa a utilizar a propriedade e as máquinas agrícolas como suas.
Caracterizar a posse de C: titulada, má-fé, pacífica, pública, à luz do art.1267º/1/d), Bento está sujeito a perder a posse
para Carlos.

Sucessão de Ernesto:
Pelo artigo 1255º, Ernesto enquanto sucessor de Bento passa a possuidor com a sua morte.

Alegação de usucapião por parte de Carlos:


São 3 os requisitos estabelecidos legalmente para a usucapião:
Uma posse "boa": a posse pública e pacífica referida no ar.1297º, e contínua e ininterrupta* (VER ART. 326º EXCEÇÃO),
como retirado da expressão "mantida por certo lapso de tempo" do art.1287º.
Fixação da duração da posse necessária: neste caso, não existe registo de título, logo aplicar-se-ia o disposto no art.
1296º. Assim, e há luz do artigo 1260º/2, visto que a sua posse não era titulada presume-se de má-fé e por isso, já teria
ultrapassado o prazo maior de 20 anos para a usucapião.
Invocação pelo possuidor: art.1292º + art.303º.

Relativamente a 2007 e 2016:


Notificação judicial avulsa: propósito de interromper a prescrição (o prazo); evita a prescrição e a caducidade. Não
podem ser contestadas. Efeito: interrupção instantânea.

Interrupção da prescrição: artigos 323º/1, 326º/1 e 327º. O prazo começa a decorrer no dia seguinte.
Caso diferente seria uma ação de defesa da posse: o prazo conta a partir do trânsito em julgado.
Em 2018, só teriam passado dois anos logo o C não poderia invocar a usucapião.

Relativamente às máquinas agrícolas: se considerássemos sujeitas a registo, aplicava-se art.1298º/b). Senão, caía no
âmbito do art.1299º. De ambas formas, podia usucapir, pois, ambos os prazos foram ultrapassados e a notificação
judicial avulsa enviada não fazia qualquer menção às máquinas.

Dúvida para o professor:


“Se a usucapião se refere ao direito de propriedade, porque a posse do usucapiente se exerceu nos termos desse direito,
a propriedade anterior que incidia sobre essa coisa, extingue-se no momento em que a usucapião produz o seu efeito
aquisitivo. Assim, verifica-se um efeito extintivo para B.”
R.: O que aconteceria por exemplo no caso em questão, se não se verificassem notificações ou ação de defesa da posse.

Quando o direito usucapido é um direito real menor (usufruto, superfície, servidão predial), a usucapião não determina
a extinção do direito de propriedade existente, mas apenas a sua oneração.
R.: A título de exemplo: uma senhora que à 30 anos leva o seu gado a beber água (servidão) num terreno vazio cujos
donos não aparecem à décadas. Com a morte do proprietário, o filho que herda dito terreno pretende impedir a senhora
de utilizar a água. Ora, como a mesma andou anos publicamente e pacificamente, contínua e ininterruptamente a servir-
se daquelas águas, pode invocar a figura da usucapião da utilização das águas. Sem qualquer registo, a prova
testemunhal dos vizinhos que observam aquela senhora desde sempre chega para suportar a sua invocação.

Registo de Mera Posse [art.1295º]


Tem como função permitir ao indivíduo que tem o uso da coisa, o registo da sua posse, num limite temporal menor que
a usucapião.

Ex.: Abel invade terreno vazio pertencente a terceiro falecido sem herdeiros. O Estado ainda não se apossou do bem.
Abel, passado 5 anos, podia registar a sua mera posse (art.1295º/2 remissão para o art.116º do Código do Registo
Predial).

Caso Prático N.º 9


(Acessão)
António, camponês analfabeto, decide tentar a sua sorte em Lisboa, no ano de 2015.
Quando chega à capital, António fica instalado na moradia da sua tia, arranjando trabalho.
António, decide então construir, nesse mesmo ano de 2015, uma pequena casa improvisada em tijolo para si, num
terreno vazio que se situava ao lado da moradia da tia e que, segundo esta, estava abandonado há mais de 30 anos.
Uma vez que o salário de António era parco, este decide plantar algumas árvores de frutos para ajudar no seu
sustento, utilizando sementes que surripiou da sua tia, sem esta saber.
Aquando das escavações para fundar os alicerces da sua nova casa, António encontrou um saco com diversas pepitas
de ouros que vendeu, em seguida, num antiquário da Baixa de Lisboa, aplicando, integralmente, o valor recebido na
compra dos restantes materiais de construção da sua nova casa.
Um ano depois, informado por vizinhos de António da nova construção, Bento dirigiu-se à casa construída, munido da
certidão do registo predial que comprovava ser ele legítimo proprietário do terreno, dizendo a António que aquele
terreno era seu, que tudo o que lá se encontrava lhe pertencia, e que António teria que abandonar o imóvel de
imediato.
António recusou-se a sair do imóvel, dizendo que aquele terreno estava claramente abandonado quando iniciou a
construção, que aquela casa fora construída com o seu suor e que era sua por direito.

Quid juris ?

BENFEITORIAS ≠ ACESSÃO:
A jurisprudência dominante segue a doutrina de Pires Lima/ Antunes Varela, na qual se afirma que pese embora haja
semelhança entre ambas figuram nomeadamente no benefício material para a coisa; a benfeitoria verifica-se quando o
melhoramento é feito por alguém com vínculo jurídico ou relação com a coisa, ao passo que, a acessão é um fenómeno
que vem do exterior, de uma pessoa sem contacto jurídico com a coisa.

No caso em apreço, A tomou a iniciativa de construir uma casa, de tijolo, num terreno alheio, tendo feito obras no
mesmo. Atendendo que sendo a casa e as obras de A e o terreno alheio, aplica-se o disposto do art.1325, na medida em
que os pressupostos deste regime da acessão estão preenchidos: a propriedade de A une-se e a coisa que não lhe
pertencia, mesmo que o terreno tivesse abandonado há 30 anos - como o caso não especifica o tipo de posse que o
dono teria sobre o terreno.
A acessão vem prevista no art.1317º/d) como um facto aquisitivo da propriedade, e pelo art.1325º dá-se quando a coisa
que é propriedade de alguém se une e incorpora outra coisa que não lhe pertencia.
Para José Alberto Vieira, a acessão pressupõe em regra a verificação
cumulativa de dois requisitos:
1º requisito: explícito no art. 1325º - a união ou mistura de duas (ou mais) coisas;
2º requisito: implícito - a inseparabilidade da coisa resultante da união ou mistura de duas (ou mais) coisas autónomas.
Tipos de acessão:
Industrial: resulta da ação humana, constituindo numa situação de união. Está-se perante uma acessão industrial
imobiliária, sendo que respeita a coisas imóveis.
Intencional: a única é resultado de uma ação humana e a ela é dirigida e não como resultado fortuito de uma ação
humana com outro fim.
Vertical: situação em que se constrói algo sobre o solo.
Neste caso, caímos sobre a segunda parte do nº 1 do art.1326º, pelo que a acessão resultou por facto de homem, sendo
assim uma acessão industrial. Esta, conta com duas distinções pelo nº2 do mesmo artigo, influenciada pela natureza das
coisas em questão. Tanto a plantação feita por António, como a habitação por si erguida pertencem à subseção IV,
referente à acessão industrial imobiliária.
Assim, resta questão de saber a quem os materiais utilizados na obra pertenciam. Posto ato, é sabido que parte dos
materiais provinham do salário de A, contudo provinham também das pepitas de ouro que este descobriu no terreno,
sendo que estas, pelo disposto do art1324, se constituem como tesouro, atendendo que este ouro estava enterrado no
terreno, segundo o artigo supramencionado, A tornar-se-ia proprietário de memorado do achado, sendo que o restante
seria do proprietário do terreno. Quanto a esta questão, A tinha a perceção que o terreno estava abandonado há mais
de 30 anos, pelo que se aplica o n2 do artigo: A não teria de denunciar às autoridades, podendo adquirir imediatamente,
concluindo isto, consideram-se que os bens eram de A, condenado aplicar o regime da realização da obra própria em
terreno alheio, com materiais próprios.
Correção: o n2 do art 1324.º: tem muito pouca relevância no tráfego jurídico porque não é algo que acontece
regularmente, para anos falar que é muito difícil de se saber, em concreto, há quanto tempo é que um tesouro foi
enterrado/escondido. Por isso, convém sempre aplicar primariamente o n1 e abrir a hipótese do n2.
Discussão sobre a questão da boa ou da má fé de A ao construir o imóvel no terreno abandonado:
AULA: QUESTÃO DA BOA FÉ: a ordem jurídica impõe deveres de cuidado aos sujeitos: em que o sujeito tinha que
consultar o registo
JAV + ML: na boa fé do autor da construção estamos perante uma convenção subjetiva ética: ou seja, exigia-se que A
estivesse sob um estado de desconhecimento desculpável do direito alheio; o sujeito não pode ter um conhecimento
culposo
MC: não estaria de boa fé
No caso concreto, considerando que A viu um terreno abandonado ao lado do terreno da tia, tendo questionado se o
mesmo estava vazio, obtendo Resposta positiva. NOTA: A era analfabeta: este iria necessitar de ajuda de 3.º para
acetificado do registo predial daquele terreno. Assim, A estaria de boa fé, adquirindo o direito de acessão dependendo
do valor que a obra trouxe à totalidade do terreno de B: 1340/1, A adquire a propriedade, pagando o valor que o terreno
tinha antes das obras
Boa fé: disposto no n4: neste caso, A tinha como conhecer indo ao registo. Estava de má fé.

NOTA: imaginando que seria de má-fé: 1341.º: a obra seria desfeita, acartando com os custos. Se quisesse, poderia de
ficar com a coisa para sim, tendo de indemnizar no valor da obra.

Acessão automática: Antunes Varela + Pires Lima: sentido literal do 1339 +1340
JAV+ AO: potestativa –do quando os donos do terreno pagassem o valor da indemnização se quisesse ficar com a coisa.

Sementes e plantas : não está preenchido a inseparabilidade no sentido normativo postulado porque existe um dano
irreparável em caso de separação.
1342/1: Sementeiras são feitas com materiais alheios, que é o caso porque eram a tia dele, em terreno alheio: aplica-se
o disposto do n1, que remete para o 1340°: a tia de aa poderia este mecanismo. Atendendo que o valor da planta é
menor ao valor do terreno, está tem direito à indemnização no valor que tinham ao tempo da incorporação, estando de
má ou boa-fé

Relativamente à boa ou má-fé de António face à titularidade do terreno:


A informação que temos relativamente a António é que é uma pessoa analfabeta, e por isso presume-se com estudos
insuficientes para duvidar da palavra da tia, uma fonte para ele de confiança.
Acreditando este que o terreno estava realmente abandonado e que, por isso, disponível para António usar como
entendesse é possível averiguar que este não só tinha desconhecimento que o terreno era alheio (requisito de boa-fé
previsto no art.1340º/4) como este desconhecimento era desculpável (requisito necessário pela doutrina de JAV e MC).

Relativamente à plantação:
António não só a faz em solo alheio como utiliza sementes de terceiro também, neste caso, da sua tia. Ora, dispõe o
art.1342º/1 que serão atribuídos aos donos das sementes os direitos conferidos ao autor da incorporação previstos no
1340º, independemente da boa ou má-fé do último.
Assim, não sendo António proprietário do terreno nem das sementes, não vai beneficiar dessa acessão. Os direitos
fornecidos à tia iam respeitar os termos do art. 1340º/1, pois a plantação valorizou o terreno, que era outrora baldio.

Relativamente à habitação:
Relembrando que António estava de boa-fé, caímos novamente no escopo do art.1340º/1; sendo que este deve pagar o
valor do terreno a Bento que este tinha antes da habitação, mas não adquire assim imediata propriedade do mesmo. Tal
só acontece após a manifestação de vontade e após o pagamento de indemnização a Bento, ao contrário da acessão
natural, em que o facto aquisitivo da propriedade acontece automaticamente.
António, enquanto beneficiário da acessão, deve exercer o seu direito potestativo, se assim desejar, e proceder ao
pagamento da indemnização legal. Apenas aí passará a ser proprietário, verificando- se o facto (1316º e 1317º/d).
Ora, tendo em conta que o terreno passa a ser seu, António pode pagar à tia o valor das sementes bem como pagar
indemnização caso haja lugar (que não penso que haja?) adquirindo assim os materiais que usou, as sementes.

Relativamente ao ouro que António encontrou:


Na parte que toca ao saco com pepitas de ouro, podemos afirmar que estamos perante uma aquisição de tesouro,
prevista no art.1324º. Inseridas no artigo mencionado, distinguem-se duas hipóteses, sendo que a relevante para a
questão atual é aquela na qual o achador (António) não tem como saber quem é o proprietário pois julga o terreno
abandonado há mais de 30 anos. Contudo, nesta situação importa diferenciar dois cenários, sendo o pertinente para
este caso aquele em que o achador julga o tesouro encontrado há mais de 20 anos. Ora, assim sendo, fica o achador
livre de seguir o determinado no art.1324/2 e com a apreensão material do ouro, dá-se a aquisição automática por parte
de António.

Dúvida para o prof:


Não há qualquer consequência pelo facto de a habitação ter sido construída com materiais obtidos pela venda do ouro
encontrado? Não, os materiais que obteve são seus, e não de outrem.

Certidão predial:
Esta certidão, emitida em papel, faz prova da situação jurídica de um imóvel no momento em que é emitida. Reúne e
descreve os registos em vigor que dizem respeito àquele prédio.

A certidão de registo predial comprova, por exemplo, a quem pertence o imóvel e se existem encargos sobre ele.

Caso Prático N.º 10


(Efeito Atributivo do Registo)

I
António decide vender a sua moradia da Lapa a Bento, em novembro de 1988, tendo sido lavrada escritura pública.
Bento era emigrante e apenas pretendia ir viver para a moradia, quando se reformasse, não tendo o facto aquisitivo
sido registado.
António decide constituir, em dezembro de 1988, um usufruto oneroso a favor de Carlos, relativamente à moradia da
Lapa, tendo Carlos, por contrapartida, lhe dado uma tiara de diamantes. Carlos regista o facto aquisitivo a seu favor,
passando a residir no imóvel.
Em 2021, Bento regressa a Portugal para gozar a sua reforma, vendo que Carlos residia no imóvel, decidindo, de
imediato, intentar uma acção de reivindicação contra este.

Quid juris?

O negócio celebrado entre António e Bento caracteriza-se como um contrato de compra e venda, previsto no art. 874º
CC. Dispõe o art. 875º CC que a validade do contrato em causa depende da celebração de escritura pública ou
documento particular autenticado. Temos indicação que tal requisito se encontra verificado e de acordo com o
art.879º/a), na realidade substantiva Bento é o legítimo proprietário do direito real sobre o imóvel. Contudo, prevê o
art.2º/1/a) do Código do Registo Predial que estão sujeitos a registo, entre outros, os factos jurídicos de aquisição de
propriedade, o que não se verificou.
Um mês depois da celebração do negócio supramencionado, António celebra com Carlos um usufruto oneroso
(1439ºCC), e, como previsto pelo artigo 2º/1/a), regista o facto aquisitivo a que este está sujeito.
A regra-geral abordada pelo professor José Alberto Vieira consagra que a ordem substantiva prevalece sobre a ordem
registral, o que significaria, à primeira vista, que o direito de Bento prevaleceria.
Contudo, e em conformidade com o art.1º do Código do Registo Predial, a função do registo tem como destino essencial
publicitar a situação jurídica do prédio, conservando a segurança do comércio jurídico imobiliário. Desta forma, há uma
valorização da fé pública registral, protegendo assim, por exemplo, um terceiro que confia na aparência suscitada pelo
registo e vem posteriormente a praticar um ato de aquisição de um direito real com quem afinal não é o titular.
Assim, dispõe o art.5º/1 que os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiro depois da data do respetivo
registo, e, por sua vez, o nº4 do mesmo artigo define terceiros, para efeitos do registo, aqueles que tenham adquirido de
um autor comum direitos incompatíveis entre si. A este fenómeno denomina-se de aquisição tabular, e contém quatro
preceitos onde se pode verificar.
Relevante para este caso, é a situação já mencionada do artigo 5º do Código do Registo Predial, que conta com alguns
requisitos:
Pré-existência de um registo desconforme à realidade substantiva (verificamos este requisito pois sem o ato registral de
Bento, é António que consta no registo);
Ato de disposição praticado com base nesse mesmo registo (António, titular inscrito, e por isso goza de presunção de
titularidade pelo art.7º do Código do Registo Predial e de legitimidade registral pelo 9º/1 do Código do Registo Predial);
Boa fé do terceiro (Desconhecendo outra realidade senão a do registo predial, acredita António como titular legítimo do
direito real do prédio);
Caráter oneroso do negócio jurídico realizado com o terceiro (Carlos tem como contrapartida a entrega de uma tiara de
diamantes, e por isso, o negócio não é gratuito, como seria, por exemplo, uma doação);
Que o terceiro registe a sua aquisição antes do titular do direito real na ordem substantiva (Carlos regista o facto
posteriormente à celebração do contrato, e Bento nunca o faz).
Assim, estão reunidos todos os critérios para a aplicação da aquisição tabular com base no artigo 5º do Código do
Registo Predial, e Carlos adquire tabularmente o direito real em causa.
O que acontece então ao direito de Bento?
Menezes Cordeiro desenvolveu a teoria dos "direitos reais naturais", na qual direitos com natureza real que, em
determinadas circunstâncias, nomeadamente aquisição tabular, ficariam sem oponibilidade. Ou seja, defende que o
direito de Bento não se extinguiria e admitia-se uma situação de inoponibilidade em sentido próprio.
José Alberto Vieira, por sua vez, não concorda com tal opinião pois acredita que vai contra certo princípio dos direitos
reais, tais como: o princípio da inerência (direitos reais são direitos inerentes a uma coisa, ora se este se encontra
atribuída ao adquirente tabular em termos de propriedade, então explicar a inerência da propriedade inoponivel), da
tipicidade ficando todo o aproveitamento da coisa suspenso, teríamos uma propriedade atípica) e da oponibilidade
absoluta.
Assim, defende a extinção do direito real incompatível, aplicando-se a todos os casos em que o direito adquirido
tabularmente e o direito sacrificado tenham a mesma natureza. Por isso, prevaleceria o direito de usufruto de Carlos,
mas a propriedade passaria a Bento, que
Por referência ao caso acima referenciado, imagine agora que Carlos tinha adquirido o imóvel em venda executiva
(depois da penhora da moradia em virtude das dívidas de Carlos). Qual seria a sua resposta ao caso ?

Venda executiva: bem penhorado.


A realidade registral não plasma a realidade substantiva.

Na maioria da doutrina, não concordam que C é 3º porque não é autor comum, mas sim o tribunal. Mas se o C for
considerado desprotegido, só podia intentar responsabilidade civil contra B, que não registou o facto aquisitivo.
A doutrina que o prof concorda: o tribunal é um veículo" para concretizar a venda, mas do ponto vista da
transmissibilidade do direito, este é transmitido da esfera jurídica do A para o C, nunca passando pelo estado. Autor
deve ser entendido como transmitente. Negócio corporizado num processo executivo.

Por referência ao caso acima referenciado, imagine agora que Bento sempre residira no imóvel desde novembro de 1988
e que Carlos registara, também o seu facto aquisitivo.
Qual seria a sua resposta ao caso ?

Como B sempre residira no imóvel e já passaram 33 anos, podemos estar perante uma situação de usucapião contra
registo (usucapio contra tabulas) -> 5º/2??
Conclusão, 1296º usucapião prevalece sobre tudo, incluindo registo.

II
Abel, que cuidava de Berta, interditada por anomalia psíquica de 1990, decide levar a cabo uma tramoia para passar a
propriedade do palacete do Estoril a seu favor.
Para tal, decide ir ter com Carlota, notária em Cascais, que lavra uma escritura para o efeito, sem o conhecimento de
Berta, tendo o facto aquisitivo sido registado a favor de Bento.
Bento, em 2015, acaba por vender o imóvel a Daniel.
Em 2018, Berta morre, tendo deixado todos os bens a seu único sobrinho, Ernesto.
Ernesto, que nunca se dera com a sua tia, mas sabendo da existência do Palacete do Estoril, decide investigar o que se
passou, acabando por descobrir a tramoia perpetrada por Abel.
Ernesto, decide, de imediato, requer a nulidade do contrato de compra e venda entre Berta e Abel.

Quid juris ?

Registo de Bento é nulo, 16/a) CRP. Ernesto pode invocar quer o art.291ºCC quer o art.17º/2 CRP.

O Regime do Registo Predial

Eu publicito a propriedade do meu computador utilizando-o -> publicidade espontânea, exercício possessório.
VS. Publicidade organizada: resulta do registo predial. Como primeira noção de publicidade podemos dizer que esta é
operação, ato ou o efeito de tornar público ou dar a conhecer ao público determinada situação jurídica ou ato com valor
real (?). Existem várias situações sujeitas a registo: pessoais (registo civil, por exemplo), reais (registo predial, automóvel,
etc.). Factos jurídicos que constituem os direitos reais estão sujeitos a registo.
Objetivo: dar conhecimento aos terceiros interessados; situação jurídica real presente no registo -> SEGURANÇA
JURÍDICA (1º CRP). Assim sendo, ao consultar o registo conseguimos ver quais são os direitos reais de gozo que incidem
sobre determinado prédio. Ao consultarmos o registo somos terceiros de boa-fé. Nem todas as coisas corpóreas são
objeto de registo predial - 204ºCC. Por motivos de segurança, algumas dessas mencionadas no artigo são sujeitas a
regime próprio. Bonifácio Ramos: regime das coisas móveis -> ideia, mas não existe?
Objeto do registo: constituído pela inscrição ou averbamento de factos jurídicos e não por situações jurídicas, sendo
certo que são os factos jurídicos concretos que dão origem à constituição, modificação ou extinção dos direitos reais.
NÃO SE REGISTAM DIREITOS, REGISTRAM-SE FACTOS JURÍDICOS CONCRETOS.
Factos jurídicos sujeitos a registo: adquire a propriedade com facto jurídico (compra e venda, doação, usucapião,
testamento, dação em cumprimento, contrato permuta, expropriação). O registo predial português é público e real, e
não privado e pessoal, pois é organizado por uma entidade pública e no que diz respeito à natureza do prédio resulta a
sua inscrição pública (base real -> todo o histórico de cada prédio, diz respeito ao prédio e não ao titular do prédio).
3 MODALIDADES DE ATOS DE REGISTO:
Descrição predial - tem como objetivo a identificação física, económica e fiscal dos prédios (79º/1 CRP). Ex.: área do
prédio, rústico ou urbano. 79º/2 - descrição de cada prédio, com base numa ficha de registo ordenada por freguesias
acompanhada com a data de apresentação; cada facto registado tem uma data de apresentação. Dependem de uma
inscrição ou averbamento (art.80º), execuções (81º)
Inscrição - é o ato mais importante do registo, é a que vai permitir regular a situação jurídica do prédio (91º/1). pode ser
definitiva (?) ou provisório (73º+92º).
Averbamento – a inscrição, servem para completar, restringir ou atualizar uma inscrição já existente e são lançados na ?
a que respeita (100º/1 e /4). Ex.: aumento de hectares de um prédio.
A inscrição predial é sempre alicerçada a factos jurídicos e para que seja promovido o registo deve existir o título (43º).
Ex.: contrato de doação, permuta, compra e venda, etc.
Legitimidade registral: 36º CRP. ex.: compradores do imóvel, credores que sabe o devedor tem móvel a sua titularidade
que não registou para que este não fosse penhorado.
Princípios orientadores do CRP:
Legitimação registral: cabe-lhe o disponente a inscrição a nosso favor (9º CRP remete para o 54º/2 Código do notariado),
caso haja transmissão sem inscrição prévia, não invalida logo o negócio jurídico (OA).
Instância: contrapõe-se a um sistema de registo oficioso (41º) ou seja, regra geral o registo tem que ser feito por uma
parte.
Tem que ser articulado com o art.36º
Prioridade: 6º crp. Aplica-se a direitos reais de garantia (ex.: hipoteca) não se aplica a direitos reais de gozo
? 9+7º crp. efeito presuntivo do registo
trato sucessivo: resulta do art.34º, e tem como objetivo o conservador e não o titular. consequência da legitimação
registral. impõe que haja uma retratação histórica do prédio (todas as inscrições e averbamentos)
Escrita de justificação notarial: ?
obrigatoriedade: resulta do art.8º-A, e tem normas que não resultam da versão originária, mas da reforma de 2008, em
que os factos passaram a ser obrigatórios a registo, mas não há consequência jurídica da ausência desse registo, mas sim
o pagamento do valor em dobro o registo; ou então aquisição tabular caso se verifique.

Efeitos do crp:
1º enunciativo - inscrição do fato do registo e que dá ao seu inscrito a consolidação do seu direito
2º constitutivo - exceção: resulta de casos de direitos reais de garantia (hipoteca) tem que existir o registo do facto
aquisitivo para que a hipoteca nasça.
3º consolidativo - a nossa posição solidifica-se. 4º atributivo: aquisição tabular

3º para efeitos do registo:


teoria ampla de 3º: guilherme moreira - todos aqueles que tivessem adquirido um direito incompatível independemente
do autor ser ou não comum.
teoria restrita de 3º: Manuel de Andrade - para efeitos de registo, são todos os que adquirem o direito incompatível de
um autor comum.
Acórdão uniformizador de jurisprudência: fixou o sentido de um determinado conceito: 1º 1997 concordou com a
ampla, depois 2º 1999 inverteu a posição concordando com a restrita (aditamento do nº4 do art.5º CRP).

3º para efeitos do registo:


Carvalho Fernandes:
Defende que o 3º deve só estar de boa-fé, não sendo necessário onerosidade.

Escola de Coimbra:
Entende que não é necessária onerosidade nem boa-fé, apenas registo prévio.

Santos Justo:
Parece inclinar-se para a tese da boa-fé.

Caso Prático N.º 11


(Propriedade)

I
António comprou um terreno urbano em Mértola a Bártolo com o objetivo de construir quatro pequenas moradias
que pretendia arrendar a terceiros, tendo o vendedor garantido a possibilidade de construção nestes termos, uma vez
que um funcionário da Câmara Municipal de Mértola lhe havia transmitido essa informação.
Para se salvaguardar António consagrou uma cláusula no contrato de compra e venda, no qual previa que se a Câmara
não deferisse o projeto de construção, o negócio ficava sem efeito.
Quando deu entrada do respetivo licenciamento, António apercebeu- se de que apenas podia construir duas
moradias, pretendendo reverter o negócio.
Entretanto a Câmara Municipal de Mértola decide expropriar, por utilidade pública, o terreno de António, uma vez
que os casos de Covid estavam a aumentar no município e necessitavam de um espaço para albergar doentes.
Quid juris ?

A propriedade é um direito real de gozo que afeta todos. 1305.º - direitos do proprietário. Poder de uso, fruição e
disposição (concretizado por B – enquanto poder de alienação).

Disposição com celebração de clausula resolutiva – manifestação de autonomia privada e permitido com base nesse
princípio.

Expropriação – 1308.º + indemnização – 1310.º.

Atuação da camara municipal de Mértola – princípio da proporcionalidade enquanto maneira de restringir a


propriedade. Como havia necessidade temporária, e a expropriação extingue de forma definitiva o direito de
propriedade, a medida era desproporcional – medida desnecessária.
Bastava que houvesse uma requisição – forma de restituição temporária do direito de propriedade que vigora em
momentos de necessidade pública.

II

Madalena, aproveitando que o seu marido Tiago não estava em causa, decide colocar no contentor do lixo uma
cadeira estilo Luís XIV, que esta detestava.
Bento, vizinho do casal que estava a passar no local, no momento em que Madalena se deslocou ao mesmo, decide de
imediato levar a cadeira consigo para casa.
Tiago, quando chegou a casa, verificou que não tinha a sua cadeira no escritório, pedindo explicações à esposa, tendo
Madalena referido que estava farta de antiguidades, que havia colocado a cadeira no lixo e que a mesma já estava em
casa de Bento.
Atendendo à explicação, Tiago pretende recuperar a sua cadeira, recusando Bento a devolução daquele objeto, uma
vez que havia encontrado a cadeira no lixo.

Quid juris ?

Abandono é uma forma de renuncia do próprio direito de propriedade – abandono do direito de propriedade. No caso
não há legitimidade por parte de M, por isso B não pode ocupar. A aquisição é de T e não de M.
1311.º - reivindicação. Res nulius – coisas adquiridas por ocupação – móveis. Não se adquire por ocupação coisas
imoveis.

III
Abel, proprietário de uma indústria metalo-mecânica sita na Rua da Palma, n.º 2, labora, diariamente, incomodando o
vizinho do prédio da Rua da Palma, n.º 9, Bento, que em virtude de padecer da síndrome do ouvido irritável, não
consegue estar descansado em casa.
Bento, pede que Abel cesse de imediato aquela situação, o que Abel recusa dizendo que os decibéis de ruído
produzido estão dentro dos padrões legais e que ele tem licenciamento para o efeito.

Quid juris ?

Art. 1346.º - a coisa tem que estar numa proximidade para que a emissão de fundo ou afins afete o outro prédio

Propriedade – direito real de gozo por excelência

Cada direito real de gozo tem autonomia per si. O regime da propriedade é o regime base da grande maioria das
matérias dos direitos reais menores.

O direito de propriedade concede um conteúdo mais intenso dos que os outros - 1305.º.

Caso Prático N.º 12


(Comunhão dos Direitos Reais)
I
António, proprietário de um prédio rústico, decide constituir um usufruto gratuito e vitalício a favor dos seus quatro
netos: Beatriz, Carlos, Dário e Elisa, em maio de 2017.
O prédio produziu, no final de junho de 2017, uma tonelada de maçãs, que Beatriz destinou, integralmente, à sua
unidade de produção de sumos de fruta, sem o conhecimento dos demais usufrutuários.
Em agosto de 2017, dá-se uma reunião entre os usufrutuários, com o objetivo de decidir se o muro do prédio deveria
ser pintado.
Beatriz e Carlos queriam que o prédio sofresse tal obra, contrariamente a Dário e Elisa.
Beatriz diz que o prédio será pintado, em virtude de a sua quota no usufruto ser de 70%, conforme resultara de uma
carta escrita pelo Avó António, e que todos tinham conhecimento.
O prédio acabou por ser pintado.
Em outubro de 2017, Beatriz, decide proibir Dário de entrar no prédio mudando a fechadura e alegando que este não
havia liquidado a sua parte nas despesas do IMI.
Posteriormente Elisa, que se pretendia “livrar” da família, decide alienar o prédio a Félix, forjando três procurações de
Beatriz, Carlos e Dário, nas quais lhe eram dados os poderes necessários para vender o prédio.
O negócio é celebrado entre Elisa e Félix do Cartório Notarial do Campo Grande.
No mesmo do negócio acima indicado, Carlos decide ainda doar o seu direito real de gozo a favor de Zacarias, seu
filho, em segredo total.

Quid juris ?

Relativamente aos efeitos do usufruto:


A comunhão pode resultar dos mesmos factos jurídicos que desencadeiam a constituição dos vários direitos reais, tais
como por factos jurídicos negociais, incluindo o usufruto. António, ao constituir usufruto a favor dos seus quatros netos,
está a atribuir o mesmo direito real sobre a mesma coisa a cada um deles, ou seja, cada comunheiro será titular de um
direito independente dos demais, com a particularidade deste direito partilhar o seu objeto com outros direitos reais da
mesma espécie (art.1403º/2 1ª parte e art.1405/1 1ª parte).

Relativamente às maçãs:
Cada comunheiro tem uma posição quantitativamente determinada na comunhão, denominada de quota, à qual a lei
associa certos efeitos, nomeadamente a posição do comunheiro. Na opinião de José Alberto Vieira, Pires de Lima e
Antunes Varela, a indicação do valor da quota não tem de ser expressa, contudo, presumem-se quantitativamente iguais
na falta de indicação em contrário no título constitutivo (1403º/2 2ª parte). Não me parece que a carta em que o Avô
escreveu que atribuiu 70% a Beatriz seja válida pois não pertence ao título constitutivo. (PROF: se o usufruto fosse
oneroso, quem pagava mais ficava com maior quota).
Frutos naturais - cíclicos da coisa. Beatriz não podia. Responsabilidade civil: danos sofridos e lucros cessantes.
1405º - cada comunheiro tem direito aos frutos da proporção da sua quota. Beatriz deveria ter informado os restantes
comunheiros da sua pretensão.
Prof (concorda com o Mota Pinto):
Poderes individualizados: pode exercer sem autorização dos demais consortes
Poderes maioritários: consortes têm que decidir.
Poderes unanimes: poderes que são concretizados através do acordo unânime de todos os consortes (ex.: venda integral
do bem).

Relativamente ao muro:
1407ª - não havia dupla maioria. Recorrer para o tribunal (nº2).
O muro poderia ter sido pintado? Não, mas foi. Qual consequência? Como não havia a maioria necessária, os consortes
que avançaram na pintura, deviam pagar a pintura, e não os que não queriam, pois, o contrato é nulo e não podia ser
utilizado contra os outros consortes.

Proibição de Beatriz a Dário:


1406º - regra geral, todos os comunheiros tem uso comum da coisa. Encargos e despesas: 1474º + 1405º/1 2ª parte. O
Dário tem que pagar o IMI. Mas o facto de ele não ter pago atribui a Beatriz legitimidade para o proibir? Não. A restrição
do uso não é permitida, mesmo que os comunheiros não estejam a cumprir as suas obrigações. O que Beatriz poderia
realmente fazer para Dário pagar? Se ela pagasse por ele, iria ter direito de regresso, podendo penhorá- lo. Seria uma
situação de esbulho, e Dária podia intentar uma acção de reivindicação ou não sei que da possa?
Procurações forjadas de Elisa:
1408º - Elisa podia onerar a sua própria quota, mas os comunheiros gozam de direito de preferência (1409º - prof:
interpretação ampla: qualquer negócio jurídico oneroso). Segue o regime da ação de preferência do art.1410º

Em relação ao Zacarias:
Negócio jurídico gratuito: não exige direito de preferência.

PROF:
A comunhão no nosso ordenamento jurídico é de transição e temporária. Ação de revisão de coisa comum: regime do
art.1412º que remete para ação especial prevista no CPC. Os comunheiros podem a todo o tempo exigir a coisa,
excetuando se tratar de coisa ? Esta situação não significa que a coisa tenha que ser divisível. Licitação em tribunal:
terreno dos sobreiros, ou ? Direito de divisão.

II

Distinga comunhão de matriz romana de comunhão de matriz germânica e indique concretas situações em que este
tipo de comunhão se verifica no tráfego jurídico português.

A comunhão de matriz romana é a atualmente adotada como modelo- regra no ordenamento jurídico português, ao
contrário da matriz germânica, também conhecida como comunhão de mão comum. No
modelo germânico, o património em causa pode ser composto tanto por outras coisas corpóreas como por outros bens,
não estando sujeito a quotas, retirando dos comunheiros a opção de dispor da sua posição, seja por vontade própria seja
por consentimento geral. Contudo, não implica que a coisa em comunhão não possa ser objeto de disposição, total ou
parcialmente, por todos os comunheiros.
Encontramos no Direito português referências à comunhão de mão comum quando estamos perante as três situações
seguintes: comunhão conjugal resultante de um casamento em regime de comunhão de bens (geral ou adquirido),
comunhão hereditária e na sociedade civil sem personalidade jurídica (havendo personalidade jurídica, os bens não
estão em comunhão, não havendo risco de confusão).
Explicando cada um com mais detalhe e exemplificando:
A comunhão conjugal resultante de um casamento em regime de comunhão de bens é uma das situações em que se
aplica a comunhão de mão comum em Portugal. Nesse caso, todos os bens adquiridos após o casamento são
considerados bens comuns do casal, a menos que haja um acordo pré-nupcial que estabeleça o contrário. Dessa forma,
tanto os bens móveis quanto os imóveis adquiridos durante o casamento são compartilhados pelos cônjuges.

Por exemplo, suponhamos que um casal esteja casado em regime de comunhão de bens e adquira um apartamento
após o casamento. Nessa situação, o apartamento será considerado um bem comum do casal, pertencendo a ambos os
cônjuges na proporção de 50% cada.
Outra situação em que encontramos a comunhão de mão comum é na comunhão hereditária. Quando ocorre o
falecimento de uma pessoa e seus bens são deixados para herdeiros, esses bens passam a ser comuns entre os herdeiros
até que a partilha seja realizada. Durante esse período, os herdeiros têm direitos indivisos sobre os bens e são
considerados como estando em comunhão de mão comum. A partilha dos bens definirá a proporção em que cada
herdeiro terá direito a cada bem.

Por fim, nas sociedades civis sem personalidade jurídica, os bens dos sócios podem estar em comunhão de mão comum.
Isso ocorre porque, nesse tipo de sociedade, não há separação patrimonial entre os sócios e a sociedade. Assim, os bens
adquiridos ou utilizados pela sociedade são considerados como estando em comunhão de mão comum entre os sócios.
É importante observar que, se a sociedade possuir personalidade jurídica, os bens não estarão em comunhão, pois a
sociedade é uma entidade jurídica separada dos sócios.

Podemos apontar duas principais razões para a adoção da figura da comunhão no ordenamento jurídico, sendo estas:
históricas (a influência que o desenvolvimento romano relativo à propriedade tem no direito português em geral) e
científicas (na ausência de uma parte geral no sistema interno dos direitos Reais leva a aplicar praticamente tudo que é
geral à propriedade). Assim, define o regime geral do art.1404º que as regras de compropriedade são aplicáveis, com as
necessárias adaptações, à comunhão de quaisquer outros direitos, sem prejuízo do disposto especialmente para cada
um". Assim, o regime de compropriedade funciona como paradigma da comunhão de direitos reais, mas o alcance da
sua disciplina transcende em muito a comunhão de propriedade, atingindo a comunhão de qualquer direito real.

SÓ ATÉ AQUI PARA A FREQUÊNCIA

Caso Prático N.º 13


(Usufruto)

António, proprietário de um apartamento no Estoril, decide doar, em 1999, aos seus dois filhos, Bento e Carlos tal
imóvel, reservando para si, até ao final da sua vida, o usufruto do imóvel. Na escritura de doação, é prevista numa das
cláusulas que o quando António morresse, o usufruto seria transmitido a favor dos seus dois netos, Dário e Félix, pelo
período de 10 anos após a sua morte, para que estes residissem no mesmo. Aquando da morte de António de 2008,
os seus dois netos tomam posse do imóvel, decidindo transformar o apartamento num restaurante gourmet, com
vista para o mar, fazendo obras profundas no imóvel, partindo todas as paredes, para ficarem com um espaço amplo.
Entretanto o restaurante não tem o sucesso esperado, os quais acumulam múltiplas dívidas. Hermengarda, credora de
Dário e Félix, tendo na sua posse uma livrança, e sabendo do negócio de 1999 pede ao seu advogado para intentar
acção executiva contra ambos e para penhorar o usufruto.
Carlos também era usufrutuário vitalício de uma herdade, cujo nu proprietário era o seu tio. Carlos nunca ligou ao
prédio e à sua manutenção, acabando por deixar crescer um enorme mato na herdade, culminado num incêndio que
destrói boa parte dos seus sobreiros. Perante tal situação, o tio de Carlos pretende reaver a herdade.
Quid juris?

Relativamente à doação com reserva de usufruto: A doação é um negócio jurídico, cujo regime vem previsto no
arts.940º e seguintes, no qual uma pessoa, neste caso António, dispõe gratuitamente uma coisa (neste caso um
apartamento) em benefício de outro contraente, neste caso, aos seus dois filhos Bento e Carlos. A doação a ambos é
considerada uma doação conjunta, prevista no art.944º/1 e, sem informação em contrário, é considerada feita em
partes iguais. O art.958º prevê a reserva de usufruto para o doador (e não só), permitindo assim a António reservar para
si o usufruto do imóvel até ao fim de vida (art.1443º 1ª parte + art.1476º/1/a).
Dentro dos direitos reais de gozo menor, aquele que goza de maior extensão e importância no tráfego jurídico. Quando o
mesmo é de natureza vitalícia, a nua propriedade fica onerada. Poder de uso e de fruição pertencem somente ao
usufrutuário.
Relativamente à cláusula a favor de Dário e Félix: Relativamente à cláusula que atribui aos dois netos o usufruto com
duração de 10 anos após a morte de António, devemos recorrer ao art.1441º. Este artigo dispõe que pode constituir-se
usufruto a favor de uma ou mais pessoas, simultânea ou sucessivamente, contanto que existam ao tempo em que o
direito do primeiro usufrutuário se torne efetivo. Neste caso, e sem mais informação, determinamos que os netos Dário
e Félix existem no tempo determinado pelo artigo mencionado. Então encontramos duas modalidades de usufruto: o
simultâneo e o sucessivo.
Comecemos por ver o usufruto sucessivo, que parece ser mais relevante para a questão em mãos: este determina um
usufruto constituído a várias pessoas que, na ordem prevista em título constitutivo, cada uma delas vai ser investida no
direito logo que o anterior usufrutuário veja o seu terminar. Ou seja, parece que é válida a disposição constante na
escritura. Assim, quando o usufruto de António se extinguisse com a sua morte, Dário e Félix tornar-se-iam os novos
usufrutuários. O que nos leva à segunda modalidade, o usufruto simultâneo:
É também permitido, pelo art.1441º, a possibilidade de constituir usufruto a favor de mais de uma pessoa. Por sua vez,
José Alberto Vieira, define esta figura como "uma forma de comunhão do usufruto (co-usufruto)". Como tal, está sujeito
ao regime jurídico da comunhão, com as necessárias adaptações ao art.1404º da compropriedade.

Relativamente à transformação do imóvel em restaurante: Como mencionado, os netos de António, tornam-se


usufrutuários com a sua morte em 2008, e podem gozar da sua posição num prazo de 10 anos, até 2018.
Enquanto usufrutuários, devem respeitar a delimitação negativa imposta pelo art.1439º pelo que devem gozar do
apartamento sem alterar a sua forma ou substância". Ou seja, não devem somente preserve a coisa como ela lhes foi
entregue, mas também manter a destinação económica pré-definida pelo proprietário, como reiterado pelo art.1446º e
1450º/1. Assim, o imóvel deixado devia ser utilizado, como reforçado pela cláusula, para ambos residirem; concordando
assim com a ótica de interpretação do JAV do art.1439º, na qual o usufrutuário deve conformar-se com o estado
económico atual da coisa, que o proprietário definiu e que existia no momento de constituição do usufruto.
MC: o usufrutuário não pode alterar o destino económico da coisa, respeitando a legalidade vigente. A coisa pode ser
livremente conformada pelo usufrutuário desde que no final volte ao seu estado inicial.
ML: o destino económico é supletivo, à forma e a substância de coisa.
A violação ilícita e culposa de qualquer das duas obrigações do art.1439º assenta na violação do direito da nua
propriedade e confere ao proprietário o direito a ser indemnizado pelos danos sofridos, nos termos gerais da
responsabilidade civil extracontratual. Também se põe em causa se tal importa a possibilidade de reivindicação da coisa
e da extinção do usufruto. JAV, defende que o poder de reivindicar a coisa, procedimento válido para o proprietário se
servir, não impõe a extinção forçosa do usufruto. Contudo, tratando-se de casos, como este, em que a violação das
obrigações é tão grave, não se afasta a possibilidade do proprietário requer a extinção do usufruto.

Penhora de usufruto: O direito do usufruto é penhorável.


Carlos enquanto usufrutuário vitalício irresponsável:
O aproveitamento compreendido no tipo legal do usufruto abrange, entre outros, o uso.
Neste caso, não temos informação de há quanto tempo o usufruto foi celebrado a favor de Carlos, e apenas sabemos
que este não cumpre a sua obrigação de manutenção e conservação da coisa. Extraímos do art.1472º que deve o
usufrutuário promover a conservação da coisa, prevenindo os efeitos de uma deterioração antecipada e evitável, ficando
somente fora do escopo deste, a conservação extraordinária, art.1473º. Uma deterioração decorrente da ausência de
manutenção apropriada da coisa implica a imputação dos danos ao usufrutuário.

Podia ser considerado mau uso? Ambas situações vão para além do mau uso. Para além deste, está em
causa um ataque ao direito do proprietário, daí que nestes casos não seja aplicável o art.1482º, havendo a possibilidade
de extinguir o usufruto quando justificado.
Assim, considero que o tio de Carlos tem razões válidas o suficiente para sustentar a extinção do usufruto enquanto
proprietário (art.298º).

PROFESSOR:
O usufruto de participações sociais (ações, quotas, etc.), previsto legalmente não é um verdadeiro usufruto (Oliveira
Ascensão - USUFRUTO IRREGULAR). Direitos reais têm como objetos tem coisa corpóreas (falta inerência, especialidade).
USUFRUTO VS. DIREITO DE USO E HABITAÇÃO
1984º e ss- prédio rustico, dizemos que estamos perante um prédio um dito de uso, quando é uma casa é direito a
habitação. proporciona o gozo menos intenso que o usufruto. 1484º- ... na medida das necessidades.
O âmbito é limitado, o gozo no usufruto e pleno tal como a fruição, ao contrário do uso e habitação, que se restringe às
necessidades.
Direito de uso da herdade: produz todos os anos duas toneladas de azeitona. Neste caso concreto, se tivéssemos
perante usufruto, as duas toneladas iam diretamente para o usufrutuário. AO contrário do uso, que permitia apenas que
o usuário recebe apenas as azeitonas necessárias para satisfazer uso interno, e as restantes para o nu proprietário,
Ex.: plantação com 300 hectares. Usufrutuário pode usar todos os hectares, enquanto o usufrutuário não precisa de 300
hectares para subsistir; apenas aos hectares para si e para a sua família.
Intransmissibilidade: 1488º (não pode arrendar, emprestar) ao contrário do usufruto
Não é usucapível: 1293º ao contrário do usufruto
Art.1486º fixa as necessidades a que se refere os restantes; padece de inconstitucionalidade por violar o princípio da
igualdade. É determinado pelo tipo legal e pelas necessidades, e não de acordo com a condição social do seu titular.
Não obstante, o regime 1490º manda aplicar as normas do usufruto as normas de uso e habitação, quando a sua
natureza assim o permita.

Caso Prático N.º 14


(Propriedade Horizontal)
Antónia, proprietária de uma fração autónoma inserida num prédio em regime de propriedade horizontal com fins
habitacionais, num total de 10 frações autónomas, detesta o seu vizinho Bento, em virtude das festas que esta
organiza até altas horas da madrugada. Para o efeito, decide convocar uma assembleia de condóminos a realizar no
dia 06.05.2022, pelas 21:00 horas, tendo convocado os vizinhos mediante carta que colocou na caixa de correio dos
10 vizinhos, no dia 29.04.2022.
Como ordem dos trabalhos colocou como ponto 1: aprovação das contas e ponto 2: alteração ao regulamento do
condomínio, no sentido de se deliberar a proibição do recebimento de visitas nas frações autónomas dos condóminos
após as 23:00 horas. Compareceram na assembleia de condóminos 7 proprietários que aprovaram, unanimemente, as
contas e a alteração do regulamento do condomínio nos termos propostos. Bento não compareceu na assembleia,
pretendendo, todavia, colocar termo a tal deliberação. Bento, que sempre fora dado a festas, decide transformar
também o seu amplo apartamento num bar de trance, decidindo, para o efeito, isolar a sua fração para evitar o ruído.
Decide ainda colocar um néon nas grades da sua varanda para publicitar o novo bar. Posteriormente, Carlota,
condómina, que era Contabilista, apercebe-se que houve tramoia na aprovação das contas, tendo os 7 condóminos
presentes no dia 06.05.2022 falseado as contas ao longo de anos para benefício próprio, pretendo que tal deliberação
não tivesse efeito, solicitando auxílio à sua Advogada.

Quid juris?

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