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Bioquímica de Alimentos e Processamento de Alimentos

Editado por YH Hui
Copyright © 2006 por Blackwell Publishing

28
Bioquímica da Carne Fermentada
F. Toldrá

Informações básicas Expressões latinas “salsicia” e “salumen”,

Preparação de Matéria Prima respectivamente (Toldrá 2002). A produção e consumo
Ingredientes de carnes fermentadas expandiu-se por toda a Europa
Outros Ingredientes e Aditivos na Idade Média, adaptando-se às condições climáticas
Iniciados
(ou seja, defumadas no norte da Europa e secas nos
Bactérias do ácido lático (LAB)
países mediterrâneos). A experiência na fabricação
Micrococcaceae
dessas carnes foi para a América com os colonos (por
Leveduras

Bolores
Tripas
Fase de Processamento 1: Processamento de
Cominuição Fase 2: Processamento de Recheio
Fase de Processamento 3: Fermentação
Tecnologia de Fermentação Metabolismo
Microbiano do Processamento de Carboidratos
Estágio 4: Amadurecimento e Secagem
Mudanças físicas
Mudanças químicas
Etapa de processamento 5: segurança
para fumar
exemplo, estados como Wisconsin ainda têm um bom
número de linguiças típicas do norte da Europa, como
linguiças norueguesas e alemãs).
Hoje, uma grande variedade de embutidos fermentados é
produzida, dependendo das matérias-primas, população
microbiana e condições de processamento. Por exemplo, as
salsichas do norte da Europa contêm carne bovina e suína como
carnes cruas, são maturadas por curtos períodos (até 3 semanas)
e geralmente são submetidas à defumação. Nestas salsichas, a
vida de prateleira é principalmente devido ao pH ácido e
defumação, em vez de secagem. Por outro lado, as salsichas

Produto final mediterrâneas usam principalmente carne de porco e são

Cor maturadas por períodos mais longos (várias semanas ou até

Textura meses), e a fumaça não é tão tipicamente aplicada (Flores e
Sabor Toldrá 1993). Exemplos de diferentes tipos de embutidos
Gosto fermentados, de acordo com a intensidade de secagem, são
Aroma apresentados na Tabela 28.1. As salsichas secas e semi-secas são
Glossário fermentadas, para atingir valores de pH baixos, e geralmente
Referências
são defumadas e cozidas antes do consumo. A vida útil e a
segurança são determinadas principalmente pela queda do pH e
redução da atividade da água como consequência da
INFORMAÇÕES FUNDAMENTAIS
fermentação e secagem, respectivamente. O produto pode ser
A origem das carnes fermentadas está bem distante no considerado estável à temperatura ambiente quando o pH - 5,0 e
tempo. Os antigos romanos e gregos já fabricavam a relação umidade:proteína estiver abaixo de 3,1:1 (Sebranek
enchidos fermentados e, de facto, a origem de palavras 2004). As razões umidade:proteína são definidas para os
como linguiça e salame pode provir do diferentes

641
642 Parte VI: Alimentos Fermentados

Tabela 28.1.Exemplos de Carnes Fermentadas com Diferentes Graus de Secura

Peso Secagem/
produtos Modelo Exemplos Perda (%) Amadurecimento

Salsichas fermentadas não secas Propagável teewurst alemão - 10 Sem secagem

Frische mettwurst - 10 Sem secagem

Salsichas semi-fermentadas Fatiável Salsicha de verão - 20 Curto

Líbano Bolonha - 20 Curto
Saucisson d'Alsace - 20 Curto
Laap chinês ch éung - 20 Curto
chinês Xunchang - 20 Curto

Salsichas fermentadas secas Fatiável Húngaro e - 30 Grandes

salame italiano
Pepperoni - 30 Grandes

chouriço espanhol - 30 Grandes

salchichón espanhol - 30 Grandes

saucisson francês - 30 Grandes

Fontes:Lücke 1985, Campbell-Platt 1995, Roca e Incze 1990, Toldrá 2002.

linguiças fermentadas secas e semi-secas nos Estados Unidos,
enquanto os valores de atividade de água são preferidos na
Europa.
PREPARAÇÃO DA MATÉRIA-PRIMA
Existem várias considerações (listadas na Tabela
28.2) que precisam ser levadas em consideração ao
produzir carnes fermentadas. A seleção das
diferentes opções, que serão discutidas nas seções
seguintes, facilita a escolha das condições mais
adequadas para o correto processamento,
segurança e ótima qualidade final.
EUINGREDIENTES
mic protein que é o pigmento natural responsável
pela cor da carne.
As costas de porco e as gorduras da barriga constituem a
principal fonte de gorduras. Atenção especial deve ser dada
ao perfil de ácidos graxos poliinsaturados, que deve ser
inferior a 12%; e o nível de oxidação, medido como valor de
peróxido, deve ser o mais baixo possível (Demeyer 1992).
Algum ranço pode se desenvolver após armazenamento
congelado a longo prazo, uma vez que as lipases presentes
no tecido adiposo são ativas mesmo em temperaturas tão
baixas quanto -18°C e são responsáveis pela liberação
contínua de ácidos graxos livres que são suscetíveis à
oxidação (Hernández et al. 1999). ). Portanto, deve-se ter
extremo cuidado com gorduras armazenadas por vários
meses, pois podem desenvolver um sabor rançoso.

Geralmente são utilizadas carnes magras de suíno e bovino,

em quantidades iguais, ou apenas carne suína.
Características de qualidade como cor, pH (de preferência -
5,8) e capacidade de retenção de água são muito
importantes. Quando o pH da carne suína é -6,0, a carne é
conhecida como DFD (escuro, firme e seco). Este tipo de
carne liga-se firmemente à água e estraga-se facilmente. A
carne suína com outro defeito, conhecido como PSE (pálida,
macia e exsudativa), não é recomendada porque a cor é
pálida e a linguiça liberaria água muito rápido, o que
poderia causar o enrugamento das tripas. A carne de
animais mais velhos é preferida por sua cor mais intensa,
que se deve ao acúmulo de mioglobina, um sarcoplasma.
OTEREUINGREDIENTES EUMADITIVOS
O sal é o aditivo mais antigo usado em produtos cárneos
curados desde os tempos antigos. O sal, em cerca de 2-4%,
tem várias funções, incluindo (1) uma redução inicial na
atividade de água, (2) proporcionando um sabor salgado
característico e (3) contribuindo para o aumento da
solubilidade das proteínas miofibrilares. O nitrito é um
agente de cura típico usado como conservante contra
patógenos, especialmenteClostridium botulinum. O nitrito
também é responsável pelo desenvolvimento da cor típica
da carne curada, prevenção da oxidação e contribuição para
o sabor da carne curada (Gray e Pearson 1984). o
 28 Bioquímica da Carne Fermentada 643

Tabela 28.2.Algumas Decisões a Adotar e Opções de Escolha no Processamento de Carnes

Fermentadas

Aspectos Opções
Tipo de carne Carne suína, bovina, etc.

Qualidade da carne Escolha boa qualidade. Rejeitar carnes defeituosas (porco PSE e DFD), anormais
cores, exsudação, etc.
Origem da gordura Escolha gorduras refrigeradas ou congeladas (por quanto tempo?) Rejeite as gorduras
Tipo de gordura oxidadas. Controle do perfil de ácidos graxos (excesso de PUFA?).
Razão Escolha a relação carne:gordura desejada.

Tamanho da partícula Escolha a placa adequada (moedor) ou velocidades (cortador).

Aditivos: sal Decida a concentração.
Aditivos: agente de cura Nitrito ou nitrato dependendo do tipo e duração do processo.
Aditivos: carboidratos Tipo e concentração dependendo do tipo de processo e queda de pH necessária.
Especiarias Escolha de acordo com o sabor específico necessário.
Microflora Natural ou adicionado como starter?
Iniciantes Escolha microorganismos dependendo do tipo de processo e produto.
Revestimento Material e diâmetro dependendo do tipo de produto.
Fermentação Condições dependendo do tipo de starter utilizado e do produto.
Amadurecimento/secagem Condições dependendo do tipo de produto.
Fumar Aplicação opcional. Condições dependendo do tipo de produto e
sabor.
Cor Depende da carne crua, nitrito e condições de processamento. Depende da
Textura relação carne:gordura, pressão de enchimento e extensão da secagem. Escolha
Sabor condições adequadas de partida e processo.
Atividade aquática Depende das condições de secagem e da duração do processo.

a redução do nitrito a óxido nítrico é favorecida pela
presença de ácidos ascórbico e eritórbico ou seus
sais de sódio. Também exercem ação antioxidante e
inibem a formação de nitrosaminas.
Carboidratos como glicose e lactose são usados com
bastante frequência como substratos para o crescimento e
desenvolvimento microbiano. Os dissacarídeos, e especialmente
os polissacarídeos, podem retardar o crescimento e a taxa de
queda do pH porque precisam ser hidrolisados a
monossacarídeos por microrganismos.
Às vezes, substâncias adicionais podem ser usadas
para fins específicos (Demeyer e Toldrá 2004). É o caso
da glucono-delta-lactona, adicionada a 0,5%, que pode
simular a acidulação bacteriana. Na presença de água, a
glucono-delta-lactona é hidrolisada a ácido glucônico e
produz uma rápida diminuição do pH. A qualidade é
bastante ruim porque a queda rápida do pH reduz
drasticamente a atividade de enzimas relacionadas ao
sabor, como exopeptidases e lipases. Os fosfatos podem
ser adicionados para melhorar a estabilidade contra a
oxidação; proteínas vegetais, como isolados de soja,
para substituir as proteínas da carne; e sulfato de
manganês como cofator para bactérias lácticas.
Acrescentam-se especiarias, quer na forma
natural quer em extractos, para conferir um
aroma ou cor característicos ao enchido
fermentado. Há uma grande variedade de
especiarias (pimenta, páprica, orégano, alecrim,
alho, cebola, etc.), cada uma dando um aroma
particular ao produto. Algumas especiarias
também contêm poderosos antioxidantes. Os
compostos voláteis aromáticos mais importantes
podem variar dependendo da origem geográfica
e/ou vegetal. Por exemplo, o alho, que dá um
cheiro pungente e penetrante, é normalmente
usado no chouriço, e a pimenta é usada no
salchichón e no salame. A páprica confere sabor e
cor característicos devido ao seu alto teor de
carotenóides (Ordoñez et al. 1999). A presença de
manganês em algumas especiarias, como
pimenta vermelha e mostarda,
STARTES
Os produtos fermentados típicos foram inicialmente
baseados no desenvolvimento e crescimento de desejáveis
644 Parte VI: Alimentos Fermentados
flora, por vezes reforçada com backslopping, que consiste
na adição de um enchido fermentado previamente curado,
com propriedades sensoriais adequadas. No entanto, esta
prática geralmente dava uma alta heterogeneidade na
qualidade do produto. O uso de starters microbianos, como
forma de padronizar o processamento, bem como a
qualidade e segurança, é relativamente novo. De fato, o
primeiro uso comercial foi nos Estados Unidos na década de
1950, seguido pelo seu uso na Europa na década de 1960;
desde então, os iniciantes viram uso extensivo. Hoje, a
maioria das linguiças fermentadas são produzidas com uma
combinação de bactérias lácticas, para obter uma acidulação
adequada, e duas ou mais culturas para desenvolver o sabor
e facilitar outras reações, como a redução de nitrato.
Em geral, os microrganismos utilizados como culturas
iniciadoras devem atender a vários requisitos de acordo
com os objetivos de seu uso: não toxicidade para o homem,
boa estabilidade nas condições de processamento
(resistência a pH ácido, baixa atividade de água, tolerância
ao sal, resistência a infecções fágicas), crescimento intenso
na temperatura de fermentação (ou seja, 18–25°C na Europa
ou 35–40°C nos Estados Unidos), geração de produtos com
interesse tecnológico (ou seja, ácido lático para queda de
pH, compostos voláteis para aroma, redução de nitrato ,
secreção de bacteriocinas, etc.) e falta de enzimas
indesejáveis (por exemplo, descarboxilases responsáveis
pela geração de aminas). Assim, as linhagens mais
adequadas devem ser cuidadosamente selecionadas e
controladas, pois terão um papel muito importante no
processo e serão decisivas para a qualidade final. Os
microrganismos mais importantes usados como
iniciadores pertencem a um dos seguintes grupos: bactérias
do ácido lático, Micrococcaceae, leveduras ou bolores
(Leistner 1992). Os principais papéis e funções de cada
grupo são mostrados na Tabela 28.3.
Bactérias de ácido lático (LAB)
A função mais importante das bactérias lácticas consiste
na geração de ácido láctico a partir de glicose ou outros
carboidratos por via homo ou heterofermentativa. O
acúmulo de ácido lático produz uma queda de pH na
linguiça. No entanto, alguns produtos secundários
indesejáveis como ácido acético, peróxido de
hidrogênio, acetoína, . . . pode ser gerado no caso de
certas espécies com vias heterofermentativas.L. sakeieL.
curvatus crescem a temperaturas amenas sendo
habitual no processamento de enchidos europeus
enquantoL. plantarum
eP. acidilacticicrescem bem em temperaturas mais altas
(30-35°C) mais próximas das condições de fermentação nas
salsichas produzidas nos Estados Unidos. As bactérias
lácticas também possuem um sistema proteolítico,
constituído por endo e exopeptidases, que contribui para a
geração de aminoácidos livres durante o processamento e,
em sua maioria, também são capazes de gerar diferentes
tipos de bacteriocinas com propriedades antimicrobianas.
Micrococcaceae
Este grupo é composto porEstafilococoeKocuria (antigamente
Micrococcus), que são os principais contribuintes para o sabor
devido à sua atividade proteolítica e lipolítica. Outra função
importante consiste na atividade da redutase do nitrato,
necessária para reduzir o nitrato a nitrito e contribuir para a
formação e segurança da cor. No entanto, esses microrganismos
devem ser adicionados em grandes quantidades, pois crescem
pouco ou até morrem logo no início da fermentação, quando
prevalecem condições de baixo pH. De preferência, cepas
tolerantes a pH baixo devem ser cuidadosamente selecionadas.
As espécies desta família também possuem uma importante
atividade catalase que contribui para a estabilidade da cor e, de
alguma forma, prevenção da oxidação lipídica.
Leveduras
Debaryomyces hanseniié a levedura predominante em
carnes fermentadas, crescendo principalmente na área
externa da linguiça devido ao seu metabolismo aeróbio.D.
hanseniitem uma boa atividade lipolítica e é capaz de
degradar o ácido lático. Além disso, também apresenta uma
importante atividade desaminase/desamidase, utilizando
aminoácidos livres como substratos e produzindo amônia
como subproduto que eleva o pH da linguiça (Durá et al.
2002).
Bolores
Algumas salsichas fermentadas secas típicas do
Mediterrâneo têm bolores na superfície. Os mais usuais são
Penicillium nalgiovenseeP. chrysogenum. Eles contribuem
para o sabor, por meio de sua atividade proteolítica e
lipolítica, e para a aparência, na forma de uma camada
branca na superfície (Sunesen e Stahnke 2003). Eles também
geram amônia através de sua atividade desaminase e
deamidase e contribuem para o aumento do pH. A
inoculação de enchidos com bolores naturais presentes na
sala de fermentação é perigosa porque
 Tabela 28.3.Principais Funções e Efeitos dos Microrganismos em Carnes Fermentadas

Grupo Microrganismos Papel principal Função Secundária Contribuição Química Efeitos

Ácido lático L. sakei, L. curvatus, Glicolise Proteólise Geração de ácido lático queda de pH

bactérias L. plantarum, (endo e Geração de amino livre Segurança

L. pentosus, exo) ácidos Firmeza

P. acidilactici, Gosto
P. pentosaceus
Micrococcaceae K. variantes, Nitrato Proteólise Redução de nitrato para Segurança

S. Xyloso, redutase, (exo) nitrito Aroma

S. carnosus lipólise, Geração de gordura livre Gosto
catalase ácidos, prontos para
oxidação
Geração de amino livre
ácidos
Degradação do hidrogênio
peróxido
Leveduras Debaryomyces Lipólise Desaminação/ Geração de gordura livre Aroma
hansenii desamidação ácidos Gosto
Transaminação Transformação de aumento do pH

aminoácidos
Consumo de ácido lático
e geração
de amônia
Bolores Penicillium Lipólise, Desaminação/ Geração de gordura livre Aroma
nalgiovense,P. proteólise desamidação ácidos, prontos para Gosto
crisógeno (exo) Transaminação oxidação aumento do pH

Geração de graça Externo

aminoácidos e sua aspecto
transformação
Geração de amônia

645
646 Parte VI: Alimentos Fermentados

fungos toxigênicos podem crescer. Assim, as culturas iniciadoras vários minutos, dependendo da quantidade. Os processos
de fungos são usadas principalmente como medida preventiva industriais podem usar um cortador, como alternativa à
contra o crescimento de outros fungos produtores de moagem e mistura, quando os tamanhos de partículas
micotoxinas e dão uma cor branca típica na superfície, conforme necessários são pequenos. O cortador consiste em uma
exigido em certas áreas do Mediterrâneo. tigela de movimento lento, contendo as carnes, gorduras e
aditivos, que gira contra um conjunto de facas que operam
com rotação rápida. A gordura e a carne devem ser pré-
CASINGS
congeladas (-6 a -7°C) para evitar manchas de partículas de
As tripas podem ser naturais, semissintéticas ou sintéticas, gordura durante o corte. Este fenômeno consiste em um
mas uma característica comum exigida é sua fino filme de gordura formado sobre as partes magras que
permeabilidade à água e ao ar. As tripas naturais são pode reduzir a liberação de água durante a secagem (Roca e
porções naturais do trato gastrointestinal de suínos, ovinos Incze 1990). O cortador opera sob vácuo para evitar
e bovinos e, embora de forma irregular, apresentam boa qualquer
elasticidade, resistência à tração e permeabilidade. As tripas
naturais são normalmente utilizadas para os enchidos
tradicionais porque conferem um aspecto caseiro ao
produto. As tripas semissintéticas são à base de colágeno
que encolhe com o produto e é permeável, mas não pode
ser estofada demais (Toldrá et al. 2004). As tripas à base de
celulose sintética não são comestíveis, mas são preferidas
para processos industriais devido a vantagens importantes,
como tamanho de poro controlado e regular, uniformidade
para produtos padrão e higiene. Esses invólucros são
facilmente removidos.
Uma ampla gama de tamanhos, entre 2 e 15 cm, pode
ser usada, dependendo do tipo de produto. Claro, o
diâmetro afeta fortemente as condições de fermentação e
secagem. Portanto, a queda de pH é mais importante em
salsichas de grande diâmetro, onde a secagem é mais difícil
de alcançar.

ETAPA DE PROCESSAMENTO 1:
PARTIDA
Um exemplo de fluxograma para o processamento de
embutidos fermentados é mostrado na Figura 28.1. Carnes
refrigeradas, suínos puros ou misturas de suínos e bovinos,
e gorduras suínas são submetidas à trituração em moedor
(Fig. 28.2). Existem várias placas com diferentes tamanhos
de orifício, dependendo do tamanho de partícula desejado.
Recomenda-se o corte prévio para remoção do tecido
conjuntivo, especialmente ao processar linguiças
fermentadas secas ou semi-secas, onde não ocorrerá mais
hidrólise do colágeno. Sal, nitrato e/ou nitrito, carboidratos,
starters microbianos, especiarias, ascorbato de sódio e,
opcionalmente, outras proteínas não-carne são adicionadas
à massa moída, e toda a mistura é homogeneizada sob
vácuo para evitar bolhas e oxidações indesejáveis que Figura 28.1.Diagrama de fluxo mostrando as etapas mais
afetam a cor e o sabor (Fig. 28.3). Moagem e mistura tomar importantes no processamento de embutidos fermentados.
 entrou

Figura 28.2.Moagem de carnes e gorduras. Existem muitos Figura 28.3.Detalhe da massa após a mistura em um massageador
tamanhos de placas trituradoras de acordo com o tamanho de misturador a vácuo.
partícula necessário.

ção leva apenas um curto período de tempo, apenas alguns minutos; e a Isso ocorre: (1) crescimento e desenvolvimento microbiano,
razão entre a velocidade do recipiente e a velocidade da faca determina o (2) mudanças bioquímicas, principalmente quebra
tamanho de partícula desejado. enzimática de carboidratos, proteínas e lipídios, e (3)
mudanças físicas, principalmente gelificação ácida de

ETAPA DE PROCESSAMENTO 2: RECHEIO proteínas da carne e secagem.

A tecnologia de fermentação da carne difere entre os Estados
A mistura é colocada sob vácuo em tripas, naturais, à Unidos e a Europa. Altas temperaturas de fermentação (35-40°C)
base de colágeno ou sintéticas, com ambos os são típicas em linguiças americanas, seguidas por um processo
extremos cortados. O vácuo evita a presença de de aquecimento suave, como uma espécie de pasteurização.
bolhas no interior da salsicha e rupturas na tripa. O
recheio deve ser adequado para evitar manchas na
massa e a temperatura deve ser mantida abaixo de
2°C para evitar esse problema. Uma vez recheadas
(Fig. 28.4), as linguiças são penduradas em racks e
colocadas em câmaras de secagem naturais ou
climatizadas.

ETAPA DE PROCESSAMENTO 3:
FERMENTAÇÃO
FERMENTAÇÃOTTECNOLOGIA
Uma vez que as salsichas são recheadas, elas são colocadas em
câmaras com ar condicionado controladas por computador e
deixadas para fermentar para o crescimento e desenvolvimento
microbiano. Uma câmara típica é mostrada na Figura 28.5. A
temperatura, a umidade relativa e a velocidade do ar devem ser
cuidadosamente controladas para que haja crescimento
microbiano correto e ação enzimática. Todo o processo pode ser Figura 28.4.Salsichas recheadas em tripa de colágeno de 80
considerado como uma fermentação láctica em estado sólido em mm de diâmetro e cortadas em ambos os extremos.
que vários processos simultâneos
648
Figura 28.5.Exemplo de uma câmara de fermentação/secagem
com controle computadorizado de temperatura, umidade
relativa e vazão de ar. (Por cortesia de Embutidos y Conservas
Tabanera, Segóvia, Espanha.)
Assim, iniciadores comoLactobacillus plantarumou
Pediococcus acidilactici,que crescem bem a essas
temperaturas, são normalmente usados. Na Europa,
diferentes tecnologias podem ser encontradas,
dependendo da localização e do clima. Existe uma
tendência histórica para enchidos fumados de curta
duração em países frios e húmidos, como no norte da
Europa, e enchidos secos de processamento longo em
países mais quentes e secos, como na zona
mediterrânica. No caso dos países do norte da Europa
(NES), os enchidos são fermentados durante cerca de 3
dias a temperaturas intermédias (25–30°C), seguidos
por períodos de maturação curtos (até 3 semanas).
Essas salsichas são submetidas a uma rápida queda de
pH e geralmente são defumadas para um sabor
específico (Demeyer e Stanhke 2002). Por outro lado, as
salsichas mediterrânicas requerem tempos de
processamento mais longos. A fermentação ocorre em
temperaturas mais amenas (18–24°C) por cerca de 4
dias,L. sakeiouL. curvatussão as BAL mais utilizadas
como culturas iniciadoras (Toldrá et al. 2001). O tempo
necessário para a etapa de fermentação é função da
temperatura e do tipo de micro-organismos utilizados
como iniciadores.
A tecnologia é bem diferente na China e em outros
países asiáticos. As salsichas são primeiro secas sobre
carvão a 48°C e 65% de umidade relativa por 36 horas e
depois a 20°C e 75% de umidade relativa
Alimentos
3 dias. A atividade da água cai rapidamente abaixo de 0,80,
o pH permanece em torno de 5,9, o que é relativamente
valor. A fermentação é relativamente pobre e o
sabor, considerado indesejável, é vermelho. A
salsicha crua chinesa é consumida após o calor-
Leistner 1992).
CROBIALMETABOLISMO DE
RBOHIDRATOS
O carboidrato adicionado é convertido, durante a
fermentação, em ácido lático de configuração D(-) ou
L( ), ou uma mistura de ambos, dependendo da espécie de
bactérias lácticas usadas como iniciador. A razão entre os
enantiômeros L e D depende da ação da lactato
desidrogenase L e D, respectivamente, e da presença da
lactato racemase. A taxa de geração e a quantidade final de
ácido lático dependem do tipo de espécie LAB utilizada
como iniciador, do tipo e teor de carboidratos, da
temperatura de fermentação e de outros parâmetros de
processamento. O acúmulo de ácido lático produz uma
queda de pH mais ou menos intensa dependendo de sua
taxa de geração. Alguns produtos secundários como ácido
acético, acetoína e outros podem ser formados por vias
heterofermentativas (Demeyer e Stahnke 2002). O pH ácido
favorece a coagulação das proteínas, à medida que o pH se
aproxima do seu ponto isoeléctrico, favorecendo assim
também a libertação de água. O pH ácido também contribui
para a segurança, contribuindo para a inibição de bactérias
patogênicas ou deteriorantes indesejáveis. A queda de pH
favorece a proteólise inicial e a lipólise, estimulando a
atividade da catepsina D muscular e da lipase ácida
lisossomal, ambas ativas em pH ácido, mas uma queda
excessiva de pH não favorece reações enzimáticas
posteriores envolvidas na geração de compostos de sabor
(Toldrá e Verplaetse 1995). ).
ETAPA DE PROCESSAMENTO 4: MADURA
E SECAGEM
A temperatura, a umidade relativa e o fluxo de ar devem ser
cuidadosamente controlados durante a fermentação e o
amadurecimento para permitir o crescimento microbiano
correto e a ação enzimática, mantendo o progresso de secagem
adequado. A velocidade do ar é mantida em torno de 0,1 m/s, o
que é suficiente para uma boa homogeneização do ambiente. O
amadurecimento e a secagem são importantes para as reações
enzimáticas relacionadas ao desenvolvimento do sabor e
obtenção da perda de água necessária e, portanto, redução
 28 Bioquímica da Carne Fermentada
na atividade da água. A duração do período de
maturação/secagem leva de 7 a 90 dias, dependendo de
muitos fatores, incluindo o tipo de produto, seu
diâmetro, grau de secura, teor de gordura, intensidade
de sabor desejada etc. A redução de umWé mais lento
em salsichas contendo carne bovina. A tripa deve
permanecer presa à salsicha quando ela encolhe
durante a secagem. Em geral, os produtos de longa
maturação tendem a ser mais secos e saborosos.
PHÍSICOCPENDÊNCIAS
As mudanças físicas mais importantes durante a
fermentação e amadurecimento/secagem estão resumidas
na Figura 28.6. A acidulação produzida durante o estágio de
fermentação induz a coagulação da proteína e, portanto,
alguma liberação de água. A acidulação também reduz a
solubilidade das proteínas sarcoplasmáticas e miofibrilares,
e a linguiça começa a ganhar consistência. O processo de
secagem é uma operação delicada que deve
Figura 28.6.Esquema mostrando mudanças físicas importantes durante o processamento de carnes fermentadas.
649
alcançar um equilíbrio entre dois processos diferentes
de transferência de massa, difusão e evaporação
(Baldini et al. 2000). A água dentro da salsicha deve se
difundir para a superfície externa e depois evaporar
para o ambiente. Ambas as taxas devem estar em
equilíbrio, pois uma redução muito rápida da umidade
relativa da câmara causaria evaporação excessiva da
superfície da salsicha que reduziria o teor de água nas
partes externas da salsicha, causando o endurecimento.
Isso é típico de salsichas de grande diâmetro devido à
lenta taxa de difusão da água. A seção transversal
dessas salsichas mostra um anel externo mais escuro,
seco e duro. Por outro lado, quando a taxa de difusão da
água é muito maior que a taxa de evaporação, a água se
acumula na superfície da linguiça, causando uma tripa
enrugada. Esta situação pode ocorrer em linguiças de
pequeno diâmetro sendo maturadas em câmara com
alta umidade relativa. O avanço na secagem reduz o
teor de água, até 20% de perda de peso nas linguiças
semi-secas e 30% nas secas
650 Parte VI: Alimentos Fermentados
salsichas (Tabela 28.1). A atividade de água diminui de acordo
com a taxa de secagem, atingindo valores abaixo de 0,90 para
linguiças de longa maturação.
CHEMICCPENDÊNCIAS
Existem diferentes enzimas, tanto de origem muscular
quanto microbiana, envolvidas em reações relacionadas à
cor, textura e geração de sabor. Essas reações, que estão
resumidas na Figura 28.7, são muito importantes para a
qualidade sensorial final do produto. Um dos grupos mais
importantes de reações, afetando principalmente proteínas
miofibrilares e produzindo pequenos peptídeos e
aminoácidos livres como produtos finais, é conhecido como
proteólise (Toldrá 1998). Uma intensa proteólise durante a
fermentação e maturação é realizada principalmente pela
catepsina D endógena, uma proteinase muscular ácida que
é muito ativa em pH ácido. Essa enzima hidrolisa a miosina e
a actina, produzindo um acúmulo de polipeptídeos que são
posteriormente hidrolisados em pequenos peptídeos pelas
peptidilpeptidases musculares e microbianas e em
aminoácidos livres pelas aminopeptidases musculares e
microbianas (Sanz et al. 2002). A geração de pequenos
peptídeos e aminoácidos livres aumenta com a duração do
processamento, embora a taxa de geração seja reduzida em
valores de pH ácido porque as condições estão longe de
serem ótimas para a atividade enzimática. Os aminoácidos
livres podem ser
Figura 28.7.Esquema mostrando as reações mais importantes de enzimas musculares e microbianas envolvidas em alterações
químicas e bioquímicas que afetam a qualidade sensorial de carnes fermentadas.
posteriormente transformados em outros produtos, por
exemplo, compostos voláteis por meio de degradações de
Strecker e reações de Maillard; amônia por meio de reações
de desaminação e/ou desamidação por deaminases e
deamidases, respectivamente, presentes em leveduras e
bolores; ou aminas por descarboxilases microbianas.
Outro importante grupo de reações enzimáticas, que
afetam os lipídios do músculo e do tecido adiposo, é
conhecido como lipólise (Toldrá 1998). Assim, uma
grande quantidade de ácidos graxos livres (entre 0,5 e
7%) é gerada pela hidrólise enzimática de triacilgliceróis
e fosfolipídios. A maior parte da lipólise observada é
atribuída, após extensos estudos em sistemas estéreis
modelo e salsichas com adição de antibióticos, a lipases
endógenas presentes no músculo e tecido adiposo (por
exemplo, lipase ácida lisossomal, presente nos
lisossomos e muito ativa em pH ácido; Toldrá 1992 ,
Hierro e outros 1997, Molly e outros 1997).
As catalases estão presentes principalmente em
microrganismos comoKocuriaeEstafilococos;eles são
responsáveis pela redução do peróxido e, assim,
contribuem para a estabilização da cor e do sabor. A
redutase do nitrato, também presente nesses
microrganismos, também é importante para reduzir o
nitrato a nitrito em linguiças de maturação lenta com adição
inicial de nitrato. Recentemente, duas cepas deLactobacillus
fermentumprovaram ser capazes de gerar óxido nítrico e
dar uma cor aceitável em salsichas sem nitrato/nitrito.
 28 Bioquímica da Carne Fermentada
Isso poderia ser usado para produzir carnes curadas livres
de nitrato e nitrito (Moller et al. 2003).
ETAPA DE PROCESSAMENTO 5: FUMAR
A defumação é aplicada principalmente em países do
norte com climas frios e/ou úmidos. Inicialmente, foi
usado para fins de preservação, mas hoje sua
contribuição para o sabor e a cor é mais importante
(Ellis 2001). Em alguns casos, a defumação pode ser
aplicada logo após a fermentação ou mesmo no início
da fermentação. A defumação pode ser acompanhada
de aquecimento a 60°C e tem forte impacto nas
propriedades sensoriais finais. Tem um forte efeito
antioxidante e confere cor e sabor característicos ao
produto, que é o papel principal da defumação. O efeito
bacteriostático dos compostos de fumar inibe o
crescimento de leveduras, bolores e certas bactérias.
SEGURANÇA
A estabilidade da salsicha contra patógenos e/ou
microorganismos deteriorantes é o resultado de
sucessivos obstáculos (Leistner 1992). Inicialmente, o
sal de cura nitrito adicionado é muito importante
para a estabilidade microbiana da mistura. Durante
a mistura sob vácuo, o oxigênio é gradualmente
removido e o potencial redox é reduzido. Este efeito
é aumentado quando ácido ascórbico ou ascorbato é
adicionado. Baixos valores de potencial redox inibem
as bactérias aeróbicas e tornam o nitrito mais eficaz
como bactericida. Durante a fermentação, as
bactérias lácticas podem inibir outras bactérias, não
só pela geração de ácido lático (e consequente
queda de pH), mas também pela geração de outros
produtos metabólicos como ácido acético e peróxido
de hidrogênio e, principalmente, bacteriocinas (baixa
peptídeos de massa molecular sintetizados em cepas
positivas para bacteriocina; Lücke 1992).W
abaixo de 0,92) que inibem o crescimento de
microrganismos deteriorantes e/ou patogênicos. Assim, a
correta interação de todos esses fatores garante a
estabilidade do produto.
Alguns patógenos de origem alimentar que podem ser
encontrados em carnes fermentadas são brevemente
descritos.Salmonelaé mais comum em salsichas frescas e
barradas (Lücke 1985), mas pode ser inibida por acidificação
a pH 5,0 e/ou secagem a umW- 0,95 (Talon et al. 2002). As
bactérias lácticas exercem um efeito antagonista contra
Salmonela(Roca e Incze 1990).Esta-
651
phylococcus aureuspode crescer em condições aeróbicas ou
anaeróbicas e requer umW- 0,91 para inibição, mas é
sensível ao pH ácido. Portanto, é importante controlar o
tempo decorrido antes de atingir a queda de pH para evitar
a produção de toxinas. Além disso, esta toxina é produzida
apenas em condições aeróbicas (Roca e Incze 1990).
Clostridium botulinum e sua capacidade de produção de
toxinas são afetadas por uma rápida queda de pH e baixoW
ainda mais do que pela adição de bactérias lácticas e nitrito
(Lücke 1985).Listeria monocytogenestem um crescimento
limitado a umaW- 0,90 combinado com valores de pH baixos
e culturas iniciadoras específicas (Hugas et al. 2002).
Escherichia colié bastante resistente a pH baixo eWmas é
reduzido quando exposto a umW- 0,91 (Nissen e Holck 1998).
As medidas de prevenção adequadas consistem em um
resfriamento correto e um plano de análise de risco de
ponto crítico de controle (APPCC) com aplicação de boas
práticas de fabricação (BPF), sanitização e rigoroso controle
de higiene de pessoal e matérias-primas.
Nos últimos anos, a maior atenção tem sido dada à
biopreservação como forma de melhorar a preservação
contra bactérias deteriorantes e patógenos de origem
alimentar. A cultura bioprotetora consiste em uma cepa
bacteriana competitiva que cresce muito rápido ou produz
substâncias antagônicas como as bacteriocinas. Outra
forma precisa consiste na adição direta de bacteriocinas
purificadas. Aquelas bacteriocinas pertencentes ao grupo IIa
(também chamadas de pediocina-like) que apresentam
inibição contraListeriatêm sido relatados como os mais
interessantes para a indústria de carnes (Hugas et al. 2002).
Parasitas comoTrichinella spiralissão quase eliminados
através de sistemas de reprodução modernos. A carne de
porco isenta de triquinas deve ser utilizada como matéria-
prima para enchidos fermentados; caso contrário, são
necessários tratamentos térmicos da salsicha para atingir
temperaturas internas acima de 62,2°C para inativa-las
(Sebranek 2004).
A geração de compostos indesejáveis, listados na
Tabela 28.4, depende de vários fatores. O fator mais
importante é a qualidade higiênica das matérias-primas.
Por exemplo, a presença de cadaverina e/ou putrescina
pode ser indicativa da presença de flora de carne
contaminante. Outro fator são as condições de
processamento, que podem favorecer a geração de
aminas biogênicas; no entanto, o tipo de flora natural
ou iniciador microbiano utilizado para o processo é a
questão mais importante, pois a presença de
microrganismos com atividade descarboxilase pode
induzir a geração de aminas biogênicas. No geral,
652 Parte VI: Alimentos Fermentados

a tiramina é a amina gerada em maior As condições de processamento podem

quantidade, e é formada por certas bactérias
lácticas que apresentam atividade enzimática
para descarboxilação da tirosina (Eerola et al.
1996). A tiramina libera noradrenalina do sistema
nervoso simpático, e a vasoconstrição periférica e
o aumento do débito cardíaco resultam em
aumento da pressão arterial e risco de crise
hipertensiva (Shalaby 1996). No entanto, o nível
de tolerância estimado para a tiramina (100-800
mg/kg) é maior do que para outras aminas (Nout
1994). As aminas derivadas de alimentos são
geralmente degradadas em humanos pela
enzima monoamina oxidase (MAO) através de
reações de desaminação oxidativa. Os
consumidores em uso de inibidores da MAO
estão menos protegidos contra as aminas e,
portanto, são suscetíveis a situações de risco,
como crise hipertensiva, ao ingerir quantidades
significativas de aminas. Outras aminas também
podem causar problemas; por exemplo,
feniletilamina, que pode causar enxaqueca e
aumento da pressão arterial; ou histamina, que
excita os músculos lisos do útero, do intestino e
do trato respiratório. Uma maneira de reduzir os
riscos à saúde das aminas consiste no uso de
culturas iniciadoras que são incapazes de
produzir aminas, mas são competitivas contra
microrganismos produtores de aminas. Além
disso, o uso de microrganismos que exibem
atividade amina oxidase e são capazes de
degradar aminas, a seleção de matérias-primas
de alta qualidade e o uso de BPF garantem
produtos de alta qualidade e riscos reduzidos
(Talon et al. 2002). Finalmente,
favorecer a oxidação do colesterol. Alguns
óxidos gerados podem estar envolvidos em
doenças cardiovasculares (p. exercendo
qualquer efeito tóxico (Demeyer et al. 2000).
PRODUTO FINAL
Uma vez finalizado, o produto é embalado e distribuído.
As salsichas fermentadas podem ser vendidas inteiras
ou em fatias finas (Fig. 28.8). A cor, textura e sabor
desenvolvidos dependem do processamento e do tipo
de produto. As principais propriedades sensoriais são
descritas abaixo.
COLOR
A cor da salsicha depende do teor de umidade e gordura,
bem como do teor de hemoproteína, particularmente
mioglobina. A cor também é influenciada pela taxa de queda
de pH e pelo pH final, mas também pode ser afetada pela
presença de especiarias como pimenta vermelha. Um
excesso de geração de ácido por lactobacilos também pode
afetar a cor.
A cor característica se deve à ação do nitrito com a
mioglobina. O nitrito é reduzido a óxido nítrico, favorecido
pela presença de ascorbato/eritorbato. A mioglobina e o
óxido nítrico podem interagir para formar mioglobina de
óxido nítrico, que dá a característica cor vermelho-rosada
curada (Pegg e Shahidi 1996). Esta reação é favorecida em
pH baixo. Salsichas de processamento longo usando nitrato
precisam de algum tempo para o crescimento de
Micrococcaceae antes do pH

Tabela 28.4.Aspectos de Segurança: Geração de Compostos Indesejáveis em Carnes Secas Fermentadas

Compostos Rota de Formação Origem Concentrações (mg/100 g)

Tiramina Descarboxilação Microbiana Tirosina - 16,0
Triptamina Descarboxilação Microbiana Trytophane - 6,0
Feniletilamina Descarboxilação Microbiana Fenilalanina - 3,5
Cadaverina Descarboxilação Microbiana Lisina - 0,6
Histamina Descarboxilação Microbiana Histidina - 3.6
Putrescina Descarboxilação Microbiana Ornitina - 10,0
Espermina Descarboxilação Microbiana Metionina - 3,0
Espermidina Descarboxilação Microbiana Metionina - 0,5
Óxidos de colesterol Oxidação Colesterol - 0,15
Fontes:Adaptado de Maijala et al. 1995, Shalaby 1996, Hernández-Jover et al. 1997, Demeyer et ai. 2000.

Figura 28.8.Imagem de um típico salchichón de pequeno
diâmetro, mostrando sua seção transversal.
gotas. A nitrato redutase, que está presente em
Micrococcaceae, reduz o nitrato a nitrito, que é
posteriormente reduzido a óxido nítrico, que pode
reagir com a mioglobina. A descoloração oxidativa
consiste na conversão da nitrosilmioglobina em
nitrato e metamioglobina, o que afeta a estabilidade
oxidativa devido ao efeito pró-oxidante do heme
férrico.
TEXTURE
A consistência das carnes fermentadas é iniciada com a
adição de sal e redução do pH. A capacidade de ligação à
água das proteínas miofibrilares diminui à medida que o pH
se aproxima do ponto isoelétrico das proteínas e libera
água. A solubilidade das proteínas miofibrilares também é
reduzida, com tendência à agregação e coagulação,
formando um gel. A consistência deste gel aumenta com a
perda de água durante a secagem. Assim, há um
desenvolvimento contínuo de características texturais como
firmeza, dureza e coesividade das partículas de carne
durante a secagem (Toldrá 2002). A relação carne:gordura
pode afetar algumas dessas características de textura, mas
em geral, a textura final da linguiça dependerá
principalmente da extensão da secagem (Toldrá et al. 2004).
FLAVOR
Pouco ou nenhum sabor é geralmente detectado antes da
fermentação da carne, embora um grande número de
precursores de sabor esteja presente. Como fermentação e mais
Carne mentada 653
Durante o processo de amadurecimento/secagem, o efeito
combinado da enzima muscular genética e da atividade
microbiana oduz um elevado número de compostos não
voláteis e voláteis com impacto sensorial. Quanto mais longo
for o processo, maior será o acúmulo desses compostos e seu
impacto sensorial intensificado. Embora não seja tão
importante quanto no cozimento de carnes, alguns
compostos com impacto sensorial podem ser induzidos por
meio de reações químicas posteriores. A edição de especiarias
também tem uma contribuição intensa para sabores
específicos.
Gosto
Os principais compostos não voláteis que contribuem para o
sabor das carnes fermentadas estão resumidos na Tabela
28.5. O sabor azedo, resultante principalmente da geração
de ácido lático através da glicólise microbiana, é o sabor
mais relevante em carnes fermentadas. A acidez também
está correlacionada com outros metabólitos microbianos,
como o ácido acético. A amônia pode ser gerada pela
atividade desaminase e deamidase, geralmente presentes
em leveduras e bolores, reduzindo a intensidade do sabor
ácido. O sabor salgado é geralmente percebido como um
sabor direto da adição de sal. Compostos derivados de ATP,
como monofosfato de inosina e monofosfato de guanosina,
exercem algum aprimoramento do sabor, enquanto a
hipoxantina contribui para o amargor. Outros contribuintes
do sabor são os compostos resultantes da hidrólise de
proteínas. A geração e o acúmulo de pequenos peptídeos e
aminoácidos livres contribuem para a percepção do paladar,
que aumenta com a duração do processo. Alguns desses
pequenos peptídeos (por exemplo, leucina, isoleucina e
valina) também atuam como precursores de aroma,
conforme descrito abaixo.
Aroma
A origem do aroma depende principalmente dos
ingredientes e das condições de processamento. Diferentes
vias são responsáveis pela formação de compostos voláteis
com impacto no aroma (Tabela 28.6). Como mencionado
acima, a proteólise origina uma grande quantidade de
pequenos peptídeos e aminoácidos livres. Os
microrganismos podem converter os aminoácidos leucina,
isoleucina, valina, fenilalanina e metionina em importantes
compostos sensoriais com baixos valores de limiar. Alguns
dos mais importantes são aldeídos ramificados, como 2- e 3-
metilbutanal e 2-metilpropanal, álcoois ramificados, ácidos
como
654
Tabela 28.5.Aspectos de Qualidade: Geração ou Presença de Compostos Não Voláteis Desejáveis Contribuindo para o Sabor em Carnes Fermentadas

Representante Principal Rotas de Presença em Esperado

Grupo de Compostos Compostos Geração Produto final Contribuição principal Intensidade

Peptídeos Tri e dipeptídeos Proteólise Aumenta com o comprimento de Gosto Alto

processo
Aminoácidos livres Ácido glutâmico, aspártico Proteólise Aumenta com o comprimento Gosto Alto
ácido, alanina, lisina, de processo
treonina
Nucleotídeos e Monofosfato de inosina, Degradação de ATP Cerca de 100 mg/100 g Melhoria do sabor Baixo
nucleosídeos guanosina
monofosfato,
inosina, hipoxantina
Livre de cadeia longa Ácido oleico, linoleico Lipólise Aumenta com o comprimento de Gosto Baixo
ácidos graxos ácido, ácido linolênico, processo
ácido araquidônico,
Ácido palmítico
Cadeia curta Ácido acético, propiônico Microbiano Depende da microflora Gosto Médio
ácidos graxos ácido metabolismo
Ácidos Ácido lático Glicolise Depende da inicial Sabor azedo Alto
quantidade de açúcar e
fermentação
Carboidratos glicose, lactose Restante (não Depende da inicial Gosto doce Baixo
consumido através quantidade de açúcar e
glicolise) microflora
Inorgânico Sal Adição Depende da inicial Gosto salgado Alto
compostos quantia
 Tabela 28.6.Aspectos de Qualidade: Geração de Compostos Voláteis Desejáveis Contribuindo para Aroma em Carnes Fermentadas

Grupo de Representante Principal

Compostos Compostos Rotas de Geração Aroma principal Contribuição esperada

Alifático Hexanal, pentanal, Oxidação de insaturados Verde Alto

aldeídos octanal, etc ácidos graxos
Strecker 2- e 3-metilbutanal, Degradação Strecker de cacau torrado, Alto
aldeídos etc. aminoácidos livres verde-queijo
Cadeia ramificada 2- e 3-metilbutanoico Produtos secundários de Suado Médio
ácidos ácido Strecker anterior
degradação
Álcoois Etanol, butanol, etc. Decomposição oxidativa Doce, álcool, etc. Baixo
de lipídios
Cetonas 2-pentanona, 2-heptanona, Oxidação lipídica Etéreo, ensaboado Médio
2-octanona, etc.
Sulfetos Dimetildissulfeto Degradação Strecker de Meias sujas Baixo
aminoácidos contendo
enxofre (metionina)
Ésteres acetato de etila, etila Interação de carboxílico abacaxi, frutado Alto
2-metilbutanoato ácidos e álcoois
Hidrocarbonetos Pentano, heptano, etc. Autooxidação de lipídios Alcano Muito baixo
Dicarbonil Diacetil, acetoína, Microbiano de piruvato Manteiga Baixo
produtos acetaldeído metabolismo
Azoto Amônia Desaminação, desaminação Amônia Variável, depende
compostos crescimento de leveduras

e moldes
Fontes:Adaptado de Flores et al. 1997, Viallon et ai. 1996, Stahnke 2002, Toldrá 2002 e Talon et al. 2002.

655
656 Parte VI: Alimentos Fermentados
Ácidos 2- e 3-metilbutanóico e 2-metilpropanóico, e
ésteres tais como 2- e 3-metilbutanoato de etilo
(Stahnke 2002). Alguns desses aldeídos de cadeia
ramificada também podem ser formados através da
degradação de Strecker, que consiste na reação de
aminoácidos com dicetonas. No entanto, as condições
encontradas em linguiças estão longe das ideais para
esse tipo de reação, que necessita de alta temperatura e
baixa atividade de água (Talon et al. 2002).
Metilcetonas podem ser formadas por oxidação de ácidos
graxos livres ou descarboxilação de ácidos graxos livres.
- - cetoácidos. Outros compostos alifáticos não
ramificados gerados pela oxidação lipídica são alcanos,
alcenos, aldeídos, álcoois e vários ciclos furânicos.
Um grande número de compostos voláteis é gerado
pela oxidação química dos ácidos graxos insaturados.
Esses compostos voláteis são gerados principalmente
durante o amadurecimento e armazenamento posterior.
Outros compostos voláteis de baixo peso molecular são
gerados por microrganismos a partir do catabolismo de
carboidratos. Os compostos mais usuais são diacetil,
acetoína, butanodiol, acetaldeído, etanol e ácidos
acético propiônico e butírico. No entanto, alguns desses
compostos podem ser derivados do piruvato originado
por outras vias metabólicas que não a glicólise de
carboidratos (Demeyer e Stahnke 2002, Demeyer e
Toldrá 2004). O perfil de sabor pode ter variações
importantes dependendo do tipo de microrganismo
usado como starter (Berdagué et al. 1993).
GLOSSÁRIO
ATP – trifosfato de adenosina. Aminopeptidases—
Exopeptidases que catalisam a
liberação de um aminoácido do terminal amino de um
peptídeo.
Backslopping—Prática tradicional que consiste na
adição de linguiça previamente fermentada com propriedades
sensoriais bem sucedidas.
Bacteriocina - Peptídeos de baixa massa molecular
induzida por bactérias lácticas com ação inibitória contra
certas bactérias deteriorantes e patógenos de origem
alimentar.
Catalase—Enzima capaz de catalisar a decomposição
de peróxido de hidrogênio em oxigênio molecular e
água.
Catepsinas—Enzimas localizadas nos lisossomos e capazes de
para hidrolisar proteínas miofibrilares em polipeptídeos.
Descarboxilases—Enzimas capazes de transformar um amino
ácido em uma amina.
DFD—Carne suína com características escuras, firmes e secas
tiques devido à falta de carboidratos no músculo e, portanto,
glicólise pobre e geração reduzida de ácido lático. Essas
carnes apresentam valores de pH acima de 6,0 após 24 horas
post mortem e são típicas de suínos exaustos e estressados
antes do abate.
Glicólise – degradação enzimática de carboidratos
com a formação de ácido pirúvico e ácido lático e a
liberação de energia na forma de ATP. Homofermentativo
- Bactérias gerando uma única extremidade
produto (ácido lático) da fermentação de
carboidratos.
Heterofermentativa—Bactérias gerando vários
produtos (ácido lático, acetoína, etanol, CO2, etc.)
da fermentação de carboidratos.
Lactato desidrogenase—Enzima que catalisa a oxi-
dação do ácido pirúvico em ácido lático.
Lactato racemase—Enzima que catalisa o ácido lático
reações de racemização.
Lipólise – Quebra enzimática de lipídios com a
formação de ácidos graxos livres.
Lipase ácida lisossomal—Enzima que catalisa a re-
liberação de ácidos graxos por hidrólise de triacilgliceróis
nas posições 1 e 3.
Valor de peróxido - Termo usado para medir rancidez e
expressa em milimoles de peróxido absorvidos por 1000
g de gordura.
Proteólise – Quebra enzimática de proteínas com
a formação de peptídeos e aminoácidos livres. PSE—Carne
suína com características pálidas, macias e exsudativas
resultantes de uma glicólise acelerada e, portanto, rápida
geração de ácido lático. A queda do pH é muito rápida,
atingindo valores tão baixos quanto 5,6 em apenas 1 hora
postmortem.
Atividade aquática(umaW)—Indica a disponibilidade de
água em um alimento e é definida como a razão entre a
pressão de vapor de água de equilíbrio sobre o sistema e a
pressão de vapor da água pura à mesma temperatura.
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