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PROCESSO PENAL APLICADO – 2022.

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Profª Wanda Maria Lima

1. OS ATOS JURISDICIONAIS
Os atos jurisdicionais são classificados em:
• Despacho
• Decisão interlocutória
• Sentença
Atentem para a origem etimológica da palavra “jurisdicionais”. Assim,
estão excluídas as atividades administrativas, ou seja, o que o juiz faz
administrativamente.

1.1. Despacho

É aquele destinado ao impulso do processo, desprovidos de qualquer carga


decisória, cujo objetivo é impulsionar o curso do procedimento em direção ao ato
culminante, que é a sentença. Quem é que profere o despacho? Em primeiro lugar, é o
juiz. Compete a ele o ato de despachar. Ex.: os despachos de “junte-se”, “intime-se”,
“dê vista”, etc.
Emenda Constitucional 45/04 – Expressamente disse: servidor também pode por
delegação do juiz. Está no art. 93, XIV, da CF/88.
É possível recurso contra o despacho do juiz? Em princípio, como regra, não
cabe, mas comporta exceções. E quais são as exceções? Quando você pode interpor
um recurso de um despacho?
• Despacho tumultuário – Exemplo: juiz inverte a ordem procedimental.
• Despacho abusivo – Onde há abuso de poder. Também é possível.

Qual é o recurso cabível nessas duas hipóteses de despacho? Correição


parcial. Este é o recurso. Houve uma época e aqui se discutia se a correição era um
recurso administrativo ou jurisdicional. Correição é um recurso jurisdicional.
Última observação sobre o despacho: despacho é despacho e, portanto, não se
fala em coisa julgada.

1.2. Decisão Interlocutória

É aquela dotada de carga decisória, podendo acarretar (ou não) a extinção do


processo, porém sem enfrentamento do mérito principal, ou seja, sem se pronunciar
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quanto à culpabilidade ou inocência do acusado.


Existem duas espécies?

a) Decisão Interlocutória Simples


São aquelas que resolvem questões relativas à regularidade ou marcha
processual, sem que penetrem no mérito da causa. É pouco mais do que um despacho
de mero expediente, já possui um mínimo de caráter decisório e gera gravame para
uma das partes. A decisão interlocutória simples é marcada por três características:
ü Não encerra o processo
ü Não encerra nenhuma fase do procedimento
ü Não decide nenhum pedido incidental
Logo, essas decisões simples, não têm nenhum teor decisivo mais complexo.
Exemplo: recebimento de denúncia ou queixa, decretação de prisão preventiva,
temporária, indefere o pedido de habilitação como assistente da acusação, etc. Em
regra, essas decisões interlocutórias simples são irrecorríveis, salvo se porventura
listadas no rol do art. 581 do CPP, quando será cabível o RSE.

b) Decisão Interlocutória Mista


Também chamadas de decisões com força de definitivas, são aquelas que,
julgando ou não o mérito, põe fim ao procedimento, possui cunho decisório e gera
gravame ou prejuízo para a parte atingida. Encerra uma etapa do procedimento
processual ou a própria relação do processo, sem o julgamento do mérito da causa em
sentido estrito. Tais decisões subdividem-se em:

b.1) Decisão Interlocutória Mista Não Terminativa (ou com força de definitiva)
São aquelas que encerram uma etapa procedimental, tangenciando o
mérito, porém sem causar a extinção do processo. Exemplo: pronúncia. Ela é não
terminativa. Se é não terminativa, claro que não terminou o processo. Uma pronúncia
não encerra o processo. Ao contrário, se tem pronúncia significa que a fase do júri foi
definida. A pronúncia é fundamento para a segunda fase. O que a pronúncia faz é
encerrar o que chamamos de iuditium accusationis, que é a primeira fase do júri.

b.2) Decisão Interlocutória Mista Terminativa (ou decisões definitivas)


São aquelas que extinguem o processo, sem julgamento do mérito, bem como
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aquelas que resolvem um procedimento incidental de maneira definitiva, sem


possibilidade de reexame no mesmo grau.
Ex.: rejeição da denúncia, impronúncia, desclassificação, procedência das
exceções que acolhe a coisa julgada, litispendência, etc.

2. CONCEITO DE SENTENÇA
É a decisão que julga o mérito principal, ou seja, a decisão que condena
ou absolve o acusado.
Acaba com o processo, com ou sem julgamento de mérito. As sentenças são
classificadas em 5 espécies de sentença:

1. Sentença condenatória – Quando julga procedente, total ou parcialmente, a


pretensão punitiva.

2. Sentença absolutória – Quando não acolhe o pedido de condenação.


Subdividem-se em:
- próprias: quando não acolhem a pretensão punitiva, não impondo qualquer sanção
ao acusado;
- impróprias: quando não acolhem a pretensão punitiva, mas reconhecem a prática da
infração penal e impõem ao réu medida de segurança em razão do reconhecimento da
sua imputabilidade total ao tempo do fato (art. 386, VI, 2ª parte, e parágrafo único, III,
do CPP)

3. Sentença declaratória de extinção da punibilidade –Ela não condena,


nem absolve. Só extingue a punibilidade. Exemplo: morte do réu.

4. Sentença que julga uma ação autônoma – Isso dentro do processo penal.
E o que é uma sentença que julga uma ação autônoma? Você liga ação
autônoma com mandado de segurança, habeas corpus, revisão criminal. São
ações autônomas. Não são recursos. Claro que cumprem a função de
recurso, mas não são recursos. Quando o juiz sentencia um HC, ele está
sentenciando uma ação autônoma. Não é absolutória, não é condenatória.

5. Sentença constitutiva – A sentença no processo penal pode ser constitutiva,

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ou seja, constitui uma nova situação jurídica. Exemplo: reabilitação criminal


porque o réu reabilitado tem um novo status jurídico e esse novo status foi
criado por uma sentença.

Toda essa classificação e divisão tem pouca importância teórica, mas tem
importância prática no estudo dos recursos. Qual é o recurso, em regra, cabível de uma
decisão no processo penal? É o RESE. Pela regra geral é o RESE. Se da
decisão interlocutória não cabe o RESE, porque ele é numerus clausus, se a decisão
não entra no art. 581, o recurso é a apelação.

3. CLASSIFICAÇÃO DAS SENTENÇAS (Essa classificação leva em conta o


órgão jurisdicional prolator da decisão):

Sentença Subjetivamente Simples – São aquelas proferidas por apenas um


órgão monocrático. Ex.: a sentença proferida por juiz singular.

Sentença Subjetivamente Plúrima – Sentença proferida por órgão colegiado


homogêneo, como câmaras, turmas ou seções dos tribunais Ex.: acórdão que julgando
apelação da defesa, absolve o réu.

Sentenças Subjetivamente Complexas –são aquelas que resultam do


pronunciamento simultâneo de mais de um órgão monocrático, importando em
prevalência do que foi decidido pela maioria. Exemplo: decisão do tribunal do júri. A
soma de todas as decisões vai dar uma sentença. Os jurados decidem uma parte e o
juiz faz outras coisas. A sentença final é produto de duas vontades: do veredicto e da
participação do juiz. Outro exemplo: a extradição. Em toda nossa história, a extradição
sempre foi ato complexo. Ou seja, o Supremo examina os requisitos da extradição, os
chamados requisitos extrínsecos ou objetivos. O ato de entregar é do Presidente da
República. O Supremo autoriza e o Presidente manda embora.

4. OUTRAS CALSSIFICAÇÕES DA SENTENÇA:


Sentença Material – É a que julga o mérito e extingue o processo.

Sentença Formal – É a que extingue o processo sem julgar o mérito.


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Sentença Autofágica ou de Efeito Autofágico –É a sentença em que o juiz


reconhece o crime e a culpabilidade do agente e, ao mesmo tempo, julga extinta a
punibilidade. Ex.: perdão judicial. O juiz reconhece o crime, reconhece a culpabilidade e
julga extinta a pena.

Sentença Branca – É a sentença do juiz que remete ao tribunal a decisão de


uma controvérsia sobre direito internacional, a decisão de um ponto controvertido sobre
direito internacional. Há sentença branca no Brasil? Não existe. Isso se dava na antiga
Comunidade Econômica Européia. Qual é o princípio que você aplica para dizer que o
juiz não pode fazer isso, não pode remeter questão para o tribunal? Princípio da
indeclinabilidade da jurisdição. A jurisdição é indeclinável. Não existe sentença branca
no Brasil.

Sentença Vazia – Essa é mais simples. É uma sentença sem nenhuma


fundamentação, sem respeitar o princípio da motivação. Exemplo: prisão preventiva
sem fundamento. Tem decisão sobre prisão preventiva aos montes sem
fundamentação. Tem juiz até que pensa que fundamenta ao falar na garantia da ordem
pública, assegurar a execução da lei penal. Ele apenas repetiu o texto da lei.

Sentença Suicida – É a sentença em que o dispositivo (ou conclusão) diverge


da fundamentação, sendo, portanto, nula, caso não seja corrigida mediante oposição
de embargos de declaração. Fere o princípio da congruência. Exemplo: imagine o juiz:
“a vítima não reconheceu o réu, as testemunhas não confirmaram, o réu não
confessou, não há provas; isso posto, condeno a dez anos de prisão.”

Sentença Executável – É a sentença que produz seus efeitos imediatamente.


Exemplo: a sentença absolutória proferida pelo juiz, que importa em imediata liberdade
ao réu nos termos do art. 596 do CPP.

Sentença não Executável – É aquela que, opostamente, não admite execução


imediata, condicionando-se ao trânsito em julgado. Exemplo: a sentença condenatória,
pois a pena nela estabelecida não pode ser executada antes do trânsito em julgado.

4. DA SENTENÇA (art. 381 e seguintes, do CPP)


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4.1. Requisitos
4.1.1. Relatório
Consiste no resumo das principais etapas do procedimento e dos incidentes
que, eventualmente, tenham sido suscitados ou resolvidos no curso do processo.
Ressalvada a hipótese do art. 81, § 3º, da Lei 9.099/95, que dispensa o relatório nas
sentenças do Juizado Especial Criminal, a ausência dessa formalidade é causa de
nulidade absoluta da sentença, já que se trata de formalidade essencial do ato (art.
564, IV, do CPP).

4.1.2 Fundamentação
É requisito geral das decisões judiciais, decorrente de previsão inserida na
CF/88 (art. 93, IX). Consiste no raciocínio lógico realizado pelo juiz a partir do contexto
probatório inserido ao processo. A motivação deverá abranger tanto as matérias de fato
relativas à autoria e à materialidade como as matérias jurídicas que constituem as
teses de acusação e defesa.

4.1.3 Dispositivo
Trata-se da conclusão da sentença, ou seja, é o momento em que, levando em
consideração o raciocínio lógico realizado pela etapa anterior, o julgador condena ou
absolve o réu, indicando os respectivos dispositivos legais.

4.1.4 Parte autenticativa – Local, data e assinatura do juiz.


Corresponde à oposição da assinatura do juiz. Na doutrina e jurisprudência,
prevalece o entendimento no sentido de que a falta de subscrição pelo juiz torna a
sentença inexistente.

4.2. Natureza jurídica


A sentença cria ou declara o direito? Para uma corrente antiquada, a sentença
declara o direito, não cria o direito. Só declara. Porque quem cria é o legislador. E o
juiz? Declara. Divisão de funções.
No entanto, pela posição moderna, o juiz, nas lacunas da lei, cria o direito. Cria a
regra.

4.3. Princípio da imodificabilidade da sentença


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Uma vez publicada a sentença, ela se torna inalterável, imutável, imodificável.


Mas há quatro hipóteses em que o juiz pode modificar a sentença, mesmo depois de
publicada:
• Para corrigir inexatidões materiais
• Para corrigir erro de cálculo
• Embargos de declaração
• Quando advém uma lei penal nova mais favorável.

Quem aplica a lei nova mais favorável? São três respostas possíveis:
1ª) Se o processo está em primeira instância, o juiz aplica.
2ª) Se o processo está no tribunal, o tribunal aplica a lei nova favorável.
3ª) Se o processo está em fase de execução, o juiz das execuções aplica
(Súmula 611, do STF):
STF Súmula nº 611 - DJ de 31/10/1984 - Transitada
em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das
execuções a aplicação de lei mais benigna.

4.4. Coisa julgada


É a imutabilidade da sentença e dos seus efeitos.
Há duas espécies de coisa julgada:

a) Coisa julgada formal – É a imutabilidade da sentença dentro do processo.


Ou seja, ela se projeta para dentro do processo.

b) Coisa julgada material – É a imutabilidade que se projeta para fora do


processo.

Desde que uma sentença transitou em julgado, ninguém mais vai poder
modificar. Nem o juiz dentro do processo e nem outro juiz ou tribunal em outro
processo. Essa é a garantia da coisa julgada.

Não existe coisa julgada material sem a formal porque primeiro se dá a coisa
julgada no processo. Depois se impede que outro processo reexamine aquela causa.

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Mesmo depois da coisa julgada, há exceções em que o juiz modifica a sentença.


Ninguém interpôs recursos, já há coisa julgada e, mesmo assim, o juiz pode rever em
caso de: inexatidão material (nome errado, etc.), erro de cálculo e lei nova favorável (a
lei nova favorável retroage mesmo diante de coisa julgada), modificar a sentença.

O fundamento para a coisa julgada é a segurança jurídica. Se não existisse a


coisa julgada, os litígios nunca teriam fim.

Qual é a função cativa da coisa julgada? Ela impede novo processo sobre o
mesmo fato. E o detalhe: este é o famoso princípio do ne bis in idem. Ou seja, não
pode repetir. A coisa julgada impede a rediscussão do caso.
A hipótese que se pode rediscutir a coisa julgada por meio de instrumento
colocado à disposição do réu é a Revisão criminal. É a única hipótese no processo
penal para rediscussão da coisa julgada. A revisão criminal é o instrumento que desfaz
a coisa julgada. A Revisão no Brasil somente pro reo, ou seja, não existe, no direito
brasileiro, revisão pro acusação, chamada revisão pro societate.
A coisa julgada no Brasil, portanto, é absoluta ou relativa? Resposta: em
regra, a coisa julgada no processo penal é relativa. No processo penal, diferentemente
do processo civil, a coisa julgada sempre foi relativa porque se admite a revisão
criminal. E quando ela é absoluta, que não tem exceções? Ela é soberana quando a
sentença for absolutória.

Algumas questões:
Um réu foi absolvido por falta de prova. Trânsito em julgado. No mês seguinte,a
polícia encontrou um caminhão de prova. O que você pode fazer? Quando ele foi
julgado, não havia prova, não havia testemunha e transitou em julgado. No mês
seguinte, a vítima e as testemunhas compareceram perante o MP. O que o MP pode
fazer? Nada porque não existe revisão criminal para o MP.

O réu negou autoria do crime, o juiz absolveu. No dia seguinte ao trânsito em


julgado ele confessa o delito publicamente. O que o MP poder fazer? Nada! Tudo por
força da coisa julgada, que é uma garantia. É o que leva a certas injustiças. Mas é a
garantia da coisa julgada. A coisa julgada, nesse caso é soberana.

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Qual é a hipótese em que o réu pode ser processado e condenado duas vezes
validamente? Quando alguém pergunta: pode o réu ser processado e condenando
duas vezes? A resposta é: não, em geral isso é ne bis in idem. Mas há uma exceção:
extraterritorialidade da lei penal brasileira. Neste caso, dois processos, duas
condenações, ambas válidas. Uma no estrangeiro e outra no Brasil. O crime ocorrendo
no estrangeiro, normalmente não aplica a lei brasileira. Mas nas hipóteses de
extraterritorialidade aplica-se a lei brasileira.

Qualquer atentado contra o Presidente do Brasil – Haverá dois processos:


um processo lá, pela territorialidade, e um processo aqui, pela extraterritorialidade. E aí
poderá haver duas condenações. Mas no caso do atentado contra o Presidente da
República, haverá duas condenações, ambas válidas. O que se pode é compensar a
pena cumprida lá com a pena imposta aqui. Mas as duas condenações são válidas.

Obs: é comum o juiz, ao fim da sentença, escrever a expressão “P. R. I.”, que quer
dizer “Publique-se. Registre-se. Intime-se.”, que são as ordens de praxe para dar
eficácia à sentença proferida.

A primeira novidade em relação à sentença condenatória, trazida pela Lei


11.719/08, é a hipótese do juiz poder fixar um valor mínimo para a reparação dos
danos causados ao ofendido (artigos, 63, P. único e 387, IV, CPP). O juiz criminal
fixará apenas um valor mínimo de reparação, sem prejuízo da apuração integral no
juízo cível do valor do dano sofrido. Isso evita a liquidação da sentença agilizando a
reparação da vítima ainda que parcialmente.

Outra inovação trazida pela referida lei e contida no art. 387, §1º, do CPP é
a que estabelece que o juiz, ao proferir sentença condenatória, deve decidir, de forma
fundamentada, sobre a manutenção ou decretação da prisão preventiva, ou seja, o juiz
sempre que condenar alguém deverá verificar se estão ou não presentes os requisitos
da prisão preventiva.

SENTENÇA ABSOLUTÓRIA

O art. 386 do CPP enumera as hipóteses em que o réu deve ser absolvido. É
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importante compreender tais incisos para utilizá-los nas alegações finais, no momento
em que é feito o pedido.

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que
reconheça:
I - estar provada a inexistência do fato;
Ex: a vítima do homicídio aparece viva, a vítima do furto diz ter perdido os objetos que
haveriam sido furtados pelo réu.

II - não haver prova da existência do fato;


Ex: quando não se consegue saber se o bem foi mesmo furtado ou se o dono quis
aplicar um golpe na seguradora.

III - não constituir o fato infração penal;


Ex: crime impossível, vítima da corrupção de menores não era menor (ver L. 8069 de
90, art. 244-B, acrescido pela Lei 12.015 de 2009).

IV – estar provado que o réu não concorreu para a infração penal; (redação nova)
Ex: há prova da existência do crime e também há prova de que foram outras pessoas
que o cometeram ou que o réu não o cometeu (por exemplo, o réu comprova que
estava em outro local no momento do crime). Aqui fica cabalmente rompido o nexo
entre o réu e o crime.

V – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal; (redação nova)
Ex: há o crime, mas não há prova para condenar o réu.

VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts.


20, 21, 22, 23, 26 e § 1o do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver
fundada dúvida sobre sua existência; (redação nova)
Ex: hipóteses de excludentes de ilicitude e de excludentes de culpabilidade. Mesmo
que haja dúvida sobre a existência destas.

VII – não existir prova suficiente para a condenação.


Ex: dois réus acusados de lesões corporais recíprocas atribuem ao outro a
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responsabilidade pelo início das agressões e as provas não esclarecem o fato. A única
solução é absolver ambos. Este inciso é criticado por Pacelli, pois “chove no molhado”,
afinal poder-se-ia utilizar os incisos II ou V, caso a prova não fosse “suficiente”.

PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ


A Lei 11.719/08 também inovou ao trazer para o processo penal o princípio da
identidade física do juiz, previsto no artigo 399, § 2º do CPP. Assim, o juiz que presidir a
audiência deverá proferir a sentença. Assim, o juiz levará em conta suas impressões
pessoais no momento de sentenciar. Caso esse juiz que tenha presidido a audiência
não profira a sentença e seja convocado para outra função jurisdicional aplicar-se-á o
disposto no artigo 132 do CPC por analogia, o que é criticado por Gustavo Badaró.
Para Renato Brasileiro: “Diante da revogação do art. 132 do antigo Código de
Processo Civil, e o silêncio do novo CPC acerca das hipóteses que autorizam a
mitigação ao princípio da identidade física do juiz, certamente surgirá o seguinte
questionamento: será que as ressalvas à aplicação do referido princípio dele
constantes – convocação, licença, afastamento por qualquer motivo, promoção
ou aposentadoria –, continuam válidas para o processo penal (CPP, art. 399, §
2º)? A nosso juízo, a resposta é afirmativa. A despeito de o art. 132 do CPC estar na
iminência de ser revogado pelo novo CPC, que não contempla o princípio da identidade
física do juiz, é evidente que, em qualquer ressalva outrora listada pelo referido
dispositivo, cessa a competência do magistrado instrutor para o julgamento do feito. A
título de exemplo, por mais que determinado magistrado tenha presidido a instrução
probatória de determinado feito como titular de uma vara criminal de 1ª entrância, a
partir do momento em que promovido para uma vara criminal de 2ª entrância, este juiz
deixará de ter competência para o julgamento dos feitos por ele instruídos naquela vara
criminal. Por consequência, sob pena de se admitir que um princípio com status de lei
ordinária – identidade física do juiz (CPP, art. 399, § 2º) –, possa se sobrepor a um
princípio com envergadura constitucional – juiz natural (CF, art. 5º, incisos XXXVII e
LIII) –, não se pode admitir que um juiz que deixou de ter competência para o
julgamento do processo em virtude de afastamento legal, logo, incompetente, seja
compelido a julgar o feito pelo simples fato de ter presidido a instrução probatória.”
(Curso de Direito Processual Penal, Ed. Juspodivm, 2016, p. 578)

PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO
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Significa que a sentença deve guardar plena consonância com o fato descrito na
denúncia ou queixa. O juiz só pode julgar aquilo que está sendo submetido à sua
apreciação. Este princípio se submete a algumas regras de suma importância
presentes nos artigos 383 e 384 do CPP.

Emendatio libelli (art. 383, CPP) – “O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na
denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em
conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave”.

Ao oferecer a denúncia ou a queixa, o acusador necessariamente deve descrever um


fato ilícito e, ao final, dar a ele uma classificação jurídica. O réu por sua vez, defende-
se da descrição fática e não do artigo de lei citado. Pode acontecer, assim, que o juiz
entenda estar efetivamente provado o fato descrito na peça inicial, mas que o artigo
citado está errado. Neste caso, o juiz pode condenar o réu diretamente na classificação
que entenda ser a correta, sem a manifestação da defesa, mesmo que a pena seja
mais alta. Ex: a acusação descreve o fato e diz ser estelionato. O juiz entende que o
fato descrito encontra-se comprovado, mas configura furto mediante fraude e não
estelionato condenando o réu por este crime mais grave.

§ 1o Se, em conseqüência de definição jurídica diversa, houver possibilidade de


proposta de suspensão condicional do processo, o juiz procederá de acordo com o
disposto na lei.

Ex: MP tipificou por furto mediante fraude (pena mínima de 2 anos), juiz condenou por
estelionato (pena mínima de 1 ano). Após o MP manifestar o desejo de não recorrer o
juiz remeterá novamente o processo para o MP para que este ofereça a suspensão.

§ 2o Tratando-se de infração da competência de outro juízo, a este serão


encaminhados os autos.

Ex: Juiz altera o artigo de lesão corporal seguida de morte para homicídio doloso. Terá
que remeter para o Tribunal do Júri.

Mutatio libelli (art. 384, CPP) – “Encerrada a instrução probatória, se entender cabível
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nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de


elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério
Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude
desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a
termo o aditamento, quando feito oralmente”.

Este instituto pressupõe que, a peça inicial acusatória descreva um fato, mas as provas
carreadas ao processo demonstrem fato típico diverso. Neste caso o promotor deverá
aditar a denúncia ou a queixa (na ação penal privada subsidiária da pública) para que
seja efetuada a correção.

Obs: elementar altera a estrutura do crime, ou seja, faz com que desapareça ou surja
outro. Já a circunstância aumenta ou diminui a pena, porém o tipo fundamental
continua o mesmo.

Ex: a denúncia descreve uma subtração praticada sem violência ou grave ameaça, ou
seja, um furto e, na colheita de provas, demonstra-se ter ocorrido a violência. Deverá o
MP aditar para descrever o crime de roubo na inicial. Neste caso a pena é mais grave.
Grave ameaça e violência são elementares do roubo. O mesmo ocorreria caso fosse
descrito um crime simples e na instrução ficasse demonstrado ser um crime qualificado
ou com causa de aumento. Ou seja, circunstâncias do crime.
É o Ministério Público quem deve ter a iniciativa para fazer o aditamento para
que não haja ofensa ao sistema acusatório. Porém o legislador, que ia bem na reforma,
pecou ao prever que, caso o promotor não o faça, o juiz deverá utilizar o artigo 28 do
CPP, remetendo os autos ao Procurador Geral de Justiça. Isso é criticável segundo
Rangel, pois se o juiz entender que o réu não praticou o fato descrito na exordial, mas
outro fato qualquer, deveria absolvê-lo pela ausência de materialidade do fato descrito
na inicial. Do jeito que ficou continuou o juiz, de forma inquisitória, imiscuindo-se na
titularidade da ação penal pública ao provocar o incidente do artigo 28, CPP.

Obs: caso seja ação penal privada exclusiva, caberá ao querelante o aditamento, não
havendo aplicação do artigo 28, CPP.

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PUBLICAÇÃO E INTIMAÇÃO DA SENTENÇA


A publicação regula-se pelo artigo 389 do CPP e, após esta, as partes devem
ser intimadas da decisão.
Obs: se a sentença for proferida em audiência na presença das partes estas já
sairão intimadas (artigo 795, §2º, “b”, CPP). O Ministério Público é sempre intimado
pessoalmente (art. 390, CPP). Quanto ao réu, o artigo 392, CPP estabelece uma série
de regras para sua intimação, contudo, em virtude do princípio constitucional da ampla
defesa, entende-se que, qualquer que seja o delito, deverá sempre ser tentada a
intimação pessoal, caso ele não seja encontrado, a intimação será efetuada por edital.
O defensor dativo deve ser intimado pessoalmente e o constituído pela imprensa.

5. QUESTÕES CONTROVERTIDAS

Caso de recurso ex oficio – Súmula 423

STF Súmula nº 423 - DJ de 8/7/1964 - Não transita


em julgado a sentença por haver omitido o recurso "ex-
oficio", que se considera interposto "ex-lege".
O que se entende por essa súmula? Há algumas situações no processo penal
que a lei exige recurso de ofício. A decisão do juiz vai passar pelo tribunal
necessariamente. Por exemplo: concessão de HC, de reabilitação criminal. São
situações que exigem recurso ex officio. A súmula diz que enquanto o tribunal não
reexaminar o caso, não tem coisa julgada. Pode demorar dez anos. Se o juiz esqueceu
e não mandou, não foi para o tribunal, não tem coisa julgada. As situações de recurso
ex officio subsistem ou desapareceram por conta da CF/88? Para o Supremo as
situações de recurso ex officio subsistem.

Limite objetivo da coisa julgada - A sentença tem 4 partes. Que parte transita
em julgado? É a parte decisória, que está no dispositivo. Leia-se, então, não é o
dispositivo que transita em julgado, mas a parte decisória que está dentro do
dispositivo. O que transita em julgado é: “isso posto, condeno; isso posto absolvo.” O
julgamento é imutável. Os fundamentos da sentença não fazem coisa julgada. O limite
objetivo da coisa julgada é a parte decisória. Os fundamentos não transitam em julgado
e mais: a coisa julgada se refere a um fato. Não existe coisa julgada sobre uma ideia,
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uma opinião. Coisa julgada versa sobre fato e aí, quando há um fato, você conclui: fato
julgado jamais pode ser repassado. O fato fica delimitado na narrativa do MP e depois
na sentença. Mas cuidado.

Fato e realidade histórica –Se parte do fato foi julgada, não pode haver novo
processo, ainda que se discuta toda realidade histórica. Ex.:Vamos julgar só uma parte
da realidade histórica. Réu condenado por furto. Transita em julgado o furto. Dez anos
depois, a vítima vem narrar que, na verdade, o condenado apontou uma arma para a
cabeça dela. Isso é descoberto depois da coisa julgada. O fato julgado compõe uma
realidade histórica e toda a realidade histórica deste fato se torna imutável. Morreu,
acabou. Vai ser sempre morto. O que está julgado é toda realidade histórica. Acabou,
ninguém mais mexe naquele caso. Diante disso, alguns probleminhas básicos:

Concurso formal de crimes – Um acidente de trânsito com duas vítimas: um


homicídio e uma lesão corporal. Com um único acidente, duas mortes. Isso é concurso
formal. O MP denunciou a lesão corporal culposa e fez coisa julgada. O processo foi
por um crime só. Indubitavelmente ninguém tinha falado dessa morte. Algum tempo
depois, se descobre que também houve homicídio culposo. Pergunta-se: cabe novo
processo? A lesão já foi julgada. Agora é que se descobriu a morte naquele mesmo
acidente. Cabe novo processo? A resposta: agora é possível. O crime não foi julgado.
E onde está a diferença entre esse caso e o caso do furto que transitou em
julgado e depois a vítima veio e falou que, na verdade, houve uma arma apontada para
a cabeça dela com ameaça? A diferença é que no acidente, há dois crimes distintos:
um já foi julgado e agora você abre o processo pelo outro. Mas agora são dois crimes
distintos. Dois crimes! No caso do furto, o fato é único. É bem verdade que só foi
julgada uma parte dele. Mas lá o fato é único. Como a coisa julgada se refere a uma
realidade histórica, a um fato, aquele fato já ocorreu. No exemplo do acidente há dois
fatos, duas realidades.

Concurso material de crimes - Exemplo: roubo + estupro. São dois fatos. Há


um processo e uma condenação por um. Tem coisa julgada no roubo. Mas a vítima não
falou nada sobre o estupro. Hoje haveria um problema de decadência porque o estupro
é agora de ação pública condicionada. Depende de representação da vítima. Cabe
novo processo sobre o segundo crime? Claro que sim porque são dois fatos distintos,
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PROCESSO PENAL APLICADO – 2022.2
Profª Wanda Maria Lima

autônomos. Só foi julgado um, logo, cabe processo quanto ao segundo fato.

Crime permanente – Crime permanente é aquele cuja consumação se prolonga


no tempo por vontade do agente. Ex.: sequestro. Agora o problema processual: não
importa quanto tempo dura, o crime é único. Logo, processo único. Não pode haver
dois processos sobre um único sequestro. O sujeito sequestrou a vítima por dez dias,
respondeu processo e foi condenado. Aí o mesmo sequestrou a vítima de novo e ficou
com a vítima por três dias. Se acontecer um segundo sequestro, cabe novo processo
porque agora são crimes autônomos.

Crimes de conteúdo múltiplo – A exemplo das drogas e tráfico – Art. 33, da Lei
de Drogas. O art. 33 contempla muitos verbos, é crime de conteúdo múltiplo ou
variado. O princípio que rege os crimes de conteúdo múltiplo é o Princípio da
alternatividade. Vários verbos praticados no mesmo contexto fático é crime único.
Conclusão: quem foi julgado por um fato, por exemplo, 1 kg de cocaína. Aquele quilo
de cocaína é um fato. Posso praticar 500 verbos em cima desse quilo de cocaína
(emprestar, dar, vender, guardar...). O crime é único. Não se discute mais esse quilo de
cocaína. A surpresa é que o réu fez tudo isso (guardou, vendeu, emprestou) e foi
condenado a 5 anos de reclusão. A polícia foi na casa dele ontem e havia 100g
daquele quilo debaixo do colchão. Logo, é fato já julgado. Acabou.

Crime habitual – O que é o crime habitual? Crime que exige reiteração da


conduta. O réu já julgado, condenado, coisa julgada. A pergunta é: descobrimos que
esse sujeito que faz exercício ilegal da medicina faz isso desde 2002. Aparentemente
era um ano. Cabe novo processo? Descobriram 6 anos de exercício ilegal de medicina.
Cabe novo processo? Negativo. Se o crime é habitual, a habitualidade vai de 2002 a
2009. O crime é único. Crime único, acabou. Então, não cabe novo processo nesse
tempo descoberto para tal. Mas olha como muda tudo: o réu foi condenado por exercer
ilegalmente a medicina em SP. Mas ele voltou a exercer ilegalmente a medicina em
Santarém. Se ele continua em outra cidade é fato novo. Fato novo, cabe novo
processo. Agora, cabe novo processo. Você pode até achar estranho, mas o exercício
ilegal da medicina é um dos crimes mais cometidos porque o que tem de médico
formado no estrangeiro cujo título não foi validado no Brasil, exercendo a medicina por
aí, é tudo exercício ilegal da medicina.
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Profª Wanda Maria Lima

Certidão de óbito falsa – Sentença extintiva da punibilidade. Você já imaginou?


O juiz extingue a punibilidade com base em certidão de óbito falsa. Depois da coisa
julgada, a sentença vale ou não. STF: a sentença não vale, ou seja, não se respeita a
coisa julgada. Não tem nada de coisa julgada porque a sentença foi proferida com base
em documento falso. Mas há uma segunda corrente: doutrina unânime quase: respeita-
se a coisa julgada porque não existe revisão pro societat. São duas posições: do
Supremo, da doutrina. E no concurso público? Se for teste, a pergunta vai ter que ser
anulada. Se puder fundamentar, comece pela posição do Supremo, mas fale da
doutrina renomada que diz que não porque não existe revisão pro societat no Brasil.
Você mostrou que conhece o tema.

Limites subjetivos – A coisa julgada vale contra às partes. Absolvido o corréu A,


pode ser processado o corréu B? Depende do fundamento da absolvição. Qual é o
fundamento da absolvição? Absolvição de A por atipicidade. Se é atípico para um é
atípico para o outro. Não pode processar B. Uma sentença absolutória de um réu
acaba repercutindo na vida do outro corréu. A é absolvido por falta de provas, isso não
impede processo contra B porque pode ter prova sobre B.

Execução de sentença contra terceiros que não fizeram parte do processo


– Isso é possível ? Qualquer acidente com carro envolvendo empresa, a
responsabilidade civil é da empresa. A criminal é do motorista. E o motorista foi
condenado. É possível utilizar a sentença contra o motorista para executar civilmente
um terceiro, que é a empresa, que não fez parte do processo? Evidentemente que a
resposta é negativa. Não houve o devido processo legal contra a empresa. A vítima já
conseguiu a condenação do réu no crime, não pode executar a empresa, mas tem
interesses reparatórios legítimos. Ela ajuíza Ação civil ex delicto contra a empresa em
decorrência desse evento.

FIM

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