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Revisão técnica:

Gustavo da Silva Santanna


Bacharel em Direito
Especialista em Direito Ambiental Nacional e Internacional
e em Direito Público
Mestre em Direito
Professor em cursos de graduação e pós-graduação em Direito

Miguel do Nascimento Costa


Bacharel em Ciências Sociais
Especialista em Processo Civil
Mestre em Direito Público

L514 Legislação civil aplicada II / Fabiana Hundertmarck Leal... [et


al.] ; [revisão técnica: Gustavo da Silva Santanna,
Miguel do Nascimento Costa]. – Porto Alegre: SAGAH,
2018.
380 p. : il. ; 22,5 cm

ISBN 978-85-9502-428-1

1. Direito civil. I. Leal, Fabiana Hundertmarck.

CDU 347

Catalogação na publicação: Karin Lorien Menoncin - CRB -10/2147


Fato ilícito
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Analisar as características da ilicitude.


 Definir as diferenças entre o ato e o fato ilícito.
 Aplicar a classificação dos fatos ilícitos.

Introdução
Como ensina Pontes de Miranda (2012), o fato jurídico é um evento ocor-
rido no mundo dos fatos que encontra correspondência em uma norma
jurídica por meio do suporte fático (ações ou omissões previstas nessa
norma). Esse fato jurídico pode se dar por meio do cumprimento das ações
ou omissões esperadas pelo ordenamento jurídico ou pelo desrespeito
a estas, quando estamos diante de um fato ilícito.
Neste capítulo, você vai ler a respeito das características da ilicitude, da
diferenciação entre um fato e um ato ilícito e, finalmente, da classificação
dos fatos ilícitos e das suas repercussões na prática jurídica.

Características da ilicitude
Conforme se depreende do vocábulo, ilicitude é a contrariedade ao que é
lícito, sendo essa figura a representação do que é legal, previsto ou permitido
pela lei ou normas costumeiras.
Dentro da esfera pública, conforme o conteúdo do princípio da legalidade,
aquilo que não se encontra descrito na lei não é permitido, e a extrapolação do
que é previsto é, portanto, ilegal. Já na esfera privada, conforme o princípio
da autonomia da vontade, aquilo que não é expressamente vedado pela lei
é permitido, estando a esfera da ilegalidade restrita ao descumprimento do
que é previsto em lei ou manifestado pela vontade das partes em atos ou
negócios jurídicos.
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É nesse sentido que se torna relevante o seguinte ensinamento de Pontes


de Miranda (2012, p. 70):

Os fatos jurídicos podem ser positivos ou negativos. Há regras jurídicas


cujo suporte fático é o não acontecer, o não ter acontecido, a abstenção, a
omissão, o silêncio. O não-acontecer supõe previsibilidade, de modo que,
tendo-se previsto (ou esperado) A, A não acontece. O não-acontecer, como
fato negativo, está em nós, e não na causação, que é só afirmativa (cadeia de
acontecimentos positivos); porém, na ordem dos atos humanos, que é quase
toda assistida por nós (homens, ruas, veículos, que direta ou indiretamente
os homens conduzem, animais que os homens guardam, entidades coletivas
compostas de homens e dirigidas por homens, obra e trabalhos humanos), a
previsão é fato de cada momento e tem-se de contar com o ato e a omissão, com
o acontecer e o não-acontecer. Não há diferença, aí, entre as duas causalidades,
a do mundo físico e a do mundo jurídico; apenas nesse inserimos previsão
e espera, o que dá significação de causa do que não aconteceu, se devia ser
esperado que acontecesse, ou se devia não ter dado o não-acontecimento.
Muitos acontecimentos e estados jurídicos são tratados como positivos e como
negativos: se A (e.g. boa-fé), A’; se não-A (e.g. má-fé), A’’. Outras vezes, a regra
jurídica somente leva em consideração o acontecimento ou estado positivo,
ou só o negativo, e o acontecimento ou estado negativo, ou o estado positivo
é irrelevante para o direito.

Conforme o autor Pontes de Miranda (2012, p. 83):

A incidência das regras jurídicas é infalível; isto é, todos os suportes fáti-


cos, suficientes que se compuseram, são coloridos por ela, sem exceção. A
vontade humana nada pode contra a incidência da regra jurídica, uma vez
que ela se passa em plano do pensamento. Não se dá o mesmo com a sua
realização. A regra jurídica somente se realiza quando, além da coloração,
que resulta da incidência, os fatos ficam efetivamente subordinados a ela.
Aí, a vontade humana pode muito. Se A devia cortar o cano de água até
meio-dia e o fez, A realizou a regra jurídica que incidira. Se A não o fez,
A violou a regra jurídica. A violação da regra jurídica pode ser direta ou
indireta. Se alguém vende ao filho sem o assentimento dos outros filhos,
viola a regra jurídica do art. 1.132 do Código Civil, para cuja violação a
sanção é a nulidade do contrato de venda e compra. Pode ser que A não
venda ao filho, mas venda a estranho, que doe ao filho ou venda ao filho.
A violação indireta da regra jurídica é um dos pontos mais graves e mais
mal estudados do direito, assim público como privado, razão para termos
de aprofundar a matéria.
Fato ilícito 197

Porém, como alerta Kelsen (1984, p. 49):

As normas jurídicas prescrevem, necessária e fundamentalmente, deveres


jurídicos, ainda que, por derivação, determinem, também, faculdades. Con-
tudo, os deveres da maioria dos indivíduos não são expressos por normas,
embora estejam efetivamente determinados por elas. “[...] a norma primária
considera apenas duas situações fáticas relacionadas como conduta regu-
lada, a saber: um fato antecedente, que é a [...]” licitude — adição nossa
ou a “ilicitude (A), e um fato consequente, que é o ato coativo ou sanção
imputável a essa ilicitude (B).

Nesse sentido, instrui Pereira (2006, p. 653):

A conduta humana pode ser obediente ou contraveniente à ordem jurídica.


O indivíduo pode conformar-se com as prescrições legais ou proceder em
desobediência a elas. No primeiro caso encontram-se os atos jurídicos, entre
os quais se inscreve o negócio jurídico, estudado antes [...] No segundo estão os
atos ilícitos, concretizados em um procedimento, em desacordo com a ordem
legal. O ato ilícito, pela força do reconhecimento do direito, tem o poder de
criar faculdades para o próprio agente. É jurígeno. Mas o ato ilícito pela sua
própria natureza, não traz a possibilidade de gerar uma situação em benefício
do agente. O ato ilícito, pela sua submissão mesma à ordem constituída, não é
ofensivo ao direito alheio; o ato ilícito, em decorrência da própria iliceidade
que o macula, é lesivo do direito de outrem. Então, e o ato lícito é gerador
de direitos ou de obrigações, conforme num ou noutro sentido se incline a
manifestação de vontade, o ato ilícito é criador tão-somente de deveres para
o agente, em função da correlata obrigatoriedade da reparação, que se impõe
àquele que, transgredindo a norma, causa dano a outrem.

Dessa forma, o fato ilícito é um evento ocorrido no mundo dos fatos que
rompe com determinada norma primária (ação ou omissão prevista na norma)
e que faz com que incida uma norma secundária, sendo esta a sanção esperada
pelo descumprimento da primeira.
Dentro da teoria do fato jurídico, portanto, pode-se dizer que o fato ilícito
é aquela ação ou omissão que se encontra com o suporte fático previsto em
determinada norma (seja de forma direta ou indireta). Incide sobre o fato
ilícito, no entanto, não a norma primária, que prevê deveres e obrigações,
mas a norma secundária, que prevê a sanção pela qual a ilicitude será sanada
aos olhos da outra parte, da vítima ou da sociedade, a depender da espécie
de norma incidente.
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Fato ilícito versus ato ilícito


Os fatos ocorridos no mundo real são classificados, por Pontes de Miranda
(2012), em:

 fatos;
 fatos jurídicos;
 atos–fatos;
 atos jurídicos;
 negócios jurídicos.

Para Nader (2014, p. 541):

Ato lícito e ato ilícito são espécies de fatos jurídicos, que se consubstanciam
em acontecimentos que geram, modificam ou extinguem relações jurídicas.
Fatos jurídicos são a grande fonte de criação de direitos subjetivos e de
deveres jurídicos. [...] Tanto o ilícito civil quanto o criminal, em sentido
amplo, representam quebra de dever e violação de direitos subjetivos. No
dizer preciso de Nélson Hungria, “A ilicitude jurídica é uma só, do mesmo
modo que um só, na sua essência é o dever jurídico”. Não há uma distinção
ontológica entre o ilícito civil e o penal. A orientação do legislador se-
gue os imperativos de conveniência. Se determinada conduta é irregular,
afronta, mas sem ferir interesses maiores, contenta-se com a sanção civil.
Na hipótese, contudo, de atentar contra os valores básicos da pessoa, como
a vida, a honra, a liberdade, o patrimônio, o legislador tipifica a conduta,
sancionando-a penalmente.

Dentro dessa classificação, o fato ilícito se encontra, portanto, como uma


contrariedade à norma jurídica primária, que torna determinado fato jurídico
inexistente e faz com que determinada norma secundária venha a incidir sobre
o fato ocorrido no mundo real.
Por exemplo, uma parte realiza a transferência de coisa certa, mas sem
realizar pagamento esperado por ela (ou seja, não havia intenção da parte que
teve a sua coisa subtraída em doar para a parte que adquiriu a coisa). Nesse
caso, deixa de incidir e, portanto, inexiste o fato jurídico compra e venda,
previsto no art. 481 do Código Civil, e passa a incidir o art. 155 do Código
Penal, que disciplina o crime de furto.
Fato ilícito 199

Segundo o art. 481 do Código Civil, “Pelo contrato de compra e venda, um dos con-
tratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo
preço em dinheiro” (BRASIL, 2002, documento on-line). Já segundo o art. 155 do Código
Penal, “Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena — reclusão, de um a
quatro anos, e multa” (BRASIL, 1940).

O fato ilícito, no entanto, também pode ser classificado como fato ilícito
lato sensu e subdivisões, como ato–fato ilícito, ou seja, que independe da
vontade do agente em cometer o ilícito, mas apenas da incidência de norma
que contenha o suporte fático aos atos por este cometido ou omitido, ou ato
ilícito, quando há vontade de realização dos atos contrários à norma primária.
Em relação à classificação dos atos ilícitos, esclarece Pontes de Miranda
(2013, p. 129) que:

Tem-se insistido, demais em separar os atos ilícitos e os atos jurídicos. Em ver-


dade, a regra jurídica incide sobre aqueles como sobre esses; colore-os; dá-lhes
entrada no mundo jurídico. Esses são atos cuja eficácia é ativa; aqueles, atos
cuja eficácia é reativa; Falar-se de atos jurídicos como se só fossem tais os atos
humanos que não importam em reação já é diminuir o sentido de atos jurídicos,
isto é, reduzi-los aos atos não-contrários ao direito, em vez de os considerar como
classe de atos sobre que incide a regra jurídica. Nesse sentido, o crime, o ato ilícito,
é ato + incidência da regra jurídica; e essa é a definição mesma do ato jurídico.

Logo, como esclarece o autor Pontes de Miranda (2013, p. 129):

Os crimes são atos jurídicos; porque atos jurídicos não são somente os atos
conforme o direito, os atos (lícitos) sobre os quais a regra jurídica incide,
regulando-os; são-no também os atos ilícitos, sobre os quais incidem regras
penais, ou de ofensa aos direitos absolutos, ou de reparação dos danos, ou de
violação dos direitos de crédito, ou outros.
Os atos jurídicos, que consistem em declarações ou manifestações de vontade
reguladas pela lei, foram suporte fático de regras jurídicas, que os classificaram
e lhes regulam a eficácia jurídica. Os atos ilícitos, penais ou civis, são tratados
como reprovados e reguladas pelas regras jurídicas e as suas consequências. As
consequências dos atos ilícitos são criações das regras jurídicas, para os repro-
var. Tais atos ilícitos são, por vezes, simples infrações de obrigações pessoais.
200 Fato ilícito

Dessa forma, em que pese seja possível distinguir os atos ilícitos como
espécie pertencente ao grupo dos atos jurídicos, é impossível destacar o úl-
timo grupo do primeiro, eis que ambos fazem parte da mesma família, cuja
característica principal se assenta no aspecto volitivo que os distingue dos
demais fatos jurídicos.
A divisão fundamental, portanto, centra-se na presença ou não da ma-
nifestação da vontade do indivíduo, que é igualmente imprescindível para a
compreensão do conceito de sanção subjetiva e objetiva, em que a primeira leva
em consideração a graduação da vontade do agente ou condições de considerar
a sua atitude ou omissão e a segunda independe da vontade da parte, mas de
uma disposição normativa clara, objetiva e vigente.
No entanto, como lembra Pontes de Miranda (2013, p. 147):

O ato ilícito exige suporte fático completo. Se algum elemento se mostra


menor, ou maior, do que se pensava, ou se desaparece (e.g. a morte, esperada,
não se deu; ou se ficou provado que a coisa caiu devido à ruína do prédio, art.
1.528 e não pode ser lançada, art. 1.529), a figura foi outra e é outra, em vez
de ter sido aquela de que se cogitava.

Assim, dada a gravidade da aplicação de sanções pelo Estado aos cidadãos,


como bem lembra o doutrinador, é necessário que o suporte fático seja com-
pletamente atendido para que incida a penalidade descrita na norma. Portanto,
no caso de responsabilidade, é necessário observar se a norma que incide
sobre a conduta é de tentativa inexitosa ou exitosa, se houve qualificantes ou
atenuantes da conduta, no caso da esfera penal, assim como na esfera civil é
importante a verificação de se tratar de caso de responsabilidade subjetiva
(ato ilícito) ou objetiva (ato–fato ilícito), se há ou não cláusula de exclusão
de ilicitude ou se houve o estrito cumprimento do suporte fático, no caso do
Direito Administrativo.

Dessa forma, é possível concluir que o fato ilícito é uma espécie de fato jurídico que
depende da contrariedade à uma norma jurídica primária (dever) e da incidência de
uma norma secundária (sanção). Ato ilícito, então, é aquela infração em que se avalia
a vontade do agente em incorrer na ilicitude, que, por sua vez, é parte do conjunto
formado pelos fatos ilícitos, junto com a figura dos atos–fatos ilícitos.
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Classificação dos fatos ilícitos


Uma vez compreendida a relação entre o gênero fato ilícito e as suas espécies,
ato–fato ilícito e ato ilícito, passaremos a explorar a classificação de Pontes
de Miranda (2012) e as repercussões na aplicação jurídica.
Segundo o referenciado autor, compõe as espécies de fato ilícito o já men-
cionado ato–fato ilícito:

[...] a contrariedade a direito decorre de ato-fato, ou seja, de fato produzido


pelo homem, sem ser considerada, no entanto, a vontade de praticá-lo, e que
causa prejuízo a terceiro. O mau uso da propriedade que causa prejuízo à se-
gurança, sossego e saúde dos vizinhos, independente da vontade de prejudicar,
é exemplo de ato-fato ilícito (MIRANDA, 2012, p. 193).

Também inclui o ato ilícito lato sensu, que, segundo o autor, seria “ação
ou omissão voluntária, culposa ou não, conforme a espécie, praticada por
pessoa imputável que, implicando infração de dever absoluto ou relativo,
viole direito ou cause prejuízo a outrem” (MIRANDA, 2013, p. 183-185), e
as subdivisões do ato ilícito:

 Ato ilícito stricto sensu ou absoluto. Espécie definida no art. 927 do


Código Civil, caracteriza-se por prescindir de uma relação jurídica
anterior entre o agente que pratica o ilícito e o ofendido. Ocorrendo
o dano, em razão da ação ou omissão do agente, emerge o dever de
indenizar. A reparação tem natureza patrimonial, abarcando tanto os
danos materiais como os morais.
 Ato ilícito relativo. Caracterizado pela violação de um dever que emerge
de uma relação jurídica, seja contratual ou decorrente de outra relação
jurídica, que não a contratual, como, por exemplo, as protegidas pelo
Direito de família, gerando o dever de indenização por perdas e danos.
 Ato ilícito caducificante. Nem sempre a ação ou omissão culposa do
agente, violadora de direitos de outrem, gera o dever de indenizar. Mas,
em algumas situações, pode resultar na perda de um direito. Essa perda,
porém, pressupõe a culpa, na prática do ilícito. Tem-se como exemplo
o artigo 129, X, do Estatuto da Criança e do Adolescente, em que o pai
ou mãe pode perder o pátrio poder em virtude de castigo imoderado
ao filho ou em razão do seu abandono.
 Ato ilícito invalidante. Quando os atos jurídicos (e apenas essa espécie
de fato jurídico, já que envolve a vontade humana) apresentam problemas
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relativos à capacidade, licitude ou possibilidade do objeto, à forma, ou


devido à manifestação viciada da vontade (em virtude de erro, dolo ou
coação), o ato será inválido. O ato foi praticado em desconformidade
ao Direito (portanto ilícito) e a sanção estabelecida não é o dever de
indenizar, mas a nulidade relativa ou absoluta do ato jurídico, previstas,
respectivamente, nos arts. 166 e 171 do Código Civil.

Além da classificação proposta por Pontes de Miranda, também é possível


identificar, no Direito brasileiro, a divisão entre fatos ilícitos cíveis, adminis-
trativos e penais, dependendo da esfera de responsabilidade (norma secundária)
que incide sobre a violação da norma.
Assim, no caso dos fatos ilícitos que se inserem na esfera civil, há incidência
do art. 927 do Código Civil ou seu parágrafo único a partir da noção de culpa lato
sensu ou risco da atividade, complementados pelas disposições especiais do Código
de Defesa do Consumidor e das leis esparsas que regem as relações privadas.

Aquele que, ao abalroar outro carro, causa danos ao veículo do outro condutor, deve pagar
pelos danos causados, uma vez que por negligência ou imprudência os gerou. Dessa
forma, há dever legal de indenização, que pode se dar na forma da restituição integral
ou conserto das peças danificadas por meio de obrigação de fazer (reparar o carro de
outrem) ou da restituição pecuniária (indenização) para que a vítima possa reparar o carro
por seus próprios meios ou satisfazer-se com os valores recebidos pelo agente danoso.

Já no caso dos ilícitos administrativos, é necessária a tipificação prévia


do ilícito em norma certa e anterior (princípio da legalidade) e desobediência
objetiva do preceito normativo, como é o caso das infrações previstas no Có-
digo Brasileiro de Trânsito. A infração do dever de dirigir livre de álcool, por
exemplo, pode gerar multa e suspensão do poder de dirigir por até 12 meses,
independentemente da vontade ou não do agente no descumprimento legal.
Finalmente, no caso de infração de bens-legais especialmente protegidos
como a vida, integridade física e liberdade, podemos nos deparar com
normas de caráter penal, em que são aplicadas as sanções mais severas
de nosso sistema na forma da restrição de liberdade. Para tanto, o nosso
sistema jurídico tradicionalmente requer a presença da vontade do agente
em realizar o dano a outra pessoa ou ao menos o descaso para com o
Fato ilícito 203

bem-jurídico afetado (dolo eventual), estando alguns seletos tipos penais


presentes nas modalidades de tentativa, crime culposo ou mesmo de res-
ponsabilização criminal objetiva (sem análise de culpabilidade), como é
o caso de alguns crimes ambientais.
Assim, é possível concluir que, em nosso sistema, são admitidas duas
classificações principais para os fatos ilícitos, sendo a primeira quanto à
presença ou não de vontade nas condutas contraditoras de normas jurídicas e
as suas ramificações — conforme a classificação de Pontes de Miranda —,
e a segunda uma classificação de ordem prática quanto à natureza da norma
incidente sobre o fato ocorrido no mundo real.

1. Segundo o art.121 do Código Penal a) Ato ilícito.


(BRASIL, 1940), “matar alguém” é b) Fato natural.
um típico ____________, que prevê c) Ato–fato ilícito.
pena de reclusão de 6 a 20 anos. d) Ato jurídico.
Já o art. 927 do Código Civil prevê e) Fato jurídico stricto sensu.
que aquele que, por ___________ (art. 3. A respeito do ato–fato ilícito,
186 e 187), causar dano a outrem, assinale a alternativa correta:
é obrigado a repará-lo. Por fim, o a) O ato–fato ilícito é um
art. 927, parágrafo único, do Código fenômeno natural irresistível.
Civil trata de um ____________: haverá b) A responsabilidade por danos
obrigação de reparar o dano, gerados por explosão nuclear é
independentemente de culpa, caso que gera responsabilidade
nos casos especificados em lei, ou por ato–fato ilícito.
quando a atividade normalmente c) O ato ilícito independe da
desenvolvida pelo autor do dano vontade ou capacidade de
implicar, por sua natureza, risco cognição do agente.
para os direitos de outrem. d) O fato natural é aquele
a) Ato–fato ilícito; ato ilícito; fato ilícito. que não interessa ao
b) Ato ilícito; ato ilícito; ato–fato ilícito. Direito, por tratar-se de
c) Fato ilícito; ato–fato ilícito; ato ilícito. fenômeno incontrolável
d) Fato jurídico; fato ilícito; e, portanto, excludente
ato–fato ilícito. de responsabilidade.
e) Negócio jurídico; ato– e) A ilicitude depende de
fato ilícito; ato ilícito. contrariedade à previsão
2. O acidente em planta nuclear, por se nos costumes sociais,
tratar de responsabilidade objetiva, independentemente
é um exemplo de ___________ ilícito. de norma expressa.
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4. Seguindo a classificação de parte, independentemente


Pontes de Miranda (2012), a perda da sua vontade, cumpre com
do poder familiar é espécie as disposições normativas.
de ato ilícito _____________. c) O ato ilícito é aquele em que
a) Caducificante. a parte, por sua vontade ou
b) Absoluto. descaso, contraria a norma,
c) Relativo. enquanto o ato lícito é quando a
d) Invalidante. parte, por sua vontade, cumpre
e) Stricto sensu. com as disposições normativas.
5. Assinale a alternativa correta sobre d) O ato lícito é aquele em que a
a distinção entre ato lícito e ilícito. parte, independentemente da
a) O ato ilícito é aquele em que a sua vontade, contraria a norma,
parte, independentemente da enquanto o ato ilícito é quando
sua vontade, contraria a norma, a parte, independentemente
enquanto o ato lícito é quando da sua vontade, cumpre com
a parte, independentemente as disposições normativas.
da sua vontade, cumpre com e) O ato ilícito é aquele em
as disposições normativas. que necessariamente houve
b) O ato ilícito é aquele em que a contrariedade à norma,
parte, independentemente da sua enquanto o ato lícito é quando
vontade, por força da natureza, a parte, independentemente
contraria a norma, enquanto da sua vontade, cumpre com
que o ato lícito é quando a as disposições normativas.
Fato ilícito 205

BRASIL. Decreto-Lei nº. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Brasília, DF, 1940.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.
htm>. Acesso em: 8 maio 2018.
BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF, 2002.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso
em: 8 maio 2018.
KELSEN, H. Teoria pura do Direito. 6. ed. Coimbra: Armênio Amado, 1984.
MIRANDA, P. de. Tratado de Direito Privado: Parte Geral — pessoas físicas e jurídicas.
São Paulo: RT, 2012. t. 1.
NADER, P. Curso de Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2014.
PEREIRA, C. M. da S. Instituições de Direito Civil. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. v. 1.

Leituras recomendadas
LARENZ, K. Lehrbuch des Schuldrechts. Berlin: Beck, 1987.
MIRAGEM, B. Direito Civil: Direito das obrigações. São Paulo: Saraiva, 2017.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.

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