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Ontologia da representação documental

Na primeira parte da presente defesa da teoria de Andolina, argumentei que


representações documentais, por serem entidades “presentáveis”, prestavam-se,
racionalmente, a serem requisitos de admissibilidade da execução. Agora, volto à análise,
desta vez mais ontológica, da noção de represenção documental de crédito. Argumentarei
que RDs, embora dotadas de constituição ontológica tal que se preste a ser algo
“presentável” [um “exibível”], esta sua presentbilidade não esgota sua [de RDs]
constituição ontológica. E é na compreensão do que é, realmente, uma representação
documental de crédito, de onde extraio o argumento final de minha contra-refutação a
Medina.

Uma representação documental de algo é um objeto com inscrições que, de


alguma maneira, é usado para corresponder [por analogia ou por convenção],
reprodutivamente, a um certo objeto, o obketo representado. Dessa forma, para que seja
logicamente possível existir uma representação documental de algo, é necessário, antes de
qualquer outra coisa [já que se trata de possibilidade lógica], que este “algo” exista. A
prova desta “condição essencial” de existência de um objeto-representação documental [o
que atesta pela institucionalidade mínima de qualquer representação documental,
institucionalidade apenas “intensificada” quando o objeto representado for um fato
institucional] é a seguinte: é logicamente impossível existir representação documental de
unicórnio, posto que a expressão ‘unicórnio’ é irremediavelmente vazia de referência (ou,
no popular: unicórnios não existem).

Se aquilo que é representado por uma representação documental RD1 é um


fato institucional, RD1 se institucionaliza, necessariamente, de modo que parte ou
fragmento de RD1, para existir, requer mais do que pura faticidade, mas institucionalidade.
Assim, para que exista uma representação documental de um determinado
crédito [dever jurídico individual, conteúdo de um ato jurídico A {existente ou válido, o
que é o mesmo, o presente contexto}], é necessário que exista mais do que um objeto
“bruto”, inteiramente redutível à sua mera constituição ontológica natural ou empírica. É
necessário, sim, que exista um tal objeto, pois isto [que se traduz na sua “presentabilidade”]
é condição essencial para algo ser uma representação documental. Chamo este objeto de
substrato empírico S1.

Todavia, é também necessário que exista, já instituído, o “valor-


institucional-de-representação-documental-de-crédito” [= V-RD(c)]. Isto pela óbvia (a esta
altura do discurso, é claro) razão de que “representações documentais de crédito” não são
entidades de um gênero que possa dizer “existente in rerum natura”.

Finalmente, é necessário que S1 tenha ou porte os atributos, que o mesmo


sistema que institui o valer-representação documental, estipula como conditio sine qua non
para que S1 [e qualquer outro substrato empírico] valha como uma representação
documental de um crédito C.

Eis, portanto, assinalada como “opera” a institucionalidade de uma


representação documental de um crédito.

Para completar a análise – e aqui está o arremate decisivo – da


institucionalidade da representação documental de um crédito, indago: o que determina o
“valor-institucional-de-representação-documental-de-crédito”? Respondo: em virtude da
natureza [= uso ou função] meramente representativa de qualquer RD, o que institui o
valor-representação” vem a ser, precisamente, as normas que determinam quando, um
outro substrato empírico S2, vale como crédito C.

O juiz, na execução, não conhece a existência de S2 – e, por isso, não


conhece a existência [integral] do ato [pois o E-ato ele não conhece]. No entanto, ele faz o
exame – não poderia deixar de fazer, em virtude da transparência da representação – da
subsunção entre aquilo que de S2 estiver representado e as normas que estipulam se S2 vale
ou não como C.

É fundamental, portanto, não perder de vista é que juiz faz o exame desta
correspondência como parte necessária – até onde for possível – de sua atividade de
determinar se existe uma RD(c).

Representação de “algo” que, já pelas informações fornecidas pela própria representação


deste “algo”, se possa aferir que ele “valha como conteúdo do ato A[= crédito C].

INTUIÇÃO FUNDAMENTAL: a representação documental é um objeto que funciona


como um operador semântico [Austin-Recanati] criando um contexto onde “o que existe”
é o objeto representado (e não mais o objeto representante como tal).

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