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Gabriel Augusto Pinto Barbosa

Laringites Agudas e Crônicas

A laringite é um processo inflamatório que acomete a mucosa laríngea, com


congestão e edema. A sintomatologia é variável, dependendo da agressão, extensão e perda
de função. Enquanto nos adultos tende a ser menos grave, tendo a disfonia como sintoma
dominante, nas crianças tende a ser mais grave, principalmente pelo seu menor diâmetro,
cursando com sintomas respiratórios com maior facilidade.
As laringites podem ser classificadas como agudas (geralmente benignas e
autolimitadas, de etiologia viral, com duração média de 8 dias) e crônicas (acima de 3 meses,
mais presente nos adultos, com disfonia progressiva, geralmente de maior gravidade).

LARINGITES AGUDAS:
A LARINGITE ALÉRGICA AGUDA é uma alergia respiratória que cursa com aumento da
secreção na árvore traqueobrônquica com alterações nas membranas de revestimento nasal e
faríngea, resultando em alteração na qualidade vocal, tosse seca e discreta rouquidão, podendo ainda
evoluir com edema laríngeo intenso e dispneia. Apesar de comum, é uma patologia de difícil
diagnóstico, ainda mais por outras afecções relacionadas (RFL, tabagismo, abuso vocal).
O diagnóstico é feito pela anamnese alergológica (sinais evidentes de alergia), com quadro de
edema laríngeo agudo sem outro fator etiológico e videolaringoestroboscopia mostrando edema de
pregas vocais e leve congestão venoarterial submucosa, com fenda irregular durante fechamento
glótico, após excluir outras causas. O tratamento é feito com anti-histamínicos ou imunoterapia,
mostrando melhora do quadro e dos achados videolaringoscópicos.

A EPIGLOTITE é uma inflamação das estruturas da


supraglote, especialmente face lingual da epiglote e pregas
ariepiglóticas, de instalação aguda, causada pelo Haemophilus
influenzae do tipo B (menos frequente atualmente pela vacinação).
Mais comum em crianças entre 2-7 anos, no sexo masculino,
principalmente no final do inverno e início da primavera. A clínica
envolve uma irritação com picos febris e dispneia ao deitar, evoluindo
rapidamente (4-8 horas) para odinofagia intensa e disfagia, com
posição do tripé (corpo inclinado para frente, hiperextensão da cabeça,
mãos nos joelhos e boca entreaberta), tendo obstrução de via aérea de evolução rápida.
O diagnóstico é feito pela anamnese e exame físico. A
videolaringoscopia pode mostrar hiperemia e edema da
epiglote com cor vermelho-cereja (evitar manipulação por
possibilidade de piorar o edema e provocar insuficiência
respiratória), e a radiografia mostra o “sinal do polegar”. O
tratamento pode ser feito com nebulização com epinefrina,
hidratação com solução hipotônica, corticoides
(dexametasona), cefalosporina de segunda geração
(cefuroxima), se atentando sempre para manutenção da via aérea.
A LARINGOTRAQUEOBRONQUITE VIRAL (crupe viral) é a inflamação da laringe, traqueia e
brônquios, de evolução geralmente benigna, causada pelo Parainfluenza I. Mais comum em crianças
de 3 meses a 5 anos (maioria aos 18 meses), no sexo masculino (2:1). A clínica envolve febre baixa
após período prodrômico de 2-6 dias, evoluindo com tosse rouca, intensa e persistente
ladrante/metálica, além de estridor inspiratório, podendo ser bifásico nos casos
mais graves.
O diagnóstico é clínico, podendo ser feita a laringoscopia indireta (pode
mostrar edema subglótico, especialmente em menores de 3 anos, por ser o ponto de
maior estreitamento) e a radiografia mostrando o “sinal da torre de igreja” ou
“ponta do lápis”. O tratamento é feito com nebulização com adrenalina racêmica
(0,25-0,75 mL da solução a 2,25%), e em casos severos é necessária monitorização,
dexametasona (0,6mg/Kg) ou inalação de 2mg budesonida em solução de
nebulização. Manter a criança em observação por pelo menos 4 horas pelo
possível efeito rebote da epinefrina! Em casos de repetição, deve-se pensar em
refluxo gastroesofágico ou estenose subglótica com manifestação subclínica.
A LARINGITE CATARRAL é a forma mais comum de laringite
aguda, causada principalmente pela Branhamella catarrhalis e
Haemophilus influenzae, geralmente após IVAS. Geralmente existem
fatores coadjuvantes que facilitam a infecção, como o tabagismo, abuso da
voz, etilismo e RFL. A clínica envolve globus faríngeo, faringalgia,
constrição, dor no pescoço, tosse seca que evolui para produtiva e
disfonia em diversos graus. O diagnóstico é feito por
nasofibrolaringoscopia flexível mostrando edema laríngeo,
principalmente em glote, com hiperemia e secreção purulenta. O
tratamento é feito com antibioticoterapia de amplo espectro e eliminação
dos fatores coadjuvantes. Podem ter recidivas.

A LARINGITE ESTRIDULOSA, também chamada de crupe espasmódico ou falso crupe, é uma


das formas mais comuns de laringite que acomete crianças. Possui etiologia multifatorial, e clínica
envolvendo dispneia de instalação súbita, geralmente a noite, de evolução benigna (criança acorda
com quadro de sufocação, estridor, tiragem e sudorese, durando de minutos a poucas horas), podendo
persistir a tosse rouca. O diagnóstico é feito pela clínica, e a videolaringoscopia pode mostrar um
edema subglótico com discreto edema de pregas vocais. O tratamento da crise é feito com
umidificação do ar, corticoide oral, salbutamol, anti-histamínicos e nebulização com adrenalina.
Pode ser usado vasoconstritor nasal quando queixa de obstrução nasal importante até melhora dos
sintomas. O tratamento de manutenção é feito com controle da rinite alérgica e do RFL para evitar
recorrência.

A LARINGITE AGUDA NO PROFISSIONAL DA VOZ é uma das principais


causas de disfonia de instalação aguda no cantor. O quadro cursa com faringalgia,
rouquidão, pigarro e tosse. O diagnóstico é feito com
videolaringoestroboscopia com telescópio rígido que mostra hiperemia e edema
das pregas vocais, podendo mostrar ulcerações, hemorragias e hematomas em
casos mais graves. É importante complementar com avaliação funcional do trato
vocal utilizando endoscópio flexível. O tratamento é feito com repouso vocal e
corticoide oral, podendo ser associado o corticoide inalatório a depender da
gravidade (risco de candidíase secundária). Podem ser utilizados antitussígenos,
vasoconstricotres nasais e IBPs, com incentivo ao aumento da ingesta hídrica.
Os descongestionantes orais devem ser evitados pela propensão ao ressecamento
da via aérea, com piora do esforço fonatório e do fonotrauma. Os anti-histamínicos devem ser
administrados com cautela pelo efeito sedativo, que pode piorar a performance do profissional. As
medicações que interferem na coagulação (AAS) não devem ser administradas pelo risco de hematoma.

LARINGITES CRÔNICAS:
A TUBERCULOSE é caracterizada por um processo inflamatório
granulomatoso causado pelo Mycobacterium tuberculosis, causa mais frequente
de lesão granulomatosa da laringe. Possui predomínio do gênero masculino e em
idosos, raramente acometendo crianças. A clínica envolve odinofagia, disfagia e
disfonia progressivas (mais comum em adultos), com estridor e dispneia (mais
comum em crianças). A tuberculose laríngea geralmente está associada a um
quadro pulmonar grave, onde a tosse permite a inoculação direta do bacilo
através da secreção contaminada (ascendente). A via linfática e hematogênica é
rara, e o quadro primário laríngeo também é raro, sendo mais comum em crianças.
O diagnóstico é feito pelos achados de videolaringoscopia (lesão
infiltrante, vegetante ou ulcerada), história clínica, exames de imagem (RX, TC),
baciloscopia de escarro (pesquisa do bacilo), biópsia de lesão oculta ou PPD
(triagem – inoculação com tuberculina e verificação da reação após 3 dias). O
tratamento é feito com Rifampicina, Isoniazida, Pirazinamida e Etambutol (2
meses RIPE + 4 meses RI). A presença de BAAR positivo no final do segundo
mês de tratamento pode indicar micobactéria resistente, e por isso deve ser
realizada cultura e antibiograma. As sequelas envolvem erosão / amputação total
da epiglote, estenose laríngea, fixação da articulação cricoaritenóidea e lesões
cicatriciais em pregas vocais.
A HANSENÍASE é caracterizada principalmente pelas afecções de pele com
hipocromia e alteração de sensibilidade causada pelo Mycobacterium leprae.
Acomete ambos os sexos e em qualquer idade, porém as crianças são mais
suscetíveis. A transmissão ocorre por contato com secreções nasais, de
orofaringe ou por ferimentos na pele dos doentes bacilíferos, com alta
infecciosidade porém baixa patogenicidade e virulência (período de incubação 3-5
anos). Classificada como paucibacilar (mais comum  índice baciloscópico < 2,
teste de Mitsuda positivo com boa reação ao bacilo) ou multibacilar (índice
baciloscópico ≥ 2, teste de Mitsuda negativo por falta de imunidade efetiva). A doença
tem um caráter descendente (nariz  boca e laringe), assim como o
comprometimento laríngeo (epiglote  pregas vocais) por inoculação direta dos
bacilos da cavidade nasal. A sintomatologia envolve aspereza na voz, tosse não
produtiva e sensação de corpo estranho.
O diagnóstico é feito com os sinais de lesão de pele (única ou múltipla), em
geral hipopigmentada com perda de sensibilidade e baciloscopia positiva. Pode
ser feita prova da histamina, prova da pilocarpina, exame histológico, citológico,
PCR, sorologias e reação de glicolipídeo fenólico 1. O tratamento é feito com a
associação de Rifampicina, Dapsona e Clofazimina, com resposta terapêutica
rápida e processo cicatricial em diferentes graus de fibrose.
A SÍFILIS é uma doença causada pelo Treponema pallidum, com
transmissão por relação sexual com parceiro infectado (mais frequente em adultos
jovens sexualmente ativos) ou via transplacentária (sífilis congênita). Pode ser
classificada como sífilis primária (3-90 dias após exposição), secundária (4-10
semanas após infecção) ou terciária (3-15 anos após infecção). O cancro duro na
laringe é incomum e excepcional. O estágio secundário está relacionado a uma lesão infiltrativa
altamente contaminante, e o terciário geralmente acomete epiglote e porção posterior da glote, com
polimorfismo, podendo evoluir com disfagia, disfonia e até mesmo estenose laringotraqueal. As
lesões geralmente são recidivantes, e podem coexistir com com outras em diferentes mucosas,
podendo ter adenite satélite.

O diagnóstico é feito por pesquisa direta em campo escuro (cancro duro),


imunofluorescência direta, testes sorológicos (reações antilipídicas como triagem
e acompanhamento pós tratamento – VDRL, com alta sensibilidade e baixa
especificidade – e reações antitreponêmicas para diagnóstico – FTA-ABS, com alta
especificidade) ou exame anatomopatológico. O tratamento é feito com Penicilina
Benzatina 2,4 milhões UI em dose única (primária, secundária ou latente recente)
ou semanal por 3 semanas (terciária, latente tardia ou indeterminada).
A PARACOCCIDIOIDOMICOSE é uma infecção fúngica causada pelo
Paracoccidioides brasiliensis de evolução aguda e subaguda (jovens com
linfonodomegalia e emagrecimento) ou crônica (adultos, mais comum, lesões
pulmonares e de mucosas). Geralmente acomete gênero masculino entre 30-50
anos (raro na infância), trabalhador rural. A transmissão é feita por inalação dos
esporos, podendo ser primariamente de pele (excepcional). O comprometimento
laríngeo é por disseminação linfo-hematogênica de uma infecção pulmonar
primária, com lesões variáveis, geralmente mostrando áreas de mucosa com
pontilhado hemorrágico (“picada de pulga”), aspecto de estomatite moriforme.
O diagnóstico é feito com videolaringoscopia, histopatológico (certeza –
roda de leme) e avaliação sorológica (imunodifusão dupla,
contraimunoeletroforese, imunofluorescência indireta, ensaio imunoenzimático
ELISA e imunoblot). O tratamento é feito com Itraconazol (escolha, menos efeitos
colaterais, 200mg/dia, 6-9 meses para formas leves e 12-18 meses em formas
moderadas, boa tolerabilidade), Sulfametoxazol-Trimetoprima (principalmente em
crianças, na forma de xarope, 12 meses em formas leves, 18-24 meses nas
moderadas ou solução intravenosa com 2 ampolas 8/8 horas em formas graves) ou
Anfotericina B (1 mg/Kg/dia).
A CANDIDÍASE laríngea é causada pela Candida albicans, sendo
geralmente oportunista, de origem endógena (imunossupressão, uso de ATB,
corticoide inalatório, radioterapia, IOT prolongada, pós operatório, tabagismo,
alcoolismo, doenças oncológicas) associada a um comprometimento oral e/ou
pulmonar. Pode ter tramissão inter-humana em situações excepcionais. A clínica
envolve a disfonia, podendo mostrar enantema, placas esbranquiçadas ou
vegetantes.
O diagnóstico é clínico, porém o de certeza é feito com achado do agente
no exame micológico direto, cultura ou biópsia. O tratamento é feito com
suspensão de Nistatina (gargarejo e deglutição 4x/dia 7-14 dias, usada para a
forma superficial) ou antifúngicos sistêmicos (Itraconazol, Fluconazol ou
Anfotericina B, utilizada para quadros agressivos, na forma invasiva, onde ultrapassa a membrana basal).
A HISTOPLASMOSE é uma micose sistêmica causada pelo Histoplasma
capsulatum. É uma doença acidental, não transmissível, causada pela inalação
de esporos do solo contaminado por fezes de pássaros e morcedos, assim
como cavernas, árvores ocas, construções antigas e sótãos. O quadro clínico é
variado a depender do sistema imunológico do hospedeiro e o grau de exposição,
geralmente cursando com alteração do padrão vocal e lesões ulceradas que podem ser
extremamante dolorosas, dificuldando a deglutição e fonação.
O diagnóstico é feito pela história de exposição ao agente, achados sugestivos no RX de
tórax (múltiplos nódulos hilares e na periferia), teste cutâneo com histoplasmina e sorologia, mas o
diagnóstico de certeza é feito com o crescimento do fungo em cultura. O tratamento é feito com
Itraconazol (100-200mg/dia, 6 meses - 1 ano) ou Anfotericina B (graves, 0,5 - 1 mg/Kg/dia).

A LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA é uma doença


causada pela Leishmania amazonensis, Leishmania brasiliensis e
Leishmania guyanensis, onde há parasitismo dos macrófagos. A
transmissão é feita pela picada do inseto flebótomo. A clínica envolve
disfagia ou disfonia, com lesões infiltrativas, ulceradas ou vegetantes
na supraglote (principalmente epiglote), podendo causar insuficiência
respiratória ao comprometer glote e subglote.
O diagnóstico é feito com exames parasitológicos (isolamento do
parasita), imunológicos (ELISA, IFI, Montenegro – intradermorreação com
reavaliação em 72 horas) ou moleculares. O tratamento é feito com
Glucantime (Antimonial N-Metilglucamina 20mg/Kg/dia até 1500mg) ou
Anfotericina B (resistentes).

Questões:

1) Paciente, sexo masculino, 4 anos, encontra-se irritado com picos febris e dispneia ao deitar.
O quadro evoluiu rapidamente de uma IVAS em 6 horas para odinofagia intensa e disfagia,
levando à dificuldade de deglutição da própria saliva. No PS foi realizada a radiografia abaixo.
O possível diagnóstico e o agente mais comum dessa doença é:
a. Parainfluenza I, Epiglotite
b. Haemophilus influenzae tipo B, Epiglotite
c. Parainfluenza I, Laringotraqueíte viral
d. Harmophilus influenzae tipo B, Laringotraqueobronquite viral
2) Qual a causa mais frequente de lesão granulomatosa da laringe?
a. Leishmaniose
b. Candidíase
c. Tuberculose
d. Hanseníase
3) Paciente do sexo masculino, 54 anos, com rouquidão há 3 meses, realizada nasofibroscopia que mostra
áreas da mucosa com pontilhado hemorrágico, descritas como “picada de pulga” (estomatite
moriforme), no anátomo-patológico foi descrito o patógeno com aspecto de “roda de leme”. O provável
diagnóstico é:
a. Tuberculose
b. Hanseníase
c. Histoplasmose
d. Paracoccidioidomicose;
4) Qual o tratamento de escolha para Histoplasmose?
a. Anfotericina B
b. Fluconazol
c. Itraconazol
d. Cetoconazol
5) Quais os principais agentes da laringite catarral?
a. Branhamella catarrhalis e Streptococcus pneumoniae
b. Haemophilus influenzae e Staphylococcus aureus
c. Branhamella catarrhalis e Klebsiella pneumoniae
d. Branhamella catarrhalis e Haemophilus influenzae;
6) Qual a principal região acometida pela Leishmaniose na região laríngea?
a. Subglote
b. Epiglote
c. Processo vocal
d. Comissura anterior

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