Você está na página 1de 45

Santa Casa da Misericórdia de Itabuna

Pericardite Aguda
Carolina Correia Menezes Fonseca – R1 de Clínica Médica
Lavine dos S. Souza - Interna de Medicina

Itabuna
2023
O Pericárdio
Classificação

• Doença primária x Secundária

• Aguda x Crônica

• Benigna e autolimitada

• Derrame ou constrição pericárdica


Epidemiologia

• Ocorre em 0,1% dos pacientes hospitalizados

• Em até 5% das necropsias

• 5% dos pacientes que procuram o hospital com dor torácica


Etiologias
Etiologias
Diagnóstico Clínico

Dor torácica Atrito pericárdico

- Súbita
- Região anterior do tórax
- Pleurítica
- Piora: inspiração, decúbito, tosse
- Melhora: sentado e inclinado para frente
Derrame pericárdico
Diagnóstico Clínico

Marcadores de alto risco na Pericardite Aguda :

• Elevação de enzimas de necrose miocárdica


Admissão Hospitalar
• Febre acima de 38ºC e leucocitose
Intensificação da avaliação etiológica
• Derrames pericárdicos volumosos com ou sem tamponamento
• Pacientes imunocomprometidos Otimização terapêutica

• História prévia de anticoagulação oral


• Disfunção global pelo ECO
Diagnóstico Clínico

Tamponamento cardíaco :

• Quantidade de líquido > a distensão do tecido fibroelástico pericárdico


• Aumento da pressão intrapericárdica -> redução do volume de enchimento cardíaco -> redução do DC
• Velocidade de instalação / Fator causal
• Agudo x Subagudo
• Diagnóstico é clínico
• Tríade de Beck
• Taquicardia, pressão venosa elevada, hipotensão arterial e a presença do pulso arterial paradoxal
Diagnóstico Clínico

Pericardite constritiva :

• Espessamento fibrótico com calcificação do pericárdico


• “Envelope inelástico”
• Dispneia de esforço e/ou fadiga ; disfunção diastólica ; ascite desproporcional ao edema de MMII
• No pulso venoso jugular ; colapso “Y” proeminente e sinal de Kussmaul
• No pulso arterial : pulso paradoxal
Diagnóstico

O diagnóstico é fechado com 2 ou mais dos seguintes critérios:

Dor torácica do tipo


Atrito pericárdico
pleurítica

ECG com alterações Derrame pericárdico novo ou


sugestivas presumivelmente novo
Marcadores Laboratoriais

Marcadores de necrose miocárdica

• Quando elevados costumam estar presentes nos casos de comprometimento miocárdico associado
(Miopericardite)
• A troponina tem pico em geral no segundo dia após inicio dos sintomas e seus níveis se mantém
elevados por mais tempo que os de CKMB
• Apesar de auxiliar no diagnóstico, tem baixa especificidade e sensibilidade, estando presente em
apenas 27% dos casos de pericardite aguda, no caso da Troponina
Marcadores Laboratoriais

Marcadores de atividade inflamatória

• Marcadores de atividade inflamatória aguda como VHS e PCR costumam estar elevados em 75%
dos casos
• A ausência desses marcadores em uma avaliação inicial não afasta o diagnostico
• Tendem a normalizar dentro de 2 semanas
• Servem como marcadores prognósticos, sendo que valores persistentemente elevados indicam a
necessidade de terapêutica anti-inflamatória prolongada e maior risco de recorrência
• A dosagem seriada de PCR pode ser útil para avaliação da resposta ao tratamento
Marcadores Laboratoriais

BNP/ NT- PROBNP

• Os níveis de peptídeo natriurético atrial do tipo B (BNP) e da fração N terminal do BNP (NT-
PROBNP) podem estar elevados em doenças do pericárdio, porém não há evidencias suficientes
para justificar seu uso rotineiro no diagnóstico da pericardite aguda.
Marcadores Laboratoriais

Outros marcadores de diagnóstico etiológico

• A avaliação sorológica em busca de fator causal deve incluir:


 Dosagem de hormônios tireoidianos
 Provas reumatológicas
 Função renal
 Hemoculturas, na suspeita de infecção bacteriana
 A pesquisa viral através de sorologia em sangue não é recomendada por não possuir correlação
com os achados no pericárdio
• Na presença de derrame pericárdico volumoso a analise do líquido pericárdico pode aumentar a
chance de diagnostico etiológico
Marcadores Laboratoriais
Eletrocardiograma

• O ECG dos pacientes com pericardite costuma estar alterado em 94% dos casos, sendo estes
quando a inflamação se estende ao epicárdio (pericárdio visceral), já que o pericárdio parietal não
apresenta atividade elétrica.
• Ocorrem alterações nos segmentos PR, ST e no ritmo, variando de acordo com a fase da
pericardite.
• As alterações eletrocardiográficas tendem a ocorrer em um padrão evolutivo e acontecem em 4
estágios
Eletrocardiograma

• Estágio I: A alteração mais encontrada é o supradesnível de ST, com ST de aspecto CÔNCAVO.


• Esse aspecto pode ser visto em várias derivações , geralmente poupando V1 e aVR.
• Pode haver infradesnível do PR, exceto em aVR, onde ocorre supradesnível, sendo uma alteração
mais específica porém menos observada. Presente sobretudo em derivações periféricas e
precordiais esquerdas (V5 e V6).
Supra de ST difuso que
poupa V1 e aVR + infra
de PR em derivações
precordiais
Eletrocardiograma

• Estágio II: Ocorre normalização do segmento ST e do PR, além de achatamento da onda T


Eletrocardiograma

• Estágio III: Nem sempre está presente, pode-se observar o desenvolvimento de inversões difusas
da onda T, simulando isquemia miocárdica, após normalização do segmento ST.
Eletrocardiograma

• Estágio IV: Geralmente o ECG normaliza semanas após a resolução do quadro, em alguns casos a
inversão de onda T se mantem, levando à denominação de “pericardite crônica”.
• Alterações de ritmo podem ocorrem em qualquer estágio e variam de taquicardia sinusal a arritmias
atriais diversas.
• Outras alterações:
o ECG de baixa voltagem/ baixa amplitude de QRS: Ocorre no derrame pericárdico e pode ser
observado como QRS de no máximo 5mm no plano frontal e no máximo 10mm no plano horizontal.
o Alternância de morfologia no QRS: Pode ocorrer na pericardite com derrame pericárdico volumoso e
sinais de tamponamento cardíaco.
Eletrocardiograma

Como diferenciar o supra de ST da pericardite do IAM?

• O supra de ST da pericardite geralmente possui concavidade voltada para cima, ao contrário do IAM
• Na pericardite é comum o infradesnivelamento do intervalo PR, o que não ocorre no IAM
• Na normalização do ECG da pericardite a inversão de onda T só ocorre quando o ST já voltou à linha de base
• O supra de ST da pericardite não evolui com formação de onda Q de necrose ao ECG.
Eletrocardiograma

Como diferenciar o supra de ST da pericardite do IAM?

Pericardite IAM Pericardite IAM


Eletrocardiograma
Eletrocardiograma
Eletrocardiograma

IAM PERICARDITE
Distribuição do supra Território de 1 artéria Difuso + infra de ST de aVR e V1

Imagem em espelho Geralmente presente Não ocorre

Magnitude do supra Pode passar de 5mm Não costuma passar de 5mm

Ondas Q patológicas Presente em boa parte dos casos Ausentes

Concavidade Para cima inicialmente e para baixo Para cima


após algumas horas

Infra de PR Incomum Comum e presente em varias


derivações

Inversão de onda T Ocorre ainda na vigência de supra Ocorre após normalização do


segmento ST
Ecocardiograma

• Deve ser realizado em todos os casos suspeitos


• Tem grande utilidade no acompanhamento da resposta terapêutica e do prognóstico
• Pode se visualizar aumento do espessamento do pericárdio e presença de derrame pericárdico.
• Quando o tamanho do derrame ao modo M é <10mm, temos derrame pequeno; quando mede entre
10- 20mm e circunda o coração temos um derrame moderado, acima de 20mm temos derrames
pericárdicos importantes.
• O ECO pode oferecer ainda informações acerca da etiologia, permitindo caracterizar aspecto do
liquido (transudato ou exsudato), presença de fibrina, cálcio, coágulos, massas ou cistos.
• Pode ocorrer pericardite sem alterações no ecocardiograma, sendo denominada “pericardite aguda
seca”
Ecocardiograma
Tomografia computadorizada de coração (TCC)

• Espera-se encontrar pericárdio uniformemente espessado, derrame pericárdico e algum realce


precoce após contraste venoso.
• A densidade do derrame pericárdio deve ser medida, pois transudatos tem baixa densidade (0-10
UH) ao contrario de exsudatos, hemorragias e neoplasias.
Ressonância magnética cardíaca

• É o padrão- ouro, permitindo quantificar o grau de espessamento e o volume do derrame


pericárdico
• Se distingue por permitir a identificação de sinais sugestivos de injuria inflamatória miopericárdica
através da técnica do realce tardio
• A RMC tem indicação classe IIA (nível de evidência B) pelas diretrizes brasileiras de
Miocardite / Pericardites para avaliação de pericardite aguda ou crônica e pericardite
constritiva com ou sem calcificação pericárdica.
Tratamento

• A hospitalização é desejável na maioria dos casos inicialmente, para investigação etiológica e


atentar para sinais ou sintomas de tamponamento
• O tratamento envolve uso de um AINE, em dose anti-inflamatória, até melhora dos sintomas e
queda da proteina C reativa, após esse período reduzir a dose semanalmente por 3 semanas,
guiando-se pelos níveis séricos de PCR como marcador de atividade inflamatória.
• O AINE de escolha pela Diretriz Brasileira de Miocardite e Pericardite é o Ibuprofeno na dose de
400-800 mg, a cada 6 ou 8 horas, inicialmente por 14 dias e após esse período de acordo com
resposta clínica/ normalização da PCR.
• AAS e Indometacina também podem ser utilizados, em caso de intolerância ao Ibuprofeno, evitando-
se uso de Indometacina na pericardite pós-IAM, pois reduz o processo cicatricial.
Tratamento

• Além do uso de AINE, a Colchicina tem se mostrado efetiva na terapêutica coadjuvante na


pericardite aguda, no alivio da dor e na prevenção de recorrência.
• É utilizada na dose de 0,5 mg de 12/12h ou 0,5 mg a cada 24h nos pacientes com menos de 70kg,
pelo período de 3 meses caso se trate de primeiro evento e 6 meses na pericardite recorrente.
• Nas formas mais graves e recorrentes alguns estudos sugerem uso por 12-24 meses após ultimo
período de recorrência, com retirada gradual.
• O principal efeito adverso é diarreia, acometendo menos de 8% dos pacientes e em casos raros
hepatotoxicidade e miotoxicidade
Tratamento

• O uso de corticoides para supressão da atividade inflamatória, apesar de ocasionar dramática


melhora clínica e inflamatória, é reservado para situações especiais pois favorece o
desenvolvimento de recorrência.
• Pode ser utilizado em situações de ausência de resposta terapêutica aos AINES e Colchicina ou
quando a pericardite é secundária a doença autoimune, doença do tecido conjuntivo ou pericardite
urêmica.
• A dose recomendada de Prednisona é de 1mg/kg de peso, com duração de 2-4 semanas.
• Para evitar o fenômeno de recorrência imunológica com reativação da pericardite, a retirada deve
ser lenta e gradual e deve ser feita com associação da Colchicina.
Particularidades

Pericardite recorrente

• Inicialmente reavaliar possível fator causal:


• 1) Esquema terapêutico inadequado
• 2) Posologia inadequada
• 3) Uso de corticoide associado a retirada rápida.
• 4) Reativação em decorrência da replicação viral por uso de corticoide
• 5) Reinfecção Se recorrência frequente, associar
Azatioprina ou Ciclofosfamida!
• 6) Reativação de doença autoimune
• Na ausência desses fatores, considerar uso de corticoide em pacientes com crises frequentes e
comprometimento clinico importante. Recomenda-se Prednisona, 1-1,5mg/kg por 4 semanas e
retirada lenta, por cerca de 3 meses.
Particularidades

Pericardite piogênica

• Associada a febre alta, calafrios e prostração, com menor preponderância de dor torácica.
• O diagnostico pode ser retardado pela apresentação atípica, tendo por isso pior prognostico, com
até 70% de mortalidade.
• Costuma ocorrer por infecção contígua (pneumonia, empiema pleural, mediastinite)
• O diagnóstico é feito com pericardiocentese e o tratamento com antibioticoterapia empírica,
inicialmente para estafilococo, e drenagem do liquido pericárdico.
Particularidades

Pericardite urêmica

• As toxinas nitrogenadas parecem agir diretamente sobre os folhetos pericárdicos, tornando-os


friáveis e propensos a hemorragias, sendo comum o derrame pericárdico sanguinolento.
• Na maioria dos casos responde bem à dialise, nos casos em que isso não ocorre podemos indicar
AINE (de forma cautelosa), corticoide local ou pericardiectomia.

Associada à febre reumática

• Pode se associar ou não ao comprometimento de outras estruturas cardíacas


• Tem curso autolimitado, com raras complicações
• O tratamento é feito com AAS ou corticoide
Particularidades

Lupus

• A pericardite é a manifestação cardiovascular mais frequente do LES, ocorrendo em até 45% dos
casos, estando associada às demais manifestações de atividade de doença.
• Inicialmente pode ser feito o tratamento habitual, caso não haja resposta, pode ser feito corticoide.

Relacionadas ao IAM

• Os pacientes com IAM também podem se apresentar com pericardite, sendo um importante
diagnostico diferencial com nova isquemia miocárdica
Particularidades

Pós cirurgia cardíaca

• Sua causa é o próprio trauma da pericardiotomia. Geralmente ocorre na primeira semana de pós-
operatório.

Pericardite tuberculosa

• Ocorre em 1-4% da população com TB pulmonar, tendo mortalidade de aproximadamente 85% se


não tratada.
• Pode se apresentar em 4 estágios: seco, efusivo, fase absortiva e fase constritiva.
• Tem apresentação clinica variável, sendo insidiosa no começo.
• Existem algumas opções de esquemas testados e o tratamento costuma ser feito por 3 meses.
REFERÊNCIAS

Montera M.W., Mesquita E.T., Colafranceschi A.S., Oliveira Junior A.M., Rabischoffsky A., Ianni B.M., et al.

Sociedade Brasileira de Cardiologia. I Diretriz Brasileira de Miocardites e Pericardites. Arq Bras Cardiol

2013; 100(4 supl. 1): 1-36

JATENE, Ieda B.; FERREIRA, João Fernando M.; DRAGER, Luciano F.; et al. Tratado de cardiologia

SOCESP. [Digite o Local da Editora]: Editora Manole, 2022.

Você também pode gostar