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Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro


GAB. DES MAURICIO CALDAS LOPES
DÉCIMA OITAVA CAMARA CIVEL

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0020370-60.2021.8.19.0001


APTE. ALESSANDRA MARCIA RIBEIRO
APDA. SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE
RELATOR: DESEMBARGADOR MAURICIO CALDAS LOPES

Indenizatória por danos materiais e morais.


Plano de saúde.
Pretensão de reembolso integral das despesas médico-hospitalares, além de indenização
por danos morais.
Necessidade premente de internação da autora em clínica de rede não credenciada, por
alegada falta de estabelecimento credenciado e tecnicamente habilitado para internação
psiquiátrica em quarto individual.
Sentença de improcedência.
Apelação.
Relação de consumo.
Embora objetiva a responsabilidade da ré (CDC, art.14), mesmo quando invertidos os
ônus da prova, ainda assim remanesce íntegro o ônus da parte autora de comprovação
dos fatos constitutivos de seu direito, especialmente no que respeita à existência de
falha na prestação do serviço -- Enunciado 330 da Súmula do TJRJ.
Ausência de prova da recusa de internação pelas clínicas referenciadas da ré.
Prova de fácil produção, suficiente uma simples declaração, por escrito, das clínicas
indicadas pela ré, no sentido de que não aceitavam receber a paciente nas condições em
que indicadas pela médica assistente, tanto mais que uma delas se situa na Tijuca, bairro
contíguo ao que reside a autora com seus genitores, no do Grajaú, nesta cidade.
Reembolso de despesas médico-hospitalares em clínica e profissionais não referenciados
que deve se dar segundo os termos contratados, não assim, pela integralidade postulada.
Art. 12, inciso VI da Lei 9.656/98.
Precedente do E.STJ.
Inexistente comprovação de falha ou ilícito atribuíveis à seguradora ré, nem quanto à
oferta da internação, nem ao reembolso na forma contratada, a improcedência da ação
era mesmo de rigor.
Honorários recursais.
Recurso não provido.
Vistos, etc.
1. AÇÃO INDENIZATÓRIA intentada por ALESSANDRA MARCIA
RIBEIRO em face de SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE, ao escopo
de reparar-se dos danos materiais e morais suportados em virtude de sua
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Assinado em 22/07/2022 18:28:02


MAURICIO CALDAS LOPES:24352 Local: GAB. DES MAURICIO CALDAS LOPES
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internação em clínica psiquiátrica particular, por alegada falta de


estabelecimento referenciado pelo plano de saúde que oferecesse
internação nas condições em que indicadas por sua médica assistente,
que a douta juíza de 1º grau entendera de julgar improcedente,
submetida a autora ao pagamento das despesas processuais e honorários
advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa (índice 451).
1.1 Daí o recurso dessa a propugnar pela procedência da
ação, ao argumento de que a ré não impugnara o laudo da médica
assistente quanto à infraestrutura necessária a seu tratamento e tampouco
provara que as quatro clínicas conveniadas realizassem internação
psiquiátrica nos moldes prescritos. Afirma que a demandada não atendera
ao despacho que determinara a sua manifestação “sobre a negativa de
internação e as clínicas e/ou hospitais conveniados ao plano de saúde que
ofereciam tratamento psiquiátrico em quarto individual” (sic) e deixara de
indicar uma clínica para a internação da autora. Acrescenta que a
operadora tampouco impugnara a afirmação de que a mãe da autora
contactara, via telefone, as quatro clínicas indicadas pelo plano, e que
nenhuma delas fazia internação psiquiátrica em quarto individual, tudo a
ensejar a presunção de veracidade dos fatos alegados na inicial (art. 341
do CPC). Sustenta que os fatos vivenciados lhe causaram também danos
imateriais, aplicáveis, no caso, as Súmulas 209 e 339 do TJRJ (índice
464).
1.2 Contrarrazões em prestígio à sentença, com a ressalva
de que a ré não recusou atendimento à autora e de que esta jamais entrou
em contato para informar qualquer dificuldade de atendimento/internação
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nas clínicas conveniadas. Aduz, ademais, que o reembolso, na hipótese


de o segurado optar por recorrer a profissional ou estabelecimento não
referenciado, se dá de acordo os critérios pactuados (índice 485).
Assim relatados, decido:
2. Tempestiva a insurgência e presentes os demais
pressupostos objetivos e subjetivos da respectiva admissibilidade, dele se
conhece.
3. Anoto, por primeiro, que a relação entre as partes é de
consumo, submetida, portanto, ao diploma consumerista, em especial a
seu art. 14, que apenas admite o afastamento da responsabilidade objetiva
mediante prova de que, prestado o serviço, o defeito não existiu ou que se
dera em decorrência de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (art.
14, § 3º do CDC).
4 Na espécie, a autora, após atentar contra a própria vida
cortando os pulsos com uma tesoura, fora levada por sua genitora à clínica
psiquiátrica Espaço Clif Mente e Vida S/A por alegada indicação da médica
psiquiatra Dra. Paula Maia, submetida à internação em caráter de
urgência, e somente após os primeiros socorros tomou conhecimento de
que a clínica não era conveniada da ré.
4.1 Malgrado a usuária alegue que a sua transferência para
uma clínica conveniada restou impossibilitada, porquanto nenhuma delas
realizava internação nas condições indicadas por sua médica assistente
(laudo médico, índice 109), não fez prova alguma de tal recusa, que a
legitimaria a buscar a internação em estabelecimento não referenciado e
a reembolsar-se integralmente das despesas efetuadas...
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Cumpre ressaltar que a autora também não provou que


a internação na clínica Espaço Clif fora recomendada pela médica
psiquiatra que lhe assistia -- Dra. Paula Maia --, porquanto no único laudo
médico juntado aos autos, emitido pela profissional em 29/01/21, ou seja,
9 dias após a internação, não há qualquer recomendação de que a
internação devesse, especificamente, ocorrer nesta clínica. Ademais, a
demandante sequer comprovara que a referida médica lhe assistia desde
antes da internação, eis que todos os documentos emitidos por ela – laudo
e recibos de honorários médicos – se referem a período posterior à
internação.
4.2 Assim, no evolver processual, a paciente não cuidou de
demonstrar os fatos constitutivos de seu direito, ainda que a prova
necessária fosse de fácil produção, suficiente uma simples declaração,
por escrito, das clínicas conveniadas à ré, no sentido de que não
aceitavam receber a paciente nas condições em que indicadas por sua
médica assistente, tanto mais que uma delas se situa na Tijuca e está
muito mais próxima da residência da autora e de seus genitores, no bairro
do Grajaú, do que a clínica não referenciada em que optara por se internar,
situada em Botafogo.
E, mesmo diante da manifestação judicial de índice 118,
em que o magistrado de piso apontou que “a autora não comprova a
negativa de internação, nem tampouco, que as clínicas e/ou hospitais
conveniados ao plano de saúde não ofereçam tratamento em quarto
individual”, manteve-se ela inerte quanto à produção das provas que lhe
competia, a teor do disposto no art. 373, I do CPC, ônus de que nem
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mesmo a incidência do CDC, ainda que invertido o ônus da prova, a libera


consoante o entendimento consolidado no Enunciado 330 da Súmula do
TJRJ, verbis:
"Os princípios facilitadores da defesa do consumidor em juízo, notadamente o
da inversão do ônus da prova, não exoneram o autor do ônus de fazer, a seu
encargo, prova mínima do fato constitutivo do alegado direito"
5. Digno de nota que a autora fora internada em 21/01/21
e apenas em 29/01/21 ajuizara a presente ação, sem provar qualquer
negativa de internação por parte da ré, que fora intimada em 02/02/21 para
falar sobre o pedido de tutela de urgência, um dia antes da alta da autora,
que ocorrera em 03/02/21. Ou seja, todo o período de internação
transcorrera sem que a ré tivesse qualquer ciência do fato e os
próprios e-mails enviados para as clínicas foram remetidos também
no dia 29/01/21, já no final do período de internação, de modo que,
acaso positivas as respostas – que, aliás, não foram juntadas aos autos -
-, de nada prestariam...
O pedido de tutela de urgência veiculado, por sua vez,
não era no sentido de cumprimento do contrato com a disponibilização de
quarto individual em clínica conveniada, mas de obrigação alheia aos
termos pactuados, qual seja, o custeio integral da internação da autora na
clínica que elegera, de modo que fora sobre tal ponto -- a impossibilidade
de reembolso integral -- que se manifestara a ré (índice 131).
6. Nesse cenário, diante da internação da autora em
clínica não credenciada, o reembolso se dará na forma pactuada -- jamais

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de modo integral como almeja a autora --, nos termos do disposto no art.
12, inciso VI da Lei 9.656/981. A propósito:
PROCESSUAL CIVIL. CONTRATOS. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. APRECIAÇÃO DE TODAS AS QUESTÕES RELEVANTES DA
LIDE PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. AUSÊNCIA DE AFRONTA AO ART. 1.022 DO
CPC/2015. PLANO DE SAÚDE. ATENDIMENTO DE URGÊNCIA FORA DA REDE
CREDENCIADA. REEMBOLSO. LIMITAÇÃO. PREÇOS DE TABELA DA
OPERADORA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM
JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA N. 83 DO STJ. DECISÃO
MANTIDA. 1. Inexiste afronta ao art. 1.022 do CPC/2015 quando o acórdão
recorrido pronuncia-se, de forma clara e suficiente, acerca das questões suscitadas
nos autos, manifestando-se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam
infirmar a conclusão adotada pelo Juízo. 2. Nos termos da jurisprudência do
STJ, "é lícita a cláusula que limita o reembolso à tabela da prestadora de
assistência à saúde, nos termos do artigo 12, VI, da Lei 9.656/98" (AgInt
no AREsp 1.278.739/SP, Relatora Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI,
QUARTA TURMA, julgado em 16/10/2018, DJe 24/10/2018). 3. Agravo interno
a que se nega provimento (AgInt no AREsp 1450612/SP, Rel. Ministro ANTONIO
CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 26/11/2019, DJe 03/12/2019).

6.1 E não tendo havido recusa de atendimento – afinal duas


clínicas especializadas foram postas à disposição da autora na cidade em
que reside --, nem mesmo recusa do reembolso nos limites do contrato,
não há dano de índole material ou moral a cobrar reparação.

1 Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o §
1o do art. 1o desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as
respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as
seguintes exigências mínimas:
(...)
VI - reembolso, em todos os tipos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, nos
limites das obrigações contratuais, das despesas efetuadas pelo beneficiário com assistência à saúde, em
casos de urgência ou emergência, quando não for possível a utilização dos serviços próprios, contratados,
credenciados ou referenciados pelas operadoras, de acordo com a relação de preços de serviços médicos
e hospitalares praticados pelo respectivo produto, pagáveis no prazo máximo de trinta dias após a entrega
da documentação adequada;
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7. Sem outras considerações, por desnecessárias, nega-


se provimento ao recurso o, majorados, nos termos do §11 do artigo 85
do CPC, os honorários advocatícios a 12% sobre o valor da causa.
Intimem-se.

Rio de Janeiro, 22 de julho de 2.022.

Desembargador Mauricio Caldas Lopes


Relator

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