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Brasília, 2015
Elaboração:
Edir MELLO
Gilberto Aparecido ANGELOZZI
Vassia Alexandre POUCHAIN
Produção:
Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e
Editoração
Sumário
Organização do caderno de estudos e pesquisa...................................................................................................... 4
Introdução.............................................................................................................................................................................. 6
Aula 1
A questão do conhecimento...................................................................................................................................... 9
Aula 2
A Sociologia como ciência: uma perspectiva histórico-crítica....................................................................20
Aula 3
A Educação como fenômeno social e objeto de estudo da Sociologia.................................................... 36
Aula 4
As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional........ 43
Aula 5
DIFERENÇA, EXCLUSÃO SOCIAL E Desigualdade Social.............................................................................81
Aula 6
Processos Educacionais no Brasil e as Teorias Contemporâneas da Sociologia da Educação......... 94
Referências........................................................................................................................................................................ 102
Organização do caderno de
estudos e pesquisa
Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos,
de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com
questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar sua leitura mais
agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para aprofundar os estudos
com leituras e pesquisas complementares.
A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa.
Provocação
Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.
Para refletir
Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa
e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio.
É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus
sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas
conclusões.
Praticando
4
Organização do caderno de estudos e pesquisa
Atenção
Saiba mais
Sintetizando
5
Introdução
Seja bem vindo ao curso de Sociologia da Educação. É com grande alegria que iniciamos esta
jornada junto com você. Nosso objetivo central aqui é examinar algumas das principais propostas
relativas às teorias sociais sobre Educação, refletindo sobre a problemática que informa cada
análise, contrastando-as e destacando os esforços de síntese.
Nosso propósito, por meio da comparação de algumas correntes teóricas, será o de colocar em
perspectiva as concepções sobre educação vigentes em diferentes contextos histórico-sociais.
Para tanto, faremos uso da literatura clássica publicada na área de Ciências Sociais sobre os
processos educacionais e materiais de pesquisas em andamento na atualidade.
Um dos pontos básicos da discussão será a relação entre educação e sociedade e os processos
de produção e reprodução do fenômeno educacional na sociedade capitalista.
De certo teremos um olhar voltado para as especificidades da relação entre sociologia e o campo
educacional e, tanto quanto possível, buscaremos contemplar demandas específicas da escola
reconhecida como instituição formal, responsável pela aprendizagem.
Objetivos
6
Introdução
»» Diferenciar os dois critérios de cientificidade que se encontram por trás das ciências
naturais e das ciências sociais, alargando, com isso, a própria noção de ciência.
7
A questão do conhecimento
Aula
1
Apresentação
Assim sendo, este capítulo tem como objetivo refletir sobre as diferenças existentes entre o
conhecimento de senso comum e o conhecimento científico, no que diz respeito aos três elementos
básicos para a existência de um conhecimento científico, a saber, sujeito, objeto e método.
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
»» Localizar no conhecimento científico uma condição essencial para se romper com uma
visão superficial dos acontecimentos sociais.
9
AulA 1 • A qUESTÃO DO CONhECImENTO
A questão do conhecimento
10
A QUESTÃO DO CONHECIMENTO • AULA 1
Chama-se senso comum o conhecimento espontâneo, o saber resultante das experiências cotidianas
do homem no enfrentamento dos obstáculos do dia a dia. Fazem parte deste conhecimento, o
acúmulo de experiências dos homens, suas tradições, crenças, o aprendizado do cotidiano.
Este tipo de conhecimento, também chamado de vulgar, é assistemático e ametódico, pois não
existe rigor ou critérios para observação de um fato, não se produz crítica sobre aquilo que se
vê ou se sente. O conhecimento de senso comum se contenta com as evidências imediatas, ele
parte do empirismo, isto é, da observação imediata de um fenômeno.
“Por esse motivo o conhecimento de senso comum, muitas vezes é presa das
aparências.“
ARRUDA (2000)
Exemplo:
Quando uma pessoa faz um bolo, segue a receita e incorpora uma série de informações para
o melhor sucesso do seu trabalho. Sabe que, ao bater as claras em neve, elas crescem e se
tornam esbranquiçadas; que não convém abrir o forno quando o bolo começa a assar, senão ele
murcha; que a medida adequada de fermento faz o bolo crescer. Se estiver fazendo pudim em
banho-maria, sabe que uma fatia de limão na água evita o escurecimento da vasilha, o que
facilitará seu trabalho posterior de limpeza. Essa pessoa sabe tudo isso, mas não conhece as
causas, não consegue explicar por que e como ocorrem esses fenômenos.1
1 ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; PIRES, Maria Helena. Filosofando: introdução à Filosofia. SP, Cortez, 2001.
11
AulA 1 • A qUESTÃO DO CONhECImENTO
Sugestão de leitura
Sociologia no cinema
Uma ilustração interessante sobre a questão de ciência e senso comum pode ser vista no
filme “O nome da Rosa” 1986, do diretor Jean-Jacques Annaud.
Ver também o filme Erin Brockovich - Uma Mulher de Talento de 2000 dirigido por Steven
Soderbergh e escrito por Susannah Grant.
A revolução científica
12
A QUESTÃO DO CONHECIMENTO • AULA 1
o navegador que embarca em um navio sem leme nem bússola. Sempre a prática deve se
fundamentar na boa teoria. Antes de fazer de um caso uma regra geral, experimente-o duas ou
três vezes e verifique se as experiências produzem os mesmos efeitos. Nenhuma investigação
humana pode-se considerar verdadeira ciência se não passa por demonstrações matemáticas.
A semente dessa nova forma de conhecimento germinou e deu seus maiores frutos no século
XVII, quando explodiu a grande revolução galileana. Da vasta obra deixada pelo italiano Galileu
Galilei (1564-1642), o primeiro aspecto a destacar é a sua adesão ao modelo heliocêntrico.
Galileu seguiu o caminho que havia sido aberto pelo polonês Nicolau Copérnico (1473-1543),
acrescentando, porém, novos e decisivos argumentos a favor de um modelo cosmológico em que
o Sol se encontra no centro do sistema — em vez do modelo geocêntrico da doutrina aristotélica.
Pela primeira vez na história da nossa civilização, foi usado um instrumento óptico para olhar
os céus: a luneta, que acabara de ser inventada pelos holandeses. Com esse instrumento, Galileu
descobriu que existiam corpos celestes girando em torno do planeta Júpiter.
Essa constatação contrariava o modelo geocêntrico, pois este afirmava que todos os corpos
celestes giravam em torno da Terra. Galileu descobriu também que a Lua tinha crateras e relevo
análogos à Terra, também contrariando a tese de que haveria uma diferença essencial entre os
elementos da Terra e os celestes, presente na doutrina aristotélica.
O conhecimento científico
Embora desde a antiga Grécia, homens como Sócrates preocupavam-se com a definição de
conceitos, na busca pela essência das coisas e Platão com seu empenho em mostrar o caminho
a ser seguido para ir da doxa (opinião) à episteme (ciência) tenham buscado um saber mais
rigoroso, o conhecimento científico é relativamente recente. Somente ao procurar o seu próprio
caminho, ou melhor, o seu método (já na Idade Moderna), a ciência se desvincula da Filosofia
e passa a determinar objetos específicos a serem apreendidos e controlados através do método
científico. Em vez de uma ciência, surgem, gradativamente, ciências particulares, com campos
mais ou menos delimitados de pesquisa. Esse avanço ocorreu a partir do século XVII e tem a
revolução galileana como um dos seus marcos.
Diante do exposto podemos afirmar que a ciência moderna nasce ao determinar um objeto
específico de investigação e ao criar um método pelo qual se fará o controle desse conhecimento.
13
AULA 1 • A QUESTÃO DO CONHECIMENTO
Cada ciência se torna então uma ciência particular, no sentido de ter um campo delimitado
de pesquisa e um método próprio. As ciências são particulares na medida em que cada uma
privilegia setores distintos da realidade; a física trata do movimento dos corpos; a química, da
sua transformação; a biologia, do ser vivo etc.
Por outro lado as ciências são também gerais, no sentido de que as conclusões não valem apenas
para os casos observados, e sim para todos os que a eles se assemelham. Ao afirmarmos que o
“peso de qualquer objeto depende do campo de gravitação” ou que “a cor de um objeto depende
da luz que ele reflete” ou ainda que “a água é uma substância composta de hidrogênio e oxigênio”
fazemos afirmações que são válidas para todos os corpos, todos os objetos coloridos ou qualquer
porção de água, e não apenas para aqueles que foram objeto da experiência.
Enquanto o saber comum observa um fato a partir do conjunto dos dados sensíveis que formam a
nossa percepção imediata, pessoal e efêmera do mundo, o fato científico é um fato abstrato, isolado
do conjunto em que se encontra normalmente inserido e elevado a um grau de generalidade:
quando nos referimos à dilatação ou ao aquecimento como fatos científicos, estamos muito
distantes dos dados sensíveis de um certo corpo em um determinado momento. Além disso,
estabelecemos entre tais fatos uma relação de variação do tipo “função” (na qual o volume é, em
dado momento, função da temperatura). Isso supõe a capacidade de racionalização dos dados
recolhidos, em nunca aparecem como dados brutos, mas sempre passíveis de interpretação.2
2 ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; PIRES, Maria Helena. Filosofando: introdução à Filosofia. SP, Cortez, 2001.
14
A qUESTÃO DO CONhECImENTO • AulA 1
As disciplinas Sociologia, Antropologia e Todavia, a designação usualmente mais aceita é aquela que
reconhece apenas três disciplinas como parte constitutiva desse
a Ciência Política, estudam fenômenos
campo científico.
muito semelhantes, ou seja, fatos que
resultam da vida em sociedade. Mas,
embora estas áreas do conhecimento sejam muito próximas entre si, não são totalmente iguais.
Dado o recorte aqui proposto, trataremos em nossos estudos mais especificamente de elementos
da análise sociológica.
Atenção
Antropologia: estuda as diferentes culturas do homem, os diversos grupos sociais, culturais ou étnicos e as transformações
ocorridas em função da interação entre os grupos.
Ciência política: estuda os sistemas de poder, as instituições e os partidos políticos de um país, o comportamento e as políticas
públicas em suas diversas fases (elaboração, implantação e avaliação).
Sociologia: Investigar as relações sociais, as estruturas e a dinâmica das sociedades modernas, analisando os processos
históricos de transformação das organizações sociais.
Quanto à análise sociológica, pode-se dizer que esta envolve a tentativa de compreensão dos
processos de estruturação e relacionamento dos indivíduos entre si e com as sociedades. Para isso
parte, geralmente, do conhecimento de coletividades com o objetivo de entender o comportamento
grupal e/ou individual. Seu foco está, via de regra, na investigação das estruturas da sociedade
procurando compreender como estas influenciam os grupos ou indivíduos no que se refere a
seu comportamento, seus costumes e sua cultura.
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AulA 1 • A qUESTÃO DO CONhECImENTO
As ciências históricas e humanas não são, portanto, como as ciências naturais. A diferença nas
condições de trabalho dos físicos e químicos e a dos sociólogos não é de grau, mas de natureza:
enquanto os primeiros trabalham em um ambiente em que há unanimidade nos juízos de valor
sobre a pesquisa e o conhecimento, os sociólogos enfrentam divergências de todo tipo.
Semelhanças e diferenças
Para refletir
Elabore uma lista de palavras e imagens que vêm à sua cabeça quando você pensa em Natural e no Social. Estipule um período
de 30 segundos para este brain storm ou tempestade de ideias.
» Tais fatos podem ser vistos, isolados e reproduzidos dentro de condições de controle
razoáveis, num laboratório.
» No âmbito das Ciências Sociais torna-se difícil Posso comer o bolo para agradar a minha mãe.
» Muitas vezes atitudes semelhantes têm significados diferentes. Cada cultura constrói
seu significado social. Os fatos estudados pelo cientista social podem ser reproduzidos
em situações muito distintas. Não podem ser reproduzidos em condições controladas.
16
A qUESTÃO DO CONhECImENTO • AulA 1
Compare
Reproduzível Irreproduzível
» Os fatos naturais são reproduzíveis em condições » Os fatos sociais são irreproduzíveis em condições
controladas. controladas e, por isso, quase sempre fazem parte do
passado. São eventos a rigor históricos e apresentados
de modo descritivo e narrativo, nunca na forma de uma
experiência.
o que quiser sobre as baleias que elas não poderão Ao observar tais fenômenos temos que
contestar e continuarão vivendo. enfrentar nossa própria posição, nossos valores,
nossa visão de mundo que interfere na nossa
As teorias descobertas poderão ser usadas para alterar pesquisa. Nossa fala, nossos gestos, nosso modo
de ser e de agir revela o tipo de socialização que
a vida das baleias, mas nunca usadas diretamente pelas
tivemos e influencia em nossa visão de mundo.
baleias. Por isso são considerados conhecimentos
objetivos, externos, independentes de baleias, aves e
investigadores.
Nas Ciências sociais temos um tipo de interação complexa entre o investigador e o investigado.
Ambos compartilham de um mesmo universo de experiências humanas, ainda que seus
significados possam vira ser diferentes para ambos.
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AulA 1 • A qUESTÃO DO CONhECImENTO
Os homens se separam pela organização de suas experiências, sua história, pelo modo como
classificam suas realidades internas e externas.
Podemos reunir os mesmos personagens, Quando investigo um objeto das Ciências Sociais, abro
músicas, comidas, vestes, mobiliário, animais.
o meu Ser para uma relativização dos meus parâmetros
Não será possível reproduzir o clima daquele
epistemológicos. Nasce um debate inovador, numa
momento, a atmosfera da época. Estaremos
criando outro significado
relação dialética entre investigador e investigado. Trata-
se de uma avenida de mão dupla.
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A qUESTÃO DO CONhECImENTO • AulA 1
Sintetizando
» Senso comum: chama-se senso comum o conhecimento espontâneo, o saber resultante das experiências cotidianas do
homem no enfrentamento dos obstáculos do dia a dia. Fazem parte deste conhecimento, o acumulo de experiências dos
homens, suas tradições, crenças, o aprendizado espontâneo.
» Conhecimento Científico: o conhecimento científico é relativamente recente. Somente ao procurar o seu próprio caminho,
o seu método (já na Idade Moderna), a ciência se desvincula da filosofia e passa a determinar objetos específicos a serem
apreendidos e controlados com esse método.
» Senso comum é o conhecimento de todos nós, homens comuns, não especialistas. Trata-se de um conhecimento
espontâneo, um saber resultante das experiências de vida. Suas principais características são: ametódico, assistemático,
fragmentação e empirismo.
» O conhecimento científico é conquista recente da humanidade, surgiu no séc. XVII, com a revolução de Galileu Galilei. Utiliza
métodos rigorosos para a produção de um saber sistemático, preciso e objetivo. Busca-se um saber que possa descobrir as
relações necessárias e universais entre os fenômenos.
» As ciências são gerais apenas no sentido de que suas conclusões valem para todos os casos similares.
» O conhecimento científico precisa do processo de racionalização dos dados recolhidos. Suas conclusões aspiram à
objetividade. Isto significa dizer que podem ser observadas por qualquer outro cientista.
» Os fenômenos podem ser percebidos, divididos, classificados e explicados dentro de condições de relativo controle e em
condições de laboratório.
» O resultado prático é visto em livros, romances, arte, teatro, novelas, onde tais ideias podem ser aplicadas para produzir
modificações no comportamento das pessoas – nos sistemas de valores.
» Os fatos sociais são irreproduzíveis em condições controladas e, por isso, quase sempre fazem parte do passado. São eventos
a rigor históricos e apresentados de modo descritivo e narrativo, nunca na forma de uma experiência.
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Aula
A Sociologia como ciência: uma
perspectiva histórico - crítica 2
Apresentação
Na aula anterior vimos as diferenças que marcam o campo das ciências naturais e das ciências
sociais. Salientamos, sobretudo a especificidade da ciência que tem por objetivo estudar a
sociedade. Agora, apresentaremos o contexto histórico da Europa, na segunda metade do século
XIX – época na qual se deu o surgimento da Sociologia como ciência independente. Pretende-se
assim, que possamos compreender os processos que conduziram à formação da corrente
positivista: a primeira forma de pensamento social.
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
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A SOCIOLOgIA COmO CIêNCIA: UmA PERSPECTIvA hISTóRICO - CRíTICA • AulA 1
De fato, as revoluções trazem grandes transformações e com a revolução industrial não poderia
ter sido diferente. Tais transformações já se fizeram presentes na transição do feudalismo para
o capitalismo.
Os cercamentos foram acompanhados por várias leis visando, antes de mais nada, controlar a
mão de obra, o número de desempregados ou desocupados e, na visão inglesa, evitar a desordem.
Atenção
» 1601 – LEI DOS POBRES: Segundo essa lei, o aumento de desocupados e mendigos resultava de uma indisposição para o
trabalho. Por isso, punia a vagabundagem com o chicote e a marca de ferro em brasa. Caso o indivíduo reincidisse, seria
aplicada a pena capital.
» 1662 – LEI DE DOMICÍLIO: Visava impedir que os pobres se transferissem de uma paróquia para outra e autorizava a
expulsão dos não residentes naquela paróquia. Isso confinou os trabalhadores e evitou a locomoção. Somente em 1795 uma
nova lei retirou das autoridades locais o direito de expulsar os não domiciliados na paróquia.
» 1795 – LEI SPEEHAMLAND: Estabelecia que todos os homens tinham o direito a uma renda mínima. Caso o trabalhador
obtivesse pelo seu trabalho uma renda inferior à mínima, cabia à sociedade pagar a diferença. Esta lei favorecia
21
AulA 1 • A SOCIOLOgIA COmO CIêNCIA: UmA PERSPECTIvA hISTóRICO - CRíTICA
manufatureiros e fazendeiros, que lucravam pagando salários inferiores à renda mínima estabelecida, enquanto os
contribuintes arcavam com o prejuízo.
» 1760 a 1840: Os cercamentos passaram a ser regulamentados por leis instituídas pelo Parlamento inglês.
Com a abolição da Lei de Domicílio, os trabalhadores voltaram a circular livremente, sem o risco
de serem expulsos. Os cercamentos, autorizados pelo Parlamento desde 1760, permitiram que um
número cada vez maior de pessoas deixasse os campos em busca das manufaturas nas cidades,
como forma de sobreviver e em busca de melhores condições de vida. Deu-se assim um grande
êxodo rural e um inchamento das cidades. Tal fato torna-se visível ao analisarmos os dados dos
censos demográficos da época:
cidades com população superior a BRIGS, Asa. História Social da Inglaterra. Lisboa:
» York, grande centro ferroviário, cresceu de 17.000 habitantes em 1801 para 36.000 em 1851.
O inchamento das cidades transformou o cenário urbano e, como vimos anteriormente, pobreza
e riqueza passaram a conviver lado a lado.
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A SOCIOLOgIA COmO CIêNCIA: UmA PERSPECTIvA hISTóRICO - CRíTICA • AulA 1
e quase sempre irregularmente construídas [...] As casas são habitadas dos porões
aos desvãos, tão sujas no exterior como no interior, e têm um tal aspecto que
ninguém as desejaria habitar. Mas isto ainda não é nada comparado às habitações
nos corredores e vielas transversais, aonde se chega através de passagens cobertas
e onde a sujeira e a ruína ultrapassam a imaginação (...), aí que habitam os mais
pobres dos pobres, os trabalhadores mais mal pagos, com os ladrões, os escroques
e as vítimas da prostituição, todos misturados.
(BRESCIANI, 1989. p.25)
Como conseqüência dessa alteração urbana, a literatura registrou grandes crimes, como Os
crimes da rua Morgue, de Edgar Alan Poe, ou os famosos casos do detetive Sherlock Holmes, de
Conan Doyle. Também nessa época surgem nomes como o de Jack, o estripador, e casos que se
tornaram lendários, como o do barbeiro de Londres. A criminalidade estava diretamente ligada
ao aumento populacional, à pobreza, à busca de vida melhor, à cobrança do direito de cidadania,
enfim, a diversos fatores combinados.
O desenvolvimento industrial se fez acompanhar pelo desenvolvimento científico, que por sua
vez impulsionou ainda mais a indústria em função de descobertas e invenções. Nos centros
urbanos europeus respirava-se desenvolvimento e acreditava-se que a tecnologia e a máquina
resolveriam todos os problemas do homem. A indústria cresceu e com esse crescimento vieram
as crises de produção porque a superprodução não era acompanhada pelo consumo. A solução
para a crise de consumo foi encontrada no neocolonialismo, ou imperialismo do século XIX.
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AULA 1 • A SOCIOLOGIA COMO CIÊNCIA: UMA PERSPECTIVA HISTÓRICO - CRÍTICA
para a Europa e para os EUA: afinal, aqui se encontrava a matéria-prima, a mão de obra barata
e o favorecimento governamental.
O período entre 1875 e 1914 pode ser identificado como a ERA DOS IMPÉRIOS, não só porque
criou um novo tipo de imperialismo, mas também pelo grande número de governantes que se
intitulavam imperadores.
Escondendo os interesses econômicos das nações europeias ou, se preferirmos, como justificativa
humanitária para o colonialismo, estava a missão civilizadora do homem branco, através da qual
ele deveria levar a civilização aos povos não civilizados. Sobre isso, Rudyard Kipling, o poeta
inglês do colonialismo, escreveu:
A África e a Ásia foram o cenário onde atuou uma infinidade de cientistas e religiosos que
assumiram o fardo do homem branco. Na Índia, por exemplo, qualquer membro da raça branca
era tido como membro da classe dos amos e senhores, respeitado e reverenciado. Situações
semelhantes fizeram o fundador da República do Quênia, na segunda metade do século XX,
referir-se assim à dominação imperialista:
Todas as tentativas de reação por parte das nações dominadas pelos impérios europeus foram
enfrentadas com o uso das armas por parte das nações europeias.
24
A SOCIOLOGIA COMO CIÊNCIA: UMA PERSPECTIVA HISTÓRICO - CRÍTICA • AULA 1
Nem a China ficou de fora da corrida imperialista: foi dominada economicamente e teve territórios
ocupados pelos japoneses.
A literatura também participou do processo, assaltada pelo cientificismo. Mais uma vez a figura
de Sherlock Holmes se destaca. Porém, por outro lado, viu-se inundada de histórias de meninos
lobos, como Greystoke, a lenda de Tarzan. Outras obras características da época são as de Júlio
Verne (Vinte mil léguas submarinas, Viagem ao centro da terra, 80 dias em um balão), ou ainda
Frankenstein, de Mary Shelley, ou Dr. Jekyll & Mr. Hyde, um clássico dos clássicos de horror e
mistério, de Robert Louis Stevenson.
O cientificismo esteve presente em tudo. Foi também nessa época que se desenvolveu a teoria de
Charles Darwin sobre a evolução e adaptação das espécies. O autor colocou em xeque as ideias da
imutabilidade das espécies. Assim, a formação dos sistemas vivos começou a ser entendida não
como criação simultânea, mas como decorrência de etapas sucessivas. Na sua obra A Origem das
Espécies, publicada em 1859, em consonância com o espírito da época, Darwin defendeu a noção
de variação gradual dos seres vivos graças ao acúmulo de modificações pequenas, sucessivas e
favoráveis, e não por modificações extraordinárias, surgidas repentinamente. Nessa obra Darwin
apresentou o núcleo da sua concepção evolutiva: a seleção natural, ou a persistência do mais
capaz; com o passar dos séculos, a seleção natural eliminaria as espécies antigas e produziria
novas espécies.
Logo as teses de Darwin estavam sendo discutidas em todo o meio científico e o próprio liberalismo
econômico adotou o pressuposto da competição. Ao defender a propriedade privada, o liberalismo
postula que todo homem compete em igualdade no acesso à propriedade privada. Aquele que
não a conquista, não o faz porque é vicioso ou preguiçoso. É claro que essa tese, presente em
nossas mentes até hoje, interessava e interessa à manutenção do domínio da classe burguesa.
Isso será discutido mais adiante.
Segundo o Darwinismo Social, as sociedades se modificam e se desenvolvem como os seres vivos. As transformações nas
sociedades representam a passagem de um estágio inferior para outro superior, na qual o organismo social se mostra mais
evoluído, adaptado e complexo. Se na natureza a competição gera a sobrevivência do mais forte, também na sociedade favorece
a sobrevivência de sociedades e indivíduos mais fortes e evoluídos. As expressões: luta pela existência e sobrevivência do
mais capaz, tomadas de Darwin, apoiaram o individualismo liberal e justificaram o lugar ocupado pelos bem sucedidos nos
negócios. Por outro lado, as sociedades foram divididas em raças superiores e inferiores, cabendo aos mais fortes dominar os
mais fracos e, consequentemente, aos mais desenvolvidos levar o desenvolvimento aos não desenvolvidos. A civilização deveria
ser levada a todos os homens. É claro que o Darwinismo Social serviu para justificar a ação imperialista das nações europeias.
25
AulA 1 • A SOCIOLOgIA COmO CIêNCIA: UmA PERSPECTIvA hISTóRICO - CRíTICA
Foi nesse cenário de constantes conflitos sociais, políticos, econômicos e religiosos, cenário
marcado pela industrialização, pelo cientificismo e pela luta de classes, que nasceu a Sociologia.
Em 1824 veio o rompimento com Saint-Simon, motivado por questões de autoria legítima
de ensaios que Comte devia publicar. A solução, que Comte considerou injusta, foi que cem
cópias do trabalho saíram sob o nome de Comte, enquanto mil cópias, intituladas Catéchisme
des industriels, indicavam a autoria de Henri de Saint-Simon. Outra causa do rompimento foi o
fato de Comte desdenhar a ideia de um paradigma religioso no projeto de Saint-Simon. Mesmo
assim, posteriormente, ao criar a Religião Positiva, o próprio Comte adotou para si essa ideia,
proclamando-se Sumo Sacerdote da Humanidade.
26
A SOCIOLOgIA COmO CIêNCIA: UmA PERSPECTIvA hISTóRICO - CRíTICA • AulA 1
Comte cunhou o termo Sociologia. A princípio, quis chamar essa disciplina de física social, a
fim de enfatizar que ela estudaria a natureza fundamental do universo social; porém, por não
acreditar na aplicação das probabilidades no campo dos fenômenos sociais, cunhou o termo
Sociologia a partir de dois termos: Socio, do latim socius, que significa associado ou sócio, e logia,
do grego log+ia, significando discurso científico. O termo apareceu pela primeira vez na lição
número 47 do Curso de Filosofia Positiva.
Comte estabeleceu uma hierarquia das ciências, ordenando-as de acordo com a sua complexidade
e o seu movimento no Estado Positivo; assim, partindo da menos complexa para a mais complexa,
estabeleceu a seguinte classificação:
MATEMÁTICAS: possuem o maior grau de generalidade e estudam a realidade mais simples e indeterminada;
ASTRONOMIA: acrescenta a força ao puramente quantitativo, estudando as massas dotadas de forças de atração;
BIOLOGIA: ocupa-se dos fenômenos vitais, nos quais a matéria bruta é enriquecida pela organização;
» A Sociologia é entendida por Comte incluindo uma parte essencial da Psicologia, toda
a Economia Política, a Ética e a Filosofia da História.
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AulA 1 • A SOCIOLOgIA COmO CIêNCIA: UmA PERSPECTIvA hISTóRICO - CRíTICA
Naquele momento histórico, o problema central da Sociologia era o que fora articulado pelos
pensadores no Iluminismo, ou seja, como a sociedade deve ser mantida unida, mesmo quando
se torna maior, mais complexa, mais variada e mais diferenciada.
Comte acreditava necessário estabelecer consensus universalis para dar à sociedade moralidade
universal. Por isso, para resolver a crise social – que, como vimos, se fazia presente na França
e em toda a Europa do seu tempo – Comte não propunha a atividade revolucionária, mas sim
uma nova ordem social, com base na Filosofia Positiva. No seu pensar, combinando Ordem e
Progresso o Positivismo superaria a teologia e a revolução. Por isso identificou dois movimentos
na sociedade: a Estática Social e Dinâmica Social.
Estática social
pela preser vação dos elementos Um exemplo da aplicação desses conceitos pode ser
permanentes da ordem social: religião, encontrado na destruição do Arraial do Bom Jesus –
família, linguagem, acordo entre o poder Canudos – no sertão da Bahia.
espiritual e o temporal etc. Canudos era visto como um movimento que tirava dos
coronéis a mão-de-obra quase gratuita do sertanejo.
» As instituições mantêm a coesão e
O movimento não pagava impostos à República
garantem o funcionamento da sociedade. e interferia na vida religiosa, já que o arraial não
Por isso o progresso deve aperfeiçoar os precisava de padres mas possuía uma igreja. Alguns
religiosos visitaram Canudos e nada encontraram
elementos da ordem, e não destruí-los.
que atacasse a Igreja Católica; mesmo assim, esta se
sentia afetada. Logo, Canudos interferia na Ordem
da República e por isso, visando garantir o progresso
na chamada República Velha, durante o governo
de Prudente de Morais, 5 mil soldados atacaram e
destruíram o Arraial.
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A SOCIOLOGIA COMO CIÊNCIA: UMA PERSPECTIVA HISTÓRICO - CRÍTICA • AULA 1
Dinâmica social
Outro elemento essencial do pensamento de Auguste Comte é a Lei dos Três Estados.
O estado teológico
»» FETICHISMO: Uma vida espiritual semelhante à do homem é atribuída aos seres naturais.
Esta fase corresponde à etapa em que o homem constrói totens, cultua a lua, o sol, as
estrelas, as árvores, os seres da natureza em geral.
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AulA 1 • A SOCIOLOgIA COmO CIêNCIA: UmA PERSPECTIvA hISTóRICO - CRíTICA
o deus sol – por exemplo – ganha personalidade distinta, como no Egito, e se torna
Amon-Rá, Aton etc.
Para Augusto Comte existem o Politeísmo Conservador ou Sacerdotal, de característica intelectual, que se manifestou
principalmente na elaboração grega entre os séculos XIII a.C. e I d.C., e o Politeísmo Progressivo ou Militar, de característica
social, que se apresentou na Civilização Romana entre os séculos VIII a.C. e III d.C.
Augusto Comte acreditava que “a maioria da nossa espécie não saiu ainda de semelhante estado, que persiste hoje na mais
numerosa das três raças humanas, no escore da raça negra e na parte menos avançada da branca.”
Surge um deus apresentado acima de todos os deuses e criador de todas as coisas, porém distante no homem, no mais alto dos
céus.
Segundo Augusto Comte a etapa Monoteísta corresponde à civilização católica feudal, situada entre os séculos V e XIII d.C.,
quando se dá a transição para o Pensamento Metafísico.
O estado metafísico
» Nele a argumentação, penetrando nos domínios das ideias teológicas, traz à luz as suas
contradições inerentes.
30
A SOCIOLOgIA COmO CIêNCIA: UmA PERSPECTIvA hISTóRICO - CRíTICA • AulA 1
Para Augusto Comte esta é a fase da transição ocidental, estendendo-se desde o século XIV, ou seja, da fase de transição feudo-
capitalista, e passando pelos descobrimentos e pela Revolução Científica dos séculos XVII e XVIII. Por isso, na esfera política, o
espírito metafísico corresponde à substituição dos reis pelos juristas; supondo-se a sociedade como originária de um contrato,
a tendência é basear o Estado na soberania do povo.
O estado positivo
» A visão positiva dos fatos abandona a consideração das causas dos fenômenos
(procedimento teológico ou metafísico) e torna-se pesquisa de suas leis, entendidas
como relações constantes entre fenômenos observáveis.
Para Comte, a sociedade só poderia ser reorganizada através da completa reforma intelectual do homem. Para tanto era
necessário fornecer aos homens novos hábitos, de acordo com as ciências do seu tempo.
31
AulA 1 • A SOCIOLOgIA COmO CIêNCIA: UmA PERSPECTIvA hISTóRICO - CRíTICA
O Positivismo procurava resolver os conflitos sociais por meio da exaltação à coesão, à harmonia
natural entre os indivíduos e ao bem-estar do todo social. Por isso representou uma ação política
conservadora que justificava as relações desiguais entre as sociedades. Por outro lado, O Positivismo
também representou também um esforço concreto de análise científica da sociedade, partindo
dele as primeiras formulações objetivas sobre a sociabilidade humana, abrindo as portas para
uma nova concepção da realidade social com suas especificidades e regras.
Por fim, devemos verificar que para Comte a história não é pensada como um vir a ser, mas
como uma sequência congelada de Estados definitivos; e a evolução é a realização, no tempo,
daquilo que já existia em forma embrionária e que se desenvolve até alcançar o seu ponto final.
O seu conceito de ciência é o saber acabado, que se mostra sob a forma de resultados e receitas.
As ideias positivistas justificaram o avanço imperialista europeu sobre a África e a Ásia, porém o
positivismo não foi capaz de resolver a crise daquela sociedade europeia, na qual nem todas as
pessoas participavam da sociedade positiva nem usufruíam dos seus benefícios, já que a riqueza
de poucos convivia com a pobreza de muitos e essa maioria também não tinha acesso aos bens
culturais, educacionais etc.
O pensamento positivista não se resumiu a Augusto Comte. O seu desenvolvimento teve variantes
como a de Émile Durkheim, também na França. E o ideal positivista de ciência permeou todo
o pensamento social, político, jurídico, econômico, educacional, histórico e literário do século
XIX e de uma boa parcela do século XX.
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A SOCIOLOgIA COmO CIêNCIA: UmA PERSPECTIvA hISTóRICO - CRíTICA • AulA 1
A influencia de Auguste
A doutrina positivista, em sua fase científica ganha relevo no Brasil a partir dos debates realizados
no Colégio Militar e depois se dissemina pelos ambientes de outras escolas, dentre elas o Colégio
Pedro II.
Estas reflexões, feitas no interior das escolas militares da cidade do Rio de Janeiro possibilita
que se comece a pensar a educação brasileira como um projeto para alcançar grande parte da
população brasileira.
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AulA 1 • A SOCIOLOgIA COmO CIêNCIA: UmA PERSPECTIvA hISTóRICO - CRíTICA
Sintetizando
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A SOCIOLOgIA COmO CIêNCIA: UmA PERSPECTIvA hISTóRICO - CRíTICA • AulA 1
Saiba mais
35
Aula
A Educação como fenômeno
social e objeto de estudo
da Sociologia 3
Apresentação
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
36
A Educação como fenômeno social e objeto de estudo da Sociologia • AULA 3
A Escola como instituição sempre mereceu atenção especial dos estudos sociológicos. Neste
sentido, tem-se como pressuposto fundamental, de que ela seja um espaço de sociabilidade,
no qual as relações sociais se caracterizam por práticas que afirmam valores educacionais e
constroem identidades. Onde, sobretudo, também se elaboram e (re) elaboram-se papéis sociais.
O ser humano ao nascer necessita de outras pessoas para a sua sobrevivência, no mínimo de
mais uma pessoa, o que já faz dele membro de um grupo. Por isso, podemos dizer que desde o
primeiro momento de vida o indivíduo está inserido em um contexto histórico, pois as relações
entre o adulto e a criança recém-nascida seguem um modelo ou padrão de cada sociedade,
modelo este, que ela veio desenvolvendo com o passar dos tempos e que considera correta.
Diversos autores (TURA, 2001; SILVA, 2003; SOUZA, 2003) discutem o papel que Sociologia da
Educação para uma compreensão crítica da realidade social, política, econômica e cultura na
qual a escola e a educação estão inseridas e contribui para uma formação de educadores com
uma visão crítica que possa formar indivíduos para compreenderem e transformarem a realidade
onde vivem.
A educação entendida como uma prática social que busca formar indivíduos para a vida em
sociedade deve proporcionar uma visão que os permita uma compreensão da sociedade em
todas as suas dimensões. Para tanto se torna necessário um currículo que em seus conteúdos
e em suas práticas possibilitem uma problematização e reflexão crítica das relações sociais,
relações de poder existentes na sociedade, pois como discute Bernstein, citado por Forquin
(1993, p.85): O modo como uma sociedade seleciona, classifica, distribui, transmite e avalia os
saberes destinados ao ensino reflete a distribuição do poder em seu interior e a maneira pela
qual aí se encontra assegurado o controle social dos comportamentos individuais. Pois, como
nos ensina Foucault:
37
AulA 3 • A EDUCAÇÃO COmO FENômENO SOCIAL E OBjETO DE ESTUDO DA SOCIOLOgIA
sujeito de conhecimento que seria a sua a sua origem, mas a relações de poder
que lhe constituem. Não há saber neutro. Todo saber é político.
(FOUCAULT, 1986, p. 21)
38
A EDUCAÇÃO COmO FENômENO SOCIAL E OBjETO DE ESTUDO DA SOCIOLOgIA • AulA 3
Nesse arcabouço explicativo a educação ocupa lugar central como um fato social, que contribui
para a “socialização metódica das novas gerações” (DURKHEIM, 1987, p.41) e para integrar os
indivíduos na sociedade em que estão inseridos, disseminando a consciência coletiva. Vendo a
educação com duplo aspecto, uno e múltiplo, como seus constituintes básicos Durkheim (1967,
p. 40) aponta suas principais funções:
Suscitar na criança: 1) um certo número de estados físicos e mentais, que a sociedade a que
pertença, considere como indispensáveis a todos os seus membros; 2) certos estados físicos e
mentais, que o grupo social particular (casta, classe família, profissão) considere igualmente
indispensáveis a todos quantos o formem.
Ao tratar das relações entre o educador e a criança submetida à sua influência, Durheim (1967, p.
5354) defende que a criança fique “por condição natural, em estado de passividade” e o educador
assume uma posição de superioridade advinda da sua experiência, sua cultura e da moral que
ele encarna. Assim a ação educativa é entendida como um trabalho de autoridade. A autoridade
é o meio essencial da ação educativa. “A autoridade moral é a qualidade essencial do educador”.
39
AULA 3 • A Educação como fenômeno social e objeto de estudo da Sociologia
demarcando uma classe detentora dos meios de produção e da riqueza que advém do trabalho
da classe trabalhadora.
Para Marx, a sociedade se estrutura por uma base constituída das forças produtivas e das relações
de produção, donde se originam as ideias, a política, a religião, o direito e a filosofia que constituem
a superestrutura. As relações de produção classistas são conflitivas e contraditórias provocando
constantemente crises que não encontram solução nos marcos da sociedade burguesa. Assim, ele
defende uma revolução liderada pelas classes trabalhadoras para superar essa sociedade classista
e a criação de uma sociedade em que não mais existiria a exploração do homem pelo homem,
culminando numa sociedade comunista, na qual os meios de produção seriam coletivizados.
Marx não se deteve numa discussão sobre a educação, sua teoria se concentrou na análise
econômica, sociológica, histórica e filosófica, da sociedade capitalista, mas o desdobramento
de suas análises das relações de poder inerentes às relações classistas produziu contribuições
importantes para a compreensão da escola e da ação educativa.
Antonio Gramsci, outro autor que bebeu da fonte sociológica marxista e desenvolveu sua análise
social e educacional partindo do pressuposto da existência de uma sociedade conflituosa e
contraditória, baseada em princípios capitalistas de exploração e submissão, vincula a educação a
uma estrutura de combate ideológico hegemônico e contrahegemônico e a considera um espaço
pedagógico que funciona tanto como instrumento de dissimulação, a serviço da classe dominante,
quanto revela à classe dominada as contradições existentes, permitindo a esta última reagir. A
defesa de Gramsci define-se na utilização da escola como centro de formação da consciência
crítica e política para realizar uma mudança real da estrutura social vigente.
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A EDUCAÇÃO COmO FENômENO SOCIAL E OBjETO DE ESTUDO DA SOCIOLOgIA • AulA 3
Sintetizando
» A Escola como instituição sempre mereceu atenção especial dos estudos sociológicos.
» O pressuposto fundamental, é de que a escola seja um espaço de sociabilidade, no qual as relações sociais se caracterizam
por práticas que afirmam valores educacionais e constrõem identidades. Onde, sobretudo, elaboram-se e relaboram-se
papéis sociais.
» O ser humano ao nascer necessita de outras pessoas para a sua sobrevivência, no mínimo de mais uma pessoa, o que já faz
dele membro de um grupo.
» Desde o primeiro momento de vida o indivíduo está inserido em um contexto histórico, pois as relações entre o adulto e a
criança recém-nascida seguem um modelo ou padrão de cada sociedade, modelo este, que ela veio desenvolvendo com o
passar dos tempos e que considera correta.
» As normas, são o que basicamente, caracterizam os papéis sociais e que determina as relações sociais. Ou seja, os papéis de
pai e de mãe se caracterizam por normas que dizem como um homem e uma mulher se relacionam quando eles têm um
filho, e como ambos se relacionam com o filho e este no desempenho de seu papel com os pais.
» Ao tratar das relações entre o educador e a criança submetida à sua influência, Durheim (1967, p. 5354) defende que a criança
fique “por condição natural, em estado de passividade” e o educador assume uma posição de superioridade advinda da sua
experiência, sua cultura e da moral que ele encarna. Assim a ação educativa é entendida como um trabalho de autoridade. A
autoridade é o meio essencial da ação educativa. “A autoridade moral é a qualidade essencial do educador”. Essa concepção
de educação e do papel do professor influenciou as práticas pedagógicas adotadas no Brasil ao longo da história da educação
e a atividade docente que nela se realiza.
» Karl Marx, que influenciou todo o pensamento crítico em educação, começando pelas ideias reprodutivistas de Althusser,
Establet e Baudelot que ressaltaram a contribuição da educação na reprodução das relações sociais de produção. A análise
materialista histórica de Marx vê a sociedade capitalista sob a perspectiva do conflito resultante das contradições produzidas
pela divisão da sociedade em classes sociais, definidas pela apropriação dos meios de produção, demarcando uma classe
detentora dos meios de produção e da riqueza que advém do trabalho da classe trabalhadora.
» Para Marx, a sociedade se estrutura por uma base constituída das forças produtivas e das relações de produção, donde se
originam as ideias, a política, a religião, o direito e a filosofia que constituem a superestrutura. As relações de produção
classistas são conflitivas e contraditórias provocando constantemente crises que não encontram solução nos marcos da
sociedade burguesa. Assim, ele defende uma revolução liderada pelas classes trabalhadoras para superar essa sociedade
classista e a criação de uma sociedade em que não mais existiria a exploração do homem pelo homem, culminando numa
sociedade comunista, na qual os meios de produção seriam coletivizados.
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AulA 3 • A EDUCAÇÃO COmO FENômENO SOCIAL E OBjETO DE ESTUDO DA SOCIOLOgIA
Saiba mais
Ver também A sociedade dos poetas mortos Dead Poets Society é um filme
estadunidense de 1989, do gênero drama, dirigido por Peter Weir.
Duração: 2h 9m
42
Aula
As matrizes do pensamento
sociológico e as diferentes
análises do fenômeno
educacional 4
Apresentação
Nesta parte de nosso estudo tomaremos contato com três dos mais ilustres teóricos do pensamento
sociológico. São eles: Émile Durkheim, Max Weber e Karl Marx. Tamanha é a importância destes
pensadores que são os mesmos considerados os clássicos da sociologia, isto é, seus pilares de
sustentação, os fundadores desta ciência que estamos aprendendo.
Chamamos a atenção, para o fato de que, de uma forma ou de outra, cada um deles, contribuiu
profundamente para o pensamento crítico sobre a escola e os processos educacionais.
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
43
AulA 4 • AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL
Dizemos que são EXTERNOS porque são fatos coletivos, como a religião ou o sistema econômico,
por exemplo, independentes dos indivíduos, que já os encontram prontos quando nascem e que
morrerão antes que esses deixem de existir.
Ou seja, existem fora dos indivíduos e são internalizados por meio do processo de socialização.
Essas maneiras de agir e pensar são, além de externas, capazes, pelo seu poder coercitivo, de
obrigar um indivíduo a adotar um comportamento qualquer. A coerção pode se manifestar
direta ou indiretamente.
44
As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional • AULA 4
É DIRETA, por exemplo, quando o professor estabelece seus critérios de avaliação, aos quais o
aluno é coagido a se adaptar para se sair bem na prova. Mas é INDIRETA quando um empresário
passa a utilizar computadores para administrar os seus negócios, pois ele faz isso pressionado
pela concorrência, embora não exista nenhuma lei que o obrigue explicitamente.
A coerção pode também ser formal ou informal. É FORMAL, como o próprio nome já diz, quando
a obrigação e a punição pela transgressão estão estabelecidas formalmente. O Código Penal,
por exemplo, apresenta um grande número coerções formais para diversos atos predefinidos.
É INFORMAL quando é exercida espontaneamente pelas pessoas no seu dia a dia. Quando, por
exemplo, uma pessoa chama a atenção de outra por tentar furar uma fila.
Finalmente, a coerção pode estar OCULTA. A pessoa que cumpre de bom grado e com satisfação
as suas obrigações sociais não sente o peso da coerção sobre o seu comportamento. Uma pessoa
que gosta de sua profissão, por exemplo, geralmente cumpre seus deveres com prazer, sem a
necessidade de imposições. Mas a coerção nunca deixa de existir. Está sempre à espreita.
Quando se diz que são fatos sociais fixos ou não-fixos significa que podem se apresentar de duas
maneiras diferentes: como maneiras de agir ou como maneiras de ser.
As MANEIRAS DE AGIR são formas de atuar e pensar coletivas, que determinam o comportamento
dos indivíduos, que os obrigam a agir de uma determinada forma, mas não têm uma longa
duração no tempo, ou seja, são efêmeras e instáveis.
As MANEIRAS DE SER também são fenômenos de ordem coletiva que determinam o comportamento
dos indivíduos, mas nesse caso há uma durabilidade no tempo, uma permanência ou estabilidade.
Um sistema religioso ou econômico estabelecido pode ser um bom exemplo desse tipo de fato
social. Os dogmas de uma religião, que não foram criados por nenhum dos fiéis, se impõem de
maneira estável e contínua no tempo, coagindo as pessoas a os aceitarem.
Há uma relação importante entre esses dois tipos de fenômenos. Muitas vezes um movimento
social se inicia como maneira de agir e pode vir a se fixar e estabelecer (se institucionalizar) e
daí se tornar uma maneira de ser.
45
AULA 4 • As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional
Por exemplo, um movimento religioso de caráter momentâneo (um grupo de pessoas que se
reúne para ouvir um líder carismático, por exemplo) pode vir a se estabelecer como uma nova
religião organizada, estável e permanente.
Teríamos bons exemplos também no caso da língua que falamos. A língua portuguesa, em sua
versão formal, apresenta uma série de padrões e regras fixos, estáveis e, até mesmo, codificados.
Nesse aspecto, seria uma maneira de ser.
Por outro lado, a língua usada no dia a dia é viva e está em constante processo de transformação.
Novas palavras, gírias, novas sintaxes, novas formas verbais surgem o tempo todo. Nesse aspecto,
a língua estaria recheada de maneiras de agir passageiras e efêmeras.
É interessante observar que muitas dessas, digamos, maneiras de agir linguísticas se transformam
em maneiras de ser à medida que vão sendo incorporadas à língua padrão, à gramática e ao
dicionário. Basta lembrar da história da forma de tratamento VOSSA MERCÊ, que se transformou
em VOSMECÊ, depois em você (já incorporado) e que hoje, pelo menos em Minas Gerais, é CÊ.
Como vimos, em primeiro lugar Durkheim procura demonstrar que existe toda uma ordem de
fenômenos que devem ser explicados através do que ele denomina “fato social”. É porque estes
tais “fatos sociais” existem que a sociologia existe. Do contrário poderíamos explicar a ação
humana e a ordem social através de outras disciplinas.
É fato social toda maneira de agir, fixa ou não, suscetível de exercer sobre o
indivíduo uma coerção exterior; ou então ainda, que é geral na extensão de
uma sociedade dada, apresentando uma existência própria, independente das
manifestações individuais que possa ter.
A primeira observação importante é que a Sociologia deve explicar apenas os fatos sociais e
não todo e qualquer fenômeno que tenha “algum interesse social”. Assim Durkheim enumerará
fatos de importância social, mas que não fazem parte da província explicativa sociológica, como
comer, dormir e beber.
É bastante óbvio de que os seres humanos precisam comer, beber e dormir, e que uma sociedade
não perdurará se eles pararem de fazer isto (apesar de Durkheim nos seus momentos mais
exaltados chega a afirmar que a sociedade continuará existindo mesmo se todos os seus integrantes
46
As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional • AULA 4
morrerem. Obviamente não podemos tomar isto ao pé da letra.) Mas isto deve ser explicado pela
Biologia e pela Sociologia.
E como nós sabemos, era precisa DISTINGUIR a Sociologia não só da Biologia e Psicologia, mas
também da História, da Economia e da Filosofia.
Consoante, Durkheim afirma: “Na verdade, porém, há em toda a sociedade um grupo determinado
de fenômenos com caracteres nítidos, que se distingue daqueles estudados pelas outras ciências
da natureza.” (p.1)
O que nos chama a atenção é a frase “pelas outras ciências da natureza”. Não sei se trata-se de
um lapso, mas Durkheim deveria ter escrito “pelas ciências da natureza”, pois a sociologia é
uma ciência social, e não natural. Esta frase, aliás, pode ser um “lapso” de escrita, referindo-se
às preocupações metodológicas do autor.
Quando lemos estes trechos nunca podemos esquecer que os escritos de Durkheim continham
um forte conteúdo programático, no sentido de estabelecer um “lugar ao sol” para a Sociologia
no mundo acadêmico.
Quando nascemos nos deparamos com uma infinidade de instituições que nós não criamos,
por exemplo, “os sistemas de sinais de que sirvo para exprimir meus pensamentos, o sistema de
moedas que emprego para pagar as dívidas, os instrumentos de crédito..., as práticas seguidas
na profissão”.
Mais uma vez, a consciência individual é aquela que é apenas do indivíduo tomado isoladamente
e outras ciências da profusão de instituições previamente existentes faz com que a sua consciência
se torne social.
E como isto se dá, para Durkheim? Por meio da educação. Ele afirma:
Toda a educação consiste num esforço contínuo para impor às crianças maneiras
de ver, de sentir e de agir às quais não chegariam espontaneamente - observação
que salta aos olhos todas as vezes que os fatos são encarados tais quais são e tais
quais sempre foram. Desde os primeiros anos de vida, são as crianças forçadas
a comer, beber, dormir em horas regulares; são constrangidas a terem hábitos
higiênicos, a serem calmas e obedientes; mais tarde, obrigamo-las a aprender a
pensar-nos demais, a respeitar usos e conveniências, forçamo-las ao trabalho
etc. Se, com o tempo, esta coerção deixa de ser sentida, é porque pouco a pouco
47
AulA 4 • AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL
dá lugar a hábitos, a tendências internas que a tornam inútil, mas que não a
substituem senão porque dela derivam.
(pp.5-6)
fundamental para nos tornar-mos agentes sociais. Normal Superior. Em sua vida acadêmica, Durkheim foi
privilegiado por chegar à universidade no momento de
expansão do ensino francês. À época, impera a Terceira
Durkheim pode ser enquadrado como o principal
República francesa que derruba as universidades
teórico funcionalista da sociologia da educação. antigas, datadas da idade média, para transformá-
Em sua concepção, a educação cumpre a função las para algo grandioso: a universalização do ensino
de preparar as crianças para a sociedade. Assim, público. As novas universidades possuem o triplo do
tamanho das anteriores. É neste momento que nosso
seu papel principal é gerar os indivíduos que a
autor vai adentrar na vida acadêmica. Terá em sua vida
sociedade deseja ter no futuro. E ainda, que essa acadêmica como um todo a preocupação com o ensino,
educação se estabelece socialmente. Não cabe aos e sua função para a constituição da vida social.
passadistas ou futuristas, não importa; num caso, como noutro, não estarão
em condições de vida normal. Há, pois, a cada momento um tipo regulador
de educação, do qual não nos podemos separar sem vivas resistências, e que
restringem as veleidades dos dissidentes.
(DURKHEIM, 1967)
Vimos que a educação nos obriga a nos adequar a determinadas situações. Todavia, faz-se mister
definir, afinal, o que é educação. Segundo Durkheim, a educação é quando uma geração de adultos
impõe às crianças uma determinada forma de conduta. A pedagogia – teoria educacional –,
para isso é diversa, pois diversos são os caminhos para um indivíduo se realizar na vida social.
A educação não é única, pois a sociedade exige várias aptidões para realizá-la. Com isso, essa
diversidade social produzida pela diversidade educacional será benéfica para a sociedade
como um todo. Esta visão é contrária, por exemplo, a visão kantiana de que a educação deveria
48
AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL • AulA 4
ser única; desenvolver ao máximo as habilidades do indivíduo. Nosso autor acredita que uma
educação única só poderia existir em uma sociedade simples, como na existente no passado,
pois, a educação única seria reflexo de uma sociedade pouco desenvolvida. A sociedade atual
produz indivíduos diversos para cargos diversos. O nosso sentimento de igualdade, de pertencer
a um mesmo grupo ocorrerá pela religião, nacionalismo e certos valores morais apreendidos
durante a vida.
“A sociedade não poderia existir sem que houvesse em seus membros certa
homogeneidade: a educação a perpetua e reforça, fixando de antemão na alma
da criança certas similitudes essenciais, reclamadas pela vida coletiva.”
(DURKHEIM, 1967)
O homem, na concepção durkheimiana, é um ser que nasce individualista e insocial. Sua mente
neste momento está vazia, em estado de uma tabula rasa. O homem apesar de possuir herança
genética, ela é insuficiente para realizá-lo em sociedade. A educação, desta forma, prepara o
indivíduo para este novo momento social, já que as condições que ele encontrará serão diferentes
da do seu pai; assim como o prepara para a vida social.
» Aptidão que ele não possui. A sociedade, desta forma, obriga o indivíduo egoísta a aceitar
em seu interior o social. Depois de formado, o homem terá dentro de si dois elementos
que o constituem como Homem. O lado privado, individual; e o lado coletivo, social. O
homem só aceita esse domínio do social
pela necessidade de aceitação coletiva e, Saiba mais
ademais, ele só é considerado Homem,
Da Consciência Comportada à
quando realizado em sociedade. Dialética da Existência constitui
exercício de reflexão sobre a
Digno de nota é que posteriormente esta ênfase sociologia formulada por Emile
na educação foi substituída pelos mecanismos Durkheim, mais precisamente
no que se refere à abordagem
de introjeção da psicanálise, mais conhecidos
da dimensão normativa
como processos de internalização e socialização. da vida social e sua relação
Em outras palavras, trata-se de especificar como com a individualidade dos
sujeitos. Essa questão é problematizada observando-
tornamos internos os elementos sociais, e daí
se o conceito de consciência em sua expressão
derivamos o nome “socialização”. coletiva e individual e os aspectos concernentes
às representações (eixo da cultura) e distorções da
A Sociologia Durkheimiana é pré-Freudiana. percepção (eixo do conhecimento). O confronto dos
Subseqüentemente a teoria freudiana será utilizada aportes teóricos de Durkheim com a teoria psicanalítica
relevante é que as normas, convenções e hábitos Scortecci Editora - Psicologia - Formato 14 x 21 cm - 1ª edição - 2014 -
328 páginas
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AULA 4 • As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional
Assim para retomarmos nossas discussões sobre a inter-relação entre fatores genéticos e
sociológicos, é bastante plausível pensar que dois atores diferentes respondam de maneiras
diferentes a processos de socialização semelhantes devido a diferenças de cunho genético. E as
diferenças resultantes podem levar estes atores a contatar diferentes grupos de referência que
por sua vez levam a diferentes influências sociais que reforçam estas diferenças individuais.
...a educação tem justamente por objeto formar o ser social... A pressão de todos
os instantes que sofre a criança é a própria pressão do meio social tendendo
moldá-la à sua imagem, pressão de que tanto os pais quanto os mestres não são
senão representantes e intermediários.
(p.6)
Mais uma vez esta frase pode sugerir a existência de uma entidade sociológica superior quando diz
que os responsáveis pelos processos de socialização, os pais e mestres, são meros intermediários.
Mas Durkheim está querendo dizer que eles também não inventaram as instituições sociais, que
eles também foram formados sob a sua influência e que agora estão repassando este conhecimento,
este conteúdo social.
A educação, assim, é uma forma de coerção. Os fatos sociais são externos e coercitivos, mas
Durkheim afirma que “com o tempo, esta coerção deixa de ser sentida, é porque pouco a pouco
dá lugar a hábitos, a tendências internas que a tornam inútil mas que não a substituem senão
porque dela derivam.”
O ponto a ser detacado é que com a internalização dos conteúdos sociais nós nos tornamos
sociais e que há -parafraseando Parsons - uma mudança no significado do termo “coerção”. Mas
isto não quer dizer que deixamos de ser “sociais”.
Se “coerção” é concebida como algo puramente externo ela torna-se parte das condições para a
ação. Se as ações devem ser analisadas como o encontro da volição subjetiva com as condições
objetivas, então a coerção - concebida como elemento externo - deve ser vista como mais uma
condição objetiva que deve ser levada em conta, da mesma maneira que uma montanha ou uma
determinada disponibilidade de recursos.
Mas as normas sociais coercitivas deixam de ser externas por meio da educação. O que acontece,
segundo Parsons, é que:
50
AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL • AulA 4
O resultado é que Durkheim deixa de conceber a conformidade com as normas (ou seja, a
operação dos fatos sociais) como fruto de um desejo de não sofrer as prováveis conseqüências
externas deste ato.
Durkheim afirma que é “... incontestável que a maioria de nossas ideias e tendências não são
elaboradas por nós, mas nos vêm de fora, conclui-se que não podem penetrar em nós senão
através de uma imposição.”
É digno de nota que Durkheim utiliza a palavra “penetrar”, há uma transferência de elementos
externos para o interior (superego?) do ator.
Durkheim afirma que para sentirmos o jugo da sociedade basta tentarmos violar as normas sociais.
É possível e muitas pessoas violam as normas sociais, mas sempre sofrem as consequências, da
resistência das estruturas sociais (se você é empresário e teima em utilizar técnicas ultrapassadas)
e das outras pessoas (vingança, ostracismo, reprimendas e fofocas etc.)
Uma das maneiras de sentir o jugo das forças sociais são os efeitos que os grupos e massas
exercem sobre a consciência individual. Durkheim afirma:
51
AULA 4 • As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional
fariam isto se estivessem sozinhos, que houve um certo “efeito-gangue”, que os tornou capazes
de cometer aquela atrocidade. Muito provavelmente nenhum deles se reconhece no ato que
cometeu e daí o espanto das famílias, que conhecem, na maior parte das vezes, seus filhos
enquanto atores isolados.
Um exemplo óbvio é a violência nos estádios de futebol. Cidadãos pacatos podem se transformar
em pessoas violentas, prontas para massacrar seu oponente. Estes “efeitos-gangue” podem ser
muito importantes para compreendermos certas facetas de movimentos sociais, quais sejam,
aquelas caracterizadas por ações violentas. Pois é muito mais fácil a emergência de violência
e agressividade se o efeito-gangue se faz presente. Evidentemente a pré-condição para um
movimento social e para o efeito-gangue é a multiplicidade dos atores, a convivência grupal.
Durkheim afirmará que os fatos sociais são gerais devido à sua obrigatoriedade, ou seja, a
relação de causalidade é inversa. Saímos de uma instância coletiva (“Os fatos sociais são crenças,
tendências, práticas de grupo tomadas coletivamente”) e passamos à incorporação individual
(“... quanto às formas que os estados coletivos revestem ao refratar nos indivíduos, são coisas de
outra espécie.”), e não que fatos individuais são generalizados até se tornarem coletivos.
Para corroborar a sua tese Durkheim argumenta que a natureza coletiva das determinações
sociais fica evidente nos sentimentos coletivos que “explodem” numa reunião, é a existência de
uma energia especial, cuja fonte é coletiva.
Fatos morais ou sociais são externos em relação aos indivíduos e portanto são estranhos a eles
em alguma medida. No mínimo são coisas que não foram criadas pela pessoa e assim podem
diferir mais ou menos de seu pensamento. Além disso, esses fatos externos e estranhos têm a
capacidade de exercer coerção, isto é, podem se impor aos indivíduos como uma obrigação.
Desse ponto de vista, a sociedade, as regras e a moral aparecem como realidades que constrangem
o indivíduo, que limitam a sua ação e a possibilidade de realização de suas vontades. Viver em
sociedade representaria, assim, um sacrifício ou, no mínimo, um incômodo.
Mas esse é apenas um dos lados dessa questão. Se a sociedade e a moral só tivessem esse lado
negativo e coercitivo, seria muito difícil explicar a existência da ordem social.
É sabido que nenhum grupo ou sociedade pode sobreviver por muito tempo com base apenas
na coerção. Pessoas muito insatisfeitas são capazes de enfrentar qualquer tipo de perigo para
encontrarem uma saída. Basta observar que mesmo nos regimes políticos muito fechados,
mantidos pela violência, a resistência não deixa de existir e, na maioria das vezes, leva o sistema
à ruína.
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As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional • AULA 4
Os fatos sociais ou morais não são apenas obrigações desagradáveis que temos que seguir
independentemente de nossa vontade. São também coisas que queremos e necessitamos. Nesse
caso, a coerção deixa de se fazer sentir, se transforma em respeito. Aquilo que antes era uma
obrigação se transforma em um dever. Algo que poderia ser visto como um sacrifício passa a ser
visto como um prazer.
Isso acontece porque o indivíduo não se realiza fora da sociedade ou do grupo. Só entre outras
pessoas, num meio onde exista ordem e um conjunto de instituições morais reguladoras do
comportamento coletivo, o indivíduo pode encontrar segurança (tanto física como psicológica)
e tranqüilidade para levar a sua vida.
Por isso, ou seja, em retribuição a essa segurança, o indivíduo passa a ver a sociedade não como
um conjunto de obrigações estranhas a ele, mas como um conjunto de direitos e deveres que
ele precisa e, acima de tudo, quer respeitar.
“A sociedade é nosso cárcere, se dela nós não nos sentimos prisioneiros é porque
a ela nos conformamos.”
DURKHEIM, Émille. As regras do método sociológico. SP, Nacional, 985, 41-65
Para Durkhein a sociedade, como todo organismo vivo, apresenta estados normais e patológicos
(saudáveis e doentes). Émile Durkhein desenvolveu o caráter normal e patológico dos fatos.
Normalidade social
a. Sua generalidade (comum aos membros de uma sociedade) na “espécie” social a que
pertencem (“são normais suas formas que se repetem em todos os casos observados.”); e
b. Sua correspondência às condições de vida social (pois existem fenômenos que persistem
em toda a extensão da espécie, embora não correspondam mais as exigências da situação);
Assim, é normal o fato que não extrapola os limites dos acontecimentos mais gerais de determinada
sociedade que refletem as condutas mais aceitas pela maior parte da população.
53
AULA 4 • As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional
Assim, uma instituição, uma prática costumeira, uma conduta, uma regra moral, serão considerados
normais ou patológicas conforme se aproximam ou se afastem, respectivamente, do tipo “médio”
da sociedade.
A distinção entre normal e patológico passa pela fuga do mediano. Desta forma, o que é normal
varia de sociedade para sociedade.
Patologia social
Crime
“ ...os atos qualificados de crime não são os mesmos em toda a parte; mas sempre
e em todo lugar existiram homens que se conduziram de maneira a chamar sobre
si a repressão penal.”
Para Durkheim ele deve ser avaliado como um fato social normal nas espécies sociais:
2. O crime pode ser entendido como necessário (útil) para uma sociedade, pois se a
consciência coletiva (moral) fosse excessiva, se cristalizaria e a consciência individual
inovadora não se manifestaria. Desse modo, onde o crime existe é porque os sentimentos
coletivos estão no estado de maleabilidade necessária para tomar nova forma.
3. Representa um fato social que integra as pessoas em torno de uma conduta valorativa,
que pune o comportado considerado nocivo, que fere a consciência coletiva.
“...o crime se liga às condições fundamentais de toda a vida social e, por isso
mesmo tem sua utilidade; pois estas condições de que é solidário, são elas
próprias, indispensáveis à evolução normal da moral e do direito.”
Importante para a evolução e adaptação das instituições sociais cujo papel é moldar e
controlar padrões perduráveis de comportamento.
4. O crime é normal porque seria inteiramente impossível uma sociedade que se mostrasse
isenta dele.
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As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional • AULA 4
“...é impossível que a consciência moral da sociedade seja encontrada por inteiro
em todos os indivíduos e com suficiente vitalidade para impedir qualquer ato
que a ofendesse, fosse esta falta puramente moral ou propriamente um crime.”
6. É por essa lógica que ele irá avaliar o castigo imposto não como forma de acabar com
o crime, mas sim para mantê-lo na taxa social “média” (principalmente na sociedade
orgânica)3
Anomia
»» Seu aparecimento ocorreria quando diversas funções sociais se tornassem muito tênues
ou intermitentes.
Como as sociedades mais complexas são baseadas na diferenciação, é necessário que as tarefas
individuais correspondam a seus desejos e aptidões; como isso nem sempre acontece, os valores
ficam enfraquecidos e a sociedade é ameaçada pela desintegração – essa desintegração que é
resultante da divisão social do trabalho, é solucionada com formas cooperativistas de produção
econômicas, com grupos profissionais, associações de grupos que socializam o individuo e
despertam valores comunitários e disciplina moral).
As forças litigantes se desenvolvem sem limites e acabam se chocando umas contra as outras
para se recalcarem e se reduzirem mutuamente.
As paixões humanas só cessam diante de uma potência moral que respeitem. Não
são sancionadas senão pela opinião, não pela lei, e sabe-se quanto a opinião se
mostra indulgente com a maneira pela qual essas vagas obrigações são realizadas.
Os atos mais censuráveis são freqüentemente absolvidos pelo sucesso, que o
limite entre o que é proibido e o que é permitido, o que é justo e o que não é,
não tem mais nada fixo.
A SOLIDARIEDADE SOCIAL, para Durkheim, é formada pelos laços que ligam os indivíduos,
membros de uma sociedade, uns aos outros formando a coesão social.
3 Excertos do texto de Emile Durkheim “Regras relativas entre o normal e o patologico” IN: as regras do método sociológico , SP,
Nacional, 1985, 41-65)
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AULA 4 • As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional
Há dois tipos diferentes de solidariedade social. Esses tipos têm relação com o espaço ocupado na
mentalidade dos membros da sociedade pela consciência coletiva e pela consciência individual.
A CONSCIÊNCIA COLETIVA é representada pelo “conjunto das crenças e dos sentimentos comuns
à média dos membros de uma mesma sociedade que forma um sistema determinado que tem
vida própria”. São as crenças, os costumes, as ideias que todos que vivem em um mesmo grupo
compartilham uns com os outros.
A CONSCIÊNCIA INDIVIDUAL é aquilo que é próprio do indivíduo, que o faz diferente dos demais.
São crenças, hábitos, pensamentos, vontades que não são compartilhados pela coletividade, mas
que são especificamente individuais.
A consciência coletiva recobre espaços de distintos tamanhos na consciência total das pessoas
de acordo com o tipo de sociedade onde elas vivem. Assim, quanto maior for o espaço ocupado
pela consciência coletiva em relação à consciência total das pessoas em uma sociedade, mais a
coesão, nessa mesma sociedade, origina-se da conformidade e da semelhança existente entre seus
membros. Nesse caso, segundo Durkheim, a ordem social se fundamenta na SOLIDARIEDADE
MECÂNICA.
Isto é, quanto maior a consciência coletiva, mais os indivíduos se parecem uns com os outros
e portanto se ligam, se aproximam pelo que têm em comum. Pelo fato de terem os mesmos
pensamentos, os mesmos costumes, acreditarem nas mesmas coisas etc. A coesão, ou solidariedade
resulta das semelhanças.
Quanto menor for o espaço ocupado pela consciência coletiva em relação à consciência total
das pessoas em uma sociedade, ou quanto maior for a área ocupada pela consciência individual,
mais a coesão se fundamenta nas diferenças existentes entre os indivíduos.
Se a consciência individual é maior numa sociedade, os indivíduos são diferentes uns dos outros
e a solidariedade só pode surgir da percepção geral de que cada um, com suas especialidades,
contribui de uma maneira diferente, e importante, para a sobrevivência do todo, ao mesmo tempo
que depende dos demais membros, especialistas em outras funções. É essa rede de funções
interdependentes que promove a solidariedade orgânica.
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As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional • AULA 4
Durkheim não podia visualizar a olho nu qual tipo de solidariedade seria predominante em
uma sociedade dada. A solidariedade, como um fenômeno moral, só seria identificada a partir
de algum indicador que a fizesse visível.
Os tipos de normas do direito indicam, para Durkheim, o tipo de solidariedade que predomina
em uma sociedade.
DIREITO REPRESSIVO: A preocupação principal desse tipo de direito é punir aquele que não
cumpre determinada norma social através da imposição de dor, humilhação ou privação de
liberdade. A questão é que o criminoso agride uma regra social importante para a coletividade
e, portanto, merece um castigo de intensidade equivalente a seu erro.
Assim, quanto mais o direito tende a essa forma repressiva (direito penal), mais forte e abrangente é
a consciência coletiva em uma sociedade. É assim porque todo erro que é punido repressivamente
representa uma agressão contra a sociedade como um todo e não contra uma parte dela apenas.
DIREITO RESTITUTIVO: A preocupação principal nesse tipo de direito é fazer com que as
situações perturbadas sejam restabelecidas e retornem a seu estado original. Ao infrator cabe,
simplesmente, reparar o dano causado.
Isso acontece porque o dano causado não afeta a sociedade como um todo, mas apenas uma
função específica desempenhada nela. Quanto maior é a participação do direito restitutivo em
uma sociedade, menor é a força e a abrangência da consciência coletiva, maior é a diferenciação
individual.
Portanto, ao identificar o tipo de direito que predomina em uma sociedade, estamos identificando
o tipo de solidariedade existente. Predomina-se o direito repressivo, uma maior quantidade
de normas é mantida pela consciência coletiva (solidariedade mecânica). Se predomina o
direito restitutivo uma menor quantidade de normas diz respeito à sociedade como um todo
(solidariedade orgânica).
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AULA 4 • As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional
Teoria da história
(EVOLUÇÃO DAS SOCIEDADES ou evolução das formas de solidariedade entre os homens)
SOCIEDADE INDUSTRIAL
SOCIEDADE SEGMENTAR
MODERNA
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AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL • AulA 4
Sintetizando
ÉMILE DURKHEIM
» Criador da Escola sociológica francesa, Durkheim inaugura o uso da estatística em sociologia. Acreditava que métodos
científicos deveriam ser aplicados no estudo da sociedade.
» É preciso delinear com certeza os fatos que podem e devem ser objeto de estudo da sociologia.
» Não se confundem com fenômenos orgânicos, pois consistem em representações e ações coletivas. nem com os fenômenos
psíquicos que tem por substrato o indivíduo.
» Crenças, tendências, práticas do grupo tomadas coletivamente é que constituem os fatos sociais.
» Fatos sociais são: maneiras de agir, pensar e sentir exteriores aos indivíduos, dotados de um poder de coerção que são
imperativos.
» Para Durkheim, a solidariedade social é formada pelos laços que ligam os indivíduos, membros de uma sociedade, uns aos
outros formando a coesão social. São dois os tipos de solidariedade para este autor: Solidariedade Mecânica e Solidariedade
Orgânica.
» São dois os tipos de consciências na sociologia de Durkheim: a consciência coletiva define-se pelo conjunto de crenças,
costumes e ideias que todos que vivem em um mesmo grupo compartilham uns com os outros. A consciência individual é
aquilo que é próprio do indivíduo, que o faz diferente dos demais.
distância imensa e o desequilíbrio entre os Os pais de Karl constituíam um casal harmonioso, o que
parece ter contribuído de forma substancial para a formação
que detêm os instrumentos para a produção,
de sua personalidade.
como máquinas e equipamentos vários, e a
terra (meios de produção) e os que nada têm
a não ser sua força de trabalho (os assalariados, empregados e operários), constituindo duas
classes básicas e cada vez mais polarizadas.
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AulA 4 • AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL
O conflito humano resultante das desigualdades econômicas intrínsecas a estas duas classes
são, para Marx, o ponto chave das sociedades industriais modernas, juntamente com o modo,
a forma ideológica de manipular as ideias para que o grande povo não perceba o vínculo entre
poder econômico e poder político e sua influência na qualidade de vida de todos (alienação
política e cultural).
Segundo Catani (1992), a abordagem que Marx faz do capitalismo é a-histórica, pois o “...
capitalismo é definido como um determinado modo de produção de mercadorias, gerado
historicamente desde o início da idade moderna e que encontrou plenitude no processo de
desenvolvimento inglês, ao qual se chamou revolução industrial”.
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As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional • AULA 4
A proposta marxista
“Os filósofos se limitaram a interpretar o mundo de diferentes maneiras; o que
importa é transformá-lo.”
(MARX, 1987)
A partir de uma discussão com Hegel, Marx pôde expor uma de suas teses fundamentais. Hegel
dizia que a razão-abstrata (as ideias) é autogeradora e, além disso, geradora dos homens. Marx
rebate, defendendo a tese de que é o mundo concreto e, portanto, as pessoas em seu processo
real de vida que determinam a superestrutura ideológica, esta nada mais é do que o reflexo das
relações que se processam na base econômica.
(...) Hegel completou o idealismo positivo. Para ele, não apenas todo o mundo
material tinha se transformado num mundo dos pensamentos e toda a história
numa história dos pensamentos. Ele não se limita a registrar as coisas do
pensamento, mas procura também expor o ato de produção (...)
Todos os críticos filosóficos alemães afirmam que os homens reais têm sido até
aqui dominados e determinados
Para Marx as ideias são criadas pelos homens e não existem independente deles. Logo, a
superestrutura, enquanto sistema articulado de ideias que vem a constituir a consciência coletiva,
também não existe independente dos homens e estes se definem pelo modo que se inserem na
produção.
Neste sentido, são os homens realmente ativos, condicionados pelo modo de produção de sua
vida material, que produzem suas representações e ideias. Estas não se modificam ou evoluem
por si mesmas, mas sim em consequência de transformações que ocorrem na base material,
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AulA 4 • AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL
Daí resulta a concepção materialista da História, não mais como uma coleção de fatos mortos ou
como uma ação imaginada de sujeitos imaginados, trata-se agora de uma história real, resultante
do estudo do processo real da vida e da ação dos indivíduos em cada época determinada.
» Não é a consciência que determina a vida material, mas a vida material que determina
a consciência.
» Na história, podemos distinguir pelo menos cinco grandes modos de produção: Primitivo.
o regime asiático. escravatura. servidão (feudal) e a capitalista.
Vejamos alguns conceitos elaborados por Marx a fim de explicar a sociedade capitalista.
Para chegarmos a esta concepção de Estado, é preciso, antes de mais nada, compreendermos o
seguinte processo:
A divisão do trabalho é iniciada com a apropriação dos bens de produção por determinada classe e não por outra. A divisão
do trabalho acarreta, também, a divisão desigual dos produtos do trabalho, com isso é inevitável o aparecimento de interesses
antagônicos e, consequentemente, a luta de classes.
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AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL • AulA 4
Neste sentido, é simplesmente impossível que em uma sociedade de classes existam interesses
que possam ser considerados coletivos. “A história dos homens têm sido a história da luta de
classes” (MARX, K. O 18 brumário de Luís Bonaparte.) O que realmente pode existir (e existe)
são interesses específicos da classe dominante passados à população como sendo interesses de
toda coletividade.
É neste momento que se pode perceber o papel desempenhado pelo Estado enquanto mediador
das tensões sociais e, acima de tudo, enquanto elemento que expressa as relações de dominação
(DOMINANTES X DOMINADOS), à medida que encarna um suposto interesse coletivo, na
realidade, ditado pela classe dominante.
O Estado nada mais faz do que transformar o particular em coletivo por duas vias: ideológica
e repressiva. Coletivo este que nunca existirá realmente, sendo, portanto uma mera ilusão
alimentada por diversos interesses, dadas as condições anteriormente explicitadas
Saiba mais
O estado e sociedade
O Estado não está descolado da sociedade.
O monopólio do aparelho estatal, diretamente ou por meio de grupos interpostos, é a condição básica do exercício da
dominação.
O poder político é na verdade o poder organizado de uma classe para a opressão das outras.
Práxis
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AulA 4 • AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL
Para Marx:
“Não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência
idealista.”
(MARX, 1987)
Dialética
O que é Dialética?
A aplicação das teses fundamentais do materialismo dialético à realidade social deu origem
à concepção materialista da história. Segundo esta concepção, o entendimento da realidade
da vida só é possível a medida que conheçamos o modo de produção da sociedade – modo
de produção é aqui entendido como a maneira pela qual os homens obtêm seus meios de
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As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional • AULA 4
existência material. É por meio do modo de produção que conhecemos uma sociedade em sua
especificidade histórica e social;
História
O que distingue as diversas épocas econômicas não é o que produzem, mas sim
como produzem, com que instrumentos o fazem. Os instrumentos de trabalho
não são apenas o marco indicador do desenvolvimento da força de trabalho do
homem; são também o expoente das condições sociais em que trabalha. E, entre
os instrumentos de trabalho, os instrumentos mecânicos, cujo conjunto forma o
que podemos denominar sistema ósseo e muscular da produção, apresentam as
características essenciais de uma época social de produção de um modo muito
mais definido que os instrumentos que se limitam a servir de receptáculos aos
objetos de trabalho e aos quais em conjunto poderíamos designar, de um modo
bastante genérico, como sistema vascular de produção, isto é os tubos, os barris, as
canastras, os jarros etc. A indústria química é a única na qual estes instrumentos
adquirem uma importância considerável.
(MARX, 1959)
IDEOLOGIA
Com efeito, cada nova classe que passa a ocupar o posto da que dominou antes
dela se vê obrigada, para poder levar adiante as finalidades que persegue, a
apresentar seu próprio interesse comum de todos os membros da sociedade,
ou seja, expressando isso em termos ideais, a imprimir às suas ideias a forma
geral, a apresentar suas ideias como as únicas racionais e dotadas de vigência
absoluta (...)
(MARX; ENGELS, 1970)
65
AulA 4 • AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL
marx e a escola
Karl Marx mesmo sem se aprofundar ou escrever uma obra específica sobre educação, abordou
este tema. Segundo ele, como as condições materiais determinam a consciência do indivíduo,
seria necessário modificá-las para alterarmos a escola burguesa. Entramos aí em uma situação
dialética em relação à escola. A sociedade precisa ser modificada para alterar a escola. Mas,
sem alterar a escola, a sociedade não pode ser modificada. Ademais, a escola que é designada
aos pobres é a escola técnica. Alienadora, incompleta, ensinando à criança não a produção por
inteiro, desenvolvendo, desta maneira, todo o seu potencial, mas apenas uma parte dela. Agindo
assim, como a mola propulsora da diferenciação social e da determinação das classes sociais.
Marx, àquela época, tinha uma visão que ainda é hoje revolucionária. Importante lembrar, que
no momento em que nosso autor vive, as crianças trabalhavam nas fábricas como se fossem
adultas. Marx estipula que não mais do que duas horas seriam necessárias para ensinarmos
à criança aquilo que ela deveria aprender no trabalho. Vemos aqui algo de surpreendente. O
trabalho infantil seria “um dos mais poderosos meios de transformação da sociedade” pelo
reconhecimento das condições materiais dada – do seu tempo.
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AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL • AulA 4
Perceba que ocorre aqui uma diferenciação do conceito de criança. Se no século XXI cabe a criança
apenas o mundo da diversão, do prazer, do consumo, em suma, o mundo lúdico; no mundo
socialista a igualdade entre os homens romperia a questão temporal de adulto e criança. Não
haveria um momento da vida sem responsabilidade social, um momento de formação teórica
apenas. Mas sim uma interação entre a teoria ensinada nas escolas e a prática do cotidiano da
sociedade industrializada. O processo de criação do ser ultrapassa a separação burguesa entre
mundo de adulto e mundo infantil.
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AulA 4 • AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL
A escola assim é um locus privilegiado pois as crianças estão ali no momento de maior fragilidade,
já que não possuem capacidade crítica ou opinião própria. São obrigadas a se adequarem às
regras institucionais, aos seus professores – que muitas vezes não percebem qual é o seu papel
dentro desta instituição. Assim os anos de estudo de uma criança significam anos que a sociedade
possui para inculcar uma determinada ideologia sobre ela. A escola não se caracteriza, como dito
acima, de uma violência física – como polícia ou exército, mas sua violência é sutil, dissimulada
ou simbólica. Esse recurso garante a eficiência daquilo que se quer ensinar, modela os alunos
a sua maneira.
Assim, temos uma situação semelhante à ilustração acima, só que agora o grande produtor da
ação é o professor. Vejamos então o ciclo completo da ação do Estado sobre os indivíduos.
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AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL • AulA 4
é, a classe a qual pertence. Assim, toda forma questão da dominação e é um dos autores
mais lidos, em todo o mundo, nos campos
de educar é arbitrária “na medida em que
da antropologia e sociologia, cuja contribuição alcança as
a estrutura e as funções dessa cultura não mais variadas áreas do conhecimento humano, discutindo
podem ser deduzidas de nenhum princípio em sua obra temas como educação, cultura, literatura, arte,
mídia, linguística e política. Também escreveu muito sobre a
universal, físico, biológico ou espiritual,
Sociologia da Sociologia.
não estando unidas por nenhuma espécie Fonte: http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/
de relação interna à natureza das coisas ou
a uma natureza humana” 2. A cada ser socializado significa que uma determinada maneira de
pensar, agir ou falar foi imposta pela família, escola ou meio de comunicação. Na verdade, essas
várias formas agem em conjunto, cada qual inculcando, ou tentando inculcar, um pouco de si
no indivíduo. Vejamos um pouco da teoria para ficar mais claro.
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AulA 4 • AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL
família etc., capazes de inculcar sua violência simbólica em um indivíduo. Assim, se pensarmos
do todo da estrutura social, vemos que o estado pode ser a primeira instância da violência
simbólica, pois ele é capaz de criar leis que imponham uma determinada forma de pensar e
agir e, ainda, pode criar leis que legitimem suas proposições. As instituições que obedecem ao
estado, de uma forma ou de outra acabam por não só como inculcar como por legitimar essas
determinações. Esse domínio não deve ser explícito e, às vezes, nem quem o exerce percebe de
sua força de imposição. Assim, o Homem social é o Homem que foi inculcado uma forma de
pensar que pode ser da classe dominante ou não. Há uma vantagem da classe dominante em
termos de domínio do poder, pois, ao controlar o estado, pode usá-lo como instrumento de
imposição de suas ideias, valores, moral etc e, em muitos casos, excluindo por meio do concurso
e de artifícios relativos ao capital cultural educacional. Ou seja, apenas os indivíduos que sejam
capazes de articular as palavras, ideias de uma determinada maneira serão capazes de ter acesso
a um determinado cargo social. Esse concurso que visivelmente não tem preferência social, no
fundo esconde as determinações de classe que pela origem do indivíduo acabam por limitar sua
vida profissional a algo pré condicionado, reproduzindo assim sua classe.
Apesar de mostrar uma perversidade social, quando pensamos em termos de classes sociais,
Bourdieu explicita no prefácio de seu texto que esse mecanismo não é uma ação consciente de
todos agentes sociais; muitos são levados a reproduzi-lo. Apenas alguns possuem plena consciência
do seu papel na sociedade. Outro ponto que merece destaque, que é uma consequência deste
primeiro, é que um grupo qualquer que seja ele, produz violência simbólica. Não importa assim
a ideologia para reproduzir este fenômeno. Se alguém, ou alguma instituição desejar renunciar
ao papel de inculcador, estará se autoaniquilando, pois não existe a possibilidade de se produzir
a vida social sem que o substrato social se imponha ao indivíduo. Aquele que diz não o fazer, na
verdade, não tem consciência de sua ação social.
Quo. O aluno recebe a educação adequada Marx, constante de Pour Marx, faz uso de
um termo do filósofo da ciência Gaston
à sua situação de classe. Assim, teríamos
Bachelard ao propor uma “corte epistemológico” entre os
diferentes tipos de escola para diferentes escritos do jovem Marx, inspirados em Hegel e Feuerbach, e
tipos de pessoas. A escola seria membro seus textos posteriores, propriamente marxistas.
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Louis_Althusser
fundamental da imposição das classes
sociais. Isso significa que o indivíduo que
passa por determinada escola terá o seu
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AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL • AulA 4
destino traçado por ela. Ao receber uma forma de informação, ele estaria automaticamente
adentrando em uma classe posta. Daí a necessidade de transformação da escola.
Bourdieu e Althusser seguem uma linha bem próxima de análise da escola. Para eles a escola seria
um agente que busca reproduzir as situações de classe. O fato mais marcante desta análise é o
papel do professor, pois ele é um agente do Estado mesmo contra a sua vontade. Essa capacidade
de Estado de inculcar às crianças uma determinada forma de pensamento e de comportamento
social exterioriza o fato de que somente uma alteração no grupo dominante possa fazer uma
mudança social. Entretanto, cabe a observação de que as forças inculcadoras não são únicas e
não convivem sem conflito. Essas disputas ocorrem entre as instituições do Estado e até entre
os membros de uma mesma sociedade.
Neste sentido, emerge, por um lado, a função política do Estado de manter o controle social, e,
por outro, a questão da função política da escola de manutenção de um sistema social dado.
Faz-se necessário salientar, nesta relação Estado-Escola, a importância da escola como elemento
integrador da vida social. É pela escola que o indivíduo, para o bem ou para o mal, adquire
determinada formação social. Aprende valores e normas morais, uma profissão e a se socializar
com outros indivíduos. Caso ele não passasse por este processo, seria um marginal, não seria
apto à vida social. Ademais, com seu conhecimento adquirido, torna-se agente ativo das
transformações que são vividas pela sociedade. Pode ajudar a fazê-las ou não. Não é apenas um
ser que observa a vida passar. Desta forma, o Estado e a educação são elementos centrais na
aquisição de cidadania pelo indivíduo.
Sintetizando
Karl marx
» Para Marx, não basta interpretar o mundo, é preciso transformá-lo ® instaura-se, assim, o tribunal da Práxis.
» Partindo desta visão, Marx estabelece o conceito de dialética materialista: no conceito Marxista o termo materialismo refere-
se à teoria filosófica preocupada em destacar a importância dos seres objetivos (os homens) como elementos constitutivos da
realidade do mundo.
» Função política do Estado de manter o controle social, e, por outro, a questão da função política da escola de manutenção de
um sistema social dado.
» Relação Estado-Escola: a importância da escola como elemento integrador da vida social. É pela escola que o indivíduo, para
o bem ou para o mal, adquire determinada formação social. Aprende valores e normas morais.
» Formulação marxista identifica o Estado como um coletivo ilusório. O Estado, nesta visão, transforma o particular em geral.
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AulA 4 • AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL
Gundolf, com Werner Sombart, Ferdinand Tönn ies, Robert Primeiro exemplo de um estudo
Michels, Georg Simmel e Georg Lukács. Três gerações da elite interdisciplinar; no caso, de uma síntese
de pesquisas de história econômica e
intelectual alemã participavam das reuniões em casa de Max
de história da religião. Esse trabalho,
e Marianne Weber, em Heidelberg. que é até hoje a obra mais famosa de
Weber, saiu entre 1904 e 1905 no Archiv
Da multiplicidade desses contatos nasceu o grande trabalho für Sozialwissenschaft und Sozialpolitik
Die Protestantisch Ethik um der Gesit des Kapitalismus (A (Arquivo de Sociologia e de Política
Social), revista cuja direção tinha
Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo). Seus trabalhos,
assumido, junto com Sombart, em 1903.
nessa época, têm, muitas vezes, veemente tendência política:
combateu o latifúndio na Alemanha oriental dos Junkers,
predizendo-lhes catástrofe parecida com a do império romano; também combateu a burocracia
prussiana e o semi-absolutismo do imperador Guilherme II. Durante a guerra de 1914/1918, fez
apaixonada oposição jornalística ao governo imperial, citando as advertências dos profetas do
Velho Testamento.
Segundo Weber a Sociedade não pode ser vista como uma realidade material independente dos
indivíduos. Ao negar essa tese positivista, Weber procura compreender a sociedade como um
agregado de indivíduos que possuem suas motivações próprias. Ao mesmo tempo, o estatuto de
realidade objetiva é mudado para uma concepção menos determinista de sociedade, segundo
a qual a realidade é um fenômeno compósito; por isso, o cientista não conhece a sociedade de
antemão, nem consegue abarcá-la totalmente.
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AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL • AulA 4
Portanto, o objeto da sociologia para Weber, é o sentido da ação social, que deve ser buscado
pela apreensão da totalidade de significados e valores atribuídos pelos indivíduos. Nesse sentido,
ele procura mostrar que não há apenas uma causa dos fenômenos sociais; através da ideia de
“adequação de sentido”, Weber mostra a convergência da ação em duas ou mais esferas que compõe
o todo social (a economia, a política, a religiosa etc.), ou seja, a ação social é determinada por
mais de uma causa, sendo que cada causa tem importância variada sobre a determinada ação.
Weber, preocupado com o valor que cada indivíduo atribui à sua ação, procurou elaborar uma
tipologia para compreender as características particulares, definindo quatro tipos de ação:
É aquela ditada pelo estado de consciência ou humor do sujeito, é definida por uma
reação emocional do ator em determinadas circunstâncias e não em relação a um
73
AULA 4 • As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional
objetivo ou a um sistema de valor, por exemplo, a mãe quando bate em seu filho por
se comportar mal.
»» Ação Tradicional
É aquela ditada pelos hábitos, costumes, crenças transformadas numa segunda natureza,
para agir conforme a tradição. O ator não precisa conceber um objeto, ou um valor nem
ser impelido por uma emoção, obedece a reflexos adquiridos pela prática.
Tanto a ação afetiva quanto a tradicional produzem relação entre pessoas (relações
pessoais), são coletivas, comunitárias, nos dão noção de comunhão e conceito de
comunidade.
É aquela definida pela crença consciente no valor - interpretável como ético, estético,
religioso ou qualquer outra forma - absoluto de uma determinada conduta. O ator age
racionalmente aceitando todos os riscos, não para obter um resultado exterior, mas
para permanecer fiel a sua honra, qual seja, a sua crença consciente no valor. O que
importa é a própria ação.
O método weberiano
Weber chamou seu método de “construção de tipos ideais”. Partindo da ação social, categoria
construída como unidade analítica básica, constrói unidades lógicas mais abrangentes, sempre
apontando tipologias similares, implícita ou explicitamente, em cada unidade. Mostra que a ação
social é mutuamente referida por significados comuns e compõe o conceito de relação social,
tratando a seguir do conceito de associação. Nas associações, destaca o caráter ordenado, um
contexto organizado que serve como referência para os agentes individuais dele participantes.
De modo análogo à ação social, as associações desempenham atividades sociais orientadas no
sentido dos fins determinados pela ordem em que têm existência.
74
As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional • AULA 4
Refinando o conceito de ordem, elabora mais dois outros com ele relacionados: o de validez
e o de legitimidade, com vistas a demonstrar o caráter de dominação de todas as associações
humanas. Desse modo, explicita uma tipologia de autoridade, sua mais divulgada contribuição
para a sociologia e a ciência política.
Weber considera que uma progressiva tendência á racionalização se constitui no princípio mais
geral da transformação social. Tal tendência se expressa em uma reorganização dos significados
internalizados nos agentes sociais, permitindo a implantação de ordens sucessivas. Desse modo, a
realidade histórica é pontilhada de descontinuidades. Nessa perspectiva, a história apresenta ciclos
totais, interrompidos por movimentos de caráter excepcional, chamado por ele de carismáticos.
Em torno de uma oscilação entre o cotidiano e o extracotidiano – a rotina e o carisma –, compões
um padrão de transformação multilinear, conforme demonstra a vinculação sistemática de todos
os seus estudos sobre a religião e sobre a burocratização que chega a substituí-la.
O método em ciências sociais, isto é, nas disciplinas que aspiram a conhecer os fenômenos da
vida segundo a sua significação cultural, possui uma peculiaridade decisiva, não podendo ser
reduzido ao estabelecimento de leis gerais;
»» Partir do que é específico em cada cultura para o que é geral, e deduzir daí o que é
significativo do ponto de vista científico.
»» O Tipo Ideal: No que se refere à investigação, o conceito de tipo ideal propõe-se a formar
o juízo de atribuição, não é uma hipótese, mas pretende apontar o caminho para a
formação de hipótese. Embora não constitua uma exposição da realidade, pretende
conferir a ela meios expressivos unívocos.
Originalidade
75
AULA 4 • As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional
científicos para a sociologia; como racionalista teoriza sobre tipos de ação emocional, concedendo
papel importante a esta tanto quanto às ações racionais; como herdeiro de hegelianismo, nega
o absoluto e utiliza a dialética de modo autônomo.
Outros traços apresentados em sua contribuição não são suficientes para defini-lo de modo claro.
Muitas vezes sua teoria é vista como subjetivista, quando sua posição quanto à objetividade é
claramente manifesta. Outras vezes á chamado de psicologista, quando suas opiniões a respeito
das descobertas de Freud são muito cépticas. No entanto, sua teoria oferece importante paralelo
entre a sociologia e a psicologia, como respeito ao fato de a ação de um ego estar referida a um
alter, conforme mostra Talcott Parsons, ao associá-lo a Freud.
Como filósofo Weber foi político e como político foi cientista. Mas não teve filosofia sistemática:
seu espírito era filosófico. A empresa intelectual de Weber, antes de tudo, foi surpreender a
sociedade tal como é pensada pelos agentes individuais, e acompanhar a maneira como seus
significados mentalizados se modificavam no tempo. Realizou seu empreendimento, criando
uma crítica da razão sociológica.
Contribuições teóricas
Relação Social
Uma conduta plural (de vários), reciprocamente orientada, dotada de conteúdo significativos
que descansam na probabilidade de que se agirá socialmente de um certo modo, constitui o que
Weber denomina de relação social. Podemos dizer que relação social é a probabilidade de que
uma forma determinada de conduta social tenha, em algum momento, seu sentido partilhado
pelos diversos agentes numa sociedade qualquer.
Quando, ao agir, cada um de dois ou mais indivíduos orienta sua conduta levando em conta a
probabilidade de que o outro ou os outros agirão socialmente de um modo que corresponde às
expectativas do primeiro agente, estamos diante de uma relação social. Como exemplo de relação
social, as trocas comerciais, a concorrência econômica, as relações políticas.
Estratificação Social
A concepção de sociedade construída por Weber implica numa separação de esferas – como a
econômica, a religiosa, a política, a jurídica, a social, a cultural – cada uma delas com lógicas
particulares de funcionamento.
76
As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional • AULA 4
Partindo, portanto, do princípio geral de que só as consciências individuais são capazes de dar
sentido à ação social e que tal sentido pode ser partilhado por uma multiplicidade de indivíduos,
Weber estabeleceu conceitos referentes ao plano coletivo – a) classes, b) estamentos ou grupos de
status e c) partidos – que nos permitem entender os mecanismos diferenciados de distribuição
de poder, o qual pode assumir a forma de riqueza, de distinção ou do próprio poder político,
num sentido estrito.
Poder e Dominação
O conceito de poder é amorfo já que significa a probabilidade de impor a própria vontade dentro
de uma relação social, mesmo contra toda a resistência e qualquer que seja o fundamento dessa
probabilidade.
Dominação Legal: obedece-se não à pessoa em virtude de seu direito próprio, mas à regra
estatuída, que estabelece ao mesmo tempo a quem e em que medida deve obedecer. Seu tipo
mais puro é a burocracia.
77
AulA 4 • AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL
Desencantamento do mundo
A humanidade partiu de um universo habitado pelo sagrado, pelo mágico, excepcional e chegou a
um mundo racionalizado, material, manipulado pela técnica e pela ciência. O mundo de deuses e
mitos foi despovoado, sua magia substituída pelo conhecimento cientifico e pelo desenvolvimento
de formas de organização racionais e burocratizadas.
que lhes foi destinado pela vontade de Deus, e glorifica-lo d. Wirtschaft und Gesellschaft (Economia e
por meio de suas atividades produtivas. Sociedade), 4 volumes, 1922.
A essa dedicação verdadeiramente religiosa ao trabalho, Weber chamou de vocação. Essa ética
teve conseqüências marcantes sobre a vida econômica e, ao combinar a restrição do consumo
com essa liberação da procura da riqueza, é obvio o resultado que daí decorre: a acumulação
capitalista através da compulsão ascética da poupança. Mas este foi apenas um impulso inicial.
A partir dele o capitalismo libertou-se do abrigo de um espírito religioso.
Estado
O Estado é um instrumento de dominação do homem pelo homem, para ele só o Estado pode
fazer uso da força da violência, e essa violência é legítima (monopólio do uso legítimo da força
física), pois se apóia num conjunto de normas (constituição).
Sintetizando
Max weber
O Método
O método em ciências sociais, isto é, nas disciplinas que aspiram a conhecer os fenômenos da vida segundo a sua significação
cultural, possui uma peculiaridade decisiva, não podendo ser reduzido ao estabelecimento de leis gerais.
78
AS mATRIzES DO PENSAmENTO SOCIOLógICO E AS DIFERENTES ANáLISES DO FENômENO EDUCACIONAL • AulA 4
A Objetividade do Conhecimento
Como é possível, apesar da existência dos valores, alcançar a objetividade nas ciências sociais?
É preciso distinguir entre os julgamentos de valor e o saber empírico. Os valores devem ser incorporados a conscientemente
à pesquisa e controlados através de procedimentos rigorosos de análise, caracterizados como esquemas de explicação
condicional.
Os Tipos Ideais
Um conceito típico-ideal é um modelo simplificado do real, elaborado com base em traços considerados essenciais para a
determinação da causalidade, segundo os critérios de quem pretende explicar um fenômeno.
O tipo ideal é utilizado como instrumento para conduzir o autor numa realidade complexa.
Ação Social
Toda conduta humana dotada de um significado subjetivo (sentido) dado por quem a executa e que orienta essa ação.
A explicação sociológica busca compreender e interpretar o sentido da ação social, não se propondo a julgar a validez de tais
atos nem a compreender o agente enquanto pessoa. Compreender uma ação é captar e interpretar sua conexão de sentido,
somente a ação com sentido pode ser compreendida pela Sociologia. Em suma: ação compreensível e ação com sentido.
Saiba mais
Duração: 90’
Para relações com a teoria Durkheimiana
Filme de 1982
Pink Floyd The Wall é um filme produzido no ano de 1982 pelo diretor britânico Alan Parker,
baseado no álbum The Wall, da banda Pink Floyd.
79
AULA 4 • As matrizes do pensamento sociológico e as diferentes análises do fenômeno educacional
Especificações Técnicas: Mídia: DVD, Ano de produção: 2006, Duração: 132 min., Estúdio:
Warner Bros. / Silver Pictures / Anarchos Productions Inc. / Virtual Studios.
80
Aula
DIFERENÇA, EXCLUSÃO SOCIAL E
Desigualdade Social 5
Apresentação
Na aula anterior vimos algumas abordagens que enfatizam a questão da Estrutura social e
sua relação com o fenômeno educacional. Salientamos, sobretudo a visão marxista da relação
entre Estado e Educação, fonte de inspiração de muitos estudiosos sobre a Educação.
objetiivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
»» Construir uma visão crítica sobre a realidade brasileira no que diz respeito á população
não branca.
81
Raça e Etnia
A discussão em torno do tema raça e etnia é um dos debates mais constantes na sociedade
contemporânea. Sobretudo porque esta questão está no cerne dos conflitos que o mundo vem
atravessando, sejam por causa das guerras entre os povos, os constantes conflitos étnicos, por
exemplo, no oriente médio. Seja por causa da exclusão social pela qual alguns grupos raciais
passam em diversos países, aqui no Brasil, negros e índios, nos EUA os latinos dentre outros.
Pode-se compreender melhor o que se quer dizer quando escrito pelo antropólogo,
etnólogo e filósofo francês
fala-se de raça quando se atenta para as questões de cor
Claude Lévi-Strauss,
de pele, tipo de cabelo, conformação facial e cranial, publicado em 1952 na França, pela Unesco.
ancestralidade e genética. O conceito de Etnia está
relacionado ao âmbito da cultura, os modos de viver, costumes, afinidades lingüísticas de um
determinado povo criam as condições de pertencimento naquela determinada etnia. Pode-se
compreender melhor as questões étnicas a partir dos inúmeros exemplos que enchem a televisão
de manchetes, como os eternos conflitos entre grupos étnicos no oriente médio que vivem em
disputa política por territórios ou por questões religiosas.
Porém estes conceitos não são suficientes para que se possa compreender a realidade dos grupos
sociais que sofrem com estas questões. Como afirmou Octavio Ianni, “a questão racial parece um
desafio do presente, mas tem sido permanente. Transforma-se ao acaso das situações, das formas
de sociabilidade, dos interesses políticos, sociais e econômicos, mas reitera-se continuamente,
modificada mas persistente.”4 Neste sentido, a questão racial revela, de forma particularmente
evidente, um jogo de forças sociais que compreende identidade e alteridade, diversidade e
desigualdade, cooperação e hierarquização, dominação e subjugação.
Ainda segundo Ianni, “em perspectiva ampla, a história do mundo moderno é também a história
da questão racial, um dos dilemas da modernidade.” 5A questão racial revela-se um desafio
permanente, ao lado de outros dilemas, também fundamentais, como as guerras religiosas, as
desigualdades masculino-feminino, o contraponto natureza e sociedade e as contradições de
classes sociais. Todos, indivíduos e coletividades, cientistas sociais, filósofos, artistas somos
clamados. com frequência a viver situações e/ou interpretá-las, sem alcançar a explicação, nem
4 Sobre este assunto ver Ianni, Octavio. Escravidão e racismo, 2ª ed., São Paulo, Hucitec, 1988.
5 Ibid
82
resolver a situação. São muitas, recorrentes e diferentes, as tensões e contradições polarizadas
em termos preconceitos, xenofobias, etnicismos, segregacionismos ou racismos, multiplicadas
ou reiteradas no curso dos anos, décadas e séculos, em diferentes lugares do planeta.
Conceituando:
Preconceito
É um julgamento prévio negativo sobre uma pessoa, um grupo, uma cultura etc. Quem
age com preconceito costuma estar fundamentado em estereótipos negativos, indicando
desconhecimento ou ausência de informações suficientes a respeito de quem está sendo
julgado. O preconceito pode levar à discriminação.
Discriminação
A palavra vem do latim discriminis, que significa separar. É o nome que se dá ao ato de restringir
certos indivíduos de oportunidades ou privilégios que estão disponíveis para outros indivíduos.
Discriminar é, portanto, atuar de forma a fazer uma distinção de certas pessoas, podendo levá-las
à exclusão ou à marginalização.
Segregação
É uma ação política, pautada em leis ou normas, que tem como objetivo manter à distância, em
espaços próprios que lhes são reservados, determinados indivíduos ou grupos considerados
indesejados ou inferiores. Para isso, são estabelecidas fronteiras espaciais ou sociais, que aumentam
as desvantagens entre grupos discriminados. Esta prática é baseada na ideia de superioridade
étnica, de gênero, de nacionalidade etc. Podemos citar como exemplos de práticas segregacionistas
o regime do Apartheid, na África do Sul; o regime de segregação racial nos Estados Unidos; e o
Nazismo, na Alemanha.
Agora que já firmamos a base conceitual, fica mais evidente como o preconceito pode ser
bastante perigoso para os indivíduos e para a sociedade? Ele é transmitido muitas vezes sem que
percebamos e tende a misturar-se ao contexto cultural, de modo que fica mais difícil de superá-lo.
Deste modo, o preconceito pode levar à discriminação e à segregação de outros indivíduos.
83
AulA 5 • DIFERENÇA, EXCLUSÃO SOCIAL E DESIgUALDADE SOCIAL
Preconceito racial
O preconceito racial, também chamado racismo, é uma violação aos direitos humanos. Desde o
tempo da escravidão, o domínio de brancos sobre negros tem escrito uma história de violência
e desigualdade. Mas esse processo não aconteceu apenas no Brasil. O preconceito racial é uma
forma de exclusão comum no mundo todo.
Tal fenômeno, cujas origens são complexas, ocorre com maior ou menor intensidade em todas
as etnias, em todos os países e continentes e suas origens são muito complexas. Quando o Japão,
por exemplo, conseguiu, na primeira metade do século XX, um desenvolvimento econômico
comparável ao da Europa, surgiu no seio do povo japonês uma ideologia racista muito semelhante
à que justificava o colonialismo europeu.6
Saiba mais
» A exaltação do nacionalismo – ideologia que romantiza e deforma o ideal de nação – potencializada pela Primeira
Guerra Mundial e suas consequências, notadamente os revanchismos que marcaram os tratados entre vencedores e
vencidos após o conflito, visto que o peso “humilhante” dos tratados, tidos como impagáveis pelos vencidos, teriam
estimulado tal exaltação.
» O misticismo irracionalista – que contaminou a visão política das massas populares após 1918. Com efeito, ao
contrário da ilusão liberal-iluminista de que os povos – enquanto partícipes da política – levariam à vitória a
democracia, ocorreu, isto sim, a militarização da ação política, acompanhada pelo fanatismo nacionalista que gerou
soluções totalitárias como o fascismo e o comunismo soviético.
84
DIFERENÇA, EXCLUSÃO SOCIAL E DESIgUALDADE SOCIAL • AulA 5
No Brasil, a história de seus conflitos e problemas envolveu bem mais do que a formação de
classes sociais distintas por sua condição material. Nas origens da sociedade colonial, o nosso
país ficou marcado pela questão do racismo e, especificamente, pela exclusão dos negros. Mais
que uma simples herança de nosso passado essa problemática racial ainda toca o nosso dia a
dia de diferentes formas.
Apesar do intercurso cultural descrito acima, esse todo camburão tem um pouco de navio negreiro
todo camburão tem um pouco de navio negreiro
contato desencadeou alguns desencontros. As
diferenças se acentuaram, levando à formação de é mole de ver
que para o negro
uma hierarquia de classes que deixava evidentes
mesmo a AIDS possui hierarquia
a distância e o prestígio social entre colonizadores Na África a doença corre solta
e a imprensa mundial
e colonos. Os índios e, em especial, os negros
dispensa poucas linhas
permaneceram em situação de desigualdade comparado, comparado
ao que faz com qualquer
situando-se na marginalidade e exclusão social,
figurinha do cinema
sendo esta última compreendida por uma relação comparado, comparado
ao que faz com qualquer
assimétrica em dimensões múltiplas – econômica,
figurinha do cinema
política, cultural. Sem a assistência devida dos ou das colunas socias
85
AULA 5 • DIFERENÇA, EXCLUSÃO SOCIAL E Desigualdade Social
Esse acontecimento inicial parece ter de algum modo subsistido, contribuindo para o quadro
situacional do negro. O seu cotidiano coloca-o frente à vivência de circunstâncias como
preconceito, descrédito, marginalização, evidenciando a sua difícil inclusão social.
Essa manifestação de desigualdade de poderes e direitos não possui uma origem natural, como
defendido por muitos teóricos no passado7, mas partiu de uma construção social sem base
objetiva decorrente de representações ideológicas que englobam crenças e valores de um grupo
dominante que busca manter a ordem social ou o ideal do ethos branco. Seu objetivo é sustentar
as relações assimétricas e monopolizar as ideias e ações de um determinado grupo, mantendo-o
preso e dominado por esses conceitos, falseando a realidade, ocultando contradições reais,
construindo no plano imaginário um discurso aparentemente coerente e a favor da unidade
social. Parece haver interesse na transmissão de uma ideologia inferiorizadora, que objetiva
dominar, dividir, eliminar, desculturalizar, embranquecer, perpetuando mitos e estereótipos
negativos referentes à população negra.
A condição acima citada parece estar resumida em uma afirmação enfática do sociólogo Berger
(1991)8: “A dignidade humana é uma questão de permissão social”. A princípio, ela nos causa um
certo impacto, mas, ao analisarmos as consequências do preconceito racial, percebemos que se
encontra coerente com a afirmação citada, pois o preconceito inviabiliza o reconhecimento da
dignidade do sujeito, comprometendo a sua inclusão social.
7 Refiro-me a elaboração no século XIX de teorias que pregavam diferenças inatas e permanentes entre bancos e não-brancos.
Essas elaborações influenciaram de modo marcante a compreensão das ciências sociais sobre a questão racial. Essa prática,
que utiliza critérios de raça para segregar, humilhar, discriminar, foi denominada racismo.
8 BERGER, P. Perspectivas sociológicas: a sociedade no homem. In: Perspectivas sociológicas. Petrópolis/RJ: Vozes, 1991
9 D’ADESKY, J. Pluralismo étnico e multiculturalismo: racismos e anti-racismos no Brasil, Rio de Janeiro: Pallas, 2001.
86
DIFERENÇA, EXCLUSÃO SOCIAL E Desigualdade Social • AULA 5
O preconceito afeta não apenas o destino externo das vítimas, mas a sua própria consciência, já
que o sujeito passa a se ver refletido na imagem preconceituosa apresentada. Muitos negros são
induzidos a acreditar que sua condição inferior é decorrente de suas características pessoais,
deixando de perceber os fatores externos, isto é, assumem a discriminação exercida pelo grupo
dominante. Nesse momento, surge a idealização do mundo branco e a desvalorização do negro,
construindo-se a seguinte associação: o que é branco é bonito e certo, o que é negro é feio e errado.
O preconceito racial cria uma ação perversa que desencadeia estímulos dolorosos e retira
do sujeito toda possibilidade de reconhecimento e mérito, levando-o a utilizar mecanismos
defensivos das mais diversas ordens, contra a identidade ou o pensamento persecutório que o
despersonaliza e o enlouquece. Nessa perspectiva, é fortalecida a ideia de dominação de grupos
que se julgam mais adiantados, legitimando os desequilíbrios e desintegrando a dignidade dos
grupos dominados.
Essas elaborações preconceituosas parecem estar, assim, a serviço de um grupo dominante que
objetiva manter sob coerção grupos considerados subordinados. A sua forma de consolidação e
constante atualização ocorre nos espaços microssociais, representados pelas diversas instituições,
como escola, família, igreja, meios de comunicação. A sua forma de manifestação, em geral, é
feita de modo sutil, com toda a legitimação social no que se refere aos métodos e à garantia da
sua conseqüente eficácia.
87
AULA 5 • DIFERENÇA, EXCLUSÃO SOCIAL E Desigualdade Social
Desigualdade Social
A desigualdade social, seja ela social, econômica ou sob qualquer outra forma, materializa-se no
espaço social, ou seja, torna-se visível na composição estrutural das sociedades, sejam elas rurais
ou urbanas. As cidades e os lugares expressam a diferenciação econômica entre as pessoas, que
é resultante, muitas vezes, de questões históricas que submetem cidadãos e até grupos étnicos
a contextos de subalternidade. Um exemplo foi o processo de escravidão que até hoje deixa suas
marcas no sentido de manter a maior parte da população negra com baixos níveis de renda e
educação.
88
DIFERENÇA, EXCLUSÃO SOCIAL E Desigualdade Social • AULA 5
Exclusão social
O conceito de exclusão social está mais próximo, como oposição, do de coesão social ou, como
sinal de ruptura, do de vínculo social.
A condição de excluído lhe é imputada do exterior, pura e simplesmente, sem que para isso ele
tenha praticado qualquer ação ou mesmo tenha contribuído direta ou indiretamente para o
processo.
A exclusão social pode ocorrer como resultado de uma rede de rupturas dos vínculos sociais,
sejam eles econômicos, familiares, afetivos, religiosos ou trabalhistas. O termo exclusão pressupõe
um não-reconhecimento como igual, seja de um indivíduo, seja de um grupo.
Na Europa, por exemplo, uma de suas manifestações pode ser representada pela forte xenofobia
que se abate sobretudo sobre os imigrantes africanos e árabes; já no mundo árabe são bastante
difundidas as exclusões de grupos étnicos ou religiosos, às vezes dentro do mesmo país. Ainda
hoje temos viva a lembrança dos ataques violentos ocorridos na Grã Bretanha entre irlandeses
e ingleses, por conta de uma fortíssima exclusão religiosa.
Diferenças Sociais
Todas as culturas produzem realidades distintas, mas em todas elas existe um conjunto de
práticas regulares, que se repetem ao longo do tempo. Na medida em que estas práticas se
reproduzem, acabam criando o que chamamos de padrões culturais. Conforme estes padrões vão
sendo passados de geração em geração, tendemos a naturalizar os tipos de comportamento, de
vestimentas, de linguagem etc, que estão associados a eles. Sendo assim, quando nos deparamos
com outros costumes, a tendência é pensar no que é diferente não a partir daquilo que o torna
distinto, mas sim pelo que o distancia daquilo que nosso grupo social considera como “normal”,
“puro”, “certo” etc.
89
AULA 5 • DIFERENÇA, EXCLUSÃO SOCIAL E Desigualdade Social
Considerando tal conceituação, podemos verificar que esses termos, embora guardem uma
estreita conexão entre si, são muito distintos. Por exemplo, em todas as sociedades verifica-se a
existência de grupos sociais diferentes, mas não necessariamente tais grupos sofrem desigualdade
social. Infelizmente, essa não é uma realidade corrente.
Desigualdade econômica
Desigualdade de gênero
http://educarparacrescer.abril.com.br/comportamento/coisa-menino-coisa-menina
A sociedade salarial não é uma sociedade de igualdade, há uma grande diferença entre o
rendimento gerado pelo homem em comparação à mulher e até mesmo o acesso aos bens sociais,
por exemplo, acesso à educação e cultura.
90
DIFERENÇA, EXCLUSÃO SOCIAL E Desigualdade Social • AULA 5
Desigualdade Racial
Parte desses tipos de práticas discriminatórias resultam de estereótipos, que é quando as pessoas
fazem suposições sobre as tendências e características de determinados grupos sociais, muitas
vezes incluindo grupos étnicos, normalmente enraizadas em suposições sobre a biologia,
capacidades cognitivas, ou mesmo falhas morais inerentes.
Estas atribuições negativas são então divulgadas através da sociedade por meio de diferentes meios,
incluindo a televisão, jornais e internet, os quais desempenham papel na promoção de preconceitos
de raça e assim marginalizando grupos de pessoas. Infelizmente, isto, juntamente com a xenofobia
e outras formas de discriminação continuam a ocorrer nas sociedades contemporaneamente.10
Você notou como o tema da desigualdade social é fundamental para compreendermos a dinâmica
da vida social no tocante às diferenças entre os indivíduos e grupos no interior de uma sociedade.
Primeiramente a desigualdade pode ser definida, de maneira simples, como a condição na qual os
membros de uma sociedade possuem bens ou propriedade, prestígio e poder. As desigualdades
também podem ocorrer em função das diferenças de gênero, raça, idade, afiliação religiosa,
dentre outras. A consequência está no acesso diferenciado (desigual) dos indivíduos e grupos
à educação, aos postos mais qualificados de trabalho, às melhores remunerações, à saúde, à
participação política, aos bens de consumo, à justiça etc.
Qual a origem das desigualdades, como superá-las e, ainda mais importante, quais os mecanismos
de reprodução que permitem sua manutenção e a continuidade? Essas são questões que
desafiam a promessa burguesa de igualdade, liberdade e fraternidade, considerados os pilares
da equidade e da justiça na sociedade moderna. Somos todos iguais ou somos todos iguais em
nossas diferenças?
10 http://www.mundoeducacao.com/geografia/desigualdade-social.
91
AulA 5 • DIFERENÇA, EXCLUSÃO SOCIAL E DESIgUALDADE SOCIAL
A diferença não se relaciona necessariamente com a ética, pois uma pessoa pode ser diferente
da outra e não ser desigual. Diversidade também não representa a mesma coisa que diferença ou
desigualdade. O princípio da diversidade consiste em admitir que as pessoas podem ser iguais
e, ainda, ter atitudes e práticas diferentes. Por exemplo, no seu grupo de amigos existem pessoas
que gostam de se vestir de formas distintas, o que as torna diferentes, mas não desiguais entre si.
Basicamente, é a tentativa de se respeitar o outro, ou seja, aceitar nossos diferentes como iguais.
É a possibilidade de invertermos a lógica de funcionamento de atitudes que servem para tornar
legítima a desigualdade.
Quando esquecemos preceitos básicos para vida em sociedade, agimos sem perceber o outro
em sua individualidade.
Essas atitudes estão presentes em pequenos atos e frases que reproduzimos e não paramos para
interpretar. Como exemplo, podemos citar: “os índios são uns selvagens”.
Diante desse estado de miséria, exclusão, apartação, diferença e falta de perspectiva de muitos
indivíduos ao redor do mundo, você certamente já ouviu a frase: “o mundo não tem jeito...”
Mas saiba que existem muitas pessoas preocupadas com a condição em que nos encontramos
atualmente. Organizadas em diversas entidades, procuram, através do seu trabalho, alternativas
para que as sociedades possam se tornar territórios de iguais, onde as diferenças sejam respeitadas,
e a exclusão, superada.
Sintetizando
» O conceito de raça está intimamente relacionado com o âmbito biológico, as diferenças de características físicas que
fazem daquele grupo social um grupo particular.
» O conceito de Etnia está relacionado ao âmbito da cultura, os modos de viver, costumes, afinidades lingüísticas de
um determinado povo criam as condições de pertencimento naquela determinada etnia.
» A sociedade brasileira caracteriza-se por uma pluralidade étnica, sendo esta produto de um processo histórico que
inseriu num mesmo cenário três grupos distintos: portugueses, índios e negros de origem africana. Esse contato
favoreceu o intercurso dessas culturas, levando à construção de um país inegavelmente miscigenado, multifacetado,
ou seja, uma “unicidade” marcada por conflitos e antagonismos.
92
DIFERENÇA, EXCLUSÃO SOCIAL E DESIgUALDADE SOCIAL • AulA 5
» Desigualdade deriva de um tipo de privação social, como, por exemplo, quando existem em uma sociedade pessoas
ricas e pobres. Isso não significa que elas sejam diferentes essencialmente, mas que a condição de estar pobre ou rico
é o que as posiciona em lugares sociais distintos, tornando-as desiguais.
» A exclusão social pode ocorrer como resultado de uma rede de rupturas dos vínculos sociais, sejam eles econômicos,
familiares, afetivos, religiosos ou trabalhistas. O termo exclusão pressupõe um não-reconhecimento como igual, seja
de um indivíduo, seja de um grupo.
Sugestão de leitura
O filme faz uma analogia entre o antigo comércio de escravos e a atual exploração da
miséria pelo marketing social, que formam uma solidariedade de fachada. O filme
critica ONGs e suas captações de recursos junto ao governo e empresas privadas.
Crash
Filme de 2004
93
Aula
Processos Educacionais no Brasil
e as Teorias Contemporâneas da
Sociologia da Educação 6
Apresentação
Na aula anterior vimos algumas abordagens que enfatizam a questão da relação entre raça e
segregação social. Salientamos, sobretudo os processos históricos e sociais que contribuíram para
realidade de exclusão em que vive grande parte da população negra no Brasil contemporaneamente.
Fizemos ainda uma análise crítica sobre o papel da escola na difusão e/ou supressão do preconceito
étnico.
Nesta aula, vislumbraremos algumas das principais contribuições da sociologia para a educação.
Abordaremos ainda os processos educacionais no Brasil e mostraremos a visão de alguns
dos teóricos mais importantes. Ao final, faremos um esforço de compreensão no sentido de
entendermos a escola como espaço da formação de identidade.
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
94
PROCESSOS EDUCACIONAIS NO BRASIL E AS TEORIAS CONTEmPORÂNEAS DA SOCIOLOgIA DA EDUCAÇÃO • AulA 6
No Brasil podemos dizer que a preocupação com a educação começou no início do século passado.
Neste momento surge a escola científica, instalada em São Paulo para aplicar seu método ao nosso
sistema educacional. Vindo da Itália, da Escola Normal de Modena, Ugo Pizzoli deseja implantar
aqui uma escola que pudesse adequar o conteúdo ao tipo de aluno especificado. Dentre essas
opções, temos os NORMAIS, os ANORMAIS e os DEGENERADOS. A educação correta deveria ser
aplicada após as diferenciações dos alunos segundo os diagnósticos fornecidos pela psicologia.
Assim, a psicologia e a pedagogia andariam de mãos dadas para a melhor gestão dos esforços
educacionais.
» ANORMAIS: Indivíduos que fogem aos parâmetros normais, mas ainda podem ser
recuperados pela sociedade.
A educação então poderia ser normal ou emendatória, vai depender da análise do indivíduo.
Para os dementes, degenerados ou imorais, a educação emendatória tinha o objetivo de
corrigi-los. Desta maneira, a seleção de quem receberia que tipo de educação é uma maneira de
decidir quem vai ser incluído no rol dos cidadãos ou nos dos excluídos. Assim, não se gastariam
recursos com seres que não possuem a capacidade de aprender e se desenvolver socialmente.
95
AulA 6 • PROCESSOS EDUCACIONAIS NO BRASIL E AS TEORIAS CONTEmPORÂNEAS DA SOCIOLOgIA DA EDUCAÇÃO
A Escola Nova foi um movimento de renovação do ensino que foi especialmente forte
na Europa, na América e no Brasil, na primeira metade do século XX. O escolanovismo
desenvolveu-se no Brasil sob importantes impactos de transformações econômicas,
políticas e sociais. O rápido processo de urbanização e a ampliação da cultura
cafeeira trouxeram o progresso industrial e econômico para o país, porém, com
eles surgiram graves desordens nos aspectos políticos e sociais, ocasionando uma
mudança significativa no ponto de vista intelectual brasileiro.
A Escola Nova recebeu muitas críticas. Foi acusada principalmente de não exigir nada, de abrir
mão dos conteúdos tradicionais e de acreditar ingenuamente na espontaneidade dos alunos. A
leitura das obras e a análise das poucas experiências em que, de fato, as ideias dos escolanovistas
foram experimentadas com rigor mostram que essas críticas são válidas apenas para interpretações
distorcidas do espírito do movimento.
Apesar de todo o seu sucesso, a Escola Nova não conseguiu modificar de maneira significativa
o modo de operar das redes de escolas e perdeu força sem chegar a alterar o cotidiano escolar.
Saiba mais
Manoel Bergström Lourenço Filho nasceu em 1897 em Porto Ferreira, no interior de São Paulo.
Cursou duas vezes a escola Normal e formou-se em Direito. Foi indicado, aos 24 anos, para diretor
da Instrução Pública do Ceará, com a incumbência de reorganizar o ensino do estado. O trabalho,
que durou dois anos e meio, foi uma das primeiras realizações da Escola Nova e obteve grande
repercussão. Até o fim da vida, Lourenço Filho escreveu e publicou grande número de artigos e
livros de psicologia, pedagogia, gestão educacional e literatura infantil, além de obras didáticas.
Traduziu títulos importantes de autores como Émile Durkheim (1858-1917) e Edouard Claparède
(1873-1940). Morreu em 1970, no Rio de Janeiro.
A partir da década de 1960 temos o grande marco na educação brasileira com Paulo Freire. Seu
método utilizado no nordeste revolucionou o modo de pensar a educação. Se até este momento
a educação é vista como modeladora do indivíduo, este método visa utilizar as experiências do
aluno como elemento base para sua educação.
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PROCESSOS EDUCACIONAIS NO BRASIL E AS TEORIAS CONTEmPORÂNEAS DA SOCIOLOgIA DA EDUCAÇÃO • AulA 6
Saiba mais
Paulo Reglus Neves Freire (Recife, 19 de setembro de 1921 — São Paulo, 2 de maio de 1997) foi um
educador, pedagogista e filósofo brasileiro. É Patrono daEducação Brasileira.
Paulo Freire é considerado um dos pensadores mais notáveis na história da Pedagogia mundial,1
tendo influenciado o movimento chamado pedagogia crítica.
A sua prática didática fundamentava-se na crença de que o educando assimilaria o objeto de estudo
fazendo uso de uma prática dialética com a realidade, em contraposição à por ele denominada
educação bancária, tecnicista e alienante: o educando criaria sua própria educação, fazendo
ele próprio o caminho, e não seguindo um já previamente construído; libertando-se de chavões
alienantes, o educando seguiria e criaria o rumo do seu aprendizado. Destacou-se por seu trabalho na área da educação
popular, voltada tanto para a escolarização como para a formação da consciência política.
Autor de Pedagogia do Oprimido, livro que propõe um método de alfabetização dialético, se diferenciou do “vanguardismo” dos
intelectuais de esquerda tradicionais e sempre defendeu o diálogo com as pessoas simples, não só como método, mas como um
modo de ser realmente democrático.
Em 13 de abril de 2012 foi sancionada a lei no 12.612 que declara o educador Paulo Freire Patrono da Educação Brasileira.
Foi o brasileiro mais homenageado da história: ganhou 41 títulos de Doutor Honoris Causa de universidades como Harvard,
Cambridge e Oxford.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Paulo_Freire
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AulA 6 • PROCESSOS EDUCACIONAIS NO BRASIL E AS TEORIAS CONTEmPORÂNEAS DA SOCIOLOgIA DA EDUCAÇÃO
A partir da década de 1970 a Escola Tecnicista ganhou força no Brasil. Ela parte do pressuposto
de que a melhor forma de adaptar o indivíduo à sociedade é treiná-lo para uma profissão no
mercado de trabalho. Ela é muito útil na formação de mão de obra especializada. Ali, aluno e
instrutor interagem de modo pré-determinado, não há espaço para divagações ou divergências.
O conteúdo a ser aprendido é determinado e sabido de antemão. O instrutor possui o papel de
indicar o caminho – que pode ser por meio de um texto, uma prática -, para que o aluno saiba a
resposta adequada ao problema. Assim, estímulo-resposta é o método da escola tecnicista. Hoje,
no século XXI, assistimos uma proliferação deste tipo de escola profissionalizante. Possuem o
nome de politécnico e profissionalizante em geral.
Além disso, a teoria esboça nove eventos de instrução e processos cognitivos correspondentes:
Já Benjamin Bloom construiu um modelo que ficou conhecido como a TAXONOMIA DE BLOOM.
Nela o autor argumenta que as operações cognitivas podem ser classificadas em seis níveis
hierárquicos de complexidade. Os níveis seguem o seguinte parâmetro:
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PROCESSOS EDUCACIONAIS NO BRASIL E AS TEORIAS CONTEmPORÂNEAS DA SOCIOLOgIA DA EDUCAÇÃO • AulA 6
Numa abordagem socio-antropológica, a identidade é uma construção que se faz com atributos
culturais, isto é, ela se caracteriza pelo conjunto de elementos culturais adquiridos pelo indivíduo
através da herança cultural. A identidade confere diferenças aos grupos humanos, ao mesmo
tempo em que os torna únicos. Ela se evidencia em termos da consciência da diferença e do
contraste do outro.
A educação tem relação direta com a produção de identidade. A escola, independente de ser
reprodutora ou socializadora, é um elemento que constrói a identidade do indivíduo ao longo
dos anos. Como verifica Sposito11:
O tema da identidade aparece, assim, como importante, porque esta fase, ao ser
caracterizada como de transição, pois nela se gesta um vir-a-ser, é, ao mesmo
tempo, uma construção do presente. (...). a questão do auto-reconhecimento e de
ser reconhecido. Assim, a identidade, individual ou coletiva, sempre pressupõe a
dimensão da alteridade, ao ser uma categoria social e relacional. (MELUCCI, 1992).
Ela se constrói a partir de experiências comuns que se defrontam e confrontam.
Como afirma Paula MONTERO (1987), um dos elementos que faz evidenciar a
questão da identidade situa-se nos grupos emergentes que passam a competir
pela conquista de um mesmo espaço social.
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AulA 6 • PROCESSOS EDUCACIONAIS NO BRASIL E AS TEORIAS CONTEmPORÂNEAS DA SOCIOLOgIA DA EDUCAÇÃO
Mas é preciso, também, levar em conta esse movimento que constitui a identidade
em sua dupla dimensão: trata-se de se perceber semelhante aos outros (ser
reconhecido e reconhecer) e, ao mesmo tempo, afirmar a diferença enquanto
indivíduo ou grupo. Esta diferença, paradoxalmente, só pode ser afirmadae vivida
como tal, ao supor uma certa igualdade e uma certa reciprocidade.
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PROCESSOS EDUCACIONAIS NO BRASIL E AS TEORIAS CONTEmPORÂNEAS DA SOCIOLOgIA DA EDUCAÇÃO • AulA 6
completa separação da escola e religião ou o Estado Laico, enquanto outros optam pelo convívio
apenas com seus pares.
No Brasil, não só a escola está deixando de ser laica. O estado do Rio de Janeiro, por exemplo,
passou a ensinar religião nas escolas públicas. Temos em oposição diametral o caso francês em
que as meninas muçulmanas são impedidas de usarem o véu na escola. Este conflito tem sido
a tônica deste século. O grupo versus a sociedade; o local versus o universal.
Sintetizando
» Para Louis Althusser, a escola foi a grande novidade do sistema capitalista na divulgação de sua ideologia. Se no
mundo feudal tínhamos o par Igreja-Família, hoje em dia temos Escola-Família.
» Pierre Bourdieu publica o livro A Reprodução. Nele argumenta que o processo educacional é uma violência simbólica
no indivíduo. Essa violência ocorre, pois, o indivíduo é coagido de várias maneiras a reproduzir um determinado
comportamento de classe, isto é, a classe a qual pertence. Assim, toda forma de educar é arbitrária.
» No Brasil, a preocupação com a educação começou no início do século passado com a escola científica, instalada em
São Paulo.
» A educação deveria ser aplicada após as diferenciações dos alunos segundo os diagnósticos fornecidos pela
psicologia. Assim, a psicologia e a pedagogia andariam de mãos dadas para a melhor gestão dos esforços
educacionais.
» Hoje, no século XXI, esta escola ainda tem seu lastro na proliferação deste tipo de escola profissionalizante. Possuem
o nome de politécnico e profissionalizante em geral.
» Benjamin Bloom construiu um modelo que ficou conhecido como a taxonomia de Bloom. Nela o autor argumenta
que as operações cognitivas podem ser classificadas em seis níveis hierárquicos de complexidade.
» A escola é como um microcosmo social, nela nos relacionamos e realizamos múltiplas tarefas.
» A identidade é uma construção que se faz com atributos culturais, isto é, ela se caracteriza pelo conjunto de
elementos culturais adquiridos pelo indivíduo através da herança cultural.
» Tema clássico da Sociologia a construção da identidade articulada ao processo de socialização não é novidade nas
múltiplas abordagens das ciências sociais.
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