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Acórdãos TRL Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa

Processo: 5/11.6IDFUN.L1-3
Relator: ADELINA BARRADAS DE OLIVEIRA
Descritores: DILIGÊNCIAS DE PROVA
VERDADE MATERIAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03-10-2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário: Em nome da descoberta da verdade material e da justiça do caso
concreto, deve deferir-se o pedido de produção de prova que não se
tenha conseguido obter durante a investigação, ou outra que
contribua para a descoberta da verdade material e para a
realização da Justiça.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam proferido na 3ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa
Nos presentes autos interpôs o MP um recurso intercalar no qual 
alega o seguinte:
Os três arguidos supra identificados chegaram a julgamento
acusados pela prática de quatro crimes de fraude fiscal
Através do recurso à utilização de facturas falsas, ficcionaram
custos fiscalmente relevantes na actividade da sociedade arguida
durante o exercício fiscal relativo ao ano de 2006, de onde resultou,
para todos eles, a obtenção de uma vantagem patrimonial ilegítima
com o correspondente prejuízo para o Estado Português.
Durante o julgamento que teve lugar no âmbito dos presentes
autos, veio o Ministério Público requerer diligências de prova
ulteriores, mais precisamente a audição de António ... e José ... na
qualidade de testemunhas, bem como a solicitação à D.R.A.F. do
envio a estes autos das certidões das declarações fiscais
apresentadas pela sociedade arguida referentes aos períodos de
I.R.C. e I.V.A. indicados na acusação pública, e, ainda, da própria
declaração fiscal apresentada pela sociedade “B.” relativa ao
período 2006/06T.

O Ministério Público formulou tal pedido sublinhando que as


referidas diligências probatórias se mostravam indispensáveis à
descoberta da verdade, designadamente para a prova dos factos 5.,
6., 8., 11., 12., 13., 14 e 15. da acusação pública e oferecendo os
fundamentos resumidamente enunciados nos pontos III) e IV) do
segmento A.1) da motivação de recurso que antecede e que aqui
damos por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos
legais.
Porém, a Mma. Juiz indeferiu o pedido de produção das diligências
probatórias acima referidas invocando os fundamentos
resumidamente enunciados no ponto VI) do segmento A.1) da
motivação que antecede (e que aqui damos por integralmente
reproduzidos para os devidos efeitos legais).
Perante o sentido do aludido despacho, o Ministério Público,
declarando expressamente que não abdicava da faculdade legal de
contra o mesmo poder recorrer, arguiu de imediato a nulidade
processual que o mencionado despacho consubstanciou, solicitando
a sua reparação com o deferimento das diligências peticionadas.
No entanto, o Tribunal recorrido indeferiu também a arguição da
nulidade efectuada pelo Ministério Público proferindo despacho
onde exarou que a decisão anterior está devidamente
fundamentada, de facto e de direito, pelo que inexiste qualquer
nulidade processual.
Na sentença depois proferida neste processo, o Tribunal A Quo
absolveu todos os arguidos da prática dos crimes de fraude fiscal
que lhes foram imputados por ter dado como não provados os
factos a que acima fizemos referência como sendo precisamente
aqueles por nós referidos no ponto 3.) destas conclusões, cuja cabal
demonstração dependia das diligências probatórias ulteriores
peticionadas pelo Ministério Público igualmente descritas no ponto
2.) destas conclusões (e cuja não prova foi decisiva para a
absolvição dos arguidos).
O presente recurso versa, portanto, sobre os dois despachos acima
destacados sob os pontos 4.) e 6.) destas conclusões de recurso: ou
seja tanto incide sobre o despacho que rejeitou a audição das duas
testemunhas e a junção do acervo documental indicado no referido
ponto 4.) destas conclusões, como também incide sobre o
subsequente despacho nos termos do qual o Tribunal rejeitou,
outrossim, a existência da nulidade processual invocada pelo
Ministério Público nos termos supra expostos.

A.2) - Enquadramento jurídico do caso


De acordo com a disciplina legal estabelecida no art. 340º, nº 1, do
Código de Processo Penal, é inequívoco poder
afirmar-se que,
entre outros meios de prova, a prova documental e testemunhal
serão sempre admissíveis na fase de julgamento mesmo depois do
momento processual em que, por regra, deveriam ter sido
produzidas - ou seja já depois da fase de inquérito, instrução,
contestação ou até do art. 316º do Código de Processo Penal –
desde que revelem ser indispensáveis para a descoberta da verdade
e boa decisão da causa e que tal produção de prova tenha lugar até
ao encerramento da audiência.
B.1.) Da questão referente à indevida rejeição da prova
testemunhal requerida
Apesar da fase de julgamento em processo penal estar
fundamentalmente vocacionada para a discussão de toda a prova
já indicada no processo que será, consequentemente, aí
reproduzida, vigora, ainda, nesta fase do processo, o princípio da
investigação ou da descoberta da verdade material (bem como o do
inquisitório). Uma das consequências deste princípio fundamental
da lei processual penal, resulta na obrigação do Tribunal no sentido
de, mesmo na fase de julgamento, oficiosamente ou a requerimento,
ordenar as diligências de prova que se mostrem necessárias à
descoberta da verdade, desde que cumpridos os requisitos legais
enunciados no art. 340º, nº 1, do Código de Processo Penal. Tal
significa, para além do mais, que o legislador processual penal teve
a preocupação de fazer prevalecer o interesse da descoberta da
verdade, o qual constitui um princípio nuclear e estruturante de
todo o processo penal, sobre os formalismos inerentes ao momento
da indicação e produção da prova.
Não assiste, portanto, qualquer razão ao Tribunal A Quo ao ter
indeferido a audição de testemunhas peticionada pelo Ministério
Público nos termos acima expostos, mesmo admitindo que o
Ministério Público pudesse e devesse ter indicado a prova em
apreço nos momentos sublinhados pelo julgador.
Isto porque, em primeiro lugar, é preciso ter em conta que, de
acordo com a tese da acusação, os cheques cujas cópias foram
juntas aos autos serviram para simular pagamentos dos arguidos à
sociedade “B.” como forma de justificar os pagamentos das
facturas em causa, sendo certo que, de acordo com a mesma tese,
os serviços subjacentes a tais facturas não existiram ou, se
existiram, não foram realizados pela sociedade “B.”, o que significa
que o dinheiro em questão nunca foi pago a esta sociedade nem a
ninguém a ela ligado, tendo sido reconduzido, por isso, à sua
origem, ou seja à esfera patrimonial dos arguidos.
Logo, sendo as duas testemunhas cuja audição ora se pretende quem
procedeu ao levantamento/desconto dos cheques de fls. 113 e 116, no
valor global de € 170.000,00 (que são dois dos 5 cheques indicados na
acusação) e não tendo as mesmas nenhuma ligação conhecida à
sociedade “B.”, a sua audição mostra-se indispensável à descoberta
da verdade pois só estas poderão esclarecer a que título procederam
ao levantamento dos cheques em apreço, em que circunstâncias
concretas o fizeram e a quem entregaram o dinheiro daí resultante,
o que servirá para “desnudar” o mencionado esquema fraudulento
executado pelos arguidos.
Com efeito, como a própria sentença reconhece, o julgador ficou
com dúvidas sobre se os trabalhos a que se reportavam as facturas
foram ou não prestados, sobre se foi ou não a “B.” a prestá-los,
assim como se o Divino ... era ou não o seu gerente de facto e, em
suma, se tais facturas se reportavam ou não a operações simuladas,
sublinhando que a prova indirecta ou indiciária recolhida se
mostrou insuficiente para as dissipar.
Por conseguinte, não podia o Tribunal ter rejeitado a produção da
prova ulterior requerida pelo Ministério Público. Ainda para mais
quando os arguidos nada contribuíram para o esclarecimento dos
factos (já que se remeteram integralmente ao silêncio) e quando a
prova requerida se mostrava susceptível de poder dilucidar as ditas
dúvidas ilustrando os factos que suportam a acusação:
designadamente a existência de pagamentos simulados para ocultar
o verdadeiro destino do dinheiro pretensamente utilizado para
pagar as facturas que, por seu turno, são idóneos a demonstrar a
falsidade das mesmas (ainda que juntamente com a restante prova
já produzida nos autos).
E não podia porque, ao tê-lo feito, entrou numa clara contradição
que se prende com a invocação de dúvidas para sustentar a
absolvição dos arguidos quando estas mesmas dúvidas poderiam
ser dissipadas com a produção da prova ulterior peticionada pelo
Ministério Público e quando nem os próprios arguidos forneceram
ao Tribunal qualquer versão alternativa dos factos susceptível de
originar as ditas dúvidas.
(...) o julgador estava legalmente obrigado a admitir tais depoimentos,
independentemente do Ministério Público dever ter ou não
providenciado mais cedo pela sua inquirição, pelo que, não o tendo
feito, violou os comandos legais previstos no supra referido art. 340º,
sendo certo que o Tribunal nem sequer explicou porque razão, no
seu entendimento, a referida a audição das sobreditas testemunhas
não se mostrava indispensável à descoberta da verdade.
(...) a testemunha Samuel ..., ao contrário do que referiu nas
declarações prestadas no âmbito da acção inspectiva sobre a
sociedade arguida levada a cabo pela Inspecção Tributária, veio
agora referir em julgamento ter entregado o dinheiro de três dos
cheques identificados nos autos ao referido Divino ... quando não o
disse na referida audição perante a Inspecção Tributária.
Isto significa que, na nossa óptica, e por obediência ao princípio da
investigação e da descoberta da verdade material, se impõe ouvir
primeiro as duas testemunhas ora indicadas pelo Ministério Público
(responsáveis pelo levantamento dos outros dois cheques em causa
nestes autos) para, depois, e oportunamente, mediante o que por elas
for dito, considerar o chamamento do referido Divino ... para vir
esclarecer se recebeu o dinheiro em questão, a que título e qual a sua
intervenção no presente contexto. Note-se que, a este respeito, até o
próprio Tribunal recorrido considerou que seria fundamental para
a descoberta da verdade a audição do mencionado Divino … sem
ter, no entanto, diligenciado pela sua audição pois bastou-se com
uma informação elaborada pelo S.E.F. há mais de seis anos, ou seja
em Junho de 2011.
Perante tal cenário, que terá de encarar-se como superveniente na
medida em que difere do panorama probatório reflectido no
inquérito, pode mesmo justificar-se ser também ulterior a
necessidade de ouvir as testemunhas agora chamadas pelo Ministério
Público, o que permitiria a audição das mesmas ainda que não se
considerassem indispensáveis para a descoberta da verdade.
Posto isto, consideramos que, também na perspectiva da alegada
intempestividade do requerimento do Ministério Público, carece de
validade a tese defendida pelo Tribunal recorrido, pelo que,
também nesta linha de pensamento se mostra que tal tese violou o
disposto no art. 340º, nº 1, do Código de Processo Penal.
B.2) Da questão referente à indevida rejeição da prova documental
requerida
O Tribunal A Quo, com as suas decisões, negou peremptoriamente
o chamamento aos autos do acervo documental descrito nos pontos
II) e IV) do segmento A.1) da motivação do presente recurso, sendo
certo que, ao ter obstaculizado a consecução de tal acto, violou o
disposto nos arts. 165º, nº 1, e 340º, nº 1, do Código de Processo
Penal. Não colhe a argumentação expendida pelo Tribunal A Quo
no sentido de que os documentos em apreço, face à produção da
prova realizada nos autos, não eram indispensáveis para a
descoberta da verdade material com a agravante de que, apesar de
assim ter concluído, não explicou no despacho proferido porque
razão os documentos em causa não eram indispensáveis para a
descoberta da verdade.
Na verdade, se é sabido que um dos períodos de I.V.A. onde se
integram as facturas falsas indicadas na acusação e indevidamente
contabilizadas pela sociedade arguida é precisamente o período
2006/06T, e se é sabido que a sociedade “B.” apresentou apenas
uma declaração de I.V.A. no período 2006/06T cujo conteúdo era
desconforme com os resultados do cruzamento de dados de outros
sujeitos passivos efectuados pela administração fiscal, torna-se
indispensável à descoberta da verdade carrear para o processo essa
declaração única com vista ao auxílio da demonstração dos factos 8.)
e 13.) da acusação (nomeadamente no concernente ao facto da
sociedade “B.” não ter exixc stência real e não poder ter prestado
os serviços reportados nas facturas), ainda que este elemento
probatório careça de ser avaliado conjuntamente com os demais já
existentes nos autos.
Com efeito, esta sociedade não só nada declarou fiscalmente em
quaisquer outros períodos como também, no único período em que
faz essa declaração, não menciona qualquer dado de onde se possa
presumir a eventual existência de qualquer relação comercial com a
sociedade arguida, nem denota, tão pouco, ter subcontratado
serviços compatíveis, em termos de valor, grandeza e natureza, com
aqueles que depois alegadamente prestou à sociedade arguida,
tendo em conta nomeadamente a área de actividade da sociedade
arguida e a ordem de grandeza documentada nos valores das
facturas (daí que a integração no processo da referida declaração
fiscal de 2006/06T da “B.” seja essencial no sentido de contribuir
para a demonstração deste estado de coisas juntamente com os
demais elementos documentais dos autos).
A certidão das declarações de I.V.A. e I.R.C. da sociedade arguida
relativas aos períodos fixados no nosso requerimento (originais e
corrigidas) e que correspondem aos da acusação, mostram-se,
também elas, indispensáveis à descoberta da verdade igualmente por
três ordens de razões principais.
Isto porque: em primeiro lugar, só com base em tais declarações
fiscais se pode firmar a prova dos factos 11.) e 12.) da acusação no
sentido de garantir e demonstrar que a sociedade arguida declarou
à administração fiscal indevidamente como custos as facturas
indicadas pela acusação e que essa declaração fiscal foi levada a
cabo pelos arguidos em ordem à obtenção das vantagens
patrimoniais ilegítimas descritas no facto 11.) da acusação; em
segundo lugar, pois só com base na data de entrega das referidas
declarações se pode aferir com o rigor necessário qual a data de
consumação dos crimes imputados aos arguidos; e em terceiro
lugar, pois só estribados no teor das declarações fiscais da
sociedade arguida expurgadas das incorrecções apontadas pela
Administração Fiscal poderá fazer-se prova do facto 12.) da
acusação onde se refere que a sociedade arguida repôs a verdade
fiscal regularizando a sua situação declarativa e pagando os valores
de impostos em dívida.

B.3) Conclusões a extrair dos dois pontos anteriores


Posto tudo isto, sucede que, feita a necessária comparação entre a
argumentação contida nos dos dois despachos ora recorridos e na
sentença depois proferida pelo Tribunal A Quo, deles extraímos,
como já referimos, uma posição contraditória assumida pelo julgador
no caso vertente que inquina por completo as decisões proferidas e
ora impugnadas no sentido de não admitirem a prova testemunhal e
documental por nós supra indicada.
(...)  o referido julgador ter considerado os meios de prova
peticionados em julgamento pelo Ministério Público como sendo não
indispensáveis ou essenciais para a descoberta da verdade quando
veio, depois, a absolver os arguidos por alegada ausência de prova
suficiente, sendo certo que os referidos meios de prova rejeitados e
tidos como irrelevantes se reputam como idóneos a suprir as
dúvidas assinaladas pelo julgador e que se alimentaram na
apontada ausência de prova.
(...)  deverão ser revogados os despachos do Tribunal A Quo referidos
nos pontos VI) e VIII) do segmento A.1) da motivação do presente
recurso por força dos quais foi determinada: a não admissão da
inquirição em julgamento das testemunhas Araújo … e José ...;
bem como a não admissão da solicitação à D.R.A.F. das certidões
das declarações fiscais apresentadas pela sociedade arguida
referentes aos períodos de I.R.C. e I.V.A. indicados na acusação
pública; e, ainda, da própria declaração fiscal apresentada pela
sociedade “B.” relativa ao período 2006/06T.
(...)  deverão estes ser substituídos por uma decisão superior que, não
só, ordene a inquirição em julgamento das duas testemunhas atrás
referidas, mas também determine a solicitação à D.R.A.F. do envio a
estes autos dos documentos atrás referidos e, por conseguinte, ordene
ainda a oportuna prolacção de nova sentença onde os resultados
probatórios de tais diligências sejam tidos em consideração, impondo-
se assim a revogação da sentença já proferida nos autos, o que
igualmente se requer.
C.) Da verificação da nulidade gerada pelo primeiro despacho ora
recorrido, de acordo com a previsão legal do art. 120º, nºs. 1 e 2,
alínea d), do Código de Processo Penal
Tendo presente o contexto em que nos encontramos, resulta
igualmente vincado no presente recurso, a partir da análise da
argumentação expendida sob os pontos A) e B) da motivação de
recurso que antecede, que o indeferimento, pelo Tribunal A Quo,
relativo à prova testemunhal e documental por nós peticionada, e a
sua confirmação com a prolacção do segundo despacho ora sob
discussão, gerou uma nulidade processual, nos termos do disposto
no art. 120º, nº 1 e 2, alínea d), Código de Processo Penal, na
medida em que constituiu efectivamente uma omissão de diligências
probatórias reputadas como essenciais à descoberta da verdade.
Temos, portanto, que, por errada interpretação, e face à posição
confirmada com o segundo despacho recorrido, o Tribunal A Quo
violou outrossim, para além das normas acima referidas, o disposto
no art. 120º, nrs. 1 e 2, alínea d), do Código de Processo Penal.
Desta feita, observamos ainda que, segundo dispõem os arts. 122º,
nrs. 1 e 2, do Código de Processo Penal, as nulidades tornam
inválido o acto em que se verificarem, bem como os que dele
dependerem e aquelas puderem afectar, sendo que a sua declaração
determina quais os actos que passam a considerar-se inválidos e
ordena, sempre que necessário e possível, a sua repetição. Em face
da construção lógica que temos vindo a empreender, e ao abrigo
deste dispositivo legal, alcança-se que todos os actos processuais
subsequentes aos despachos ora recorridos se encontram também,
para além dos próprios, feridos de nulidade, carecendo, por isso, da
necessária correcção e repetição.
(...) deverá ser reconhecida e declarada nula a omissão de prova em
questão, tal como o despacho que a gerou e aquele que não reparou a
mencionada nulidade e, bem assim, todos os actos que se lhes
seguiram, como foi o caso, nomeadamente, da sentença absolutória
proferida nos presentes autos, cuja nulidade ora se pretende ver
igualmente declarada, procedendo-se, portanto, à anulação de todo o
correspondente processado, nos termos do referido art. 122º, nrs. 1 e
2, do Código de Processo Penal.
Recorreu ainda da decisão final
Em resposta ao recurso intercalar  interposto o MP  neste Tribunal
concordou com as alegações do mesmo
****
Dos despachos recorridos resulta que o tribunal recorrido indeferiu a
inquirição de testemunhas pedidas e de junção de documentos aos
autos porque entendeu que as  testemunhas em causa foram
inquiridas em sede de inquérito e não foram indicadas pelo MP para
julgamento.
Entende o tribunal que tal sucedeu porque o MP não as quis
adicionar ou porque  não as achou relevantes para a descoberta da
verdade material.
Acrescenta ainda que o arrolamento de novas testemunhas durante a
audiência  de julgamento tem carácter excecional deve fundar-se na
sua estrita necessidade para melhor se apreciar e decidir a causa e
em circunstancias supervenientes ocorridas.
De outro modo diz o Mmo Juiz a quo, estaria encontrada a forma de
acrescer á prova anteriormente indicada nova prova, num indefinido
devir protelando-se o processo e defraudando-se as regras de
arrolamento.
Não se afigurou minimamente relevante ao tribunal a quo  proceder
à inquirição de qualquer outra testemunha.
Não entendeu o acervo de documentos pretendido, importante  para a
descoberta da verdade e indeferiu o requerido.
Vejamos:
De acordo com o disposto no artº 316.º - O rol de testemunhas pode
ser adicionado ou alterado a requerimento do Ministério Público, do
assistente, do arguido ou das partes civis, conforme os casos,
contanto que o adicionamento ou a alteração requeridos por um
possam ser comunicados aos outros até três dias antes da data fixada
para a audiência.
2 - Depois de apresentado o rol não podem oferecer-se novas
testemunhas de fora da comarca, salvo se quem as oferecer se
prontificar a apresentá-las na audiência.
3 - O disposto nos números anteriores é correspondentemente
aplicável à indicação de peritos e consultores técnicos.
 Estabelece o n.º 1 do art.340.º do C.P.P. que “O tribunal ordena,
oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de
prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da
verdade e à boa decisão da causa. E acrescenta o n.º 2, “Se o tribunal
considerar necessária a produção de meios de prova não constantes
da acusação, da pronúncia ou da contestação, dá disso
conhecimento, com a antecedência possível, aos sujeitos processuais
e fá-lo constar da acta”.
Sendo assim parece recair sobre o juiz o encargo de investigar e
esclarecer oficiosamente o facto submetido a julgamento. Os meios de
prova não estão limitados aos fornecidos pela acusação ou pela
defesa. Este principio não se opõe à  estrutura basicamente
acusatória do processo penal, pois que não impede ou limita a
apresentação de prova pelo Ministério Público, pelo assistente ou
pelo arguido.
“Só significa que - ao contrário do que sucede com o princípio de
discussão - a actividade investigatória do tribunal não é limitada pelo
material de facto aduzido pelos outros sujeitos processuais, antes se
estende autonomamente a todas as circunstâncias que devam
reputar-se relevantes”- Cfr. Prof. Figueiredo Dias, in “Direito
Processual Penal”, 1º Vol., edição da C.E., 1974, pág. 192.
Como resulta expressamente do n.º1 do art.340.º do C.P.P., a
investigação judicial visa a descoberta da verdade e a boa decisão da
causa, isto é, a chamada verdade material.
Independentemente de alguém ter ou não indicado uma prova
anteriormente à audiência de julgamento, se no decurso desta o
Tribunal, oficiosamente ou a requerimento, considerar que uma
prova antes não indicada é necessária para a descoberta da verdade e
à boa decisão da causa, deve obrigatoriamente ordenar a sua
produção.
Os princípios da investigação e da verdade material, enunciados nos
n.ºs 1 e 2 do 340.º do C.P.P., que dominam o processo penal, tem os
seus próprios limites enunciados nos seus números 3 e 4.
Resulta deste n.º3 que o requerimento que vise a produção da prova
deve ser indeferido quando a prova ou o respectivo meio forem
legalmente inadmissíveis. Assim, se as provas cuja produção se
requer forem proibidas por lei (art.125.º) ou obtidas por métodos
proibidos (art.126.º) o requerimento deve ser indeferido por despacho.
O n.º4 do art. 340.º do C.P.P. estatui que devem ainda ser indeferidos
os requerimentos de prova se for notório que:
a) As provas requeridas são irrelevantes ou supérfluas;
b) O meio de prova é inadequado, de obtenção impossível ou muito
duvidosa; ou
c) O requerimento tem finalidade meramente dilatória.
No presente caso, o Tribunal recorrido indeferiu o requerimento,
apresentado pelo Ministério Público ao abrigo do art.340.º do C.P.P.,
explicando que não via neste requerimento qualquer necessidade de
produção de prova que não iria contribuir para a verdade material e
tanto assim é, que argumenta que, ouvidas que foram em sede de
inquérito  não contribuíram em nada pelo que não foram indicadas
pelo MP.
Na verdade se o MP as ouviu em inquérito não as arrolou para
julgamento foi porque entendeu que não valia a pena. Assim como
relativamente aos documentos que não juntou em inquérito e
pretende juntar agora.
O art.316.º do C.P.P. conjugado com o art. 340.º CPP, dizem-nos que 
independentemente de alguém ter ou não indicado uma prova
anteriormente à audiência de julgamento, se no decurso desta o
Tribunal, oficiosamente ou a requerimento, considerar que uma
prova antes não indicada é necessária para a descoberta da verdade e
à boa decisão da causa, deve obrigatoriamente ordenar a sua
produção.
Entendeu o tribunal que não era necessária.
O MP requer por se mostra-se indispensável à prova dos factos
imputados aos arguidos, mormente no concernente aos factos 5., 6.,
8., 11., 13. e 15., proceder à audição das testemunhas António ... e
José ..., já que estas poderão esclarecer a que titulo procederam ao
levantamento dos cheques em apreço (fls. 113 e 116) e a quem
entregaram o dinheiro daí resultante.
Por conseguinte, e ao abrigo do disposto no art. 340º, nº 1, do
Código de Processo Penal, o Ministério Público requer que seja
designada data para continuação do presente julgamento com vista
à audição das testemunhas: António ... e José ....
De acordo com a acusação a sociedade arguida integrou
indevidamente na sua contabilidade facturas falsas com base nas
quais visou obter vantagens patrimoniais ilícitas através da
dedução indevida de custos. As facturas em foco são mencionadas
na acusação e foram contabilizadas com tal finalidade na
declaração fiscal de I.R.C. da sociedade arguida respeitante ao
exercício de 2006, bem como nas declarações fiscais periódicas de
I.V.A. respeitantes aos períodos 2006/03T, 2006/06T e 2006/09T.
No entanto, e devidamente compulsados os autos, observamos que
deles não constam tais declarações fiscais de I.R.C. e de I.V.A., nem
na sua versão originária nem na sua versão subsequentemente
corrigida, sendo certo que, em face do seu teor e do quadro
delineado factual pela acusação, tais documentos se mostram
indispensáveis à prova da mesma, nomeadamente dos factos 5., 6.,
11., 12., 13., 14. e 15..
Por conseguinte, e ao abrigo do disposto no art. 340º, nº 1, do
Código de Processo Penal, o Ministério Público requer que seja
solicitada à D.R.A.F. a remessa a estes autos de certidão de cada
uma das declarações fiscais acima referidas, QUER NA SUA
VERSÃO ORIGINÁRIA, QUER NA SUBSEQUENTEMENTE
CORRIGIDA, com certificação da data em que cada uma delas foi
entregue/enviada pelo sujeito passivo à administração fiscal.

Pela mesma testemunha acima indicada – inspectora tributária


CRISTINA MARIA ALENCASTRE, – foi igualmente referido na
anterior sessão de julgamento que a sociedade B., que de acordo
com a tese da acusação foi a emissora das facturas falsas
dolosamente registadas em momento ulterior na contabilidade da
sociedade arguida, apresentou uma declaração de I.V.A. no período
200/06T (ou seja segundo trimestre de 2006, sendo certo que foi a
única declaração fiscal apresentada pela mencionada sociedade
segundo o depoimento sob análise) cujo conteúdo era desconforme
com os resultados do cruzamento de dados de outros sujeitos
passivos (alegados clientes da B., onde se inclui a sociedade ora
arguida) efectuados pela administração fiscal, designadamente no
concernente às transacções constantes nessa declaração.
Paralelamente, constatamos que um dos períodos de I.V.A. onde se
integram as facturas falsas indicadas na acusação e indevidamente
contabilizadas pela sociedade arguida é precisamente o período
2006/06T, pelo que, a nosso ver, a comparação entre a declaração
fiscal da B. respeitante a esse período com a declaração fiscal de
I.V.A. da sociedade arguida também respeitante a esse período se
mostra fundamental para a descoberta da verdade porquanto
logrará demonstrar a inexistência de quaisquer serviços prestados
pela B. à sociedade arguida nesse período (ou pelo menos auxiliar
essa demonstração).
Destarte, temos que a referida declaração fiscal da B. respeitante
ao período 06T/2006 também se revela outrossim indispensável à
descoberta da verdade, razão pela qual requeremos que, ao abrigo
do disposto no art. 340º, nº 1, do Código de Processo Penal, seja
solicitada à D.R.A.F. a sua remessa a estes autos com certificação
da data em que a mesma foi entregue/enviada pelo sujeito passivo à
administração fiscal.
Argumentou ainda que as facturas às quais a acusação se reporta e
eventual documentação com as mesmas relacionadas (eventuais
contratos e recibos associados) não foram juntas aos autos por
estarem em instalações da empresa situadas em zona de risco cujo
acesso está impedido e a aguardar a estabilização de talude, na
sequência de uma decorada, por recomendação do L.R.E.C..
No entanto, este estado de coisas (ou seja a impossibilidade de
aceder a tais documentos) reporta-se a Julho/Setembro de 2015,
altura em que a D.R.A.F. concluiu a sua investigação e a acusação
foi deduzida (cfr. fls. 403 e seguintes e 453 e seguintes). Não
sabemos por isso se, actualmente, o acesso às referidas instalações
já é ou não possível, bem como o inerente acesso à sobredita
documentação.
A documentação em apreço revela-se de grande utilidade para a
descoberta da verdade e cabal apuramento dos factos. Não só
através da observação do teor das facturas, tendo em vista a
identificação de quem as subscreveu, bem como a aferição sobre se
o seu conteúdo cumpre as regras legais estabelecidas para o efeito,
mas também para verificar se existem efectivamente contratos
escritos de suporte das mesmas e, ademais, recibos comprovativos
do seu pagamento.
Como decorre da exposição antecedente, não foi possível até ao final
da investigação aceder ao local onde tal documentação se encontra
para que a mesma pudesse ser apreendida e junta aos autos, pelo que
a sua obtenção actual e subsequente junção aos autos é inteiramente
tempestiva à luz do disposto no art. 340º, nº 1, do Código de Processo
Penal, em conjugação com o disposto no nº 4, alínea a), 1ª parte, a
contrario sensu, do mesmo preceito e com o artº 165º, nº 1, segunda
parte, também do Código de Processo Penal.

Requereu ainda o MP que  fosse  solicitado à sociedade arguida que


forneça ao presente processo, a título devolutivo, cada uma das três
facturas a que se reporta a acusação, juntamente com a
documentação de suporte que possua e esteja às mesmas associada,
nomeadamente contratos escritos e recibos;
- que, com envio de cópia de fls. 104 e 105 destes autos para melhor
esclarecimento, seja solicitado ao L.R.E.C. e à Câmara Municipal
do Funchal, que informem se a situação descrita em tal documento
se mantém, ou seja se o acesso à zona aí referida onde se
encontravam as instalações da sociedade arguida permanece
impedido/proibido no presente em virtude desse local ainda
constituir uma zona de risco eminente ou, pelo menos, caso não
seja possível
Não virá mal ao Mundo em que ao Tribunal escute e analise os meios
de prova referidos. Podendo ter mais elementos decidirá com mais
segurança. É certo que o MP já poderia ter juntado alguns dos
elementos de prova e, se ouvidas já em inquérito, devia ter oferecido
desde logo as testemunhas em audiência.
 De qualquer forma em nome da descoberta da verdade material e da
justiça do caso concreto, entende-se ser de dar lugar à produção das
provas requeridas.
Assim sendo, declara-se nula a decisão proferida nos autos e
ordena-se a requisição, a produção  e a análise da prova referida
em repetição de audiência anulando-se todo o restante processado e
decisão final por se mostrar imprescindível à descoberta da
verdade dos factos com as necessárias consequências.
DN Sem custas

Lisboa, 3 de Outubro de 2018


Adelina Barradas de Oliveira
Jorge Raposo

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