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316 • ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA • MANUAL PRÁTICO DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO •

As preparações para uso oral ou sublingual são de fácil admi- da a uma ampola de gonadotrofina sérica quatro vezes por sema-
nistração, mas têm a desvantagem de apresentar absorção irregular na, que fornece 75 UI de FSH por ampola. Esse esquema pode ser
e de serem potencialmente capazes de determinar colestase intra- repetido por cinco ciclos consecutivos. O tamoxifeno (antiestrogê-
hepática. Algumas delas, como a fluoximesterona e a metiltestos- nio não esteroidal) pode estimular a espermatogênese.
terona, estão também relacionadas ao desenvolvimento de hepa- Na criptorquia utilizam-se preparações de gonadotrofina co-
toma. A mesterolona é andrógeno de administração oral que não riônica em esquema que forneça 1.000 UI a 2.000 UI a cada dois
apresenta toxicidade hepática, sendo porém de eficácia terapêutica ou três dias, durante quatro semanas. Em crianças até os nove anos
menor quando comparada às preparações intramusculares. de idade a dose deve ser ajustada para 3000 UI/m2 de superfície
Dos andrógenos empregados por via intramuscular, o pro- corporal. O tratamento pode ser repetido por até três ciclos com
pionato de testosterona é o que apresenta meia-vida mais curta, es- pausa de uma semana entre eles.
tando por isso indicado em pacientes idosos, mais sensíveis a esse O fator liberador das gonadotrofinas (LHRH, GnRH) tem
hormônio. No caso de ocorrerem sinais de obstrução uretral por sido usado em casos específicos de hipogonadismo, como retardo
hipertrofia prostática, os sintomas desaparecem baixando-se os ní- pubertário e esterilidade. É aplicado de forma pulsátil, por meio de
veis de testosterona circulante, o que ocorre logo após a suspen- bomba de infusão portátil. Essa forma de tratamento parece não
são do tratamento. Consegue-se completa virilização dos pacien- trazer vantagens sobre as anteriormente citadas.
tes utilizando-se preparações mais potentes e de ação prolongada:
o fenilpropionato, o enantato e o hexaidrobenzoato de testoste-
rona, cuja ação se prolonga por até quatro semanas. A terapêutica
pode ser iniciada com doses de 200 mg IM a cada duas semanas
e mantida durante um ou dois anos. Após atingir virilização ade-
quada, pode-se utilizar dose de manutenção mais baixa, em torno
de 100 mg a cada três semanas. Bom parâmetro de adequação da 104 Diabetes Melito
reposição hormonal é a manutenção de níveis sanguíneos de tes-
tosterona em torno de 250 ng/dL. Entre os possíveis efeitos co- Antônio Roberto Chacra
laterais da reposição androgênica encontram-se retenção hídrica, Sérgio Atala Dib
inibição da espermatogênese, priapismo, ginecomastia, acne e al-
terações agressivas do comportamento.
Começam a surgir no mercado nacional apresentações de
testosterona por sistemas de liberação transdérmica, que forne-
D iabetes melito um distúrbio metabólico, determinado genetica­
mente, associado com deficiência absoluta ou relativa de in­
sulina e que na sua expressão clínica completa é caracterizado por
cem entre 10 e 15 mg do hormônio por adesivo. A dose de repo- alterações metabólicas e complicações vasculares e neuropáticas.
sição deve ser calculada a cada caso, variando entre a aplicação de O componente metabólico é caracterizado não só pela hiperglice-
um ou dois adesivos por dia, e o controle da dose deve ser moni- mia como também por alterações no metabolismo de proteínas e
torado pelos níveis sanguíneos do hormônio. Os efeitos colaterais lipí­dios. O componente vascular é constituído por macroangiopa-
potencialmente são os mesmos provocados pelas formas intramus- tia inespecífica (aterosclerose e suas diferentes manifestações clíni-
culares, porém menos intensos, podendo adicionalmente haver ir- cas) e pela microangiopatia diabética, a qual afeta particularmente
ritação no local da aplicação. a retina, o rim e os nervos periféricos.
A terapêutica androgênica está contra-indicada em portado- As causas de diabetes (ou hiperglicemia) são várias e os Qua­
res de carcinoma prostático. Além disso, como o andrógeno leva dros 1 e 2 apresentam a classificação de diabetes de acordo com
à fusão das epífises ósseas e, conseqüentemente, à interrupção do a ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE DIABETES e a ORGANIZAÇÃO MUNDIAL
crescimento linear, seu uso fica limitado aos pacientes que já atin- DA SAÚDE (1997). A maior parte dos casos pertence aos assim cha­
giram estatura adequada ao seu alvo genético, ou seja, raramen- mados diabetes tipo 1 e tipo 2.
te antes dos 13 anos. A indicação de reposição androgênica nessa
faixa etária deve ser criteriosa e precisa, levando-se em conta o cál-
culo da dose para o peso corporal.
QUADRO 1 - Classificação de diabetes
Gonadotrofinas 1. Diabetes tipo 1
2. Diabetes tipo 2
O uso de gonadotrofinas está indicado naqueles casos de 3. Tipos específicos (Quadro 2)
hipogonadismo decorrentes de secreção diminuída desses hormô-
4. Diabetes gestacional
nios. Em razão de sua curta meia-vida, as gonadotrofinas devem
ser administradas duas a três vezes por semana, por via parenteral.
Quando utilizadas para a indução da espermatogênese, a duração
do tratamento deve ser de pelo menos três meses, duração aproxi- Epidemiologia
mada de um ciclo espermatogênico. Essas preparações são muito
caras, o que inviabiliza seu emprego no tratamento de rotina das Estima-se que no Brasil existam sete a oito milhões de in-
deficiências androgênicas secundárias. Por esse motivo, as duas in- divíduos portadores de diabetes, dos quais metade desconhece o
dicações formais do tratamento com gonadotrofinas são a indução diagnóstico. Desse total, 90% são do tipo 2, 8% a 9% do tipo 1,
da espermatogênese e a criptorquia. de origem auto-imune e 1% a 2% secundário ou associado a ou-
Na indução de espermatogênese costuma-se usar 2.000 UI tras síndromes.
via intramuscular de gonadotrofina coriônica (ação luteinizante pre- No Brasil é bastante elevada a incidência de complicações
dominante), três vezes por semana, durante três semanas, associa- crônicas (distúrbio visual, cegueira, hipertensão, nefropatia, pé
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QUADRO 2 - Tipos específicos de diabetes*


• Defeitos na função da célula beta • Induzido por drogas ou produtos químicos
- Cromossomo 20, HNF-4α (MODY 1) - Vacor
- Cromossomo 7, glucoquinase (MODY 2) - Pentadinina
- Cromossomo 12, HNF-1α (MODY 3) - Ácido nicotínico
- DNA mitocondinal - Glicocorticosteróides
- Insulinas mutantes - Hormônio tiroidiano
- Hiperproinsulinemia - Diazóxido
- Outros - Agonitas β-adrenérgicos
• Defeitos genéticos na ação insulínica - Tiazidas
- Resistência insulínica tipo A - Dilantina
- Leprechaunismo - Interferon alfa
- Síndrome de Rabson Mendenhall - Outros
- Diabetes lipoatrófico • Infecções
- Outros - Rubéola congênita
• Doenças do pâncreas exócrino - Citomegalovirus
- Pancreatite - Outros
- Trauma/pancreatectomia • Anticorpos (formas incomuns de diabetes auto-imunes)
- Neoplasia - Síndrome de stiff-man
- Fibrose cística - Anticorpos anti-receptores de insulina
- Hemocromatose - Outros
- Pancreopatia fibrocalculosa • Síndromes genéticas associadas ao diabetes
- Outros - Síndrome de Down
• Endocrinopatias - Síndrome de Klinefelter
- Acromegalia - Síndrome de Wolfram
- Síndrome de Cushing - Ataxia de Friedreich
- Glucogonoma - Coréia de Huntington
- Feocromocitoma - Síndrome de Lawrence-Moon-Biedl
- Hipertiroidismo - Distrofia Miotónica
- Somatostatinoma - Porfiria
- Aldosteronoma - Síndrome de Prader-Willi
- Outros - Outros

* Constituem causas raras de diabetes.

diabético, amputação de membros inferiores, impotência sexual, anos, como nos adultos. O componente hu­moral desse processo
distúrbios cardiocirculatórios e vasculares cerebrais) devido prin­ auto-imune leva a produção de anticorpos contra as ilhotas, que
cipalmente à existência de poucos programas de educação e de ca­ são os marcadores periféricos desse proces­so. Os anticorpos an-
pacitação profissional em diabetes e de recursos escassos para pre­ tiilhotas (ICA), anticorpos antiinsulina (AAI), anticorpos contra
venção e controle da moléstia. Ações conjuntas do MINISTÉRIO DA a decarboxilase do ácido glutâmico (anti-GAD) e anticorpos an-
SAÚDE e da SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES têm melhorado a si- titirosina peroxidase (anti-IA2) podem estar presen­tes bem an-
tuação nos últimos anos, mas ainda assim a morbidade e mortali- tes da eclosão das manifestações metabólicas. Quando os sinto-
dade por dia­betes é elevada. mas do diabetes se manifestam a destruição ainda não é to­tal, mas
já é suficientemente grave para requerer tratamento insu­línico.
Diabetes tipo 1 Um ou mais desses anticorpos estão presentes no soro de 85 a
90% dos pacientes por ocasião do diagnóstico. Alguns anos após,
Esse tipo de diabetes resulta de destruição auto-imune
a destruição é completa, levando ao quadro de diabetes depen-
das células beta pancre­áticas. A maior parte dos casos surge an-
tes dos 30 anos, entretan­to, este pode surgir em qualquer fai- dente de insulina exógena e instável.
xa etária. Nas últimas décadas tem se observado aumento da in- Esse tipo de diabetes, se não tratado adequadamente, evolui
cidência do diabetes tipo 1 na pri­meira infância e também após para cetoacidose diabética, coma diabético e êxito letal. Os sintomas
os 30 anos de idade (tipo 1 de iní­cio tardio). O diabetes tipo 1 característicos são a poliúria, a polidipsia e a perda de peso. O dia­
é doença distinta do diabetes tipo 2. O diabetes tipo 1 é doença betes tipo 1 é sempre dependente do tratamento com insulina.
poligênica, tendo sido descrito, até o momento, aproximadamen- A retinopatia, a nefropatia e a neuropatia são as complica­
te 20 genes relacionados a doença. Os mais freqüentes são os as- ções crônicas mais freqüentes nesse tipo de diabetes. Tem sido de­
sociados a certos antígenos do sistema HLA, de histocompatibi- finitivamente demonstrado que o controle rigoroso da glicemia
lidade. Fatores ambientais desconhecidos precipitariam processo previne a instalação e progressão dessas complicações, com redu­
auto-imune especifico contra as células be­ta do pâncreas, produ- ção de 76% na retinopatia, 60% na neuropatia, 54% na albuminú­
toras de insulina. A destruição destas células pode ser rápida co- ria e 39% na microalbuminúria (Estudo DCCT -DIABETES CONT­ ROL
mo nos mais jovens ou lenta e progressiva, po­dendo às vezes levar AND COMPLICATION TRIAL, 1994).
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Diabetes tipo 2 1) Sintomas clássicos do diabetes tais como, poliúria, poli­


dipsia e emagrecimento inexplicado e glicemia ao acaso
Esse tipo, anteriormente denominado diabetes melito não in- (independente do período desde a última refeição) ≥ 200
sulino-dependente (DMNID ou, pela sigla em inglês, NIDDM) ou mg/dL (11,1 mmol/L), ou
diabetes tipo adulto ou diabetes com início na maturidade, com- 2) Glicemia de jejum ≥ 126 mg/dL (7,0 mmol/L). O je­
pre­ende conjunto de distúrbios que apresentam em comum a pre- jum é o período de 8 a 12 horas desde a última inges­tão
sença de hiperglicemia e graus variados de complicações crônicas. calórica, ou
Nos Estados Unidos da América e em alguns páises da Euro­ 3) Glicemia ≥ 200 mg/dL duas horas após sobrecarga de
pa, devido ás mudanças no estilo de vida e da alimentação hiperca­ glicose via oral equivalente a 75g de glicose.
lórica têm surgido casos de diabetes do tipo 2 no jovem. No nos- Na ausência de sinais ou sintomas de descompensação aguda do
so País, por razões ainda não determinadas e apesar de não termos diabetes, exige-se a confirmação laboratorial em dias subseqüentes.
estatísticas oficiais, a prevalência do DM2 no jovem parece ser in­ Os indivíduos que tiverem glicemia de jejum < 100 mg/dL
ferior à relatada naqueles paises. são considerados normais. Por outro lado, aqueles que apresenta­
Em aproximadamente 90% dos casos está associado à obesi­ rem glicemias que não preencham os critérios para DM, mas gli­
dade, apresenta alterações na primeira fase de secreção de insulina cemia de jejum com valores acima do normal, isto é, ≥100 porém
e nos primeiros anos exibe estado paradoxal de hiperinsulinemia e ≤126 mg/dL, denominam-se portadores de glicemia de jejum al­
hiperglicemia (resistência insulínica). Essa resistência à ação da in­ terada (GJA). Tolerância à glicose diminuída é definida quando a
sulina deve-se em grande parte à obesidade visceral, quase sempre glicemia de jejum for <100 mg/dL e a glicemia duas horas após a
presente nesse tipo de diabetes. Após cinco ou dez anos de evolu­ sobrecarga de glicose (75 g de glicose por via oral) ≥140 mg/dL
ção, a secreção de insulina pela célula beta diminui, podendo ha­ver e ≤200 mg/dL. Tanto os pacientes com glicemia de jejum altera­
a hipoinsulinemia absoluta ou relativa, e os pacientes posteriormen- da (GJA) como aqueles com tolerância à glicose diminuída (TGD)
te necessitam de tratamento insulínico (Quadro 3). apresentam risco maior de desenvolverem diabetes e devem, por­
O diabetes tipo 2 pode ser assintomático no início e o tanto, ser monitorados com mais freqüência.
diagnóstico se estabelece pela dosagem da glicemia solicitada por Para o diagnóstico de DM durante a gestação deve-se fazer
diversos motivos. A prevalência aumenta com idade, obesidade, dis- pesquisa entre a 24a e a 28a semana de gravidez. Nesse período po-
lipidemia e história familiar para diabetes. É fortemente asso­ciado de-se coletar glicemia uma hora após a paciente ter ingerido 50 gra­
com doença cardiovascular e hipertensão. mas de glicose, a qualquer hora do dia, isto é, independentemente
É importante, portanto, considerar o diabetes tipo 2 não só do jejum. As pacientes que nessas condições apresentarem glicemia
do ponto de vista da presença de hiperglicemia, mas também co­ > 140 mg/dL devem ser submetidas a teste de tolerância à glicose.
mo parte da assim chamada síndrome de resistência insulínica ou Após 8 a 12 horas de jejum, são coletadas amostras de sangue antes
síndrome metabólica (diabetes, obesidade, hiperlipidemia, e hiper­ e uma, duas e três horas após a administração de dose de glico­se,
tensão arterial). A sindrome metabólica é importante fator de ris­ via oral, igual a 100 g . Os valores da glicemia limítrofes no teste
co para doença aterosclerótica. são: jejum -95 mg/dL, primeira hora -180 mg/dL, segunda hora
A morbidade e a mortalidade do diabetes tipo 2 decorrem ­155 mg/dL e terceira hora -140 mg/dL. Dois ou mais valores su­
principalmente da macroangiopatia (doença vascular ateroescleró­ periores a esses níveis críticos estabelecem o diagnóstico de diabe-
tica) e de suas diferentes manifestações: doença coronariana, aci­ tes gestacional (intolerância à glicose que surge na gestação).
dente vascular cerebral e insuficiência vascular periférica. Por último, os indivíduos com maior risco de desenvolve­rem
O diabetes tipo 2 é bastante comum e compreende cerca de diabetes, com possibilidade de estarem em fase assintomática e que
90% de todos os casos de diabetes. Auto-imunidade não é demons­ deveriam ser investigados nesse sentido são:
trável (ICA e anti-GAD são negativos), não existindo correlação
com os antígenos do sistema HLA. A concordância para diabetes 1. Indivíduos com idade ≥45 anos;
em gêmeos idênticos é de quase 100%, sugerindo, portanto, com­ 2. Indivíduos com índice de massa corporal [≥ peso(kg)/
ponente genético importante. Estudos nesse sentido mostram que altura(m)2] ≥27 kg/m2;
o diabetes tipo 2 é doença poligênica. O Quadro 3 mostra a his­ 3. Parentes em primeiro grau de diabéticos;
tória natural do diabetes melito. 4. Mulheres que tiveram diabetes gestacional ou deram à luz
crianças com peso ≥ que 4 kg;
Diagnóstico 5. Pacientes com hipertensão arterial e/ou displidemia;
6. Indivíduos com testes anteriores demonstrando tolerân­
A presença de sintomas marcantes de diabetes, tais como po­ cia à glicose diminuída (TGD) ou glicemia de jejum al­
liúria e emagrecimento, juntamente com a detecção ao acaso de terada (GJA).
nível plasmático elevado de glicose (≥200 mg/dL) são suficientes
para estabelecer o diagnóstico de diabetes. Contudo, na ausência O novo critério para o diagnóstico do diabetes não teve co­
de tais sinais ou quando a glicemia de jejum não está inequivoca­ mo objetivo principal aumentar o número de pacientes diabéticos,
mente elevada, a análise da glicemia de duas horas, após sobrecar­ mas sim iniciar o tratamento e o seguimento dos pacientes com
ga padronizada oral de glicose, é o método de escolha para confir­ graus mais leves de hiperglicemia e com isso reduzir as complica­
mar o diagnóstico de diabetes. ções crônicas da doença.
Baseado em grandes estudos populacionais com indivíduos
e pacientes com vários graus de intolerância à glicose e nas compli­ Objetivos do tratamento
cações crônicas microangiopáticas do diabetes melito, novo crité-
rio diagnóstico para essa doença foi recentemente (2003) estabeleci­ O diabetes é fundamentalmente estado de deficiência ou de
do. De acordo com esse novo critério são considerados diabéticos falta de ação da insulina, havendo concomitância de excesso de glu­
os indivíduos que apresentarem: cagon. Nessas circunstâncias existe diminuição da utilização perifé­
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QUADRO 3 - História natural do diabetes melito

Prevenção Primária Secundária Terciária

MORTE
Início do diabetes
Desenvolvimento fetal

Tipo 1 e Tipo 2 Pré-diabetes Diabetes

Susceptibilidade genética Hiperglicemia

Tipo 1 ICA +
IAA + Dependência de insulina Insuficiência de órgãos
Anti-GAD +

Tipo 2 Nutrição, obesidade Resistência insulínica


Sedentarismo Secreção insulínica<
Envelhecimento

Complicações Ausentes Podem estar presentes Aumentam progressivamente

rica da glicose (glicólise diminuída) e aumento da glicogenólise e lares e neuropáticas e concomitância de outras moléstias endócri­
da gliconeogênese (produção hepática de glicose), fatores respon­ nas e não-endócrinas.
sáveis pela hiperglicemia. Na ausência de insulina (hormônio arma­ É fundamental, portanto, caracterizar em determinado pa­
zenador de energia) diminui a síntese de ácidos graxos e aumenta ciente o seu grau de resistência a insulina e de insulino-dependên-
a lipólise. Esse estado catabólico acarreta também diminuição da cia não só de acordo com a forma do diabetes mas também com
captação de aminoácidos pelas células e, portanto, diminuição da a circunstância apresentada, uma vez que disso dependerá a orien­
síntese protéica. A correção e a normalização desses processos re­ tação terapêutica: dieta apenas, dieta e insulina, ou dieta e agente
querem suprimento adequado de insulina. oral, ou combinações terapêuticas.
Nos diabéticos tipo 2, nos quais obesidade e resistência in­
sulínica estão presentes em mais de 80% dos casos, o tratamento é Dieta
dirigido principalmente para o manuseio dietético, com dieta hipo­
calórica e implementação da atividade física. Quando tais medidas A dieta constitui ponto fundamental no tratamento do diabe­
são insuficientes para controlar as alterações metabólicas está indi­ tes, seja em pacientes em que insulina ou agentes orais são utiliza­
cado o tratamento farmacológico com agentes orais. Em contraste, dos, seja naqueles em que medidas dietéticas associadas com exer­
o diabetes tipo 1, caracterizado por deficiência absoluta de insuli­na, cícios constituem a única forma de terapia empregada.
não apresentará melhora pela administração de agentes orais e nem Levando-se em consideração a atividade física do paciente, a
será substancialmente influenciado apenas pela dieta. dieta será hipercalórica nos pacientes com peso abaixo do normal,
A terapêutica do paciente diabético tem os seguintes ob- normocalórica quando o peso for normal e hipocalórica quando
jetivos: estiver acima do normal. Portanto, a fim de estabelecer a dose de
a) normalização do metabolismo dos carboidratos, lipí­dios insulina ou hipoglicemiante oral, o número de calorias da dieta e a
e proteínas e conseqüente compensação dos sinto­mas quantidade de exercício devem ser fixados previamente.
clínicos; No diabetes tipo 1, os pacientes são freqüentemente ma-
b) p revenção das complicações metabólicas agudas: cetoaci­ gros, principalmente por ocasião do diagnóstico. A associação de
dose, coma hiperosmolar e hipoglicemia; dieta hipercalórica com administração de insulina restaurará o pe­
c) adaptação psicossocial (educação do paciente diabético); so normal. Após atingi-lo, a dieta deve aproximar-se o mais possí­
d) prevenção das complicações crônicas. A doença não é vel da dieta normal para a idade e a atividade física do paciente. A
curável, porém controlável. criança e o adolescente diabéticos devem, portanto, estar adequa­
O tratamento com insulina, associado a melhor compreen­ damente tratados com insulina e, além disso, com dieta apropria­
são do distúrbio eletrolítico na cetoacidose, e o advento dos anti­ da para promover o crescimento e o desenvolvimento normais. É
bióticos, permitiram aumentar consideravelmente a sobrevida do comum encontrarmos pacientes magros, com diabetes tipo 1, pa­
paciente diabético. Não tem sido possível, contudo, prevenir as ra os quais foram prescritas dietas hipocalóricas. Isso constitui erro
complicações crônicas, cuja prevenção se baseia no controle rigo­ injustificável. Se o paciente estiver com peso normal, a dieta deve­
roso da glicemia, e a morbidade e a mortalidade a elas devidas são rá conter número normal de calorias. Não é necessária a proibição
bastante elevadas. total de açúcares, desde que administrados com parcimônia, den­
O tratamento específico depende do quadro clínico e da for­ tro do contexto da dieta e, quando necessária, suplementação com
ma como o diabetes se apresenta; o espectro de manifestações clí­ insulina. A reposição de insulina nessas situações tem como orien­
nicas é muito amplo, compreendendo desde pacientes com discre­ tação inicial a contagem de carbohidratos (1U de insulina de ação
ta intolerância à glicose até quadros fulminantes de cetoacidose e rápida ou ultra-rápida para cada 15 gramas de hidratos de carbono)
coma hiperosmolar. Depende ainda da presença de outros fato- e o fator de sensibilidade (1 U de insulina de ação rápida ou ultra­
res: gestação, obesidade, infecção, estresse, complicações vascu­ rápida diminui em torno de 50 mg/dL a glicemia). Estes são parâ­
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metros iniciais, pois podem variar de paciente para paciente. à noite, ou esquemas associando insulina regular ou ultra-rápida
No indivíduo normal, a secreção de insulina se ajusta natu­ à insulina lenta.
ralmente à ingestão calórica. No diabético, em que a insulina apli­ A quantidade de insulina administrada deve ser ajustada de
cada vai agir continuamente, é necessário ajustar a ingestão calórica acordo com o número de calorias recebidas diariamente na dieta, a
à insulina administrada. De importância fundamental é, portanto, atividade física diária e níveis de glicemia pré e pós-prandiais. No-
além de fixar o número total de calorias diárias, fornecer número te-se que alguns pacientes excepcionalmente podem exibir amplas
similar de calorias em cada refeição. É recomendável, e mesmo ne­ flutuações nos níveis glicêmicos, o que torna difícil estabelecer pa­
cessário, aumentar o número de refeições, acrescentando-se, além drão diário de variação (apesar do número constante de calorias
das refeições principais, duas ou três refeições menores, a fim de e da atividade física), havendo necessidade de controle intensivo,
se evitarem episódios de hipoglicemia. com administrações mais freqüentes de insulina rápida ou ultra­
No diabetes tipo 2, a maioria dos pacientes são obesos (90%). rápida. As “canetas” injetoras de insulina têm tornado mais práti­
A obesidade é acompanhada por resistência à ação da insulina e, por- cas as aplicações, principalmente as suplementações com insulina
tanto, o tratamento é dirigido para reduzir o peso do paciente e em rápida ou ultra-rápida.
conseqüência a resistência insulínica, melhorando a tolerância à gli­ Esquemas de insulinoterapia. Estudo que causou tremendo
cose. Esse objetivo é alcançado com dieta hipocalórica e aumento da impacto no tratamento do diabetes foi o chamado DCCT -Diabetes
atividade física, podendo-se eventualmente usar drogas antio­besidade Control and Complications Trial. Esse trabalho multicêntrico reali­
(vide o capítulo Obesidade). O conteúdo total de carboi­dratos da zado nos Estados Unidos da América do Norte comparou o trata­
dieta não deve ser desproporcionalmente restringido, po­rém, à se- mento convencional (uma ou duas doses de insulina) com o trata­
melhança do diabetes tipo 1, a ingestão de açúcares deve ser limita- mento intensivo (múltiplas doses de insulina ou infusão contínua
da. Do total de calorias, 15 a 20% devem ser providas na forma de de insulina subcutânea por meio de bombas especiais). Apesar de
proteína, 40% na forma de gordura, e 40 a 45% na forma de carboi- não se conseguir a normalização completa da glico-hemoglobina,
dratos complexos (batata, feijão, pão, massa). os pacientes submetidos ao tratamento intensivo mostraram subs­
tancial redução no risco de aparecimento ou na progressão das com­
Insulina plicações tardias do diabetes (retinopatia, nefropatia e neuropatia).
A recomendação final é que a maioria dos pacientes diabéticos tipo
A insulina é obrigatoriamente indicada no diabetes tipo 1, 1 realize a monitoração da glicemia com o uso de fitas reagentes e
com predisposição à cetose, insulino-dependente, e obviamente aplique doses de insulina rápida ou ultra-rápida de acordo com o
nos estados de descompensação: cetoacidose e coma hiperosmo­lar. necessário, para assim obter melhor controle glicêmico, prevenin­
Em pacientes com diabetes tipo 2, nos quais medidas dietéti­cas, do a eclosão ou progressão das complicações crônicas.
exclusivas ou em associação com agentes orais, foram insufi­cientes O esquema de tratamento intensivo exige melhor nível so-
para controlar a glicemia, também é indicada a terapêutica insulí- cioeconômico e cultural do paciente, alto grau de adesão e capa­
nica. No diabetes gestacional, não sendo suficiente a dieta, é indi- cidade de aprendizado, pois será ele a monitorar o tratamento e
cada insulina e nunca agentes orais. a decidir sobre doses de insulina, presença de hipoglicemia, pre­
A insulina regular ação rápida é indicada no tratamento da venção de complicações agudas. Há que se adquirir conhecimen-
cetoacidose, do coma hiperosmolar, durante certas intercorrên­cias to bastante grande de diabetes e será necessário estímulo constan-
como cirurgia, infecção, trauma, ou sempre que houver ne­cessidade te, tanto da parte do paciente como do médico. É importante a
de controle mais rápido da glicemia. Ainda em pacientes ambula- par­ticipação do educador em diabetes (enfermeira, nutricionista,
toriais, as insulinas de ação rápida (regular) ou ultra-rápida (lispro psi­cólogo e fisiologista), constituindo todos uma equipe, inclusive
ou aspart) é muitas vezes associada à insulina de ação inter­mediária, o paciente, principal interessado.
além de ser amplamente utilizada no tratamento inten­sivo (múlti- Como já foi mencionado, o tratamento intensivo de diabe­
plas doses de insulina). tes (dieta, monitoração da glicemia/glicosúria, múltiplas doses de
A dose de insulina é extremamente variável de paciente pa­ insulina) ou o uso de bomba de infusão contínua de insulina sub­
ra paciente, e mesmo em determinado paciente pode variar de um cutânea são as únicas maneiras de que dispomos para prevenir as
período para o outro. São necessários, portanto, vigilância e con­ complicações crônicas do diabetes, as quais constituem causa im­
trole constantes por meio da automonitoração da glicemia capi­lar, portante de morbidade e mortalidade na população diabética.
empregando-se glicosímetros (atualmente de fácil manuseio e bas- O trabalho do DCCT foi realizado com pacientes porta­
tante precisos). A avaliação da glicoemoglobina é empregada no se- dores de diabetes tipo 1, mas resultados recentemente publicados
guimento do diabetes, pois reflete a variação dos níveis glicê­micos (1998) do UNITED KINGDOM PROSPECTIVE DIABETES STUDY (UKPDS)
nos últimos três meses. mostraram que também se aplica aos pacientes com diabetes tipo
A determinação da glicemia capilar deve ser realizada antes 2, na prevenção da microangiopatia (retinopatia e nefropatia) e
de cada refeição e à noite; os períodos que antecedem o café da ma­ da neuropatia diabéticas. O estudo demonstrou que o controle in­
nhã e o jantar são críticos para avaliar a dose ideal da insulina. Gli­ tensivo da glicemia em pacientes com diabetes tipo 2 reduziu em
cemia elevada antes do café indica que a dose de insulina aplicada 25% o risco de desenvolver retino ou nefropatia. Do mesmo mo­
á noite ao deitar está insuficiente ou que o paciente está receben­ do, foi observado nesse estudo que para cada redução em 1% do
do grande número de calorias à noite. Antes do jantar, a glicemia nível de glico-hemoglobina houve redução de 35% na ocorrência
elevada pode significar também que a quantidade de insulina len- de retino, nefro ou neuropatia e de 25% nos óbitos relacionados
ta administrada pela manhã está insuficiente; se muito baixa, po- ao diabetes. Os inconvenientes principais do tratamento intensivo
de indicar que o número de calorias do almoço e do lanche foi pe­ da glicemia são ocorrência de hipoglicemia e ganho de peso, prin­
queno ou a dose de insulina foi muito elevada. cipalmente em adolescentes.
Fixando-se o padrão de variação da glicemia é possível pro­ Não está totalmente demonstrado que a normalização da gli­
gramar determinados esquemas terapêuticos de administração de cemia previna complicações como a macroangiopatia (doença dos
insulina, tais como o “esquema de dose dividida”, pela manhã e vasos grandes, principalmente doença coronariana), mesmo por­
• ENDOCRINOLOGIA • 321

que outros fatores interagem: hipertensão, hiperlipidemia, fumo, suína (semi-sintética) ou por síntese pela técnica de DNA recom­
obesidade, sedentarismo. binante (biossintética), a qual constitui a maioria das preparações
Mais recentemente, tem sido enfatizada a glicemia pós-pran- atualmente utilizadas.
dial como fator de risco para doença cardiovascular. Novas estraté­ Todas as insulinas de origem animal atualmente disponíveis
gias para correção da hiperglicemia pós-prandial têm sido introdu­ são altamente purificadas e contêm menos de uma parte por um
zidas (drogas como a repaglinida, a nateglinida, a acarbose e novas milhão de impurezas. Esse grau de purificação reduziu a incidên-
preparações insulínicas como Humalog Mix® 25 e NovoMix®30). cia de anticorpos antiinsulinas, alergia à insulina e lipoatrofia no
No estudo do UKPDS a glicemia pós-prandial não foi suficiente­ local da aplicação. Vale lembrar, contudo, que toda proteína es-
mente avaliada e nem estratégias para correção de picos glicêmi­cos tranha é antigênica.
elevados pós-prandiais foram utilizados. A insulina bovina difere da insulina humana em três ami­
Por outro lado, o UKPDS demonstrou o efeito altamen­te noácidos, e é mais antigênica que a insulina porcina, a qual difere
benéfico do controle da pressão arterial nos pacientes diabéti­cos. da humana apenas por um aminoácido. A insulina humana teori­
O controle agressivo da pressão arterial nesses pacientes co­mo tam- camente não é antigênica. A insulina porcina, por ser mais próxi­
bém em grupo que utilizou metformina houve redução na ocor- ma da humana, pode ser modificada em laboratório e transforma­
rência de eventos coronarianos, de acidente vascular cerebral e de da em insulina humana.
óbito por diabetes. A insulina humana apresenta pico de ação mais precoce e
tempo de duração menor que as insulinas animais. No futuro,
Preparações insulínicas provavelmente as insulinas humanas substituirão a insulina de ori­
gem animal.
Existe atualmente grande número de preparações insulíni­cas Duração e pico de ação. O manuseio da terapêutica insu­
disponíveis para o tratamento do diabetes, incluindo as várias pré- línica implica no conhecimento de certas características de cada
misturas, além das apresentações em cartuchos utilizadas nas ca- preparação, como tempo de ação e pico da ação (Quadro 5). As
netas injetoras. Isso pode, aparentemente, tornar o tratamento do insulinas, de acordo com essas características, podem ser de ação
diabetes mais complexo. O médico clínico e os profissionais de saú- ultra-rápida, rápida, intermediária e prolongada. O Quadro 6 apre­
de envolvidos no tratamento do diabetes devem portanto familiari- senta as características dos diferentes tipos de insulina.
zar-se com as diferentes insulinas e aprender a obter o maior bene- As insulinas ultra-rápidas disponíveis são a lispro e a aspart,
fício possível do seu emprego. O Quadro 4 apresenta as insu­linas análogos da insulina humana obtidos por síntese e modificado es­
humanas e animais disponíveis no Brasil (ano 2000). truturalmente na seqüência dos aminoácidos. As insulinas ultra-rápi-
Espécies de origem e pureza das preparações. A insulina po- das são absorvidas mais rapidamente e são utilizadas, principalmente
de ser de origem animal (pâncreas de boi ou porco, ou mistas, de antes das refeições para correção da glicemia pós-prandial. São apli­
ambas as espécies) ou humana, obtida por modificação da insulina cadas cinco minutos antes das refeições. A insulina rápida tem sido

QUADRO 4 - Insulinas Humanas e Animais disponíveis no Brasil - 2004


Insulinas Humanas Aventis Lilly Novo Nordisk
Ultra rápida (UR) Humalog Novo Rapid
Rápida (R) Insuman R Humulin R Novolin R e Biohulin R
Intermediária
NPH (N) Humulin N Novolin N e Biohulin N
Insuman N
Lenta (L) Humulin L Novolin L
Prolongada
Ultra lenta (U)
Novolin U
Glargina Lantus
Pré-Misturas
(N + R)
90/10 Novolin 90/10
85/15
Insuman Comb 85/15
80/20 Novolin 80/20
75/25
Insuman Comb 75/25
70/30 Novolin 70/30
Humulin 70/30
(UR + N)
75/25
Humalog Mix 25
70/30 Novo Mix 30
Insulinas Animais
Neosulin R (suína)
Rápida
Iolin R (bovina + suína)
Neosulin N (suína)
Intermediária
Iolin N (bovina + suína)
322 • ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA • MANUAL PRÁTICO DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO •

QUADRO 5 - Perfil médio de ação das insulinas humanas e animais - 2004


Insulinas Humanas Perfil de Ação (horas)
Início Pico Duração Efetiva Duração Máxima
Ultra-rápida (UR)* < 0,25 0,5 - 1,5 3 - 4 4 - 6
Rápida (R) 0,5 - 1,0 2 - 3 3 - 6 6 - 8
NPH (N) 2- 4 6 - 10 10 - 16 14 - 18
Lenta (L) 3 -4 6- 12 12 - 18 16 - 20
Ultralenta (U) 6 - 10 10 -16 18 - 20 20 - 24
Glargina 2-4 Sem pico 20 - 24
Pré-Misturas**
70%N / 30%R 0,5 - 1,0 Duplo 10 - 16
75%NPL / 25 % Humalog < 0,25 Duplo 10 - 16
70% NP / 30% aspart < 0,25 Duplo 10 -16
Insulinas Animais
Rápida (R)* 0,5 -2,0 3 - 4 4- 6 6 - 10
NPH (N) 4-6 8 - 14 16 - 20 20 - 24
Lenta (L) 4-6 8 -14 16 - 20 20 - 24
Ultralenta 8 - 14 Mínimo 24 - 36 24 - 36
* Medical Management of Type 1 Diabetes Third Edition (American Diabetes Association - 1998).
** JAMA, May 7, 2003(17): 2254 - 2264.

QUADRO 6 - Apresentação resumida de vários tipos de insulina


NPH Insulina com protamina. que atua como retardante no tempo de ação da insulina. Insulina de ação
(Intermediária) intermediária, que se utiliza isoladamente ou misturada com insulina regular.

Lenta Suspensão de insulina com zinco, que atua como retardante. Insulina de ação intermediária, que se
(Intermediária) utiliza isoladamente.

Ultra-rápida Análogo da insulina de ação imediata, administrada logo antes das refeições, permite melhor controle
(Ultra-rápida) e maior comodidade para o paciente.

Regular Insulina solúvel, sem adição de substâncias retardantes. Para todo tipo de terapia que necessite de
(Rápida) insulina de ação rápida, especialmente para casos de coma diabético.

80/20 Mistura composta de 80% de insulina NPH e 20% de insulina regular. Indicada para pacientes com
(Rápida + Intermediária) necessidade moderada de insulina pela manhã e aumento excessivo de glicemia pós-prandial.

70/30 Mistura composta de 70% de insulina NPH e 30% de insulina regular. Indicada para o tratamento de
(Rápida + Intermediária) pacientes com necessidade de insulina pela manhã e aumento considerável de glicemia pós-prandial.

Glargina Insulina humana modificada que forma microprecipitados no tecido subcutâneo que são liberados
lentamente praticamente sem pico, com ação de 20 a 24 horas na maioria dos pacientes

também amplamente utilizada para correção da hiperglicemia pós­ drão de variação da glicemia é possível programar determinados
prandial, mas deve ser aplicada 30 minutos antes da refeição, sen- esquemas terapêuticos de administração da insulina, tais como o
do o seu tempo de ação maior que o da lispro e da aspart. “esquema de dose dividida”, de manhã e à noite, utilizando-se in­
A automonitoração da glicemia capilar é essencial para se es­ sulina de ação intermediária isoladamente ou em combinação com
tabelecer qual preparação deve ser utilizada e qual combinação de insulina de ação rápida ou ultra-rápida.
insulinas deve ser indicada. Descrevem-se três tipos de resposta a uma dose única de
A determinação da glicemia pode ser realizada antes e 2 ho- insulina de ação intermediária (NPH ou Lenta). No tipo “A” de
ras após cada refeição e à noite ao deitar, como também em fa- resposta o paciente apresenta hiperglicemia pela manhã e à noite
ce de sintomas clínicos de hiper ou hipoglicemia. Fixando-se o pa­ e normoglicemia ou hipoglicemia à tarde. Nesse tipo de resposta
• ENDOCRINOLOGIA • 323

não se deve aumentar a dose de insulina, pois isso acarretará hipo­ mental e é empregada no seguimento do diabetes, uma vez que refle­
glicemia mais grave à tarde. Aqui se indica dividir a dose, adminis- te a variação dos níveis glicêmicos nos últimos dois a três meses.
trando-se 60 a 70% da dose total pela manhã e 30 a 40% à noite Pré-misturas. Existem diversas preparações disponíveis que
ao deitar. Muitas vezes é ainda necessário acrescentar insulina sim­ apresentam combinação variada de insulina de ação intermediária
ples nas refeições. com insulina de ação rápida. Mais recentemente foram introduzi­
No tipo “B” ou normal de resposta o paciente apresenta das as pré-misturas Humalog Mix® 25 (lispro associada a prota­
normoglicemia durante as 24 horas. Atenção especial deve ser da­ mina, forma de ação lenta) e a Novo Mix®30 (aspart, associada a
da para possível hipoglicemia no começo da noite, quando então protamina, forma de ação lenta). Essas combinações são práti­cas,
deve-se reduzir a dose de NPH. mas só podem ser utilizadas após se fixarem as quantidades de in-
No tipo “C” de resposta, também dita resposta retardada, o sulina de ação intermediária e de ação rápida a serem aplicadas.
paciente é hiperglicêmico durante o dia, com normo ou hipoglice­ Aparentemente, são mais úteis no diabetes tipo 2 do que no dia­
mia à noite. Nesses pacientes que apresentam início retardado da betes tipo 1, visto que a variação das glicemias é menor no tipo 2,
ação da NPH indica-se diminuir a dose de NPH e acrescentar in­ havendo possibilidade de fixar a dose de rápida e intermediária. As
sulina rápida nas proporções 3N:1R ou 2N:1R ou em outras pro­ diferentes preparações insulínicas de pré-misturas disponíveis do
porções, dependendo do padrão alimentar (número de calorias re­ Brasil são apresentadas no Quadro 4.
cebidas na dieta) e de atividade física do paciente.
Alguns pacientes excepcionalmente podem exibir amplas flu­ Efeitos adversos da insulina
tuações nos níveis glicêmicos, o que torna difícil estabelecer um
padrão diário de variação (apesar do número constante de calo­rias O principal efeito adverso da insulina é a eventual ocorrên­
e da atividade física), fazendo-se necessários ajustes constan­tes. As cia de hipoglicemia. Outros efeitos incluem:
“canetas” injetoras de insulina têm tornado mais práticas as apli- Efeito Somogyi - Embora a insulina possa causar hipogli­
cações, principalmente as suplementações com insulina re­gular ou cemia, paradoxalmente o excesso de insulina pode estar associado
ultra-rápida. com hiperglicemia. O paradoxo, conhecido como efeito Somogyi,
Concentrações da insulina. As preparações insulínicas po- é primariamente conseqüência de hipoglicemia aguda com libera­
dem ser apresentadas em diferentes concentrações. No Brasil, contu­ ção secundária de fatores hiperglicemiantes (cortisol, glucagon,
do, todas as preparações são U-100 ou seja, 100 unidades por mi­ catecolaminas), resultando em hiperglicemia com glicosúria e às
lilitro. Deve-se usar seringa apropriada para aplicação de insulina vezes com cetonúria. Essa hiperglicemia de rebote é ainda agrava­
com escala U-100 ou “canetas” injetoras de insulina, nas quais o da pelo excesso de calorias recebidas pelo organismo que freqüen­
cartucho de insulina já está acoplado ao injetor, facilitando a apli­ temente acompanha os episódios de hipoglicemia. O tratamen­to
cação. As prescrições de insulina devem sempre indicar qual insu­ consiste obviamente em diminuir a dose de insulina. Na nossa ex-
lina, o tipo e a dosagem exata em unidades. periência, o efeito Somogyi é raro; a maioria dos pacientes que
A dose de insulina é variável de paciente para paciente e mes­ apresenta hiperglicemia necessita seguramente doses maiores e não
mo em determinado paciente pode variar de um período para ou­ menores de insulina.
tro, o que determina ajustes freqüentes. São necessários, portanto, Lipodistrofia é complicação benigna do tratamento com in­
vigilância e controle constantes por meio da automonitoração da sulina e consiste em hipertrofia ou, mais freqüentemente, atrofia
glicemia capilar. O Quadro 7 apresenta as doses médias de insuli­ do tecido celular subcutâneo no local da aplicação. O tratamen­
na para pacientes que recebem insulina pela primeira vez. to consiste na troca da insulina para preparações mais purificadas,
A avaliação da hemoglobina glicada (A1c) é também funda­ principalmente insulina humana, a qual deve ser administrada no

QUADRO 7 - Doses médias de insulina para primeira administração em pacientes diabéticos

PESO MANHÃ* NOITE* TOTAL

20 5 3 8
25 7 3 10 Base de cálculo: 0,4 unidade/kg/dia
30 8 4 12 Exemplo: Paciente com 70 kg
35 9 5 14 Administração: 2 vezes ao dia
40 11 5 16
45 12 6 18 1. A Dose Total Diária (DTD) calcula-se multiplicando 0,4
50 13 7 20 unidade dose pelo peso do paciente em kg
55 15 7 22 Ex.: 0,4 unidade/kg x 70 kg = 28 unidades DTD
60 16 8 24
65 17 9 26 2. Cálculo de doses para um regime de administração de
70 19 9 28 duas vezes por dia: 2/3 DTD antes do desjejum,
75 20 10 30 1/3 DTD antes de deitar
80 21 11 32 Ex.: 2/3 x 28 unidades DTD = 19 unidades antes do
85 23 11 34 desjejum*
90 24 12 36 1/3 x 28 unidades DTD - 9 unidades antes de deitar*
95 25 13 38
100 27 13 40 * Valores aproximados.
324 • ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA • MANUAL PRÁTICO DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO •

próprio local onde se desenvolve a lipoatrofia, obtendo-se exce­ dicadas no diabetes tipo 2 não obeso. As sulfoniluréias são contra­
lentes resultados. indicadas no diabetes tipo 1, no diabetes lábil, instável, na acidose
Resistência insulínica - Consiste em necessidade insulíni­ca diabética, no coma hiperglicêmico hiperosmolar e em determina­
maior que 100 unidades por dia ou 2 U/kg de peso corpóreo, por das intercorrências: infecções, cirurgia, gestação, trauma, doença
alguns dias consecutivos e na ausência de outras condições clíni- renal e hepática.
cas que possam causar resistência periférica à ação da insuli­na (ce- A principal biguanida em uso atualmente é a metformina, in­
toacidose, tirotoxicose, acromegalia, hipercortisolismo, in­fecção dicada principalmente no diabetes tipo 2 com excesso de peso. A
e obesidade). metformina aumenta a sensibilidade dos tecidos periféricos (prin­
O tratamento da resistência insulínica é a mudança para in­ cipalmente hepático) à ação insulínica (insulin sensitizer) e melho­
sulina humana que, de maneira geral, não causa resistência. ra consideravelmente a hiperglicemia. É a droga de escolha para o
Alergia à insulina - Manifestações alérgicas locais podem diabético obeso no qual medidas dietéticas e exercício já tenham
re­gredir com o tempo e indicam-se apenas antialérgicos comuns. sido tentados.
Não se deve interromper o tratamento insulínico; com o uso mais A fenformina, biguanida muito utilizada no passado, susci­
difundido de insulina humana e de preparações mais purificadas, a tou discussões quanto à possibilidade de causar acidose lática. Já
alergia à insulina tem sido extremamente rara. com a metformina, estudos epidemiológicos de países onde a dro-
ga tem sido usada por mais de quarenta anos sugerem que o risco
Novas preparações insulínicas de acidose lática é muito menor (três casos por 100.000 pacien-
tes-ano, em comparação a 64 casos por 100.000 pacientes-ano
Novas insulinas estão ou estarão proximamente disponíveis, com a fenformina).
ampliando os esquemas terapêuticos de insulinização. A metformina é antidiabético de ação periférica, cujo me­
Insulina glargina -As insulinas de ação intermediária, e mes­ canismo de ação não está totalmente esclarecido. Apresenta cer­
mo de ação ultralenta, apresentam picos de ação extremamente va­ ta ação anorexígena, reduz a absorção intestinal de glicose, ini-
riáveis, principalmente quando utilizadas em combinação com insu- be a produção hepática de glicose e aumenta a captação periférica
lina de ação rápida. A insulina glargina é novo análogo da insulina de glicose. A metformina reduz a hiperglicemia sem aumentar a
de longa ação (24 horas), não apresenta variações (ação constante), se­creção insulínica; por isso é considerada a droga anti-hiperglice-
e já está disponível. O uso dessa nova insulina, em combinação com miante com menor risco de provocar hipoglicemia.
insulina de ação rápida ou ultra-rápida, seguramente tornará não só A metformina é contra-indicada na cetoacidose diabética,
mais prático como mais eficaz o tratamento insulínico. no coma hiperosmolar hiperglicêmico, em cirurgia, infecção, insufi­
Insulina detemir é um análogo de insulina de ação ultralen­ta ciência hepática, insuficiência renal, história pregressa de acidose
que é solúvel em pH neutro. Essa insulina é um derivado aci­lado lática, em concomitância com a ingestão de álcool, em emergên­
(foi acrescentado um ácido graxo ao residuo lisina da cadeia beta cias clínicas, particularmente colapso periférico, insuficiência car­
da insulina) da insulina humana, com o objetivo de facilitar a sua díaca congestiva, insuficiência coronariana aguda, septicemia, desi­
ligação a albumina circulante. Os estudos iniciais mostraram que dratação, em qualquer condição associada a hipóxia ou em qualquer
as oslilações nos níveis plasmáticos de insulina com a detemir são outra condição que predisponha à acidose lática.
inferiores ás encontradas com a insulina NPH. Os efeitos adversos do tratamento com a metformina são
Insulina inalada - Constitui avanço no tratamento insulí­ diminuição do apetite, náusea e diarréia. Os sintomas diminuem
nico. A insulina é absorvida nos alvéolos pulmonares, e a admi­ com o tempo e/ou com a diminuição da dose e podem requerer
nistração é realizada por meio de dispositivo especial que libera a suspensão do tratamento em 3 a 5% dos casos. Os pacientes não
insulina (em pó) por via oral, com posterior inalação e absorção ganham peso, e alguns até perdem, principalmente devido à di­
via pulmonar. O pico e a duração da ação são intermediários en­ minuição da ingestão de alimento. A metformina é utilizada tam­
tre a insulina rápida e a ultra-rápida (quando administradas por bém em combinação terapêutica com sulfoniluréia e/ou inibidor
via subcutânea). de α-glicosidase, com repaglinida e com nateglinida, compostos
A apresentação, em blisters de 1 mg ou 3 mg, será bastan- discutidos a seguir.
te útil no diabetes tipo 2 para correção da hiperglicemia pós-pran- Os inibidores da α-glicosidase (acarbose) são indicados no
dial. Poderá ser associada a agentes orais, à insulina de ação interme­ tratamento do diabetes tipo 2 obeso e não obeso. A acarbose é oli­
diária ou à insulina glargina. A insulina inalada, contudo, só esta­rá gossacarídeo complexo; administrado por via oral imediatamente
disponível dentro de dois ou três anos. antes das refeições, retarda a digestão dos carboidratos, reduzin­
do o aumento da concentração de glicose no sangue após as re­
Antidiabéticos orais feições. Como conseqüência da redução da glicemia pós-prandial
(por isso é chamado de droga anti-hiperglicemiante, não causan­
O tratamento do diabetes tipo 2, não-dependente da insu­ do portanto hipoglicemia) reduz a médio prazo o nível da hemo­
lina, é fundamentalmente dietético, acompanhado de aumento da globina glicada.
atividade física. Persistindo a hiperglicemia apesar da redução do Ao contrário das sulfoniluréias, a acarbose não aumenta a
peso está indicado o uso de antidiabéticos orais: sulfoniluréia, bi­ secreção de insulina. A ação anti-hiperglicemiante advém de inibi­
guanida, glitazonas, repaglinida, nateglinida e inibidor de α-gli- ção competitiva e reversível da α-amilase pancreática e das enzimas
cosidase (Quadro 8). hidrolisantes da α-glicosidase ligada à membrana intestinal. Acar­
As sulfoniluréias apresentam estrutura molecular comum, di­ bose pode ser utilizada com as sulfoniluréias, fazendo diminuir os
ferindo uma da outra pela substituição de determinados radicais, efeitos insulinotrópicos e o efeito de ganho ponderal das sulfoni­
o que acarreta diferença na potência, metabolização e duração da luréias. Foi aprovado no Brasil apenas para uso no diabetes tipo 2.
ação de cada um desses compostos. Atuam estimulando a libera­ Como a acarbose inibe a absorção da sacarose (açúcar comum),
ção de insulina endógena, não tendo ação em pacientes que não cautela deve ser tomada em pacientes do tipo 2 que estejam com
apresentem função residual de células beta. São principalmente in­ insulina ou sulfoniluréias, dado que a ocorrência de hipoglicemia
• ENDOCRINOLOGIA • 325

QUADRO 8 - Dosagem dos antidiabéticos orais

APRESENTAÇÃO DOSE
NOME NOME DOSE
CLASSE COMERCIAL MÁXIMA
QUÍMICO COMERCIAL MÍNIMA(mg)
(mg) (mg)

Sulfoniluréias Clorpropamida Diabinese Comp. 250 62,5 500

Glibenclamida Daonil Comp. 5 1,2 20

Lisaglucon Comp. 5

Glipizida Minidiab Comp. 5 2,5 20

Gliclazida Diamicron Comp. 80 40 160

Glimepirida Amaryl Comp. 1, 2 e 4 1 8

Biguanida Metformina Dimefor Comp. 850 425 2550

Glifage Comp. 500 e 850

Glucoformin Comp. 850 e 500

Acido carbamoil- metilbenzóico Repaglinida NovoNorm Comp. 0,5, 1 e 2 1,5 16

Prandim Comp. 0,5, 1 e 2 1,5 16

Inibidor de α-glicosidase Acarbose Glucobay Cáps. 50 e 100 75 300

Derivado da D-fenil-alanina Nateglinida Starlix Comp. 120 180 540

Tiazolidinadionas (glitazonas) Rosiglitazona Avandia Comp. 4 e 8 4 8

Pioglitazona Actos Comp. 15, 30 e 45 15 45

Combinados Glucovance Metformina / 250 mg / 1,25 mg


Biguanida + Sulfonilurea Glibenclamida
Metformina + Glibenclamida

500 mg / 2,50mg

500 mg / 5 mg

Glitazona + Rosiglitazona + Rosiglitazona / Metformina 2mg / 500 mg


Avandamet Biguanida

4mg / 500 mg

não poderá ser tratada com sacarose. Deve-se, nessas circunstâncias, insulínica, de modo que as glitazonas diminuem a resistência insulí­
administrar glicose oral. Dor abdominal, diarréia e flatulência são nica (melhora a sensibilidade insulínica), o que promove redução da
os efeitos adversos principais. Deve-se iniciar com doses pequenas glicemia e da hiperinsulinemia no diabetes tipo 2. Outros fatores de
(25 mg imediatamente antes da refeições) e aumentá-las progres­ risco cardiovasculares, tais como a hiperproinsulinemia e os triglicé­
sivamente. Doses excessivas não causam hipoglicemia. rides, também são reduzidos com o uso das glitazonas.
As tiazolidinadionas, das quais fazem parte as glitazonas, dro- Os dois componentes do grupo das glitazonas disponíveis
gas que atuam quebrando a resistência insulínica, fator patogené­ no mercado nacional são o maleato de rosiglitazona e o cloridra­
tico principal do diabetes tipo 2, são outro grupo de agentes orais to de pioglitazona.
recentemente introduzido no Brasil. A rosiglitazona é agonista altamente seletivo e potente do re­
As tiazolidinadionas foram inicialmente estudadas no Japão, ceptor do ativador da proliferação do peroxissoma gama (PPARγ).
onde se demonstrou que reduziam a resistência insulínica em roe­ Um dos mecanismos pelos quais a rosiglitazona melhora a sensi­
dores e em pacientes com diabetes tipo 2. As tiazolinadionas se li­ bilidade à insulina é melhorando a captação da glicose nos tecidos
gam a receptores intracelulares (peroxisome proliferator-activator re- por meio da proteína transportadora de glicose, GLUT-4. A ati­
ceptor-γ, PPAR-γ), resultando em complexo que regula a expressão vação do PPAR-γ pela rosiglitazona resulta na maior expressão e
de vários genes nos tecidos musculares e adiposo, melhorando a ação translocação da GLUT-4 para a superfície dos adipócitos, em res­
326 • ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA • MANUAL PRÁTICO DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO •

posta à insulina. Conseqüentemente, há maior captação de glico- mo monoterapia ou associada às biguanidas e às glitazonas. A do­
se, e portanto redução da hiperglicemia. Os dados pré-clínicos mos­ se inicial recomendada é de 0,5 mg antes das principais refeições.
traram que a rosiglitazona é consideravelmente mais potente do Quando o paciente é transferido de outro hipoglicemiante oral, a
que a troglitazona e a pioglitazona na redução da hiperglicemia, o dose inicial recomendada é de 1 mg antes das principais refeições.
que relaciona à maior afinidade de ligação da rosiglitazona com o A dose máxima preconizada é de 4 mg antes cada refeição e a do­
PPAR-γ, em comparação com as outras glitazonas. se máxima diária não deve exceder 16 mg.
A rosiglitazona administrada por via oral é absorvida rapi­ A repaglinida tem perfil de segurança semelhante ao das
damente, atingindo pico de concentração plasmática em média sulfoniluréias, mas com menor incidência de hipoglicemias gra-
uma hora após a ingestão. A rosiglitazona pode ser administrada ves quando uma refeição é retardada ou abolida. Os efeitos adver-
com ou sem alimentos. A meia-vida plasmática da rosiglitazona, sos mais freqüentemente relatados em estudos controlados foram
após dose única, varia de três a quatro horas e independe da do­ hi­poglicemias leves, distúrbios visuais transitórios e alterações gas­
se administrada. O metabolismo da rosiglitazona é amplo e todos trintestinais leves (diarréia ou náuseas).
os metabólitos circulantes são significamtemente menos poten­tes Uma das vantagens preconizadas para o uso da repaglinida
do que o composto original. A farmacocinética da rosiglita­zona é a sua flexibilidade na relação dose-refeição, isto é, uma refeição
não é influenciada pela idade, mas não deve ser iniciada caso o pa- - uma dose; nenhuma refeição - nenhuma dose.
ciente apresente evidência clínica de doença hepática ativa ou ní- A nateglinida é composto derivado da fenilalanina e tem
veis das transaminases séricas duas vezes e meia o limite su­perior como ação principal o restabelecimento da primeira fase de secre­
do normal. ção de insulina. A ação, mediada por interação rápida e transitória
A rosiglitazona pode ser utilizada como monoterapia ou em com os canais de K+ das células β pancreáticas, provoca aumen-
associação com metformina, sulfoniluréia ou insulina para melhorar to significativo na secreção de insulina durante os primeiros 15 mi­
o controle glicêmico em pacientes com diabetes do tipo 2. A dose nutos após uma refeição. O resultado final é a redução nos picos
inicial recomendada de rosiglitazona é de 4 mg uma vez ao dia e de glicemia pós-prandiais.
pode ser aumentada para 8 mg/dia em dose única ou dividida. Duas propriedades importantes da nateglinida são a sua sele­
O outro componente deste grupo de drogas, a pioglitazo­ tividade, 300 vezes superior para as células β pancreáticas em rela­ção
na, além de ativar o receptor PPAR-γ tem mostrado alguma ativa­ aos canais de K+ATP cardiovasculares, e o seu potencial reduzido
ção secundária do receptor PPAR-γ. A ativação PPAR-γ tem sido em estimular a secreção de insulina em meios com baixas concen­
relacionada com alguns aspectos do metabolismo lipídeo. Em mo­ trações de glicose. Aquela pode resultar em menor interação com
noterapia, ou quando adicionada a sulfoniluréia, metformina ou mecanismos de proteção à isquemia do miocardio e esta em me-
insulina, a pioglitazona pode diminuir também os níveis de trigli­ nor risco de hipoglicemia interprandial ou noturna.
cerídeos e promover aumento do HDL colesterol. A nateglinida após a ingestão oral atinge a sua concentração
A pioglitazona é indicada como adjunto à dieta e ao exer­cício máxima na circulação dentro de 30 a 60 minutos. A administração
no tratamento do diabetes do tipo 2. Pode ser usada como mono- pode ser feita 30 minutos ou imediatamente antes das refeições. Os
terapia ou em combinação com sulfoniluréia, metformina ou insu- principais metabólitos são três a seis vezes menos potentes do que
lina quando necessário para o controle glicêmico. A pioglita­zona o composto principal. A maior parte da nateglinida e de seus me­
deve ser tomada uma vez ao dia e independentemente das refei- tabólitos é excretada pela urina (83%) e pelas fezes (10%). A meia­
ções, na dose de 15 a 45 mg/dia. vida da nateglinida é em média de uma hora e meia, e não há acú­
Os principais efeitos colaterais que podem ocorrer com es­sas mulo do composto após doses múltiplas diárias.
duas tiazolinadionas são edema e ganho de peso. A nateglinida pode ser utilizada, à semelhança da repaglini­
Devido a possibilidade dos pacientes poderem desenvolver da, como monoterapia ou em terapia combinada com metformi­
uma retenção hidrica com o uso das glitazonas esta estão contra­ na, glitazonas ou insulina. A dose habitual é de 120 mg antes das
indicadas, também naqueles com insificiência cardiaca tipo fun­ principais refeições. A monitoração da dose é realizada por meio
cional II para cima. da medida da glicemia duas horas após as refeições, e também da
Uma das drogas hipoglicemiantes orais recentemente in­ HbA1c. Quando a resposta adequada não for obtida, a dose pode
troduzidas no Brasil para o tratamento do diabetes tipo 2 é a re- ser aumentada para 180 mg antes das refeições. Por outro lado, em
paglinida. Pertence ao grupo do acido carbamoilmetilbenzóico. A alguns pacientes com menor grau de descompensação meta­bólica
repaglinida estimula a secreção de insulina pelas células be­ta pan- podem ser suficientes 60 mg de nateglinida antes das refei­ções.
creáticas, fechando os canais de K+ sensíveis ao ATP na membra- O perfil de segurança da droga é o mesmo entre a popula­ção ge-
na dessas células. Isso inibe o efluxo de íons potássio e despolariza ral e em idosos.
a membrana celular, causando influxo dos íons de cálcio extrace- Nos últimos com o objetivo de melhorar a adesão do pa­
lular para o meio intracelular. O aumento no cálcio intracelular es- ciente ás combinações de antidiabéticos orais tem surgido prepa­
timula a secreção de insulina. A repaglinida se liga a receptor dife- rações com dois componentes no mesmo comprimido como Glu­
rente dos das sulfoniluréias nas células beta. A ação in­sulinotrópica covance® (250 mg de metformina + 1,25 mg de glibenclamida
da repaglinida é glicose-dependente. Após a ingestão via oral da ou 500 mg de metformina + 2,5 mg de glibenclamida e 500 mg
repaglinida esta atinge a concentração máxima após 30 minutos e de metformina + 5,0 mg de glibenclamida), Avandamet (2 mg de
tem meia-vida plasmática de 60 a 90 minutos. rosiglitazona + 500 mg de metformina ou 4 mg de rosiglitazona
A repaglinida é metabolizada no fígado e assim excretada: + 500 mg de metformina). Temos também o Starfor® que tem a
90% pelas vias biliares, nas fezes, e 8% pelos rins, na urina. Apenas nateglinida e a metformina mas em comrpimidos separados. Estas
traços da repaglinida podem ser detectados em circulação cinco preparações já estão disponíveis no mercado nacional.
horas após a administração via oral em indivíduos normais. A re- Falência primária aos agentes orais ocorre seis meses ou me-
paglinida está indicada para o tratamento dos diabéticos do tipo 2 nos após o início do tratamento, quando mesmo com doses má­
quando a hiperglicemia não pode mais ser controlada satisfatoria­ ximas das drogas os pacientes permanecem hiperglicêmicos. Esses
mente com dieta, redução do peso e exercício. Pode ser usada co­ pacientes geralmente são magros, ou não obesos, com menos de
• ENDOCRINOLOGIA • 327

40 anos e, em alguns casos, com diabetes erroneamente diagnos­ microalbuminúria/creatinina (nefropatia diabética), eletrocardio­
ticado como tipo 2. História pregressa de cetose e pacientes mui­ grama, perfil lipídico. Avaliação pelo menos trimestral da pressão
to sintomáticos freqüentemente apresentam falência primária. A arterial e semestral da glicoemoglobina também estão indicados
falência secundária aos antidiabéticos orais ocorre comumente no acompanhamento dos pacientes diabéticos.
após cinco a dez anos de evolução. A combinação terapêutica de
sulfoniluréia, biguanida e acarbose pode ser útil, mas o paciente Adequação do tratamento do diabetes tipo 2
acaba evoluindo para necessidade de insulina, principalmente após às diferentes fases da história natural da moléstia
vários anos, quando passa a apresentar perda espontânea de peso
(às vezes lenta e progressiva, por meses ou anos e glicemia de je­ Adequação do tratamento do diabetes tipo 2 às diferentes
jum >200 mg/dL. Persistindo os sintomas, há necessidade da in­ fases da história natural da moléstia
dicação de insulina. Os agentes orais são tradicionalmente utilizados e reconhe­
A combinação terapêutica de metformina e insulina é bastante cidos como a primeira opção no tratamento do diabetes tipo 2.
útil, principalmente com o esquema de bed time (insulina NPH em Muitos desses pacientes, porém, necessitam ou virão a necessitar de
doses pequenas, à noite, ao deitar), o qual inibe a produção hepá­ insulina durante a evolução da moléstia. A necessidade de insulina
tica de glicose, uma das características do diabetes tipo 2. pode se manifestar já por ocasião do diagnóstico ou, como acon­
Finalmente, em relação ao tratamento do diabetes tipo 2 é tece mais freqüentemente, após algum tempo (meses ou anos) do
importante frisar que devemos tratar concomitantemente os outros reconhecimento da hiperglicemia. O papel da deficiência de insu­
componentes associados (síndrome plurimetabólica): hipertensão, lina como fator patogenético do diabetes acentua-se progressiva­
hiperlipidemia, macroangiopatia e tendência a hipercogulabilidade mente como o decorrer dos anos.
sangüínea. O Quadro 9 apresenta parâmetros bioquímicos e cri­ O diabetes tipo 2 está freqüentemente associado ao excesso
térios de controle metabólico global nos diabéticos. de peso, e grande maioria dos pacientes tem índices de massa cor­
Atenção especial deve ser dada à educação do paciente, prin­ pórea elevados, compatíveis com o diagnóstico de sobrepeso ou
cipalmente em relação à prevenção do pé diabético. É necessário obesidade. Nessas circunstâncias, o defeito principal é a presença
controle anual do fundo de olho (retinopatia diabética), relação da resistência insulínica, fator que predomina nas fases iniciais da

QUADRO 9 - Parâmetros de avaliação do controle metabólico global nos diabéticos

PARâmetro grau de controle

Bom Aceitável Mau


Glicemia (mg/dL)
de jejum 80 - 115 116 - 140 >140
pós-prandial 1,5 a 2 hs 80 - 140 141 - 180 >180

Hemoglobina
glicolisada (%)
Hba 1 <8 8,1 - 10 >10
­Hba 1c <6,5 6,6 - 7,5 >7,5

Glicosúria 0 <5 g/l >5 g/l

Cetonúria (-) (-) (+)

Colesterol total <200 200 - 239 >240


(mg/dL)

HDL (mg/dL)
em homens >35 >35 <35
em mulheres >45 >45 <45
LDL <100 130 - 159 >160

Triglicérides <150 150 - 200 >200


(mg/dL)

Índice de massa
corporal
em homens 20 - 25 kg/m2 27 <27
em mulheres 19 - 24 kg/m2 26 <26

Pressão arterial 135/85 mmHg 140/90 mmHg >140/90 mmHg


328 • ATUALIZAÇÃO TERAPÊUTICA • MANUAL PRÁTICO DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO •

doença - o tratamento deve ser dirigido para medidas que aumen­ se acentua, as combinações terapêuticas de agentes orais podem
tem a sensibilidade à ação da insulina. As medidas incluem diminui­ não ser mais eficazes em controlar a glicemia elevada e a adminis-
ção do peso corpóreo, implementação da atividade física, eventual tração de insulina se impõe (Quadro 10).
uso de drogas antiobesidade e uso de agentes orais que façam di­ Recente e importante estudo do UKPDS -UNITED KINGDOM
minuir a resistência insulínica (biguanidas e tiazolinedionas). PROSPECTIVE DIABETES STUDY acompanhou por vários anos cerca de
Com o decorrer dos anos, o diabetes passa por fases inter­ 4.500 pacientes com diabetes tipo 2, observando a história natu-
mediárias em que ambos os defeitos, resistência e deficiência de in­ ral da moléstia. Foi concluído que realmente o diabetes tipo 2 é
sulina, podem coexistir, indicando-se então associar-se às drogas doença progressiva e que com o decorrer dos anos os pacientes
sensibilizadoras da ação insulínica, drogas secretagogas de insuli­na acabam ne­cessitando de tratamento insulínico. Além da duração
(sulfoniluréias, repaglinida, nateglinida). À medida que a de­ficiência do diabetes, outros indicadores da necessidade de insulina no dia-

QUADRO 10 - Estádios no tratamento do diabetes tipo 2


Estádio 1 • Tratamento dietético • Mudança de estilo de vida
• Programa de exercícios • Treinamento em automonitoração

Estádio 2 • Acrescentar antidiabéticos orais em monoterapia ou em combinações

Estádio 3 • Acrescentar insulina ao tratamento oral ou instituir definitivamente a insulina como


monoterapia

Estádio 4 • Intensificação do tratamento insulínico

betes tipo 2 com­preendem a idade de aparecimento e os níveis de trolar a hiperglicemia, a intervenção farmacológica primária no dia­
glicose sanguínea. Quanto maisjovem o paciente, mais possivel- betes tipo 2 tem sido tradicionalmente o uso de agentes orais. Atual­
mente necessitará de in­sulina, principalmente os indivíduos não mente existem diferentes classes de agentes orais com diferentes
obesos. A medição da gli­cose plasmática de jejum é indicador in- mecanismos de ação, os quais são utilizados isoladamente (mono­
direto da produção de insu­lina. Níveis de glicose plasmática em je- terapia) ou em combinações terapêuticas diversas. Contudo, con-
jum acima de 180mg/dL em pacientes com diabetes tipo 2, que forme já mencionado, com o decorrer dos anos o tratamento com
sigam dieta adequada, estão asso­ciados a diminuição considerável agentes orais passa a não mais ser eficaz e em conseqüência os ní­
da produção de insulina. veis glicêmicos aumentam, não sendo mais possível manter o con­
Além dos níveis de glicose, a variação do peso pode ser indi­ trole metabólico. Nesses casos está indicado o tratamento com in­
cador da necessidade de insulina. Assim, pacientes que tenham sulina, existindo duas condutas.
tido perda considerável de peso espontaneamente também têm A primeira opção é suspender o tratamento com agentes
neces­sidade de insulina, principalmente quando o índice de mas- orais e iniciar insulina como monoterapia. Havendo falha secun-
sa cor­pórea estiver muito abaixo do normal. O estudo do UKPDS dária aos agentes orais e sendo o diabetes já de longa duração (15
de­monstrou ainda que a insulina não é aterogênica, esclarecendo anos ou mais), o tratamento insulínico tem de ser mais agressivo,
a controvérsia sobre os efeitos da insulina exógena no eventual de­ visto que nessas circunstâncias a deficiência de insulina é mais pro-
senvolvimento da aterogênese. O Quadro 11 apresenta o fluxo­ nunciada, principalmente após a suspensão dos agentes orais, quan-
grama da conduta terapêutica no diabetes tipo 2. Os parâmetros de do a in­tolerância à glicose deteriora mais rapidamente. Dose única
controle glicêmico em pacientes com diabetes do tipo 2 são apre­ de in­sulina pode não ser suficiente, devendo-se optar pelo esque-
sentados no Quadro 12. ma de dose dupla de insulina de ação intermediária (NPH), ini-
Quando a dieta e o exercício não forem suficientes para con­ ciando-se com 10 a 15 unidades duas vezes ao dia, pela manhã e à
noite. A dose deve ser aumentada de acordo com os níveis de gli-
QUADRO 11 - Conduta terapêutica no diabetes tipo 2 cose medi­dos em intervalos regulares (automonitoração) e tam-
bém com outros parâmetros clínicos: variação de peso, diurese,
Dieta e Exercícios alívio dos sintomas.
Em muitos casos pode haver necessidade de associar insu­
lina de ação rápida, podendo-se utilizar as pré-misturas após es­
Monoterapia Oral tabilização dos níveis de glicose e fixadas as proporções de insuli­
na NPH e rápida.
Quando não houver perda de peso espontânea e persistên-
Terapia Combinada de
cia de níveis elevados de glicose, a segunda opção ao se iniciar o tra­
Antidiabéticos Orais
tamento com insulina no diabetes tipo 2 é manter os agentes orais
e acrescentar a insulina. O melhor esquema é o chamado “esque­
Antidiabéticos Orais + Insulina ma da insulina ao deitar” (bed-time insulin) em que 10 unidades
de insulina NPH (de ação intermediária) são administradas à noi­
te, ao deitar, aumentando-se progressivamente a dose até 20 ou 30
Insulinoterapia unidades. Com esse esquema consegue-se controlar a hiperglice­mia
de jejum, fazendo diminuir a glicotoxidade, melhorando não só
Indicações do uso de insulina no diabetes tipo 2 a secreção endógena da insulina como também a ação da insulina
nos tecidos periféricos (diminuição da resistência insulínica causa-
• ENDOCRINOLOGIA • 329

QUADRO 12 - Parâmetros de controle glicêmico em pacientes com diabetes tipo 2


PARâMETRO bioquímico níveis desejados PARâMETRO bioquímico

Glicemia de jejum (mg/dL) 80 - 120 <80 ou >140


Glicemia ao deitar (mg/dL) 100 - 140 <100 ou >160
Glicohemoglobina (%) <1% acima do valor máximo >2% acima do valor máximo

da pelo próprio aumento dos níveis de glicose). cional, endocrinopatias de hiperfunção como hipertiroidismo e hi­
O esquema tem sido utilizado com excelentes resultados, com persomatotropismo e durante o uso de glicorticóides.
sulfoniluréia e metformina, e atualmente também com as tiazolina-
dionas, e apre­senta como vantagens menor ganho de peso e menor Transplante de pâncreas, transplante de ilhotas
incidência de hipoglicemia. Estudos são necessários em relação à pos- e pâncreas “artificial”
sível com­binação de insulina com agentes orais mais recentemente
introdu­zidos (nateglimida e repaglimida). O esquema da combinação Com os meios disponíveis no momento para tratamento do
de insulina com agentes orais pode ser feito também administrando- diabetes não conseguimos reproduzir a liberação fisiológica de in­
­se pré-misturas 70N/30R ou 80N/20R antes do jantar. sulina e obter portanto controle rigoroso da glicemia. Outras solu­
O esquema combinado de insulina mais agentes orais pode, ções têm sido propostas: “pâncreas artificial”, transplante de ilho­
eventualmente, com o passar do tempo, não mais funcionar, o que tas pancreáticas, transplante do pâncreas total.
é comprovado pelo aumento progressivo dos níveis de hemoglobi­
O transplante de pâncreas total poderia ser considerado co­
na glicada e também dos valores glicêmicos obtidos pela automo­
mo terapêutica alternativa à insulina exógena nos pacientes dia­
nitoração. Passam então a ser necessárias duas doses de insulina de
béticos com iminente ou estabelecida insuficiência renal terminal,
ação intermediária ou de pré-misturas. Pode haver necessidade de
nos quais foi realizado ou está sendo planejado transplante renal.
quantidades maiores de insulina.
Os pacientes devem preencher as indicações médicas e os critérios
Finalmente, quando não há mais possibilidade de uso de es­
quemas combinados de insulina e agentes orais, devem estes últi­ para transplante renal. Durante a seleção desses pacientes é pon­to
mos ser suspensos e manter apenas a insulina (insulinização plena). importante a avaliação do risco cardiovascular, que muitas ve­zes
Os esquemas podem ser variáveis, desde o uso de duas doses fixas contra-indica o transplante. O transplante de pâncreas pode ser
(de manhã e à noite) de insulina intermediária (NPH ou Lenta) ou feito simultaneamente ou após o transplante renal. Entretanto, a
de duas ou três doses de pré-mistura, até o uso de múltiplas doses sobrevida ao enxerto é melhor quando realizado simultâneamen­
de insulina rápida ou ultra-rápida, ajustadas de acordo com os va­ te ao transplante renal.
lores glicêmicos obtidos na automonitoração, associado ao uso de Outra alternativa é o transplante de ilhotas. Até recentemen­
insulina de ação intermediária ou prolongada. te os registros mostravam que dos pacientes com diabetes melito
Além do uso da insulina em fases mais avançadas da história tipo 1 submetidos a transplante de ilhotas apenas 8% permaneciam
natural de diabetes, a insulina pode ser usada em algumas circuns­ livres da insulina exógena após um ano de seguimento. Entretanto,
tâncias como primeira opção de intervenção farmacológica. De fa- em 1999 foram relatados os resultados de nova técnica para trans­
to, alguns autores preconizam até mesmo o uso direto da insulina plante de ilhotas por embolização portal trans-hepática associada a
como primeira opção; não usam agentes orais, iniciam o tratamen­ esquema de imunossupressão sem corticosteróide em pacientes com
to farmacológico com insulina, quando dieta e exercício não tive­ diabetes do tipo 1 de longa duração. Com essa técnica obteve-se,
rem sido suficientes. Em alguns pacientes é obrigatória a insulina até o momento, com seguimento médio de um ano, condição de
como primeira opção: pacientes que por ocasião do diagnóstico de independência de insulina exógena e excelente controle metabóli­
diabetes tipo 2 apresentam grande perda de peso e/ou pacientes co nos pacientes transplantados. Entretanto, deve-se entender que
muito sintomáticos e instáveis, com poliúria, polidipsia, glicosúria se trata de técnica experimental, que necessita de maior período de
acentuada, hiperglicemia considerável (acima de 250 mg/dL) e até seguimento, e que ainda é precoce a indicação de transplante de
eventualmente com presença de cetonúria. Tais pacientes apresen­ ilhota para o tratamento do diabetes tipo 1 na rotina clínica.
tam deficiência importante de insulina e são, portanto, dependen­ O “pâncreas artificial” é dispositivo eletrônico que funcio­na
tes da insulina. Muitos deles, na verdade, podem ser portadores de como célula beta artificial e que, implantado em algum local do
diabetes tipo 1 de início tardio que cursam com insuficiência de cé­
organismo, detecta as mínimas oscilações da glicemia (“sensor de
lulas beta e diminuição importante da secreção de insulina.
glicose”). Em contato com um microcomputador e um reservató­
O esquema de insulinização inicial nesses pacientes consis-
rio de insulina (em elevada concentração), transmite impulsos, li­
te na administração de duas doses de insulina de ação intermediá-
berando insulina na medida necessária. O “pâncreas artificial” não
ria (NPH ou Lenta) e posterior acompanhamento dos aspectos
está, contudo, disponível para uso prático.
clí­nicos: regressão dos sintomas e ganho de peso. As doses de insu­
lina devem então ser ajustadas de acordo com as glicemias capila­ O que temos atualmente são as bombas de infusão contí­nua
res (automonitoração). de insulina, disponíveis comercialmente, inclusive no Brasil. As
A insulina como monoterapia no diabetes tipo 2 está in­ bombas infundem a insulina por via subcutânea, devendo-se ajustar
dicada sempre que houver contra-indicação ao uso dos agentes a dosagem de acordo com os níveis glicêmicos e algoritmos adequa­
orais, seja pela presença de alergia,efeitos colaterais e reações ad­ dos. Esses aparelhos foram bastante aperfeiçoados e constituem, na
versas, seja pela presença de nefropatia diabética clínica ou insufi­ atualidade, o melhor método de controle do diabetes tipo 1. Com
ciência hepática. o uso das bombas de infusão previne-se hipoglicemia, o paciente
Outras circunstâncias em que está indicado o uso da insuli­ tem mais flexibilidade com relação às refeições, o ganho de peso
na no diabetes tipo 2 são presença de doenças intercorrentes co­ é menor, a quantidade total diária de insulina também é menor, e
mo infecções graves, infarto agudo do miocárdio, acidente vascular melhores níveis de hemoglobina glicada são atingidos.
cerebral, traumatismo, outras condições de estresse, diabete gesta­

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