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JEAN PIAGET: Psicologia e Educação

1. Dados biográficos: nasceu em 1896. Por formação é biólogo. Foi influenciado pelo
ESTRUTURALISMO, corrente filosófica que o auxilia no estudo da estruturação do pensamento
mental. Não é psicólogo nem educador, mas vai influenciar nos estudos e experiências no campo
psicológico e educativo. A psicologia não o reconheceu como psicólogo durante muito tempo.
Inicialmente foi lido mais por educadores. É considerado o Einstein da psicologia. Tem grande
influência na psicologia do século XX pela consistência de seu pensamento. Sua obra é imensa:
70 livros, inúmeros artigos. Falece em 1980 aos 83 anos.
2. Seu objetivo: saber como o homem pensa? Como constrói seu conhecimento? A sua psicologia é
denominada de EPISTEMOLOGIA GENÉTICA (epistemologia = filosofia da ciência, parte da
filosofia que estudo o fenômeno da ciência, do conhecimento + genética = psicologia da
construção do conhecimento, etimologicamente vem de gênesis que significa evolução).
3. Como a criança é o ser que mais evidentemente constrói conhecimento ele fez mais pesquisas
com crianças mas a sua pergunta não está situada no campo da psicologia da criança, mas tem
caráter epistemológico, ou seja, ele pergunta como os homens sozinhos ou em conjunto
constroem conhecimento. Sua psicologia é baseada essencialmente na inteligência e na
construção do conhecimento.
4. Inteligência para Piaget = é vista como FUNÇÃO e ESTRUTURA. Enquanto função é uma
adaptação com a finalidade de garantir a sobrevivência, à adaptação e modificação do meio.
Enquanto estrutura a inteligência é uma organização de processos que permitem se a organização
for mais complexa um nível de conhecimento mais complexo e vice-versa.
7. CONCEITOS:
7.1 EQUILIBRAÇÃO: vem da idéia de equilíbrio. Ao se entrar em contato com o objeto novo, este
não se deixa conhecer facilmente. Por isso há o conflito e o desequilíbrio. É necessária a
acomodação, a adaptação, a modificação. Neste processo há a busca do equilíbrio que é a estabilidade
da organização mental que dá conta do conhecimento. O conhecimento mental se dá então por
equilíbrio/desequilíbrio. É importante observar que o termo usado por Piaget não é equilíbrio, mas
Equilibração. Equilíbrio dá a idéia de algo estável. Já equilibração dá a idéia de algo móvel e
dinâmico.

- Dois mecanismos são acionados para se chegar a um novo estado de equilíbrio:


a) ASSIMILAÇÃO
- retira este conceito da Biologia e aplica na sua psicologia significando basicamente o seguinte:
quando uma pessoa entra em contato com um objeto de conhecimento retira algumas informações e
não outras porque existe uma organização mental. Ver o mundo não é só olhar mas interpretar, tornar
seus alguns elementos do mundo. Assimilação então quer significar assimilar algumas informações e
deixar de lado outras.

b) ACOMODAÇÃO
- a estrutura mental (= organização mental para conhecer o mundo) é capaz de se modificar para dar
conta da singularidade do objeto.
- Vinculando assimilação com acomodação diríamos conhecer o objeto é assimilá-lo mas o objeto
oferece certas resistências ao conhecimento que obriga a organização mental a se modificar e a esta
modificação Piaget dá o nome de ACOMODAÇÃO.

- Relação entre ASSIMILAÇÃO/ACOMODAÇÃO: “Embora a acomodação e assimilação sejam processos


distintos e opostos, numa realidade eles ocorrem ao mesmo tempo. Por exemplo, ao pegar uma bola, ocorre assimilação
na media em que a criança pequena faz uso do esquema de pegar (uma certa postura de braço, mão e dedos) que já lhe
conhecido, atribuindo à bola o significado do ‘objeto que se pega’. No entanto, a acomodação também está presente, uma
vez que o esquema em questão precisa ser modificado para se ajustar às características do objeto. Assim, a abertura dos
dedos e a força empregada para retê-lo são diferentes quando se pega uma bola de gude ou uma bola de futebol .” (In
Psicologia na Educação. Cláudia Davis e Zilma de Oliveira. São Paulo: Cortez Editora, 1990, p. 38)
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7.2) ESTÁGIOS: o desenvolvimento da inteligência é um processo de EQUILIBRAÇÕES
sucessivas. Mas este processo é caracterizado por estágios ou etapas. Porém não se dá de forma
linear, por acúmulo de informações, e sim por saltos, rupturas. Um estágio é superado por outro
estágio superior com outra lógica. A inteligência muda de qualidade, adquire outra organização.

a) Estágio sensoriomotor (de 0 a 2 anos):


b) Estágio pré operatório (2 a 7 anos)
c) Estágio operatório: concreto (7 a 12 anos) e formal (dos 13 anos em diante)
a) Estágio sensoriomotor: de 0 a 2 anos
- Antigamente se pensava que o bebê de 0 2 anos não apresentava nada de interessante em relação a
inteligência já que não falava. Havia a idéia de que a inteligência aparecia somente com a linguagem.
No entanto esta fase é extremamente rica e demonstra que a inteligência começa a se mostrar bem
antes da linguagem. Uma série de conquistas, de pequenos passos preparam a criança para o uso da
linguagem. No momento adequado tem o que falar, pois construiu o mundo antes. A
INTELIGÊNCIA É ANTERIOR A FALA. Existe pois, uma inteligência pré verbal, sem
comunicação verbal que é um dos pontos essenciais da teoria de Piaget.
- Este estágio é chamado também de INTELIGÊNCIA PRÁTICA porque a inteligência não emprega
a linguagem, mas apenas suas ações (=motor) e percepções (=sensoriomotor). É uma inteligência em
ação, não representativa. A criança resolve seus problemas de forma prática: bater numa caixa, pegar
um objeto, jogar uma bola etc..Considera-se que nesta etapa ainda não possui pensamento pois “não
dispõe da capacidade de representar eventos, de evocar o passado e de referir-se ao futuro.” (op. Cit.
p. 39)
- Construção da noção de objeto: neste estágio a criança não tem clareza que no universo onde se
encontra há objetos e que ela é inclusive um objeto entre estes objetos. Por isso precisa construir a
noção de objeto. Nesta construção há a fase do OBJETO PERMANENTE (=é aquele que embora eu
não o veja sei que ainda existe). Constrói isto por volta dos 9 meses de idade. Antes para ela só
existem coisas que ela vê. Aos poucos vai percebendo que o universo tem objetividade própria.
- Causalidade: vai entendendo que os objetos interagem entre si e com ela e também que causam
efeitos entre si. No entanto a tendência da criança até 1 ano e pouco é ficar no campo da magia. Acha
que o objeto se move por conta de suas ações ou dos seus desejos (Freud=onipotência infantil).
Depois vai entendendo que há leis de causalidade, regras que se aplicam inclusive a ela.
- Meios e fins: por volta dos 9 meses diferencia meios e fins. Antes não. Exemplo: uma criança é
capaz de pegar uma bola perto dela. Mas se coloca a bola embaixo de uma almofada ela não sabe
tirar a almofada para pegar a bola. Tirar a almofada é um meio e o fim é pegar a bola. Não consegue
hierarquizar as duas condutas.
- Espaço: por volta de 2 a 3 meses a criança sobe reconhecer a mamadeira. Mas se eu der para ela
pelo avesso, com o bico pelo lado contrário, não lhe ocorre virar a mamadeira. Já por volta de 1 ano
ela viraria a mamadeira. Consegue situar a mamadeira no espaço (na frente, por trás)

b) Estágio pré-operatório (2 a 7 anos)

- Com dois anos de idade (observação: é uma média. Não se dá de forma igual em todas as crianças)
há a mudança de estágio. É o estágio da representação. A criança adquire a capacidade de pensar um
objeto através de outro objeto. É capaz de ações interiorizadas. Exemplo: a palavra casa remete a algo
que não é a casa, ou seja, a palavra casa é uma representação do objeto casa. Representação da casa
não é o objeto casa. Outro exemplo: por volta de 1 ano a criança se vê no espelho, mas não se
reconhece nele, vê a imagem de outra criança. Se lhe passar tinta na testa não lhe ocorre passar a mão
para tirar. Já no período pré –operatório faria isto. O que implica pensar esta imagem que é ela e não
é ela ao mesmo tempo. Nesta etapa pode pensar o mundo em imagens. Por volta dos 2 anos entra
plenamente no mundo da representação com capacidade de desenhar, imitar algo do qual ficou a
imagem. Comprrende que papai refere-se a uma pessoa específica. Seu pensamento começa a ser
sustentado por conceitos.
- a criança nesta fase é introduzida na linguagem que permite a comunicação e a socialização da
inteligência e que prepara a criança para entrar por volta dos 4 anos no mundo da moralidade.
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- uma característica desta fase é o EGOCENTRISMO. Não é exatamente no sentido de que a criança
está centrada nela, mas que tem dificuldades em perceber o ponto de vista do outro. É centrada no seu
próprio ponto de vista. Por exemplo, considere o seguinte diálogo:

Adulto: quantos irmãos você tem?


Criança: eu tenho só um irmão
Adulto: E seu irmão, quantos irmãos tem?
Criança: Meu irmão!? Ora, nenhum...

Apesar de saber que possui um irmão, a lógica do seu pensamento não a faz compreender que o seu
irmão também tem um irmão.

- A interiorização desta fase não é REVERSÍVEL (=pensar a ação e a anulação desta mesma ação,
pensar o que se fez e voltar ao ponto de partida) Exemplo: se pergunto para uma criança de 5 anos de
idade qual a distância de são Paulo a Campinas, se ela aprendeu, responderá que é 100 km. Mas se
perguntar qual é a distância de Campinas a São Paulo ela não saberá responder.

c) Período operatório: concreto (7 a 12 anos) e formal (dos 13 anos em diante)


- nas duas sub-etapas em que é dividido este período a inteligência pode se manifestar de forma
interiorizada e com reversibilidade. O pensamento é denominado operatório porque é reversível.
Operação é quando a gente está usando o pensamento de forma a pensar o que vou fazer, realizar o
que pensei, e ver o resultado do que fiz. E se não der certo refazer.
Por exemplo: nesta etapa a criança sabe que 2 + 3 = 5 tem a reversibilidade em 5 – 3= 2. Se de S.
Paulo a Campinas há 100 km, de Campinas a São Paulo há também 100 km.

De forma concreta: apenas em cima de objetos que a criança pode manipular ou vivenciar. De forma
formal (abstrata), a partir dos 13 anos: com puras hipóteses.
Exemplo: uma criança no período operatório concreto é capaz deste raciocínio: Todos os planetas são
redondos. Logo a terra que é um planeta é redonda. Mas se peço para concluir a partir da premissa:
todos os planetas são quadrados, ela não aceitará a conclusão de que “portanto a terra que é um
planeta é quadrada” porque a sua capacidade de interiorização ainda está relacionada ao concreto. Por
isso nesta etapa a aprendizagem da matemática é feita sempre levando em consideração problemas
concretos: alguém que compra tantas bananas no supermercado, etc...

8. Os estágios nas pessoas adultas: as capacidades destes estágios não desaparecem na idade adulta.
Exemplo: quando se vai a um museu há uma plaquinha onde está escrito que não se deve tocar
nas peças. Se há esta proibição é porque temos a tendência (estágio sensoriomotor) de pegar para
compreender. É uma ação própria do bebê.
- Estes estágios não se desenvolvem de forma igual em todas as pessoas. Alguns podem estar mais ou
menos desenvolvidos. Às vezes uma pessoa pode ser boa na abstração e péssima em questões
práticas.

9. PIAGET E A EDUCAÇÃO:
- Piaget não foi um educador. Escreveu sim alguns poucos textos sobre educação, mas a sua
preocupação é a forma como os homens constroem o conhecimento. Mas porque sua teoria foi aplicada
na educação? Porque a pedagogia tem interesse em todas as teorias que versam sobre o educando e esta
não poderia ficar de fora. O ponto essencial desta influência é a crítica ao verbalismo e ao formalismo no
ensino tradicional.
- Construtivismo: Piaget usa esta palavra. Sua psicologia é construtivista e ele se considera um
construtivista. Mas é um construtivismo basicamente epistemológico (tem a ver com a construção do
conhecimento)
- Tendo estes cuidados preliminares pode-se aplicar algumas idéias de Piaget na educação. Para que um
ambiente de ensino seja construtivista é fundamental que o professor compreenda que todo e qualquer
desenvolvimento cognitivo só será efetivo se for baseado em uma interação muito forte entre o sujeito e
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o objeto. É necessário termos um objeto que desafie o sujeito. Se não acontecer isto ele não se acomodará
a situação criando uma futura assimilação do objeto. A primeira das exigências é que o ambiente permita
uma grande interação com o objeto de estudo.
- Como compatibilizar pedagogicamente o fato de que os objetos de conhecimento – idéias, conceitos -
têm sua progressão evolutiva específica e o fato de que eles devem ser ensinados na escola? Piaget
inspira a resposta quando se reconhece formas diferentes da criança de apreensão dos conteúdos: “não
mais como inadequados, como erros, mas como referência essencial à interferência do professor” (In
Psicologia e Educação: revendo contribuições. São Paulo: Educ-Fapesp, 2000, p. 129)
- A questão da interação social como contexto de aprendizagem: Piaget não tematizou esta questão como
objeto de sua pesquisa, mas está presente na sua obra. Sob esta perspectiva a escola deveria propiciar
trabalhos em equipe como oportunidade para ocorrer a troca de pontos de vista entre os alunos por causa
da necessidade: a) da relação com o outro para ocorrer a tomada de consciência do indivíduo de si
próprio; b) do distanciamento da perspectiva própria para o indivíduo alcançar algum grau de
objetividade; c) de o indivíduo pensar segundo a perspectiva do outro para construir e obedecer as regras
de pensamento. Não mais teria, então, o professor o papel tradicional de transmissor do conhecimento.”
(op. Cit. p. 131). Importante é frisar que “as práticas sociais intervêm necessariamente na construção
escolar do conhecimento, não havendo confusão, mas articulação entre os mecanismos cognitivos de
construção dos objetos e suas significações sociais.” (op. Cit. p. 134)
- a pedagogia inspirada em Piaget “deslocará a ênfase da repetição correta pelo aluno do que o professor
faz, para a organização bem-sucedida pelo estudante da sua própria experiência.... O significado de uma
palavra é também uma construção própria de um sujeito... É o aprendiz que faz a aprendizagem; ele,
aprendiz, aprende em seu contexto real; o mais importante na aprendizagem e seguir aprendendo; toda a
aprendizagem é a aprendizagem de alguma coisa.... Contudo, segundo Castorina, a aprendizagem
construtivista, na construção dos conteúdos escolares, deve ter os sistemas gerais de pensamento como
sua condição necessária, mas não suficiente. A aprendizagem traz necessariamente a intervenção do
docente que oferece e organiza condições para o aluno elaborar suas hipóteses. No entanto na construção
dos conteúdos escolares, deve ter os sistemas gerais de pensamento como sua condição necessária” (op.
Cit. p. 133)
- A realidade do docente nas escolas do Brasil: “está presente um discurso teórico mesmo bem articulado
sobre o processo ensino-aprendizagem, mas ao qual não corresponde uma prática diversa daquelas de
marcas tradicionais, salvaguardadas notáveis exceções. Várias razões podem ser enumeradas para
explicar esse estado de coisas. Entretanto, temos privilegiado em nossas reflexões sobre o assunto a
dimensão da cognição do professor como sujeito também ativo que elabora conhecimento em suas
experiências com os objetos. .... É muito difícil para um professor compreender o processo construtivo do
conhecimento de seus alunos em qualquer área, e acompanhar e intervir nesse processo, se ele próprio
não fez essas construções. É provável que ele esteja trazendo, para a sua prática de sala de aula, da sua
própria experiência como aluno não a compreensão dos conteúdos a ensinar, mas um domínio dos
mesmos restrito a aquisições mecanizadas, típicas da escola tradicional.... Merece exame a hipótese de
que é necessário a um professor realizar seu próprio processo de construção do conhecimento que deve
ensinar para poder levar a cabo um ensino para a construção do conhecimento pelos seus alunos.” (op.
Cit. p. 136)
Sugestões de livros

“Nascimento da inteligência na criança”, “A construção do real na criança”, A formação do símbolo na


criança”, “A psicologia da criança”, “Seis estudos de psicologia”, “O juízo moral na criança”
Leitura mais difícil: “Da lógica da criança à lógica do adolescente” (leitura mais difícil)

REFERÊNCIAS

1. Vídeo-palestra sobre Piaget no site http://cafesfilosoficos.wordpress.com/tag/piaget/


2. Placo, Vera Maria Nigro de Souza (org.). Psicologia & Educação: revendo contribuições. São Paulo:
Educ-Fapesp, 2000
3. Oliveira, Zilma e Davis, Cláudia. Psicologia na Educação. São Paulo: Cortez Editora, 1990

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