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Aula 18/09
Introdução
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• O porquê do direito? Pergunta que se dirige ao fundamento do direito e que,
nesse sentido, haverá oportunidade de se compreender o direito associado a um
certo projeto humano cultural, associado à intenção de institucionalizar uma
certa ordem de validade, que tem como referência determinados sentidos, valor,
especificidades. Trata-se de pensar este desafio do direito de ordem como
legalidade enquanto possibilidade, muito ligada à prática e a uma certa cultura,
associada a uma compreensão ocidental do direito. Este é um dos problemas
que deve hoje ocupar a filosofia do direito, não diretamente se tratará de um
problema metodológico. Mas a resposta que se dará a este problema terá
implicação na prática. Se se assumir como tarefa a realização, em concreto, de
uma ordem de validade, haverá uma reposta, pensando-se o direito como uma
ordem funcional, todo o esquema metódico seria diferente (esquema funcional,
atendendo a certos fins, finalidades sociais). Esta pergunta, hoje, não deve fazer-
se em termos puramente teoréticos, especulativos, deve fazer-se, em particular,
a partir da própria experiência da prática. Colocar esta pergunta de porquê do
direito, é, em grande parte, partir da prática, interrogá-la, problematizá-la e, no
limite, poder-se-á chegar a esta pergunta final, do porquê do direito.
• Para quê? O que se questiona, no fundo, a função essencial do direito. Associada
a esta questão do para quê aparece o problema da lei injusta. Analise crítica. A
função que hoje responsabiliza o direito é uma função crítica que, também
poderá ser desenvolvida na dimensão da legitimação, mas, uma função crítica
que pode ser desenvolvida em contraponto com outras respostas possíveis.
• De que modo? (o mais importante) De que modo é que, realmente, o direito é
que se vai experimentar como ordem de validade. É aqui que se encontra o
problema metodológico do direito. A ordem de validade só faz sentido porque
aparece associado a uma conceção do direito como uma ordem de validade.
Fala-se numa continuidade metodológica atendendo-se a um primus casos (não se
estudam estas questões como compartimentos isolados à luz de uma metodologia
tradicional) entende-se que é através do caso que se vai fazer uma experiência de todas
as dimensões do direito, trata-se de uma resposta ao caso que vai mobilizar todas as
dimensões do direito, integrando a norma no contexto em que aparece os fundamentos,
critérios..
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Encontram-se, aqui, duas faces inseparáveis da própria imergência do direito. Duas faces
que aparecem como dois momentos distintos mas que devem ser pensados nessa tal
tensão dialética:
“odos” – tem a ver com a ideia de um percurso, um caminho que ser desenvolve por
etapas. Um percurso que vai ter, seguramente, problemas diferenciados, não é um
percurso linear, é um percurso que terá que ser construído. Este caminho prosseguido
tem um sentido, um objetivo – não é um caminho que se assuma sem um prepósito. A
componente meta.
“meta” – esta componente aparece pensada em respeito das exigência da ordem da
validade. Procura atingir como exigência de sentido a realização de uma ordem de
validade.
“logos” – tem-se aqui uma reflexão sobre o próprio caminho. Logos identifica a própria
racionalidade, trata-se de um pensamento que se vai construir em termos reflexivos
(logos), referente a um caminho (odos) que tem um propósito (meta).
“nomos” – novo componente. Acrescido pelo Dr. Pinto Bronze. Esta componente vai ao
encontro da metodologia ser uma reflexão sobre o método concentrada na realização
jurisdicional do direito. Este significante “nomos” que é acrescentado tem importância.
De facto, tem importância, desde logo porque a intenção é identificar o nosso problema
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como problema de realização jurisdicional do direito que vê no direito uma ordem de
validade. O nomos está ligado a uma ideia de regulativo mas já tem, através de um
tratamento conhecido de Hayek, adquire um significado especial. Hayek distingue duas
visões do direito: Nomos e Thesis – esta distinção – fala-se no direito como nomos
quando se preocupa em mostrar que o sentido do direito está associado a determinados
valores, a um projeto cultural, o direito como jus no seu sentido originário – o direito é
uma intenção de realização. Quando se fala no direito como Thesis vai-se acentuar um
aspeto que é associável à experiência legislativa. O direito é algo que é contruído
programaticamente, algo que se programa para o futuro, é uma certa experiência
legislativa, a ideia de que o direito, sendo uma construção humana, é,
fundamentalmente, um instrumento para prosseguir fins, o direito tem uma dimensão
pragmática e estratégica, algo que é construído pragmaticamente para atingir certos
fins (como a lei), objetivos que têm a ver com certas expetativas sociais. Enquanto que
a perspetiva do direito como nomos tende a ver no direito como projeto autónomo com
a sua especificidade. A visão de Hayek do nomos e da thesis é discutível. A ordem é uma
ordem imanente, não tanto de criação humana, ele próprio associa a uma visão da
liberdade. Seja como for vale esta referência para um certo conflito que pode haver da
compreensão do direito como ordem de validade ou do direito como instrumento que
se consegue em termos estratégico pragmáticos.
Ponte com o direito anglo-saxónico – muitas vezes esta meta definida é associada a um
problema muito tratado – o problema do concept of law - este caminho será diferente
se o nosso conceito de direito for diferente. Podemos até certo ponto admitir que a
exigência de sentido que parece traduzida no meta possa ser pensada como conceito de
direito. Só que é preciso esclarecer que se se fala num conceito de direito que não deve
ser tratado como se fosse um conceito de classe, deve ser tratado como se fosse um
conceito arquétipo (grande debate que marcou o século XX).
Quando se está preocupado em contruir um conceito de direito tem que se partir das
experiências de todas as ordens jurídicas e procurar perceber o que têm em comum que
permitam identificar como ordens de direitos – Dr. Aroso – chegaria por aqui ao conceito
de ordem de direito.
O entendimento do direito como ordem de validade aproxima-se (atendendo a esta
temática) do pensamento arquétipo. As exigências práticas têm que estar presentes.
Preocupação institucional em as prosseguir. Critério de demarcação que permite
distinguir uma ordem de direito ou não de direito, não é, portanto uma característica de
tudo ou nada como defende outro autor, é um conjunto de exigências, aspirações, que
têm que ser tidas em conta.
O acrescento da componente nomos, o Dr. Pinto Bronze quer acrescentar que pensa o
direito a partir da realidade concreta, como ordem de validade.
Não se trata de recusar que o direito possa ser Thesis, mas trata-se de acentuar que
mesmo entendido como Thesis terá que respeitar certos limites.
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Ver-se-á o papel que tem no esquema metodológico o juiz e os princípios. Esta visão
só será possível entendendo-se o direito como ordem de validade, que realizar direito
é procurar construir um contexto preocupado com a realização desses princípios e
valores. Isto permite separar conceções metodológicas.
Qual é a relação que deve existir entre o logos e as outras componentes? A realação
que deve existir entre o logos e o método?
Trata-se de se entender a relação que o logos irá estabelecer com o método. São
possíveis aqui 3 grandes tipos de relações. Estas 3 maneiras correspondem a perspetivas
diferentes do direito e a momentos historicamente diferenciados da cultura jurídica. É
preciso ver que esta preocupação com o método jurídico, só aparece de forma clara no
século XIX, trazida pela modernidade.
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silogisticamente, só assim estará a respeitar a racionalidade universal da lei
que é expressão da vontade geral.
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que já existe) é uma atitude Crítico Reflexiva – refletir sobre uma prática, não
pode ser fora dessa prática, mas refletir criticamente.
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uma ciência de normas que nos permite distinguir vários momentos. Este é o exemplo
mais acabado de uma atitude de exterioridade construtiva – pensar previamente.
Viu-se, também que a atitude revela-se no contexto do pensamento jurídico europeu –
uma atitude de imanência constitutiva – preocupação introduzida com a modernidade
– preocupação em estabelecer um discurso prévio é uma preocupação que só aparece
com a modernidade. Todo o desenvolvimento da prática jurídica que está para trás
conduz-nos a uma prática que se vai desenvolvendo e que vai forjando os seus
procedimentos, métodos que vão evoluindo – o método é algo que podemos descrever
à posteriori – observando essa prática vai ver-se como é que essa prática se desenvolve
– e, neste sentido é uma atitude que descreve uma prática que acontece assim e se vai
auto explicitando nos seus esquemas racionais. Reflexão sobre o método.
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A nossa reflexão metodológica sobre o direito, hoje, não deverá seguir nenhum
destes caminhos. Isto não quer dizer que, no contexto do pensamento contemporâneo
não se encontrem propostas que reinventam estas atitudes – uma atitude prescritiva
exterior ou uma atitude mais interna, descritiva das práticas. Stendley Fish – entende
que, hoje mesmo, estamos de certo modo condenados à força das diversas práticas na
sua identidades profissional – formativa – isto significa, um pouco contra a corrente,
reconhecer que falar de interdisciplinaridade não passa de retórica porque o que temos
verdadeiramente é práticas que constroem a sua identidade. Quando nós pensamos
sobre essas práticas acabamos por influencia-las com outras ideias, atitudes – e,
portanto, é um exercício improdutivo. Ou seja, este autor entende que não é necessário
desenvolver uma atitude interpretativa sobre estas práticas que já se encontram
enraizadas na comunidades de juristas. Porque é que não podemos aceitar isto?
Precisamente porque a situação que hoje vivemos é uma situação muito complexa e
muito plural. Nós mesmo que quiséssemos admitir que as práticas estão condicionadas
por códigos que traduzem a experiência de uma certa comunidade interpretativa, nós
teríamos seguramente dificuldade no momento do pensamento jurídico, em identificar
de uma forma unívoca quem é essa comunidade interpretativa. Porque, naquele
momento, aparecem diferentes imagens, perspetivas do que é ou do que deve ser essa
realização em concreto do direito. Trata-se de construções que se refletem e projetam
decisivamente nessa prática, influenciando as decisões, estabelecendo diferentes
modos de abordagem dos problemas. Remetermo-nos para a força das prática será,
hoje, remetermo-nos para uma tonalidade muito complexa que acabará por agravar o
problema em vez de o resolver.
o Na linha de pensamento de CN – reconstrução que terá que envolver,
inevitavelmente, uma dimensão crítico-reflexiva que vai permitir,
claramente, pensar sem lhe conferir uma identidade prescritiva, não
apenas refletir sobre o modo como os juízes pensam, o que fazem, trata-
se de perguntar o que é que eles devem fazer. Abordar questões como a
validade, do porquê, do para quê do direito. Tudo isto associado ao
problema de que modo os juízes devem decidir para poderem, em
concreto, realizar este projeto de direito como ordem de validade. O que
se tem aqui é uma tentativa, no plano discursivo, fazer uma reconstrução
que vá tematizando as suas próprias opções. Se se vive uma situação de
crise, a crítica aparece como uma tentativa de refletir sobre essa crise
mostrando opções que se vão tomando e abrindo caminhos possíveis.
Este é o aspeto mais relevante – a reflexão metodológica que hoje se
espera dos juristas – uma atitude crítico-reflexiva neste sentido.
o Quando se desenvolve uma atitude deste tipo podemos entender que ela
traga consigo um importante complemento. Nós não podemos,
efetivamente, assumir um discurso metodológico isolando-o da
realidade. A construção do método jurídico do século XIX foi uma
tentativa de assumir teoreticamente – imposição prática de um
esquema metódico que dificilmente fazia sentido quando se
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considerava uma prática de resolução de controvérsias – associado à
ciência, epistemologia. Não se pode pensar num método isolado da
realidade mas, ao mesmo tempo, não devemos ter uma construção de
um método que se reconduza a uma mera descrição – não se trata de
descrever sociologicamente o processo de construção das decisões a
partir de uma determinação factual – há aqui uma componente relativa
que deve ser assumida. A reflexão metodológica não cumpriria a sua
função se se limitasse a ser uma mera sociologia da realidade – o modo
como os juízes atuam. Não se esgota neste diagnóstico da realidade. A
sua preocupação condutora é marcada pela preocupação com o modo
como os juízes devem atuar para realizar o direito que tem um
determinado sentido.
o É importante ver que, neste diagnóstico da realidade (reflexão
metodológica adequada, real) – vemos que um dos traços característicos
dessa realidade quando a pensamos, referida à prática dos juízes, uma
das notas caracterizadoras é a pluralidade de conceções, de
entendimentos, que se projetam em diversas imagens do papel do juiz.
( NOTA: se quiséssemos fazer uma tentativa de compreender esta pluralidade –
conceções do que deve ser o modus operandi do juiz – podemos admitir várias
possibilidades de distinção (que passam pela possibilidade de uma espécie de distinção
de base que nos traz consigo uma grelha de leitura do pensamento jurídico
contemporâneo – mas na sua base de identidade, podemos dizer que no nosso contexto
contemporâneo, as diferentes perspetivas se agrupam em 3 grandes linhas, o que nos
leva a poder reconstituir 3 grandes conceções de direito, que são, em si mesmas, muito
complexas porque têm vários caminhos internos que as fragmentam, mas 3 perspetivas
de compreensão básicas que hoje se oferecem ao pensamento jurídico e são cultivadas
por esse pensamento jurídico (3 grandes paradigmas do entendimento do que deve ser
o pensamento do juiz). Trata-se de uma distinção que nos permite fazer o contraponto
entre:
• Conceções normativistas
• Conceções funcionalistas
• Conceções jurisprudencialistas
É a perspetiva jurisprudencialistas que é assumida por CN. A perspetiva normativista é
herdeira dos pensamentos da modernidade, do jus racionalismo, do jus racionalismo
iluminista, do positivismo – esta perspetiva oferece-se hoje como uma perspetiva
possível.
As outras duas perspetivas são, ao contrário da primeira, perspetivas que só se tornam
possíveis na segunda metade do século XX.
Hoje temos, como possibilidade de base, que a compreensão do direito e do modus
operandi do juiz pode seguir um caminho normativista, funcionalista ou
jurisprudencialista.
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Poderíamos dizer que a estas 3 perspetivas correspondem modelos diferentes de
compreensão do papel do juiz que se traduzem em esquemas metódicos, também eles,
distintos – pode falar-se em paradigmas de compreensão do modus operandi do juiz.
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objetivos, meios para atingir os objetivos e aquilo que o juiz deve fazer é, em
concreto e, com alguma flexibilidade, desempenhar uma tarefa de maximização
das possibilidades da estratégias -atingir aqueles fins com os menores custos
possíveis (custos/benefícios). O julgador vai optar pela alternativa de decisão
que permita realizar a estratégia do legislador com maior eficiência. O esquema
metódico da decisão do juiz é um paradigma da decisão. Teremos aqui associada
à racionalidade instrumental, estratégica, uma compreensão muito diferente do
julgador.
Para termos um esquema conveniente, reconhecendo que este esquema possa nem
sempre resultar, é um esquema de base, forte, que nos permite entender que, hoje, as
grandes conceções do direito e do modus operandi do juiz se dividem em 3 grandes
caminhos possíveis. )
Retomando:
A compreensão hoje da pluralidade dos pensamentos jurídicos exige outras distinções
para além da distinção de base acima mencionada entre as 3 perspetivas. Refira-se uma
distinção que se tornou relativamente comum no universo do pensamento jurídico
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contemporâneo e que permite fazer ajustamentos diferentes das propostas de
compreensão do modus operandi do juiz. No universo jurídico contemporâneo há duas
tendências quando se trata de pensar o problema da realização jurisdicional do direito.
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• Tendência juridista ou juridicista – que insiste na possibilidade de dar uma
reposta às controvérsias práticas que se possa sempre dizer construída pela
mediação do direito, dos materiais jurídicos. Se mobilizarmos adequadamente
esses materiais conseguimos chegar a uma reposta para cada caso e a uma
reposta que é a reposta jurídica para aquele caso. Esta tendência em confronto
com a outra aposta na possibilidade de autonomia do direito. Entender que
todos os casos, mesmo os mais complexos, permitem que, se houver uma
mobilização adequada dos materiais, contruir uma reposta jurídica . A
abordagem de CN é uma abordagem juridicista por se entender que a
mobilização adequada da dialética do problema-sistema vai permitir chegar a
uma reposta jurídica para o caso que se está a considerar. O modo como se vai
desenvolver esta dialética problema-sistema vai permitir que, no final, a
resposta que assimila a controvérsia como juridicamente relevante, será uma
reposta que mobiliza o sistema jurídico, um sistema aberto. Leva-se a sério a
pluridimensionalidade do sistema. Esta perspetiva procura dizer que vai ser
possível, ainda que possa ser complexo, dar uma resposta jurídica para os
problemas concretos. Vai ser possível porque essa resposta é construída através
desta dialética problema-sistema.
Por outro lado é preciso ver que há aqui algumas afinidades um pouco perturbadoras.
A perspetiva normativista do século XIX também são, a seu modo, perspetivas
juridicistas.
• Tem que se abrir um certo confronto com outras posições que, pelo contrário,
defendem que é desejável, hoje, quando se reflete metodologicamente sobre o
direito, alargar o campo temático e considerar, também, o modus operandi dos
legisladores (o legislador do parlamento, o membro do governo e, até mais
longe, a dogmática) – a metodologia da realização do direito não deve ser apenas
confinada à realização jurisdicional juiz. Porém aqui não se vai tratar dessa
metodologia jurídica totalizante. O que importa é a metodologia jurídica do
juiz.
• Contudo, é interessante pensar sobre isso porque, de facto, um dos temas que
preocupa os juristas no nosso universo contemporâneo, é o tema que se pode
identificar a partir de uma pergunta. Quando se pensa na realização do direito
ou mesmo na constituição do direito (law making), na realização que está
associada, até que ponto é que a experiência legislativa e a experiência
jurisdicional são diferentes? Note-se que as propostas partem da ideia de que há
uma continuidade discursiva entre a experiência legislativa e a experiência
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jurisdicional – há uma certa comensurabilidade entre estes dois modos de
constituição do direito que nos permitem aproximá-los e vê-los em contínuo. É
curioso notar que o universo jurídico contemporâneo, também aqui, mostra a
sua fertilidade em distinções. De facto, tem-se, neste contexto, perspetivas que
defendem claramente uma certa tese de continuidade e outras que assentam no
reforço da descontinuidade.
o Tese de continuidade discursiva – o papel do julgador era pensar como
papel de mero aplicador usando as regras da lógica formal construindo
os tais silogismos. O que está associado ao positivismo do século XIX é
uma ideia de complementaridade, desde logo, institucional, entre o
poder legislativo e o poder jurisdicional, a independência deste último
está, em poder pronunciar, em concreto, as palavras da lei. Há aqui uma
ideia de complementaridade e de continuidade que quase que anula a
pergunta. O papel do julgador é o papel de aplicador da lei. O direito está
objetivado nessa legalidade. Há diferenças que atenuam esta
continuidade absoluta. De facto, mesmo no século XIX esta
continuidade não era assumida de tal forma (não se defendia um
positivismo estrito (costume)) e de facto mesmo no universo anglo-
saxónico – o direito criado pelos juízes era pensado como se na verdade
o seu processo de crescimento se desse através da possibilidade de
extrair dos precedentes normas gerais e abstratas que depois se
aplicariam. Se entendêssemos que a tarefa do juiz era de mera aplicação
poderiamos dizer que há aqui uma continuidade, não fazendo sentido
distinguir a construção legislativa da jurisdicional, o que interessa é tratar
estes processos unitariamente na perspetiva do direito.
Mas há outra possibilidade de entendermos essa possibilidade
discursiva – na abordagem normativista – método jurídico integral. É
uma perspetiva fundamentalmente baseada em pressupostos
funcionalístico-pragmáticos e, muito especialmente, naquela repartição
de funções (para a perspetiva funcionalista o legislador é visto como
estratega e o juiz como prático) – a continuidade discursiva está no
núcleo de decisão. O legislador quando decide construi um certo
programa para atingir um certo objetivo e escolhe o meios adequada
para o atingir, o legislador faz opções, opções que podem ser
diretamente determinadas por orientações políticas ou influenciadas
pelas ciências sociais - mas ele faz opções (em vez de escolher este fim
escolhe aquele, opta por estes meios). Há aqui um processo de tomada
de decisão que pode ser metodicamente explorado. A teoria da legislação
(contemporânea) trata quais são as possibilidade de escolha, como são
racionalizadas tendo, sempre, em atenção que há aqui alguma
possibilidade de discussão entre perspetivas ideologicamente políticas e
outas que atendem a ciências sociais, científicas. Isto significa que, no
fundo, temos uma tomada de decisão que é uma escolha, uma opção por
determinado fins e meios que significa rejeitar outros. Aqui opta-se para
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várias alternativas para o futuro que serão influenciadas por estas
decisões políticas – o legislador pretende produzir uma determinada
consequência na realidade social. Esta perspetiva tecnológica, de
engenharia social do funcionalismo curiosamente alarga este
entendimento ao próprio papel do juiz. Podemos desde logo dizer que
este papel se alarga ainda ao administrador – processo de construção da
decisão semelhante ao do legislador mas mais limitado – teremos não
um estratega mas um tático condicionado pelas escolha que o estratega
previamente consolidou. Esta continuidade poderia pensar-se, também,
no interior do poder legislativo – o legislador constitucional poderá fazer
de escolhas mais livres e o legislador ordinário estará então condicionado
por essas escolhas. Ora procura, esta perspetiva orientada pela
engenharia social tentará ampliar isto ao juiz – que terá uma tarefa
semelhante ao administrador. Há quem diga que esta perspetiva num
quadro democrático não respeita o princípio da separação de poderes –
o juiz não deixa de ser um longa manus do legislador – terá apenas a
flexibilidade da maximização, terá que respeitar as escolhas do
legislador, terá é que torna-las mais eficientes em concreto.
Tanto na primeira possibilidade como nesta se demonstra uma
continuidade entre o papel desempenhado pelo legislador e pelo juiz.
Aceitamos uma tese que assenta claramente numa descontinuidade.
Não seria possível, nem pensável uma reflexão metodológica unitária. Os problemas da
construção legislativa e da decisão judicial são problemas distintos.
Conclusão do raciocínio a prepósito da continuidade e descontinuidade do poder
legislativo e jurisdicional na realização do direito. Quando se fala numa certa
descontinuidade, que será o ponto de partida para a abordagem que se vai desenvolver,
pode pensar-se no Dr. Pinto Bronze e na sua expressão “nomos” – o tratamento da
expressão nomos pensada numa certa relação com a realização do direito em concreto
se deve ao autor Hayek que mobiliza uma distinção muito clara entre a dimensão do
direito como nomos e a dimensão do direito como thesis. Este contraponto, realmente,
tem a ver, para Hayek, numa linha de pensamento que associa ao direito como jus,
quando se fala no direito como nomos fala-se em modos de tomada de decisão que são
imanentes às práticas e têm como que uma continuidade quase natural – foram
desenvolvidos na imanência dessas práticas e não são criações que podemos imputar a
uma decisão. Há neste entendimento de Hayek que o direito como nomos incorporaria
um entendimento da prática social através do modelo jusnaturalista e não tem que ser
assim. Este direito é um direito, segundo este entendimento, que se vai desenvolver
através da prática judicial sem uma interrupção que pode acontecer na prática
legislativa. Ele encontra inspiração para pensar este direito como nomos na prática
jurisdicional inglesa dos séculos XVI e XVII – exemplos que ele dá para dizer que há ali
uma ordem especificada que se vai desenvolvendo sem introduzir verdadeiras roturas.
Quando se fala no direito como thesis fala-se no direito como uma criação legislativa
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político-estratégica em que há escolhas, em que se fazem opções específicas e em que
se introduzem roturas – uma legislação pode substituir drasticamente uma legislação
anterior. Um processo claramente distinto daquele que constituía o direito como
nomos. Note-se que esta distinção enquanto tal não é a mais adequada para nós hoje
podermos pensar a descontinuidade. Hayek pensa esta distinção a partir do contexto da
modernidade europeia e esta ordem espontânea teria uma exigência de liberdade
inscrita nas possibilidades da ordem de mercado ao ponto de dizer que este horizonte
acaba por se esgotar numa referência ao mercado como modelo de autonomia que é
redutor das grandes possibilidade do direito como jus afirmado ao longo dos séculos.
Esta distinção acaba por ser pensada a partir do contexto da modernidade e isto torna
as suas possibilidades menos interessantes.
De facto, a distinção que verdadeiramente releva hoje é a de associar ao direito como
jus, ao direito pensado como projeto prático cultural, a tarefa de uma institucionalização
de uma ordem de validade que seria a comunidade de sujeito pessoas, sujeitos que se
reconhecem reciprocamente como pessoas num contexto de assimilação de dignidade
específica. De facto este entendimento do direito como grande projeto prático-cultural
com grandes exigências de sentido e que está comprometido com a institucionalização
de uma ordem de validade. Aqui fala-se de continuidade. Os diferentes ciclos foram
assumindo esta continuidade mas também transformando o seu sentido. Arquétipo de
compreensão – polo de compreensão do direito como jus, nomos.
Depois ter-se-ia outro entendimento do direito que, no nosso contexto contemporâneo
se tornou relevante, que é aquele que nos permite ver nos programas legislativos
componentes decisivos de prossecução de políticas públicas, satisfazer interesses,
sustentando num plano programático um equilíbrio entre interesses e espectativas –
encontra-se uma representação do direito que o associa inequivocamente a opções,
decisões que são autoritárias. Há aqui uma dinâmica de construção que muitas vezes
corresponde a uma rutura. Esta referência à thesis traz-nos um mundo diferente do
primeiro. O que se poderá dizer é que, estas estratégias encontrarão no direito como
nomus e jus um limite – encontram como limite a ordem de validade que está associada
aos princípios, ao património dos direitos humanos, ao princípio da dignidade. Haveria
aqui uma certa tensão entre o direito como nomos e o direito como thesis, sendo certo
que o direito como nomos terá sempre que desempenhar em relação ao direito como
thesis um certo limite. A explicitação dos princípios pela doutrina e jurisprudência
teriam aqui um papel decisivo.
A questão que se coloca se quisermos aceitar esta distinção entre outras possíveis é uma
questão que se coloca, hoje, de uma forma indiscutível e que não se colocaria ano
contexto do iluminismo, do século XIX – quando se pensava a lei esta estaria a realizar
de uma forma direta e imediata certos valores – esta lei na sua pureza jurídica estaria
sustentada na exclusividade de um programa sedimentado – na sua universalidade e
estrutura responderia a problemas jurídicos mas não estaria ao serviço de intervenções
político-sociais, não teria um índole estratégica, a universalidade racional permitiria
superar a contingência das decisões que a contruíam como prescrição autoritária. Essa
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prescrição legislativa vai, hoje, ser assumida nesta identidade político-social. Admite-se
muitos modos de prescrição legislativa. Quando isto acontece tal é acompanhado pelo
reconhecimento de que associado à construção pelo legislador está uma componente
político-ideológica, político-estratégica que está presente nessa construção do direito
através da legislação. Toda a construção é pensada numa índole político-social. Sem
deixar de se defender que estas opções legislativas têm limites – CN (estas opções
encontram sempre como limite a comunidade dos princípios) o entendimento de que a
própria lei deve ser entendida como uma perspetiva de ratio legis e ratio iuris –
introduzir limites a essas opções estratégicas – mas tal não nos impede de ver que o
processo construtivo da legislação seja distinto do poder jurisdicional. Hoje não se pode
esconder o caráter ideológico-político das leis. Estamos muito longe da conceção
iluminista da lei (universalidade racional através da vontade geral). O reconhecimento
deste caráter da lei convoca, ele próprio, um limite, um contrapeso que,
inevitavelmente aparece sob a forma de um poder chamado a garantir os valores da
ordem jurídica – é aqui que aparece o papel que deve ser atribuído à função jurisdicional
(CN) – caráter contrário no sentido de dizer que, no fundo, o papel decisivo da função
jurisdicional será o de se responsabilizar por esse dizer autónomo do direito, em
concreto. Percebe-se que, se a construção jurisdicional do direito em concreto não pode
deixar de convocar a lei, a realização que vai ser desenvolvida, não é uma realização que
mobiliza exclusivamente essa lei, mobiliza um sistema jurídico complexo. E, portanto,
tratam-se de funções concorrentes com duas dimensões intencional e institucional
opostas entre um poder constituinte e um poder que postula a validade do direito e é
convocado para a sua realização.
A reflexão metodológica que nos vai ocupar vai procurar levar a sério este papel da
jurisdição – jurisdição que não pode deixar de mobilizar um direito de criação legislativa
mas, ao mobilizá-lo mobiliza-o inserindo-o num sistema jurídico que tem outras
dimensões. chega-se a uma conclusão que permite inserir essas opções estratégicas
num contexto dessas intenções globais inseridas no sistema jurídico.
Por vezes esta descontinuidade pode ser, num ponto ou noutro, atenuada por algumas
projeções de continuidade. Há algumas pequenas continuidades que poderiam ser aqui
pensadas. Ver-se-á que algumas dessas continuidades se encontraram no esquema
metódico.
(Fim da etapa introdutória)
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distintas (perspetivas normativistas, juridicistas e funcionalistas), pelo que a resposta a
esta questão, é que a reflexão metodológica que vamos assumir no nosso percurso
será uma reflexão concentrada no problema do juiz jurisdicional, no discurso
jurisdicional, que dá resposta aos problemas (resposta essa que pode ser tida como pura
decisão – paradigma de decisão, um esquema metódico que vê na sentença uma
decisão, no sentido de uma escolha entre alternativas possíveis dentro de um quadro
possibilitado pelos materiais jurídicos). Com isto esclarecemos que o nosso campo
temático será de levar a sério a ideia de que a sentença será um juízo de julgamento,
e não uma decisão, e esta referencia ao juízo de julgamento, em grande parte, permite-
nos apontar num certo tipo de discurso, de racionalidade que se espera desse modus
operandis, que não será uma escolha entre alternativas, como acontece com os
modelos de área aberta, será sim uma especificação concretizadora e constitutiva de
uma certa ordem de validade, que se assume na sua referencia comunitária, através
das práticas de estabilização que nos permitem falar em sistema jurídico. Assim, este
juízo de julgamento traduzirá a possibilidade de, em concreto, podermos dizer que a
realização do direito que assimila a controvérsia é uma realização conseguida num
sistema jurídico na pluralidade das suas dimensões e exigências, o que nos leva a
associar o discurso jurídico à dialética sistema-problema.
Assim, estamos em condições de avançar, considerando este nosso primeiro
tema que é preparatório porque se vai tratar de lhes expor em termos sistemáticos os
tipos de racionalidade disponíveis no modo como esses tipos se têm cruzado com o
universo do direito, sempre preocupados com a questão de saber se é possível ou não
falar-se de uma racionalidade especificamente jurídica ou será que o discurso jurídico
se limita a assimilar modelos de racionalidade gerais que podemos identificar noutros
contextos.
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O que acontece na SUPERAÇÃO DESTE MODELO a partir das primeiras décadas
séc.XX, foi uma explosão de diferentes tipos de racionalidade e o reconhecimento
preciso de que não temos um único tipo, temos vários tipos disponíveis. Esta atenção
à pluralidade das razões, até certo ponto, implicava uma recuperação, com exigências
e equilíbrios diferentes, mas uma recuperação de tipos de racionalidade e discurso que
tinham perdido sua importância e alguns dos quais tinham mesmo desaparecido sob
o império da razão científica. Inclusivamente, esta explosão de outros tipos, trouxe
consigo a possibilidade de, no plano epistemológico, se desenvolverem epistemologias
críticas, tendo presente que a própria ciência não deixa de ser prática historicamente-
situada que vai progredindo ao mesmo tempo que mobiliza esquemas e opções
metódicas distintas.
Neste contexto, perguntamos – se estamos a pensar da realização do direito, na
resposta que o julgador deve construir para responder às controvérsias, se estamos a
pensar no modus operandi deste, estamos em condições de perguntar que LOGOS é
esse que deverá sustentar essa resposta? É importante refletir diretamente sobre o tipo
de racionalidade aqui envolvido. Ora, a 2ª metade do séc.XX trouxe consigo
oportunidades de recuperação, assistimos a uma recuperação de perspetivas do
pensamento prático, que se tornaram presentes em movimentos conhecidos no
universo do direito como a tópica, a nova hermenêutica, a nova retórica, etc, que nos
remetem para um tipo de RACIONALIDADE PRÁTICO OU PRUDENCIAL, que tivera o seu
lugar no contexto PRÉ-MODERNO. Na verdade, neste contexto, a própria formação
jurídica desenvolvia-se dando atenção a estes movimentos.
Portanto, é importante a este propósito voltarmos à sistematização que
ARISTÓTELES propõe no seu livro 6º, que se preocupa com virtudes intelectuais, e estas
correspondem na sua construção a tipos de discurso, de racionalidade, cada uma das
virtudes vai assumir uma determinada posição perante as coisas. E é com base nesta
referência, nesta sistematização, que podemos reconstituir todo o pensamento jurídico
europeu, sobre a perspetiva desta pluralidade de razões.
E, desde logo, é importante acentuar que a distinção entre as virtudes
intelectuais. Desde logo há algumas virtudes intelectuais que Aristóteles evidencia –
sophia, episteme e o nolos (?) – que têm em comum porem o sujeito perante coisas,
qualidades ou especificações que NÃO mudam, são necessárias, e ao serem
necessárias também nos aparecem marcadas por uma certa indisponibilidade. Por outro
lado, temos duas outras virtudes intelectuais – poiesis e afronesis, virtudes que
correspondem à virtude de decidir, julgar, em concreto, trata-se de poder considerar
um problema concreto e encontrar resposta adequada a este – que têm, em confronto
com as outras, a ver com coisas que são mutáveis, marcadas pela contingência. E isto
é relevante porque quando na visão aristotélica se dá certa autonomização da prática,
da praxis, podemos dizer que esta autonomização se refere a estas duas últimas
virtudes, permitindo distinguir discursos teoréticos e discursos práticos:
a) Discursos teoréticos – aqui falamos de objeto que não muda, que pode ser
contemplado. Constrói uma perspetiva sujeito dirigido ao objeto, em que o
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sujeito conhece o objeto. A intenção desta racionalidade é dirigir-se ao objeto e
determiná-lo, é o conhecimento.
b) Discurso prático – associado às virtudes de poieses e afronesis, considerando
uma perspetiva sujeito-sujeito, conexões entre argumentos que se produzem e
cruzam, construindo eles próprios uma teia de argumentação e contra-
argumentaçao, um processo dialético, e este discursão ja não é marcado pela
referência a um objeto exterior através de uma estrutura cognitiva, mas sim um
pensamento argumentativo, dialético, com forte componente retórica, com
uma estrutura sujeito-sujeito.
E o que aconteceu foi que num determinado momento histórico marcado pela
viragem moderna, verificou-se a hipertrofia da virtude da episteme, um
desaparecimento das outras. Partindo deste horizonte que nos dá alguns sinais, estamos
em condições de tentar fazer uma reconstituição dos tipos de racionalidade e, ao
mesmo tempo, procurar mostrar como eles podem ser projetados no universo do
direito.
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se que o sistema jurídico corresponderia a uma ideia forte de direito natural
racional, devendo ser inteiramente deduzido daquele axioma, pelo que as suas
normas, princípios, etc, seriam puras desimplicações do próprio axioma,
desimplicação necessária. Tinhamos um modelo de unidade de consistência
lógica, pensada a partir de um axioma, o que exigia que este axioma fosse
mobilizado.
Ora, este esquema pode ser hoje reconstituído numa perspetiva sujeito-objeto,
em que o objeto identifica a realidade exterior que o enuncia vai ter de
reproduzir. Esta perspetiva vai construir um enunciado e este será
correspondente ao objeto exterior.
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só será válido se se reproduzir a realidade), com pura intenção de conhecer
esse objeto, de o conhecer, de descrever e explicar o objeto. Temos aqui de
confrontar o enunciado com o objeto.
Não deixa de, à primeira vista, poder suscitar surpresa que este discurso apareça
a cruzar-se com o discurso jurídico pois, na verdade, quando pensamos neste
discurso, pensamos numa função explicativa atribuída à linguagem e, portanto,
podemos ter dificuldade em entender como é que um discurso teórico pode ser
assimilado pelo direito. Quanto muito poderíamos admitir que há um problema
que tem índole teorética, o problema da prova, pois é um problema de
determinação do facto da realidade, ou pelo menos da verdade de certos
enunciados.
23
Também é difícil falar deste esquema fora do contexto histórico, pois este
discurso é um discurso de procura de relações causa-efeito entre fenómenos,
usando método dedutivo e indutivo (indutivo pois quando se observam os
fenómenos, depois de algumas observações repetidas, em condições
experimentais semelhantes, há capacidade para atingir uma lei cientifica
submetida a testes de comprovação, admitindo-se que depois de várias
experiências, seria possível tratar aquela hipótese como lei e considera-la
comprovada pela experiencia).
24
• Racionalidade finalística. Consequentemente fala-se ainda de um outro discurso
já com intenção de prosseguir fins, já não assente na perspetiva sujeito-objeto,
mas sim assente num esquema instrumental, ou seja, tenho x objetivo e
seleciono os meios funcionalmente adequados a prosseguir esse objetivo; ou
recorre-se a várias alternativas com efeitos diferentes, fazendo gestão eficiente
das alternativas. Este discurso finalístico faz ponte com discurso prático pela
possibilidade de se falar de uma engenharia social.
Assim, fala-se desta racionalidade finalística associada à técnica, à logica
instrumental, ligada à racionalidade estratégica. Esta racionalidade associada
ao discurso tecnológico, não é nem racionalidade teorética nem prática, mas sim
racionalidade de 3º género.
09-10-2018
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a) No fundo vamos num 1º degrau assumir UMA RELAÇÃO INSTRUMENTAL,
queremos produzir certos efeitos pelo que antecipamos intelectualmente esses
efeitos, resultados, e quando falamos de fins falamos de efeitos previsíveis, que
queremos que aconteçam. Ora, para produzir este efeito teremos que
selecionar meios, recursos, funcionalmente adequados a esses fins, e para
sabermos qual os meios funcionalmente adequados temos de ter informações
de um discurso científico.
b) E num 2º degrau, mais complexo, exige-se que olhemos para todos os meios e
recursos eficazes, e dentro destas escolhamos aquele que é o mais eficiente,
capazes de atingir os fins com menores custos, aqui já não é questão de eficácia.
Há aqui um cálculo custo-benefício em equilíbrio que permitirá que uma escolha
se revele eficiente. E este cálculo pressupõe uma informação da própria
realidade, não pensamos apenas em abstrato como é que os fenómenos se
relacionam, estou a investigar uma situação concreta em toda a sua
complexidade.
Este discurso pode parecer afastado das preocupações do direito, mas tem sido
transposto para o campo do direito, desde logo para o campo das opções
legislativas.
26
Mas, a praxis não é uma tecnia nem é redutível a esta. Esta expressão praxis,
no seu sentido mais forte, voltando ao quadro de aspiração aristotélica, podemos
dizer que esta praxis está ligada à virtude intelectual da fronesis, da prudência, que se
traduz na capacidade de decidir e agir em concreto num contexto humano, com as
suas contingências, com a sua mutabilidade. E essa ação ou decisão pode encontrar o
seu princípio último em princípios, mas em si mesmo implica escolhas que se vao
fazendo, juízos que se vao formulando que têm de ser plenamente assumidos.
27
práticas foram desvalorizadas, quanto não completamente rejeitadas. O que o discurso
moderno pretendeu foi uma tentativa de racionalizar teoreticamente a prática, o
julgador deveria responder às controvérsias construindo juízos lógico-dedutivos,
partindo de premissas necessárias, o método da dedução passaria a ser o método da
realização do direito. A prática estaria cientifico-teoreticamente dominada, a prática
deixa de ser prática pois deixa de poder ser reconstituída através de uma estrutura
sujeito-sujeito.
Mas quando se fala neste regresso da filosofia prática, como recuperação, é bom
não esquecer que estamos na segunda metade do séc.XX e este foi muito marcado por
uma acentuação da condição de sujeitos históricos, e essa acentuação da historicidade
torna muito difícil nesta época que possam ter êxito posições que se apõem numa
tentativa de reabilitação do direito natural no contexto moderno, com perspetivas que
defendem que é possível identificar uma ordem de valores que consideraremos como
universal, imutável. Pensamos nos valores como construções humanas condicionadas
por uma dinâmica de historicidade e, portanto, não podemos atribuir-lhes uma
característica de imutabilidade ou historicidade.
Contudo, a recuperação da virtude fronesis, não torna possível acompanhar a
recuperação do pensamento prático com apoio que tinha n ocontexto pré-moderno.
Esse pensamento pratico assentava na conceção de que, em ultimo termo, havia ma
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ordem de validade que era imutável e necessária. Todo este discurso da prática estava
apoiado assim numa metafisica, na referência a uma ordem natural indisponível, o que
dava sustento especial a esse aspeto prático.
Assim na segunda metade do séc.XX o desafio é a recuperação, do pensamento
prático sem rede, levando a sério o que foi uma das aquisições da mordernidade, UMA
PERSPETIVA DE SUBJETIVIDADE INTENCIONAL, isto é, o conhecimento que os próprios
valores são construçoes humanas e não uma ordem necessária, construída pelo homem.
Os princípios, de facto, são construções humanas que orientam o comportamento
humano, mas sujeitos a historicidade. Acentua-se o caráter de historicidade constitutiva
de todos os nossos valores. O principio orienta o comportamento humano, a nossa
prática, mas também é inferido da própria prática, daí haver uma certa circularidade.
Assim, quando pensamos em prática através da referencia a uma estrutura sujeito-
sujeito estamos sempre a pensar numa circularidade, que deve ser entendida com certo
equilíbrio (se estou a ser orientado por um principio, mas à medida que vou agindo e
decidindo vou introduzindo transformações no modo como entendo esse principio, pelo
que se considerarmos estas açoes e decisões as exigências dos princípios vao-se
transformando sob impulso dos problemas, devido ao contexto histórico-social).
29
fundamento, mas todo esse fundamento é construído com base/na perspetiva
do problema concreto.
Uma perspetiva como esta, tenderá a ser uma perspetiva em que a instância
decisiva de controlo racional é a própria discussão em termos argumentativos,
na perspetiva de cada caso, os argumentos se contra-argumentos tecidos a
partir de cada caso é que serão decisivos para as soluções. As soluções são
obtidas a partir de argumentos e contraargumentos, criando-se zonas de
consenso através da persuasão com esses argumentos. E quando dizemos isto,
facilmente se compreende que o que é decisivo na racionalidade de tipo
tópico-retórico, é a própria argumentação, que tem de estar submetida a série
de regras, sobretudo regras de procedimento, dando oportunidade a todos de
intervir, e impedir que se manipulem as pessoas , por exemplo – assim, é uma
racionalidade procedimental, com um conjunto de regras que se definem para a
tomada de decisão, para que obedeça a um discurso racional.
Isto leva-nos para um campo de racionalidade prática que é a RACIONALIDADE
PROCEDIMENTAL, que nos poderá dizer o que verdadeiramente fundamenta
uma solução não é o seu mérito material, por referencia a princípios, critérios
ou valores assumidos previamente, mas sim o processo que permitiu construir
a decisão, respeitando-se as regras, é isso que fundamenta a decisão. O que
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interessa é que a decisão tenha sido tomada respeitando certas regras de
procedimento – e aí é que temos uma boa decisão.
No fundo a tópica foca-se naquilo que deve ser o discurso. Neste circulo prático
dá-se prioridade ao problema-caso em detrimento da representação do
sistema, pois as componentes do sistema serrão tratadas na sua equivalência
como tópicos, como lugares comuns, apenas ganhando identidade com cada
problema concreto.
Nesta perspetiva o sistema passa para um segundo plano porque as componentes desse
sistema vão ser tratadas na sua equivalência ganhando apenas identidade em concreto
a partir daquilo que cada problema novo vai criando. Fazer referência à racionalidade
procedimental.
Aquilo que se espera desta racionalidade é que define um conjunto de regras, muito
rigorosas, na tomada da decisão.
Esta racionalidade procedimental sobretudo quando representa uma parte significativa
do pensamento contemporâneo – é uma reivindicação projetada em termos inter
subjetivos do que seria a racionalidade do discurso prático kantiano, esta perspetiva
puramente procedimenttal tende a assimilar elementos que têm um conteúdo material.
Estas regras de procedimento acabam por ser inferidas de uma representação que
acentua a importância do homem, do consenso, do diálogo, não é portanto neutra. Por
trás de tudo isto há uma referência de valoração, mas em sim mesmo, o discurso
baseia-se em regras procedimentais.
Poderemos perguntar se a racionalidade jurídica deverá ser esta?
Temos materiais jurídicos à nossa disposição e depois não o s vamos usar a partir da
exigência de adequação ao caso.
Importante vai-se construir um argumento em que se vai mobilizar esse materiais –
ao fazer-se isto está-se a prescindir de uma auto subsistência desses materiais e à
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diferenciação entre eles (não se dá relevância às normas em detrimento de outro
instrumento por exemplo) este equilíbrio é um equilíbrio que está a ser sempre
recomposto na perspetiva de cada caso. Não obstante a importância deste pensamento
tópico retórico que veio a restabelecer a reflexão do pensamento prático, mas
podemos questionar se o modus operandi do juiz deverá obedecer a este modelo e
se dessa forma não se esta a esquecer certas componentes do sistema jurídico que é
um sistema auto subsistente e em que há diferença entre os seus estratos – e isso é
preciso ser refletido no âmbito metodológico. As normas, princípios e doutrina não
podem ser exatamente o mesmo. Somos levados para o lado da racionalidade
procedimental que nos faz pensar numa pura logica da argumentação - a construção do
melhor argumento e decisiva na determinação da solução.
• Racionalidade hermenêutica
Está a falar-se de um movimento que surge associado ao nome de um grande filósofo
do século XX – Gadama).
Este autor trouxe consigo uma abordagem que podemos associar a esta nova
hermenêutica. A nova hermenêutica trilha um caminho diferente da tópica embora que
insistindo na mesma racionalidade (sujeito-sujeito como estrutura) - para ele a
hermenêutica deve ser tratada como uma filosofia e não como um método –tem a ver
com a reconstituição de condições do nosso ser no mundo, do nosso estar no mundo
e do modo como esse estar no mundo relaciona efetivamente com os outros - isto leva
a uma acentuação perturbadora – ele vem dizer, no fundo, que a nossa atitude
originária no mundo é uma atitude de compreensão e não de explicação – esta seria
já uma atitude secundária. A nossa atitude natural, espontânea de relação com os outros
é uma atitude de compreensão como categoria que se contrapõe à explicação do
discurso teorético. O compreender é o modo de ser da nossa existência. O que a
hermenêutica como filosofia se propõe é reconstruir as formas de compreensão.
Nós quando nos dirigimos aos outros há todo um património de tradição que nos
condiciona – referência marcada pela pré-compreensão – no fundo cada problema que
se coloca é um problema que tem a sua novidade, mas quando se está perante essa
situação não deixa de se dirigir a essa situação com um património de experiência,
compreensão, que é um património pré-compreensivo.
O que está em causa nesta visão hermenêutica é a ideia de um círculo que se constrói
sempre dando um peso muito significativo à tradição e às diversas pré-compreensões
que essa tradição vai construir. No fundo, trata-se de dizer que em cada ato de leitura
que se realiza carrega-se essa tradição e vai-se estabelecer uma conversação entre essa
tradição e o texto que se está a ler nas suas significações. E essa situação de leitura é
uma situação que se inscreve num círculo, o tal círculo prático (hermenêutica por
Gadama) porque se se dirigir ao texto com determinadas pré-compreensões, não é para
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projetar no texto essas pré-compreensões, mas é para estabelecer um diálogo com o
texto. Diálogo que se faz mobilizando a tradição e levando a sério a especificidade da
leitura.
Tudo isto acabou por representar um apelo a converter o que seria apenas uma
filosofia para um método - um esquema metódico que poderia ser útil quando estamos
a ler texto – literários e jurídicos. Note-se que ao nível do pensamento jurídico, hoje há
linhas de autores que cultivam esta hermenêutica - procuram ver na compreensão da
leitura jurídica um método. Possibilidade de ver na hermenêutica um método se bem
que infiel às ambições do seu autor.
Compreende-se que este caminho é diferente porque já não se tem aqui acentuado o
problema na sua novidade. Há referência à situação de leitura que é sempre diferente,
mas repare-se que se fala na situação de leitura e não no problema concreto que
condicione a construção da solução. Isto leva a dar um outro peso à própria tradição.
Esta acentuação serve para percebermos que a perspetiva hermenêutica dá particular
relevo ao facto de a racionalidade prática ser aqui confundida com um exercício de
interpretação de texto e os problemas vêm diminuída a sua autonomia porque são
tratados como se fossem situações de leitura (de textos ou gestos). – ideia de
encontrar resposta para este problema através da circularidade – aqui já não se da
importância tanto ao problema - traz um perspetiva predominantemente marcada pela
representação da textualidade e interpretação. (pensa-se não na hermenêutica de
Gadama, mas enquanto método interpretativo acima mencionado). Aqui desvaloriza-
se a importância do problema como problema). Vai tratar-se o problema como situação
de leitura e dar atenção especial a um modo de reconstituição que é um modo cognitivo
– desenvolve—se um exercício de interpretação.
Hermenêutica como filosofia e hermenêutica como método.
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Note-se o momento metódico da prova - o problema da prova é um problema que
deve ser pensado ao nível de uma racionalidade narrativa – o que temos são
construções narrativas em confronto - temos duas histórias – a história construída por
uma parte em contraponto com a construída pela outra parte - podemos narrativizar
a própria pragmática do foro - o juiz terá que reconstruir uma terceira narrativa. Há
aqui possibilidade de conferir ao problema da prova esta racionalidade narrativa. No
entanto, pode parecer mais forçado querer ver os problemas das normas
(experimentação, por exemplo) como problema de racionalidade narrativa.
Há uma tendência para associar esta perspetiva ao direito e que não se esgota no
domínio da prova (que é o onde faz sentido).
Será que a racionalidade jurídica é uma racionalidade pratica? Se sim, será que a
conseguimos compreender partindo de qualquer destes modelos? Ou será que a
especificidade do sistema jurídico determina por si mesma que a especificação da
racionalidade pratica a ter em conta seja uma especificação muito especial, muito
autónoma que nos afaste destes caminhos?
O caminho que nos pode ser oferecido é aquele que encontramos quando podemos
dizer que racionalidade jurídica é sustentada numa dialética sistema – problema.
Aula 16/10
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racionalidade tópica? Note-se que desde a idade média é que refletir sobre o
direito e resolver problemas jurídicos é mobilizar textos e encontrar as soluções
nesses textos. Por outro lado poderíamos admitir que no universo do direito,
como outros universos da prática, o que se faz é contar histórias – organização
narrativa – pelo menos no plano probatório haveria boas razões para pensar que
a racionalidade prática tinha uma índole narrativa.
(antes de dar uma resposta poder-se-á acentuar outro ponto relevante – aquando da
superação do normativismo – a racionalidade assume uma teleologia. Note-se que isto
não nos condena – essa viragem para os fins é uma viragem que se faz atentando a uma
dualidade de dimensões muito importantes – não se atende apenas os fins
(racionalidade instrumental estratégica), atendendo-se também a valor que podem
relativizar os fins e que os podem hierarquizar. Hoje atendemos a valores sobretudo da
experiência que fazemos dos princípios normativos (se os levarmos a sério na sua
dimensão axiológica). Se nós dissermos que a teleologia não deve apenas considerar fins
mas esta dualidade – fins (projeções de necessidades subjetivas) e os valores (como
representações integradoras ao nível da comunidade) no fim estaremos a admitir um
teleolgoismo especial. Se a perspetiva for uma perspetiva de valores e princípios, a
perspetiva já não é de separação (como se se atendesse aos fins apenas (o outro aparece
como um obstáculo), o outro aparece como uma componente decisiva de uma partilha
– os valores têm uma dinâmica integradora enquanto os fins têm uma dinâmica de
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separação. Pode ver-se que se se ficar pela racionalidade teleológica no plano dos meros
fins (que são seguramente importantes, muitas das nossas prescrições legislativas hoje
se nos dirigem através da prossecução de fins), mas se se ficar por aqui – racionalidade
finalístico-pragmática de tipo instrumental estratégica. Sr. Bronze – teleotécnologismo
(teleolgoismo de meros fins, que se satisfaz com uma racionalidade instrumental
estratégica, tecnológica). Já quando dizemos que os fins são importantes mas que são
limitados no plano da sua validade por uma referência a valores ou princípios que
traduzem esses valores, aqui considera-se a experiência dos fins mas limitada por outra.
Se admitirmos que para além dos fins podemos inserir valores (é mais difícil em
sociedade multiculturais falarmos em valores comuns) então aí de facto o tipo de
discurso que nos vai permitir projetar esse teleolgoismo já é um discurso de sujeito
sujeito – esses princípios vão ser recriados na perspetiva de cada problema e através de
um discurso que será seguramente argumentativo. Usando aqui a palavra nomos –
podíamos falar num telenomologísmo – envolve esta dualização – uma referência a
valores através de princípios por um lado e uma referência a fins por outro lado. Poder-
se-á dizer que nem todos os problemas de hierarquia de fins ficam resolvidos, há alguns
que só são através de decisões, mas há uns que ficam resolvidos, porque nem tudo será
possível no plano da eficiência, e há limites introduzidos por esses valores – e a escolha
do julgador ou legislador poderá fazer-se por referência a esses princípios em nome da
realização em concreto desses princípios.)
1) Sendo a racionalidade jurídica uma racionalidade que dá grande importância
ao problema, porque é que o modelo tópico-retórico não chega? O que é que
lhe falta? Há aqui uma importante acentuação do problema há uma recursa
que a racionalidade seja lógico-dedutiva, isso não chega?
Ora, em 1º lugar é preciso ver que realmente a racionalidade jurídica para além da
dimensão da controvérsia prática em concreto precisa de outra dimensão fundamental,
uma dimensão de validade – sentido axiológico – que se exprime através das exigências
e intenções dos princípios. Trata-se de realizar em concreto uma certa validade. A
perspetiva tópico-retórica visa um consenso a posteriori – cada uma das partes vai
mobilizar argumentos, baseados em tópicos e vai desenvolver a sua argumentação,
(forma persuasiva) – e o julgador irá reconstituir esta teia de argumentos entendendo
que o controlo racional daquela discussão está na própria discussão – há aqui um
consenso a posteriori – o julgador surge como um mediador para permitir a melhor
apresentação possível dos argumentos pelas partes – sendo objetivo uma das partes
convencer a outra desde que respeitados determinados pressupostos – o julgador vai
construir essas condições ideais – CN – no universo do direito à sempre uma validade a
priori – e isso é muito relevante – aquilo que se pretende do juízo concreto é que seja
uma realização plausível dessa realidade não tanto que consagre o consenso a posteriori
que foi alcançado pelas partes.
Em 2º lugar há um ponto muito relevante – se o discurso fosse puramente tópico – ao
acentuar a importância do problema tender-se-ia a dizer que em abstrato, à partida, os
critérios da jurisprudência, doutrina, princípios devem ser todos eles tratados como se
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fossem indiferentes – e há de ser o problema que depois vai permitir estabelecer os
equilíbrios e as prioridades. Ora se se estivesse a experimentar determinado problema
poderia entender-se que se daria mais importância a um critério da doutrina do que um
critério legislativo – e não haveria problema desde que justificado argumentativamente
– porque o peso que se dá a cada um desses estratos é o peso que o problema exige que
se dê – princípio da equivalência dos estratos. Esta será a maior das dificuldades de
pensar a racionalidade jurídica como puramente tópica, porque o modus operandi do
juiz tem que pressupor um sistema e esse sistema envolve diversos estratos e esses
estratos têm um relevo distinto desde logo no plano metodológico (princípios como
validade; normas – legalidade; dogmática – racionalidade) são critérios diferentes,
materiais diferentes que, eles próprios nos aparecem, no momento em que se está a
realizar direito, um sistema com diversos estratos com presunções diferentes, modos
de aplicação diferentes – no plano da realização do direito tem que se respeitar isto.
No momento em que se realiza direito pressupõe-se um sistema nas suas diferenças
não querendo isto dizer que quando se resolve um problema não se possa vir a
conseguir introduzir alterações, renovações.
De facto há aqui uma rejeição dessa dimensão puramente tópica de equivalência dos
diversos estratos.
Poder-se-á dizer, na verdade, que esta racionalidade tópica-argumentativa aparece mais
próxima de alguns modos alternativos de resolução não jurisdicional de conflitos –
mediação – quando há uma mediação autêntica o mediador está sobretudo a garantir
que as partes comuniquem entre si as suas posições obedecendo a certas regras e
possam chegar a um consenso – ele está no fundo a vigiar se as regras são cumpridas e
possibilitar a chegada a um consenso. quando se fala no modus operandi do juiz fala-se
de um terceiro que intervém e que não é moderador – poderá haver domínios do
processo em que se abrem partes para isso – mas não é isto a índole da solução judicial.
Caracterizar a decisão judicial como se ela fosse obtida através do consenso que as
partes consagram é desfigurar o modus operandi do juiz.
Tudo isto está ligado ao aspeto – se nós levássemos a sério a ideia de que a
racionalidade jurídica é puramente tópica, para além de dizer que todos os critérios se
equivalem, o que se pretende conseguir é um consenso a posterior, para além disto ter-
se-ia que concluir que a racionalidade jurídica do modus operandi do juiz seria uma
racionalidade procedimental – se o julgador não está a construir uma solução autónoma
a partir de critérios e fundamento do sistema mas está a vigiar se as regras estão ou
não a ser cumpridas e se as partes chegam o consenso, o que está é assumir-se como
puro mediador. A solução a que se chega é uma solução que respeita regras de
procedimento para a tomada de decisões e não uma solução autónoma fundada em
regras e critérios. Estar-se-ia a favorecer não uma racionalidade material, substantiva,
mas uma racionalidade procedimental.
Note-se que estes pontos afastam-nos daquilo que se espera da racionalidade jurídica.
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• Por outro lado, se estivermos a considerar um discurso puramente
hermenêutico – no âmbito da nova hermenêutica (o juiz como puro jurista
aquilo que está a fazer é a compreender textos, está a compreendê-los a partir
de uma situação especial de leitura – as leituras são sempre circuladas). A
hermenêutica tende a dizer que os casos não são mais que situações de leitura.
Se se está a procura de uma reposta – vai-se ler os textos jurídicos preocupado
com o problema – e assim naturalmente se introduz significações nos textos de
acordo com a preocupação do problema. A questão aqui é diferente, no fundo
não há dúvida que cabe a dinâmica que há aqui uma circularidade – só que, a
dificuldade de pensarmos a realização do direito como um discurso puramente
hermenêutico nesta linha da nova hermenêutica – está em podermos dizer que
as questões que se colocam ao juiz quando resolve casos são questões de
compreensão, será que são?
O modus operandi do juiz é esgotável na tarefa de interpretação? O que o juiz pretende
fazer é compreender o melhor possível os materiais que tem à sua disposição? Ou será
que para além disso o juiz tem que extrair desses materiais um critério que lhe permita
assimilar um problema? A questão que se coloca ao juiz é mais uma questão decisória
do que meramente compreensiva. Os textos com certeza que são muito importantes
mas para permitir extrair deles critérios e não para realizar uma melhor compreensão.
Na verdade os problemas jurídicos não são de mera compreensão, a decisão jurídica,
em concreto, não é um ato puramente hermenêutico, tem uma componente
nomeadamente ter que se mobilizar textos – mas não se reduz a isto. A visão
hermenêutica tende a pensar o caso atendo à situação que se encontra. O problema do
modus operandi do juiz é de solução concreta e não de compreensão de textos ainda
que essa compreensão possa ser uma componente, mas é uma componente que não é
nuclear na identificação do próprio discurso. É verdade que a nova hermenêutica trouxe
consigo, quando projetada no direito, uma referência importante – não podemos
interpretar em abstrato– nunca se interpreta nada em abstrato, mas sim através de pré-
compreensões, interpreta-se os textos situados, através de uma pré-compressão – mas
a racionalidade do juiz num plano metodológico não podemos reduzir a tarefa do juiz a
uma tarefa meramente de compreensão de textos. O problema da hermenêutica é
desconsiderar aspetos decisórios.
• Duas dimensões que são polares – extremas – que aparecem nos polos:
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o Dimensão axiológica, da validade comunitária – validade em sentido
jurídico. Hoje quando olhamos para esta dimensão axiológica vemo-la
precipitada sobretudo em princípios e em exigências associadas a esses
princípios.
o Dimensão problemática das controvérsias reais, práticas – aqui
aparecem sempre como um elemento de novidade – cada caso é um caso
com a sua especificidade – teríamos aqui uma outra dimensão – não uma
dimensão pressuposta que nos remete para a experiência da
comunidade (axiológica) teríamos uma componente problemática que
acentua a novidade de cada problema. Novidade irredutível de cada
problema.
Ter-se-iam aqui duas dimensões fundamentais. Ter-se-á que responder à novidade de
cada problema mobilizando um horizonte de validade, de exigências invocadas em
princípios. Portanto ter-se-ia que responder ao problema respeitando a sua novidade
irredutível mas mobilizando o horizonte daquela validade – a resposta teria que ser
plausível no horizonte daquela validade. MAS ISTO NÃO BASTA. Falta aqui elementos
intermédios que tem a ver com processos de institucionalização.
• Dimensão dogmática
A validade é uma referência muito importante mas se a quiser invocar por si própria,
sobretudo num cotexto como ao nosso seria difícil. Como se invoca esta validade
partilhada? Através de princípios, mas os princípios são e devem ser tidos em conta
como o primeiro estrato daquilo que se pode dizer o sistema jurídico. Quando nos
dirigismo à validade comunitária – em cada experiencia do problema – através do
sistema jurídico – porque o sistema pode ser levado a sério como objetivação dessa
validade em diversos estratos – onde ela se precipita diretamente é nos princípios –
temos aqui uma dimensão de estabilização dogmática global (dogmática – porque o
sistema vai estabilizando a validade, embora não seja fechado, considera uma
precipitação daquela validade) – tudo isto funciona como uma dimensão que até certo
ponto desonera o julgador – dimensão dogmática de um sistema que ele próprio vai
atuar (o sj atua como uma condição de tercialidade – a tercialidade está na ideia de que
o julgador quando responde como um terceiro está sustentar esse juízo num sistema e
está pressupor para comparar a posição de uma parte com a outra – um padrão de
comparação que é o próprio sistema. O sistema oferece-nos na sua complexidade os
padrões de comparabilidade – o sistema jurídico garante a tercialidade, garante que
existe um padrão para comparar). Ter-se-ia aqui uma dimensão dogmática próxima da
dimensão da validade que trazia uma série de práticas de estabilização da validade
comunitária eu se ia estabilizar no direito vigente – isto é uma dimensão muito
importante da racionalidade jurídica (os tipos globais de RP não consideram esta
componente que é decisiva num sistema plural, multicultural).
• Dimensão praxística
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Consiste em dizer que a resposta que o juiz vai dar à controvérsia é uma reposta
assimiladora da controvérsia – há um exercício que ter-se-á que fazer – tem que se
converter um acontecimento da vida na sua complexidade – o que é apresentado pelas
partes – num caso jurídico (aqui já se está a fazer atuar o próprio sistema) – se se disser
o que é relevante neste acontecimento juridicamente já se está a pressupor a
experiência que se tem com o sistema jurídico – há aqui uma dimensão que tem a ver
com a prática de realização – vai-se responder àquela controvérsia prática mas vai
tratar-se como um problema jurídico (considerar-se o acontecimento no contexto deste
sistema jurídico e nas práticas de estabilização a que ele atende) – vai querer-se que
essa controvérsia tenha uma reposta que não seja um mero juízo – ter uma decisão que
pressuponha a novidade do problema e as práticas de estabilização do sistema.
Entender o modus operandi do juiz será considerar algo de verdadeiramente
específico e é necessário atender a estas dimensões – que as outras racionalidades
não atendem.
• Dimensão axiológica
• Dimensão dogmática
• Dimensão judicativo-decisória – tem a ver com as práticas de realização que
identificam os próprios casos jurídicos.
• Dimensão problemática – tem a ver diretamente com as controvérsias práticas.
Serão estas as componentes fundamentais quando se fala numa racionalidade
autónoma e especificamente jurídica.
Racionalidade especificamente jurídica - para completar a alusão a estas 4
componentes, recorde-se várias coisas relevantes quando se considera esta
racionalidade, do ponto de vista metodológico nesta pressuposição do sistema.
Se se fala numa dogmática que tem a ver com as práticas de estabilização do sistema,
sistema esse pluridimensional que envolve – princípios normativos, legais, critérios de
jurisprudência, doutrina, cânones possíveis inferidos das práticas da realidade jurídica,
etc.
Aquilo que é importante lembrar que vai ser importante no esquema metodológico e
que nos afasta de uma perspetiva tópica – é dizer assim: quando me dirijo ao sistema
há uma distinção de base a ter em conta no tratamento dos materiais que estão no
sistema. Que é a distinção entre fundamentos e critérios – alguns daqueles materiais
vão ser metodologicamente tratados como fundamentos e outros vão ser tratados
explicitamente como critérios. Isto é importante porque envolve uma chamada de
atenção – não podemos tratar os fundamentos como se fossem critérios nem vice versa.
Isto parece redundante mas não é – porque encontram-se muitas formas de tratamento
de desconsideram esta distinção. Dizer-se no plano metodológico como algumas
perspetivas dirão que os princípios são normas – isto envolve um tratamento
semelhante das normas e princípios em termos de se ver nos princípios normas mais
gerais e abstratas do que as normas. As normas mais fechadas e os princípios mais
abertos. Ora Dr. Aroso crê que este tratamento é desadequado e crê que a distinção
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proposta por CN entre critérios e fundamentos é muito relevante do ponto de vista
metodológico. Porque significa dizer que os princípios enquanto direito vigente não
devem ser tratados como normas legais. Esta distinção fundamentos/critérios. O que é
que nuclearmente nos permite distinguir os princípios enquanto fundamentos dos
critérios – em termos metodológicos quando se considera um fundamento considera-
se uma intenção de realização, uma exigência de sentido que o princípio está a
pretender (“claim”) – pretensão/exigência – deve ser levada a sério como intenção de
realização ou seja, a resposta que em termos judicativos vai ser dada a um caso concreto
tem que ser uma resposta que respeite estas exigências. Estas exigências têm que estar
presentes – a não violação destas exigencias – tem que estar presente. A resposta a dar
ao caso concreto tem que preservar a identidade destas exigências. Os princípios atuam
como verdadeiros limites da validade dessas respostas. Os juízos decisórios concretos
têm que assimilar estas exigências ou pelo menos não as violar. O desafio é
precisamente o dizer quando eu me refiro a um princípio em si mesmo (há princípios
que aparecem sob a forma de normas) está apenas a identificar-se esta exigência de
sentido. Poder-se-á dizer que no princípio propriamente dito não há uma antecipação
em termos de previsão de um problema específico, de um problema tipificado – o que
há é puramente uma exigência de sentido que deve ser assimilada. O princípio não
prevê, não antecipa. Manifesta uma exigência de sentido que o percurso tem que
respeitar mas não sabemos quais os problemas que vão surgir nem quais são os
esquemas de solução, apenas que aquelas exigências têm que ser respeitadas.
Todos os critérios à sua maneira antecipam problemas que podem ocorrer e, também à
sua maneira propõem soluções para eles. Os princípios não. Os princípios são puras
exigências e confere-se aos princípios uma identidade especial – quando me dou conta
em concreto que o princípio está a ser violado, está-se a compreender em concreto, a
partir do problema as exigência de sentido desse princípio – terá uma marca forte de
consonância prática. A exigência do princípio só é assumida quando confrontado com a
novidade do problema é que se percebe se a resposta frusta ou não o princípio.
Em relação aos fundamentos enquanto tais, considerando-se os princípios, considera-se
a intenção de realização e essa só se torna clara quando a vemos nas práticas de
realização, os conteúdos dos princípios só os temos em pleno em cada experiência e, por
isso, é que se compreende que a experiência dos problemas vá transformando
paulatinamente os princípios.
Não devemos ver nos princípios esquemas de solução mas intenções de realização que
não podem ser violados – do ponto de vista do esquema metodológico.
Todos os critérios devem ser experimentados e tratados na perspetiva dos princípios.
Não poderá admitir-se, no final, ao chegar à solução em concreto, um critério (norma
ou precedente) se for levado para uma solução em que as intenções dos princípios
resultem frustradas. Solução conforme os princípios – daí falar-se em fundamentação.
Isto significa que quando se vai tratar os outros estratos, tratar-se-ão como critérios – o
conteúdo e as intenções dos princípios, na sua evolução é muitas vezes refletido e
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tratado pela dogmática – aquilo que os princípios são hoje depende muito daquilo que
a dogmática e a jurisprudência em conjunto vão experimentando e depende das
correntes que essa dogmática vai estabilizando – direito dos juristas – a menos que
admitíssemos um pensamento constitucionalista (que será desadequado). Mas este
conteúdo não é um conteúdo que eu possa pré-determinar em pleno, pois só aparecem
na sua plenitude, em concreto, quando respondem aos problemas.
Quanto aos critérios – estes são esquemas de solução, distinguindo-se. Como qualquer
esquema de solução passa por uma certa antecipação, maior ou menor, de um problema
que pode decorrer e por uma resposta para esse problema. Antecipação do problema
e uma resposta mais ou menos precisa para esse problema. É por isto que, as
prescrições legislativas são critérios porque estas são programas (onde se viu melhor a
índole do critério é quando temos numa lei um problema condicional “se, então” – o
problema está previsto na hipótese, como tipo de problema e na estatuição temos a
resposta). Mas, mesmo quando se considera um problema final – são definidos elencos
de situações possíveis – há sempre uma previsão de situações ainda que possa não ser
tão clara como acontece nos problemas condicionais. Nos problemas finais dizemos o
objetivo a atingir é este e para tal vamos usar estes recursos nesta situação – não se
deixa de ter aqui uma pressuposição de uma situação com elementos componentes
desta situação que nos permitem ver depois ver qual é o sentido da resposta – que será
a prossecução do fim. Sempre que temos um programa estamos perante um critério e
não um fundamento (o programa pode respeitar mais ou menos o fundamento mas é
um critério).
A lei tem esta vocação para o futuro – a hipótese prevê um problema – e a estatuição
dá-nos um sentido de solução, um esquema de solução – que não é a solução em si
mesma, essa vai ter que ser reiventada com o problema em concreto, mas temos uma
solução mais ou menos pré-determinada.
O critério é sempre um esquema de solução e, portanto, se se diz que os precedentes
(critérios da jurisprudência judicial) são critérios, é preciso ver se são critérios muito
diferentes das normas legais (que são programas) e a os critérios da jurisprudência
judicial é uma sentença – o juízo que está na base da sentença – mas é concreto, no
fundo não há aqui uma previsão nenhuma de um problema que pode acontecer no
fundo o que há é a exemplificação de um problema concreto que aconteceu. Está-se a
partir do exemplo de um caso concreto que já foi decidido pelos tribunais – parte-se da
identificação que um certo tribunal fez de um caso e também da solução que deu àquele
caso, o que se faz é usar essa sentença como exemplo para uma decisão que eu próprio
vou construir – o tipo de discurso que eu uso é diferente. Enquanto que a norma é um
programa que sustenta uma tipificação em abstrato, quando se considera o precedente
considera-se a própria sentença e o juízo que a sustenta, através de um discurso análogo
– mobiliza-se o caso anterior face ao atual e verifica-se se o atual é análogo ou não ao
anterior. Pode dizer-se que o precedente é um critério mas muito diferente da norma,
não é um programa para o futuro nem é uma antecipação em abstrato – é um problema
concreto construído a nível de sentença judicial. (universo anglo-saxónico – extrai-se do
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precedente uma norma geral e abstrata – formalismo). Mesmo num contexto romano-
germânico diz-se tratar-se de prévios juízos – vai poder usar-se como exemplo para
construir outras decisões e um exemplo que vai benificiar de uma presunção de justeza
(presume-se apenas a correção daquela solução – não a justiça em termos gerais, mas
a adequação daquela solução àquele caso) – então utiliza-se o juízo beneficiando a
partida de que aquela decisão foi adequada para o caso. Confronta-se o meu caso com
o caso anteriormente decidido e vai procurar-se pela positiva ou negativa – aquilo que
aproxima e aquilo que distingue – o caminho de solução. Quando se tem vários
precedentes e norma – vai-se vendo as decisões judiciais que foram ocorrendo em prole
daquela norma – e isto é importante. Nota: a vinculação dos precedentes é uma mera
vinculação presuntiva de correção, adequação. A presunção de justeza tem mais força
quando é sustentada por uma corrente jurisprudencial – e uma eventual contra
argumentação deveria ser mais forte. O mesmo acontece se se estiver perante uma
decisão de um tribunal superior. A presunção de justeza não é linear – não há mais fortes
nem mais débeis – mas uma sentença isolada – poderá ser mais fácil afastar-se dela do
que de uma corrente jurisprudencial estabilizada (intenção estabilizadora que não pode
deixar de ser considerada quando se considera o problema em concreto - e aqui é mais
difícil a refutação).
Critério doutrinal – não é uma decisão nem um programa – como é que o trato como
critério - a questão de se dizer que o que se tem ali em termos dogmáticos, doutrinas é
uma reconstituição racional, discursiva, extensa sobre os problemas que podem ocorrer.
Nas obras de doutrina surgem muitas vezes hipóteses. Tem-se um critério completo em
que se consideram possibilidades que estão a ser reconstituídas racionalmente – o que
se tem é um exercício de reconstituição racional que se pode mobilizar em tribunal. Aos
critérios de doutrina está uma ideia de presunção racional. Se se refutar a presunção de
racionalidade ter-se-á evidentemente que contra argumentar.
É importante ter isto em atenção e recordar estas presunções – que distinguem os
diferentes estratos do sistema – na base do sistema jurídico é necessário existir esta
distinção entre fundamentos e critérios – no plano metodológico isto é muito
importante – quando se mobiliza um princípio, norma, critério da jurisprudência ou
doutrina para resolver um problema – está a pressupor-se ao nível do modus operandi
as ditas presunções - porque se distinguir os estratos do sistema associando a cada um
dele um modo de vigência e vinculação que é diferente:
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metodológico – se houver violação da validade está autorizada a refutação da
autoridade e a norma pode ser afastada – isto exige do ponto de vista
metodológico uma argumentação absolutamente irrepreensível (refuta-se a
própria presunção de autoridade em nome da validade).
• Quando se está perante um precedente – há uma presunção de justeza mas não
reduzível a uma vinculação formal, há uma vinculação no sentido em que se me
afastar da presunção, na minha decisão tenho que justificar porque é que me
afastei daquela corrente – rigor metodológico – exercício de contra
argumentação. Consegui uma boa solução levando a sério estas presunções.
• Presunções de racionalidade da doutrina – o tratamento que tem que ser dado
é atender a racionalidade daquela doutrina – mas isso não impede que em
concreto não esteja autorizado a refutar aquela doutrina – mas só o irei fazer se
estiver à altura de desenvolver um verdadeiro exercício de contra
fundamentação.
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