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EXMO(A). SR(A).

JUIZ(A) DE DIREITO DA VARA DO TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA DE


CONTAGEM/MG

Joaquim das Dores, já qualificado nos autos da ação penal que lhe move a Justiça Pública de
nº, vem por meio de seu advogado que abaixo assina (procuração anexa), perante Vossa
Excelência, nos termos do inciso LVI do art, 5º da CF combinado com o art. 316 do Código de
Processo Penal, requerer a REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA, de acordo com os fatos e
fundamentos a seguir expostos.

DOS FATOS
O réu responde à ação penal perante este Juízo, por suposto crime de homicídio doloso
praticado contra João das Couves de Andrade. A requerimento do Ministério Público, Vossa
Excelência entendeu por bem decretar sua prisão preventiva, fundamentando-a na
necessidade de garantia da ordem pública.
Mas, apesar do enorme saber jurídico do Magistrado, a prisão deve ser revogada, de acordo
com os fundamentos que se passa a expor.

DOS FUNDAMENTOS
Conforme princípio Constitucional no inciso LVII do art. 5º da CF, todos somos considerados
inocentes até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Trata-se do princípio da
inocência ou não culpabilidade, ou seja, ninguém pode ser considerado culpado até a
imutabilidade da penal condenatória. Inquestionável, que a prisão cautelar deve ser
entendida como medida excepcional e, por esse motivo, a sua aplicação é restrita, devendo
estar bem fundamentada, sob pena de se mostrar ilegal.
Em atendimento às normas constitucionais, o art. 282 do CPP orienta o intérprete a observar
a existência de proporcionalidade em sentido amplo para a decretação de medidas
cautelares, ou seja, antes de decretar qualquer medida cautelar, o Magistrado deve observar
a existência do trinômio necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito.
Portanto, para o encarceramento precoce realizado antes do trânsito em julgado de
sentença penal condenatória, é necessário que se avalie se essa restrição terá uma
finalidade prática e uma maior proteção ao bem jurídico tutelado.
A prisão provisória será necessária se ficar comprovado que a liberdade do indivíduo possa
causar gravame à sociedade ou ao regular andamento do processo. Não há que se falar na
necessidade da prisão preventiva para proteger a vida ou integridade física do agente. É
totalmente desarrazoado cercear a liberdade de alguém para proteger-lhe. Parece até
contraditório esse entendimento, pois viola-se um dos maiores direitos do indivíduo para
proteger-lhe a vida.
A cautelar aplicada também precisa ser adequada ao fim a que se propõe, isso quer dizer
que deve ser a menos gravosa possível, com preferência de aplicação das cautelares diversas
da prisão, isolada ou conjuntamente, evitando-se ao máximo o encarceramento provisório.
A proporcionalidade em sentido estrido pode ser entendida como a medida capaz de
proteger o bem jurídico tutelado sem se exceder.
O art. 312 do CPP nos traz os requisitos necessários para a decretação da prisão preventiva:
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem
pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou
para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência
do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de
liberdade do imputado. (BRASIL, 1941, [s. p.], grifo nosso)

A prisão cautelar do réu baseou-se na necessidade de garantia da ordem pública, por ele já
ter sido investigado por outro delito, e para proteção de sua vida e integridade física, já que
a vítima, segundo relatos, era uma pessoa querida na comunidade.
Ora, a fundamentação para a determinação da prisão cautelar é vazia e está totalmente
equivocada. A doutrina majoritária critica esse requisito autorizador da medida cautelar,
pois não se sabe ao certo o que seria a garantia da ordem pública.
Para alguns doutrinadores:
Violam a ordem pública: aqueles que afetam a credibilidade do judiciário; os
que contam com a divulgação pela mídia (não confundir com
sensacionalismo, clamor público); os crimes cometidos com violência ou
grave ameaça ou com outra forma de execução cruel; se o agente delitivo
possui longa ficha de antecedentes etc. (ALVES, 2019, p. 117)

Perceba, nobre julgador, que o conceito jurídico de garantida da ordem pública é aberto e
indeterminado, não podendo fundamentar uma medida tão drástica quanto a prisão
cautelar, a qual, por ser exceção, deveria ser fundamentada de forma mais clara e precisa,
demonstrando a sua real necessidade.
Entender que alguém precisa permanecer na prisão antes do reconhecimento
inquestionável de sua culpa por já ter sido investigado por outro delito viola o princípio da
não culpabilidade, principalmente por ter havido trancamento do inquérito policial por falta
de provas, ou seja, não houve sequer oferecimento de denúncia, já que são inexistentes as
provas de que o réu havia participado do alegado crime.
É certo que, não é idôneo fundamentar a segregação cautelar na gravidade em abstrato do
crime cometido, pois, inicialmente, de acordo com os comandos constitucionais, o réu é
inocente, e a gravidade do delito cometido não está associada a nenhuma outra motivação
justa para mantê-lo preso. Esse é o entendimento majoritário dos tribunais superiores.
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS.
TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. NULIDADE DAS PROVAS OBTIDAS
MEDIANTE INGRESSO EM DOMICÍLIO. FUNDADAS SUSPEITAS. PRISÃO
PREVENTIVA. NECESSIDADE DE GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA.
FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. ARGUMENTOS GENÉRICOS. GRAVIDADE
ABSTRATA DO DELITO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.
SEGREGAÇÃO REVOGADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O
trancamento da ação penal somente é possível, na via estreita do habeas
corpus, em caráter excepcional, quando se comprovar, de plano, a inépcia
da denúncia, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da
punibilidade ou a ausência de indícios de autoria ou de prova da
materialidade do delito. 2. O delito imputado ao recorrente tem natureza
permanente, nas modalidades de guardar ou ter em depósito. Legítima,
portanto, a entrada de policiais para fazer cessar a prática do delito,
independentemente de mandado judicial, desde que existam elementos
suficientes de probabilidade delitiva. 3. Neste caso, a existência de
informações preliminares motivara a expedição de mandado de busca e
apreensão que resultaram na prisão do recorrente e na localização de
substâncias entorpecentes, retirando do fato qualquer mácula capaz de
ensejar o reconhecimento de vício no procedimento policial. Além disso, o
alegado vício na execução do mandado de busca e apreensão não foi
previamente analisado pela Corte a quo, inviabilizando sua apreciação pelo
Superior Tribunal de Justiça. 4. A prisão preventiva tem caráter excepcional e
deve ser justificada com a indicação de elementos que demonstrem a
existência da prova da materialidade do crime e a presença de indícios
suficientes da autoria, bem como a ocorrência de um ou mais pressupostos
do artigo 312 do Código de Processo Penal. 5. Carência de fundamentação
do decreto prisional. Caso em que o decreto que impôs a prisão preventiva
ao recorrente não apresentou qualquer motivação concreta e
individualizada apta a justificar a necessidade e a imprescindibilidade da
segregação; somente faz referência à gravidade abstrata do delito 6. A
necessidade de garantia da ordem pública e a gravidade abstrata do delito,
dissociadas de quaisquer elementos concretos que indicassem a necessidade
da rigorosa providência cautelar, não constituem fundamentação idônea
para justificar a medida extrema. 7. Recurso ordinário parcialmente provido,
para revogar a prisão preventiva, cabendo ao juízo de primeiro grau
decretar as medidas cautelares alternativas à custódia que considerar
pertinentes ao caso. (RHC 130.330/RN, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA
FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 22/09/2020, DJe 28/09/2020).

O juízo também motivou a necessidade da prisão preventiva na proteção à vida e à


integridade física do réu. Mas, com a devida vênia, essa fundamentação não merece
prosperar, pois não tem respaldo constitucional, legal ou jurisprudencial. Não se pode
antecipar uma possível reprimenda para proteger a incolumidade física de alguém, é um
total despropósito colocar alguém no cárcere para evitar o seu sofrimento. Essa justificativa
tenta colocar no indivíduo uma responsabilidade que é do Estado, mesmo que para isso
precise violar seus direitos e suas garantias fundamentais.
Incontestável que a prisão cautelar é a última ratio por ser uma medida dura que antecipa
uma possível punição, devendo o Magistrado fundamentar a não aplicação de cautelares
diversas da prisão presentes no art. 319 do CPP em sua substituição. O objetivo da lei é
evitar o constrangimento do indivíduo, mas, aqui, percebe-se exatamente o contrário, pois,
apesar da existência de medidas legais com poder de preservar o processo e a liberdade o
réu, preferiu-se retirá-lo prematuramente do contato social, mesmo que isso lhe cause
danos irreversíveis.
Por todos os motivos expostos, percebe-se que não deve ser aplicada nenhuma restrição ao
réu, pois não há fundamentos que justifiquem. Contudo, de acordo com o princípio da
eventualidade, caso se entenda necessária a determinação de alguma medida, seja ela uma
cautelar diversa da prisão, que não viole os direitos de personalidade do réu, que não atinja
a sua dignidade e viole os direitos e as garantias constitucionais a ele inerentes.

DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer seja revogada a prisão preventiva, imposta ao requerente, nos
termos do art. 316 do CPP, ou caso Vossa Excelência entenda necessário, que seja concedida
a liberdade provisória, nos termos do art. 321 do CPP, aplicando-se, se for o caso, uma das
medidas previstas no art. 319 do CPP, expedindo-se imediatamente o alvará de soltura.

Nestes termos, requer-se deferimento.


Local e data.

Assinatura / OAB-SP

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