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Livro Coordenação Pedagógica.

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© dos autores
1ª edição 2018

Direitos reservados desta edição: Tomo Editorial Ltda.


A Tomo Editorial publica de acordo com suas linhas e conselho editoriais,
que podem ser conhecidos em www.tomoeditorial.com.br.

Coordenação editorial
João Carneiro
Revisão
Moira Revisões
Preparação de originais
Maria Carolina Gurgacz
Capa e projeto gráfico
Atelier @Arte
Diagramação
Tomo Editorial

C778
Coordenação pedagógica: concepções e práticas. / organizado por
Mariângela Bairros e Patrícia Souza Marchand. – Porto Alegre :
Escola de Gestores; Tomo Editorial, 2018.
416 p.

ISBN 978-85-9516-012-5

1. Educação : Pedagogia. 2. Coordenação Pedagógica. 3. Gestão


Escolar. I. Bairros, Mariângela. II. Marchand, Patrícia Souza. III. Título.

CDU 37.013

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Morganah Marcon, CRB-10/1024)

Tomo Editorial Ltda. | Fone/fax: +55 (51) 3227.1021


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Organizadoras

Mariângela Bairros
Patrícia Souza Marchand

Porto Alegre, 2018

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AGRADECIMENTO

Agradecemos a professora Maria Beatriz Gomes da Silva pelo


seu empenho e dedicação para a realização do curso de Pós-Gra-
duação Lato Sensu: Especialização em Coordenação Pedagógica,
que foi promovido pelo Departamento de Estudos Especializados
da Faculdade de Educação (FACED) da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul.

Mariângela Bairros
Patrícia Marchand
Organizadoras

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Prefácio

Vera Maria Vidal Peroni

Ao reunir algumas memórias do processo de construção coletiva do curso de


especialização Escola de Gestores, foi possível perceber a riqueza do seu processo
de formulação, implantação e implementação, tanto em nível nacional como local.
A UFRGS participou ativamente desde o processo inicial de concepção do
curso na primeira reunião técnica/oficina de trabalho do Programa Nacional Escola
de Gestores da Educação Básica, realizada no dia 08 de março de 2006, em Brasília,
a convite da coordenação do curso, juntamente com pesquisadores dos núcleos
de política e gestão da educação de algumas universidades federais, da direção da
ANPED (GT 5), da ANPAE e do FórumDir.
O Programa Nacional Escola de Gestores foi implementado, em caráter expe-
rimental, em 2005, sob a coordenação do INEP, tendo realizado um projeto-piloto
de formação de dirigentes, por meio de um curso de 100 horas, que atingiu 400
dirigentes de escolas de dez estados da federação: Santa Catarina, Ceará, Pernam-
buco, Bahia, Piauí, Rio Grande do Norte, Mato Grosso, Espírito Santo, Rio Grande
do Sul e Tocantins.
A partir de 2007, foi ampliado para outros estados. A implementação do Curso
de Especialização em Gestão Escolar (Lato Sensu), parte do Programa Nacional
Escola de Gestores da Educação Básica, teve como objetivo formar gestores (dire-
tores e coordenadores pedagógicos) das escolas públicas da Educação Básica, em
cursos de especialização e de atualização em Gestão Escolar, na perspectiva da gestão
democrática e da efetivação do direito à educação escolar com qualidade social.
Foi constituída uma Coordenação Nacional do Programa e um Grupo de
Trabalho Interinstitucional de caráter consultivo, com representantes de diferentes
entidades e instituições: UNDIME, CONSED, ANDIFES, ANPED, ANPAE, FÓ-
RUMDIR e CNTE. As IFES foram as Agências Formadoras locais, responsáveis
pela gestão do curso. Em nível local foi formado um Grupo de Trabalho Interins-
titucional (SEDUC/CRE, NTEs, UNDIME).
A equipe coordenadora do Rio Grande do Sul (RS) tinha como princípio que
um curso com foco na gestão democrática deveria ter como marca fundamental

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8 Prefácio

a coletivização das decisões; assim que a totalidade do processo de construção do


curso foi realizado com a participação de toda a equipe. Cada sala-ambiente foi
pensada pelos seus professores, tendo como parâmetro a ementa do curso livre-
mente adaptada à realidade local. A equipe pensou o conteúdo, os textos e também
a relação entre teoria e prática, já que era um curso realizado para gestores que
estavam atuando nas redes públicas, tanto em nível estadual quanto municipal,
com diferentes estágios de gestão democrática.
Algumas redes já vivenciavam a eleição de diretores, conselho escolar atuante
e autonomia financeira, e questionavam os desafios e conflitos de suas práticas.
Outras não tinham nenhum desses mecanismos de gestão democrática e viviam
o conflito entre o conteúdo do curso e a sua dificuldade de implantação, já que
as administrações locais muitas vezes dificultavam ou impediam os avanços que
os profissionais queriam realizar na gestão local. Estas realidades tão diversas, ao
mesmo tempo em que eram um desafio para o curso, eram também a sua riqueza.
O debate sobre as diferentes realidades de cada escola foi um dos grandes objetivos
do curso, em que os cursistas tiveram a oportunidade de repensar as suas realidades,
dialogando com os colegas e confrontando seus desafios cotidianos com a teoria,
ou seja, essa teoria seria fundamental para avançar no processo democrático e no
entendimento da sua realidade, o que foi a tônica do curso.
Ao mesmo tempo em que tínhamos como objetivo que o conhecimento
produzido na universidade chegasse até as escolas, também queríamos, como
pesquisadores, aprofundar o conhecimento sobre a gestão escolar em nosso es-
tado. Por isso, as equipes foram cuidadosamente escolhidas entre professores da
universidade e mestrandos e doutorandos que estavam realizando suas pesquisas
sobre os temas tratados no curso.
Entendemos que o objetivo geral do programa – “formar gestores escolares das
escolas públicas da Educação Básica em cursos de especialização e de atualização
em Gestão Escolar, na perspectiva da gestão democrática e da efetivação do direito
à educação escolar com qualidade social” – foi atendido em todas as versões do
curso, que foram se aperfeiçoando ao longo do tempo por conta da avaliação cole-
tiva em processo no curso de seu desenvolvimento e de reuniões periódicas com os
coordenadores das salas. Desde o cronograma inicial até o TCC, tudo foi debatido
e decidido coletivamente. Foi um grande aprendizado, já que, visando à qualidade
do curso, constantemente avaliávamos e reformulávamos o que era necessário.
Destacamos também a importância, proporcionada durante o curso, da re-
lação teórico-prática entre as salas-ambiente e o cotidiano da escola. Acreditamos
que o curso teve o mérito de oportunizar formação em gestão democrática para os
diretores das escolas estaduais e municipais do Rio Grande do Sul. Muitas questões
relevantes para a atuação do gestor puderam ser debatidas, proporcionando um
grande aprendizado, tanto para os gestores quanto para os pesquisadores, as trocas
de conhecimentos e aprofundamento da realidade educacional e, em especial, a

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 9

luta pela gestão democrática da escola. Entendemos que a escola tem um impor-
tante papel no processo de construção de uma sociedade mais democrática e que
a aprendizagem da participação ocorre na prática e na sua avaliação constante
através da teoria; assim que, ao nos dedicarmos ao curso, tínhamos e temos obje-
tivos mais amplos na direção de contribuir para uma sociedade mais democrática,
o que efetivamente ocorreu.
Este livro traz importantes análises desta rica prática que foi um aprendizado
para todos.

Boa leitura.

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Sumário
Prefácio 7
Vera Maria Vidal Peroni

Apresentação 17
Mariângela Bairros
Patrícia Marchand
Organizadoras

Parte I
SALAS-AMBIENTE:
A CONTRIBUIÇÃO PARA A FORMAÇÃO
DO COORDENADOR PEDAGÓGICO

01 A utilização do ambiente virtual MOODLE na formação docente 27


Patrícia Souza Marchand

02 Contribuição da sala-ambiente “políticas educacionais e


gestão pedagógica” para as práticas dos coordenadores pedagógicos 41
Denise Comerlato
Maria Otília Kroeff Susin
Vera Maria Vidal Peroni

03 Formação de professores e direitos humanos:


desafios para a coordenação pedagógica 53
Jaime José Zitkoski
Paulo Peixoto de Albuquerque

04 O Wikilivros e as mídias móveis: um exemplo de como as diretrizes


curriculares nacionais para a educação básica podem ser reutilizadas,
revisadas, remixadas e redistribuídas entre professores, gestores appers 65
Cintia Inês Boll
Fabiane Penteado Galafassi
Silvana Corbelini

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12 Sumário

05 O processo de aprendizagem de teorias de currículo na


educação continuada de coordenadoras pedagógicas:
o caso de duas turmas de um curso de especialização 83
Iana Gomes de Lima
Luis Armando Gandin
Ricardo Boklis Golbspan

06 Uma breve avaliação de uma disciplina sobre avaliação escolar 95


Gustavo Andrada Bandeira

07 O papel do Coordenador Pedagógico


frente à docência criadora 107
Karen Elisabete Rosa Nodari

08 Contribuições da sala-ambiente “Projeto Político Pedagógico e


Organização do Ensino” na construção da gestão democrática 117
Arthur da Silva Poziomyck
Graziella Souza dos Santos
Luis Armando Gandin

09 A experiência da sala-ambiente “Tópicos Especiais” 129


Alexandre José Rossi
Juliana Selau Lumertz

10 Algumas reflexões sobre a sala-ambiente


“Metodologia do Trabalho Científico” 139
Caterine Vila Fagundes
Natália de Lacerda Gil

Parte II
RELATOS – PROJETOS DE AÇÃO

11 Formação continuada de coordenadores pedagógicos:


reflexões sobre as temáticas dos trabalhos de conclusão 151
Julliana Cunha Alves
Maria Goreti Farias Machado

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 13

12 Significados atribuídos à inclusão escolar por docentes e


funcionários de uma escola do interior do RS 167
Gustavo Andrada Bandeira
Leonardo Cardozo Vieira

13 As narrativas sobre o currículo escolar da língua


estrangeira moderna: teoria versus prática 179
Angela de Fátima Linck de Jesus
Juliana Veiga de Freitas

14 O perfil docente de um grupo de professores de uma instituição


pública de ensino básico técnico e tecnológico (EBTT):
vocação e comprometimento social 189
Daiane Scopel Boff
Igor Ghelman Sordi Zibenberg

15 Perfil discente e repercussões de um núcleo de educação


de jovens adultos (NEEJA) 203
Graziela de Lourdes Demétrio Nunes
Luciano Bedin da Costa

16 As implicações da lei de gestão escolar democrática


no município de Novo Hamburgo – RS no
trabalho da coordenação pedagógica 213
Delci Heinle Klein
Miriam Mallmann Prates

17 Planejamento do professor em “tempos de internet” 223


Daiana Gisele Rosário da Rocha
Delci Heinle Klein

18 Educação integral: uma construção coletiva a partir de


diversos saberes e atividades formativas 235
Andréa Lauermann Tassinari
Joseane Leonardi Craveiro El Hawat

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14 Sumário

19 O papel do Coordenador Pedagógico na atuação


do professor na Sala de Recursos Multifuncionais 247
Carla Ferreira Aguirre
Gabriela Maria Barbosa Brabo

20 O processo de construção da nova grade curricular da escola


estadual de ensino fundamental Mercedes Motta – Santa Rosa – RS 261
Amanda Cabette
Tatiane Mattiazzi

Parte III
A GESTÃO ESCOLAR E A COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA

21 Escola de gestores: o perfil do Coordenador Pedagógico 277


Mariângela Bairros
Patrícia Souza Marchand

22 O papel da coordenação pedagógica no fortalecimento da


participação da comunidade na gestão escolar 289
Neusa Chaves Batista
Eliane Helena Menegotti
Fátima Ehlert
Lúcia Fernanda Félix

23 O Coordenador Pedagógico e a avaliação institucional


na perspectiva da gestão democrática 307
Andréia da Silva Mafassioli

24 Ferramentas dialógicas em uma perspectiva freireana:


um foco no fórum e no editor de texto coletivo 325
Claúdia Zank
Patricia Alejandra Behar

25 Direito à educação infantil: perspectivas para


consolidação no contexto dos 20 anos da LDBEN 349
Maria Luiza Flores

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 15

26 Políticas de inclusão escolar das pessoas com deficiência


e a gestão escolar: desafios da escola contemporânea 371
Adriana da Silva Thoma
Graciele Marjana Kraemer

27 As implicações da parceria público-privada para a


gestão democrática da escola pública 387
Alexandre José Rossi
Daniela de Oliveira Pires
Juliana Selau Lumertz

Sobre autoras e autores 401

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Apresentação

Mariângela Bairros
Patrícia Marchand
Organizadoras

Prezadas leitoras e prezados leitores

Apresentamos este livro, que é resultado de uma caminhada e da parceria


entre a Faculdade de Educação (FACED) da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS) e o Ministério de Educação (MEC). Com o intuito de recuperar
parte desta história, revisitaremos mais de uma década em poucas linhas.
O MEC, a partir de 2005, traçou um objetivo: qualificar os gestores das escolas
públicas de educação básica. Neste sentido, oportunizou, através do oferecimento
de cursos de formação à distância – como o Programa Nacional Escola de Ges-
tores da Educação Básica – um conjunto de ações que iniciaram no governo do
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para começar este o processo, foi lançado um
curso-piloto de extensão em gestão escolar (de 100 horas).
Em 2006, o programa passou a ser coordenado pela Secretaria de Educação
Básica do MEC, dando início ao Curso de Pós-Graduação (lato sensu) em Gestão
Escolar, com carga horária de 400 horas, destinado a diretores e vice-diretores, em
exercício, de escola pública da educação básica.
Em 2009, o programa implementou o Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em
Coordenação Pedagógica, carga horária de 405 horas, para coordenadores peda-
gógicos e profissionais que exerciam função equivalente à equipe gestora da escola
de educação básica. E, em 2010, lançou o Curso de Aperfeiçoamento em Gestão
Escolar, com carga horária de 200 horas. Esse curso se destinava aos profissionais
de instituições públicas de educação básica da equipe gestora: diretor e vice-diretor,
ou equivalentes, nos diferentes sistemas de ensino. O objetivo foi formar, em nível
de especialização (lato sensu), gestores educacionais efetivos das escolas públicas
da educação básica, incluídos aqueles de educação de jovens e adultos, de educação
especial e de educação profissional. Além disso, objetivou contribuir para a quali-
ficação do gestor escolar na perspectiva da gestão democrática e da efetivação do
direito à educação escolar com qualidade social.
O convênio entre FACED/UFRGS e MEC apresentou o desafio de participar
desse Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica Pública que fazia
parte das ações do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). A necessidade

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18 Apresentação

de se construírem processos de gestão escolar e de articulação entre as práticas e as


vivências das escolas e a teorização destas práticas foi o impulsionador desse desafio.
Resultado de uma caminhada de dezesseis anos de formação de professores e
gestores, este livro apresenta uma parte da trajetória do Curso Escola de Gestores
– especificamente a etapa de Coordenadores Pedagógicos.
O livro está estruturado em três partes. Na primeira, apresentaremos os artigos
que trazem a interação oportunizada nas salas-ambiente do MOODLE (ambiente
virtual) como um suporte importante de ambiente digital e que aprofundou a re-
lação entre o processo de construção e a articulação do trabalho pedagógico dos
docentes com os alunos cursistas. Evidenciou também o estímulo de um trabalho
colaborativo em que as demandas foram o fortalecimento da autonomia intelectual
dos cursistas. O MOODLE para alguns cursistas constituiu-se em novidade, mas
estes artigos nos conduzem para os resultados desse desafio.

PARTE I

Começamos apresentando o artigo da professora e coordenadora do curso,


Patrícia Marchand, A utilização do ambiente virtual MOODLE na formação
docente, que nos apresenta a importância de um Coordenador Pedagógico do-
minar a utilização do ambiente MOODLE como espaço de potência para estudos
e formações no interior da escola, desenvolvido na formação do curso Escola de
Gestores – Coordenadores Pedagógicos.
Na sequência, as professoras Denise Comerlato, Maria Otília Kroeff e Vera
Maria Vidal Peroni apresentam o artigo Contribuição da sala-ambiente “Políticas
Educacionais e Gestão Pedagógica” para as práticas dos coordenadores pedagó-
gicos. Elas abordam aspectos referentes à sala-ambiente “Políticas Educacionais
e Gestão Pedagógica” (PEGP). As autoras apresentam os pressupostos teórico-
-metodológicos que orientaram o planejamento da sala, enfocando a diferença
entre os princípios teóricos da gestão democrática e da gerencial, passando pelo
conceito de democracia e de gerencialismo como privatização endógena.
Os professores Jaime José Zitkoski e Paulo Peixoto de Albuquerque nos trazem
o artigo Formação de professores e direitos humanos: desafios para a coordenação
pedagógica, que trata da temática dos direitos humanos na formação de professo-
res trabalhada ao longo do desenvolvimento da sala-ambiente “Realidade Escolar
e Trabalho Pedagógico” (RETP). Para os autores, as ações político-pedagógicas
das propostas de formação de professores se caracterizam como educação cidadã,
porque o processo de construção de conhecimento e socialização de saberes se
dá na concretização de espaços de mediação social e de explicitação de conceitos
diferenciados voltados para a promoção dos direitos humanos em um país tão
desigual e injusto socialmente, como é o nosso.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 19

Cintia Inês Boll, Fabiane Penteado Galafassi e Silvana Corbelini apresentam


em seu artigo, O Wikilivros e as mídias móveis: um exemplo de como as diretrizes
curriculares nacionais para a educação básica podem ser reutilizadas, revisadas,
remixadas e redistribuídas entre professores, gestores appers, a organização dos
alunos nos trabalhos em grupo de forma cooperativa e com as ferramentas que
foram incorporadas às suas práticas como gestores, a partir das reflexões sobre os
usos dos aplicativos e utilização de apps desenvolvidos durante a sala para usos
diversos, agregando funcionalidades em suas atividades profissionais.
Iana Gomes de Lima, Luis Armando Gandin e Ricardo Boklis Golbspan
apresentam, no artigo O processo de aprendizagem de teorias de currículo na
educação continuada de coordenadoras pedagógicas: o caso de duas turmas de
um curso de especialização, a importância da sala-ambiente “Currículo, Cultura
e Conhecimento Escolar” (CCCE) no processo de aprendizagem das alunas. Os
autores, ao longo do desenvolvimento desta sala, fazem várias observações decor-
rentes das avaliações pedagógicas dos trabalhos.
Gustavo Andrada Bandeira apresenta o texto Uma breve avaliação de uma
disciplina sobre avaliação escolar, no qual busca mostrar a construção e o fun-
cionamento da sala-ambiente “Avaliação Escolar”, bem como o modo como as
atividades foram pensadas para proporcionar um maior diálogo entre cursistas e
de que forma responderam às suas provocações.
Karen Elisabete Rosa Nodari nos apresenta o artigo O papel do Coor-
denador Pedagógico frente à docência criadora, em que aborda de forma
mais específica uma atividade dissertativa da sala-ambiente “Aprendizagem
Escolar e Trabalho Pedagógico” (AETP) integrante do currículo do Curso. Foi
proposta a escrita de um ensaio a partir das seguintes questões: Qual o papel
do Coordenador Pedagógico no estímulo do professor-pesquisador? Que tipo
de ações ele pode criar enquanto gestão dos processos de aprendizagens ou de
educação permanente?
Graziella Souza dos Santos, Arthur da Silva Poziomyck e Luis Armando
Gandin, no artigo Contribuições da sala-ambiente “projeto político pedagógico
e organização do ensino” na construção da gestão democrática, refletem sobre o
desafio de elaborar junto aos cursistas, professores e coordenadores pedagógicos
de escolas públicas do Rio Grande do Sul, conhecimentos e reflexões acerca da
importância do Projeto Político-Pedagógico, frequentemente denominado PPP,
para a construção e vivência da gestão democrática.
Alexandre José Rossi e Juliana Selau Lumertz apresentam o artigo A
experiência da sala-ambiente “tópicos especiais”, que está dividido em três
partes. Na primeira apresentam a sala-ambiente por meio de explicitações que
envolvem a temática escolhida para ser abordada, a forma como se organizaram
e os professores que nela aturam. Na segunda, tratam do tema da diversidade
na escola, que foi o fio condutor da sala. E, por último, descrevem a análise

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20 Apresentação

do funcionamento e dos resultados da sala-ambiente com base nos relatos dos


professores e finalizam com algumas considerações sobre essa experiência.
E, para finalizar a primeira parte, Natália de Lacerda Gil e Caterine Vila Fa-
gundes apresentam o artigo Algumas reflexões sobre a sala-ambiente “metodologia
do trabalho científico”, em que elegem prioritariamente a pesquisa-ação – que
demanda que o pesquisador intervenha em uma problemática buscando uma
transformação – como abordagem de pesquisa a ser seguida no desenvolvimento
do TCC.

PARTE II

Na segunda parte deste livro, apresentamos os artigos que foram estruturando


o trabalho com a finalidade de elaborar o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)
dos cursistas.
Maria Goreti Farias Machado e Julliana Cunha Alves assinam o artigo For-
mação continuada de coordenadores pedagógicos: reflexões sobre as temáticas
dos trabalhos de conclusão, que traz uma reflexão acerca dos conteúdos explo-
rados pelos coordenadores pedagógicos nos respectivos TCC da segunda edição
do Curso de Especialização em Coordenação Pedagógica, por meio de uma breve
análise dos campos de interesse manifestados pelos cursistas de acordo com as
temáticas escolhidas, partindo da premissa de que a pesquisa qualitativa tem sua
ênfase no processo, e seu direcionamento surgiu no desenvolvimento da coleta de
dados e informações.
Leonardo Cardozo Vieira e Gustavo Andrada Bandeira apresentam o artigo
Significados atribuídos à inclusão escolar por docentes e funcionárias/os de uma
escola do interior do RS, no qual analisam os significados que os/as docentes e
funcionários/as de escola do interior de Arroio Grande atribuem à inclusão escolar.
Utilizando a metodologia qualitativa, o trabalho teve o questionário aberto como
instrumento para coleta de dados aplicados a docentes e funcionários/as de uma
escola municipal.
Angela de Fátima Linck de Jesus e Juliana Veiga de Freitas apresentam o
artigo As narrativas sobre o currículo escolar da língua estrangeira moderna:
teoria versus prática, no qual partem do currículo como eixo central da pesquisa.
Na primeira parte do artigo, trazem as concepções de currículo, a revisão históri-
ca das Políticas Nacionais do Ensino de Língua Estrangeira Moderna no Brasil e
apontamentos sobre o currículo da Língua Estrangeira descritos na Base Nacional
Comum Curricular. Na segunda, retratam a metodologia da pesquisa, a descrição
do contexto da pesquisa, dos participantes e dos instrumentos de coleta e análise.
Terminam descrevendo os procedimentos metodológicos, a produção dos dados
da pesquisa e o tratamento e a análise de dados.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 21

Daiane Scopel Boff e Igor Ghelman Sordi Zibenberg, no artigo O perfil docente
de um grupo de professores de uma instituição pública de ensino básico técnico e
tecnológico (ebtt): vocação e comprometimento social, apresentam detalhes sobre
o trabalho realizado, buscam construir um perfil, a partir dos docentes pesquisa-
dos, investigando algumas características pessoais, tais como sexo, idade, titulação,
trajetória acadêmica, experiências de trabalho, tempo de docência, aderência a
programas de iniciação científica durante a formação inicial. Com uma abordagem
basicamente qualitativa, a pesquisa utilizou procedimentos estruturados para a co-
leta de informações que foram analisadas em seguida por meio de procedimentos
estatísticos de tabulação, organização e apresentação de dados.
Graziela de Lourdes Demétrio Nunes e Luciano Bedin da Costa, no artigo
Perfil discente e repercussões de um núcleo de educação de jovens adultos (NE-
EJA), apresentam o perfil do jovem e do adulto que está inscrito em um Núcleo
de Educação de Jovens e Adultos na cidade de Porto Alegre, tendo sua base de
pesquisa centrada no ensino de jovens e adultos e a importância do Núcleo para a
conclusão dos seus estudos.
Miriam Mallmann Prates e Delci Heinle Klein, no artigo As implicações da
lei de gestão escolar democrática no município de Novo Hamburgo – RS no tra-
balho da coordenação pedagógica, apresentam algumas análises realizadas sobre
os reflexos da Lei n.º 2.015/2009, que regulamenta a Gestão Democrática Escolar
em Novo Hamburgo, RS, no trabalho do Coordenador Pedagógico. Debatem o
exercício da coordenação pedagógica e sua relação com o espaço de autoria, bem
como o tempo que seria necessário para a construção da identidade profissional,
uma vez que a legislação desse município prevê a eleição direta de diretores de
três em três anos.
Daiana Rosário da Rocha e Delci Heinle Klein, em artigo intitulado Plane-
jamento do professor em “tempos de internet”, apresentam uma reflexão sobre
como vem acontecendo a relação “Planejamento e internet” no âmbito escolar.
Com o objetivo de verificar se os professores, ao planejarem suas aulas, utilizam a
internet como ferramenta, e de que recursos disponíveis na rede lançam mão, além
da forma como fazem, foram levantados dados a partir de questionários virtuais
com vinte professores.
Andréa Lauermann Tassinari e Joseane Leonardi Craveiro EL Hawat, no
artigo Educação Integral: uma construção coletiva a partir de diversos saberes e
atividades formativas, abordam os desafios enfrentados para a implementação de
uma escola de turno integral na cidade de Porto Alegre no ano de 2015. A pesquisa
retrata a importância da educação integral para a comunidade e as expectativas
dos professores frente a essa nova proposta de trabalho.
Carla Ferreira Aguirre e Gabriela Maria Barbosa Brabo, no artigo O papel
do Coordenador Pedagógico na atuação do professor na Sala de Recursos Mul-
tifuncionais, apresentam um recorte de pesquisa realizada em escola estadual de

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22 Apresentação

ensino fundamental e médio localizada no município de Sant’Ana do Livramento/


RS, onde as ações voltaram-se para os coordenadores pedagógicos e o que têm de-
senvolvido para incentivar os professores especializados a fazerem uso da tecnologia
assistiva no Atendimento Educacional Especializado ofertado na sala de recursos.
O objetivo geral foi verificar o papel do Coordenador Pedagógico no incentivo ao
uso das tecnologias assistivas na sala de recursos.
E, fechando a segunda parte deste livro, Tatiane Mattiazzi e Amanda Cabette,
no artigo Processo de construção da nova grade curricular da Escola Estadual
de Ensino Fundamental Mercedes Motta – Santa Rosa/RS, frente à implantação
do tempo integral, apresentam a construção participativa com a Comunidade
Escolar da nova grade curricular da Escola Estadual de Ensino Fundamental Mer-
cedes Motta – Santa Rosa/RS, diante da implantação do tempo integral, buscando
compreender o contexto no qual a escola está inserida, descobrindo as áreas de
interesses dos alunos e pais e interligando os quereres e saberes da Comunidade
Escolar aos conhecimentos ditos científicos na construção desta grade curricular.

PARTE III

Para finalizar, na terceira parte deste livro, apresentamos os artigos com os


debates que atravessaram o curso nas diferentes salas entre professores e cursistas:
políticas públicas educacionais, política brasileira de financiamento da educação
básica e suas repercussões no desenvolvimento da educação escolar, o papel do
Coordenador Pedagógico dentro da escola e o levantamento sobre as temáticas
abordadas pelos coordenadores pedagógicos nos seus Trabalhos de Conclusão de
Curso (TCC).
Mariângela Bairros e Patrícia Marchand apresentam, no artigo Escola de Ges-
tores: o perfil dos coordenadores pedagógicos, o resultado de pesquisa realizada
junto aos coordenadores pedagógicos que participaram do curso de especialização
Coordenadores Pedagógicos Escola de Gestores, com o objetivo de realizar um
mapeamento da carga horária autorizada pelo Sistema de Ensino e escola para
a realização do Curso, jornada de trabalho, motivos para a realização do Curso
e a possibilidade e outras questões que geograficamente definem o papel deste
coordenador.
Neusa Chaves Batista, Eliane Helena Menegotti, Fátima Ehlert e Lúcia Fer-
nanda Ramires Félix, no artigo O papel da coordenação pedagógica no fortaleci-
mento da participação da comunidade na gestão escolar, discutem as narrativas
do papel da coordenação pedagógica em diferentes momentos históricos, políticos
e pedagógicos, buscando compreender o papel do Coordenador Pedagógico como
princípio da gestão escolar democrática. Analisam a apresentação e as implicações
teórico-práticas das políticas de educação e a gestão escolar democrática, com o

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 23

objetivo de relacionar o incremento da participação da comunidade escolar nesse


processo de materialização do papel do Coordenador Pedagógico na escola pública.
Andréia da Silva Mafassioli, no artigo O Coordenador Pedagógico e a ava-
liação institucional na perspectiva da gestão democrática, trata do papel exercido
pela coordenação pedagógica na esfera da gestão escolar, dentro da perspectiva da
gestão democrática, princípio constitucional. O foco é o processo de avaliação ins-
titucional participativo. Ela apresenta elementos teóricos e práticos sobre a atuação
da coordenação pedagógica na escola de educação básica e sua contribuição para
estabelecer estratégias de avaliação institucional, contemplando as dimensões de
autoavaliação e avaliação em larga escala.
Claúdia Zank e Patricia Alejandra Behar, no artigo Ferramentas dialógicas
em uma perspectiva freireana: um foco no fórum e no editor de texto coletivo,
discutem os recursos digitais que podem oportunizar e favorecer o diálogo nas
práticas pedagógicas, caracterizando-os, assim, como ferramentas dialógicas. Para
tanto, partem do pressuposto de que tanto os recursos quanto as práticas estão
sempre relacionados a uma concepção de educação. O diálogo freireano, perspec-
tiva adotada por elas, está presente em uma concepção de educação que entende
a participação popular e a gestão democrática como partes de uma pedagogia
participativa que influencia positivamente a aprendizagem.
Maria Luiza Flores destaca, no artigo Direito à educação infantil: perspectivas
para consolidação no contexto dos 20 anos da LDBEN, o fato de que, a partir da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei n.º 9.394/1996, o direito à
educação infantil foi incorporado como a primeira etapa da educação básica. Para
isso, organiza o texto a partir de dois objetivos principais. O primeiro deles é resga-
tar alguns marcos fundamentais da trajetória desta etapa referentes à sua garantia
como direito social, desde um conjunto de dispositivos legais e de documentos
orientadores de caráter indutor produzidos pelo Ministério da Educação (MEC).
O segundo se refere à sistematização de algumas ideias no sentido de contribuir
para a organização dessa oferta, em processo de expansão no âmbito dos sistemas
de ensino, de maneira a que a necessária ampliação do atendimento atenda aos
critérios e parâmetros de qualidade vigentes, sem desconsiderar ainda aspectos de
equidade, tendo em vista a realidade brasileira.
Graciele Marjana Kraemer e Adriana da Silva Thoma, no artigo Política de
inclusão escolar das pessoas com deficiência e a gestão escolar: desafios da es-
cola contemporânea, analisam uma série de documentos para desenvolver uma
discussão sobre os deslocamentos políticos que o Brasil tem vivido para colocar
em funcionamento a educação inclusiva. Para isso, utilizam a gestão escolar e os
desafios gerados para colocar em prática a política de inclusão escolar das pessoas
que possuem deficiência como questão norteadora. Mais do que se posicionar a
favor ou contra, as autoras buscam problematizar essa questão que tem sido tão
discutida atualmente.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 23 22/10/2018 14:27:22


24 Apresentação

Para terminar este livro, Alexandre José Rossi, Juliana Selau Lumertz e Daniela
de Oliveira Pires, no artigo As implicações das parcerias público-privadas na edu-
cação: uma análise do programa escola eficaz do Instituto Ayrton Senna, fazem
uma análise das implicações da relação “público-privada” na gestão democrática
da escola pública e as principais consequências que isso gera na democratização da
educação. Eles utilizam como referência a parceria entre o Instituto Ayrton Senna
e os diferentes municípios brasileiros.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 24 22/10/2018 14:27:22


Parte I

SALAS-AMBIENTE:
A CONTRIBUIÇÃO PARA A FORMAÇÃO
DO COORDENADOR PEDAGÓGICO

Livro Coordenação Pedagógica.indb 25 22/10/2018 14:27:22


Livro Coordenação Pedagógica.indb 26 22/10/2018 14:27:22
A utilização do ambiente virtual 0 1
MOODLE na formação docente

Patrícia Souza Marchand

Neste artigo, iremos abordar a utilização do ambiente virtual MOODLE como


um espaço de aprendizagem para a formação continuada dos professores que
realizaram a 2º edição do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Coordenação
Pedagógica oferecido pela Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul. O Curso teve duração de 18 meses, iniciando em março de 2015,
com carga horária total de 405 horas.
O Curso se desenvolveu no âmbito do Programa Nacional Escola de Ges-
tores da Educação Básica Pública, vinculado à Secretaria de Educação Básica do
Ministério da Educação – SEB/MEC. Sua operacionalização ocorreu de forma
descentralizada, sob responsabilidade de Instituições Públicas de Ensino Superior
e em colaboração com a Secretaria de Educação à distância (SEED) e do Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). O objetivo foi formar, em
nível de pós-graduação lato sensu, coordenadores pedagógicos que atuam em
instituições públicas de educação básica.
Tivemos a participação de um total de 423 discentes, distribuídos em dez
polos pelo Rio Grande do Sul. A estrutura pedagógica contava com um coorde-
nador geral, um supervisor pedagógico, dois assistentes pedagógicos e dez tutores
presenciais, 47 professores pesquisadores.
Os princípios norteadores do Curso foram o direito à educação, a gestão
democrática, formação continuada crítica e promotora da identidade profissional,
articulação teoria-prática e integração de elementos curriculares.
A matriz curricular do Curso foi organizada em salas-ambiente abaixo apre-
sentadas.
• sala-ambiente Introdução ao Curso e ao Ambiente Virtual de Aprendi-
zagem. (15 horas)
• sala-ambiente Realidade Escolar e Trabalho Pedagógico. (30 horas)
• sala-ambiente Projeto Político-Pedagógico e Organização do Ensino. (45
horas)
• sala-ambiente Currículo, Cultura e Conhecimento Escolar. (45 horas)
• sala-ambiente Avaliação Escolar. (45 horas)

Livro Coordenação Pedagógica.indb 27 22/10/2018 14:27:23


28 A utilização do ambiente virtual MOODLE na formação docente

• sala-ambiente Práticas e Espaços de Comunicação na Escola. (45 horas)


• sala-ambiente Aprendizagem Escolar e Trabalho Pedagógico. (45 horas)
• sala-ambiente Políticas Educacionais e Gestão Pedagógica. (45 horas)
• sala-ambiente Tópico Especial. (30 horas)
• sala-ambiente Metodologia do Trabalho Científico. (60 horas)
Assim, neste artigo iremos analisar a utilização do ambiente virtual MOODLE
como espaço de aprendizagem a partir do trabalho desenvolvido na sala-ambiente
Introdução ao Curso ao Ambiente Virtual MOODLE. Para isto, foi realizada uma
análise da fala dos alunos em diversas atividades desenvolvidas durante essa sala-
-ambiente.

O AMBIENTE VIRTUAL DE APRENDIZAGEM

A educação à distância é uma modalidade que tem ganhado destaque nas po-
líticas públicas para formação docente no Brasil. Isto muito se deve por oportunizar
cursos de formação em regiões onde a oferta de se apresenta ainda insuficiente. Isto
faz com que essa modalidade de ensino venho sendo muito utilizada na formação
para professores das redes públicas de ensino.
A educação à distância, com o uso das tecnologias de informação e comu-
nicação (TICs) no processo de ensino e aprendizagem, pode ocorrer em lugares e
tempos diversos. Essa talvez seja a sua principal característica: democratizar o acesso
ao conhecimento. O fato de oportunizar o processo de ensino e aprendizagem em
lugares e tempos diversos tem se mostrado como fator relevante para o crescente
número de professores que se matriculam em cursos de formação continuada à
distância.
O Ministério da Educação, por meio do Sistema UAB (Universidade Aberta
do Brasil), tem procurado expandir e interiorizar a oferta de cursos e programas de
educação superior no Brasil na modalidade de educação à distância nas instituições
públicas de ensino superior, com o objetivo de contribuir para a Política Nacional
de Formação de Professores.
Diante de tamanha abrangência, o grande desafio se torna viabilizar essa
formação à distância, com espaços amigáveis, compreensíveis para os discentes
que muitas vezes nunca fizeram um curso à distância e por isto não possuem fa-
miliaridade com ambientes virtuais de aprendizagens (AVA).
A utilização de novos espaços de aprendizagem para a formação docente
tem sido muito utilizada na formação continuada de professores e tem crescido
significativamente nos últimos anos.
No contexto de formação continuada do professor, a educação à distância via internet
tem se tornado uma referência para o desenvolvimento de propostas que enfatizam

Livro Coordenação Pedagógica.indb 28 22/10/2018 14:27:23


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 29

a interação entre os participantes e o desenvolvimento do trabalho colaborativo.


(PRADO; ALMEIDA, 2002. p. 12)

Os ambientes virtuais de aprendizagem (AVA) estão cada vez mais presentes


nos espaços acadêmicos. Isto muito se deve à grande demanda por formação tanto
inicial quanto continuada.
Em um ambiente virtual de aprendizagem, cada pessoa tem a oportunidade de
percorrer distintos caminhos, nós e conexões existentes entre informações, textos e
imagens; criar novas conexões, ligar contextos, mídias e recursos. Cada nó representa
um espaço de referência e interação que pode ser visitado, explorado, trabalhado,
não caracterizando local de visita obrigatória. (ALMEIDA, 2002, p. 8)

A possibilidade de o aluno percorrer distintos caminhos dentro desse espaço


permite uma construção autônoma da aprendizagem, característica relevante na
modalidade de educação à distância.
Compõem os ambientes virtuais de aprendizagem várias ferramentas que pos-
sibilitam a interação entre os participantes do curso, a organização do conteúdo a
ser trabalhado e o gerenciamento das informações pedagógicas referentes aos parti-
cipantes do curso e de informações relativas à administração/ configuração do AVA.
Cabe destacar que esses espaços dependem de uma boa organização e de um
bom planejamento por parte dos professores para o uso adequando e qualificado
destas ferramentas. Como diz Almeida (2002, p. 23),
O uso que se faz destas ferramentas depende do objetivo do professor e das caracte-
rísticas dos participantes (necessidades e/ou interesses). Embora estas ferramentas
sejam de extrema importância, cabe ao professor dar vida, ou seja, dinamizar o seu
uso com os alunos. Geralmente, estas ferramentas, do ponto de vista técnico, são
simples de serem manipuladas, mas as possibilidades e implicações pedagógicas
dependem da (re)significação que o professor pode fazer no contexto do curso.

A utilização de ambientes virtuais de aprendizagem como suporte para o pro-


cesso de ensino e aprendizagem permite ao docente acesso a várias possibilidades
de uso das tecnologias, pois “esses ambientes permitem a utilização de materiais
didáticos em formatos variados que podem ser trabalhados por uma equipe mul-
tidisciplinar desde a sua construção até a finalização do curso, com vista a explorar
todo o potencial dos recursos” (PAIXÃO, CAZORLA; RAMOS, 2012, p. 4).
Para a realização deste Curso foi utilizada a plataforma MOODLE (Modular
Object Oriented Dynamic Learning Environment), um programa livre voltado para
o desenvolvimento e à implementação de ambientes virtuais de ensino-aprendiza-
gem que servem de apoio a cursos e as atividades à distância, como este. Através do
MOODLE, é possível por meio da internet oportunizar para os cursistas o uso de
recursos voltados para a interatividade entre usuários e a publicação de conteúdos,
além de permitir o controle e a avaliação à distância das atividades desenvolvidas.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 29 22/10/2018 14:27:23


30 A utilização do ambiente virtual MOODLE na formação docente

Este ambiente permite a utilização de um amplo número de recursos, o que permite


maior flexibilização para a formatação do curso.
O principal objetivo do MOODLE vem sendo o apoio à aprendizagem online,
destacando-se dos outros ambientes virtuais por suas características mais voltadas
para as necessidades pedagógicas e por sua flexibilidade no que diz respeito à va-
riedade de recursos e opções de customização que oferece, favorecendo a autoria
dos professores no ambiente virtual. (BURNHAM et.al, 2015, p. 177)

A SALA-AMBIENTE DE INTRODUÇÃO AO CURSO


E O AMBIENTE VIRTUAL MOODLE

Para que os cursistas pudessem se familiarizar e ter o domínio de ferra-


mentas que compõem o ambiente virtual de aprendizagem, foi oferecido como
primeira sala-ambiente do Curso “A Introdução ao Curso e ao Ambiente Virtual
de Aprendizagem”, sendo, portanto, o ponto de partida para o desenvolvimento
das atividades presenciais e à distância do curso. O principal objetivo desta sala-
-ambiente foi apresentar o Curso de Especialização em Coordenação Pedagógica
e familiarizar os cursistas com o ambiente virtual MOODLE, onde o Curso se
desenvolveu.
As atividades propostas visavam à utilização das ferramentas e funcionalidades
do MOODLE, para que assim os cursistas tivessem a oportunidade de se familiari-
zar com elas e ao mesmo tempo se apropriarem da proposta pedagógica do Curso.
A carga horária desta sala-ambiente foi de 15 horas, sendo que parte dela foi
realizada presencialmente e outra à distância.
Neste primeiro contato dos alunos com o Curso, tornou-se imprescindível um
momento presencial para que eles realizassem o acesso ao ambiente e começassem
a trabalhar com as ferramentas que viriam a ser utilizadas durante o Curso pelas
demais salas-ambiente.
As atividades desenvolvidas tinham como objetivo que os alunos acessassem
o MOODLE e conhecessem esse ambiente.
Os recursos apresentados foram:
• Alterando dados cadastrais
• Recuperação de senha
• Notas
• Participantes e mensagens
• Fórum
• Base de dados
• Tarefa

Livro Coordenação Pedagógica.indb 30 22/10/2018 14:27:23


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 31

• Glossário
• Chat
Para a utilização dos recursos, foram desenvolvidas dez atividades sendo que
seis estavam relacionadas aos recursos de comunicação (mensagens, fóruns e chat)
e quatro atividades estavam relacionadas aos recursos de atividades (tarefas, base
de dados e glossário).

UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS DE COMUNICAÇÃO

Com o objetivo de que os alunos pudessem conhecer seus colegas, tutores e


professores, a primeira atividade desenvolvida foi a alteração dos dados cadastrais
que permitiu a atualização dos seus perfis. Nesta atividade, além de atualização
dos dados cadastrados, foi solicitado que preenchessem o espaço destinado à
sua descrição/apresentação e que inserissem uma foto para identificação na
plataforma. Esse recurso permite aos alunos que se apresentem aos colegas,
professores e tutores.
A segunda atividade estava relacionada ao envio de mensagens. Para isto,
foi solicitado que os alunos clicassem no box “participantes” e, além do professor,
escolhessem um dos colegas para enviar uma mensagem, estabelecendo contato
com colegas e professores. A utilização de mensagens é de extrema importância
para realização de um curso à distância que utiliza um AVA, pois possibilita o
contato direto com seu professor, tutor ou colega. É um dos recursos que pro-
porciona maior aproximação, pois permite um contato mais direto. Além disto,
nesta atividade foi trabalhada a comunicação por meio da utilização do box
“mensagens”.
O recurso do fórum foi também trabalhado. A utilização deste recurso é
sempre muito importante em cursos que utilizam o AVA, pois, na medida em que
o curso é desenvolvido, debates são propostos e conduzidos pelos professores e é
no fórum que os debates acontecem. Para trabalhar com o recurso, foram propos-
tas duas atividades. Uma em que eles pudessem trabalhar com a possibilidade de
apenas responder à proposta de debate feita pelo professor e outra em que pudes-
sem inserir questões para gerar debates no fórum, independentemente da questão
apresentada pelo professor.
O chat foi trabalhado como uma forma possível de comunicação entre alunos,
professores e tutores de forma síncrona (permite a comunicação em tempo real).
Para isso, foi trabalhado o acesso ao chat e suas ferramentas.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 31 22/10/2018 14:27:23


32 A utilização do ambiente virtual MOODLE na formação docente

UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS DE ATIVIDADES

Os recursos relacionados à realização de atividades foram trabalhados nesta


sala-ambiente, pois foram utilizados nas demais salas-ambiente como locais para
a realização das tarefas propostas.
Desta forma, foi trabalhado com os alunos o recurso “base de dados”, que
possibilita o armazenamento e a disponibilização de arquivos para todos os par-
ticipantes, fazendo muitas vezes o papel de uma biblioteca. Foram desenvolvidos
com os alunos o envio de arquivos e o acesso de arquivos já disponibilizados neste
recurso pelos professores e colegas.
A ferramenta denominada “tarefa” foi trabalhada com objetivo de possibilitar
que os alunos tomassem conhecimento de uma das ferramentas que mais seriam
utilizadas no Curso. O recurso “tarefa” tem a função de armazenar e disponibilizar
arquivos ou textos individuais. O material enviado por meio do recurso não poderá
ser visualizado por outros participantes, mas apenas pelo próprio autor, professores
e tutores. As atividades propostas trabalharam com as ferramentas deste recurso,
como formatação de texto, tipo de arquivo a ser enviado e tamanho do arquivo,
com o envio de tarefas online, que permite aos alunos digitar um texto dentro do
ambiente no navegador para a tarefa, e o envio de tarefas, que possibilita os alu-
nos enviarem um ou mais arquivos como tarefa. Por fim, foi trabalhado o recurso
“glossário”. Essa atividade possibilitou aos participantes criarem e atualizarem uma
lista de definições, como em um dicionário.
Após a realização dessas tarefas, foi possível identificar as concepções que os
cursistas apresentavam sobre a educação à distância e as suas apreciações quanto
ao uso do MOODLE no curso de especialização.

A EXPERIÊNCIA DOS DISCENTES NA UTILIZAÇÃO DO MOODLE

Por diversas oportunidades, durante a realização das atividades propostas pela


sala-ambiente Introdução ao Curso e ao Ambiente Virtual MOODLE, os alunos
evidenciaram suas concepções sobre a formação docente na modalidade à distância
e a utilização do AVA como espaço de aprendizagem.
Através de relatos, foi possível identificar suas impressões sobre:
• O MOODLE como ambiente de aprendizagem na formação docente
• A educação à distância na formação docente e o uso da tecnologia

Livro Coordenação Pedagógica.indb 32 22/10/2018 14:27:23


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 33

O MOODLE COMO AMBIENTE DE APRENDIZAGEM


NA FORMAÇÃO DOCENTE

Sobre a utilização do ambiente virtual e a metodologia utilizada no Curso, os


discentes na sua maioria classificaram como uma experiência enriquecedora, pois
permitiu que vários colegas de profissão pudessem se conectar independentemente
do local de trabalho. O que reforça o papel da educação à distância como meio para
que a formação ocorra em diversos locais e tempos, possibilitando, no caso deste
Curso, que trocas de experiências significativas entre os alunos pudessem ocorrer.
Isso foi possível evidenciar nas falas que seguem.

Acho muito interessante este tipo de metodologia utilizada neste curso. Ao


usar a internet como principal ferramenta podemos estar conectados com
diversos colegas de profissão de vários municípios. Assim a troca é mais
enriquecedora pois teremos conhecimento de outras realidades e como os
profissionais da educação estão atuando em suas escolas. Será um grande
momento de trocas e aprendizado.

Muitos relataram que estavam tendo o primeiro contato com este tipo de
ambiente virtual, o que, num primeiro momento, remeteu a sensações de angústia
e medo pelo desconhecido. Porém, com o trabalho realizado na sala-ambiente de
Introdução ao Curso e ao Ambiente Virtual MOODLE, logo os alunos constataram
a sua importância para a realização do Curso, como podemos ver nas falas que
seguem.

Neste primeiro momento do curso, é possível perceber que o trabalho no


ambiente virtual é de vital importância para o sucesso desta formação.

Ao ouvir falar do Ambiente Virtual, fiquei com muitas dúvidas e preo-


cupada se eu aprenderia utilizar esta ferramenta. Agora conhecendo o
ambiente e com as explicações da Professora, estou satisfeita e percebo que
será de fácil compreensão e assim irá facilitar para nos mantermos um
contato e compartilhar ideias com os colegas e professores.

É muito interativo, só é necessário que conheçamos a ferramenta que esta-


mos utilizando. Minha maior dificuldade foi saber onde clicar para aces-
sar as atividades, ver se foram postadas ou não.

Tenho tido dificuldade devido meu analfabetismo digital. Espero que com
o tempo possa sentir-me mais segura, por enquanto vou precisar de muito
empenho para acompanhar e realizar todas as atividades que me serão so-
licitadas. Estou um tanto insegura quanto a buscar as atividades, utilizar
o chat, ativar os fóruns.

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34 A utilização do ambiente virtual MOODLE na formação docente

A forma como o MOODLE estava organizado e a necessidade de ter conhe-


cimento sobre a utilização dos recursos do AVA apareceram como preocupação
dos alunos. Isso evidencia que, para que os alunos tenham uma boa experiência
na utilização do AVA como um espaço de aprendizagem, é necessário que o aluno
esteja apto a utilizar os recursos disponíveis e que o AVA tenha uma boa organi-
zação pedagógica do espaço e um design que permitam um processo de ensino
aprendizagem qualificada. O uso da tecnologia não pode se tornar um empecilho
para o desenvolvimento do aluno; assim, a formação deste aluno para utilização
deste ambiente como um ambiente de aprendizagem é fundamental.
Sobre a organização e utilização dos recursos no MOODLE, os alunos de-
monstraram certa dificuldade inicial, mas como algo possível de ser superado.
Salientaram também a organização da plataforma e as orientações disponibilizadas
como algo que facilitou o processo de ambientação e realização das tarefas. Segue
fala dos alunos:

A plataforma está prática em suas orientações, sendo assim, apresenta-se


de modo a nos facilitar nos encaminhamentos das tarefas.

Saber navegar nos diferentes espaços, participar dos fóruns, enviar men-
sagens, comunicar-se com os colegas e ter acesso a tudo o que está sendo
produzido em tempo real faz com que se tenha a certeza de que há muito
conhecimento sendo compartilhado, de que sempre é possível fazer uma
troca significativa.

É a primeira vez que faço um curso à distância. Tive algumas dificulda-


des. Acho difícil o chat, pois o que eu gosto mesmo é conversar com as
pessoas olhando olho no olho. Mas não há nada que com força de vontade
a gente não consegue.

O instrumento Fórum é interessante pois, acaba aproximando os discentes


e proporciona a possibilidade de lançar temas para serem discutidos, sen-
do que a discussão é importante para podermos construir conhecimento e
conceitos ao longo do curso.

Gostaria de destacar a ferramenta fórum, que nos permite grande inte-


ração, troca de experiências e de informações consistentes, de uma forma
dinâmica e séria.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 34 22/10/2018 14:27:23


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 35

A EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA NA FORMAÇÃO


DOCENTE O USO DA TECNOLOGIA

Em relação à realização de um curso de formação à distância, muitos relatam


ser esse um grande desafio.
As falas dos alunos permitem identificar elementos considerados relevantes
na oferta de um curso à distância para formação docente. A necessidade de um
maior comprometimento dos alunos com os estudos propostos, a identificação da
formação à distância como uma nova forma de agregar conhecimento, a possibi-
lidade de inclusão de alunos que, se não fosse um curso EaD não poderiam estar
se qualificando devido a carga horária de trabalho, a flexibilidade com os horários
para realização dos trabalhos e leituras solicitadas, são alguns destes elementos,
como podemos verificar a seguir.

É a primeira vez que estou realizando um curso online, onde recebemos


atividades e explicações, materiais de apoio para pesquisa, troca de ideia
entre professor e colegas, construímos o conhecimento, analisamos nossas
respostas, recebemos orientações, enfim acontece a aprendizagem. Estou
adorando o curso, estou aprendendo como se estivesse com aulas presen-
ciais. E um fator importante é que conseguimos nos organizar de acordo
com nosso tempo disponível, após um dia cheio de trabalho podemos che-
gar em casa e realizar nossas atividades com êxito.

Acredito que todo curso à distância requer do estudante um maior com-


prometimento e envolvimento com todas as ferramentas e estudos ofere-
cidos. Gosto de desafios e de dividir meus conhecimentos, ansiedades e
perspectivas sobre a educação.

Creio que para muitos é novidade, assustador, para mim esse cenário vir-
tual é uma nova forma de agregar conhecimento, já que o tempo na atua-
lidade é reduzido diante das demandas profissionais e pessoais.

O estudo através das ferramentas de EAD promove a inclusão de muitos


estudantes que de outra forma não poderiam acessar ou disponibilizar um
horário fixo para a atividade de qualificação.

Vimos que nos dias atuais os cursos on-line, em EAD, estão aprimorando-
-se cada vez mais, sendo um facilitador de conhecimentos. Com isto dan-
do oportunidades para que possamos nos atualizar e continuares nossos
estudos.

A educação à distância é uma ferramenta atual e importante que facilita


muito o acesso à educação e principalmente à especialização, uma vez

Livro Coordenação Pedagógica.indb 35 22/10/2018 14:27:23


36 A utilização do ambiente virtual MOODLE na formação docente

que, a disponibilidade de horário para estudos presenciais torna-se cada


vez mais escasso tendo em vista o excesso de atribuições que o dia-a-dia
acaba nos impondo. Na tranquilidade de nossos lares podemos, de uma
forma mais tranquila, responder de forma eficiente às questões que são
propostas e, da mesma forma, podemos nos comunicar com colegas e tro-
carmos experiências.

Como podemos ver, a questão da organização do tempo para a realização das


leituras e tarefas foi identificada como sendo um desafio, ainda mais para professores
que, na sua grande maioria, trabalham 40 horas. Do total de alunos do curso por
volta de 77% trabalha 40 horas e 17,5% trabalha 60 horas.
Como barreiras a serem superadas para a realização de um curso à distância,
foram identificados alguns fatores. A dificuldade no uso da tecnologia é apontada
por muitos como dificuldade a ser superada, para que não se transforme em bar-
reira. A pouca fluidez na comunicação entre professor e aluno foi considerada um
possível obstáculo na realização do curso. A necessidade de maior organização para
a realização de um curso à distância também aparece como sendo possível obstáculo.

Para nós, que estamos nos alfabetizando nas questões tecnológicas, não é
muito fácil realizar um curso neste formato, pois como a professora falou
no início das atividades, o nosso maior desafio é organizar nossos horários
para realizar as atividades.

São desafios e barreiras, que a minha geração, está tendo que enfrentar
e que as novas gerações, que já nasceram em um mundo tecnológico já
saem em vantagem.

Na verdade é a primeira vez que tenho contato com este tipo de sistema,
minha graduação foi presencial, minha pós também, nunca fiz nenhum
curso à distância. De uma forma geral estou um pouco aflita e ansiosa em
utilizar as ferramentas mas não estou encontrando grandes dificuldades.
Aos poucos espero ir me acostumando mais.

A realização do curso e a utilização destas ferramentas nos trazem uma


nova forma de formação ainda não experimentada por mim, por isso
muitas vezes surgem dúvidas, mas que com tranquilidade e empenho são
sanadas. Estou me sentindo muito feliz em poder agregar esta experiência
ao meu currículo ampliando meus conhecimentos.

São desafios e barreiras, que a minha geração está tendo que enfrentar
e que as novas gerações, que já nasceram em um mundo tecnológico já
saem em vantagem.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 37

É a primeira vez que participo de um curso utilizando um ambiente virtu-


al. Para mim é um desafio muito grande, pois sempre fui muito resistente
em aprender utilizando novas tecnologias. O sentimento que tenho é de
aprender a andar de bicicleta. Depois de muitas tentativas, vou conseguir
pois sei que o que nos move é sempre a vontade de ir além e é com este
sentimento que estou agora. Espero chegar até o final do curso.

Acredito que a vivência no ambiente da Educação à distância pode ser tão


proveitosa quanto ao da Educação Presencial, uma vez que o recurso per-
mite a rapidez na troca e o compartilhamento de conhecimentos. Porém,
alguns pontos podem travar a agilidade da comunicação e, consequente-
mente, o êxito das atividades, pois diferente do contato presencial, a dinâ-
mica do diálogo com a utilização das ferramentas do ensino à distância
pode complicar o entendimento e a realização das atividades se a troca
das informações/ orientações não ocorrer de maneira rápida e fluida.

A Educação à distância é um grande desafio, é preciso organização e mui-


ta força de vontade para alcançar os próprios objetivos e os desafios pro-
postos pelos professores e tutores.

Estou começando, pela primeira vez, um curso à distância. Estou encon-


trando um pouco de dificuldade, mas é um desafio, que vou tentar ven-
cer. Acho a tecnologia algo maravilhoso. Neste início me parece um pouco
complicado, mas, sem dúvida, vou aprender e vou terminar este curso sa-
bendo mto mais sobre coordenação pedagógica e sobre tecnologia. Essa é
minha expectativa.

Cabe destacar ainda que grande parte dos alunos relata a importância das aulas
presenciais, mesmo sendo este um curso à distância. Isto muito se deve ao fato de
esses alunos trazerem a cultura da educação presencial e sentirem a necessidade
de, pelo menos em algum momento, terem a troca com professores e colegas de
forma presencial. Como podemos verificar nas falas dos alunos, muitos relatam
o momento da aula presencial como sendo importante para sanar dúvidas e, com
isso, evidenciam a dificuldade que ainda possuem na utilização do ambiente virtual
de aprendizagem como uma sala de aula e na interação via ferramentas disponi-
bilizadas no AVA com os professores.

Considero que as informações na aula presencial do curso foram muito


importantes pelas questões de adequação do tempo, do será pensado para
realizar a pesquisa e as atividades propostas.

Acho importante os encontros presenciais, pois dão o gás necessário que


precisamos para quando estivermos à distância.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 37 22/10/2018 14:27:23


38 A utilização do ambiente virtual MOODLE na formação docente

Os encontros presenciais são de suma importância quando se faz um cur-


so à distância. Os encontros presenciais são importantes, pois trocaremos
ideias com os colegas, interagindo com o grupo na troca de conhecimentos.

Esta primeira aula presencial foi muito importante, pois nela tivemos a
oportunidade de acessar a plataforma conhecer e tirar as dúvidas que fo-
ram surgindo. Realizar as atividades com o auxílio da professora que foi
atenta a cada detalhe ao que estávamos fazendo.

Certamente, como se está diante de algo novo, surgem também dúvidas e


anseios, no entanto acredito que o formato do curso, com aulas presenciais
intercaladas com atividades a distância trará a segurança e a tranqui-
lidade necessárias para que o andamento do mesmo ocorra com muito
sucesso.

O encontro presencial foi fundamental para conhecimento da plataforma


e do funcionamento do curso.

A aula presencial é de extrema importância, pois nos possibilita a oportu-


nidade de sanar dúvidas. E no que se refere à esta primeira aula, foi muito
significativa pois é o momento de início do acesso à plataforma, momento
de navegar pela página, de aprender a usar as ferramentas que o sistema
nos disponibiliza.

A educação à distância, além dos desafios e obstáculos de um curso de


pós-graduação, possui uma especificidade: a plataforma on-line exige
comprometimento para a realização das atividades e disciplina para “não
se perder pelo caminho”. Contudo, os encontros presenciais além de tirar
dúvidas aproximam os cursistas e isto é um agregador. Por mais que não
tenhamos todos os encontros juntos. A proximidade dos encontros físicos
dá mais sentimento às trocas de experiências e dificuldades. Por mais que
a internet aproxime as pessoas, há uma necessidade de encontros não vir-
tuais. Isto deixa as vivências mais significativas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A necessidade de utilização do AVA para a realização do curso foi um desafio a


ser enfrentado para muitos alunos, como pôde ser constatado nas suas falas. Deve-se
destacar, entretanto, que a tecnologia não se tornou um obstáculo para a realização
deste Curso de formação. Muitos souberem utilizar as dificuldades enfrentadas na
formação como uma forma de se aproximaram do uso da tecnologia a seu favor.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 38 22/10/2018 14:27:23


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 39

A autonomia proporcionada pelo curso à distância oferecido no AVA foi um


fator destacado pelos alunos, assim como a flexibilidade para a realização das tarefas
em relação aos horários, possibilitando que muitos alunos pudessem realizar as
atividades propostas conforme suas disponibilidades de horários.
A ambientação dos alunos no MOODLE para a realização de um curso à dis-
tância é imprescindível para a realização do mesmo. Esta primeira sala-ambiente de
introdução ao AVA possibilita que muitos alunos tenham pela primeira vez contato
com estes ambientes e, com isto, percam o temor da tecnologia. O receio e o medo
com o uso da tecnologia e o desconhecimento sobre este espaço de aprendizagem
podem se tornar uma barreira para muitos e, desta forma, se não bem trabalhada,
levar a que muitos abandonem o curso não pela dificuldade com as questões rela-
cionadas ao conteúdo e sim pela dificuldade com a tecnologia.
Desta forma, não podemos desconsiderar que a utilização de um ambiente
virtual é um grande desafio para muitos alunos que estão realizando cursos à
distância. A tecnologia ainda é um grande desafio para muitos, porém, grande
parte dos alunos identificou o Curso como uma oportunidade de se aproximar
desta modalidade de ensino, que se utiliza da tecnologia, e assim adquirir novos
conhecimentos.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Maria Elizabeth Bianconcini. Gestão de tecnologias na escola. Boletim Salto para o Fu-
turo. Tecnologia e educação: novos tempos, outros rumos. MEC, 2002. Disponível em: http://cdnbi.
tvescola.org.br/resources/VMSResources/contents/document/publicationsSeries/1426096028139.
pdf. Acessado em: outubro de 2017.
BURNHAM, Teresinha Fróes; SOUZA, Fábio Kalil de; ARAUJO, Maristela Midlej Silva de; RICCIO,
Nícia Cristina Rocha. PEREIRA, Socorro Aparecida Cabral. Ambientes virtuais de aprendizagem; o
MOODLE como espaço multirreferencial de aprendizagem. Formação de professores para docência
online: uma experiência de pesquisa online com programas de pós-graduação. 1º edição. Santo Tirso:
Whitebooks, 2015.
PAIXÃO, Ana Lúcia Purificação da; CAZORLA, Irene Maurício; RAMOS, Kátia Souza de Lima.
A importância do design instrucional nos cursos virtuais para formação continuada dos profissio-
nais da educação: um estudo de caso. 2012. Disponível em: http://www.abed.org.br/congresso2012/
anais/334f.pdf
PRADO, Maria Elisabette Brisola Brito. Educação à distância: os ambientes virtuais e algumas pos-
sibilidades pedagógicas. Boletim Salto para o Futuro. Tecnologia e educação: novos tempos, outros ru-
mos. MEC, 2002. Disponível em: : http://cdnbi.tvescola.org.br/resources/VMSResources/contents/
document/publicationsSeries/1426096028139.pdf. Acessado em: outubro de 2017.
PRADO, Maria Elisabette Brisola Brito; ALMEIDA, Maria Elizabeth Bianconcini. A distância e a
formação continuada do professor. Boletim Salto para o Futuro. Tecnologia e educação: novos tempos,
outros rumos. MEC, 2002. Disponível em: http://cdnbi.tvescola.org.br/resources/VMSResources/
contents/document/publicationsSeries/1426096028139.pdf. Acessado em: outubro de 2017.

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Contribuição da sala-ambiente 0 2
“políticas educacionais e gestão
pedagógica” para as práticas dos
coordenadores pedagógicos

Denise Comerlato
Maria Otília Kroeff Susin
Vera Maria Vidal Peroni

Este artigo aborda aspectos referentes à sala-ambiente “Políticas Educacio-


nais e Gestão Pedagógica” (PEGP), do Curso de Especialização em Coordenação
Pedagógica, do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica. Na
primeira parte, trataremos dos pressupostos teórico-metodológicos que orientaram
o planejamento da sala, enfocando os princípios teóricos da gestão democrática
e da gerencial, passando pelos conceitos de democracia e de gerencialismo como
privatização endógena. Na segunda parte, apresentaremos aspectos referentes à
elaboração coletiva do conteúdo da sala, em um exercício de democracia, como
coletivização das decisões, abordado ao longo do artigo. Apresentaremos as ativi-
dades desenvolvidas entremeadas com análises acerca dos limites e possibilidades
dos objetivos propostos para a sala.

GESTÃO DEMOCRÁTICA E GESTÃO GERENCIAL

Entendemos que as propostas de gestão democrática e gestão gerencial não


são apenas formas de gestão educacional, mas parte de propostas societárias dis-
tintas, construídas por sujeitos individuais e coletivos1 em um processo histórico
de correlação de forças. Iniciamos apresentando o conceito de democracia.
A democracia não é entendida como uma abstração, mas como materialização
de direitos e de igualdade social2 (WOOD, 2003) e “coletivização das decisões”
(VIEIRA, 1998), com efetiva participação na elaboração de políticas com base na
prática social crítica e autocrítica no curso de seu desenvolvimento (MÉSZÁROS,

1 Sujeitos individuais e coletivos na concepção de Thompson (1981).


2 Sobre a não separação entre o econômico e o político, ver Wood (2003).

Livro Coordenação Pedagógica.indb 41 22/10/2018 14:27:23


42 Contribuição da sala-ambiente “políticas educacionais e gestão pedagógica” para ...

2002); (PERONI, 2015). É importante ressaltar a especificidade brasileira, pois


os avanços das lutas por direitos sociais ocorreram no momento pós-ditadura na
década de 1980, mesmo período de crise do modelo fordista/keynesiano. Em seu
lugar, o capitalismo propunha um conjunto de estratégias para retomar o aumento
das taxas de lucro, reduzindo direitos, com graves consequências para a constru-
ção da democracia e da efetivação dos direitos sociais, materializados em políti-
cas públicas, dando lugar ao que temos chamado de “naturalização do possível”
(PERONI, 2003; 2006; 2013). Assim sendo, se as redefinições no papel do Estado
em âmbito internacional apresentam importantes implicações para o processo de
democratização e minimização de direitos universais e de qualidade para todos,
esse processo é ainda mais problemático em países que viveram ditaduras e estão
em um processo recente de luta por direitos materializados em políticas.
Ressaltamos que no Brasil, a garantia do acesso à educação pública foi amplia-
da, o que consideramos um avanço nesse processo. No entanto, também verificamos
a presença cada vez maior do privado mercantil definindo a educação pública. O
Estado continua sendo o responsável pelo acesso e inclusive amplia as vagas públicas,
mas o “conteúdo” pedagógico e de gestão da escola é cada vez mais determinado
por instituições que introduzem a lógica mercantil, com a justificativa de que, ao
agir assim, estão contribuindo para a qualidade da escola pública.
Em nossas pesquisas, analisamos as várias formas de relação entre o público
e o privado na educação básica. Neste artigo discutiremos, particularmente, a
privatização endógena. A privatização endógena, “[...] envolve a importação de
ideias, técnicas e práticas do setor privado a fim de tornar o setor público mais
mercadológico e mais parecido com as empresas” (BALL; YOUDELL, 2008, p. 14).
[...] funciona para produzir novos sentimentos, incentivos e lógicas para os profes-
sores. Esses processos demonstram que há efeitos negativos para o profissionalismo
docente em termos de perda de autonomia e autoridade, intensificação do trabalho,
desqualificação e o rompimento das negociações coletivas pela individuação. (BALL
et al., 2013, p. 14).

A privatização exógena está vinculada ao lucro: “[...] envolve a abertura dos


serviços da educação pública para a participação do setor privado em bases lucra-
tivas e utilizando o setor privado para planejar, gerenciar ou fornecer partes da
educação pública” (BALL; YOUDELL, 2008, p. 22).
Advertimos que a gestão gerencial é parte da luta do setor privado pela direção
da educação; é parte de um processo de correlação de forças que envolve a definição
do conteúdo da educação de um país. Ressaltamos, assim, que a privatização endó-
gena se materializa por meio dos princípios do gerencialismo, que é o conteúdo da
proposta do privado para o sistema público. O gerencialismo tem como base teórica
o neoliberalismo em que todas as relações têm a troca como modelo (BUCHANAN
et al., 1984). Essas mudanças ocorrem através da disseminação de valores e práticas

Livro Coordenação Pedagógica.indb 42 22/10/2018 14:27:23


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 43

de empreendimento, empreendedorismo e transposição do discurso internacional


do gerencialismo. Para Clarke e Newman (2012):
[...] mesmo onde os serviços públicos não foram totalmente privatizados (e muitos
permaneceram no setor público), era exigido que tivessem um desempenho como se
estivessem em um mercado competitivo. Era exigido que se tornassem semelhantes a
negócios e este ethos era visto como personificado na figura do gerente (em oposição
ao político, ao profissional ou ao administrador). Isto introduziu novas lógicas de
tomada de decisão que privilegiavam economia e eficiência acima de outros valores
públicos. (CLARKE e NEWMAN, 2012, p. 358).

O resultado de nossas pesquisas de várias formas evidencia a materialidade da


análise de Clarke e Newman. Destacamos, nesse sentido, o material proposto pelas
parcerias que é padronizado e replicável retornando à histórica separação entre o
pensar e o fazer, sendo que as instituições privadas determinam e monitoram e as
escolas executam. Igualmente constatamos programas de formação de gestores que
têm como base princípios gerenciais como meritocracia, produtividade, liderança
do diretor em detrimento de construção coletiva e participativa dos processos
educacionais. Elementos que encontramos nas características do gerencialismo:
Ele é linear e orientado para um ‘único objetivo’ através de padronização. Ele é
concebido com objetivos e planos ao invés de intenções e julgamentos. É sobre ação
ao invés de reflexão. Ele baseia-se em análises (dividindo problemas) ao invés de
sínteses. Ele estabelece fronteiras entre ‘política’ e ‘execução’, ‘estratégia’ e ‘implan-
tação’, pensar e agir. Ele oferece um discurso técnico que separa o debate de seus
fundamentos políticos, então o debate sobre meios suplanta o debate sobre fins.
(CLARKE; NEWMAN, 2006, p. 148)

Os autores ressaltam que essas características fazem com que o gerencialismo


seja instrumental aos objetivos políticos deste período particular do capitalismo. É
esta qualidade técnica do gerencialismo que o torna atrativo para interesses sociais
e políticos diversos. Em particular sua aplicação para resolver os problemas de
um obstrutivo e antiquado modelo de sistema administrativo burocrático, engaja
apoios de representantes políticos (prometendo uma implantação mais efetiva de
suas políticas) e de uma gama de outros pretensos modernizadores (que buscam
sistemas de governo mais racionais). (CLARKE; NEWMAN, 2006, p. 148)
As redefinições no papel do Estado implicam o processo de democratização e
a minimização de direitos universais e de qualidade para todos, o que traz conse-
quências para as populações de todo o mundo. No entanto, em países que viveram
ditaduras e um processo recente de luta por direitos materializados em políticas, o
processo de privatização é ainda mais danoso.
No Brasil, o Estado foi, historicamente, vinculado aos interesses privados
(FERNANDES, 1987; VIEIRA, 1998; PIRES, 2015; CURY, 2003). Após o último
período de ditadura, a partir de meados dos anos 1980, entrou na pauta da socie-

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44 Contribuição da sala-ambiente “políticas educacionais e gestão pedagógica” para ...

dade, mesmo que de forma tímida, o processo de democratização, participação,


coletivização das decisões, assim como direitos sociais materializados em políticas.
Ao mesmo tempo, os processos de neoliberalismo, reestruturação produtiva e fi-
nanceirização redefiniam o papel do Estado para com as políticas sociais, com um
diagnóstico de crise fiscal e redução de custos. Assim, ocorreram avanços inegáveis
no acesso à educação, no entanto, com os “recursos possíveis” e, muitas vezes, em
detrimento de salários e condições de trabalho dos profissionais da educação. A
ampliação de direitos pela universalização do acesso, inclusão de alunos com neces-
sidades especiais, maior participação na vida escolar não foi seguida de condições
materiais com a mesma intensidade das mudanças.
Vivemos a contradição de que, ao mesmo tempo em que a privatização do
público é cada vez maior, também em um processo de correlação de forças, estamos
avançando lentamente em alguns direitos materializados em políticas educacionais.
Trata-se de direitos que foram reivindicados no processo de democratização nos
anos 1980 e materializados em parte na Constituição Federal de 1988 e na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) de 1996, como a gestão demo-
crática do ensino público, a educação básica entendida como educação infantil,
fundamental e média, a gratuidade da educação pública, dentre outros (PERONI,
2015a).
Ao mesmo tempo, nos anos 1990, o Brasil viveu um processo difícil para a
democratização, entendida como materialização de direitos em políticas sociais e
também como a coletivização das decisões, pois, na primeira eleição direta após
o período ditatorial, que iniciou em 1964, foi eleito pelo voto direto o presidente
Fernando Collor de Mello, que representava assumidamente o projeto neoliberal
para o Brasil, com o discurso da modernização e de que o país seria competitivo
em nível internacional. Apesar de o processo de impeachment, que afastou o pre-
sidente, ter levado novamente às ruas os movimentos sociais, os governos que o
seguiram tinham o ajuste fiscal como meta principal, com sérias consequências
para as políticas sociais. Vivemos, então, o que chamamos em nossas pesquisas de
um processo de “naturalização do possível” (PERONI, 2013a), isto é, a população,
que mal tinha iniciado a luta por direitos sociais para todos e com qualidade, acaba
aceitando políticas focalizadas “para evitar o caos social”, priorizando populações
em vulnerabilidade social e nem sempre oferecidas pelo poder público.

A SALA-AMBIENTE “POLÍTICAS EDUCACIONAIS


E GESTÃO PEDAGÓGICA”

A sala-ambiente “Políticas Educacionais e Gestão Pedagógica” (PEGP), ao


trabalhar o conteúdo definido pelos professores juntamente com a coordenação
da mesma, desenvolveu quatro atividades, todas embasadas em conteúdos que

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 45

abordaram a gestão democrática da educação vinculando-a ao movimento do real


vivenciado na sociedade brasileira e na instituição escola, numa relação constante
da teoria com a prática e da prática com a teoria. O conteúdo abordado foi a gestão
democrática a partir da luta pela democratização da educação como parte do pro-
cesso de democratização da sociedade. Nessa perspectiva, a gestão democrática é um
fim e não apenas um meio, entendendo que está em construção não simplesmente
uma mudança na concepção de gestão da educação, mas a concretização da gestão
democrática no espaço educacional. Para tanto, o conteúdo e a metodologia da sala
tiveram por objetivo qualificar o debate e a prática pedagógica levada a efeito nas
escolas públicas do nosso Estado.
Neste sentido, a sala PEGP trabalhou a gestão democrática como espaço
de participação ativa e substancial da comunidade escolar, buscando envolver a
comunidade educacional e fazer um movimento para além dos muros das escolas
numa contraposição à cultura política do Estado Patrimonialista, que se manifesta
através do clientelismo e da troca de favores.
A prática democrática na escola e a troca com a comunidade escolar têm como
sujeito fundamental o Coordenador Pedagógico. Logo, os conteúdos trabalhados
no Curso visaram qualificar a relação deste profissional com os demais segmentos
da comunidade escolar. O conteúdo trabalhado na sala PEGP permitiu um link
entre as ações da escola com o mundo real e a teoria trabalhada no Curso, em que
pesem algumas dificuldades dos cursistas em fazer esta relação.
Com estes conteúdos, os professores3 foram a campo, iniciando os trabalhos
em todos os polos de ensino à distância por um fórum de interação dos cursistas
entre si e com os professores fazendo mediação.
Essa primeira atividade solicitava que os cursistas compartilhassem suas
reflexões no fórum destacando “a relação entre as redefinições do papel do Estado
e as concepções de Gestão Democrática e de Gestão Gerencial”. Foram utilizados
como textos-base A gestão democrática da educação em tempos de parceria entre
o público e o privado, de autoria da Professora Vera Peroni (2012), e A atuação do
gestor escolar: dimensões política e pedagógica, das autoras Roselane Fátima Campo
e Leda Scheibe (2009). Do primeiro texto, destacamos a discussão sobre um du-
plo movimento de mudanças nas relações que redefinem o papel do Estado com
implicações na educação:
[...] o primeiro é a alteração da propriedade, ocorrendo a passagem do estatal para
o público não estatal ou privado; já no segundo, permanece a propriedade estatal,
mas passa a haver a lógica de mercado, reorganizando, principalmente, os processos
de gestão, o que alguns autores têm chamado de quase-mercado (PERONI, 2012,
p. 19 e 20).

3 Alexandre Rossi, Daniela de Oliveira Pires, Denise Maria Comerlato, Liane Bernardi, Lucia
Hugo Uczak, Luciane Paz Comerlatto, Maria Otília Kroeff Susin, Maria Raquel Caetano, Maria
Rita Vidal Peroni, Monique Robain Montano.

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46 Contribuição da sala-ambiente “políticas educacionais e gestão pedagógica” para ...

Essas propostas correspondem às perspectivas neoliberais e à chamada tercei-


ra via, cuja penetração no sistema educacional se traduz em propostas de gestão
educacional gerencialista e por parcerias com o terceiro setor. Já da segunda leitura
(CAMPO; SCHEIBE, 2009), salientam-se a caracterização e as diferenças entre o
gerencialismo e a gestão democrática do ensino público, sendo que as principais
características do gerencialismo são: ênfase na dimensão técnica da gestão; cen-
tralização na figura do diretor; a participação compreendida como colaborativa
e não deliberativa; autonomia e responsabilização individual pelos resultados do
desempenho dos alunos e da escola; alcance de metas de eficiência e eficácia e;
competitividade entre as escolas como fator para alavancar a qualidade das mesmas.
Já a perspectiva democrática se caracteriza por: enfatizar a dimensão político-pe-
dagógica da gestão sob a qual estão subordinados os aspectos técnicos; proclamar
a gestão centrada nos colegiados da escola; garantir a gestão participativa efetiva,
no sentido de discutir e decidir coletivamente seus rumos; promover a autonomia
e a corresponsabilização pelos resultados da aprendizagem dos alunos e da escola;
garantir o alcance da qualidade socialmente referenciada da educação e conceber
a qualidade da educação como uma conquista em prol da autonomia, da gestão
democrática do financiamento público e da formação de professores (CAMPO e
SCHEIBE, 2009, p. 14).
A gestão democrática do ensino público foi consubstanciada pela Constituição
Federal de 1988 e reafirmada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDBEN – nº 9.394/96). Esta também deve ser efetivada por meio dos Planos
Nacionais de Educação, elaborados de forma decenal, nos quais são desenvolvi-
dos diagnósticos, diretrizes e metas com vistas à democratização da educação em
nosso país. Em tempos de políticas neoliberais e da terceira via, o fórum, como
primeira atividade da sala, focou na compreensão das diferentes concepções de
gestão educacional em disputa, assim como nas dificuldades de implementação
da gestão democrática na escola a partir dos relatos dos cursistas.
O segundo momento foi o encontro presencial. Optou-se por ser de dois
turnos (8 horas), quando então foram apresentados os principais conceitos a
serem trabalhados, criando um espaço maior de discussão e apropriação do
conteúdo, da metodologia de trabalho, da realização das tarefas e da avaliação da
sala. Salientam-se, dentre outros, os conceitos de participação, autonomia, gestão
pedagógica e relação entre representantes e representados na perspectiva da gestão
democrática. Para tanto, serviu de base a leitura dos textos: Gestão democrática:
definições, princípios, mecanismos de sua implementação e Conselho escolar e
autonomia: participação e democratização da gestão administrativa, pedagógica
e financeira da educação e da escola, de autoria de Dourado Moraes e Oliveira
(s/d), e ainda do texto Estrutura da escola e prática educacional democrática, de
Paro (2007). Também foram oferecidos vídeos, como material complementar, que
trataram da gestão democrática da escola e da gestão democrática do sistema de

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 47

ensino4. Além dos conceitos já elencados, destacaram-se também, nesta segunda


atividade da sala, a importância do Projeto Político-Pedagógico como construção
coletiva da escola e os mecanismos de participação, as instâncias ou agremiações
que envolvem toda a comunidade escolar, como o Conselho Escolar, o Conselho de
Classe, a Associação de Pais e Mestres e o Grêmio Estudantil. Foi enfatizada ainda
a finalidade da escola, que visa à aprendizagem, sendo uma dessas a aprendizagem
da própria democracia. Neste sentido, como salienta Paro (2007, p. 5), “o princípio
fundamental da administração passa a ser a coerência entre as atividades-meio e as
atividades-fim, perpassando todo o processo de realização dos objetivos” da escola.
Ou seja, “que configuração deve ter a estrutura da escola se adotar, como objetivo
a ser atingido, a realização da educação como prática democrática?” (PARO, 2007,
p. 6). Assim, além da estrutura administrativa, a estrutura didática e o currículo
devem ser reinventados. Nessa perspectiva, para cumprir o fim maior da educação,
as práticas desenvolvidas na escola devem se voltar para o exercício mesmo da de-
mocracia ao valorizar e incentivar as instâncias coletivas com poder decisório em
todos os níveis da comunidade escolar. Dentro do tempo disponibilizado para o
encontro presencial, cada professor da sala escolheu dinâmicas e metodologias para
desenvolver o debate com seu grupo, de modo a retomar os principais conceitos
e a aprofundá-los à luz das leituras e das experiências dos cursistas. Logo após a
realização do encontro presencial, os professores se reuniram para compartilhar
experiências relacionadas às atividades desenvolvidas, assim como para avaliar a
continuidade do trabalho. Este momento foi muito importante para observar o
grande comprometimento dos cursistas com seu fazer educacional, especialmente
daqueles pertencentes às redes municipais, explicitado pelos debates aprofundados
localmente. Sem desejarmos fazer uma análise mais aprofundada e quantificada,
ficou nos docentes designados para cada uma das dez turmas do Curso a impressão
de que os cursistas que são professores das redes municipais, em geral, são mais
valorizados por suas respectivas redes, assim como têm participação maior na
gestão escolar e maior proximidade da gestão educacional. Muitos relatos de ações
autoritárias por parte das direções, professores e conselhos de classe foram feitos
no encontro presencial e nos chats ocorridos semanalmente com os cursistas, mas
também houve muitos relatos de escolas em busca da gestão democrática, com
grandes avanços nessa direção, demonstrando as possibilidades de autonomia de
cada instituição escolar em construir um perfil próprio de funcionamento.

4 Vídeo 1 – Conselho escolar e educação com qualidade social. (Gestão democrática da edu-
cação; parte 1) http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_
action=&co_obra=48120 Vídeo 2 – Conselho escolar e educação com qualidade social. (Gestão
democrática da educação; parte 2) http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObra-
Form.do?select_action=&co_obra=48121 Vídeo 3 – A gestão democrática do projeto político-
-pedagógico. (Gestão da escola) http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObra-
Form.do?select_action=&co_obra=50671

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48 Contribuição da sala-ambiente “políticas educacionais e gestão pedagógica” para ...

A terceira atividade permitiu a análise exatamente desses mecanismos de


participação nas escolas. Cada cursista deveria preencher um quadro contendo as
diferentes instâncias que sua escola possui (Conselho Escolar, Conselho de Classe,
Associação de Pais e Mestres, Grêmio Estudantil, Equipe Pedagógica, Reunião
Pedagógica com os Professores, outros espaços), alguns dados sobre essas instân-
cias (como se organizam, periodicidade das reuniões, quem participa, escolha dos
representantes, o que decidem) e ainda analisar a construção da gestão democrática
em sua escola e o seu papel como Coordenador Pedagógico neste processo. Aqui,
vimos que muitas vezes os cursistas acreditam conhecer suas escolas; no entanto,
para a realização da atividade, tiveram que retomar o Projeto Político-Pedagógico
da escola e entrevistar outros membros da instituição para saber exatamente como
essas diferentes instâncias desenvolvem suas atividades. Também o papel do Coor-
denador Pedagógico se mostrou central, pois a este cabe conduzir a reflexão acerca
dos fins da educação e zelar pelo cumprimento de seus objetivos. Neste sentido,
as atividades oferecidas nesta sala visaram, além de proporcionar a apropriação
de conceitos fundamentais para a compreensão da gestão democrática na escola
e no sistema educacional, produzir questionamentos e reflexões sobre o papel de
cada membro da escola, em especial dos coordenadores pedagógicos, público alvo
do Curso.
Um conteúdo importante desenvolvido pela sala PEGP na última atividade
referiu-se aos programas que estão chegando à escola tendo por objetivo analisar
as parcerias firmadas neste espaço e em que medida estas parcerias interferem no
cotidiano escolar, relacionando-as com a gestão escolar e com a atuação do Coor-
denador Pedagógico nesse processo. Assim, houve possibilidade de problematizar
a interferência das parcerias público-privadas na gestão da escola – visto que a
maioria dos cursistas não percebe a implicação destas na gestão pedagógica da
educação entendendo-as somente como um “suporte financeiro e técnico” – o que
nos levou a concluir que o abandono das escolas pelo poder público, tanto do ponto
de vista das necessidades físicas, quanto da formação continuada dos professores,
permite ver as parcerias como alternativas para a solução das demandas crescentes
das escolas e dos profissionais.
Na perspectiva dos professores, quando da avaliação do trabalho realizado
nos diferentes polos, o conteúdo desenvolvido na sala PEGP possibilitou grande
interação professor/cursistas por meio dos fóruns e da discussão do conteúdo das
tarefas. A avaliação processual, praticada no Curso, permitiu ser este mais um
momento de troca e aprendizagem, pois essa prática pedagógica gerou outros
momentos de interlocução, possibilitada pelo acesso à plataforma virtual.
Os professores avaliaram que houve crescimento dos alunos no que se refere
à conceituação e teorização da prática escolar/educacional por terem estabelecido
relações entre a teoria e a prática, ao levarem os textos disponibilizados para estudo
e discussão nos momentos destinados à formação do coletivo da escola onde atuam.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 48 22/10/2018 14:27:23


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 49

Dessa forma, pode-se afirmar que a sala PEGP foi uma experiência exitosa, por ter
atingido um de seus principais objetivos: analisar a prática de gestão escolar com
base nos princípios teóricos da gestão democrática. Entendemos que cursos com
esse propósito, como é o caso dos que se inserem no Programa Nacional Escola
de Gestores da Educação Básica, carecem de continuidade, pois o espaço educa-
cional é permeado pela vida social de cada comunidade, que se constituem por
diferenciadas culturas, por particularidades sociais, pela forma peculiar como se
organizam economicamente para dar conta de sua subsistência e pela política em
torno da qual se organizam, sendo tudo isso constituinte das experiências teórico/
práticas que dão vida à sociedade.
Por outro lado, a experiência vivenciada no Curso permite aproximar o poder
público e a academia da realidade que envolve a educação pública e as experiências
educacionais construídas e aplicadas nestes espaços, muitas delas exitosas e que
precisam ser divulgadas para outras escolas. Portanto, a continuidade desses ricos
momentos de formação, proporcionada pelo Curso de Especialização em Coor-
denação Pedagógica, é um desejo das escolas e dos profissionais nela envolvidos,
como valorização e teorização dos saberes construídos nestes espaços, uma vez que
o movimento se deu do Curso para a escola e da escola para o Curso.
Em síntese, o conteúdo geral do Curso permitiu repensar a escola enquanto
espaço democrático de decisão que deve envolver, nas decisões pedagógicas, além
da participação dos professores, também a dos pais e dos alunos, trazendo-os para
os Conselhos de Classe5, entre outras instâncias de participação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Historicamente, o privado foi parâmetro de organização da escola pública.


No Fordismo, por meio da hierarquia, divisão social do trabalho, especialização
e formas de controle como a supervisão escolar. Nosso país viveu um processo
recente de democratização e lutamos por outra forma de organização da escola
com princípios democráticos e criticamos a teoria do capital humano e concepções
gerenciais de organização escolar.
A educação sempre esteve vinculada ao capital, mas lutamos neste período de
democratização para avançar no sentido de uma proposta democrática e realmente
pública de educação. Educação entendida como processo societário de formação
humana. Nesse aspecto, consideramos a lógica de mercado na educação um retro-
cesso. É um processo de correlação de forças que não ocorre por acaso e que está

5 Espaços de reflexão e avaliação dos alunos que deve possibilitar uma retomada da ação peda-
gógica. Envolve a participação do Coordenador Pedagógico, do orientador educacional, dos
alunos e professores. Muitas escolas incluem os pais nesse processo. É importante que o diretor
da escola também participe dos Conselhos de Classe.

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50 Contribuição da sala-ambiente “políticas educacionais e gestão pedagógica” para ...

cada vez mais dando direção para a política pública. Lutamos por processos demo-
cráticos e de justiça social na educação e, quanto mais avançamos neste caminho,
mais o capital se organiza para retomar o seu papel na educação. Retomamos a
ideia de que são distintos projetos societários de classe em relação. Neste sentido,
este Curso, que forma coordenadores pedagógicos com os princípios da gestão
democrática, está contribuindo, no processo de correlação de forma a reforçar o
importante papel social da escola no aprendizado da democracia em nosso país.

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Formação de professores e 0 3
direitos humanos: desafios para
a coordenação pedagógica

Jaime José Zitkoski


Paulo Peixoto de Albuquerque

INTRODUÇÃO

Este artigo busca refletir sobre a temática dos direitos humanos na formação
de professores trabalhada ao longo do desenvolvimento da sala-ambiente “Realidade
Escolar e Trabalho Pedagógico” (RETP), durante a 2ª edição do Curso de Especia-
lização em Coordenação Pedagógica, do Programa Nacional Escola de Gestores
da Educação Básica, do Ministério da Educação, oferecido em parceria com a
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Essa temática foi evidenciada como
reconhecimento e autonomia, visto que a realidade dos espaços societários no qual
se desenvolvem os projetos educativos implica ter presente não só os conceitos de
“atores sociais”, “relações sociais”, mas de “complexidade”, que redefine os parâme-
tros de entendimento do próprio espaço societário em suas múltiplas dimensões
da vida coletiva. Para os autores, as ações político-pedagógicas das propostas de
formação de professores se inscrevem como educação cidadã, porque o processo
de construção de conhecimento e socialização de saberes se dá na concretização de
espaços de mediação social e de explicitação de conceitos diferenciados voltados
para a promoção dos direitos humanos em um país tão desigual e injusto social-
mente, como é o nosso.
O objetivo maior da sala foi possibilitar aos participantes, através de situa-
ções-problema da escola, identificarem os principais procedimentos que podem
compor uma proposta político-pedagógica de reflexão gestionária/docente e, ao
mesmo tempo, mapearem os desafios da instituição como um instrumento técnico
e transversal para pensar uma base curricular inovadora. O diálogo para viabilizar
o alcance desse objetivo foi estabelecido a partir de temas como: utopia, progresso
e distopias; relações entre sujeito proprietário de direitos e sujeito com direito à
propriedade; o lugar do sujeito de direitos; o sujeito de direitos e exclusão social;

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54 Formação de professores e direitos humanos: desafios para a coordenação pedagógica

autonomia e liberdade; professor/aluno/comunidade; o exercício da tolerância. O


diálogo ocorreu em caráter permanente, por meio de textos selecionados, vídeos,
arquivos de áudio e imagens e também de fórum, chat e troca de mensagens e foi
arquitetado pelos conceitos/conteúdos explicitados nas próximas seções.

FUNDAMENTOS PARA COMPREENDER A REALIDADE ESCOLAR

Quando penso no futuro, não esqueço o passado. (Paulinho da Viola).

O verso que abre esta seção tem razão de ser, pois ele evidencia que, para
compreender a vida, precisamos nos dar conta do paradoxo: para a compreensão
da realidade, a vida precisa ser percebida na sua historicidade processual. Ou seja,
não pode ser entendida no recorte do agora, ou nos fragmentos que apontam para
situações imensamente diferentes e superpostas, que não admitem que o hoje é o
resultado de um conjunto de momentos e situações vivenciadas no passado.
Assim também parece se apresentar a temática destas notas: “Formação de
Professores e Direitos Humanos”, uma vez que estão relacionadas, não apenas
pelo conetivo que articula os dois substantivos, mas pelas exigências do mundo
contemporâneo.
Nessa perspectiva, o significado desta relação, que de certa maneira atua como
nossa hipótese de trabalho – Formação de Professores –, só tem sentido quando
pensada na perspectiva da interpelação cidadã assumida através dos direitos hu-
manos e do compromisso com a mudança de pensar o presente-futuro sem eludir
o presente-passado. Esse desafio tem o seu papel hoje, porque o compreender
do(s) aluno(s) está muito mais no modo como as pessoas percebem, aprendem
e constroem seus saberes. Portanto, parece-nos que, cada vez mais, na formação
de professores, precisamos superar a fragmentação e a (des)contextualização que
teimam em afirmar-se como método de aprendizado.
Tal fato se evidencia nos currículos organizados de modo a privilegiar o
“aprender a aprender” ou o “ensinar a ensinar” consolidando a emergência de um
conceito de formação essencialmente técnica que separa saber especulativo – the-
oría – (desvelador do mundo, da realidade, destinado ao cidadão) do saber fazer
– téchne – (acessível aos que executam e que aprendem apenas no exercício do
trabalho) como se fossem duas dimensões diferentes, ainda que complementares
à aquisição de competências necessárias ao usufruto do mundo social.
Parece-nos que o divórcio entre passado/presente/futuro de certa forma
reproduz não só uma fragmentação, como explicita uma divisão que esconde que
método e conteúdo são indissociáveis, que não podem ser apresentados de forma
autônoma ou independente; são resultados de uma prática social que reproduz
diferenças, dominações, subalternidades.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 55

Esta separação também concorre para que a explicação da realidade social


se dê a partir de uma dualidade epistemológica que funda dois tipos de saber: o
saber-formal e acadêmico que se pretende (universal/sistematizado) e cujo status
cognoscitivo lhe dá um caráter privilegiado e o saber da vida do cotidiano (senso
comum/não sistematizado), que por ser local e restrito passa a ser visto como
secundário, digamos, de uma “educação popular”.
Esse fato favorece a concretização de práticas educativas que apresentam “o
conhecimento formal” como um processo instrumentalizador (treino e preparo de
mão-de-obra) relativizando o acesso e o conhecimento da cultura produzida por
uma sociedade como direito ou possibilidade de os indivíduos serem os produtores
do conhecimento, pelo menos do conhecimento diferenciado daquele universal
sistematizado.
Neste sentido, compreender a realidade em que vivemos a partir dos direitos
humanos passa a ser fundamental na medida em que desafia aqueles que preten-
dem pensar educação/ensino sem articular com o mundo da vida, a utopia com a
realidade das relações sociais, hoje cada vez mais precárias, injustas, sem fronteiras
e em transformação acelerada.
Assim, o curso proposto se construiu no contraponto de uma cultura docente
hegemônica, que se distancia de pensar a formação de professores, as questões que
nos atropelam enquanto professores, como, por exemplo:
• Que tipo de saberes são (serão) necessários para se constituir um conhe-
cimento diferenciado, fundado nos princípios de um projeto de educa-
ção para e/ou dos direitos humanos que tenha condições de responder às
novas condições sociais produzidas pela precarização e vulnerabilidades
sociais de nosso cotidiano?
• Que projeto pedagógico de educação para garantir a diversidade e a di-
ferença de uma proposta cidadã1 e coletiva é possível frente à realidade
social que se apresenta?
Significa dizer que estas notas (assim como este livro coletivo) têm a pretensão
de identificar os elementos principais e constitutivos de um projeto de educação
(formação de professores) que seja democrático, socialmente justo e popular, no
qual as ações pedagógicas apontem para a construção de um projeto de sociedade
que viabilize e concorra para uma cidadania emancipada.

1 A educação no projeto neoliberal de mundialização via mercado propõe uma educação que
concorre para uma cidadania seletiva; um projeto de educação nacionalista que reduz o papel e
as questões a serem resolvidas pelo Estado Nação de forma tuteladora e assistencialista. É uma
educação que concorre para uma cidadania menor. Um projeto de educação democrático, so-
cialmente justo e popular remete a pensar ações que apontem para a construção de um projeto
pedagógico que viabilize e concorra para uma cidadania emancipada, autônoma no modo de
participar das decisões.

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56 Formação de professores e direitos humanos: desafios para a coordenação pedagógica

NA CONTEMPORANEIDADE A REALIDADE PLURAL E OS


CONCEITOS PARA EDUCAÇÃO/ENSINO EM DIREITOS HUMANOS

Como já destacado anteriormente, pensar a realidade dos espaços societários


na qual se desenvolvem projetos educativos diferenciados implica ter presente o
conceito de “complexidade” – conceito chave – que (re)define os parâmetros de
entendimento de outros conceitos, como o de “atores sociais” e de “relações sociais”
e, sobretudo, do próprio espaço societário.
Pensar complexidade, hoje, passa a ser fundamental, porque mudou a forma
como entendíamos e pensávamos o social. Os parâmetros de espaço-tempo, de
causalidade, de presença no mundo, de individualidade e história que antes ser-
viam para dar sentido e explicar o que acontecia e, eventualmente, amortecer o
seu impacto, já não nos servem mais. Vivenciamos uma realidade social que não
se deixa apreender facilmente e, em função disso, nos expõe e fragiliza.
Nossos modelos explicativos não servem, ou ajudam muito pouco, diante de
uma sociedade que não é só difícil de entender, mas complexa. As relações sociais
não se apresentam lineares e não traduzem uma racionalidade ordenada, coerente.
Cada vez mais nos damos conta que há muitos elementos determinantes envolvidos
em um dado fenômeno social e que os atores não desempenham um único, mas
múltiplos papéis sociais.
Além disso, as relações entre educação e direitos humanos (nosso foco de
análise) passam a ser mediadas por outros elementos cujos significados permitem
outras interpretações dos objetos, eventos e situações da vida.
São outras relações entre educação e direitos humanos que se desenvolvem
através de diferentes processos, de novas conexões, não determinadas por uma
lógica mecânica; os tempos e os espaços sociais são e se apresentam diferenciados.
São tempos bem diferentes daqueles espaços societários que a revolução industrial
favoreceu e que permitiu construir os paradigmas de modelos de ação prescritivas
em termos de direitos humanos (normativo/técnico) que conhecemos. “Com a
secularização do mundo moderno, a divisão do trabalho, a competitividade do
mercado, a interdependência tornou-se maior e o processo de criação/assimilação
das representações que dão significado à realidade tornou-se mais sutil, sofisticado,
complexo” (ROCHA, 1999, p. 363).
Na contemporaneidade o desafio é compreender como se dão os processos
de construção das identidades coletivas (ser trabalhador/ser cidadão de um país),
ou de que forma nossas escolhas políticas determinam a economia, ou vice-versa.
Hoje, mais do que nunca as práticas interpessoais que ocorrem em seu dia-a-dia
possibilitam ao sujeito aprender a levar em conta os efeitos de suas ações, na me-
dida em que convive com a interposição de regras e com as reações da alteridade;
ensina ao indivíduo que as escolhas individuais implicam, a controlar sentimentos
e moderar suas ações espontâneas, levando mais em consideração o momento, as

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 57

instituições, o que os outros esperam dele em circunstâncias definidas. Tal fato per-
mite que o indivíduo amplie seu espaço mental, dando-lhe mobilidade temporal e
espacial cognitiva para além do presente e do aqui. A interdependência das relações
sociais chegou a um nível de complexidade que não há como se processar a volta à
tradicional unidade conhecimento/trabalho (ROCHA, 1999, p. 362).

É preciso dar-se conta de que tentar entender as mudanças sociais sem levar
em consideração estes pressupostos induz a uma compreensão do social cujo
caráter pode ser de extrema generalidade, impedindo de encontrar os elementos
estruturantes destas transformações. Não conseguimos passar de análises abran-
gentes e amplas porque as mudanças se revestem de diversas formas: o social se
apresenta como a realidade plural. Nosso tempo é constituído de numerosas mu-
danças culturais, políticas, sociais, que não são independentes das transformações
econômicas, mas que não se explicam apenas pelo econômico. Este cenário do
mundo contemporâneo se caracteriza não só pela afirmação triunfante do (neo)
liberalismo, mas também pela racionalidade instrumental, que respondem às vezes
como eco e às vezes como dissonância de modificações nos modos de ser individu-
ais e coletivos. Assim sendo, é preciso ter presente o modo como estas mudanças
incidem na construção de saberes. Dito de outra forma, as questões relacionadas
à ação educativa precisam ser identificadas e analisadas em função do contexto
social, porque o sujeito não existe antes ou fora da comunidade; essa constitui o
marco, o horizonte de perspectivas no qual ele se acha imerso desde o nascimento.
O homem transforma-se de biológico em sócio-histórico, num processo em que a
cultura é elemento de mediação e parte essencial da constituição da natureza huma-
na. Não podemos pensar o desenvolvimento psicológico como um processo abstrato,
descontextualizado, universal: o funcionamento psicológico, particularmente no
que se refere ao aprendizado, está baseado fortemente nos modos culturalmente
construídos de ordenar o real (OLIVEIRA, 1989, p. 24).

Este marco determina seu lugar (identidade), assim como as normas que definem
o seu fazer (trabalho) nos espaços públicos. Desta forma, o que o sujeito é e o modo
como ele se concebe está circunscrito e depende das condições materiais da sociedade
em que ele vive. Portanto, quanto melhor o indivíduo conheça seu contexto social
maiores são as possibilidades para autocompreender-se e, ao mesmo tempo, identi-
ficar os limites e as perspectivas de transformação da realidade social em que vive.
Educação e Direitos Humanos só têm sentido quando percebidos como prática
social que se objetiva a partir de uma proposta educativa, materializada em con-
teúdos programáticos que buscam construir indivíduos em sujeitos de si mesmo
e do mundo. A percepção desta singularidade passa a ser importante porque ela,
de certa maneira, fundamenta o modo como os atores sociais pensam as questões
sociais (dar conta da injustiça social) e, consequentemente, o modo como cons-
troem seus saberes.

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58 Formação de professores e direitos humanos: desafios para a coordenação pedagógica

Em certo sentido, todo saber objetivado legitima-se, antes de tudo, pelo simples
fato de existir e pelo compartilhar percepções. Por isso é preciso ter presente que
as percepções sobre Educação e Direitos Humanos evidenciam aquilo que delas se
pretende: construir nos espaços educativos (escolares ou não) a superação da desi-
gualdade, a constituição de um igual que não perca a sua diferença, pois o oposto
do igual não é o diferente, mas sim o desigual.

PENSAR EDUCAÇÃO E/OU DIREITOS HUMANOS É INCORPORAR


OS CONCEITOS DE RECONHECIMENTO E AUTONOMIA

Pode-se dizer que as desordens e as desarticulações causadas pelos tempos


contemporâneos apontam para situações completamente contraditórias com os
princípios proclamados pelos protocolos que apontam os direitos humanos como
direitos do cidadão2, visto que equidade não se articula bem com exclusão social.
Entretanto, é preciso reconhecer que estas desordens inserem na pauta de
discussão o sentido e os pressupostos da justiça social, hoje submetidos ao falso
dilema de atender as demandas de mercado ou atender as expectativas individuais
– o que se chama “boa vida”.
Neste sentido, o desmanche da sociedade do bem-estar social fundada no
pacto keynesiano e sua passagem para um modelo de formação profissional mais
dinâmico, não pautado pelo corporativismo de categorias profissionais, exigem
dos espaços educacionais formais respostas a um contexto social marcado pela
pluralidade. Os impasses educacionais que derivam desta situação não são poucos
e podem ser traduzidos nas questões que seguem:
• Como preparar técnico/socialmente os indivíduos que atuam na edu-
cação para serem sujeitos da ação quando as propostas de capacitação
são hierarquizadas, verticalizadas e resultado de um sistema de ensino
que enfatiza o conhecimento formal e uma cultura de determinismo e
dependência?
• Como preparar profissionalmente esses indivíduos de modo que a am-
pliação de competências não signifique apenas agregar valor ao trabalho
a partir da tecnologia, mas da construção de conhecimentos a partir do
que as pessoas (comunidade) sabe/pensam, agem e interagem?

2 A Constituição de 1988 afirma a universalidade, a integralidade e a equidade das propostas de


educação para todos e a nova legislação sobre as Bases Curriculares aponta para uma concepção
de educação que não se reduz à capacitação apenas para o mercado de trabalho, mas a uma vida
com qualidade.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 59

São questões que nos fazem refletir sobre o lugar da docência como espaço
mediador de processos que se caracterizam (ainda hoje) por invisibilizar situações
de injustiça social (lugar da mulher, do deficiente, do negro, entre outros.).
Um outro enfoque de organização da capacitação/formação pode ser aquele
que se constrói a partir de uma prática social que insira o(s) saber(es) da comuni-
dade em outro registro: o dos direitos humanos. Para que isto seja possível, se faz
necessário reconhecer que há outros saberes (da comunidade) e que a construção
desses saberes se faz a partir de outra epistemologia.
A multiplicação dos processos de formação de professores (universidades
públicas e privadas) pode aparecer como a nova imagem de racionalidade instru-
mental que governa o universo cultural dominante e até tem efeitos consideráveis
sobre os indivíduos. Mas estas multiplicações nos interrogam sobre as possibili-
dades e os meios de uma formação de professores que enfatize e privilegie uma
“recomposição” dos saberes existentes na comunidade e que garanta o direito dos
indivíduos enquanto cidadãos.
Todavia, não se trata de uma “recomposição dos direitos” na perspectiva
nostálgica de um antigo modo de ser (existente apenas nos relatos míticos). Refe-
rimo-nos à rearticulação da diversidade, das diferenças fundantes da vida social,
dos grupos conflituados que derivam da mudança, dos indivíduos e dos grupos
abandonados pelos movimentos da sociedade, dos “desfiliados sociais” (CASTELLS,
1999) ou em desaparecimento3, que tiveram e têm seu repertório de direitos es-
terilizados por um projeto monopolizado pela unidimensionalidade econômica.
Nessa perspectiva, um projeto de formação de professores que possibilite a
identificação de finalidades sociais a serem reforçadas só tem sentido se resultar no
reconhecimento de que há direitos fundamentais do(s) indivíduo(s), que podem ser
potencializados a partir de um compromisso docente. Compromisso docente aqui é
entendido como considerar as diferenças que cada aluno tem diante de situações
de aprendizagem, não aceitando as diferenças propostas por uma realidade sócio/
cultural/econômica injusta, que neutraliza o lugar da docência, ao mesmo tempo
em que impede uma prática e uma reflexão inovadora dentro e fora da escola. Ou,
como bem coloca Paulo Freire na obra Pedagogia da Autonomia (1996), que é um
dever ético e político do educador respeitar os saberes dos educandos marcados
por sua realidade de vida, mas com o compromisso de problematizar essa realidade
tendo em vista a luta por uma vida mais digna para todos.
A afirmação desse compromisso docente não se restringe à educação formal
e à sua lógica curricular. Ao contrário, busca construir outro caminho pedagógi-
co, com dispositivos didáticos a partir da Pedagogia da Autonomia de Freire, que

3 Ninguém pode ignorar os efeitos da administração do estresse ligada à incorporação massiva


de novas tecnologias nos processos de trabalho ou ainda os efeitos destas novas tecnologias nos
modos de organização o processo produtivo. Ninguém pode ignorar mais o caráter hipócrita da
definição dos pequenos trabalhos ou do chamado apelo ao empreendedorismo, ingrato e mal
remunerado como resposta aos problemas de desemprego e exclusão social.

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60 Formação de professores e direitos humanos: desafios para a coordenação pedagógica

empoderem uma pedagogia da práxis. Freire conclui que educamos muito mais
pelo exemplo do que pela palavra proferida em sala de aula. Ou seja, a coerência e
o fazer juntos são mais significativos do que discursos bonitos e teorias/conteúdos
meramente ilustrativos.

FORMAÇÃO DE PROFESSORES E DIREITOS HUMANOS: POR UMA


PEDAGOGIA HUMANIZADORA E DO RECONHECIMENTO DO OUTRO

Partindo da perspectiva freireana, a formação docente requer uma pedagogia


da autonomia e da humanização baseada na atitude ética da alteridade. Nesse hori-
zonte, o objetivo maior da proposta de Freire é a luta para transformar a realidade
social e, assim, construirmos um mundo mais democrático e justo, pois o conhe-
cimento, a ciência e a educação só têm sentido se contribuírem com o ser mais da
humanidade toda. Esse é o compromisso ético e político da pedagogia freireana e
o sentido mais profundo do legado que ele nos deixou para a área da pedagogia e
da formação de professores.
O caminho formativo-pedagógico implica o diálogo entre as diferentes mo-
dalidades de saberes para que na prática possamos formar educadores comprome-
tidos com uma educação humanizadora. Mas o diálogo requer abertura ao Outro
e reconhecimento da alteridade. Ou seja, de que há diferenças e pluralidades na
sociedade e, portanto, precisamos nos educar para uma vida democrática e cidadã,
com autonomia e respeito à legitimidade dos saberes e experiências plurais.
No processo pedagógico tradicional (da modernidade ocidental), a educação
produz formas sutis e ideológicas de controle no modo de pensar e desenvolver
a ação humana, pois condiciona as visões de mundo desde a faixa etária da edu-
cação infantil até a universidade. E, infelizmente, quanto mais avançam os níveis
de ensino, mais ocorre o aprofundamento nos níveis de fragmentação dos conhe-
cimentos e processos formativos. É a lógica do modelo disciplinar na forma de
produzir o conhecimento (através das pesquisas científicas), de organizar o ensino
(através da grade curricular) e de administrá-lo através da gestão dos tempos e
espaços escolares. Tudo é planejado de forma fragmentada e disciplinar, distante
das necessidades sociais dos educandos e dos educadores. Esse processo produz
as especializações e a formação técnica, mas atrofia a formação humana, a visão
política e o compromisso ético do cidadão.
Esse é o grande entrave para os avanços necessários na educação formal, que
está pautada no paradigma ainda hoje hegemônico na educação escolar, a saber,
o modelo positivista de currículo escolar. A esse modelo, Freire denomina critica-
mente de educação bancária, que produz o arquivamento da existência humana:

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 61

Educador e educandos se arquivam na medida em que, nessa distorcida visão de


educação, não há criatividade, não há transformação, não há saber. Só existe saber
na invenção, na reinvenção, na busca inquieta, impaciente, permanente que os
homens fazem no mundo [...]. (FREIRE, 1993, p. 58).

Enquanto alternativa a essa pedagogia tradicional, Paulo Freire aponta para a


necessidade do cultivo de uma perspectiva pedagógica crítica e problematizadora,
voltada para a autonomia de cada sujeito envolvido no processo educativo. Essa
proposta está alicerçada em uma abordagem antropológica dialética, em que tudo
o que existe e tem relação com a vida humana está em movimento, se transforma
e, portanto, requer novas leituras da realidade e de nossa condição no mundo
enquanto seres de intervenção no mesmo.
Portanto, se tudo está em movimento, em transformação e diretamente re-
lacionado com nossa intervenção no mundo, então a forma de melhor conhecer,
interpretar e entender o mundo é por meio de uma concepção interdisciplinar. Ou
seja, se tudo se relaciona na realidade, então o nosso conhecimento, nossa ciência
do mundo real, precisa estar em relação intermediada pelo diálogo autêntico entre
os diferentes saberes (acadêmico, popular, religioso, etc) e as diferentes áreas cien-
tíficas. É necessário o diálogo entre os diferentes saberes e experiências de vida,
respeitando a alteridade.
O diálogo é um conceito central em Freire e, por essa razão, requer algumas
condições fundamentais que distinguem diálogo de simples conversa, ou simulação
de diálogo. Ou seja, segundo Freire (1993), o diálogo verdadeiro difere de práticas
que escondem outra intencionalidade por estarem voltadas a fins estratégicos.
No início do terceiro capítulo da Pedagogia do Oprimido (1993), Freire estabe-
lece as condições necessárias para o verdadeiro diálogo. Dentre elas, destacamos a
amorosidade como ponto de partida, a humildade que requer saber ouvir o Outro e
a abertura ao diferente, a esperança no Outro e na possibilidade de mudar o mundo.
Mas uma das exigências para o diálogo Freireano é o pensar dialético e crítico. Na
prática é reconhecer que as coisas mudam, pois estão em movimento e, por isso
mesmo, precisamos repensar novamente o que já concebemos anteriormente.
E, diante das mudanças, da relatividade de nossos conhecimentos, precisamos
sempre reavaliar nossos saberes e buscar interpretar os fenômenos a partir dos
diferentes olhares que nos circundam no diálogo com os demais interlocutores
envolvidos. Enfim, pensar dialeticamente é se dispor a rever o próprio pensamento
e aprender junto com os outros.
Para a formação de professores, essa postura dialógica e crítica é fundamen-
tal, pois, como bem coloca Paulo Freire em seu último escrito publicado em vida,
ensinar exige pesquisa e criticidade:
O saber de pura experiência feito. Pensar certo do ponto de vista do professor, tanto
implica o respeito ao senso comum no processo de sua necessária superação, quanto

Livro Coordenação Pedagógica.indb 61 22/10/2018 14:27:24


62 Formação de professores e direitos humanos: desafios para a coordenação pedagógica

o respeito e o estímulo à capacidade criadora do educando. Implica o compromisso


da educadora com a consciência crítica do educando [...] (FREIRE, 1996, p. 32).

A realidade complexa que cerca a atividade docente e a diversidade de cultu-


ras presentes no espaço escolar com diferentes escalas de valores e de leituras de
mundo exige dos professores e das equipes gestoras das escolas, integrada também
pelos coordenadores pedagógicos, uma perspectiva da intersubjetividade a partir da
qual o mais coerente é buscar a síntese de leituras, interpretações e explicações da
realidade. Isso é uma tarefa coletiva que envolve todos os sujeitos intencionalmente
voltados para o entendimento intersubjetivo, mas o desafio do coordenador/educa-
dor é provocar um diálogo crítico com seus pares, a fim de que esses, no exercício
de suas docências, levem os educandos a avançarem da curiosidade ingênua e das
leituras fragmentadas de mundo para uma visão de conjunto que requer estabelecer
relações múltiplas na leitura da realidade.
A Pedagogia da humanização, na perspectiva de Freire, requer uma epis-
temologia da intersubjetividade, na qual não existe um EU Penso Cartesiano,
mas um NÓS Pensamos. “O sujeito pensante não pode pensar sozinho; não pode
pensar sem a coparticipação dos outros sujeitos no ato de pensar sobre o objeto.
Não há um penso, mas um ‘pensamos’ que estabelece o ‘penso’ e não o contrário”
(FREIRE, 1992, p. 66).
Uma educação comprometida com a humanização do mundo requer desen-
volver uma ciência que tenha responsabilidade com a vida (Freire, 1994a). Essa
ciência biófila, no dizer de Freire, só pode desenvolver-se na perspectiva interdis-
ciplinar, de interdependência na interpretação dos fenômenos. A solução de um
problema em estudo nunca pode ser trabalhada isoladamente, pois um campo do
saber científico tem repercussão no conjunto da vida e vice-versa. Nessa concepção,
a ciência só tem sentido se contribuir para defender e qualificar a vida em suas
múltiplas formas de manifestação.
No mundo atual, que se mostra fortemente marcado pela lógica da racionalida-
de instrumental, mediante uma crise em termos culturais e sociopolíticos que impõe
as regras de produzir ciência para transformar em tecnologia e desta em ganhos
econômicos, a perspectiva interdisciplinar é um novo começo para trabalharmos
a formação de novas gerações de cidadãos e de profissionais comprometidos com
um futuro mais humanizado.
A formação para a autonomia implica construir conhecimentos emancipa-
tórios. Tal processo não pode ser um ato egocêntrico direcionado por algumas
mentes privilegiadas. Os saberes científicos só têm sentido se contribuírem para
superar a miséria humana. Ou seja, as informações, teorias, leituras de mundo,
devem corroborar para superar os problemas que fazem diminuir nossa huma-
nidade, pois, do contrário, podemos estar reproduzindo saberes que nos levam à
autodestruição ou que comprometem nosso futuro no planeta, que na atualidade

Livro Coordenação Pedagógica.indb 62 22/10/2018 14:27:24


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 63

se encontra ameaçado por questões ambientais ou até de destruição pelo poder


das armas e da ameaça constante do seu uso irracional.
Então, os cursos para formação de professores, em todos os níveis da edu-
cação superior, têm melhores possibilidades de manterem-se coerentes com os
propósitos de uma pedagogia cidadã e comprometida com a emancipação, quando
são desenvolvidas atividades de grupo, com projetos coletivos de trocas e diálogos
constantes sobre nossas práticas escolares. O compromisso ético da ciência da
educação (pedagogia) requer a interlocução de saberes a partir do diálogo crítico
e da horizontalidade na metodologia e na forma de trabalhar o conhecimento, seja
na hora de produzir, ou no momento de socializar o que é produzido.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É por isso que pensar em Educação Popular e Direitos Humanos passa a ser
fundamental, porque remete a um agir responsável, a um agir cooperativo, que é
a Pedagogia da Práxis. O agir cooperativo, ao se objetivar em propostas de ações
solidárias, rompe com parâmetros normalmente aceitos de pensar programas
educacionais ou de capacitação pautados em generalizações que descontextualizam
conteúdos, que têm seu enfoque no indivíduo e que distanciam teoria da prática.
Em função disso, se faz necessário dizer que educação tem sua razão de ser
quando se reveste de um caráter substantivo e se transforma em política de ação,
porque:
• na Educação Popular as pessoas organizam não só suas existências para
o trabalho, mas aplicam saberes múltiplos que decorrem da sua experi-
ência de vida;
• nas dificuldades do cotidiano, as pessoas constroem alternativas, e mo-
dos de produzir possibilitando criar espaços de resistência são inventa-
dos;
• é no espaço da saúde que as exigências da ética se evidenciam (é por isso
que o descrédito também é proporcional às exigências).
Capacitar professores em direitos humanos é ação política que resulta da
experiência associativa vinculada ao trabalho (que ainda permanece como central
no nosso universo social e cultural) e é o principal canal de acesso à vida social.
Assim, pensar projetos de educação popular para/em uma sociedade pessimista
e excludente tem sentido, porque aponta para uma dupla articulação: reconheci-
mento e autonomia.
É uma relação mais do que necessária, é fundamental para o reconhecimento
de que no mundo contemporâneo os saberes são plurais e a autonomia dos atores
sociais não remete à liberdade individualista (neoliberal), mas à responsabilidade

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64 Formação de professores e direitos humanos: desafios para a coordenação pedagógica

social entendida como compromisso da democracia e da reciprocidade que, nas


práticas de saúde exercidas na comunidade, decorrem de um aprendizado, não
individual, mas construído processualmente, historicamente no cotidiano coletivo.
De fato, é no reconhecimento dos saberes da comunidade que nasce o ideal
de autenticidade, que não é nada mais que a capacidade de cada indivíduo dar um
sentido a sua vida, que o leva a distinguir o bem do mal. Uma voz que não depende
de um deus ou de uma autoridade. Este é o saber proposto pela educação – calcada
na formação de professores através dos direitos humanos e apreendida na ação
coletiva – que não pode ser subestimado ou subvalorizado por representações da
vida que estão centradas em leituras globalizantes.

REFERÊNCIAS

CASTELLS, Manuel. A era da informação: econômica, sociedade e cultura – a sociedade em rede.


São Paulo: Paz e Terra, 1999.
FREIRE, Paulo. Extensão ou Comunicação! São Paulo: Paz e Terra, 1992.
___. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1993.
___. Pedagogia da Esperança. São Paulo: Paz e Terra, 1994a.
___. Cartas a Cristina: reflexões sobre minha vida e minha práxis. São Paulo: Unesp, 1994b.
___. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
OLIVEIRA, Marta Kohl de. Vygostsky – Aprendizado e desenvolvimento um processo sócio-histó-
rico. São Paulo: Editora Scipione, 1989.
ROCHA, Maria Zélia Borba. Espaço urbano, escola e desigualdade social. Revista Sociedade e Esta-
do, v. XIV nº2 julho/dezembro, 1999, p. 349-368.

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O Wikilivros e as mídias móveis: 0 4
um exemplo de como as diretrizes
curriculares nacionais para a educação
básica podem ser reutilizadas,
revisadas, remixadas e redistribuídas
entre professores, gestores appers

Cintia Inês Boll


Fabiane Penteado Galafassi
Silvana Corbelini

INTRODUÇÃO

As possibilidades de gestão escolar em tempos de cultura digital, vivendo-a


intensamente na relação tecnologia-comunicação-escola, convergem atualmente às
políticas de formação, em especial a este Curso de Especialização em Coordenação
Pedagógica desenvolvido na modalidade da Educação à Distância (EaD). A formação
de professores em serviço, particularmente as ações vinculadas à Universidade Federal
do Rio Grande do Sul (UFRGS) e à Faculdade de Educação (FACED), remetem-nos
ao ano de 2005 e à criação de Ambientes de Aprendizagem para as licenciaturas nessa
modalidade de ensino que se iniciariam no ano seguinte, tais como a Licenciatura
em Música, Licenciatura em Letras e Licenciatura em Pedagogia.
O Decreto Presidencial nº. 5622, de 19 de dezembro de 2005, reconhecendo a
importância não só da formação dos professores “em serviço”, mas também da pro-
posta inovadora que a modalidade EaD poderia oportunizar, possibilitou a criação,
mesmo que inicialmente em caráter experimental, dos Programas “Universidade
Aberta do Brasil – UAB” e “Pró-Licenciaturas”, coordenados pela Secretaria de
Educação à Distância – SEED e pela Secretaria de Educação Básica – SEB, ambas
do Ministério da Educação (MEC), com base no art. nº. 81 da Lei nº. 9.394, de 20
de dezembro de 19961.

1 Recentemente, novo Decreto Presidencial nº 9005/2017 apresentou algumas novas propostas,


mas também manteve as premissas básicas do antigo Decreto, quais sejam: existência de projeto
pedagógico do curso a ser oferecido; realização de atividades presenciais e cumprimento das
Diretrizes Curriculares Nacionais.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 65 22/10/2018 14:27:24


66 O Wikilivros e as mídias móveis

Este Programa denominado então de Pró-Licenciaturas entre as principais justifica-


tivas apresentou a urgente demanda pelo Ensino Superior das Licenciaturas, como
a de diplomar os professores que atuam nos sistemas públicos de ensino, nos anos/
séries finais do Ensino Fundamental e/ou no Ensino Médio que não têm habilitação
legal para o exercício da função. Neste sentido, pela amplitude a que se pretende,
as Instituições de Ensino Superior (IES) foram convidadas a participar do processo
tanto para concepção como para execução destes cursos e a Universidade Federal do
Rio Grande do Sul – UFRGS, articulada também com seu próprio Projeto Institu-
cional capacitou-se à Chamada 01/2004 MEC/SEED, em modalidade de consórcio
com a Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, para implementar o Curso
Licenciatura em Pedagogia: Ensino à Distância (PEAD), iniciado em setembro de
2006 (BOLL, MEIRELLES, CARVALHO, 2006).

Responsável pela construção do Ambiente de Aprendizagem para o eixo em


que ocorresse o estágio, particularmente o que se referiria ao curso de Licenciatura
em Pedagogia à Distância, um dos grupos de pesquisa participantes2 tinha por foco
oferecer um espaço digital na tentativa de contemplar o cotidiano pedagógico já
vivido pelos alunos, professores, tutores e gestores. O Ambiente de Aprendizagem
precisaria oferecer um espaço digital comunicativo onde palavras, ideias e vida
suscitassem redes de interação em um:
[...] processo deflagrado a partir da relação entre a subjetividade expressa na criação
dos ambientes digitais e a possível acolhida da subjetividade alheia, fundamental-
mente, na forma de relações dialógicas como estranhamentos, buscas, referências
ao cotidiano, abstrações configuradas e interações programadas conceitualmente.
[...] é a condição de habitação revelada por toda experiência de construção, que se
expressa por meio do jogo da relação de sentido entre ambiente e usuário, entre
conceito e experiência (BAIRON, 2004).

O desafio na criação do Ambiente de Aprendizagem para o período de estágio


do Curso de Licenciatura em Pedagogia na modalidade EaD estava sendo relacio-
nar sentidos pedagógicos entre cores, desenhos e disposições, compreendendo-o
em seu espaço digital como “labirinto imagético” (BAIRON, 2000). Segundo
Bairon, no labirinto imagético o análogon do fluxo perceptivo não se encontra em
um único lugar, em uma imagem móvel: ele se traduz na comunicação, em uma
convergência não-argumentativa (no sentido persuasivo) e sempre evidente (no
sentido da curiosidade epistêmica). Assim, a estética argumentativa do Ambiente
de Aprendizagem precisaria (tentar) garantir não só a mobilidade desse jogo da
relação de sentido entre ambiente e usuários, mas especialmente entre conceitos e
experiências pedagógicos enunciados.
Dos primeiros enormes e complexos computadores criados na década de 1940,
passando pelo desenvolvimento das Novas Tecnologias de Informação e Comuni-
2 Com financiamento SEAD-UFRGS edital 21, o grupo era coordenado por Cintia Inês Boll e
Mauro Meirelles e era composto por mais dois bolsistas de Graduação e um de Pós-Graduação.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 67

cação – NTIC a partir de 1950 e pelo advento da informática, da cibernética com a


microeletrônica, mais especialmente a partir de 1970, hoje a mobilidade oferecida
pela cultura digital garante não só outras formas de sociabilidades na esfera da co-
municação e da mídia, mas também outras formas de ensinar e aprender na esfera
escolar. A convergência das telecomunicações e a informática, em simbiose com a
sociedade e a cultura, estabeleceu outra estética sociocultural pela primeira vez na
história da humanidade reunindo em um mesmo ambiente técnico interconectado
o atual conjunto da memória e da comunicação digital, pois que, nas palavras dos
autores Lemos e Lévy: “As novas funções pós-massivas constituem uma cultura da
mobilidade inédita, com implicações sociais, estéticas, comunicacionais e políticas
planetárias”. (LEMOS; LÉVY, 2010, p. 71)
Desde as primeiras comunidades em listas de newgroups até as atuais partici-
pações em redes sociais, os espaços digitais de comunicação móveis ampliaram a
relação entre professores/alunos/tutores/gestores, pois que eles, tanto quanto outros
usuários passaram a: “[...] consumir, produzir e distribuir conteúdo informacional
sob qualquer formato em tempo real e para qualquer lugar do mundo sem ter de
movimentar grandes volumes financeiros ou ter de pedir concessão a quem quer
que seja” (LEMOS; LÉVY, 2010, p. 25).
Apesar de que nem todos os Ambientes de Aprendizagem institucionais
ofereçam-se como aplicativos para serem instalados pelos usuários nos disposi-
tivos móveis, a possibilidade de comunicação instantânea no espaço digital pode
fortalecer a distribuição, o consumo e, de forma singular, a prática aberta, práticas
colaborativas de produção e compartilhamento de conteúdo pedagógico.
O modelo [blended learning] surgiu na busca pela sinergia entre o ensino à distância
e o ensino presencial, buscando configurações de ensino que melhor pudessem
satisfazer os interesses de alunos e professores, levando em conta preferências de
aprendizagem, tempo disponível, entre outros fatores. Não se trata, portanto, de
pensar em quais novas mídias, sistemas ou técnicas podem suplantar modelos de
ensino vigentes. Neste fértil e produtivo embate entre modelos sedimentados e
emergentes, encontram-se oportunidades para configurações cada vez mais com-
plexas de ensino e aprendizagem, que possam satisfazer a real diversidade de alunos
e professores, nos mais variados contextos e condições (AMIEL, 2012).

Práticas Abertas em instituições, sistemas e recursos educacionais que atendam


a real diversidade nas escolas, entre elas a própria diversidade econômica, podem
colaborar para que alguns alunos das escolas públicas tenham mais facilidade de
relacionar seus currículos e conteúdos. Reconhecer naquilo que é mais próximo do
aluno (e dos professores, tutores e gestores), inserindo na mobilidade sons, imagens
e textos nos Recursos Educacionais Abertos para acessá-los também na mobilidade,
através dos aplicativos móveis, como os criados na Fábrica de Aplicativos, pode ser
mais um desafio. Um desafio em que a criação pedagógica, indicando que conteúdo

Livro Coordenação Pedagógica.indb 67 22/10/2018 14:27:24


68 O Wikilivros e as mídias móveis

do currículo merecerá ser incluído e por que, concentre esforços cooperativos e


colaborativos em cada outra possível reutilização, revisão, remix e redistribuição.

OS RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS

A Prática Aberta e colaborativa desenvolvida na produção de conteúdo


pedagógico na sala-ambiente intitulada “Práticas e Espaços de Comunicação na
Escola” foi encorajada na perspectiva de acolhida à complexa relação de ensino e
aprendizagem em tempos de cultura digital, mas também de crescente discussão
da importância da Educação Aberta.
A Educação Aberta é um movimento que promove a integração dos Recursos
Educacionais Abertos (REA), materiais (inclusive didáticos) de suporte à educação
(especialmente na modalidade à distância) que podem ser reutilizados, revisados,
remixados e redistribuídos (UNESCO, 2015). Enquanto as práticas de relações
dialógicas como estranhamentos, buscas, referências ao cotidiano, abstrações con-
figuradas e interações podem ser encorajadas desde os pressupostos da Educação
Aberta, o conteúdo da criação de um REA precisa garantir o que Lemos e Lévy
(2010, p. 73) definem como “[...] referência ao cotidiano e a singularidade local da
palavra, seja ela cultural, linguística ou musical”.
Entendemos que a referência ao cotidiano na produção do REA precisa estar
garantida nessa produção de sentido que se dá entre espaço digital e usuário, entre
conceito e experiência captada. Considerando a mobilidade de smartphones e tablets,
bem como as possibilidades de edição a qualquer momento para que se adapte aos
objetivos de uma educação formal, ao currículo escolar e seus conteúdos, tal como
a UNESCO propõe nas atuais Diretrizes para Recursos Educacionais Abertos no
Ensino Superior (2015), é possível afirmar que um REA pode garantir just in time
a inclusão do cotidiano escolar mais próximo dos usuários e suas singularidades.
Considerando que, segundo Lemos e Lévy (2010), as comunidades fundam-se num
primeiro momento sobre as coletividades territoriais de “pessoas que se frequentam
fisicamente” (p. 69), na ausência momentânea de uma plataforma brasileira em
REA para a criação do App, optamos por oferecer aos alunos da sala a possibilida-
de de não só criar, mas também de convergir suas próprias leituras singularizadas
pelos seus contextos de atuação, tendo as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Básica como ponto de partida.
A ferramenta Fábrica de Aplicativos (FA) é uma plataforma Web brasileira
que transformou nossos alunos em appers, como são chamados os criadores de
aplicações para dispositivos móveis na cultura digital, porque puderam criar e
compartilhar aplicativos de forma rápida, intuitiva e sem a necessidade de ter co-
nhecimentos sobre programação. Foram 45 horas distribuídas em quatro semanas
intensivas de aulas na modalidade à distância usando o espaço do ambiente virtual

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 69

de aprendizagem MOODLE. Entre atividades síncronas e assíncronas, leituras e


fóruns, foram criados, nos dez polos UAB no estado do RS, mais de cem aplicativos
com foco nas atuais Diretrizes Curriculares Nacionais (BRASIL, 2013)3, orientações
para a Educação Básica dos sistemas de ensino para a organização, articulação e
desenvolvimento das propostas pedagógicas nacionais.

PRÁTICAS E ESPAÇOS DE COMUNICAÇÃO NA ESCOLA

A sala “Práticas e Espaços de Comunicação na Escola” (PECE) teve como


metodologia de ensino a busca pela discussão reflexiva do seu conteúdo permeado
de exposições dialogadas, com discussão de textos e análise de práticas e espaços de
comunicação mediados por suportes tecnológicos diversificados visando à sociabi-
lidade, a produção e circulação de informações e conhecimentos e a gestão escolar.
Desta forma, as atividades desenvolvidas na disciplina PECE tiveram como
orientação a cooperação, o envolvimento e competência teórico-reflexiva. Dentre
suas atividades, a sala previu ainda a inclusão e o reconhecimento do recurso Wiki-
livros (REA) pelos alunos como parte do conteúdo e da avaliação. Cada polo ficou
responsável por uma das Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação
Básica sugeridas para estudo. São elas:
• Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (Polo
Pelotas);
• Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9
(nove) anos (Polo Santa Cruz do Sul);
• Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (Polo Caxias do
Sul);
• Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional Técnica
de Nível Médio (Polo Novo Hamburgo);
• Diretrizes Curriculares Nacionais – Educação do Campo (Polo Santo
Antônio da Patrulha);
• Diretrizes Curriculares Nacionais para crianças, adolescentes e jovens
em situação de itinerância (Polo Cruz Alta);
• Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Quilombola (Polo
Palmeira das Missões);
• Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-
-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
(Polo Santana do Livramento);

3 Os apps criados podem ser acessados através do repositório Disponível em: https://www.
ufrgs.br/culturadigitalmidiasmoveis/aplicativos-moveis-ja-desenvolvidos-colaboradores-
-educadores/

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70 O Wikilivros e as mídias móveis

• Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação em Direitos Huma-


nos (Polo Santa Maria);
• Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental (Polo Por-
to Alegre).
Os alunos de cada polo construíram à distância suas escritas através de uma
página Etherpad (da Mozilla), um editor em tempo real de documentos colabo-
rativos, para posterior transferência para o local definitivo do livro em REA: o
Wikilivros, uma extensão da Wikipédia. Com o objetivo de orientar professores,
gestores e comunidade educativa na proposição atualizada dos princípios das etapas
e modalidades, considerando as singularidades a que cada comunidade de cada
polo está inserida, a proposta ficou registrada no MOODLE, um dos Ambientes
de Aprendizagens institucionais na UFRGS. Foi enfatizado aos alunos que o ma-
terial a ser criado poderia ser usado em suas formações de professores nas suas
escolas, pois que a maioria deles eram coordenadores pedagógicos em suas escolas
públicas. Por fim, foi solicitado que cada escrita cooperativa no Etherpad pelos
integrantes dos grupos deveria conter aspectos principais, indicações, questões e
outras perspectivas que julgassem necessárias sobre a Diretriz Curricular pela qual
o polo ficou responsável.
Ao final deste trabalho, através do MOODLE e do EtherPad, que também é
REA, tal como o Wikilivros, esse documento compôs uma parte importante do
App. Além da página no EtherPad, depois transcrita para a Wikilivros pelo co-
ordenador geral da sala, os alunos puderam inserir nas abas de seus apps, vídeos
de filmes comerciais e de filmes criados por eles salvos no YouTube, entrevistas a
autores que foram referência para a construção das DCN, fotos e áudios de suas
escolas sobre a DCN a que ficaram vinculados, textos para consulta, perguntas e
respostas frequentes4. Portanto, as contribuições procuraram garantir não só olhares
singulares de cada grupo sobre uma mesma Diretriz, mas também a compilação
de diversos conteúdos e outras informações que podem ser comuns a todos que
precisarem de informações mais gerais.

A PRÁTICA NA SALA: ORIENTAÇÃO PELA COOPERAÇÃO

A necessidade de trabalhos em grupo requereu também práticas que esti-


vessem alicerçadas na colaboração e cooperação. Essas são destacadas por vários
autores que atuam na área da educação (CAMPOS et al, 2003; PARENTE, 2004;
FUKS et al, 2004; KENSKI, 2007) como um dos fatores essenciais na modalidade

4 Foi desenvolvida uma média de quatro apps por polo, totalizando mais de 80 aplicativos relacionados às
atuais Diretrizes Curriculares Nacionais. Destes, alguns grupos seguiram editando-os ao que destacamos
o “Coordenadores Pedagógicos: saberes e fazeres”, disponível no link http://galeria.fabricadeaplicativos.
com.br/coordenador_pedagogico_saberes_e_fazeres?feature=facebook

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 71

à distância. Piaget (1973) é um autor que se dedicou ao estudo da cooperação na


esfera da educação e, de forma contundente, apresentou contribuições com este
tema para as práticas nos processos de ensino e de aprendizagem.
Neste contexto, importa pontuar a diferença entre os conceitos de cooperação e
colaboração de acordo com o referencial piagetiano, que é o que estamos utilizando
para fundamentar a cooperação. Para Piaget (1973), a colaboração refere-se à união
de ações realizadas de forma isolada pelos componentes de um grupo, mesmo que
possuam um objetivo comum. E a cooperação aponta para um “além”, requerendo
vínculos e reciprocidade afetiva, possibilitando transformação de conteúdos, pela
bidirecionalidade (uma via de mão dupla), que permite a escuta dos outros, a
descentração e a ocorrência de co- criação.
Os autores Campos et al (2003) registram que a possibilidade de comunicação
é o que existe de melhor nas redes e salienta que os sujeitos precisam aprender
a utilizar-se da internet, uma vez que ela oferta condições potencializadoras de
aprendizagem cooperativa. Parente (2004) corrobora com esta ideia. O autor as-
sinala que o uso da internet, aliado a uma visão cooperativa, melhora a dimensão
qualitativa do ensino. Conforme Parente (2004), a aliança da tecnologia com uma
prática pedagógica diferenciada, pautada em um trabalho interativo, pode pro-
mover uma aprendizagem mais dinâmica, pois propicia espaços e tempo flexíveis,
que permitem intercâmbios em diversos sentidos, potencializados pelas diversas
tecnologias e em prol de um trabalho direcionado para objetivos comuns, burlando
as distâncias de espaço e tempo.
De acordo com a Declaração da Cidade do Cabo (2007), o movimento
emergente da Educação Aberta combina a tradição de partilhar boas ideias com
colegas e com a cultura da internet, alicerçada na colaboração e na interatividade.
Essa metodologia se pauta na crença de que todos devem ter a liberdade de usar,
personalizar, melhorar e redistribuir os recursos educacionais sem restrições, desde
que respeitadas as fontes. Essa crença une educadores, alunos e outros sujeitos que
compartilham o desejo de qualificar a educação, tornando-a mais acessível e mais
próxima do que Piaget aponta como cooperação.
A escola hoje é retratada como uma “organização de aprendizagem”, isto é, são
instituições que criam e não que somente reproduzem o conhecimento (UNESCO,
2009). Mas as práticas pedagógicas, de uma forma geral, ainda são incipientes nesse
sentido. As instituições propiciam pouco tempo para a experimentação, a reflexão
e o trabalho coletivo (OLIVEIRA, 2009). Assim, construírem-se alternativas em
prol de novas formas do fazer docente torna-se um imperativo no processo de
ensino e de aprendizagem.
Neste contexto, atenta-se para a proposta de um agir cooperativo entre os
sujeitos envolvidos no processo pedagógico. Uma estrutura que propicie espaços
nos quais sejam promovidas relações cooperativas pode ser uma alavanca para a
melhoria da educação.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 71 22/10/2018 14:27:24


72 O Wikilivros e as mídias móveis

A inserção de diversas práticas pedagógicas que considerem a ideia de rede


equivale a modificar a organização do processo de ensino e de aprendizagem. A
flexibilização de relações, de currículos, de disciplinas e conteúdos possibilita
diferentes formas de poder fazer, através de várias atividades, propiciando que os
alunos trabalhem conjuntamente, de acordo com os seus interesses, pesquisando,
construindo novos saberes. Esta visão implica uma concepção epistemológica, na
qual se acredita que o sujeito é construtor do seu conhecimento e não que possa
o receber de outrem.
Tal processo de construção de conhecimento, alicerçado na teoria piagetiana,
parte do pressuposto de que devam ocorrer interações entre os sujeitos, trocas
intelectuais que permitam a descentração (capacidade do sujeito de sair do seu
próprio ponto de vista para conhecer os demais e coordená-los), possibilitando
reflexões e modificações de conhecimento pelo movimento do “co-operar”, dando
continuidade ao processo de ensino e de aprendizagem. Assim, o investimento na
construção do coletivo, no compartilhamento de ideias e no trabalho cooperativo
precisa ser visto como essencial para a qualidade da educação e não como ameaça.
O trabalho efetuado na sala permitiu que ocorressem trocas entre os sujeitos,
propiciou um espaço (virtual) no qual o trabalho cooperativo ocorresse, permitindo
uma construção conjunta. Os sujeitos unidos pelas atividades precisaram estabe-
lecer relações de cooperação em prol de objetivos comuns. As trocas intelectuais
requerem movimentos de descentração, que fazem com que os sujeitos precisem
considerar outros pontos de vista e, assim, ir modificando o todo, construindo novos
saberes. Desta forma, pôde-se ter a construção dos textos e dos apps no decorrer
do período da sala, a partir dos trabalhos em grupos que foram desenvolvidos.
Piaget (1977) defende o trabalho em grupo nas práticas educacionais como
parte do processo ativo do aprendente, sendo a cooperação uma ferramenta indis-
pensável para a elaboração racional. Conceitua a cooperação como o conjunto de
interações entre os sujeitos que desejam alcançar o mesmo objetivo. Destaca que o
trabalho em grupo serve como um plus para os alunos, pois propicia o confronto
de ideias, podendo fazerem fluir os pensamentos, estimulando a criação. Desta
forma, torna-se necessária a existência de atividades e de espaços (sejam físicos ou
virtuais) para que a cooperação possa ocorrer, como salienta Piaget (2002).
Esse ponto pode ser explicitado pelos seguintes comentários de alun@s, em
que destacam a importância dos trabalhos em grupo realizados neste período e os
“avanços” que conseguiram a partir desta prática:

Professora posso afirmar que nosso grupo está conseguindo interagir com
a Fábrica de Aplicativos, fizemos avanços na semana. Conseguimos pos-
tar, alterar, excluir e incluir dados, agora nos resta continuar as investiga-
ções e ampliar as possibilidades. (Fonte: alun@ 2).

Livro Coordenação Pedagógica.indb 72 22/10/2018 14:27:24


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 73

Nosso grupo passou a tarde de hoje trabalhando na Fábrica de Aplicati-


vos. Não conseguimos acessar os links do Facebook e do YouTube. Alguém
conseguiu postar algo? Fizemos conta nos dois aplicativos em nome do
grupo para verificar o acesso e não tivemos êxito... seguimos o tutorial e
nada. Aguardamos dicas. (Fonte: alun@ 5)

Olá profe.. Nosso grupo está caminhando para a construção do App, con-
fesso que é algo bastante novo para mim. (Fonte: alun@ 6)

Então, percebe-se que a proposta da sala disponibilizou esses espaços e, a


partir deles, práticas cooperativas, nas quais todos trabalharam conjuntamente
em prol dos mesmos objetivos. Nas seguintes postagens, os alunos destacam as
suas experiências, dificuldades e alegrias com a exploração e uso dos recursos que
foram propostos nos trabalhos realizados nos grupos:

Professora, esta disciplina realmente trouxe muita aprendizagem para mi-


nha vida, principalmente com relação à exploração das mídias digitais e
também, quanto ao conhecimento das políticas públicas de direito e acesso
gratuito a internet. Um grande abraço. (Fonte: alun@ 3)

Percebi nesta disciplina que com os poucos recursos que as Escolas pos-
suem se tiver interesse dos professores e orientações dos coordenadores
pode acontecer um aprendizado significativo e atraente aos alunos, favo-
recendo assim um elo entre a teoria e prática. (Fonte: alun@ 4)
De acordo com Piaget, somente a cooperação conduz à autonomia. Desta for-
ma, atenta-se para a importância de favorecê-la nos ambientes, tendo-se o cuidado
para que elas sejam interações entre todos: coordenadores, gestores, professores,
alunos e demais envolvidos nas instituições.

Hoje ninguém mais tem dúvida de que os alunos de nossas escolas são
extremamente hábeis em manipular qualquer tipo de recurso tecnológico.
Mas vale lembrar que lhes falta ainda preparo para saber filtrar o que é do
que não é útil e isso quem deve fazer é o professor, pois de nada adianta
ter disponíveis todos os recursos se não se souber utilizá-los, e acredito
que, muitas vezes, isso acontece. É necessário levar para sala de aula tais
recursos, mas, para isso, é importantíssimo o planejamento, pois, saber
aonde se quer chegar é fundamental para que não se caia no lugar comum
(Fonte: alun@ 1).

Outros dados que validam a importância dessas práticas para a formação dos
gestores encontramos nos registros de relatos da Atividade 3, na qual os alunos
deveriam anotar as potencialidades comunicativas das suas escolas e realizar um
planejamento do uso do aplicativo na sua instituição. A exigência desses plane-

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74 O Wikilivros e as mídias móveis

jamentos permitiu que se observasse que os coordenadores se preocupam com o


aspecto da comunicação e que respondem positivamente ao uso de novas possibi-
lidades, apesar das dificuldades e das resistências envolvidas no processo.
Exemplos de extratos retirados dos trabalhos dos grupos na realização da
Atividade 3:

Com a realização desta atividade percebemos que, podemos potencializar


o acesso às informações através dos aplicativos desenvolvidos pelo grupo.
O trabalho colaborativo com o uso de aplicativos é uma ferramenta muito
eficiente para pesquisa e informação em todas as áreas do conhecimento
(Fonte: grupo 1).

A aprendizagem cooperativa, conforme Piaget (1973), é a forma de aprender


a aprender por meio de atividades, interações com objetos físicos e culturais, sejam
essas individual ou coletivamente. Neste caso, o trabalho realizado em conjunto
mostrou-se, de acordo com a aluna, uma ferramenta eficiente para os objetivos
propostos pela sala. As interações entre os sujeitos exigiram a cooperação para
realizarem o App.

O App é uma tecnologia móbile que poderá aumentar o interesse dos pro-
fessores nas reuniões pedagógicas e dos alunos durante as aulas com a
apresentação de textos, vídeos, fotos. Esse APP servirá como divulgador
do trabalho da coordenação pedagógica e dos professores, socializando o
conhecimento construído na escola (Fonte: grupo 2).

A partir desses exemplos, podemos ver como o uso do aplicativo supre


demandas dos profissionais em relação ao aspecto de práticas comunicacionais
nas instituições escolares e inclusive com a comunidade escolar como um todo.
Dessa forma, retrata-se a carência que existe nas formações e do quanto esta sala
conseguiu atingir os objetivos aos quais se propôs. Considera-se também que as
práticas fundamentadas na cooperação foram essenciais para o sucesso do trabalho.
Autores como Castro e Santos (2010) corroboram a ideia de que os saberes
são produzidos principalmente nas interatividades, no aprender com o outro e,
assim, torna-se necessário estabelecer e formar redes de aprendizagens em um
“sistema educacional aberto, plástico, atemporal e ininterrupto” (CASTRO; SAN-
TOS, 2010, p. 05).
Inserirem-se práticas que possibilitem trabalhos cooperativos no processo
de ensino e aprendizagem na modalidade à distância; aliados aos REA, são im-
portantes alicerces para as relações em tempos de cultura digital. A educação hoje
requer a criação coletiva, o trabalho em grupo, mobilidade e práticas que sustentem
esta complexidade. Assim, incorporar os pressupostos da Educação Aberta com

Livro Coordenação Pedagógica.indb 74 22/10/2018 14:27:24


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 75

práticas que possibilitem novas (re)significações dos sujeitos torna-se relevante na


sociedade contemporânea.
Silva (2008) aponta que é necessário um trabalho de inclusão digital do pro-
fessor e dos alunos que conduza à superação do modelo presencial, historicamente
pautado na pedagogia da transmissão. Afirma que os canais de comunicação ali-
cerçados na web 2.0 podem potencializar a democratização da educação, através
de uma docência interativa e de uma aprendizagem cooperativa.
Dessa forma, neste contexto da sala, observou-se que a organização dos alu-
nos nos trabalhos em grupo de forma cooperativa em prol de objetivos comuns
auxiliou-os a superarem as suas dificuldades e explorarem as potencialidades que
os recursos ofereciam. Estas ferramentas foram incorporadas às suas práticas como
gestores, a partir das reflexões sobre os usos dos aplicativos. No final da sala, foi
realizado um workshop, no qual os grupos compartilharam os seus apps entre si.
Neste espaço afirmam que estão utilizando os apps desenvolvidos durante a sala
para usos diversos, agregando funcionalidades em suas atividades profissionais,
tais quais: agendamento de reuniões, compartilhamento de textos, vídeos, entre
outros. O uso das práticas cooperativas foi um plus que alcançaram neste momen-
to, conseguindo transpor os muros institucionais, construindo também canais de
comunicação com a comunidade, através da utilização dos apps.

TRANSPOSIÇÃO DA ESCRITA COLABORATIVA:


DO ETHERPAD PARA O WIKILIVROS

O livro editado sob os pressupostos da Educação Aberta no Wikilivros,


destinado às publicações dos textos colaborativos dos polos, foi intitulado como:
REA – Educação à distância e Ambientes de Aprendizagem5, e teve como principal
objetivo oferecer uma releitura deste importante documento feito pelos já gestores
das escolas públicas do RS e pós-graduandos. Cada página deste livro REA, res-
peitada a autoria, pode ser reusada, revisada, remixada e redistribuída. Essas são
as permissões concedidas aos usuários que acessam as páginas e que seguem as
regras de usabilidade do recurso Wikilivros. Nesse sentido, existe um moderador
do recurso responsável por monitorar e filtrar os conteúdos inseridos, de forma a
garantir que todo e qualquer conteúdo seja utilizado para fins educacionais.
Os textos desenvolvidos por cada polo foram feitos colaborativamente dentro
do Editor Etherpad para que ao final da disciplina os mesmos fossem transpostos
para o Wikilivros. A responsabilidade pelo encaminhamento dos textos no Etherpad
ficou a cargo da coordenação da sala e dos docentes responsáveis pela disciplina nos
polos. Embora ambos os recursos sejam REA, o Etherpad não possui um moderador

5 O livro pode ser acessado no endereço: https://pt.Wikibooks.org/Wiki/REA_-_


Educa%C3%A7%C3%A3o_a_Dist%C3%A2ncia_e_Ambientes_de_Aprendizagem.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 75 22/10/2018 14:27:24


76 O Wikilivros e as mídias móveis

e o Wikilivros, por sua vez, por se tratar de uma extensão da Wikipédia, possui todo
um processo de moderação que dificultaria a edição por várias mãos. Foi por esse
motivo que se optou pelo Etherpad, isto é, os textos poderiam ser criados, editados
e alterados livremente pelos appers e, somente após a finalização da disciplina, seu
conteúdo ser transposto para o Wikilivros de acordo com as normas.
Este material pode ser utilizado nas escolas para consulta e distribuição de
informações entre os professores. No que tange a sua reedição, revisão e atualização
de dados, o gestor deve ter o cuidado de respeitar as normas e regras estipuladas pelo
Wikilivros. Em nossa experiência de escrita, na criação/inserção de informações,
foi possível conviver com estas regras e também entender um pouco mais sobre
como este trabalho em rede é realizado. Na tentativa de contribuir para outras
inserções deste tipo – do lugar educativo e na interlocução com a educação formal
–, descreveremos a seguir experiência de edição no Wikilivros, entre os sabores de
desafios junto à equipe de moderadores.

O PROCESSO DE INSERSÃO DE CONTEÚDO

Poucas horas depois de iniciarmos a nossa transposição de escrita do Ether-


pad para a página do livro REA – Educação à distância e Ambientes de Aprendiza-
gem, um retorno via e-mail do moderador do Wiki nos foi dado. Neste e-mail de
orientação, o mesmo nos sugeriu olhar mais atentamente para as regras/normas
do recurso, pois em seu entendimento nosso conteúdo “poderia não se encaixar
nos moldes do Wikilivros”. Este início de transposição acarretou em torno de três
e-mails entre justificativas e respostas entre o moderador da página e o editor do
livro. Dentre as colocações listadas pelo moderador, estava a justificativa de que
o conteúdo inserido deveria ser revisto e adequado às normas de escrita. Ao final
desta troca de e-mails, o moderador apagou nosso conteúdo e, antes de iniciarmos
novamente, voltamos à página do Wikilivros que tratava sobre a adequação da
informação e padronização. Nesse processo não só foi possível compreender na
prática os pressupostos de uma Educação Aberta no Ambiente de Aprendizagem,
mas também, e especialmente, fazer uma leitura minuciosa das normas do recurso
antes de começar um novo projeto, fosse ele uma apostila, tutorial, texto didático
ou mesmo um manual de conteúdo livre.
Toda proposta de criação de um texto colaborativo proporciona a partici-
pação em como a informação pode ser organizada e apresentada, dando assim
uma inestimável contribuição sobre um tema, assunto ou tópico de forma mais
resumida, clara e objetiva. Com esta proposta em mãos, em um primeiro momento
essa transposição de conteúdos do Etherpad nos pareceu simples. Mas vivenciamos
essa experiência na prática e ela realmente não foi. A criação de um projeto no Wi-
kilivros requer atenção principalmente sobre aquilo que não deve figurar em suas

Livro Coordenação Pedagógica.indb 76 22/10/2018 14:27:24


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 77

páginas. Dentre as normas de criação/edição (Wikilivros: Adequação da informação


e padronização, 2016), podemos citar aqueles documentos que não se encaixam:
• Livros publicados: sejam obras clássicas ou não, os livros publicados pre-
sumem uma finalização do processo de edição e, portanto, desta forma
não fazem sentido num Wiki.
• Fontes primárias: também chamadas de corpus, no contexto científico;
são documentos usados para pesquisa, especialmente nas Ciências So-
ciais, como: cartas, mapas, leis, jornais, etc.
• Artigos acadêmicos: assim como os livros e as fontes primárias, não são
adequados para a edição por terceiros.
Após uma leitura minuciosa nas normas e adequação da informação e pa-
dronização das páginas do Wiki, reorganizamos a escrita das diretrizes dos polos
e iniciamos em definitivo a transposição dos conteúdos.
Ao reiniciarmos a transposição da escrita do Etherpad para o Wiki, além de
ser necessário fazer login para utilizar o recurso, buscamos a página inicial do livro
REA – Educação à distância e Ambientes de Aprendizagem, e a partir dela criamos
uma nova página para cada Diretriz Curricular. Esse processo de criação é ilustrado
na figura 1 abaixo:

Figura 1: Criação de um hiperlink entre uma nova página


e a página principal do projeto do Wikilivros

Na figura 1, é selecionado o índice a ser linkado (hiperlink) e escolhe-se na


barra de opções do Wiki o botão ligação (Ctrl+K). Após selecionar esta opção, a
caixa de hiperligação se abre e a mesma sugere: buscar a página dentro do Wiki,
buscar externamente (URL) ou criá-la, já que o nome sugerido para a nova pági-
na pode ainda não existir. Em nosso caso, como a página havia sido criada, ela já

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78 O Wikilivros e as mídias móveis

aparece com o nome. Caso a página não tivesse sido criada, o Wiki sugeriria como
nome o texto já selecionado. Seguindo por esta opção, o autor é redirecionado para
uma nova janela com duas opções de edição: Editar esta página ou criar. A figura
2 mostra esse processo.

Figura 2: Criação/edição de uma nova página no Wikilivros

Na figura 2, é possível visualizar que as duas opções permitem a edição/inser-


ção de conteúdo nesta nova página onde impreterivelmente ao término da edição
deverá ter seu conteúdo gravado. Cabe ressaltar que, sempre que alguma gravação
é realizada em uma página, o Wiki abre uma janela para a descrição de um breve
comentário a respeito do que foi realizado. A figura 3 ilustra esse processo.

Figura 3: Gravando alterações na página do Wikilivros

Na figura 3, é possível visualizar que o Wiki guarda um histórico de todas as


alterações realizadas em uma página. Desta forma, é possível rever o processo de
escrita contido, além do dia e hora e o usuário que efetuou a alteração. Além do
resumo a ser inserido (pequeno texto identificando o que foi realizado na página),

Livro Coordenação Pedagógica.indb 78 22/10/2018 14:27:24


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 79

as opções de marcar como edição menor e vigiar esta página também podem ser
acionadas.
Importante destacar que, com essa experiência, foi possível perceber que o
processo de uso da Wikilivros pelos pós-graduandos e outros usuários que vierem
a desenvolver suas propostas num Recurso Educacional Aberto, precisa ter um
roteiro claro a ser seguido. Esta organização e planejamento facilita o processo da
escrita, pois cada informação leva a outra informação (através dos hiperlinks) em
que todas estão interligadas entre si vinculadas à página inicial do projeto.
Outro fator a ser destacado é que a criação de qualquer Objeto de Aprendi-
zagem precisa ser pedagogicamente preparada e considerar, entre os outros fatores
apresentados acima, o próprio tempo da análise do moderador do ambiente digital
utilizado. A experiência com a criação de apps nos convida a refletir sobre a escolha
e o uso dos recursos tecnológicos que agregam e viabilizam a discussão das mídias
na educação, buscando inovar não somente as práticas pedagógicas, mas ir além
da sala de aula, contribuindo em outros aspectos da educação como a gestão de
documentos, propiciando estratégias de colaboração, cooperação e principalmente
o compartilhamento de informações entre gestores, docentes, alunos e a comuni-
dade escolar. Essa convergência entre os recursos de softwares vai ao encontro da
educação aberta: à medida que o livro REA – Educação à distância e Ambientes de
Aprendizagem tem suas informações atualizadas, os apps desenvolvidos também
acompanham essa atualização, pois possuem uma aba contendo essa opção de
visualização da página do Wikilivros.

CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS FUTURAS

O mundo da cultura digital apresenta e se apresenta nas modificações advin-


das do processo contínuo entre homem-máquina-tecnologia. Como educadores,
perseguimos incansavelmente as mudanças que contemplem cidadãos em suas
práticas cooperativas e, acima de tudo, significativas para suas vidas. Desta ma-
neira, a partir da sala “Práticas e Espaços de Comunicação na Escola”, criaram-se
vários espaços que viabilizaram a discussão das mídias na produção e circulação
de informações para, por e com a comunidade escolar. Através das leituras, das
trocas, dos trabalhos em ambientes de aprendizagem na modalidade à distância,
nas criações dos appers e seus apps, viveram-se outras possibilidades de espaços
educadores junto aos gestores.
A vivência da utilização das tecnologias criou o protagonismo necessário para
que o desassossego se instalasse: da imobilidade do texto em papel, nem sempre
disponível quando se precisa dele, das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
mobilidade de um app. Outras discussões sobre o uso pedagógico dos smartphones
nos espaços escolares uniram-se a esta opção de trabalho da equipe de professores

Livro Coordenação Pedagógica.indb 79 22/10/2018 14:27:24


80 O Wikilivros e as mídias móveis

da sala “Práticas e Espaços de Comunicação na Escola” que tinha, entre os desa-


fios propostos na súmula da disciplina, o de propor a “análise dos limites e das
potencialidades que os diferentes ambientes comunicacionais oferecem no tocante
à sociabilidade, à produção e circulação de informações e de conhecimentos e à
gestão escolar”. Considerando a modalidade do Curso, foi possível ressignificar
muitos aspectos da sua própria potencialidade criadora.
Cada dia mais, a Educação à distância inclui as experiências de seus usuá-
rios, pois que a modalidade é obrigatoriamente mediada por tecnologias em que
eles estão separados espacial e/ou temporalmente. Considerando que, nos cursos
em Licenciatura à Distância, as experiências se processam necessariamente em
consonância com propostas didático-pedagógicas de ensino e aprendizagem, é
possível crer que estudar preferencialmente nessa modalidade é constituir-se ética
e esteticamente em tempos de comunicação instantânea. É possível crer ainda que
a Tecnologia Móvel e seus aplicativos desenvolvidos para uso na mobilidade não só
contribuam para a diminuição da evasão na EaD, mas também para a compreensão
do que é aprender e ensinar em tempos de cultura digital.
Neste universo, aliar-se às práticas colaborativas e cooperativas torna-se um
imperativo. A cada dia, novas informações são acrescentadas ao universo virtual,
requerendo diferentes saberes das mais diversas áreas do conhecimento para que
a aprendizagem seja de qualidade. A sociedade atual requer novos processos de
ensino e de aprendizagem e que contemplem uma formação de sujeitos mais cria-
tivos, mais autônomos. Desta forma, corrobora-se a tese piagetina que considera
a cooperação como um acordo (explícito ou implícito) entre as partes, de uma
forma em que todos ganham, e como o melhor caminho para o desenvolvimento
da autonomia moral e intelectual.

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BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais

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Livro Coordenação Pedagógica.indb 82 22/10/2018 14:27:25
O processo de aprendizagem de 0 5
teorias de currículo na educação
continuada de coordenadoras
pedagógicas: o caso de duas turmas
de um curso de especialização

Iana Gomes de Lima


Luis Armando Gandin
Ricardo Boklis Golbspan

INTRODUÇÃO

Este artigo tem como objetivo analisar a importância da sala-ambiente “Cur-


rículo, Cultura e Conhecimento Escolar” (CCCE) no processo de aprendizagem
das alunas1 do Curso de Especialização em Coordenação Pedagógica – 2ª edição,
do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica, do Ministério da
Educação, a partir de nossas avaliações como docentes. Não se trata aqui de uma
discussão definitiva sobre esse processo, mas de algumas observações decorrentes
das avaliações pedagógicas que fizemos de nossos trabalhos ao longo do desenvol-
vimento desta sala. Essas avaliações foram focalizadas na aprendizagem – de parte
de nossas alunas – de conceitos centralmente trabalhados nessa sala-ambiente.
Trataremos aqui especialmente do trabalho com os conceitos de cultura, conheci-
mento e do próprio conceito de currículo – e das relações entre eles –, por serem
temas ressaltados na bibliografia da sala-ambiente. Além desse objetivo, queremos
apontar a importância de um curso de formação que tenha como foco um trabalho
coletivo e colaborativo. Temos em vista, neste sentido, os processos de intensificação
que o trabalho docente vem sofrendo (APPLE, 1995) e que o estão tornando cada
vez mais solitário (APPLE, 1989).

1 Optamos por nos referir ao grupo sempre no feminino devido ao fato de grande parte dos dis-
centes, em nossas disciplinas, serem do sexo feminino.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 83 22/10/2018 14:27:25


84 O processo de aprendizagem de teorias de currículo na educação continuada de ...

A opção por analisar o que foi trabalhado na disciplina CCCE deve-se ao


enfoque que procuramos colocar na temática do currículo escolar. Afinal, é esta
temática, dentre as diferentes trabalhadas no Curso, que orienta a gestão que uma
coordenadora pedagógica (função ocupada nas escolas pelas discentes da formação)
prática no seu dia a dia. Com efeito, no sentido de apontar essa centralidade do
estudo do currículo, o texto de introdução à sala-ambiente apresentado às alunas
no ambiente virtual em que o curso ocorreu é elucidativo:
O currículo é o coração da atividade de um Coordenador Pedagógico. Pensar suas
múltiplas origens, as lutas em torno do que conta como conhecimento “oficial”, as
hierarquias entre os múltiplos conhecimentos que compõem este currículo, são
atividades centrais para um Coordenador Pedagógico, que coordena, nas escolas,
o processo de construção da organização curricular. Levar em conta a cultura, as
interações e construções das comunidades com o contexto em que estão inseridos
é fundamental para que o currículo seja vivo e não apenas uma reprodução de
conteúdos sem vínculo com os sujeitos, que são os que constroem o conhecimento
na escola. Esta sala, intitulada Currículo, Cultura e Conhecimento Escolar, busca
fazer esta discussão e contribuir para o fazer pedagógico que os Coordenadores
Pedagógicos precisam coordenar nas escolas […]. (GANDIN, 2015).2

O currículo, então, sendo o “coração” da atividade de uma coordenadora peda-


gógica, precisa ser estudado pelas discentes em sua complexidade – considerando-se
sua história, os tipos de conhecimento que são reconhecidos como legítimos na
escola, as culturas que são reconhecidas como corretas no cotidiano pedagógico,
por exemplo. É, assim, oferecendo às discentes subsídios teóricos referentes ao es-
tudo do currículo, que se procurou trabalhar um aprimoramento de sua prática de
coordenação pedagógica na escola. A seguir, ao analisarmos o processo de formação
ocorrido nesta sala-ambiente, procuraremos trazer alguns elementos para debate
e algumas conclusões sobre como isto ocorreu, considerando-se as postagens das
discentes nas aulas virtuais da sala. Realizar a análise da importância desta sala no
processo de formação das discentes nos parece importante para que se compre-
endam avanços e desafios existentes para o Curso e também para se levantarem
dados sobre a realidade, em termos de formação educacional, que enfrentam essas
coordenadoras pedagógicas em seus contextos profissionais.
A noção de formação e aprendizagem empregada em nossa análise é derivada
da leitura de Silva (1987) sobre o currículo:
A desconsideração da relação entre poder e cultura (que inclui cultura de “elite”,
o “saber sistematizado”, mas também os significados e formas culturais de grupos
subordinados, bem como mercadorias postas a circular pelos meios de comunicação

2 Texto de abertura da sala-ambiente “Currículo, Cultura e Conhecimento Escolar” (CCCE) de


autoria do Coordenador da sala, Danilo Luís Armando Gandin. Disponível em: <http://coor-
denacaoescolagestores.mec.gov.br/ufrgs/course/view.php?id=28>. Acesso em: 25 de janeiro de
2016.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 84 22/10/2018 14:27:25


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 85

de massa), leva a um empobrecimento da análise sobre currículo. Essa análise não


tem senão como ficar reduzida, limitada, a questões de como um corpo de conhe-
cimento deve ser ensinado e aprendido, numa regressão a concepções tecnicistas,
por outro lado tão justamente criticada pelos conteudistas (SILVA, 1987, p. 24).

Dessa maneira, nossa proposta de investigar aqui o processo de análise do


conceito de currículo passa por não olhar isoladamente para essa área de conhe-
cimento como um saber neutro a ser transmitido por nós e apreendido por uma
aluna abstrata. Passa por considerar a história, a história da educação e da área
profissional da pedagogia em particular, e o contexto de mudanças e contradições
por que estas áreas têm passado. É, então, com um olhar que leve em conta as
relações de disputa de poder que historicamente se constituíram na área da edu-
cação e a realidade em que se encontram as discentes do Curso, que entendemos
o funcionamento do processo no contexto dessa formação específica.
Para possibilitar este trabalho sobre a formação das alunas, buscamos conside-
rar como dados as respostas às atividades online que propusemos na sala-ambiente
– respostas postadas também online por nossas alunas. Dessa forma, ao analisarmos
estes materiais, procuramos examinar como o entendimento de currículo foi sendo
construído e/ou ressignificado por elas, com nossas orientações, ao longo da sala.
Procuramos expor aqui nosso objetivo, a centralidade que vemos no tema,
a base conceitual e metodológica que empregamos, os procedimentos de campo
que selecionamos e o entendimento que temos de aprendizagem como processo
histórico e cultural (SILVA, 1987). Na próxima parte do texto, apresentaremos e
discutiremos as atividades que elaboramos e as respostas das discentes do Curso,
em duas unidades propostas na sala-ambiente3. A primeira foi dedicada a uma co-
nexão entre o currículo escolar e a cultura; a segunda, ao conceito de conhecimento
e sua relação tanto com cultura como com currículo. Finalmente, na última seção
do texto, procuraremos apontar um fechamento da discussão aqui proposta, em
função das análises realizadas e de nosso objetivo com o artigo.

O PROCESSO DE APRENDIZAGEM DO CONCEITO


DE CURRÍCULO NA SALA-AMBIENTE “CURRÍCULO,
CULTURA E CONHECIMENTO ESCOLAR”.

Após a unidade inicial da sala-ambiente, em que as alunas foram introduzidas


à temática a partir de uma aula presencial, iniciou-se um trabalho sobre aspectos
específicos do currículo escolar. Deste modo, na Unidade 2, o foco esteve na centra-

3 Excluíram-se desta análise as atividades da primeira unidade da sala-ambiente, dedicada a uma


introdução à área de currículo. Excluiu-se, também, a última unidade, dedicada a uma finaliza-
ção do debate. Concentramo-nos nas duas unidades centrais da sala, mais dedicadas às teorias
de currículo da bibliografia do curso.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 85 22/10/2018 14:27:25


86 O processo de aprendizagem de teorias de currículo na educação continuada de ...

lidade do conceito de cultura na recente pesquisa educacional sobre o currículo – e


na relevância que esse conceito pode ter para se pensar a prática de coordenação
pedagógica. As cursistas aqui foram orientadas a, em primeiro lugar, ler o artigo
“Educação escolar e cultura(s): construindo caminhos” (MOREIRA; CANDAU,
2003). Resumidamente, pode-se dizer que este é um artigo que apresenta, ainda
que de forma sintética, como o conceito de cultura tem sido introduzido ao longo
dos últimos anos no campo da educação. Ressalta a importância do conceito para
que se possam entender alguns desafios que a escola precisa superar, sobretudo, em
relação ao modo como tem lidado com a diversidade cultural nos diversos contextos
em que se insere. Após a leitura, a proposta foi de que utilizassem o fórum virtual
de que a turma dispunha para comentar as seguintes provocações:
• – Qual a relação que os autores estabelecem entre cultura e escola?
• – Por que eles colocam culturas no plural?
• – Que reflexões você pode fazer sobre sua realidade escolar a partir desta
leitura?
A seguir, então, analisamos algumas postagens das alunas, para discutir como
esses conceitos foram sendo compreendidos e conectados com sua prática profissio-
nal. Examinem-se, por exemplo, as seguintes postagens, de duas diferentes alunas4.
Comecemos por aquela que foi a primeira postagem feita na unidade:

A grande pergunta é: como trabalhar com crianças e jovens que chegam


a nossa escola de grupos sociais, culturais tão diferentes e adaptá-la às
normas, condutas e valores vigentes? Não é tarefa fácil, com certeza, irá
requerer do professor nova postura, novos saberes, novos objetivos, novos
conteúdos, novas estratégias, e novas formas de avaliação, tendo em vista
as diversas CULTURAS que esses alunos trazem para a escola. Procura-
mos trabalhar e respeitar a individualidade dos alunos, proporcionando
momentos de reflexão sobre questões da atualidade, organizando peças
teatrais e musicais.

Há aqui alguns elementos a se observar sobre a interpretação da aluna acerca


dos conceitos de cultura e currículo. Em primeiro lugar, pode-se atentar para a
rearticulação que a aluna faz da proposta da atividade, ao tornar a pergunta mais
importante, para ela, aquela que elabora – e, assim, tirar do primeiro plano aquelas
previstas inicialmente para a unidade. Esta pergunta, que julga a mais importante,
consiste em refletir sobre como adaptar os alunos da escola “às normas, condutas
e valores vigentes”. Essa é uma interpretação que não encontra fundamento teó-
rico no texto que as alunas leram. Pelo contrário, o texto propõe justamente que

4 As postagens das alunas foram reproduzidas apenas com algumas correções quanto à digitação,
pontuação e ortografia, não alterando, no entanto, o sentido original do texto.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 87

a escola precisa se adequar às diferentes culturas dos diferentes contextos em que


opera, para fazer sentido aos alunos. Foi essa postagem que conduziu o seguinte
comentário online de um de nós, como professor:

[…] os textos da sala apontam para um olhar que não sustenta o currículo
como uma adaptação dos estudantes à norma vigente. Então a pergunta
teria uma diferença que pode parecer pequena, mas é fundamental. Tal-
vez pudesse ser o inverso: “Como a escola pode se adaptar, e as normas
vigentes serem transformadas, de modo a respeitar e a aprender com as
diferentes culturas que chegam à escola?”.

Deve-se, porém, considerar a resposta que a aluna dá a sua própria pergunta,


no segundo trecho do comentário, quando afirma que não é uma tarefa fácil para o
professor trabalhar com um público tão diverso e que isso exige uma nova postura
do docente. Pode-se perceber que há também uma aprendizagem de conceitos da
sala e do texto proposto em específico. Isso aparece quando a aluna reconhece a
necessidade de os professores compreenderem que há uma variedade de culturas
diferentes em uma variedade de identidades pessoais dos alunos da escola. Por
isso, seria preciso repensar conteúdos, metodologias e avaliações. Note-se no texto,
então, uma contradição entre a pergunta que faz, mais conservadora em relação à
noção da cultura escolar (no sentido de que não se contestam os limites do enten-
dimento do conceito de cultura que é tradicionalmente estabelecido na escola), e
sua resposta, que propõe uma postura transformadora em relação à cultura escolar.
Há de se considerar ainda o trecho final de seu texto. Nesse momento, a aluna ex-
plica rapidamente o que tem feito em sua escola como coordenadora pedagógica.
É interessante perceber como a questão da cultura aparece, na sua fala, associada
apenas a certos tipos de eventos culturais, quais sejam o teatro, a música e o debate
sobre atualidades. Há uma ausência de entendimento de que a cultura está pre-
sente no currículo e na escola de forma ampla, e é constituída em outros eventos
culturais também. Assim, a aluna aponta que há, de sua parte, uma tentativa de
transformar a cultura escolar, ainda que sinalize também, contraditoriamente, um
entendimento do conceito de cultura que abrange apenas parcialmente a comple-
xidade proposta no texto.
Esta fala e as análises que antes fizemos apontam algumas influências que a
leitura do texto despertou na aluna, e também alguns elementos sobre o contexto
cultural em que a própria aluna se insere no seu cotidiano profissional, resultando
em uma postagem que se pode considerar contraditória. Seu texto indica que a dis-
cussão teórica da unidade trouxe efeitos em seu entendimento sobre a coordenação
pedagógica que exerce, especialmente em relação à orientação aos professores. É
importante que se registre como a aluna pôde incorporar alguns aspectos centrais
do conceito complexo de cultura trabalhado na unidade. Também se deve ressaltar
como a presença de características mais convencionais em seu discurso, como as

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88 O processo de aprendizagem de teorias de currículo na educação continuada de ...

examinadas anteriormente, apontam como há uma tradição cultural de percep-


ção por parte dos atores envolvidos na escola, a respeito daquela instituição e do
currículo, que segue influenciando decisivamente o modo como se define, sente
e reflete a realidade escolar. Isso não pode ser desconsiderado, apesar dos efeitos
positivos da realização da atividade proposta.
Para se analisar também como o processo de formação dentro da sala não
foi uniforme, outra fala, de outra aluna, e que vai em outra direção é a seguinte:

Chamou minha atenção o trecho do texto que fala que: “A escola sempre
teve dificuldade em lidar com a pluralidade e a diferença. (...) Sente-se
mais confortável com a homogeneização e padronização.” Apesar de se
falar tanto em cultura e culturas, mesmo sabendo a riqueza que a diver-
sidade representa para nossas escolas, continuamos a reprimi-la e fazer
do modo mais cômodo. Precisamos nos desacomodar para fazer com que
a diversidade cultural possa enriquecer as experiências na escola e na so-
ciedade.

A fala é elucidativa para se observar a interpretação que a aluna faz do texto


e em especial do trecho que destaca, podendo ser esta postagem relacionada com
todas as três perguntas provocativas preparadas para a atividade. O trecho desta-
cado pela aluna discute a história da cultura da escola, servindo justamente para se
pensar que cultura se espera que a comunidade escolar construa no seu cotidiano.
A aluna aponta como o debate sobre a cultura escolar precisa ser levado a sério,
não se resumindo a apenas falar sobre isso como algo abstrato ou distante, mas de
fato servindo a teoria estudada para uma transformação na prática da coordenação
do currículo e da escola de modo geral. Ao colocarmos em diálogo esta percepção
com aquela da aluna antes citada, nota-se um entendimento desta segunda aluna
de que está, sim, estabelecida uma conversa sobre diversidade cultural no meio
educacional. Porém, ela aponta como é necessário que a superficialidade da con-
versa seja superada por uma compreensão de que a escola precisa ter sua cultura
transformada – o que vai ao encontro do texto discutido na sala.
O texto da aluna, assim, é representativo para se perceber que, apesar desta
cultura tradicional da escola em que ela é igualadora e homogeneizante (MOREIRA;
CANDAU, 2003), há exemplos concretos de que esta lógica pode ser desafiada. A
aluna aponta como consegue assumir uma postura crítica sobre a cultura escolar
tradicional (que, afinal, tem influências sobre quem trabalha com educação, como
ela mesma), e como consegue pôr o foco dos desafios da escola na própria escola,
que precisa mudar. Assim, ela evita que se atribuam os problemas da escola àqueles
que não se “adaptam” às normas vigentes, como sugere a primeira discente citada.
A fala da segunda aluna, ao expor sua leitura da teoria do texto, aponta justamente
para o sucesso da atividade em possibilitar teoria e discussão útil para uma melhor
prática de coordenação do currículo.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 89

Neste sentido, houve também na unidade seguinte da sala-ambiente, teoria


e discussão com potencial para contribuir com o trabalho de nossas alunas, como
procuramos demonstrar a partir de agora. A terceira unidade da sala-ambiente
contava com a leitura de dois textos. O primeiro deles, de Tomaz Tadeu da Silva
(1987), denominado “Conteúdo: um conceito com falta de conteúdo?”. Neste arti-
go, Silva discute os conteúdos que são trabalhados nas escolas, problematizando
aquilo que entendemos como o “saber sistematizado”. O autor elucida a discussão
através de conceitos de Pierre Bourdieu, apontando que é questionável afirmar que
o domínio de determinados conteúdos garantiria a reprodução ou a transformação
social. Isto porque, através dos ensinamentos de Bourdieu, é possível perceber que
há questões para além do conteúdo, como as atitudes, a forma de agir – fatores
que também seriam fundamentais para a formação do aluno. Portanto, a forma
e a atitude também merecem a atenção dos educadores, já que são “conteúdos”
ensinados pelos professores. O segundo ponto trazido por Tomaz Tadeu da Silva
em relação ao conteúdo é que se tem uma ideia de que existe “um” determinado
saber, como se não houvesse divergências e conflitos em relação aos conteúdos
das mais diferentes áreas. O autor também chama atenção para o fato de que não
se pode separar o conteúdo da forma, apontando que a forma também contém
conteúdos em si própria, como, por exemplo, questões relativas a como pensar,
como raciocinar, e que são aprendidas pelos alunos.
O segundo texto trabalhado na Unidade 2 foi A Construção do Currículo:
seleção do conhecimento escolar, de Lucíola Santos. A autora inicia o artigo trazen-
do um histórico sobre a discussão acerca dos conteúdos selecionados para serem
ensinados. Lucíola afirma que, historicamente, acreditava-se que as crianças prove-
nientes de famílias de baixa renda não conseguiam aprender porque “não tinham
desenvolvido uma linguagem, hábitos e habilidades capazes de garantir a apren-
dizagem dos conteúdos escolares” (SANTOS, 2009, p. 10). Contudo, ressalta que,
no final dos anos 60, um grupo de pesquisadores ingleses da área da Sociologia da
Educação, provocando um novo olhar sobre os conteúdos, começou a questionar
se eram realmente as crianças pobres que não conseguiam aprender ou se era a
escola que estava ensinando de forma equivocada. A autora mostra que os conte-
údos são atravessados por questões de poder, priorizando determinados interesses
de determinados grupos sociais. Lucíola Santos afirma que os professores, a partir
desta premissa, precisam questionar-se sobre a importância e relevância daquilo que
estão ensinando, refletindo se estão desvalorizando a cultura das classes populares.
O objetivo, ao trazer os dois textos, foi provocar uma reflexão no grupo de
alunas acerca do conteúdo escolar. É bastante comum que o currículo seja enten-
dido apenas como uma listagem de conteúdos, sendo que esses conteúdos, por sua
vez, são entendidos como “naturais” ou como “aqueles que devem ser ensinados”
(SILVA, 1992). Desde o início da sala-ambiente, tivemos a intenção de ampliar
o conceito de currículo para além dos conteúdos, desconstruindo essa noção de

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90 O processo de aprendizagem de teorias de currículo na educação continuada de ...

neutralidade que permeia os conhecimentos escolares. Assim, questões relativas a


poder, interesses e disputas foram incorporadas à discussão, não somente através
dos textos, mas também pelas interações realizadas na sala-ambiente.
A atividade da terceira unidade da disciplina consistia em responder a seguinte
pergunta, a partir da leitura dos textos:

Como os textos podem ser relacionados? Enfatize, em sua postagem, a


discussão do conteúdo escolar como uma escolha, uma seleção e não como
um dado.

É importante ressaltar que houve, na sala-ambiente, a preocupação com que


as alunas interagissem com suas colegas. Portanto, além das postagens em que
tinham que responder perguntas específicas sobre o texto, em todas as tarefas as
alunas deveriam realizar, no mínimo, mais uma postagem. Assim, procederiam a
uma discussão sobre as ideias colocadas pelas colegas, ressaltando aquilo que po-
deria ser acrescentado e comentando outros aspectos que julgassem interessantes
– tendo sempre o cuidado de trazer questões que estivessem sendo abordadas nos
textos lidos na sala-ambiente.
Em relação a essa atividade, destacamos algumas postagens que merecem
atenção. A primeira delas traz o diálogo entre duas colegas a partir de conceitos
trabalhados nos textos:

Colega, a ideia principal que colocas sobre um currículo centrado na vida


cotidiana, permitindo aos alunos relacionar os conhecimentos, é muito
importante. Acredito que tal ideia deveria ser refletida em nossas escolas
e assim poderíamos elaborar um currículo, de fato, com caráter emanci-
patório. Questão para refletir: como mobilizar, conscientizar colegas para
realizar tal reflexão e transformação curricular?

Colega, com relação aos textos, penso que seria fundamental para refletir
e conscientizar os nossos colegas, organizar e promover oficinas pedagó-
gicas com temáticas voltadas aos conteúdos e transformação curricular,
levando em consideração nossos próprios conhecimentos passados como
também experiências, a necessidade de atualização e reconceitualização,
neste momento de cruzamento entre conceitos de conteúdos, currículos e
saber sistematizado.

Nos excertos acima, é possível verificar que as alunas se propõem a refletir


acerca do que vinha sendo trabalhado na disciplina, trazendo aspectos importantes
referentes ao currículo, como relacionar conhecimentos e abordar aspectos da vida
cotidiana. Ademais desses aspectos, ambas as alunas se mostraram preocupadas em
como replicar, na escola, entre o grupo de professores, o que estavam aprendendo
no Curso. Tal preocupação não é um reflexo apenas daquilo que foi trabalhado

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 91

na sala-ambiente em questão, mas de temas abordados em outras salas-ambiente,


como a gestão democrática. A importância da criação de espaços de diálogo, da
promoção de discussões na escola, foi amplamente trabalhada durante todo o
Curso. O diálogo entre as duas colegas evidencia essa nova postura, que se baseia
também nos conceitos discutidos ao longo do Curso. As alunas, assim, apontam
criar relações entre a gestão que praticam em suas escolas e os conceitos desta área,
com as temáticas da teoria de currículo que estudam nesta sala-ambiente. Outro
ponto que queremos destacar é que a resposta da segunda aluna traz a ideia de
“conhecimentos passados” e de “reconceitualização”, termos que parecem referir-
-se aos conhecimentos e pressupostos que ela possuía anteriormente. O fato de a
discente se propor a mudar algumas de suas ideias, reconceituando determinadas
noções que ela tinha, nos chama a atenção, pois esse é justamente o intuito de
uma formação continuada com coordenadoras pedagógicas que atuam em escolas
estaduais e municipais no estado do Rio Grande do Sul. Através dos textos e das
discussões, tínhamos como objetivo desacomodar aquilo que já estava naturalizado
na prática dessas coordenadoras, fazendo com que refletissem a partir de conceitos
fundamentais em educação, como currículo. A postagem de outro discente, no
fórum de discussão dos textos de Tomaz Tadeu da Silva (1987) e Lucíola Santos
(2009), vai ao encontro desse objetivo:

No decorrer do curso somos chamados para uma efetiva reflexão sobre


nossas posturas. A sensibilização tem ocorrido de forma bastante signifi-
cativa, pois nos faz pensar muito sobre o que fazemos, como fazemos, para
que fazemos, onde queremos chegar como docentes e como coordenadores
pedagógicos. Todas as leituras mostram o quanto o processo pode ser eclé-
tico e o quanto precisamos reformular velhos hábitos. [...]

O trecho acima também demonstra essa perspectiva de mudança da prática,


sendo esta embasada teoricamente. A ideia de que é fundamental pensar sobre “o
que fazemos, como fazemos, para que fazemos, onde queremos chegar” traz alguns
dos pressupostos trabalhados acerca do currículo nos textos de Silva (1987) e Santos
(2009), que apontam o quanto o currículo é atravessado por questões de poder, o
quanto as escolhas sobre os conteúdos e a forma de ensiná-los têm implicações para
os objetivos propostos no processo pedagógico, o quanto aquilo que entendemos
como o “saber sistematizado” representa uma possibilidade dentre inúmeras outras
escolhas que podem ser feitas.
Não queremos, com os exemplos acima, afirmar que o Curso fez com que
a prática das alunas em suas escolas fossem transformadas por completo, pois
sabemos que o processo de transformação de uma cultura é algo complexo e de
longo prazo e que são muitos os desafios cotidianos na escola. Uma das alunas, ao
comentar a postagem de uma colega, traz à cena esta questão dos desafios:

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Oi, colega! Achei muito importante esta tua colocação: os conteúdos pre-
cisam ser revisados e adaptados ano a ano, cada turma é uma realidade
diferente, os alunos são diferentes. Mas ao mesmo tempo, não podemos
esquecer os conceitos que são significativos para todos. Entendo que isto
não é tarefa muito simples, o professor precisa ter um conhecimento bem
amplo dos seus alunos, para atender esta diversidade de culturas presen-
te na sala de aula, para que em seu planejamento contemple todas estas
diversidades.

Quando a aluna se refere à necessidade de “não esquecer os conceitos que


são significativos para todos”, ela traz essa dimensão abordada no texto de Lucíola
Santos (2009) sobre o quanto alguns teóricos apontam que a escola é o único lugar
em que crianças provenientes de família de baixa renda têm acesso a determinados
saberes. Esse é uma discussão central a respeito daquilo que será ensinado na escola.
Portanto, ela aponta um desafio que é decidir o que ensinar, conseguindo traba-
lhar conteúdos que sejam importantes para a vida dos alunos, que façam sentido
para os mesmos, sem privá-los, ao mesmo tempo, do acesso a conhecimentos que
poderiam ser identificados como aqueles do “saber sistematizado” e que poderão
ser importantes para os discentes alcançarem novas posições sociais. A própria
aluna, em sua postagem, aponta que essa tarefa não é simples, mas mostra que
está disposta a pensar sobre essa questão e, provavelmente, em sua atuação como
coordenadora na escola, isso fará diferença, pois ela poderá atuar, junto ao grupo
de professores de sua instituição escolar, para pensarem juntos sobre o que tem
sido ensinado na escola. Desta forma, nos casos analisados desta terceira unidade,
também é possível perceber como as alunas foram construindo e significando os
conhecimentos trabalhados, um efeito concreto da sala-ambiente na reflexão das
alunas sobre sua prática – e também algumas questões em que a teoria trabalhada
ainda encontra resistências.
Conclui-se, enfim, com os exemplos das duas unidades aqui arrolados, que
não há um processo único de aprendizagem das alunas no Curso. Percebe-se a
presença de influências de uma tradição convencional de se olhar o papel da escola
e de sua cultura. Porém, percebe-se também que essa tradição não é absoluta, mas é
contestada, em diferentes níveis, pelas alunas. Além disso, nota-se que as alunas se
desafiaram a fazer uso dos conceitos trabalhados ao longo da sala-ambiente, o que
é fundamental no processo de formação. Mas, mais do que isso, queremos destacar
a importância do diálogo estabelecido entre as alunas, que estiveram dispostas a
rever algumas de suas certezas e a aprender com as colegas. Essa disposição está
relacionada com o que foi trabalhado no Curso em relação à gestão democrática e
ao trabalho docente como um trabalho reflexivo. Pode-se perceber que as alunas
se apropriaram não somente dos conceitos em relação a estas questões, mas tam-
bém tornaram o diálogo e a reflexão parte de suas práticas no Curso. Nota-se que,
apesar das dificuldades e dos desafios encontrados pelas alunas, elas conseguem,

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 93

com seus esforços, incorporar o que julgaram importante do que foi trabalhado
nas unidades, apontando que, além de exercerem seu papel de coordenadora em
seus ambientes de trabalho, as discentes estão dispostas a participar de um novo
processo de ensino-aprendizagem. Assim, vão elas refletindo e tentando aprimorar
suas práticas e, deste modo, a qualidade da educação de suas escolas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nossa intenção, com a escrita deste capítulo, foi analisar, ainda que brevemente,
a importância dos conceitos trabalhados na sala CCCE para o processo de apren-
dizagem relativo ao estudo do currículo por parte de coordenadoras pedagógicas,
ocorrido nas turmas em que fomos docentes da sala em questão. Procuramos, para
isso, pôr em prática uma metodologia de análise que levasse em conta a apren-
dizagem das alunas, porém com um olhar sobre o contexto em que ocorreu este
processo. Não foi nossa intenção aqui utilizar a ideia de aprendizagem ou formação
como algo neutro ou isolado. Porém, também foi, para nós, teórica e politicamente
importante utilizar de fato estes termos para se pensar o processo pedagógico de
nossa experiência. Foi nosso objetivo também procurar discutir os avanços e limites
do Curso para a aprendizagem e formação das alunas. Finalmente, nossa principal
tentativa foi mostrar como a tradição cultural dos contextos educacionais em que
estão nossas alunas também influenciam suas percepções, ao mesmo tempo em
que isso pode ser contestado e transformado por elas, especialmente com base em
seus aprendizados no Curso. Foi para isso que ressaltamos e discutimos como estes
processos foram ocorrendo concretamente na sala-ambiente, a partir dos excertos
destacados e analisados.
Destacamos também a importância de um curso de formação para aqueles
que estão atuando na prática das escolas. Isso representa uma forma de retomar a
importância de uma constante reflexão da prática e atuar, assim, como um inte-
lectual, algo característico do trabalho docente (GIROUX, 1986). Ademais, per-
cebemos que as bases teóricas da gestão democrática não foram apenas conceitos
discutidos ao longo das salas-ambiente, mas tornaram-se, para algumas discentes,
uma prática na sua atuação na sala e esperamos que também em suas escolas. A
cultura do diálogo, da escuta, da discussão, afinal, são questões fundamentais em
tempos atuais. Devido a processos de intensificação do trabalho docente, conforme
Apple (1995), e de mercadificação da educação, tem-se percebido que a atuação dos
professores vem se tornando algo cada vez mais individualizado e solitário, ainda
segundo Apple (1989). Percebe-se que o Curso propiciou um espaço para trocas
e reflexões, o que foi muito proveitoso para as alunas e salientado pelas mesmas
como algo importante para uma transformação em suas práticas e nas escolas nas
quais atuam.

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94 O processo de aprendizagem de teorias de currículo na educação continuada de ...

Compreendemos que os dados aqui explorados não encerram o debate sobre


a aprendizagem e a formação ocorridas na sala-ambiente CCCE – que pode vir
a ser complexificado ou problematizado a partir de outras experiências vividas
na sala. No entanto, entendemos que a discussão aqui proposta pode contribuir
para o debate sobre a formação dessas alunas. Procuramos, por um lado, pôr em
ação um olhar teoricamente rigoroso sobre os constrangimentos a um processo
de aprendizagem sobre o currículo. Por outro, procuramos que este olhar fosse
realisticamente otimista sobre o potencial libertador da educação – inclusive e, aqui
especialmente, da educação para profissionais, justamente, da área da educação.

REFERÊNCIAS

APPLE, Michael W. Educação e poder. Tradução de Maria Cristina Monteiro. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1989.
___. Trabalho docente e textos: economia política das relações de classe e de gênero em educação. Porto
Alegre: Artes Médica, 1995.
GIROUX, Henry. Teoria crítica e resistência em educação. Petrópolis: Vozes, 1986.
MOREIRA, Antonio Flavio Barbosa; CANDAU, Vera Maria. Educação escolar e cultura(s): cons-
truindo caminhos. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 23, p. 156-168, mai./jun./jul./
ago., 2003.
SANTOS, Lucíola. A Construção do Currículo: seleção do conhecimento escolar. In: BRASIL. Mi-
nistério da Educação. Currículo: conhecimento e cultura, 2009, p. 10-14.
SILVA, Tomaz Tadeu da. Conteúdo: um conceito com falta de conteúdo?. Revista de Educação da
Aec, v. 63, p. 20-24, 1987.
___. O que produz e o que reproduz em educação: ensaios de sociologia da educação. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1992.

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Uma breve avaliação de uma 0 6
disciplina sobre avaliação escolar

Gustavo Andrada Bandeira

Neste breve artigo pretendo ilustrar a construção e o funcionamento da


sala-ambiente “Avaliação Escolar”, no Curso de Especialização em Coordenação
Pedagógica, do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica, pro-
movido pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Tentarei mostrar como as
atividades foram pensadas para proporcionar um maior diálogo entre as cursistas1
e de que forma elas responderam às nossas provocações.
As atividades que o coletivo de professoras2 pensou para o andamento da
sala-ambiente tiveram dois objetivos: a) realizar uma aproximação com debates
contemporâneos do campo da avaliação, através de produções disponíveis na lite-
ratura de livre e fácil acesso e; b) propor uma articulação entre essas produções e
o conhecimento das coordenadoras a partir de sua prática profissional. Tentamos
ressaltar que atualmente as propostas e práticas avaliativas têm se voltado também
para o desempenho docente, de cursos, de instituições e de sistemas educacionais.
A primeira atividade realizada em nosso encontro presencial, no polo Pelotas,
na sala-ambiente “Avaliação Escolar”, consistiu em entrar no sítio da internet da
empresa de ônibus que fazia o trajeto Pelotas-Porto Alegre. Ao observar as vinte
e três possibilidades de horários, fiz uma pergunta, em alguma medida, simples e
direta: qual o melhor horário para eu voltar a Porto Alegre?
Por se tratar de nossa primeira interação, as cursistas ficaram em silêncio e
dividiram o olhar entre mim e a página da empresa de ônibus, procurando se ali
existiria alguma pista ou dica de uma resposta mais adequada. Tentando encorajá-
-las, comecei a fazer algumas questões que ajudassem a chegar o mais próximo
possível da melhor passagem de ônibus. Até que horas eu teria atividades em
Pelotas? Antes de fazer a segunda questão, uma das coordenadoras pedagógicas
indagou: “O senhor tem pressa?”. Encorajada por essa primeira participação, outra

1 Uma vez que a maioria das pessoas vinculadas ao curso era de mulheres, optei por me referir às
estudantes sempre no feminino.
2 Aqui deixo meu reconhecimento e agradecimento aos colegas que em conjunto ajudaram na
produção e execução dessa sala-ambiente para esta edição do curso: Dóris Maria Luzzardi Fiss,
Letícia Prezzi Fernandes, Luciane Torezan Viegas, Luiz Fernando Calage Alvarenga, Marcello
Paniz Giacomoni, Nilton Mullet Pereira, Paloma Dias Silveira, Rosana Fachel de Medeiros, San-
dra dos Santos Andrade e Silvana Corbellini.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 95 22/10/2018 14:27:25


96 Uma breve avaliação de uma disciplina sobre avaliação escolar

coordenadora acrescentou: “O senhor prefere conforto?”. Acrescentei a questão


sobre quem pagaria a passagem e com isso começamos a cercar melhor nossas
possibilidades de resposta.
Esse exercício extremamente singelo foi o mote para iniciarmos, ainda antes
das discussões sobre os conceitos que a disciplina procuraria trabalhar, uma ideia
das mais simples sobre avaliação: sem saber o que queremos não temos condi-
ções de avaliar nada. Sem olharmos os limites e nossos impeditivos, não temos
condições de escolher uma passagem de ônibus, uma roupa adequada para uma
determinada situação, etc. Esse exercício permitiu também ilustrarmos a presen-
ça constante da avaliação em atividades cotidianas para em seguida advertirmos
que o trabalho sobre a avaliação escolar era bastante mais complexo do que essas
pequenas decisões diárias.
Nossas provocações para o início do diálogo foram: Para que serve a ava-
liação? Como conduzi-la? Quem deve ser envolvido e como? O que fazer com os
resultados da avaliação? Tratamos imediatamente de apagar qualquer possibili-
dade de uma resposta única para essas questões e, mesmo, marcamos que não se
tratava de pensar nas respostas a essas questões a partir da lógica do certo ou do
errado. Mostramos também que o esforço em responder essas questões não fazia
parte de um processo simples e, muito menos, não podia ser entendido como um
procedimento exclusivamente técnico, uma vez que a avaliação é uma atividade
política e ideológica.
Para que algumas respostas possam ser ensaiadas, é preciso levar em conside-
ração que essas respostas estão diretamente relacionadas com os valores assumidos
por quem aplica essas avaliações. Pensada como uma das etapas que constituem o
processo educativo, a avaliação inevitavelmente precisará conversar com as pers-
pectivas pedagógicas que atravessam os valores em questão em qualquer processo
de ensino-aprendizagem.

ORGANIZAÇÃO DA SALA-AMBIENTE

Para fins didáticos, a sala-ambiente foi dividida em três unidades de estudo:


avaliação da aprendizagem; avaliação em larga escala e autoavaliação institucional.
Reforçamos que essa divisão estaria dada apenas para a exploração dos conteúdos
durante a sala-ambiente, mas que as mesmas não deveriam ser entendidas como
unidades isoladas. Em conjunto, elas integram a avaliação da/na escola tendo como
referência comum o projeto pedagógico da instituição.
Para cada uma das unidades, foram disponibilizados textos obrigatórios e
complementares, além de alguns vídeos. Algumas publicações que não possuíam
acesso livre foram indicadas para que aquelas que desejassem um maior aprofun-
damento nos conteúdos tivessem alguma referência a ser buscada por outros meios,

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 97

especialmente bibliotecas. Por fim, explicitamos que cada unidade possuiria uma
atividade obrigatória que tentaria estimular as cursistas a realizarem uma intera-
ção com a literatura consultada, articulando os referenciais apresentados com a
atuação profissional.
Na Unidade I, avaliação da aprendizagem, tivemos como objetivos analisar
concepções e práticas avaliativas, dominantes em contextos escolares, com vistas
a apreciar suas implicações nos processos de ensino e de aprendizagem, além de
identificar alternativas de vivência da avaliação que estejam a serviço da apren-
dizagem de todos os alunos. Para tanto, os conteúdos abordados foram: aspectos
históricos e políticos da avaliação da aprendizagem, finalidades, procedimentos e
instrumentos.
Os objetivos da Unidade II, avaliação em larga escala, foram: identificar as
avaliações de sistema implantadas no Brasil pelo Ministério da Educação; compre-
ender os delineamentos, instrumentos e resultados do SAEB (Sistema de Avaliação
da Educação Básica)/Prova Brasil; analisar os indicadores de desempenho da es-
cola, tendo como referência a Prova Brasil e o IDEB (Índice de Desenvolvimento
da Educação Básica) e; indicar possíveis ações a serem desencadeadas na escola, a
partir da interpretação desses dados. Trabalhamos com a conceituação e finalidades
da avaliação em larga escala ou de sistema: SAEB, Prova Brasil e IDEB Matrizes.
Por fim, na Unidade III, autoavaliação institucional, foram traçados como ob-
jetivos: compreender as finalidades e características da autoavaliação institucional;
identificar alternativas para implementar, juntamente com a comunidade escolar,
a avaliação institucional na escola em que nossas cursistas atuassem na coordena-
ção pedagógica; esboçar um plano para desencadear o debate sobre autoavaliação
institucional nesses locais, articulando a autoavaliação e a avaliação externa. Os
conteúdos utilizados para nos aproximarmos desses objetivos foram a conceituação,
princípios e procedimentos de avaliação institucional e a organização do projeto
de avaliação da escola.

UM EXERCÍCIO DIAGNÓSTICO

Entendemos que a avaliação deve servir ao processo de ensino-aprendizagem


através de suas diferentes dimensões. Com isso, oferecemos às cursistas um exer-
cício que nos permitisse diagnosticar quais entendimentos as turmas possuíam no
momento inicial de nossa sala-ambiente sobre avaliação. A proposta procurava
desenhar como a turma, sem a literatura sugerida, entendia avaliação, qual era sua
compreensão sobre o assunto.
Para tanto, utilizamos a atividade presencial, a fim de construirmos um mapa
conceitual inicial das alunas sobre a avaliação. A partir de um excerto:

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98 Uma breve avaliação de uma disciplina sobre avaliação escolar

Há a avaliação da aprendizagem dos estudantes, em que o professor tem um protago-


nismo central, mas há também a necessária avaliação da instituição como um todo,
na qual o protagonismo é do coletivo dos profissionais que trabalham e conduzem
um processo complexo de formação na escola, guiados por um projeto político-
-pedagógico coletivo. E, finalmente, há ainda a avaliação do sistema escolar, ou do
conjunto das escolas de uma rede escolar, na qual a responsabilidade principal é
do poder público. Esses três níveis de avaliação não são isolados e necessitam estar
em regime de permanentes trocas, respeitados os protagonistas, de forma que se
obtenha legitimidade técnica e política. (FREITAS e FERNANDES, 2007, p. 18).

Questionamos as cursistas sobre o que era avaliação para elas, quais suas finali-
dades e de que forma aconteciam esses processos na escola em que cada uma atuava.
Solicitamos um texto que abordasse as questões apresentadas. No polo Pelotas,
a maioria das estudantes optou por responder a três questões, inclusive numerando-
-as. Algumas respostas chamaram bastante atenção, especialmente apontando para
alguns tensionamentos.
Existe certo confronto entre números e conceitos. Algumas coordenadoras
apontaram que os números seriam mais neutros e objetivos do que os conceitos. É
bastante interessante pensar como o conceito abstrato de número acaba ganhando
legitimidade histórica nas práticas escolares e naturalizado como um processo não
politizado. Ao mesmo tempo, o conceito acaba aparecendo como mais democrático
e mais inclusivo. Apesar de reclamarem das dificuldades na produção de um parecer
descritivo, as cursistas acreditavam que o mesmo seja mais emancipatório do que
as notas visualizadas através dos números. Aqui acaba existindo certo risco de que
a representação gráfica do resultado da avaliação (notas, conceitos ou pareceres)
acabe tendo valor emancipatório ou reprodutor em si. É possível que uma nota seja
construída sobre um processo dialogado com os diferentes atores em diferentes
momentos e que o maior dos pareceres apenas classifique os estudantes, quase
sempre os vinculando às suas dificuldades.
A atividade foi feita após a apresentação da sala-ambiente, o que pode ter in-
fluenciado no aparecimento bastante recorrente da noção de que a avaliação deve
servir como um diagnóstico. Qualquer tomada de medida, com todos os riscos
que o termo assume, deveria servir, conforme a quase totalidade das respostas,
apenas para diagnosticar como o processo de aprendizagem se encontrava em
um momento determinado possibilitando novas ações procurando melhorar os
resultados. Apesar dessa perspectiva mais ligada ao processo de aprendizagem do
que a um recorte classificatório, alguns lugares de saída e chegada pareciam ser um
tanto definitivos. Mesmo que para algumas cursistas estar mais ou menos distante
de uma determinada aprendizagem não devesse significar punição, novos investi-
mentos deveriam ser feitos para que todos conseguissem determinado “nível” de
conteúdo. Esses conteúdos, por sua vez, foram pouco questionados.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 98 22/10/2018 14:27:25


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 99

Outra informação que apareceu como quadro hegemônico do entendimen-


to da avaliação foi a preponderância que esse processo dá, especialmente para a
verificação da capacidade de aprendizagem dos estudantes. Mesmo que tenhamos
reforçado que o número de atores envolvidos no processo avaliativo devesse ser
maior, abrangendo toda a comunidade escolar, quando pensavam em avaliação,
as profissionais pensavam em atividades realizadas para e com os alunos. As ava-
liações institucionais ou em larga escala apareceram apenas para reclamarem de
suas dificuldades. Algumas cursistas reclamaram que exames em larga escala “não
serviriam para muita coisa”, uma vez que acabavam classificando os estudantes
em um modelo que ignorava os contextos específicos. Sobre a possibilidade de as
professoras terem seus trabalhos avaliados pelos estudantes, uma coordenadora
contou que “as professoras eram contrárias”, uma vez que acreditavam que, com
esse mecanismo, os alunos poderiam “vingar-se das professoras”. Talvez fosse o
caso de perguntar do que os estudantes teriam motivo para se vingarem.
Por fim, existiu um grande descolamento das noções ou dos processos de
avaliação com seu ingrediente político. As coordenadoras criticaram e elogiaram
modelos de avaliação. Chegaram a pensar em modelos bons ou ruins. Entretanto,
não existiu diálogo entre os processos de avaliação com o tipo de sociedade que se
busca a partir dos Projetos Político-Pedagógicos das escolas.

AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM

Nossa primeira unidade tratou da avaliação da aprendizagem. A escolha por


iniciar nossos conteúdos por este tópico procurou desencadear o diálogo com o
tema mais familiar para o grupo de coordenadoras. Ao mesmo tempo, é necessário
reconhecer que essa escolha acabou reforçando, de alguma maneira, o entendimento
de que a avaliação da aprendizagem é o assunto mais relevante quando pensamos
em avaliação escolar.
A primeira definição fundamental sobre a avaliação da aprendizagem é de
que os critérios para julgar a adequação de uma determinada forma de avaliação
emergem dos projetos educacional e social assumidos pelas educadoras. Sem um
projeto de mundo, um currículo e uma concepção de sujeito, considerar uma
avaliação pertinente ou impertinente nada mais é do que um palpite gratuito sem
possibilidades relevantes de aprofundamento. Todo e qualquer projeto educacio-
nal assumido implica um projeto de mundo, um currículo e uma concepção de
sujeito, mesmo que nem sempre os envolvidos na construção e execução desses
projetos tenham plena consciência disso. Optamos por marcar também desde o
princípio que os instrumentos e, mais ainda, a forma de codificação do resultado
dos estudantes entre notas e conceitos não são o problema central quando se pensa

Livro Coordenação Pedagógica.indb 99 22/10/2018 14:27:25


100 Uma breve avaliação de uma disciplina sobre avaliação escolar

em avaliação da aprendizagem, mas sim, quais as práticas pedagógicas que passam


a ser adotadas a partir da “produção” desses resultados.
Colocamos que nossa perspectiva situa a avaliação da aprendizagem como
inerente ao processo de ensino e de aprendizagem, mas que essa deve ser pensada
e tratada como uma atividade de investigação sobre o estágio de aprendizagem das/
os alunas/os. É fundamental olharmos para esses números ou conceitos, exercícios
adequadamente respondidos ou incorretos com um olhar que não os tome como
algo dado, pronto ou definitivo. Em alguma medida, convidamos as coordenadoras
a tentarem produzir um olhar de pesquisadoras sobre esses materiais, ampliando
as perguntas que poderiam ser feitas a eles.
Reforçamos a necessidade de não centrarmos a avaliação deste processo
através de instrumentos “bons” ou “ruins”. A busca pelo “melhor” instrumento
avaliativo tende a ser uma falácia. Os instrumentos são mais ou menos adequa-
dos se conseguirem a produção das informações desejadas, a partir dos objetivos
previstos. Se pensamos que a função da avaliação é a produção de diagnósticos é
porque acreditamos que a partir destes dados será possível estimular o avanço da
construção do conhecimento.
Deixamos o texto Indagações sobre o currículo: currículo e avaliação como
base para a Unidade. Nele, Cláudia de Oliveira Fernandes e Luiz Carlos Freitas
(2007) apontam como a avaliação precisa estar em sintonia com o Projeto Político-
-Pedagógico e não ser pensada como algo isolado do processo. A autora e o autor
também dão ênfase ao fato de que “medir não é avaliar”. Por fim, eles apontam que
deve ser favorecida a produção de instrumentos que permitam que os estudantes
sejam mais bem acompanhados em seu processo de aprendizagem.
A partir dessa leitura dentro da lógica de reforçar o diálogo da coordenadora
com seu ambiente de trabalho, solicitamos às cursistas que realizassem uma en-
trevista com um professor ou uma professora da escola em que atuassem. A curta
entrevista possuía três questões: a) para você, o que é avaliar? b) quando você avalia
os alunos? c) que instrumentos utiliza? Por quê?
Após essa entrevista, elas deveriam produzir um texto colocando uma das
respostas de seus colegas em diálogo com o material estudado. Nos trabalhos, aca-
baram aparecendo algumas das concepções das professoras entrevistadas, dentre
as quais a supervalorização da prova como um documento oficial da capacidade
de aprendizagem do estudante. Mesmo aquelas professoras que apontaram a ava-
liação como um processo, a necessidade de um momento pedagógico específico,
o da avaliação, foi apontado como indispensável.
Outras respostas apontaram para a inadequação entre concepção de educação
e instrumentos utilizados. Uma das cursistas apontou que sua colega valorizava
bastante a construção coletiva de conhecimento com atividades em grupo e que a
colaboração fosse um elemento significativo para pensar na avaliação. Apesar disso,
a professora entrevistada não conseguia abrir mão do tal “documento” individual

Livro Coordenação Pedagógica.indb 100 22/10/2018 14:27:25


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 101

da aprendizagem, dando excessiva autonomia para esse espaço da prova que não
conversava com sua própria perspectiva educacional.
Por fim, foi possível perceber uma grande positivação para processos avalia-
tivos constantes em detrimento das avaliações estanques, quase sempre traduzidas
por provas. Entretanto, é de se colocar em questão também de que maneira pode-
-se acabar invertendo as perspectivas e transformando todo o processo de ensino
e de aprendizagem como um processo avaliativo, reduzindo de forma bastante
significativa a complexidade do processo pedagógico.

AVALIAÇÃO EM LARGA ESCALA

Iniciamos nossa segunda unidade colocando uma série de referências ao


processo de implementação da avaliação em larga escala. O Ministério da Edu-
cação (MEC) iniciou a condução dessa modalidade avaliativa na década de 1990.
Permitimo-nos interpretar que um primeiro momento de resistência estaria hoje
dando lugar a um melhor entendimento dessas avaliações sendo elas, inclusive,
pensadas como algo positivo que permite às diferentes escolas e secretarias de
educação analisar e utilizar os dados construídos para a produção, dentre outras
formas, de capacitações para as professoras.
A partir dessas avaliações o MEC construiu O IDEB. Com esse indicador, é
possível a mobilização de redes de ensino e escolas para, a partir da compreensão
dos resultados obtidos, delinear planejamentos procurando combater as lacunas
de aprendizagens, não agora centradas em um aluno, uma turma ou uma escola
individualmente, mas em diálogo com a rede e em comparação com contextos
diferenciados.
Destacamos que o IDEB considera os dados da Prova Brasil, SAEB e dados do
Censo Escolar relativos à aprovação. Com isso se definem bianualmente metas a
serem alcançadas pelas redes públicas de Ensino até 2021 para que o Brasil alcance
a meta de 6,0 pontos em 20223.
O objetivo dessa unidade era propiciar um conhecimento conjunto de inicia-
tivas de avaliação direcionadas para a educação básica ou para alunos da educação
básica, além de estudar detalhadamente o SAEB/Prova Brasil e IDEB. Nossas ex-
pectativas com as atividades propostas foram: caracterizar as avaliações de sistema
implantadas no país pelo MEC; compreender os delineamentos, instrumentos e
resultados do SAEB/Prova Brasil; analisar os indicadores de desempenho da escola,
tendo como referência a Prova Brasil e o IDEB e; indicar possíveis ações a serem
desencadeadas na escola, a partir da interpretação de dados resultantes da Prova
Brasil.

3 Em 2013, os índices apontavam 5,2 nos anos iniciais do Ensino Fundamental; 4,2 nos anos finais
do Ensino Fundamental; e 3,7 no Ensino Médio.

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102 Uma breve avaliação de uma disciplina sobre avaliação escolar

Optamos por indicar o texto A Prova Brasil na Escola (2007) produzido


pelo Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária
(Cenpec) do Estado de São Paulo. O material dirigido a professoras, coordenadoras
pedagógicas e diretoras, além de uma série de apontamentos conceituais, também
apresenta várias atividades práticas que auxiliariam as profissionais não apenas a
avaliarem o resultado de sua escola em diálogo com os resultados nacionais, como
ofereciam ações a partir destes resultados.
O material também aborda como a mídia e os educadores recebem os resul-
tados da Prova Brasil. Enquanto os jornais destacavam os resultados ruins obtidos
através das avaliações, os professores dividiam suas impressões entre aqueles que
tinham desejo de conhecer a formulação e os resultados da Prova Brasil, outros que
a desconheciam e/ou duvidavam de suas potencialidades, alguns que reclamavam
da cobertura midiática que valorizava apenas o mau desempenho dos estudantes
sem olhar para a complexidade dos processos educativos, outros acreditavam que a
forma de aplicação não era adequada, alguns ainda reclamavam que a Prova deveria
ser utilizada como um momento de reflexão, mas acabava apenas gerando uma
expectativa competitiva relacionada ao desempenho das escolas. Por fim, alguns
utilizavam seus resultados para a avaliação de seu trabalho e muitos ainda percebiam
na Prova um material para o auxílio da melhoria de seus trabalhos (CENPEC, 2007).
Para possibilitar uma maior interlocução entre as cursistas, escolhemos a
modalidade fórum para que cada coordenadora colocasse suas reflexões sobre a
temática a partir da leitura do texto e da realidade da escola em que atuava. Essa
interlocução, infelizmente, não aconteceu de forma satisfatória. As cursistas ficaram
mais preocupadas em responder as questões, especialmente vinculadas à leitura
do texto.
Apareceram reclamações relativas ao fato de a Prova Brasil ignorar as diferen-
ças existentes entre as diferentes regiões do país. Apesar de um número importante
de respostas apontar que os resultados da Prova poderiam servir de subsídios para
uma melhor organização pedagógica, uma cursista chegou a dizer que “o mesmo
não passava de desperdício de dinheiro público”, uma vez que cada professor
possuiria mecanismos para avaliar seus estudantes e seu próprio trabalho. Nessa
reclamação e também na baixa adesão ao diálogo na atividade proposta apareceu
uma sinalização preocupante quanto à função individual do trabalho pedagógico.
A dimensão do diálogo não foi aproveitada e foi, até mesmo, desacreditada. Quais
os limites de centrar o processo de avaliação educacional em atividades individuais
dos professores?
Pensando no conjunto de respostas, foi possível visualizar uma constante
queixa relativa ao tempo ou aos diferentes tempos. Por um lado, o tempo de di-
vulgação dos resultados da Prova Brasil foi reclamado por muitas coordenadoras;
de outro, a falta de tempo para se discutirem os resultados dentro da escola e com
a comunidade escolar também apareceu como uma demanda. Talvez essa falta de

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 103

tempo acabe empurrando ainda mais os professores para a construção de ativida-


des solitárias restritas à preparação de ações a serem diretamente executadas com
seus estudantes com pouco ou nenhum diálogo com colegas de escola ou de rede.
Mais do que pensar o que os dados poderiam produzir, as cursistas focaram
suas respostas nas queixas dos limites dessa avaliação. Seria interessante pensar que
instrumento avaliativo não possui limites. Seria possível um mecanismo adequado
ou “realmente” eficaz para um diagnóstico preciso da complexidade de um processo
educativo em âmbito nacional?

AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL: AUTOAVALIAÇÃO

Nosso último tópico de abordagem pretendia explorar um conteúdo um tanto


recente na escola básica que é a avaliação institucional. Essa modalidade de ava-
liação no Brasil teve suas primeiras iniciativas em instituições de ensino superior
que começaram a experimentá-la durante a década de 1980.
A avaliação institucional engloba conteúdos das dimensões política, pedagógi-
ca e administrativa. Suas formas de ocorrência podem ser divididas entre avaliação
externa e autoavaliação. A autoavaliação, foco de nossa abordagem, aparece quando
os diferentes atores da escola, professores, demais profissionais da escola, pais e
alunos, se encarregam de avaliar o trabalho realizado naquele ambiente.
Procuramos destacar a importância da coordenadora pedagógica no processo
de autoavaliação. Esse protagonismo inicia desde a sensibilização da comunidade
escolar para que essa aceite e se envolva na elaboração de uma proposta de avaliação
e participe também de sua implementação.
Apontamos também que, para pensar na autoavaliação institucional, seria
produtivo que algumas questões fossem colocadas para serem dialogadas com toda
a comunidade escolar: a) para que avaliar? (finalidade); b) o que avaliar? (objetos);
c) quem avalia? (sujeitos); d) como avaliar? (procedimentos); e) quando avaliar
(periodicidade).
Para nossa atividade neste módulo, deixamos a indicação de dois textos. No
primeiro, Avaliação Institucional: elementos para discussão (1999), Sandra Maria
Zakia Lian Sousa aponta que não se pode pensar no desempenho do aluno de
modo descontextualizado. Para isso, ela aposta no “sentido constitutivo da ava-
liação” servindo à aprendizagem dos educandos, reforçando a importância de os
profissionais da escola pensarem no trabalho ali desenvolvido. Por fim, a autora
também reforça que um dos obstáculos desses exercícios avaliativos aparece na
concepção tradicional de avaliação em que a mesma é pensada como um meca-
nismo de seleção, classificação e punição.
Nossa segunda sugestão bibliográfica foi o texto de Monica Gother Thurler:
A eficácia das escolas não se mede: ela se constrói, negocia-se, pratica-se e se vive

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104 Uma breve avaliação de uma disciplina sobre avaliação escolar

(1998). Nele, após sugerir uma série de indicações para intervenção com os dife-
rentes atores da comunidade escolar, a autora conclui lembrando que é sempre
necessário manter um importante esforço para que objetivos e métodos não es-
tejam em contradição. Ela sugere a construção de objetivos em três dimensões e
prazos distintos: os funcionais de curto, os estruturais de médio e os “visionários”
de longo prazo. Ela finaliza apontando que não existe instrumento a ser aceito
unanimemente por todos os envolvidos, que nem todos os objetivos podem ser
avaliados da mesma maneira e que a simples “constatação de ineficácia” não tende
a produzir resultados positivos.
Após as leituras, novamente sugerimos o fórum para que o diálogo entre as
cursistas acontecesse. Questionamos se na escola em que elas atuavam ocorria
avaliação institucional. Em caso positivo, de que modos ela acontecia e, em caso
negativo, quais elas acreditavam serem os maiores entraves para essa realização.
Verificamos, a partir do diálogo entre as coordenadoras, que a prática da
avaliação institucional ainda é muito incipiente. Avaliação acaba sendo traduzida
como avaliação dos estudantes. As coordenadoras se mostraram bastante sensíveis à
necessidade de olhar para o conjunto da escola. Embora algumas ainda apontem que
esse tema nunca aparece nas discussões escolares, algumas começaram a perceber
como espaços já existentes, ainda que não realizados com esse objetivo, a exemplo
dos conselhos de classe e das reuniões pedagógicas, poderiam auxiliar o início dessa
perspectiva de olhar de modo avaliativo para as práticas mais amplas da escola.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Nesse exercício reflexivo de olhar para a prática de uma sala-ambiente em um


curso de especialização à distância, conseguimos pensar algumas produtividades
de nossas práticas e outras atividades que poderiam ser mais bem problematiza-
das. Tentamos suprir a falta da interação face a face com exercícios na modalidade
de fórum que permitiria um diálogo maior entre cursistas e professoras da sala-
-ambiente. O resultado não foi muito produtivo, uma vez que a concentração das
coordenadoras se deu em relação a responder nossas demandas e não em dialogar
com suas colegas. Em alguma medida, isto também nos aponta os limites de pen-
sarmos em atividades mediadas por um ambiente virtual de aprendizagem tendo
os cursos presenciais como parâmetro. Continuamos apostando na potencialidade
da interação entre colegas; entretanto, nos parece que outras tentativas precisariam
ser postas em ação.
As coordenadoras, na condição de cursistas, se apresentaram de modo bas-
tante engajado nas discussões acerca de diferentes perspectivas avaliativas. Não
foi difícil perceber uma adesão ao entendimento de que a avaliação deveria servir
para a construção de um diagnóstico dos níveis de desenvolvimento dos educandos

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 105

produzindo materiais que subsidiassem ações pedagógicas futuras. Outras adesões


fáceis se deram relacionadas à necessidade de que a avaliação estivesse pensada em
conjunto com a concepção de educação e com o Projeto Político-Pedagógico da
escola, além de que fosse realizada de forma permanente ou ao menos não restrita
as formais “provas”.
Ainda assim, muitas vezes as cursistas criticaram diferentes modelos avalia-
tivos, seja da avaliação de aprendizagem, seja os das avaliações de larga escala. A
crítica em si não é um problema, mas em algumas atividades as coordenadoras
deram a entender que seria necessária a busca por um tipo de instrumento capaz
de resolver dúvidas e mapear com exatidão os níveis de aprendizagem, o que nos
parece pouco produtivo.
Pareceu bastante evidente também o pouco espaço que as profissionais en-
contram em suas escolas para fomentarem ou participarem de debates sobre dife-
rentes níveis de avaliações em que a escola está envolvida, especialmente com as
professoras de suas escolas. Essa falta de oportunidade pode, mesmo, desacreditar
o processo dialógico fazendo com que cada professor acabe pensando e trabalhan-
do individualmente seus processos avaliativos sem um respaldo encontrado na
comunidade escolar.
Sem essa complexificação dos processos avaliativos no ambiente escolar, fica
difícil imaginar uma capacidade mais concreta de intervenções que permitam
melhorar o ambiente de trabalho, a aprendizagem dos estudantes e os índices de
larga escala. Um cuidado necessário também é evitar o simples denuncismo das
dificuldades dos processos avaliativos e pensar que tipos de possibilidades eles nos
dão, mesmo que todos possuam limites maiores ou menores.

REFERÊNCIAS

CENPEC – CENTRO DE ESTUDOS E PESQUISAS EM EDUCAÇÃO, CULTURA E AÇÃO CO-


MUNITÁRIA; FUNDAÇÃO TIDE SETUBAL. A Prova Brasil na escola: material para professores,
coordenadores pedagógicos e diretores de escolas de ensino fundamenta. São Paulo, 2007.
FREITAS, Luiz Carlos de; FERNANDES, Cláudia de Oliveira. Indagações sobre currículo: currículo e
avaliação. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2007. 44 p.
SOUSA, Sandra Maria Zakia Lian. Avaliação institucional: elementos para discussão. In: Seminário
O Ensino Municipal e a Educação Brasileira, 2000. Anais. São Paulo: Secretaria Municipal de Edu-
cação, 1999. P. 83-91.
THURLER, M.G. Eficácia das escolas não se mede: ela se constrói, negocia-se, pratica-se e se vive.
São Paulo: Idéias, 1998, nº 30, P. 175-193.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 105 22/10/2018 14:27:25


Livro Coordenação Pedagógica.indb 106 22/10/2018 14:27:25
O papel do 0 7
Coordenador Pedagógico
frente à docência criadora

Karen Elisabete Rosa Nodari

INTRODUÇÃO

Neste artigo, proponho uma reflexão sobre um ensaio produzido pelas alunas
do olo de ensino à distância localizado em Porto Alegre, do Curso de Pós-Graduação
Lato Sensu em Coordenação Pedagógica, no âmbito do Programa Nacional Escolas
de Gestores em Educação Básica, vinculado à Secretaria da Educação Básica, do
Ministério da Educação (SEB/MEC). Mais exatamente, abordarei uma atividade
dissertativa da sala-ambiente “Aprendizagem Escolar e Trabalho Pedagógico”
(AETP), integrante do currículo do Curso. Foi proposta a escrita de um ensaio
tendo como mote as seguintes questões: Qual o papel do Coordenador Pedagógico
no estímulo do professor-pesquisador? Que tipo de ações ele pode criar enquanto
gestão dos processos de aprendizagens ou de educação permanente?
No entanto, antes de tratar sobre a escrita das alunas. é necessário justificar a
escolha: por que tal atividade é mais significativa em detrimento de tantas outras
formuladas, postadas e respondidas pelas cursistas? Cabe, então, defender a opção
tomada e apresentar, em linhas gerais, o planejamento deste componente curricular,
uma vez que a abrangência da questão proposta implica uma compreensão do obje-
tivo geral da sala AETP, ao mesmo tempo em que sugere caminhos para enfrentar
o desafio do exercício da coordenação pedagógica na escola contemporânea.

SOBRE A SALA-AMBIENTE “APRENDIZAGEM


ESCOLAR E TRABALHO PEDAGÓGICO”

A sala-ambiente “Aprendizagem Escolar e Trabalho Pedagógico”, como o tí-


tulo já aponta, enfatizava a centralidade da aprendizagem nas práticas educativas
e seus desdobramentos para o trabalho do Coordenador Pedagógico. Isto requer

Livro Coordenação Pedagógica.indb 107 22/10/2018 14:27:25


108 O papel do Coordenador Pedagógico frente à docência criadora

que ele seja capaz de organizar um contexto escolar favorável à aprendizagem de


todos os alunos. E, para atingir tal objetivo, é necessário que tenha condições de
fazer frente às seguintes questões: Quem são os sujeitos da aprendizagem e como
aprendem? Que tipo de ações ele pode criar enquanto gestão dos processos de
aprendizagens ou de educação permanente? Lembre-se que cabe ao Coordenador
Pedagógico, na relação que estabelece com o corpo docente, propor a ampliação
dos espaços da aprendizagem e a promoção de novas possibilidades de atuação do
professor na escola.
Ao longo das semanas em que a sala esteve em edição, foram introduzidos
vários temas relacionados ao cotidiano do Coordenador Pedagógico. E, neste sen-
tido, os seus objetivos específicos foram:
1) evidenciar que o centro da organização do ensino são os objetivos da apren-
dizagem;
2) demonstrar que a perspectiva sócio-interacionista da aprendizagem traz
contribuições relevantes para o trabalho pedagógico;
3) compreender as singularidades dos estudantes e suas diferentes formas de in-
tervenção no contexto escolar como constituintes do processo de aprender;
4) contribuir para o desenvolvimento da capacidade de intervenção de forma
qualificada no ambiente escolar.
A fim de atingir tais objetivos, a sala foi dividida em três unidades temáticas,
dando destaque aos seguintes conteúdos:
Eixo 1: Aprendizagem escolar e a perspectiva sócio-interacionista: o caráter inte-
grado do desenvolvimento humano e da aprendizagem de conhecimentos escolares;
afeto, ato motor, cognição e pessoa como conjunto funcionais da aprendizagem; a
aprendizagem colaborativa: as interações na sala de aula.

Eixo 2: Os sujeitos da aprendizagem: quem são os sujeitos da aprendizagem? como


os sujeitos da aprendizagem aprendem com base nos conhecimentos da neuroci-
ência? como os fatores neurológicos e socioculturais interferem na aprendizagem?

Eixo 3: As interfaces da atuação do Coordenador Pedagógico com o aprender


dos professores: identidade e formação docente; o papel do professor como eterno
aprendiz; a importância da pesquisa na formação do professor.

O diagrama a seguir ilustra de forma esquemática a relação entre o objetivo


geral da sala e os seus eixos:

Livro Coordenação Pedagógica.indb 108 22/10/2018 14:27:25


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 109

A centralidade da organização do trabalho pedagógico para que a finalidade


de qualquer escola seja atingida, a aprendizagem de todos dos alunos, fez com que
os eixos – 1) a aprendizagem escolar e a perspectiva sócio-interacionista; 2) os su-
jeitos da aprendizagem e 3) as interfaces da atuação do Coordenador Pedagógico
com o aprender dos professores – tenham sido planejados de forma complementar,
além de orbitarem ao seu redor. Destaco que o terceiro e último eixo foi aquele que
melhor respondeu ao quarto objetivo da sala: contribuir para o desenvolvimento
da capacidade de intervenção de forma qualificada no ambiente escolar.
Além disso, o encontro presencial com as alunas foi planejado com o objetivo
de sensibilizar o grupo para a necessidade de criação de uma nova escola, uma vez
que se inaugura um milênio singular marcado por mudanças tecnológicas e amplo
acesso à informação. Trata-se de momento em que os conhecimentos consolidados
são rapidamente questionados, em que a adaptação ao novo, a autonomia para
aprender e a existência de currículos flexíveis por parte das escolas serão cada vez
mais necessários e valorizados. Cabe destacar que o tema do ensino para o Século
XXI foi abordado e discutido através de leitura e vídeos naquele momento. E, neste
sentido, foi dada relevância ao papel do Coordenador Pedagógico como aquele
que, na escola, propiciará as condições de um novo aprender tanto para o aluno
como para o professor.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 109 22/10/2018 14:27:26


110 O papel do Coordenador Pedagógico frente à docência criadora

De modo que a ênfase do terceiro eixo não recaiu sobre conhecimentos


técnicos − o que foi característico nos eixos anteriores –, mas sim sobre reflexões
político-filosóficas, pois apontou as possibilidades do Coordenador Pedagógico
como incentivador do aprender dos professores. E aqui faço um duplo deslocamento
– com relação ao conceito de aprender que passa a ser entendido do ponto de vista
do referencial teórico da Filosofia da Diferença, mais exatamente da perspectiva
de Gilles Deleuze, como também, não apenas sob a ótica do aluno, mas de quem
ensina, ou seja, do professor.

O APRENDER EM DELEUZE

Embora seja sabido que o filósofo francês possui uma vasta produção intelec-
tual, ocupando-se da ciência, da literatura, das artes, do cinema em especial, para
desenvolver os seus conceitos, ele não teorizou sobre a educação. No entanto, o
que ele escreveu sobre o pensar e o aprender, – como por exemplo, em Proust e os
signos (2003) e em Diferença e Repetição (1998) – serve de matéria de pensamento
para o professor e para o futuro Coordenador Pedagógico. Ao frisar um aprender,
tenho a intenção de ir além do que o senso comum diz sobre ele. Enfatizo o verbo
na terceira pessoa do singular por ser uma característica dos devires que estão
além dos modos e dos tempos. Porém, como aprender e pensar estão imbricados,
é necessário abordar as ideias básicas de Deleuze sobre o pensar. Em termos do
ato do pensamento, ele tratava de denunciar e combater o que entendia ser a sua
Imagem Dogmática. Trata-se de algo que o aprisiona sob uma imagem que é a do
Mesmo e do Semelhante na representação e que trai profundamente o que significa
pensar. Tal imagem vem sendo construída desde os primórdios da filosofia, mais
exatamente a partir de Sócrates e Platão. Sendo que é possível, com base no Capítulo
III de Diferença e Repetição, indicar três teses básicas para reconhecer essa imagem:
1) o exercício do pensar se exerce naturalmente, como unidade de todas as fa-
culdades consideradas seus modos. Além disso, possui uma boa natureza e
uma boa vontade;
2) existem forças contrárias ou estranhas ao pensamento, que podem impedir
o seu perfeito e natural funcionamento. Forças essas que advêm do corpo,
das paixões ou de qualquer interesse sensível, concorrem para desviar o pen-
samento do seu objeto específico, fazendo-o tomar o falso pelo verdadeiro.
3) há a necessidade de um método que leve a pensar verdadeiramente, que con-
duza retamente ao conhecimento pleno da verdade.
Segundo essa imagem, o pensamento está em afinidade com o verdadeiro,
possui formalmente o verdadeiro e quer materialmente o verdadeiro. Porém, será

Livro Coordenação Pedagógica.indb 110 22/10/2018 14:27:26


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 111

a verdade uma criatura bonachona e amiga das comodidades que não perturba
ninguém? Ou, em outras palavras: o que é um pensamento que não faz mal a
ninguém? Afinal, a forma da recognição nunca santificou outra coisa que não o
reconhecido e o reconhecível, a forma nunca inspirou outra coisa que não fossem
conformidades. Embora os atos da recognição ocupem boa parte da nossa vida
diária, como por exemplo, todas as vezes que olhamos para uma porta, sabemos o
que ela é. De igual modo, não pensamos cada vez que respondemos: “bom dia” ou
“boa noite”. Porém, considerar que essa é a função do pensamento é lhe atribuir
um lugar muito medíocre.
Esta imagem dogmática do pensamento, que tudo julga e que a tudo reco-
nhece com base no raciocínio lógico, exerce enorme influência não somente no
pensamento ocidental, como também no educacional. A oposição binária que se
estabelece entre o sensível e o inteligível, entre o sujeito e o objeto, entre a mente
e o corpo remete um aprender a questões pré-formadas segundo as significações
dominantes. E, neste sentido, aprender passa a ser recuperar um mundo que existe
lá fora. As experiências devem ser ajustadas a um modelo pré-concebido e a um
ideal de aprender. Eis que o reinado da cópia, da reprodução ad infinitum de um
fundamento neste ato se instala.
No entanto, só se procura a verdade quando se é forçado. Tal tema é desenvol-
vido por Deleuze em Proust e os Signos, quando ele com base na Busca do Tempo
Perdido de Proust teoriza que só se procura a verdade em função de uma situação
concreta, quando o pensamento é arrancado do seu torpor, por uma espécie de
violência que o força. Algo capaz de provocar o desencontro das faculdades e que
impede o exercício da recognição. Tal força é atribuída aos signos, que nada têm a
ver com a linguística, nem com uma boa vontade, nem com uma afinidade, ou com
um desejo pela verdade. Neste sentido, aprender passa a ser enfocado pela via do
encontro, da afecção com o exterior, com aquilo que viola o pensamento e provoca
o pensar no próprio pensamento. Ou seja, aprender passa a ter afinidade com a
ideia de coação e de acaso e não com a de método. Um exemplo clássico deleuzeano
neste sentido é: “Alguém só se torna marceneiro tornando-se sensível aos signos da
madeira e médico tornando-se sensível aos signos da doença” (Deleuze, 2003, p. 4).
Ou seja, o aprendiz acaba se tornando um expert na leitura de pistas, ao modo
de um egiptólogo. Tal afirmação se justifica, uma vez que, para Deleuze, aprender
está ligado ao ato de interpretar signos. Neste sentido, tudo aquilo que tem a ca-
pacidade de ensinar alguma coisa emite signos. De modo que o pensamento não
é provocado por um desejo, por uma boa vontade, ou por uma afinidade com a
verdade, mas por uma situação concreta que força a sua procura... Pois: “As ideias
não estão na cabeça, mas fora de nós, não estão dentro, mas fora” (SCHERER,
2005, p. 1187).
Nesta perspectiva, numa sala de aula, o professor passa a ser um emissor de
signos da matéria com que está envolvido, a fim de que seus alunos travem encon-

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112 O papel do Coordenador Pedagógico frente à docência criadora

tros com ela, ao mesmo tempo em que interpreta os signos emitidos pelos alunos
quando estes estão envolvidos com as atividades que lhe são propostas. Portanto,
se os aprendizes não forem expostos ao efeito violento dos signos, o que os lançam
na busca do seu sentido, eles apenas chegarão a verdades puramente intelectuais,
estéreis e que rapidamente cairão no esquecimento, pois estão esvaziadas da força
da necessidade.
Portanto, com base nas ideias de Deleuze, há uma política a ser seguida e
perseguida pelo professor com relação ao cotidiano da escola: liberar todo o pen-
samento daquilo que o trava e o deforma. Trata-se de livrá-lo de tudo aquilo que
desvia ou bloqueia o seu movimento, como por exemplo, as regras artificiais, os
poderes, as ideias prontas, os clichês. Uma vez que aprender não tem a ver com
reproduzir, mas com postular o que ainda não existe, isto significa não se satisfazer
com a repetição de um saber.

POR UMA DOCÊNCIA CRIADORA

Tal posição frente à aprendizagem encontra ressonância nas leituras obriga-


tórias selecionadas para o eixo 3: O Coordenador Pedagógico na Educação Básica:
desafios e perspectivas, de Paulo Lima e Sonia Santos (2007) e A formação do professor
pesquisador e a criação pedagógica, de Sandra Corazza (2001).
O primeiro artigo foi selecionado, pois coloca em discussão o papel e inter-
venções do Coordenador Pedagógico na formação continuada de professores com
base em pesquisas realizadas na educação básica, em análise de vivências, bem
como numa revisão de literatura especializada. O texto está organizado em quatro
sessões sendo que o que é apresentado na segunda, Sobre a necessidade de outro
olhar do Coordenador Pedagógico na escola, pode ser lido como um sintoma da
sua crise de identidade. Embora desde a década de 60, no estado de São Paulo nas
escolas experimentais e vocacionais, exista a figura do Coordenador Pedagógico,
até os dias de hoje há uma falta de clareza de sua parte sobre a sua identidade e a
delimitação de sua competência. É comum lhe solicitarem a realização de toda e
qualquer tarefa: desde a substituição de um professor até a realização de trabalhos
meramente burocráticos e de secretaria, tornando-o uma espécie de “faz tudo”.
Neste sentido, a seguinte e terceira sessão do artigo, Formação continuada de
professores e Coordenação Pedagógica, afirma que, embora não se trate do educador,
sozinho, realizar tantas tarefas, um novo olhar sob o Coordenador Pedagógico
implicaria a busca de soluções dos problemas diagnosticados por meio do diálogo.
Porém, vale o questionamento: será que todo e qualquer problema que surge na
escola necessita ser resolvido? Ocorre que o pensamento passa a ser suprimido
tendo em vista a ânsia por dominar, por solucionar todo e qualquer problema. O
verdadeiro problema não consiste na sua irrupção, mas em capturá-lo segundo

Livro Coordenação Pedagógica.indb 112 22/10/2018 14:27:26


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 113

formas pré-determinadas, o que impede que se pense sobre o que rompe o esperado,
as metodologias e os planos de ensino. Novamente, é possível pensar com Deleuze
que se trata de uma ilusão filosófica considerar que os problemas são dados já
feitos e que eles desapareceriam quando se encontram suas respostas ou soluções.
Isto significa esgotar a atividade de pensar a sua resolução, como se a verdade dos
problemas dependesse de lugares-comuns, ou seja, da possibilidade lógica de serem
solucionados. Essa é a característica da grotesca imagem da cultura presente nos
testes, nos programas populares da TV, dos concursos em geral e na Educação, bem
explicitada por Deleuze no capítulo III de Diferença e Repetição.
É inegável que os problemas são o que há de mais importante. No entanto,
o que interessa é romper com a ilusão natural de decalcar os problemas sobre as
proposições do senso comum, da possibilidade lógica de receber uma solução, e
os professores, assim como os alunos, poderem formular os próprios problemas.
Então, a fim de que tal operação do pensamento se concretize, a variável tempo
na construção do trabalho do Coordenador Pedagógico, título da quarta sessão
do texto, se torna fundamental. Trata-se da necessidade de haver um tempo de
convivência do Coordenador Pedagógico com os professores, a fim de que seja
facilitada, possibilitada a sua formação continuada. Mas, obviamente, não se trata
de qualquer tempo, mas um qualificado que busque estimular a criação docente.
Tal ênfase caracteriza a segunda e última leitura obrigatória da sala: A formação
do professor-pesquisador e a criação pedagógica de Sandra Corazza (2001). Trata-se
de um texto inquietante e provocador que desestabiliza as ideias prontas formadas
sobre a divisão do trabalho docente entre quem ensina e quem pesquisa. Por se
tratar de texto que utiliza o referencial teórico da Filosofia da Diferença, afirma a
indissociabilidade entre docência e pesquisa. Tal ponto de vista questiona aqueles
que consideram que deva existir tal hierarquia educacional e assim se comportam.
Cabe perguntar: a quem interessa tal separação? A sociedade e seu o próprio sis-
tema de ensino, aos professores letárgicos e acomodados? Como se fosse possível
o docente ser um mero reprodutor ao “dar aulas”.
Ocorre que, para o pensamento da diferença, o educador não é uma figura
dadivosa e não trata de “dar” nada: sejam aulas, conselhos, conteúdos, afetos... Então,
o texto traça linhas de fuga do pensamento representacional ao afirmar o necessário
movimento de procurar e de encontrar. Só com este élan é possível ser educador
apesar das condições adversas que encontra no seu dia a dia profissional − desde
a precariedade material e humana das escolas, a falta de incentivo financeiro para
seguir na profissão, até o consequente baixo reconhecimento do seu papel social.
A potência, a força de educar consiste, justamente, naquela energia que faz com
que se insista em educar apesar dos sabidos desestímulos, entraves e mazelas edu-
cacionais. “É essa condição que abre o canal de uma docência que procura; logo,
que cria: que é o canal da pesquisa” (CORAZZA, 2001, p. 14). Então, procurar e
pesquisar se igualam em termos de uma vontade.

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114 O papel do Coordenador Pedagógico frente à docência criadora

Ensinar implica preparar em encontro – algo da ordem do inesperado – e


preparar-se, lendo, atualizando-se, fazendo recortes de uma matéria, estudando, ou
seja, pesquisando. É bem verdade que há um bom tempo o professor vem dando
sinais de estar farto do já visto, já dito, já feito, já sentido, já praticado da docência
e da pesquisa moderna. Ao se lançar na pesquisa-ensino que procura e cria, ele
tem que estar alerta e combater o seu pior inimigo.
O inimigo, apontado pelo artigo, se trata do avassalador legado da pedago-
gia moderna afeita a “receitas” de ajuda e “manuais” de autoajuda. Há um farto
receituário pedagógico que trata de métodos, didáticas, planejamento, técnicas de
ensino... Instala-se a reprodução ad infinitum do caminho já trilhado, ou seja, o
poder do como: dar uma boa aula, trabalhar com o currículo, usar os novos métodos
de ensino. Por fim, tem-se um ensino pouco potente, descontextualizado, que tem
por base a reprodução do mesmo.
O desafio tanto para o professor como para a Coordenador Pedagógico é es-
tar conectado com a contemporaneidade. E, para isso, é fundamental alimentar a
dúvida sobre o que já foi feito, sobre o que já foi dito a respeito da pedagogia, sobre
o currículo, sobre a escola, sobre o professor, sobre o aluno. Será que já se esgotou
tudo o que se poderia dizer sobre eles? Portanto, cabe tanto ao professor como ao
Coordenador Pedagógico desenvolver uma nova sensibilidade.
A interface que o Coordenador Pedagógico estabelece com o aprender dos
professores é algo que não está dado, mas que possui implicações para a sua identi-
dade, algo a ser construído. Neste sentido, a indefinição do papel do Coordenador
Pedagógico pode ser vista não somente do ponto de vista de sua impotência, mas
pelo lado da sua potência, uma vez que tal imprecisão permite brechas, espaços
para que ele adote um ponto de vista criador, assim como seja um estímulo para
que o professor também percorra este caminho. Um ato de coragem, como bem
sinaliza o artigo na sua última parte, intitulada “desafio”. O desafio de ir contra a
tradição, contra a opinião, contra o dogma, contra a voz da experiência. Somente
com a coragem de raspar, de escovar, de faxinar os clichês do senso comum e das
formas consagradas sobre como se ensina e se aprende, é possível afirmar novas
verdades sobre a Educação.

O ENSAIO DAS ALUNAS

E como as alunas do polo Porto Alegre se posicionaram frente ao papel do


Coordenador Pedagógico no estímulo ao professor-pesquisador? Que tipo de
ações ele pode criar enquanto gestor dos processos de aprendizagem ou educação
permanente?
De um modo geral, a produção escrita das 41 cursistas atendeu ao que foi
observado no enunciado da questão: o uso das duas bibliografias obrigatórias

Livro Coordenação Pedagógica.indb 114 22/10/2018 14:27:26


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 115

da sala e o número mínimo de páginas, uma vez que 85% das alunas obtiveram
conceitos entre “A” e “B” na questão. A leitura dos trabalhos indica argumentações
bem desenvolvidas e fundamentadas, sendo que muitas delas utilizaram também
conhecimentos das leituras complementares da sala, vídeos recomendados ou
mesmo outras bibliografias pertinentes. Em alguns poucos trabalhos, as alunas
corroboraram o acúmulo de tarefas que recai sob o Coordenador Pedagógico, a
crise da sua identidade apontada no texto de Paulo Lima e Sonia Santos (2007) por
já terem exercido ou estarem exercendo esta função na escola, mesmo sem titulação.
A totalidade dos ensaios considerou necessário que os coordenadores peda-
gógicos proponham espaços de formação sistemática do corpo docente. No caso
foram sugeridas várias formas do seu oferecimento, sendo as mais citadas: reuniões
de professores e seminários de estudo, inclusive com a vinda de especialistas nos
assuntos escolhidos. Neste sentido, foi apontada também uma questão básica: a
necessidade de o Coordenador Pedagógico conhecer a realidade da sua escola, a
fim de fazer a conexão entre ela e realidade social. Criar um clima de possibilida-
des, também foi mencionado como estímulo ao professor-pesquisador. Ou seja,
cabe ao Coordenador Pedagógico não barrar as iniciativas de criação vindas do
corpo docente.
No entanto, apesar do mote do ensaio sinalizar a importância da pesquisa,
somente três ensaios dentre as 35 alunas que obtiveram entre os conceitos “A” e
“B” mencionaram a importância do registro sistemático do professor das suas
experiências e práticas significativas. Tal fato é grave e preocupante, pois não se
faz pesquisa sem registro e a posterior análise de dados. E aqui é fundamental se
fazer um questionamento sobre a formação acadêmica dessas professoras. Qual
ênfase no seu currículo de graduação foi dada à pesquisa? Será que elas levam da
licenciatura a impressão de que pesquisar é somente para poucos, tarefa de uma
elite intelectual, como bem questionou o texto de Sandra Corazza? Tais dados, sem
dúvida, apontaram para a importância da sala-ambiente “Metodologia do Trabalho
Científico” ao buscar desconstruir tal visão no currículo deste Curso.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Propor a escrita de um breve ensaio como atividade final da sala-ambiente


“Aprendizagem Escolar e Trabalho Pedagógico” foi uma ousadia. É claro que o ato
de escrever em si não consiste num desafio, mas sim o tema proposto: o desenvol-
vimento de um texto no sentido do estímulo ao professor-pesquisador. As cursistas
através dos ensaios demonstraram, de uma maneira geral, domínio da escrita,
bem como argumentações embasadas nos autores indicados. No entanto, o que
foi proposto, a resposta ao ensaio não se encontrava, nem se encontra nos textos.
Uma vez que isto implica a quebra de paradigmas, um exercício experimental que

Livro Coordenação Pedagógica.indb 115 22/10/2018 14:27:26


116 O papel do Coordenador Pedagógico frente à docência criadora

conduz o pensamento para o plano das possibilidades é algo a ser ainda construído
pelas futuras coordenadoras pedagógicas.
As leituras da sala serviram de subsídios para a reflexão sobre papel do Coor-
denador Pedagógico na escola contemporânea. Tais escolhas tiveram o propósito
de servir como um alerta para que as alunas questionassem o papel de “Bombril”
atribuído ao Coordenador Pedagógico e não caíssem num ativismo estéril por
causa da sua falta de definição, pois justamente é esta imprecisão que permite e
dá margem à criação e reinvenção do seu lugar. Nem tudo o que é produzido na
escola é problema e deve necessariamente ser resolvido, quando se raspam os clichês
formados sobre o aprender e quem aprende: aqueles que envolvem o não dito, o
não feito sobre o currículo, sobre a escola, sobre o aluno. Neste sentido, cabe ao
Coordenador Pedagógico propor momentos de formação permanente do corpo
docente, em que se criem espaços para que os verdadeiros problemas possam ser
pensados. Problemas propostos pelo próprio corpo docente e que não venham de
outro lugar.
No entanto, o fato de apenas 1% das alunas que obtiveram entre os conceitos
“A” e “B” na escrita do ensaio terem apontado a necessidade de o Coordenador
Pedagógico incentivar o registro, a escrita de experiências significativas por parte
dos professores é preocupante. Uma vez que não se faz pesquisa sem registro escri-
to sistemático, esse dado é muito significativo para o planejamento dos próximos
cursos, assim como serve de questionamento para o currículo das licenciaturas.

REFERÊNCIAS

CORAZZA, Sandra. A formação do professor-pesquisador e a criação pedagógica. In: Revista da


Funarte. Montenegro, vol. 1, n. 1, p. 13-16. Jan/Jun. 2001. Disponível em: ‹ http: https://www.revis-
tas.uneb.br/index.php/faeeba/article/view/1330/909 › Acesso em: 17 abr. 2016.
DELEUZE, Gilles. Diferença e repetição. Rio de Janeiro: Graal, 1988.
___. Proust e os signos. 2ª ed. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2003.
LIMA, Paulo Gomes; SANTOS, Sandra Mendes dos. O Coordenador Pedagógico na educação bási-
ca: desafios e perspectivas. Revista educere et educare – Revista de Educação, Paraná, v. 2, n 4, p. 77-
90, Jul./Dez. 2007. Disponível em: ‹http://e-revista.unioeste.br/index.php/educereeteducare/article/
view/1656/1343 ›: Acesso em: 17 abr. 2016.
NODARI, Karen Elisabete Rosa. Além da escola: percursos entre Nietzsche e Deleuze. Porto Alegre:
UFRGS, 2007. 191f. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós Graduação em Educação,
Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2007
SCHERER, René. Aprender com Deleuze. Educ. Soc., Campinas, v. 26, n.93, p. 1183-1194. Set./Dez.
2005. Disponível em: ‹http: www.cedes.unicamp. br› Acesso em: 17 abr. 2016.

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Contribuições da sala-ambiente 0 8
“Projeto Político Pedagógico
e Organização do Ensino” na
construção da gestão democrática

Arthur da Silva Poziomyck


Graziella Souza dos Santos
Luis Armando Gandin

Ao longo do ano de 2015, participamos como professores da segunda edição


do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Coordenação Pedagógica na modali-
dade à distância da Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRGS/FACED,
em parceria com o Ministério da Educação (MEC), através do Programa Nacio-
nal Escola de Gestores da Educação Básica. Atuamos na sala-ambiente “Projeto
Político-Pedagógico e Organização do Ensino”, com o desafio de elaborar junto
aos cursistas, professores e coordenadores pedagógicos de escolas públicas do
Rio Grande do Sul, conhecimentos e reflexões acerca da importância do Projeto
Político-Pedagógico, frequentemente denominado de PPP, para a construção e
vivência da gestão democrática.
Antes de iniciarmos o relato da experiência de trabalho desta sala e dos pres-
supostos teóricos que a orientaram, acreditamos ser importante apresentar alguns
dos marcos legais que dão sustentação à noção de Projeto Político-Pedagógico,
bem como conceituá-la de acordo com o entendimento que embasou a caminhada
dessa sala.
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN (Lei
nº 9.394/1996), em seu artigo 12º, Parágrafo I, a primeira incumbência estabelecida
aos Sistemas de Ensino de todos os segmentos da Educação Nacional (Educação
Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e Ensino Superior), respeitadas as
normas comuns, é “elaborar e executar a sua proposta pedagógica”. É responsabi-
lidade primeira das instituições de ensino a existência de um projeto pedagógico,
construído coletivamente e alicerçado nos princípios da gestão democrática. Neste
ponto, cabe aos gestores escolares zelar pelo cumprimento dessa tarefa, sendo im-
prescindível, para tanto, que tenham clareza da importância e das dimensões desse
documento. Diante disso, a sala dedicou-se a refletir e ampliar os conhecimentos
dos cursistas gestores sobre a temática.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 117 22/10/2018 14:27:26


118 Contribuições da sala-ambiente “Projeto Político Pedagógico e Organização do Ensino”...

Os Conselhos Estaduais e Municipais de Educação, que estabelecem algumas


diretrizes regionais e locais, também costumam trazer orientações importantes a
respeito da construção desse documento. O Conselho Municipal de Educação de
Porto Alegre, por exemplo, na Resolução CME/PoA nº 006 de 2003, aponta aspectos
importantes sobre o PPP e sobre o Regimento Escolar – documento que em geral
acompanha o PPP, apresentando aspectos administrativos e pedagógicos a respeito
do funcionamento da escola (organização estrutural, cursos e modalidades ofere-
cidos, normas ou princípios de convivência da instituição, etc). Nessa resolução, o
referido Conselho Municipal pontua:
§ 1º O Projeto Político-Pedagógico tem como pressupostos os referenciais teóricos
que representam a opção filosófica, política, sócio-antropológica e pedagógica,
apontados pela comunidade escolar a que se destina [...]

§ 2º. Caberá à instituição de educação promover a participação de todos os segmen-


tos da comunidade escolar na elaboração, implementação e avaliação do Projeto
Político-Pedagógico, visando garantir a consolidação e o aperfeiçoamento da gestão
democrática no Sistema Municipal de Ensino. (CME/POA, 2003)

Dadas as especificidades de tais planos, e em virtude de atendermos alunos


de diferentes municípios, procuramos orientar os cursistas para que buscassem o
conhecimento de tais legislações, que não raramente são desconhecidas nas escolas.
Ainda que a elaboração desse instrumento tenha sido um dos itens previstos
pela legislação educacional desde 1996, parece-nos frágil ainda o conhecimento do
assunto e a compreensão da sua obrigatoriedade nos meios escolares. De forma am-
pla, os cursistas gestores relatam que em muitos locais o Projeto Político-Pedagógico,
quando existente, ainda é visto apenas como um documento com fins protocolares,
que repousa em alguma gaveta da sala da direção ou da coordenação pedagógica.
Observa-se, portanto, que a previsão legal da elaboração deste documento
não garante a sua efetivação. Tal dificuldade é potencializada pelo parco e nebulo-
so entendimento havido sobre o seu significado e os caminhos possíveis para sua
construção. Deste modo, salienta-se a importância desta sala junto às demais, na
tentativa de superar uma lacuna existente na formação de muitos gestores escolares.
Passemos, então, ao entendimento de Projeto Político-Pedagógico que guiou
o desenvolvimento desta sala-ambiente.
A efetivação da gestão democrática nos estabelecimentos de ensino pressupõe
uma mudança de atitude na forma de ver e dirigir as escolas, baseada em princípios
políticos, éticos e filosóficos que apontam para a construção de uma escola mais
plural e diversa, com relações horizontais entre os sujeitos e tomadas de decisão
coletivas, na busca por uma educação crítica e emancipatória. Entretanto, a mudança
de atitude por si só não garante a prevalência da gestão democrática. É necessário
traçar rumos, construir caminhos, ou seja, é preciso método. Este é, pois, o papel

Livro Coordenação Pedagógica.indb 118 22/10/2018 14:27:26


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 119

exercido pelo Projeto Político-Pedagógico das escolas. O PPP é justamente o mé-


todo, o meio pelo qual a gestão democrática se corporifica na realidade da escola.
O Projeto Político-Pedagógico é, algumas vezes, visto apenas como um mero
documento, uma formalidade. De fato, o PPP é um documento, uma sistematização,
e sua existência formal e concreta do ponto de vista documental não pode ser ne-
gligenciada pelos gestores. Entretanto, para além de um documento que respalda a
existência e funcionamento das instituições de ensino, sua maior contribuição para o
ambiente educacional está no âmbito da práxis, da ação. Conforme apresentaremos
a seguir, podemos afirmar que a construção do Projeto Político-Pedagógico colabora
em pelo menos duas grandes frentes nos estabelecimentos de ensino: a edificação
da percepção de comunidade educativa1 e a possibilidade de intervenção sobre a
realidade escolar. Esses foram, pois, os aspectos nos quais centramos as discussões
ao longo desta sala, na tentativa de construir um novo olhar sobre o PPP, que nesta
perspectiva pode ser compreendido como um significativo aliado dos gestores.
Partindo da concepção de gestão democrática da educação, o PPP é elemento
estruturante da identidade escolar. A elaboração de um PPP cria a oportunidade
de a escola olhar para si mesma, para sua trajetória e assim perceber-se não mais
apenas como um aglomerado de pessoas e estruturas. Ao descrever-se e narrar-se
no PPP, a escola pode descobrir-se como organismo vivo, composto por atores
diversos que, ao se unirem, constituem uma unidade escolar singular. É no pro-
cesso coletivo de sua construção, quando a comunidade escolar pensa e reflete
sobre seus objetivos e desejos, que se constrói a identidade de uma determinada
instituição. Neste movimento, são também gestadas as noções de coletividade e
de comunidade escolar, tão necessárias para a experiência da gestão democrática.
A elaboração do PPP colabora, por isso, com a criação de vínculos e a noção de
corresponsabilidade, uma vez que contempla os desejos e objetivos de todos os
envolvidos com o estabelecimento de ensino, na medida em que a participação de
todos se faz presente no processo.
Justamente por ser um processo de criação singular a cada instituição, tanto
quanto não se encontram duas escolas iguais, também não encontraremos projetos
político-pedagógicos iguais. A autonomia e peculiaridade de cada instituição, res-
peitadas as normas e legislações maiores, encontram no PPP um espaço que assegura
e legitima essas especificidades. Uma vez pactuado, documentado e sistematizado
coletivamente, a escola como um todo possui mais força para enfrentar adversi-
dades e lutar pelos seus interesses junto aos entes públicos sempre que necessário.

1 É importante salientar que aqui estamos entendendo o conceito de comunidade educativa,


como Veloso, Craveiro e Rufino (2012), a partir da noção de escola democrática. Assim, por
comunidade educativa, compreendemos o diverso grupo de atores sociais diretamente envolvi-
dos com a escola – pais, mães alunos, funcionários, professores e demais colaboradores – que,
através do convite e estímulo à participação, sentem-se corresponsáveis pela instituição escolar,
tomando parte nas instâncias representativas escolares e colaborando para a ampliação das ex-
periências coletivas e democráticas.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 119 22/10/2018 14:27:26


120 Contribuições da sala-ambiente “Projeto Político Pedagógico e Organização do Ensino”...

Segundo Gandin (2006), o Projeto Político-Pedagógico é também responsável


pela definição coletiva dos rumos da escola. O PPP estabelece o horizonte e o sentido
do caminhar. Uma escola ou qualquer outro estabelecimento de ensino precisa ter
clareza da direção em que pretende caminhar. E esse processo não pode ocorrer
individualmente, pois poderíamos incorrer no erro de olharmos para pontos di-
ferentes e assim não chegarmos a lugar algum. Essa unidade, contudo, não ocorre
naturalmente. Ela precisa ser discutida, debatida e convencionada coletivamente.
Esse pacto é construído e legitimado através do Projeto Político-Pedagógico.
Para apontar os rumos, porém, é necessário um passo anterior. O ponto de
partida para a elaboração de um PPP deve ser necessariamente um cuidadoso olhar
sobre a história da comunidade educacional. Entender e documentar a história são
processos fundamentais sem os quais as projeções de futuro fragilizam-se, uma
vez que não se ancoram na trajetória já sedimentada. O processo de levantamento
da história local e de construção de um diagnóstico da realidade atual é também
ponto central para a construção da identidade educacional.
Até aqui, ainda que de forma breve, já localizamos ao menos três contribuições
que a elaboração de um PPP pode trazer para uma instituição de ensino: construir
a identidade educacional, resgatar a história da comunidade escolar e estabelecer
rumos. Podemos apontar ainda outras três, que são justamente as dimensões que
fazem de um PPP uma possibilidade de ação no ambiente escolar: planejar, avaliar
e comunicar. Passemos a elas.
Atingir objetivos traçados requer planejamento. Como estabelecido no pró-
prio nome, o PPP implica projetar, prever, construir caminhos. Esse planejamento
macro da escola implica desde a escolha dos referenciais teóricos que orientarão os
processos políticos, éticos e filosóficos que permeiam uma instituição de ensino, até
o trabalho pedagógico que é realizado em cada uma das instâncias educacionais. É
em seu PPP que a comunidade educacional planeja, delibera e acorda sobre como o
ensino será organizado, como o currículo será construído e praticado, quais serão
as formas de avaliação, os encaminhamentos organizacionais, os eventos escolares,
os tempos e espaços, entre outros. É neste processo de planejamento que a escola
precisa apropriar-se da legislação vigente, ajustando o seu planejamento ao que já
fora instituído legalmente.
Estando a construção do PPP alinhada à perspectiva da gestão democrática,
julgamos que a prática do Planejamento Participativo, tal como formulado por
Danilo Gandin, é uma concepção bastante coerente a ser utilizada.
Planejar, segundo Danilo Gandin (2000), requer, em qualquer situação, ao
menos três ações: I) compreender a realidade (entender o que se passa, o que a
compõe, o que a difere das demais); II) diagnosticar a existência e extensão de pro-
blemas (fazer um levantamento de questões a serem resolvidas ou aprimoradas);
e III) tomar decisões para melhorar ou solucionar as questões elencadas (definir
estratégias, escolher caminhos). Esse formato de planejamento pode ser utilizado

Livro Coordenação Pedagógica.indb 120 22/10/2018 14:27:26


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 121

em diferentes situações, desde a resolução de problemas básicos do cotidiano até


o planejamento de uma grande empresa que deseja melhorar a qualidade do seu
produto. Porém, segundo Danilo Gandin, ainda que tais ações sejam também
realizadas no planejamento de uma escola ou de um professor, há algumas espe-
cificidades no planejamento de instituições que almejam contribuir na formação
do ser humano e da humanidade (GANDIN, 2000; 2001a).
O planejamento de instituições e movimentos que buscam uma formação
cidadã, democrática e interessada na transformação da realidade, precisa levar
em conta alguns princípios, que acabam conformando um determinado modo de
planejar, denominado pelo autor de Planejamento Participativo. Assim, o Planeja-
mento Participativo possui ao menos cinco etapas: a) a identificação dos desafios;
b) o ideal desejado em relação à sociedade e ao ser humano; c) o ideal de nosso
fazer; d) a distância entre o real e o ideal e, por fim; e) a proposta de prática. Assim,
consideramos que a noção de Planejamento Participativo na elaboração e prática
dos PPP pode auxiliar significativamente no desafio dessa composição, trazendo
indicativos importantes para que se encontrem meios viáveis de caminhar rumo
ao desejado. Desta forma, elaborar e vivenciar um PPP é colocar-se no exercício
permanente de planejar.
Outro importante desdobramento da elaboração do PPP nas instituições é
a prática da (auto) avaliação. As possibilidades avaliativas criadas pelo PPP são
diversas. Ao se construir pela primeira vez um PPP, é necessário avaliar a realida-
de, a matéria prima que se tem para planejar o futuro. Quando este documento já
existe e é necessário atualizá-lo, eis aí uma nova oportunidade: avaliar a caminhada
percorrida, identificar erros e acertos, retomar objetivos deixados para trás, projetar
novamente, estabelecer outros caminhos. O PPP, assim, é capaz de desencadear a
autoavaliação escolar, promovendo novas aprendizagens. Porém, para que o PPP
possa, de fato, contribuir para a avaliação educacional, é preciso que ele seja revisto
com alguma frequência e atualizado quando necessário. O PPP é um movimento
contínuo, um instrumento inacabado e incompleto por natureza, que vez por outra
requer uma reconstrução. As realidades escolares mudam muito rapidamente nos
dias atuais. A escola não pode ficar imobilizada diante dessas transformações e,
sempre que perceber um descompasso na relação com a sua comunidade, é preciso
rever e reconstruir o seu projeto, adequando-o aos novos contornos e demandas. É
de fundamental importância que os coordenadores pedagógicos estejam atentos a
este aspecto e que contribuam para a realização de alterações sempre que se fize-
rem importantes. Do ponto de vista da legislação, o período de validade dos PPP
pode variar, e novamente recomendamos aos alunos cursistas que acompanhem
as resoluções dos Conselhos de Educação.
Por fim, o PPP é entendido também como instrumento de comunicação entre
a escola, sua comunidade escolar e a sociedade em geral. Os projetos pedagógicos
guardam, como vimos, todas as informações relevantes da escola: sua identidade,

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122 Contribuições da sala-ambiente “Projeto Político Pedagógico e Organização do Ensino”...

objetivos, forma de organização, embasamento teórico, etc. Dessa forma, precisa


não apenas ser construído de forma coletiva, mas também estar disponível e ser
de conhecimento de todos. Pais, alunos, professores e colaboradores precisam ter
conhecimento do teor deste projeto para que possam engajar-se no mesmo.
De acordo com o material-base sala-ambiente “Projeto Político-Pedagógico
e a Organização do Ensino”, disponível na plataforma do Curso:
A comunidade escolar como um todo possui o direito e o dever de tornar públicas
as informações relevantes de interesse coletivo. Neste sentido, para tornar comum
informações, problemas, soluções, projetos, necessitamos intensificar processos de
comunicação no ambiente escolar. Por exemplo, o Projeto Político-Pedagógico – PPP,
como instrumento de participação e de gestão democrática, precisa ser entendido
como um documento público, comum a todos que compõem a comunidade escolar,
e, para tanto, a sua comunicação é imprescindível nesse processo. Tornar comum
tanto a construção do documento quanto a sua operacionalização e avaliação.2

Essas dimensões brevemente descritas revelam, em síntese, a capacidade


mobilizadora que pode possuir um Projeto Político-Pedagógico, quando orientado
pela perspectiva da Gestão Democrática e do Planejamento Participativo. E, foi a
partir desta abordagem e desse entendimento que organizamos esta sala-ambiente,
auxiliando os cursistas a aprofundarem as reflexões sobre o PPP em suas escolas.

RELATO DA EXPERIÊNCIA E ORGANIZAÇÃO DA SALA

Tendo como premissa um dos objetivos centrais do Curso – a qualificação dos


gestores educacionais em busca de um aprimoramento na gestão democrática das
escolas públicas e o entendimento de PPP exposto anteriormente –, a equipe de
professores da sala junto à sua coordenação propôs quatro eixos temáticos, a saber:
I) Democracia e participação – condições para o Projeto Político-Pedagógico; II)
A construção do Projeto Político-Pedagógico; III) A concepção do Planejamento
Participativo na elaboração do Projeto Político-Pedagógico; e por fim, IV) – Ava-
liação do Projeto Político-Pedagógico e sua vivência na escola.
Cada um dos eixos apresentou de forma integrada os pressupostos teóricos
que orientaram a sala, trazidos sob a forma de artigos e outros materiais, referência
para leitura e discussão junto às turmas. Cada unidade também previa algumas
atividades para os alunos, com o intuito de favorecer o debate e a construção do
conhecimento de modo coletivo e compartilhado. Ao mesmo tempo, também
houve a preocupação de que as atividades conduzissem os cursistas a fazerem
permanentemente o exercício de olhar para si, para sua prática e para sua escola,

2 Disponível em: http://coordenacaoescolagestores.mec.gov.br/uft/file.php/1/coord_ped/sala_3/


pdf/sala_3_Projeto_Politico_Pedagogico_e_a_Organizacao_do_Ensino.pdf

Livro Coordenação Pedagógica.indb 122 22/10/2018 14:27:26


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 123

colaborando para a indissociabilidade de teoria e prática, permitindo que novos


olhares fossem construídos.
Se a reflexão e construção coletiva do conhecimento eram objetivos centrais
desta sala, auxiliar os cursistas a pensar e executar ações em suas escolas também
eram desejos da equipe de professores da sala. Desta maneira, em mais de uma
ocasião, os alunos foram convidados a fazer pesquisa em suas escolas e a planejar
ações para intervir de maneira efetiva nos seus Projetos Político-Pedagógicos.
Assim, reflexão, avaliação e ação foram movimentos contínuos no período de
estudos desta sala.
Apresentaremos, a seguir, as ideias centrais dos eixos temáticos que compu-
seram a sala e seus pressupostos teóricos. Sendo o Projeto Político-Pedagógico
estruturante e estruturado pela Gestão Democrática, era consenso entre o grupo
de docentes dessa sala que a discussão sobre o mesmo não poderia se construir
em separado da temática da gestão democrática, que perpassa, na verdade, cada
uma das salas-ambiente que compõem o Curso. Desse modo, demos seguimento
às nossas contribuições a partir da noção de participação no contexto da gestão
democrática, que se faz imprescindível à prática do planejamento participativo no
processo de (re)construção do PPP.
Abordar a ideia de participação foi tarefa fundamental para discutir o pro-
cesso de gestão democrática da escola. Indissociáveis, a participação é requisito
do processo democrático, como estabelecido e amplamente celebrado pelo orde-
namento jurídico brasileiro. Esta mesma indissociabilidade aparece no âmbito da
gestão da escola.
De pronto, pudemos trabalhar com a ideia de que a participação consiste
na convergência de esforços dos sujeitos em prol de um interesse comum, ainda
que não haja consenso imediato sobre a forma de alcançá-lo. Conforme Danilo
Gandin, é importante salientar que na perspectiva da gestão democrática não nos
referimos a uma participação superficial e eventual, mas sim a uma participação
“que signifique realmente posse de poder dos grupos para orientarem sua ação na
direção de uma nova sociedade que realize o grande ideal de ser, ao mesmo tempo,
justa e livre” (GANDIN, 2001b). No contexto de que tratamos, o interesse comum
é a escola, e os esforços são a contribuição de cada sujeito da comunidade escolar
para sua construção.
Alunos, seus pais e/ou familiares, gestores, coordenadores, professores e fun-
cionários, são os sujeitos que classicamente compõem o universo da comunidade
escolar. São esses os sujeitos que, no âmbito de uma gestão democrática, precisam
ter suas vozes ouvidas e consideradas na organização do trabalho educativo.
Precisam participar da construção da escola, e, nesse sentido, da construção do
Projeto Político-Pedagógico da escola. Neste movimento, o processo ganha em
transparência e pluralidade, à medida que os sujeitos têm garantido o seu espaço
de participação.

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124 Contribuições da sala-ambiente “Projeto Político Pedagógico e Organização do Ensino”...

Contudo, essa noção de participação, vista como o processo de engajar-se


numa luta coletiva, não fez parte da história formativa de muitos sujeitos e muito
possivelmente ainda não faça parte do cotidiano de muitas pessoas. Em outras
palavras, muitos de nós não fomos educados e tampouco fizemos parte de ins-
tituições onde esse modelo de participação fosse experimentado. Assim, muitos
familiares e mesmo educadores precisam também aprender esse novo e complexo
sentido de participar. Mas essa aprendizagem não ocorre naturalmente; a escola
precisa insistir e investir neste processo, garantindo e ampliando os espaços de
participação na escola.
Obviamente, nessa perspectiva, a participação não é vista como algo mera-
mente consultivo, informativo ou protocolar. A participação que interessa a uma
gestão democrática é a participação efetiva, comprometida, possível, através da
qual os sujeitos podem, livremente, posicionar-se e propor, contribuindo para uma
construção coletiva. Um dos aspectos amplamente trabalhado junto aos cursistas foi
a necessidade de a escola planejar espaços e situações que chamem a comunidade
a participar. O fortalecimento das organizações colegiadas, tais como: Conselhos
Escolares, Grêmio Estudantil, Associação de Pais e Mestres, entre outras, são espaços
privilegiados para que essa nova visão de participação seja fortalecida e exercitada.
Dessa forma, cabe também aos gestores e coordenadores pedagógicos terem esse
ponto como prioritário em suas agendas.
O processo de construção de um PPP, instrumento da gestão democrática
escolar, é, por si, um processo pedagógico de alto impacto, pois desencadeia ensino
e aprendizagem entre todos os sujeitos envolvidos. A elaboração do PPP utiliza-se
de ferramentas que exercitam a cultura da participação, da pluralidade, da demo-
cracia. Ferramenta central neste processo é o diálogo, o qual instrumentaliza os
sujeitos a dar suas contribuições e contrapor ideias, ouvindo e respeitando a con-
tribuição do outro. E a isto conectam-se a pluralidade, a diferença, especialmente
as diferenças culturais.
Outro ponto que em geral levanta diversas dúvidas e angústias aos coordena-
dores pedagógicos é sobre como construir o PPP, que itens são necessários, como
organizar o processo. As perguntas dos cursistas são muito pertinentes, pois, como
vimos, estamos diante de uma tarefa bastante complexa. Buscamos construir essas
respostas de maneira coletiva e compartilhada, especialmente porque não há uma
única resposta, uma vez que cada escola precisa encontrar suas próprias formas
de desenvolver e implementar esse planejamento. Para auxiliar na reflexão, trata-
mos de analisar as diferentes perspectivas teóricas que orientam a condução dos
processos, enfatizando a perspectiva do Planejamento Participativo, como apon-
tamos anteriormente. Esta concepção de planejamento traz elementos para que o
processo de elaboração do PPP contemple, de forma sistemática, as posições dos
vários partícipes do processo educacional na escola. Ela garante a organização do
processo, para que todos possam ter voz na elaboração dos rumos da escola. Além

Livro Coordenação Pedagógica.indb 124 22/10/2018 14:27:26


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 125

disso, orientamos os cursistas a buscarem informações junto ao Conselho Estadual


e aos Conselhos Municipais e respectivas Secretarias de Educação, que geralmente
estabelecem diretrizes para essa construção.
Além dos pressupostos do Planejamento Participativo como norte na constru-
ção do PPP, construímos junto aos alunos cursistas algumas perguntas norteadoras
que precisam ser feitas quando diante do processo de (re)construção dos PPP. São
elas: qual é a história desta comunidade escolar? Quais são suas características?
Como ela se constitui? Como é a escola que temos no momento atual? Que escola
desejamos ter? Quais são os objetivos desta instituição? Que sujeitos queremos
formar? Quais são nossos maiores desafios? Que pressupostos teóricos ajudam
e podem ajudar nas reflexões da escola? Em que aspectos conseguimos evoluir
ao longo do tempo? Que ações podemos desenvolver para alcançar os objetivos
traçados? O currículo escolar está adequado e coerente com os objetivos da escola
e com a perspectiva da gestão democrática? A prática avaliativa da escola está
adequada aos objetivos da escola e à perspectiva da gestão democrática? Estamos
conseguindo garantir espaços e criar estratégias para que todos tenham vez e voz
no planejamento do projeto da escola?
Na prática dessa sala-ambiente, foi também recorrente o relato dos cursistas
em relação às dificuldades encontradas, junto aos professores e famílias dos alu-
nos, de vivenciar esse modelo de participação na construção do PPP e nos demais
processos educativos. Relatavam os cursistas que os pais, ou familiares de modo
geral, não participam do cotidiano escolar, e que a escola tem muita dificuldade
em aproximá-los. Alguns deles afirmavam que, em seus contextos, seria inimagi-
nável que os pais participassem da elaboração do Projeto Político-Pedagógico da
escola. Tratamos, então, de analisar, com esses cursistas, o fato de que essa é uma
constatação que fica apenas no nível do levantamento de problemas, sem buscar
identificar as múltiplas origens de tal percepção e do comportamento relatado.
Utilizando as ferramentas teóricas estudadas, buscamos, com os cursistas, pensar
sobre o fato de a escola chamar e receber os pais de classes populares, em geral,
apenas quando há “problemas”. Realizamos, com os cursistas, reflexões sobre os
desafios da participação e de como ela não é algo dado, mas que precisa ser cons-
truída com diálogo verdadeiro entre os vários segmentos. Finalmente, analisamos
a necessidade de sempre realizar um diagnóstico e não apenas um levantamento
de problemas, como nos ensina o Planejamento Participativo.
De outro lado, é importante considerar que em alguns destes contextos tam-
bém as gestões ao longo da história das escolas não possibilitaram que a comunidade
educativa tivesse espaço adequado e acolhedor para participar. Lembremos que
algumas escolas elaboraram o seu PPP de maneira unilateral, tendo como prota-
gonistas apenas a equipe diretiva. Sendo assim, é imperativo que a escola como
um todo reaprenda o sentido de participar e a elaboração do PPP é uma oportu-
nidade fecunda para isso. Ademais, se estamos diante de gerações que, dados os

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126 Contribuições da sala-ambiente “Projeto Político Pedagógico e Organização do Ensino”...

contextos históricos e políticos brasileiros, não foram ensinados numa perspectiva


horizontal, democrática e participativa, temos em nossas mãos a oportunidade e
a responsabilidade de traçarmos outros caminhos com a juventude que frequenta
esta escola atual. Logo, é fundamental que consigamos envolver os alunos neste
processo e que criemos espaços diversos que permitam a participação plena dos
mesmos, que além de formarem-se numa perspectiva mais colaborativa, podem
ainda multiplicar esse conhecimento em suas famílias.
Diante de questionamentos como os antes exemplificados, lembramos que o
processo participativo e o processo democrático precisam ser exercitados, dia após
dia, de modo que nos habituemos a eles e também possamos aperfeiçoá-los. Trata-
-se de um processo contínuo, que exercita o respeito, o diálogo e a visão do todo.

DESAFIOS E PERSPECTIVAS

Ao longo de toda a caminhada da sala, foi um exercício constante dialogar so-


bre a necessidade de se revisar e atualizar os PPP das escolas. Em muitas instituições,
os PPP existentes são ainda os documentos elaborados quando da inauguração da
escola, construídos há anos ou décadas. Nesses casos, em muitas circunstâncias o
PPP precisa ser refeito integralmente, de modo que reflita uma escola e seus ato-
res que já não são mais os mesmos de anos atrás. Outra dificuldade trazida pelos
cursistas, como já mencionado, é a insipiente noção que algumas comunidades
escolares e seus docentes possuem de que a construção e a implementação do
PPP é responsabilidade de todos, talvez pela pouca prática democrática dentro
das escolas. A frágil participação desses atores no processo revela que segue sendo
urgente educar e educarmo-nos para uma participação plena, engajando-nos mais
profundamente nos processos democráticos.
Ao mesmo tempo, é importante salientar que os coordenadores pedagógi-
cos possuem uma tarefa primordial nesta empreitada. São eles os sujeitos que
precisam criar as circunstâncias para que esse trabalho coletivo ocorra e tenha
desdobramentos. O Coordenador Pedagógico e demais gestores escolares não são
os responsáveis exclusivos por esta tarefa, como em geral é a visão encontrada em
alguns meios escolares. Mas é de sua responsabilidade oportunizar os espaços de
discussão e reflexão, manter a vigilância em relação às novas legislações que pre-
cisam ser incorporadas ao PPP da instituição, enfim, trabalhar de modo que todos
conheçam e se engajem no PPP da escola.
Por fim, salientamos que o processo de elaboração de um PPP na perspectiva
da gestão democrática é um processo longo, que requer tempo, investimento e muito
trabalho. Por isso, certamente o mesmo não ocorrerá sem adversidades. Ainda as-
sim, a apropriação do PPP como prática emancipatória é sem dúvida capaz de criar
espaços mais dialógicos, participativos e democráticos, pois mobiliza a comunidade

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 127

em torno do desejo comum de uma escola e de uma sociedade melhor. O trabalho


realizado na sala-ambiente “Projeto Político-Pedagógico e Organização do Ensino”
buscou contribuir para que esse processo seja vivido nas escolas.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394, de 23 de dezembro de 1996.
Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
CME/POA. Resolução n.º 006/2003, de 22 de maio de 2003. Fixa Normas para Elaboração de Pro-
jeto Político-Pedagógico e Regimento Escolar para Instituições de Educação integrantes do Sistema
Municipal de Ensino de Porto Alegre. Porto Alegre
Gandin, Danilo. A Posição do Planejamento Participativo entre as Ferramentas de Intervenção na
Realidade. Currículo sem Fronteiras. V. 1, n.1, pp. 81-95, Jan/Jun 2001a.
___. Escola e transformação social. Porto Alegre. Ed. Vozes, 2001b.
___. A prática do planejamento participativo. Petrópolis: Vozes, 8ª Ed. 2000.
GANDIN, Luís Armando. Projeto Político-Pedagógico: construção coletiva dos rumos da escola.
In: LUCE, Maria Beatriz; MEDEIROS, Isabel Letícia Pedroso (Orgs.). Gestão Escolar Democrática:
concepção e vivências. Porto Alegre: Editora da UFRGS, P. 67-71, 2006.
VELOSO, Luísa; CRAVEIRO, Daniela; RUFINO, Isabel. Participação da comunidade educativa na
gestão escolar. Educ. Pesqui., São Paulo, v. 38, n. 04, p. 815-832, out./dez., 2012.

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A experiência da sala-ambiente 0 9
“Tópicos Especiais”

Alexandre José Rossi


Juliana Selau Lumertz

Nosso objetivo neste artigo é apresentar e discutir a experiência da sala-


-ambiente “Tópicos Especiais” da segunda edição do Curso de Especialização em
Coordenação Pedagógica, vinculado ao Programa Nacional Escola de Gestores da
Educação Básica, do Ministério da Educação (MEC). O artigo está dividido em
três partes. Na primeira parte apresentaremos a sala-ambiente por meio de expli-
citações que envolvem a temática escolhida para ser abordada, a forma como se
organizou e os professores que nela atuaram, dentre outras questões. Num segundo
momento, trataremos do tema da diversidade na escola, que foi o fio condutor da
sala. Na sequência, descreveremos a análise do funcionamento e dos resultados da
sala-ambiente com base nos relatos dos professores que nela atuaram e finalizamos
com algumas considerações acerca da nossa experiência.

A SALA-AMBIENTE TÓPICOS ESPECIAIS – DISCUTINDO


A QUESTÃO DA DIVERSIDADE NA ESCOLA

A sala-ambiente “Tópicos Especiais” dentro do plano do Curso possui uma


especificidade em relação às demais salas-ambiente que o integram. Nesta sala, cabe
ao coordenador e sua equipe de professores escolherem uma temática dentre as
sete que o MEC sugere, de acordo com os interesses e\ou necessidades das turmas,
dado esse que lhes confere certa liberdade ao escolher com que tópico especial irão
trabalhar.
A temática escolhida para trabalhar no Curso foi a da diversidade na escola,
entendendo aqui a diversidade como um campo de reflexão sobre questões rela-
cionadas a características étnico-raciais, de gênero, de sexualidade, dentre outras
que também se inserem nesse campo.
Esta sala foi construída coletivamente pelo grupo dos dez professores que nela
atuaram. Salientamos ainda que o grupo de professores foi composto por mestres
e doutores em educação, muitos deles pesquisadores na área temática da sala, bem
como de professores que trabalham na rede municipal de ensino de Porto Alegre.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 129 22/10/2018 14:27:26


130 A experiência da sala-ambiente “Tópicos Especiais”

A característica, tanto da formação quanto da atuação profissional dos professores,


permitiu, ao longo do desenvolvimento da sala, uma dinâmica de maior aproxi-
mação com a realidade em que os coordenadores pedagógicos – público-alvo do
Curso – atuavam.
Quanto à organização da sala, o período em que a mesma ocorreu foi um
fator importante a ser considerado na elaboração das atividades. A sala “Tópicos
Especiais” ocorreu entre as datas de 16/12/2015 a 05/01/2016. Por tratar-se do final
do ano letivo, bem como pelo fato de termos neste período duas grandes datas festi-
vas – e com muitas alunas em férias –, optamos por priorizar o encontro presencial
como a atividade mais importante da sala, tendo em vista que esse momento seria
desencadeador da discussão proposta.
A primeira atividade foi dividida em duas partes. Inicialmente foi constituí-
da pela leitura prévia e fichamento do texto Desafios da Diversidade na Escola da
autora Neusa Maria Mendes de Gusmão (2003). Essa parte da atividade compôs a
metade do valor da mesma para fins de avaliação e deveria ser entregue no mesmo
dia do encontro presencial. No encontro presencial, realizou-se a discussão sobre
a temática da diversidade tendo como base o texto supracitado, assim como uma
parte do documentário Escola Sem Preconceito1.
A estratégia de solicitar a leitura e fichamento de um texto previamente foi
utilizada para que o encontro presencial pudesse se tornar um momento de diálogo,
uma vez que as alunas já teriam tido contato anterior com a temática. Além disso,
o próprio texto suscitava muitas questões em relação aos temas da diversidade.
Também foi disponibilizado às alunas um roteiro de leitura do texto, bem como
seu fichamento.
De acordo com o relato dos professores, a estratégia utilizada funcionou,
pois as alunas, em sua maioria, foram para o encontro levantando questões sobre
a temática e contribuindo com suas experiências como coordenadoras pedagógi-
cas, muitas vezes denunciando que a escolas tendem a ignorar essas questões, ou
tratam situações de preconceito e discriminação como bullying. Enquanto isso,
outras se diziam “despreparadas” para abordar tais temáticas, ou ainda, em vários
casos, revelavam que os pais e responsáveis não desejavam que certos temas fossem

1 Escola sem preconceitos é um vídeo didático que engloba a ficção e o documentário. Aborda
as várias formas de preconceitos e violências existentes nas escolas da rede pública e privada
com ênfase na discussão sobre a homofobia, a diversidade sexual, a acessibilidade, o bullying e
o respeito às diferenças. O longa integra um conjunto de ações educativas desenvolvidas pela
equipe do Projeto Aprender PAZ, coordenado pela Professora Glória Rabay, com o apoio direto
da Secretaria de Educação Continuada, Diversidade e Inclusão, do Ministério da Educação e
a produção do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Ação sobre a Mulher e Relações de Sexo
e Gênero. O documentário encontra-se disponível no endereço: https://www.youtube.com/
watch?v=IAtG4KejbfQ

Livro Coordenação Pedagógica.indb 130 22/10/2018 14:27:26


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 131

abordados dentro da escola. Numa das falas de uma professora no fórum2 ficou
evidente essa questão:

[... ] nem todos nossos professores têm esse conhecimento sobre diversida-
de. No dia a dia, as ações comprovam que eles também precisam buscar
informações e leituras acerca do tema. Nos PCNs a escola precisa atender
a essa diversidade, mas o professor precisa estar atento para também valo-
rizar uma educação de qualidade, o respeito a todos (Fonte: fala da aula
“A” na “Atividade 2” – Fórum, 2016)

Entendemos que educação de qualidade, além de oferecer a necessária forma-


ção científica, cultural e humanista, é aquela que valoriza o diálogo com o “outro”
e o convívio pacífico e respeitoso de todas as diferenças, de modo a fazer com que
elas não sejam motivo de inferiorização, silenciamentos, constrangimentos, insul-
tos e agressões. De acordo com Diniz e Lioncio (2009), ao não tratar as questões
da sexualidade, a escola revela que o “silêncio se apresenta como uma estratégia
discursiva dominante, tornando nebulosa a fronteira entre heteronormatividade
e homofobia” (DINIZ; LIONCIO, 2009, p. 52). Nega-se que há gays e lésbicas, ne-
gros, índios, pessoas não cristãs ou com outros credos nas escolas e, não havendo
sujeitos, não existe a necessidade de discussão. Na suposição de que realmente não
haja gays, lésbicas, travestis, negros, índios nas escolas, ainda assim, seria função da
educação abordar somente temas que dizem respeito a sua realidade imediata? Se
o processo educativo escolar exerce a função de mediador do conhecimento com
o intuito de possibilitar a formação para a vida, a escola não deveria trabalhar com
esses temas com todos os educandos independentemente da sua orientação sexual,
identidade e gênero, raça, etnia, religião? Talvez a categoria do silêncio explicitada
pelas autoras nos ajude a entender essa rejeição pela temática.
Na medida em que as escolas não abordam o tema ou negam-se a falar com
a justificativa falaciosa de que não existem tais sujeitos na sua escola, estão cada
vez mais reforçando práticas discriminatórias. A invisibilidade com que o tema é
tratado faz com que os sujeitos sintam-se acuados em vivenciar a sua sexualidade,
a sua negritude, a sua religião, e consequentemente tendem a se omitir e a se isolar
do espaço escolar.
A segunda atividade, que compreendeu o restante do período da sala, consistiu
em uma continuidade do encontro presencial. A atividade escolhida foi um fórum
com base na leitura do texto Diversidade Sociocultural na Escola e a dialética da
exclusão/inclusão da autora Maria Regina Clivati Capelo (2003). Naquele fórum,
as alunas deveriam realizar pelo menos três postagens. Na primeira postagem
deveriam destacar o conceito de diversidade apontado no texto e o modo como a

2 O fórum foi o espaço virtual disponibilizado para interações professor/cursista e cursista/cursis-


ta.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 131 22/10/2018 14:27:26


132 A experiência da sala-ambiente “Tópicos Especiais”

autora sugere abordar tais questões na escola. Essa postagem só poderia ser feita
mediante a leitura do texto. Na segunda postagem solicitamos um relato relacio-
nando as questões desenvolvidas no texto com as formas como o tema diversidade
vinha sendo tratado no contexto escolar em que a cursista atuasse ou ainda ca-
sos de preconceito/discriminação no cotidiano escolar. Nesta postagem as aulas
deveriam fazer uma relação entre teoria e prática. A terceira postagem deveria
conter comentário sobre o relato dos colegas da sala, o que permitiria uma troca
de experiências entre elas.
A atividade no formato fórum permitiu que os cursistas ficassem mais livres
para escreverem, não exigindo uma escrita mais formal, como ocorre quando se
solicita outro tipo de atividade escrita. As próprias alunas relataram que se sentiam
mais à vontade para escrever em um espaço virtual.
A partir desse breve relato das atividades realizadas na sala-ambiente “Tópicos
Especiais”, passaremos para a próxima seção, onde iremos apresentar uma breve
discussão sobre as políticas de e para a diversidade que vêm sendo abordadas pelo
Ministério da Educação.

DIVERSIDADE NA E PARA A EDUCAÇÃO: ALGUNS APONTAMENTOS

Nas últimas décadas, temos visto um cenário de políticas públicas que vão
além das ações de distribuição de renda, econômicas, educacionais, habitacionais,
etc. Nesse cenário, desde o fim da década de 1960 têm emergido as políticas iden-
titárias, ou seja, políticas que beneficiam certos grupos particulares, sustentadas
pelo que alguns teóricos chamam de novos movimentos sociais aqui entendidas
como políticas de diversidade.
Essas políticas, em geral, têm como objetivo atender as demandas e os reclames
de determinados grupos sociais que historicamente estiveram à margem do olhar
dos estados nacionais. São grupos sociais que impõem as bandeiras de igualdade
racial, de gênero, de identidade sexual, questões ambientais, religiosas, necessidades
especiais, de estilos de vida, entre outras. Todas essas causas inauguram uma nova
etapa do que até então era conhecido como políticas sociais.
No Brasil, na última década, temos visto a questão da diversidade aparecer de
forma recorrente nas políticas públicas, sejam elas do campo, da saúde, da cultura,
do trabalho e, principalmente, nas políticas educacionais. Educar na e para a diver-
sidade tem sido uma proposta cada vez mais recorrente nos debates educacionais,
surgindo como uma frente de políticas do Ministério da Educação (FARENZENA;
ROSSI; MAFASSIOLI, 2013, p. 144).

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 133

A exemplo dessa frente de políticas para a educação, tem-se a criação da Se-


cretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi)3
em 2006, com o objetivo de agrupar ações e programas governamentais que dessem
conta dos temas da diversidade. Essa Secretaria tornou-se também um canal de
diálogo com os movimentos sociais organizados, que tentam imprimir nas políti-
cas de Estado, desde a década de 1980, temas específicos, referentes a sexualidade,
gênero, raça, geração, deficiência física, etc.
Na organização do governo, ao longo dos dois mandatos da administração do
presidente Lula (2003-2007 e 2007-2011), foram criadas várias secretarias especiais
vinculadas à Presidência da República que tratavam de políticas específicas. Dentre
elas, podem-se destacar a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial
(SEPPIR), a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH), a Secretaria Espe-
cial de Políticas para Mulheres (SPM) e a Secretaria Nacional de Juventude (SNJ).
Além desse novo arranjo institucional criado pelo Governo Lula, salientamos
que neste período foram feitas algumas alterações na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996), conhecida como LDB que contempla
a questão da diversidade, tais como: a Lei nº 10.639/2003 que alterou a Lei nº
9.394/1996 (LDB) e tornou obrigatório no currículo oficial da rede de ensino a
temática História e Cultura Afro-Brasileira e, posteriormente, a Lei nº 11.645/2008
que modificou a Lei nº 10.639/2003, incluindo no currículo oficial da rede de
ensino, além da obrigatoriedade da temática ‘História e Cultura Afro-Brasileira’,
as questões da ‘história e cultura indígena’. Por fim, ainda em se tratando das alte-
rações da LDB, é importante destacar que a Lei nº 12.796/2013 altera o artigo 3º
daquela, através da inclusão do Inciso XII, que estabelece a “consideração com a
diversidade étnico-racial”.
Igualmente, destacamos ainda outros documentos oficiais que tratam da
questão da diversidade e que obrigam as escolas a tratar desta temática; são eles:
o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos de 2007, as Diretrizes Cur-
riculares Nacionais da Educação Básica de 2011, além dos dois documentos finais
das Conferências Nacionais de Educação realizadas em 2010 e 2014, sendo que
a de 2010 tinha como foco a discussão e elaboração do novo Plano Nacional de
Educação (PNE). Ainda que o PNE 2014-2024 (Lei Nº 13.005/2014) assim como
muitos planos estaduais e municipais tenham negligenciado temas como gênero,
étnico-raciais e de sexualidade, é fundamental discutir todas as questões que en-
volvam a diversidade.
O grande desafio da política educacional está em uma das acepções mais
contraditórias, que é a de como tornar compatível a igualdade entre todos na edu-

3 De acordo com Rossi (2016), a SECADI já teve a denominação SECAD, quando a Secretaria de
Inclusão havia se tornado uma secretaria independente. Desde 2011, a Secretaria de Inclusão do
Ministério da Educação voltou a ser uma pasta da secretaria SECAD, retornando à denomina-
ção original SECADI.

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134 A experiência da sala-ambiente “Tópicos Especiais”

cação com o reconhecimento da diversidade social e cultural. Sacristán (2002, p.


24) afirma que “a exigência de respeitar a diversidade como um direito pode servir
para encobrir a manutenção de certos privilégios para alguns que se transformam
em desigualdade para outros”. As políticas públicas, em especial as políticas educa-
cionais, geralmente orientam-se por princípios monoculturais – que desconsideram
a diversidade sócio-étnico-cultural –, sendo pensadas para sujeitos descolados das
suas bases reais.
As escolas e suas práticas, assim como as políticas educacionais, não estão
livres dos estigmas e preconceitos que prevalecem na sociedade. Elas, em parte,
produzem e reproduzem modelos e tipos ideais de aluno, de sujeito, de sociedade
e tendem, muitas vezes, a desconsiderar a diversidade, dando o mesmo tratamen-
to igual a todos, o que, em certa medida, iguala a diversidade e desconsidera as
particularidades.
Ainda que seja complexo pensar em conciliar políticas educacionais levan-
do em consideração as características específicas dos diferentes grupos sociais e
desiguais entre si, “o não reconhecimento das diversidades sociais determina em
que esses grupos ficam excluídos dos centros de decisão por questões econômicas
e culturais” (CAPELO, 2003, p. 119).
Feitas essas breves considerações acerca da diversidade, passamos agora a apre-
sentar a experiência que foi trabalhar com essa questão na sala “Tópicos Especiais”.

ANÁLISES SOBRE OS AVANÇOS E LIMITES DA


SALA-AMBIENTE “TÓPICOS ESPECIAIS”

Nesta seção apresentaremos algumas análises sobre o desenvolvimento da


sala, baseada nas reflexões dos dez docentes que nela atuaram. Essas análises têm
como ponto de partida o relato dos mesmos sobre suas experiências ao longo do
desenvolvimento da sala, principalmente sobre os fatos ocorridos no encontro
presencial que cada um realizou.
A atividade presencial teve como objetivo inicial confrontar o aluno com casos
reais que acontecem dentro de escolas brasileiras. Para tanto foram apresentados
três casos para serem debatidos.
O primeiro caso foi sobre o racismo que, conforme relato de uma família que
teria sua filha matriculada em uma escola de educação infantil, durante uma festa
junina escolar, a menina dançou quadrilha com um menino branco. O relato mostra
que a avó do menino sentiu-se incomodada com a situação e insultou a menina
na frente dos colegas. O segundo caso foi o de uma aluna transexual proibida de
usar o banheiro feminino. A família entrou na justiça para que a aluna usasse o
banheiro feminino. O terceiro e último caso foi de estudantes indígenas expulsos de
uma escola pública estadual sendo ofendidos ao serem chamados de sujos e fedidos.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 135

A dinâmica do encontro presencial, a partir da discussão de casos concretos,


foi importante, pois muitos cursistas reconheceram naqueles casos suas próprias
vivências escolares. Evidentemente alguns casos não faziam parte de suas realidades,
mas provocaram a reflexão e o debate sobre qual é o papel da escola na formação
do pensamento crítico dos seus alunos e sobre a importância de abordar temas
dessa natureza, mesmo não estando presentes no cotidiano escolar, mas sim na
sociedade em geral. Isso fica evidente no relato de uma docente que atuou em um
polo de ensino à distância, localizado na região central do Estado.

[...] O ponto cego constatado na sala foi a questão étnico-racial negra. A


maior parte dos/das cursistas passou ao largo da temática, justificando-o
por uma suposta ausência de alunos/as negros/as em sua escola. (Fonte:
relato do professor A, 2016)

É importante ressaltar que uma das questões que suscitaram o debate foi a de
que a maioria dos alunos entende que todos são respeitados na escola, pois são tra-
tados de maneira igual. Abordar as questões da universalidade e das singularidades
foi um desafio, mas pensamos que ao final do encontro alguns cursistas conseguiram
revisitar certos conceitos e práticas escolares e saíram, em certa medida, com outro
olhar sobre o tema da diversidade.
Para tratar dos limites e possibilidades dos objetivos propostos pela sala, a dis-
ciplina conseguiu estabelecer a discussão em torno das chamadas minorias sociais.
Dentro dos limites, destacamos a resistência dos alunos e alunas em trabalhar com
as temáticas de valorização da diversidade, pois partem do pressuposto de que a
comunidade escolar é um todo homogêneo.
Os docentes trouxeram casos exemplares envolvendo alunos negros, como a
sua exclusão de concursos de beleza na escola. Em uma abordagem progressiva-
mente aprofundada, passamos a “construir a existência” de alunos/as, funcionários/
as negros/as nessas escolas e a problematizar essa presença. Foi muito potente a
constatação de que o discurso da inexistência de alunos/as “negros de verdade”,
como referiam os/as professoras cursistas, na verdade os protegia comodamente
de abordar a diferença racial e de enfrentar o desafio de construir educação antir-
racista em sala de aula. Descobrirem-se como acobertadores da diferença para não
enfrentá-la, e mais, como potenciais agentes de preconceito em sua banalização das
diferenças raciais, foi uma reflexão importante que resultou do encontro.
Também mereceu espaço a construção do entendimento de que, como
professores/as, não estamos sozinhos no enfrentamento de crimes envolvendo
injúria racial, discriminação ativa, até lesão corporal advinda de preconceito, e que
devemos ativar as redes institucionais de proteção, como o Ministério Público e o
Conselho Tutelar.
Notamos algumas resistências em relação às temáticas da diversidade cultural,
mas, sobretudo, interesse genuíno por parte da maioria em aprender mais sobre o

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136 A experiência da sala-ambiente “Tópicos Especiais”

tema. Muitas intervenções, apontando casos problemáticos em suas próprias escolas


– envolvendo alunas transexuais e homoafetividade, principalmente, – buscavam
socializar preocupações em busca da melhor abordagem.
Outra situação bastante discutida foi a existência de banheiros para os tran-
sexuais. Na concepção de alguns cursistas isso iria gerar perversão, assédio, etc. E,
nesses casos, surgiu a versão de que uma escola solucionou a questão excluindo
ainda mais o aluno, ao indicar-lhe o uso do banheiro da sala dos professores, ou
até mesmo permitindo sua saída para utilização do banheiro em sua própria casa.
Alguns docentes da sala relataram que as alunas, ao final do encontro presen-
cial, destacaram que se essa disciplina tivesse ocorrido no início do Curso, teriam
abordado temáticas relacionadas à diversidade no Trabalho de Conclusão de Curso.
Isso ficou evidente no relato dos docentes de quatro dos dez polos de ensino à dis-
tância, organizados para o atendimento de cursistas de diferentes regiões do estado.
Mesmo vivendo em um mundo em que a informação leva frações de segundos
para rodar o planeta, ainda temos preconceito muito grande em trabalhar com a
diferença. E, se olharmos para nós mesmos e percebermos que somos diferentes
uns dos outros, veremos que isso também causa desconforto nas pessoas. Devemos,
portanto, ressaltar que essa diferença é que nos faz ricos e únicos. E cabe à escola o
papel de abrir caminhos e fomentar esta discussão livre de quaisquer tipos de pre-
conceito e com Projeto Político-Pedagógico que dê conta de abordar estas questões
incluindo a todos e a todas, construindo um pensamento crítico e transformador.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Ficou evidente para a equipe docente que trabalhou na sala-ambiente “Tópicos


Especiais” que as cursistas carecem de formação continuada, principalmente em
relação ao tema abordado. De maneira geral, pode-se afirmar que foi cumprido
o objetivo da sala, no momento em que possibilitou confrontar as cursistas com
casos reais que acontecem dentro de escolas brasileiras, provocando a discussão
em torno da diversidade. Fato que comprova tal afirmação foi o de que muitas das
alunas repensaram a ideia de diversidade, tida, até então, como sendo apenas a
inclusão de pessoas com necessidades especiais na escola.
Tendo em vista o período em que a sala-ambiente ocorreu, bem como por se
tratar da sala com a segunda menor carga horária do Curso, não foi nossa pretensão
propiciar um aprofundamento teórico sobre a temática. A ideia inicial sempre foi
a de proporcionar uma aproximação ao tema, uma provocação e reflexão sobre as
questões que permeiam a diversidade no ambiente escolar.
Neste sentido, a sala-ambiente “Tópicos Especiais”, quando tratou da temática
da diversidade, contribuiu para que elas não somente se aproximassem do tema,
mas também provocou uma mudança de postura nas suas práticas pedagógicas.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 137

Espera-se que, a partir da experiência vivida pelas coordenadoras pedagógicas


participantes do Curso, sejam desveladas todas as situações de preconceito e discri-
minação, por questão de gênero, étnico-racial, de sexualidade, de classe, geracional,
etc. Que o silêncio não seja mais uma prática, e que escolas, coordenadores peda-
gógicos, equipe diretiva, alunos, pais e comunidade, respeitem todas as diferenças.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: MEC, 1996.


___. Lei nº 10.639/2003. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretri-
zes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatorie-
dade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências.
___. Lei nº 9.394/2013. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes
e bases da educação nacional, para dispor sobre a formação dos profissionais da educação e dar
outras providências.
CAPELO, Maria Regina Clivati. Diversidade sociocultural na escola e a dialética da exclusão/in-
clusão. In: GUSMÃO, Neusa Maria Mendes de (Org.). Diversidade cultural e educação: olhares
cruzados. São Paulo: Biruta, 2003. p. 107-134.
LIONCIO, Tatiana; DINIZ, Debora (Org.). Homofobia, silêncio e naturalização: por uma narrativa
da diversidade sexual. In: ___. Homofobia e Educação: um desafio ao silêncio. Brasília, Letras Livres,
Ed.UnB, 2009.
FARENZENA, Nalú; ROSSI, Alexandre José; MAFASSIOLLI, Andreia. Educação básica e diversi-
dade: cidadania, políticas públicas e legislação. In: CAREGNATO, Célia Elizabete; BOMBASSARO,
Luiz Carlos (Orgs.). Diversidade cultural: viver diferenças e enfrentar desigualdades na educação.
Erechim: Novello e Carbonelli, 2013. p. 129-154.
GUSMÃO, Neusa Maria Mendes de (Org.). Diversidade cultural e educação: olhares cruzados. São
Paulo: Biruta, 2003.
ROSSI, Alexandre José. As Políticas de Diversidade na Educação: uma análise dos documentos fi-
nais das CONAEs, DCNs e PNE. 2016. 179 f. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-
-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Porto Alegre, 2016.

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Livro Coordenação Pedagógica.indb 138 22/10/2018 14:27:26
Algumas reflexões sobre a 1 0
sala-ambiente “Metodologia
Do Trabalho Científico”

Caterine Vila Fagundes


Natália de Lacerda Gil

As análises que buscam alternativas para melhorar a qualidade da escola


brasileira indicam invariavelmente, embora não exclusivamente, a importância
do investimento na formação dos professores. Um dos desafios dessa formação
é equacionar a relação entre teoria e prática, seja na formação inicial, seja na
continuada. Entendidas frequentemente como domínios distintos, teoria e prá-
tica adquirem maior inteligibilidade na docência se assumidas como dimensões
distintas e complementares de um mesmo processo. Isso corresponde a afirmar
que ambas são essenciais na atuação dos professores e, mais do que isso, precisam
estar articuladas e igualmente valorizadas na formação desses profissionais. Nesse
sentido é que importa enfatizar o aspecto propriamente epistemológico da prática
pedagógica e insistir na pertinência da pesquisa como ação cotidiana na escola.
A pesquisa pode, no entanto, aqui ser compreendida de diferentes maneiras.
Evidentemente, a pesquisa acadêmica, que produz continuamente novos conhe-
cimentos teóricos em várias áreas concernentes ao processo educativo é muito
relevante na medida em que amplia o repertório de uma área e põe à disposição
dos profissionais da educação novos saberes. Mas a pesquisa também pode se
desenvolver no espaço da escola, seja em colaboração com a produção do campo
acadêmico, seja como recurso capaz de levar o professor a um processo constante
de reflexão sobre a sua prática. Quase sempre reputada como menos importante,
esta última dimensão apontada tende a ser decisiva para que o professor constitua
sua identidade, fortaleça sua autonomia e seja capaz de buscar e conduzir processos
próprios que considere relevantes para sua contínua formação.
A proposição parece plena de coerência se pensamos nas demandas e desafios
específicos da escola, no entanto, enfrenta a desconfiança de que assim se produza
um saber “menos importante”. António Nóvoa (1997) ressalta que
É forçoso reconhecer que a profissionalização do saber na área das Ciências da
Educação tem contribuído para desvalorizar os saberes experienciais e as práticas
dos professores. A pedagogia científica tende a legitimar a razão instrumental: os

Livro Coordenação Pedagógica.indb 139 22/10/2018 14:27:26


140 Algumas reflexões sobre a sala-ambiente “Metodologia Do Trabalho Científico”

esforços de racionalização do ensino não se concretizam a partir de uma valorização


dos saberes de que os professores são portadores, mas sim através de um esforço para
impor novos saberes ditos “científicos”. A lógica da racionalidade técnica opõe-se
sempre ao desenvolvimento de uma práxis reflexiva (NÓVOA, 1997, p. 27).

Em parte, a política de formação, na qual se insere o Curso de Especializa-


ção em Coordenação Pedagógica do Programa Nacional Escola de Gestores da
Educação Básica, busca romper a lógica da racionalidade técnica ao propor aos
cursistas o desenvolvimento de uma pesquisa na escola em que atuam, a partir da
qual devem produzir um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Sendo assim, o
Projeto Político-Pedagógico do Curso determina que
o TCC será concretizado na elaboração de um estudo que culmine em uma proposta
de ação que articule a organização do trabalho pedagógico e a busca de um ensino-
-aprendizagem de qualidade na escola de educação básica onde atua o cursista. Essa
proposta de ação procurará, dentre outros aspectos, consolidar os fundamentos
teórico-práticos desenvolvidos ao longo do curso por meio dos conteúdos e ativi-
dades das salas-ambiente (BRASIL, 2009, p. 15).

A proposta é que, portanto, partindo da investigação da própria prática, os


coordenadores pedagógicos produzam compreensões mais abrangentes acerca dos
problemas que vivenciam no cotidiano.
Pensando nisso, o projeto do Curso elege prioritariamente a pesquisa-ação
como abordagem de pesquisa a ser seguida no desenvolvimento do TCC. A
pesquisa-ação demanda que o pesquisador intervenha em uma problemática bus-
cando uma transformação. Nessa metodologia, a pesquisa e a ação estão totalmente
relacionadas, conforme explicita Franco (2005)
Se alguém opta por trabalhar com pesquisa-ação, por certo tem a convicção de que
pesquisa e ação podem e devem caminhar juntas quando se pretende a transformação
da prática. No entanto, a direção, o sentido e a intencionalidade dessa transformação
serão o eixo da caracterização da abordagem da pesquisa-ação (FRANCO, 2005 p.
485).

A dificuldade, contudo, advém do fato de que a formação em pesquisa desses


profissionais da escola é em geral exígua, não sendo suficiente, na maior parte dos
casos, para a adequada condução de uma pesquisa dessa natureza. Cabe distin-
guir, em primeiro lugar, a diferença que há entre a investigação da prática como
procedimento que visa sistematizar um saber da experiência e desenvolver nos
professores competências de reflexão sobre a própria prática, com ganhos evidentes
no aperfeiçoamento da atividade docente, e a investigação científico-acadêmica
que se desenvolve de acordo com as regras de uma comunidade de pesquisadores,
seguindo procedimentos metodológicos específicos, prevendo a necessidade da
revisão pelos pares. Ao apresentar essa distinção, não se pretende afirmar que uma

Livro Coordenação Pedagógica.indb 140 22/10/2018 14:27:26


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 141

é melhor ou mais importante que a outra, mas sim ressaltar que são atividades,
em alguma medida, diferentes, que seguem critérios epistemológicos distintos e
que têm, no limite, funções sociais também distintas. É evidente também que todo
professor pode se formar pesquisador e integrar essas comunidades acadêmicas,
produzindo conhecimentos a partir daqueles critérios. Ocorre que, para tanto, é
preciso um investimento longo e específico no sentido da formação do pesquisador,
que não é o mesmo tipo de investimento necessário para a formação do profissional
da educação. Nem melhor, nem pior, apenas não é de mesmo tipo.
A sala-ambiente “Metodologia do Trabalho Científico” (MTC) tinha no Curso
a função de prover saberes mínimos essenciais que permitissem aos cursistas o
desenvolvimento de uma pesquisa, mesmo que restrita, que aportasse elementos
para a escrita de um TCC. Essa tarefa, no entanto, não pareceu ser desempenhada
a contento no curto tempo a ela destinado. O Curso previa 60 horas do currículo
para essa formação, em atividades à distância, apartada do convívio com outros
pesquisadores, sem possibilidade de integração a comunidades acadêmicas (ida
a eventos, participação em seminários de pesquisa, etc.). Ora, a formação de um
pesquisador requer bastante mais do que o proposto no Curso. E sem uma prévia
formação sólida em pesquisa, mostrou-se ainda mais difícil que os cursistas de-
senvolvessem o TCC seguindo a abordagem da pesquisa-ação. Aquilo que deveria
ser elemento facilitador no desenvolvimento da pesquisa por pessoas que não têm
nenhuma experiência em pesquisa1 foi afinal o que tornou quase sempre inviável
o propósito. Por se tratar de profissionais da ação, que sabem fazer suas atividades
cotidianas na escola, que sabem indicar objetivos pedagógicos e propor as ações
para sua execução – e que, em contrapartida, não têm experiência em pesquisa
acadêmica, os cursistas, muito frequentemente, confundiam a pesquisa-ação com
o planejamento de ensino. O distanciamento necessário para, a partir da própria
prática, produzir novos conhecimentos – como os requeridos no formato de TCC
proposto no Curso – era muito dificilmente obtido. Acrescentem-se a isso a falta
de tempo para dar continuidade à formação no âmbito do próprio Curso, a im-
possibilidade de integrar os cursistas amplamente nas atividades da universidade,
o fato de que esses profissionais mantivessem toda a carga horária de trabalho
(às vezes mais do que 40 horas semanais) durante a participação no Curso. Esses
aspectos conjugados inviabilizavam uma proposição formativa mais densa, seja
para a atuação profissional, seja para a pesquisa.
A pergunta, nesse caso, talvez devesse ser: por que se considera que um TCC
nos moldes acadêmicos é, de fato, um bom produto final em cursos de formação
docente? Ao que parece, apesar da intenção de incorporar a investigação na for-
mação do professor, sugerindo uma concordância com as proposições de formação
do professor como profissional reflexivo, mantém-se a ideia da superioridade do

1 Na verdade, alguns cursistas tinham experiência de pesquisa acadêmica, por já terem feito
Mestrado ou por estarem em cursos de Mestrado ou Doutorado.

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142 Algumas reflexões sobre a sala-ambiente “Metodologia Do Trabalho Científico”

saber acadêmico em detrimento do saber da experiência. Não seria o caso de pensar


em outros formatos, mais conformes à especificidade do saber que se produz na
atuação prática nas escolas? A ausência de linguagem acadêmica, a falta de revisão
da literatura, uma escrita sem introdução, capítulos e considerações finais, fazem
os outros saberes menos relevantes?
Além disso, o formato proposto – TCC – remete a uma lógica acadêmica e,
como tal, muito individualizada. O TCC é o produto de uma investigação individual
mediada pelas leituras e recomendações de um orientador apenas, não engaja os
profissionais da escola em ações coletivas de formação no âmbito da própria escola.
Tampouco pressupõe troca de saberes, já que tanto o profissional da escola, quanto
o profissional da Universidade não chegam a se envolver um com o fazer do outro.
Nesse sentido, é pertinente a crítica de António Nóvoa (1997, p. 26-27), que nos
faz pensar o quanto permanece de racionalidade técnica, afinal, nessas propostas
de formação de professores ancoradas na pesquisa.
Práticas de formação contínua organizadas em torno dos professores individuais
podem ser úteis para a aquisição de conhecimentos e de técnicas, mas favorecem
o isolamento e reforçam uma imagem dos professores como transmissores de um
saber produzido no exterior da profissão. Práticas de formação que tomem como
referência as dimensões colectivas contribuem para a emancipação profissional e para
a consolidação de uma profissão que é autônoma na produção dos seus saberes e
dos seus valores (NÓVOA, 1997, p. 26-27).

FUNCIONAMENTO DE MTC E TCC

A sala-ambiente “Metodologia do Trabalho Científico” (MTC), espaço cur-


ricular do Curso de Especialização em Coordenação Pedagógica (2015-2016) do
Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica, da Secretaria da Edu-
cação Básica do Ministério da Educação (SEB/MEC), oferecido pela Faculdade de
Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (FACED/UFRGS), apre-
sentava como característica principal sua transversalidade, uma vez que pretendia
perpassar os demais componentes curriculares desembocando na orientação do
TCC. Sendo assim, essa sala-ambiente, que permaneceu aberta até o final do Curso,
teve como objetivo principal conduzir o processo que culminaria na escrita do TCC.
Ou seja, em lugar de apresentar genérica e amplamente questões metodológicas
sobre o trabalho científico, optou-se, com o propósito de que os orientadores e cur-
sistas dispusessem de tempo e condições suficientes para dedicação aos TCC, por
centrar atenção em aspectos diretamente vinculados à produção do trabalho final.
A sala MTC foi constituída por turmas de até 47 cursistas, em cada um dos dez
polos, cada turma dispondo de dois professores. No momento da elaboração dos

Livro Coordenação Pedagógica.indb 142 22/10/2018 14:27:27


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 143

TCC, as turmas foram divididas, cada professor ficando responsável por orientar
metade dos cursistas. Assim, o trabalho de coordenação da sala MTC e, posterior-
mente, do desenvolvimento dos TCC, atribuição das autoras deste artigo, significou
acompanhar vinte professores no desenvolvimento de suas atividades de docência
e orientação. Tais atividades engendravam processos organizacionais diversos com
vistas ao desenvolvimento das variadas tarefas referentes às ações que permitem
o bom andamento de uma sala-ambiente, constituindo-se em trabalho complexo,
que demandava tarefas e competências diversas. Embora se pudesse contar com o
apoio de outras pessoas envolvidas na organização do Curso – responsáveis pela
execução financeira, pelo funcionamento do MOODLE, pela comunicação com
as Assistentes Presenciais de cada polo de ensino à distância, pelo controle da
frequência dos cursistas, etc. – as tarefas pedagógicas e logísticas de MTC e TCC
excediam o razoável para apenas uma pessoa assumir2. Assim, com o propósito de
melhor orientar os professores para o desenvolvimento das atividades previstas,
os trabalhos de coordenação da sala MTC foram divididos em uma parte mais
voltada às questões pedagógicas e outra que se voltou prioritariamente às questões
referentes à logística e organização prática da sala e, posteriormente, do TCC, com
o propósito de conferir fluência às demandas dos professores.

A ORGANIZAÇÃO DA SALA EM MÓDULOS

O trabalho docente3 requer, para além da dedicação cotidiana ao fazer peda-


gógico, momentos de reflexão sobre esse fazer. Esse objetivo formativo impõe rever
teorias, conhecer outras, elaborar e desenvolver projetos por elas inspirados. Por
essa razão, propusemos os módulos da sala MTC4 como etapas sequenciais que,
concomitantemente ao desenvolvimento das atividades de estudo propostas pelas
demais salas do Curso, pudessem contribuir na construção de um percurso de
formação relevante, sem perder de vista a necessidade de se chegar, ao final, à pro-
dução de um TCC capaz de apresentar publicamente os resultados desse processo.
A comunicação com os professores da sala MTC ocorreu principalmente por
e-mail, mas foram feitas algumas reuniões com as duplas de professores de cada
polo, ou com pequenos grupos de professores, e encontros individuais (no período

2 Inicialmente a coordenação da sala MTC foi entregue a Natália Gil que, sendo professora do
quadro efetivo da UFRGS, não podia se dedicar integralmente às atribuições deste Curso. As-
sim, logo no início do processo, convidou Caterine Fagundes, que na ocasião realizava estágio
de pós-doutorado na instituição, a assumir conjuntamente a função de coordenação.
3 Cabe dizer que se assume aqui a compreensão de que as funções de gestão escolar são parte do
trabalho docente.
4 A cada módulo, havia leituras obrigatórias aos cursistas, uma ou duas tarefas que eles deveriam
produzir e postar na plataforma do Curso, além de um encontro presencial no polo de Ensino à
distância.

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144 Algumas reflexões sobre a sala-ambiente “Metodologia Do Trabalho Científico”

especificamente de orientação dos TCC). Além disso, foram realizadas duas reuni-
ões com todo o grupo para planejamento dos encontros presenciais dos Módulos
III e IV. Em cada um desses momentos, buscava-se o exercício da reflexão sobre
a ação em face do trabalho desenvolvido, bem como a tomada de decisão coletiva
sobre os desdobramentos das atividades. Nesse sentido, adotamos, na medida do
possível, uma dinâmica dialógica com os vinte professores distribuídos nos dez
polos regionais.
Os conteúdos gerais presentes em cada módulo, bem como o desenvolvimento
das atividades nos Módulos I e II foram decididos pelas coordenadoras da sala
MTC. Assim, inicialmente, delineamos as temáticas desenvolvidas pelos professores
com os cursistas no primeiro encontro e como se desenvolveriam, em linhas gerais,
os demais, que visavam diretamente à elaboração do TCC. Ainda, definimos que
nos encontros subsequentes os professores da sala MTC orientariam os cursistas
sobre a metodologia e os encaminhamentos da pesquisa com o propósito de dar
efetivamente início ao desenvolvimento do TCC, no que concerne às leituras e
coleta de dados de pesquisa. Em linhas gerais, no primeiro Módulo discutiu-se
a questão do processo de produção da pesquisa educacional e suas implicações
éticas. No segundo Módulo, propusemos a apresentação, por parte dos cursistas,
das definições da pesquisa que pretendiam realizar. No terceiro e quarto Módulos,
trabalhamos questões referentes às possibilidades de análise dos dados de pesquisa
e aspectos da escrita do TCC, no que se refere à forma. A seguir tem-se o detalha-
mento do trabalho realizado.

Módulo I

O Módulo I, de acordo com as orientações, iniciou-se com a apresentação


das pessoas envolvidas, a apresentação do funcionamento da sala MTC – com a
discussão do que é pesquisa em educação –, ressaltando alguns conceitos básicos,
com a focalização das características da pesquisa-ação e com a discussão da ética
na pesquisa.
Definimos que o primeiro encontro presencial seria aproveitado pelos cursistas
se ocorresse nos primeiros dias de abertura da sala e se houvesse uma exposição/
discussão sobre a ética na pesquisa, destacando as questões de cópia, citação e plá-
gio. Nesse encontro também foi proposta a reflexão sobre a atuação dos cursistas
tanto como coordenadores pedagógicos quanto como pesquisadores na mesma
escola, com o intuito de ressaltar, para o desenvolvimento adequado do trabalho,
a especificidade dos dois papéis desempenhados concomitantemente por cada um
dos cursistas. Para tratar dos temas que seriam trabalhados no primeiro encontro,
sugerimos alguns textos e uma matéria de jornal que abordava a questão do plágio,
com o propósito de dar início às discussões sobre ética na pesquisa.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 145

Ao final do encontro presencial, solicitou-se aos cursistas uma breve reflexão


individual escrita sobre as impressões e aprendizagens nesse primeiro encontro.
Salienta-se que foi solicitada uma produção desse tipo ao final de cada encontro,
sempre por escrito, sobretudo para comprovar a presença dos alunos. Como tarefa
a ser postada na plataforma do Curso, os cursistas produziram uma breve análise
discutindo os textos sugeridos sobre ética e plágio na pesquisa.

Módulo II

No Módulo II, a orientação aos professores foi realizada em reunião onde


se propôs que orientassem os cursistas a iniciarem o desenvolvimento do TCC,
produzindo uma definição preliminar sobre o tema, sobre como surgiu a ideia de
pesquisar tal tema e outros elementos pertinentes à elaboração do trabalho. Sobre
os temas de pesquisa, orientou-se que se incentivassem os cursistas a encontra-
rem soluções para articular os interesses pessoais à investigação sobre a atuação
do Coordenador Pedagógico. A intenção da atividade proposta no Módulo II foi
permitir a reflexão sobre os elementos que estruturam uma investigação e avançar
nas definições das pesquisas desenvolvidas pelos cursistas. Para avaliar este Módulo,
solicitou-se, além da reflexão escrita ao final do encontro presencial, a leitura do
material referente à produção da pesquisa em educação e também a leitura de um
texto referente à metodologia da pesquisa-ação. Além disso, os cursistas indicaram,
em uma página, as definições pretendidas para a pesquisa de TCC e postaram na
plataforma do Curso.

Módulo III

No Módulo III, para o qual também se realizou uma reunião geral com os
professores, definiu-se como necessário problematizar a empiria, ou seja, a neces-
sidade incontornável, para o desenvolvimento do TCC, de produzir informações
novas e originais, na escola em que os cursistas estivessem atuando. Também foi
importante discutir e orientar sobre a necessidade de autorização para realização
das pesquisas nas escolas e a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Es-
clarecido, quando pertinente. Discutiram-se ainda procedimentos metodológicos
a partir da leitura prévia dos textos disponibilizados na plataforma do Curso e
questões sobre a tabulação e análise dos dados de acordo com cada instrumento de
coleta escolhido. O objetivo principal foi tratar com os cursistas como se faz a parte
empírica da pesquisa. Para avaliar o Módulo III, solicitou-se o desenvolvimento
das propostas de pesquisa a partir das orientações individuais e a elaboração dos
instrumentos de coleta de dados (questionário, entrevista ou roteiro de observação).

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146 Algumas reflexões sobre a sala-ambiente “Metodologia Do Trabalho Científico”

Módulo IV

Finalmente, o Módulo IV destinou-se a problematizar a escrita do TCC bem


como o formato do mesmo. Em reunião com todo o grupo de professores, ficou
definido que o encontro presencial aconteceria em quatro momentos, sendo eles:
(1) apresentação e discussão da estrutura do TCC, realizada juntamente a uma
discussão acerca do cronograma de execução do TCC; (2) apresentação da im-
portância do uso da linguagem acadêmica na escrita do trabalho; (3) orientação
sobre como realizar o levantamento dos autores/textos que se pretendem ler sobre
o tema escolhido a partir do Scielo, o Google Acadêmico e na plataforma Lattes/
CNPq e (4) avaliação presencial nos 20 minutos finais, consistindo em uma escrita
de autoavaliação do processo de aprendizagem nesses quatro módulos a partir da
retomada das escritas anteriores.
A avaliação do Módulo IV ocorreu a partir da postagem de duas tarefas no
período em que a sala esteve aberta: um cronograma pessoal de desenvolvimento
do TCC e a listagem dos referenciais teóricos propostos em consonância com os
temas escolhidos.

A elaboração dos TCC

Após a segunda recuperação do Curso, iniciou-se propriamente a escrita do


TCC. Neste momento, abriu-se uma nova sala no MOODLE com espaços especí-
ficos para postagem das versões preliminares do TCC, postagem da apresentação e
postagem da versão final. Nessa etapa, os professores-orientadores (com exceção dos
que são docentes do quadro efetivo da UFRGS) foram atendidos individualmente
por uma das coordenadoras, para que fosse possível discutir sobre os casos especí-
ficos e as eventuais dificuldades de cada um. Nesse momento, puderam expor suas
dúvidas sobre como proceder em relação às orientações dos trabalhos das cursistas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Propusemo-nos, nesta seção, refletir sobre o funcionamento da sala-ambiente


“Metodologia do Trabalho Científico”, ressaltando as possibilidades e alguns limites
do curso EaD para a formação reflexiva de coordenadores pedagógicos. Esse exer-
cício foi realizado levando-se em conta as potencialidades do exercício reflexivo
na formação dos cursistas (coordenadores pedagógicos de escolas públicas do Rio
Grande do Sul, que frequentaram esse Curso).
Sobre a pesquisa na formação docente, ressaltamos que pode ter por finalidade
a produção de conhecimentos na área de educação, mas pode também servir – sem
demérito por isso – muito mais na medida em que instrumentaliza o professor ao

Livro Coordenação Pedagógica.indb 146 22/10/2018 14:27:27


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 147

distanciamento de sua prática, à análise das situações cotidianas, à busca de soluções


pautada em procedimentos sistemáticos. Nesse sentido, questiona-se o formato
proposto pelo Curso, como produto final, uma vez que os processos formativos,
todos, requerem um “demorar-se” que não se encontra previsto neste Curso nem
na maior parte das opções de formação contínua de professores da atualidade. O
foco não parece estar, de fato, nas necessidades de formação dos sujeitos – vários
dos quais, aliás, já muito familiarizados com essa lógica, fazem um curso de espe-
cialização em seguida de outro. Considera-se preciso fazer rápido, para contingentes
amplos de cursistas, garantindo-se logo alguma certificação.
Por outra parte, o processo de formação dos professores-orientadores
mostrou-se desafiador na medida em que as demandas eram apresentadas às
coordenadoras. Ao mesmo tempo em que o planejamento buscava dar conta de
grande parte dos objetivos gerais de orientação aos professores, surgiam dúvidas e
a necessidade de encaminhamentos diversos. Esse objetivo foi plenamente atingido,
a saber, através de reuniões individuais com cada professor formador, momento
no qual demonstravam segurança para a tarefa de orientação dos TCC. Isso impõe
reconhecer que o trabalho de coordenação das salas-ambiente, longe de ser um
procedimento massificado e automático, requer muito frequentemente a disponi-
bilidade para orientar cada professor individualmente.

REFERÊNCIAS

FRANCO, Maria Amélia Santoro. A Pedagogia da pesquisa-Ação. Educação e Pesquisa. Revista da


Faculdade de Educação da USP, São Paulo, v. 31, fascículo 3, p. 483-502, dez. 2005.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Programa Nacional Escola de Ges-
tores da Educação Básica Pública. Projeto Pedagógico do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em
Coordenação Pedagógica. Brasília, 2009.
NÓVOA, António. Formação de professores e profissão docente. In: NÓVOA, António (Org.). Os
professores e a sua formação. 3. ed. Lisboa: Publicações Dom Quixote/Instituto de Inovação Educa-
cional, 1997. p. 15-33.

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Parte II

RELATOS –
PROJETOS DE AÇÃO

Livro Coordenação Pedagógica.indb 149 22/10/2018 14:27:27


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Formação continuada de 1 1
coordenadores pedagógicos:
reflexões sobre as temáticas
dos trabalhos de conclusão

Julliana Cunha Alves


Maria Goreti Farias Machado

INTRODUÇÃO
A formação continuada dos profissionais da educação está prevista Lei de
Diretrizes e Bases de Educação Brasileira – LDBEN (Lei Nº 9.394/1996) e também
reafirmada em normas posteriores, tais como, a Lei nº 13.005/2014, do Plano Na-
cional de Educação (PNE). Este plano estabelece nas metas 15 e 161 a valorização
dos profissionais da educação através da formação inicial e continuada. No Plano
antecessor, Lei nº 10.172/2001 (PNE/2001), já constavam as diretrizes e metas para
a formação e valorização do magistério e demais profissionais da educação através
de políticas voltadas, simultaneamente, para “a formação profissional inicial, as
condições de trabalho, salário e carreira e a formação continuada”.
Contudo, o debate mais contundente acerca da valorização dos trabalha-
dores em educação remonta ao ano de 1993, através da Confederação Nacional
dos Trabalhadores em Educação (CNTE) que a coloca como pauta de luta e no
mesmo patamar das reivindicações salariais2 (WEBER, 2015, p. 503). Desde então
os esforços pela valorização dos profissionais da educação vieram num crescente,
colocando na agenda pública a necessidade de políticas para a carreira e a formação
dos docentes da educação básica. Parte deste esforço foi atendida com a expansão
do ensino superior público e a oferta de cursos de formação inicial e continuada
por todo o país.
1 Meta 16: formar, em nível de pós-graduação, 50% (cinquenta por cento) dos professores da edu-
cação básica, até o último ano de vigência deste PNE, e garantir a todos(as) os(as) profissionais
da educação básica formação continuada em sua área de atuação, considerando as necessidades,
demandas e contextualizações dos sistemas de ensino.
2 Fórum Permanente de Valorização do Magistério e da Qualidade da Educação e Pacto de Valo-
rização do Magistério e da Qualidade da Educação, em outubro de 1994.

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152 Formação continuada de coordenadores pedagógicos

Tem-se, assim, o reconhecimento de que a efetivação da valorização docente impli-


ca um conjunto articulado de políticas de formação inicial, formação continuada
(a ser executada em associação com as diversas esferas de governo e as instâncias
formadoras) e políticas de carreira, remuneração, condições de trabalho, de respon-
sabilidade dos sistemas de ensino, que requerem simultaneidade de ação, para que
possam produzir melhorias substantivas no sistema educacional do país. (WEBER,
2015, p. 510)

Na última década, o governo federal, através do Ministério da Educação


(MEC), realizou importante investimento em políticas de formação docente e
demais profissionais da educação. No âmbito do Plano de Desenvolvimento da
Educação (PDE) e da mobilização da melhoria da educação básica e fortalecimentos
dos sistemas de ensino, a Secretaria da Educação Básica – SEB/MEC implementou
políticas descentralizadas em parceria com os entes federados por meio de Insti-
tuições de Ensino Superior (IES). A parceria contou também com a participação
de entidades nacionais do campo da educação3.
Neste contexto foram criados programas de formação docente, dentre eles, dois
voltados para a gestão da escola, através de formação continuada para os diretores
e equipes da coordenação pedagógica de escolas públicas. O Programa Nacional
Escola de Gestores da Educação Básica4 foi constituído por dois cursos de espe-
cialização: Curso de Especialização em Gestão Escolar e Curso de Especialização
em Coordenação Pedagógica.
O curso em Coordenação Pedagógica foi ofertado pela Universidade Federal
do Rio Grande do Sul (UFRGS) em duas edições (2012/2013 e 2015/2016), destinado
à formação lato sensu das equipes de coordenação pedagógicas das redes públicas
de ensino (municipal e estadual). O compromisso da universidade com a formação
docente está fundamentado no direito à educação como princípio inviolável e na
defesa da valorização profissional como uma das garantias para a educação básica
de qualidade. Deste modo, dentre outros objetivos apontados no projeto acadêmico,
o curso pretendeu “promover a integração dos conhecimentos sobre os processos
de gestão e organização do trabalho educativo com discussões e reflexões sobre a
prática pedagógica à luz de um referencial teórico-metodológico fundamentado
na perspectiva crítico-transformadora” (UFRGS, 2012; 2014).
Ainda, conforme a proposta do Programa Nacional Escola de Gestores da
Educação Básica, o curso teve como objetivos:

3 Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES),
Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação (ANPED), Associação Nacio-
nal de Política e Administração da Educação (ANPAE), Fórum de Diretores de Faculdades de
Educação (FORUNDIR), União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME) e
Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED).
4 O Programa compõe o Plano de Metas “Compromisso Todos pela Educação” e integra o Plano
de Desenvolvimento da Educação (PDE)

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 153

• Formar, em nível de especialização (lato sensu), gestores educacionais


efetivos das escolas públicas da educação básica, incluídos aqueles de
educação de jovens e adultos, de educação especial e de educação pro-
fissional.
• Contribuir com a qualificação do gestor escolar na perspectiva da gestão
democrática e da efetivação do direito à educação escolar com qualidade
social. (SEB/MEC/2009).
O curso foi ofertado na modalidade de ensino à distância. Os requisitos para
os docentes participarem do curso foram os de atuar na equipe de coordenação pe-
dagógica ou na coordenação de projetos na escola; ter concluído curso de pedagogia
ou demais licenciaturas; pertencer à rede de ensino pública; ter disponibilidade de
pelo menos 10 horas semanais para os estudos e disponibilidades para encontros
presenciais previstos no cronograma do curso. Deste modo, o curso possibilitou
uma articulação dos estudos com o fazer pedagógico.
Os princípios norteadores deste curso são de caráter político, ético e pedagógico
contemplando: o direito à educação; a gestão democrática; a formação continuada
crítica e promotora da identidade profissional; a articulação teoria-prática; a inte-
gração dos elementos curriculares (UFRGS, 2012; 2014).

O currículo foi estruturado em torno do eixo Organização do Trabalho Peda-


gógico. Para obter o título de especialista, além da avaliação processual ao longo do
curso, em cada uma das salas-ambiente do curso, os alunos produziram o Trabalho
de Conclusão de Curso (TCC), “concretizado na elaboração de um estudo que cul-
minou com uma proposta de ação articulando a organização do trabalho pedagógico
e a busca de um ensino-aprendizagem de qualidade na escola de educação básica
onde atua o cursista”. (UFRGS, 2012; 2014)
Este artigo apresenta uma reflexão acerca dos conteúdos explorados pelos
coordenadores pedagógicos nos respectivos TCC, da segunda edição do Curso
de Especialização em Coordenação Pedagógica, por meio de uma breve análise
dos campos de interesse manifestados pelos cursistas de acordo com as temáticas
escolhidas, conforme explicitado na próxima seção.

PROCEDIMENTOS PARA A ANÁLISE

O presente estudo oferece uma abordagem qualitativa sobre as escolhas realiza-


das pelos concluintes do Curso utilizando como procedimento a análise documental.
Partimos da premissa de que a pesquisa qualitativa tem sua ênfase no processo, pois
seu direcionamento surge no desenvolvimento da coleta de dados e informações.
Possibilita a formulação de ideias, conceitos e o estabelecimento de padrões a partir

Livro Coordenação Pedagógica.indb 153 22/10/2018 14:27:27


154 Formação continuada de coordenadores pedagógicos

dos dados analisados, devido à importância dos significados extraídos das informa-
ções coletadas. Tem um caráter exploratório para permitir familiarização, percepção
e entendimento das informações referentes ao objeto de estudo, abrindo espaço para
a interpretação dessas informações. (MACHADO, 2012, p. 26)
Em outro viés, o estudo caracteriza-se por uma pesquisa aplicada, pois pre-
tende caracterizar um contexto, uma realidade, observar comportamento de um
grupo. (RICHARDSON, 2007; SELIGER e SHOHAMY, 2001). Como fonte de
dados, analisamos os títulos e os objetivos dos duzentos e quarenta (240) TCC
concluídos, apresentados e aprovados para a obtenção do título de especialista em
coordenação pedagógica.
Os Trabalhos foram categorizados em vinte e cinco (25) temáticas. A orga-
nização do material foi realizada de forma analítica, a partir de leitura flutuante5,
constituindo-se de uma leitura prévia dos títulos e dos objetivos dos TCC. Deste
modo foi possível identificar as semelhanças temáticas. Por exemplo, trabalhos
cujos títulos evidenciassem aproximação com questões relacionadas ao papel da
escola hoje e suas formas de organização para o atendimento à demanda escolar
foram agrupados na temática: Função Social da Escola.
Seguindo a mesma lógica, foram organizadas outras vinte e quatro (24) temá-
ticas. Essa organização possibilitou a análise qualitativa do objeto deste estudo e a
formulação de algumas considerações levando em conta ao que o curso se propôs
nos seus objetivos, na sua organização curricular e nas orientações para escolha
escrita do trabalho final.

A APRENDIZAGEM NA FORMAÇÃO CONTINUADA À DISTÂNCIA

A educação à distância (EAD), mediada por ambientes virtuais de aprendiza-


gem (AVA) ainda é um desfio para os gestores das escolas públicas brasileiras. Parte
deste desafio se deve a falta de equipamentos adequados e de disponibilidade de
rede de internet qualificada, pois as redes de comunicação virtual ainda não são de
acesso universal. Muitas escolas não possuem equipamentos ou a conexão pela in-
ternet ainda é precária. Além disso, as tecnologias chegaram às escolas inicialmente
para os processos administrativos e de gestão. De outra parte, a formação inicial
dos profissionais que atuam nas escolas ocorreu, em sua maioria, na modalidade
presencial e não houve, desde então, experiências mais importantes ou formações
específicas utilizando AVA.
Reportando a teoria das aprendizagens significativas (MOREIRA E MASI-
NI,1982; MOREIRA, 1998), compreendemos que o indivíduo aprende a partir de
conexões entre o novo conteúdo e um conhecimento prévio já existente em sua

5 Na análise de conteúdo a leitura flutuante visa identificar os temas-chave, proporcionando ano-


tações e pistas de leitura posterior e definição das categorias.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 154 22/10/2018 14:27:27


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 155

estrutura cognitiva. É necessário que nos cursos EAD os docentes promovam ati-
vidades que considerem o perfil dos alunos e o conhecimento que vem na bagagem
de cada um. Deste modo, a aprendizagem ocorre a partir da problematização do
conhecimento prévio possibilitando a colaboração característica do mundo virtual
para fins de aprendizagem. Independentemente da modalidade de ensino, este
pressuposto é atual. O enfrentamento da realidade do público que frequentou o
Curso fez parte da aprendizagem não só dos cursistas, mas também dos docentes.
Na oferta da primeira edição realizada no âmbito da UFRGS do Curso de
Especialização e Gestão Escolar, também do Programa Nacional Escola de Gestores
da Educação Básica, em 2007, identificou-se como pré-requisito para realização
do curso a necessidade de preparar tanto os seus docentes quanto os gestores cur-
sistas na utilização das tecnologias e da educação mediada por ambientes virtuais
de aprendizagem. Passados dez anos desde então, o contexto das escolas públicas
não apresentou mudanças significativas relacionadas ao acesso dos profissionais
e alunos à internet6.
Contudo, as transformações ocorridas nas últimas décadas na formação
continuada de profissionais da educação com o uso das tecnologias de informação
e comunicação apontam que a modalidade tem sido cada vez mais utilizada nos
programas de formação profissional continuada. A EAD tem como mérito atingir
o maior número possível dos profissionais numa realidade em que a falta de tempo
e a distância são obstáculos para a formação.
A educação à distância responde à proposta de um modelo pedagógico alternativo,
que tem por objetivo abrir o acesso à informação aos que desejam aprender. Desde
que bem direcionada e com o apoio dos meios adequados, efetivamente pode con-
tribuir para vencer barreiras do acesso à educação, assumindo o papel desmobili-
zador de estratégias que viabilizem os princípios e fins da educação permanente,
por conseguinte, da formação continuada. (PEDROSA, 2003 p. 75).

Para Tarouco (2003, p. 43), as Tecnologias de Informação e Comunicação


(TIC) são “um caminho a ser explorado por todos os educadores preocupados
e compromissados com o processo de aprendizagem dos educandos”. Todavia, a
autora alerta “que o uso das TIC no processo da aquisição de aprendizagem não
significa que as aulas vão se tornar mais atrativas ou mais dinâmicas. Compete
aos professores e alunos a construção de um ambiente de interação estabelecendo
um ambiente de confiança e de superação das dificuldades, protagonizando um
ambiente de compartilhamento e de cooperação”, afirma. (p. 39).
Outro desafio da EAD é desenvolver a formação com qualidade de estruturas
físicas e de equipamentos, além de um aporte de recursos humanos para atendi-
mentos dos alunos.

6 Tarouco (2016) aponta alguns resultados de levantamento realizado pelo CETIC, acerca do uso
das TIC em escolas brasileiras.

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156 Formação continuada de coordenadores pedagógicos

A Educação à distância é tão ou mais complexa que o ensino presencial e para que
ela tenha qualidade precisa ser organizada desde a sua proposta até a sua prática. Ao
propor que um curso seja oferecido nesta modalidade, é preciso pensar em como
este será sua estrutura, recursos humanos, preparação e distribuição do material
didático, organização do plano de ensino e das aulas, organização administrativa e
de responsabilidades. (KONRATH, TAROUCO, BEHAR, 2009, p. 2)

Portanto, não é suficiente colocar o curso em uma plataforma sem o suporte


de polos regionais presenciais, tutores presenciais e remotos, material didático
adequado e perfil dos cursistas de acordo com a proposta do curso.
Cabe ressaltar que a educação à distância requer uma postura mais proativa do
aluno, compromisso de organização do seu tempo de estudos, ter autonomia, envolvi-
mento, cooperação e colaboração com os colegas. O aluno precisa dominar o uso da
plataforma onde o curso se desenvolve, compreendendo seus recursos e explorando
seu uso intensamente. É um esforço necessário para o êxito nos cursos EAD.
O uso de redes sociais tem contribuído para o uso das tecnologias na educação.
Estas também podem servir como um recurso que aproxima o aluno do mundo
virtual com vistas à formação de maneira mais agradável.
Por outro lado, o docente também precisa se reinventar para atuar na EAD. A
dinâmica é outra. Não se trata de transpor um planejamento de aula presencial para
um planejamento de aula à distância. Também é necessário que o docente decidido a
oferecer cursos com uso de tecnologias tenha conhecimento prévio sobre este campo.
O docente precisa realizar capacitações para o uso da modalidade à distância criando
deste modo capacidade metodológica e pedagógica para atender seus alunos.
Em um estudo de Avila et alii (2014) que aborda o mundo virtual na formação
docente, as autoras apontam algumas estratégias para o efetivo uso dos mundos
virtuais, dentre elas “a ampliação do número de horas para o desenvolvimento de
atividades presenciais”, que permitem um suporte presencial aos alunos quando
esbarram em dificuldades de uso das ferramentas do curso.
Essa constatação é importante, na medida em que se disseminam cursos EAD
sem o compromisso com a aprendizagem dos alunos, moldados em plataformas onde
não há interação com docente ou tutores deixando os alunos entregues à própria
sorte. Geralmente isto contribui para uma avaliação ruim desta modalidade de ensino
e causa o abandono dos cursos com estas características. Destaca-se, deste modo,
o papel do docente e dos tutores como requisito para o êxito dos alunos no curso.

AS ESCOLHAS DOS DISCENTES PARA ESCRITA DO TCC

O curso aqui analisado foi estruturado em torno do eixo integrador Organi-


zação do Trabalho Pedagógico. A matriz curricular esteve organizada através das
seguintes salas-ambiente:

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 157

• Realidade Escolar e Trabalho Pedagógico.


• Projeto Político Pedagógico e Organização do Ensino.
• Currículo, Cultura e Conhecimento Escolar.
• Avaliação Escolar.
• Práticas e Espaços de Comunicação na Escola.
• Aprendizagem Escolar e Trabalho Pedagógico
• Políticas Educacionais e Gestão Pedagógica
• Tópico Especial
• Metodologia do Trabalho Científico.
O conteúdo de cada sala estava relacionado ao eixo integrador e, deste modo,
o curso atenta o olhar à realidade escolar e o seu Projeto Político Pedagógico, dis-
cutindo os temas que envolvem a função do Coordenador Pedagógico no âmbito
da escola e da sala de aula. O curso articulou as políticas educacionais, as práticas
educacionais e os desafios que permeiam o trabalho pedagógico.
A avaliação da aprendizagem dos alunos se deu ao longo do curso, em caráter
processual, e culminou com a apresentação de um TCC, desenvolvido a partir das
intervenções propostas ao longo dos estudos nas diversas salas-ambiente em que os
conteúdos relacionados à gestão da escola foram aprofundados. A temática de cada
trabalho de conclusão foi definida pelos alunos sob a orientação de um docente e
atendendo as características e objetivos já apresentados para o curso. Essas temáticas,
de algum modo, expressam as preocupações e interesses mais imediatos dos cursistas.
O curso se propôs a promover a ampliação das capacidades de análise e
resolução de problemas no âmbito da organização do trabalho pedagógico. Mais
especificamente, promover a reflexão sobre o trabalho pedagógico, proporcionar
vivências de produção de conhecimento para melhor compreender a escola, de-
senvolver e refletir sobre as práticas de coordenação com a finalidade de melhorar
a aprendizagem e possibilitar o aprofundamento sobre a construção coletiva e
democrática do projeto pedagógico da escola.
Cabe reafirmar a importância da formação continuada de coordenadores
pedagógicos para o fortalecimento da educação inclusiva e da gestão democrática
da escola pública. Considerando os objetivos propostos para esta formação conti-
nuada, o que se espera do egresso é um acúmulo de conhecimento que possibilite
compreender:
• A educação como direito fundamental do cidadão e de emancipação humana
• O compromisso com o trabalho pedagógico de qualidade
• A realidade escolar e a gestão dos processos educativos
• A gestão democrática da escola como essencial ao processo de elabo-
ração e implementação do projeto político pedagógico e assegurando a
participação da comunidade escolar.

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158 Formação continuada de coordenadores pedagógicos

Neste curso em que a teoria dialogou com a prática, as escolhas das temáticas
dos trabalhos de conclusão, de modo geral, foram permeadas pelos desafios do
cotidiano das escolas e que implicam as atribuições dos profissionais da coorde-
nação pedagógica.
O papel do Coordenador Pedagógico na atualidade difere da concepção de
supervisor escolar forjada na época da ditadura. De acordo com Zen (2012, p. 8),
esse profissional atuava como “fiscal das práticas educativas ou uma espécie de
gerente, responsável pelas atividades burocráticas”. Para a autora, hoje,
O Coordenador Pedagógico é corresponsável pela sala de aula, pelo trabalho rea-
lizado pelo professor e pelos resultados dos alunos. Ele faz parte do corpo de pro-
fessores e sua função principal se divide entre a formação de professores e a gestão
do projeto político-pedagógico da escola (ZEN, 2012, p. 8).

Orsolon (2006) destaca a realização de um trabalho coletivo, integrado com


os atores escolares, com investimento na formação continuada do professor na
própria escola, na parceria de trabalho com o professor e no incentivo às práticas
curriculares inovadoras como ações necessárias da função da coordenação peda-
gógica com vistas a efetivar mudanças significativas na escola.
Nessa conjuntura de ressignificação conceitual e prática, o Coordenador Pedagógico
[...] das escolas públicas são considerados hoje educadores que procuram assumir
um papel ao mesmo tempo político e técnico, baseado no diálogo e na mediação
entre posições nem sempre convergentes nos sistemas de ensino e nas escolas, da-
das as diferenças que caracterizam as formações iniciais dos docentes em serviço.
(SILVA, 2017, p. 2)

O Curso de Especialização em Coordenação Pedagógica de certo modo


resgatou esse papel, através das leituras e discussões nos fóruns e produções dos
alunos. Podemos considerar que as escolhas têm uma intencionalidade, podendo
externar as angústias, sonhos ou até mesmos um pedido de ajuda para superar
as adversidades do trabalho pedagógico. O conhecimento acumulado por esses
profissionais possivelmente se refletiu nos trabalhos desenvolvidos ao longo do
curso e especialmente no TCC.

APRESENTANDO, DESCREVENDO E ANALISANDO


AS TEMÁTICAS DOS TCCS

Os trabalhos finais apresentados foram organizados e categorizados a partir


da leitura dos títulos, resumos, objetivos e foco do estudo proposto pelos autores.
Os TCC foram organizados em 25 temáticas e, como já foi mencionado, o agru-
pamento se deu por semelhanças dos estudos.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 158 22/10/2018 14:27:27


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 159

Por certo, as temáticas escolhidas têm relação direta com o “fazer” dos co-
ordenadores pedagógicos. Destaca-se que 10% dos estudos foram sobre o papel
desse profissional frente aos desafios da função. De certo modo, os demais temas se
relacionam a esta temática, contudo a tratam com enfoques mais específicos, mas
atribuindo o lugar de mediador aos coordenadores. Isto se verifica ao observar as
descrições das temáticas em que o fazer pedagógico dialoga com os desafios a serem
enfrentados e a importância de um trabalho participativo/compartilhado na escola.
No quadro 1, a seguir, são apresentados o número de trabalhos por temáticas,
em ordem decrescente. Na sequência do quadro 1, as temáticas são descritas con-
siderando ideias centrais dos títulos, resumos, objetivos e foco de cada trabalho.

Quadro 1 – Número de trabalhos por temáticas

TEMÁTICA NÚMERO DE TRABALHOS


1. O papel da Coordenação pedagógica 24

2. Inclusão escolar 20
3. Ambiente de aprendizagem
18
4. Currículo escolar
5. Ensino e aprendizagem escolar
17
6. Avaliação
7. Formação continuada 15
8. Educação infantil 13
9. Evasão escolar
11
10. Tecnologias de informação
11. Gestão escolar democrática
8
12. Educação de jovens e adultos
13. Projeto político pedagógico
7
14. Docência
15. Ensino fundamental
6
16. Alfabetização e letramento
17. Legislação e normas educacionais
18. Educação integral
19. Função social da escola
5
20. O brincar na escola
21. Relação família-escola
22. Educação do Campo 3
23. Diversidade
2
24. Educação ambiental
25. Adolescência e futuro profissional 1
TOTAL 240
Fonte: organização própria a partir dos títulos, resumos, objetivos e foco do estudo dos TCC.

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160 Formação continuada de coordenadores pedagógicos

Como já foi mencionado, a temática o papel do Coordenador Pedagógico


apresentou o maior número de estudos. Repercutem aqui as preocupações desses
profissionais com o fazer pedagógico da escola como um todo, em que prevalecem a
sobrecarga de trabalho e a falta de estrutura e de condições de trabalho. Os estudos
expressaram as reflexões acerca da identidade profissional que se modificou ao longo
dos anos, das atribuições desse profissional, da formação continuada dos profis-
sionais da escola e dos desafios na relação com os docentes no cotidiano da escola.
A inclusão escolar foi o segundo tema mais escolhido. Os estudos apresenta-
dos analisaram a inclusão na escola, seus desafios e limites para atuação docente.
Dentre os principais focos desses estudos estão os processos de inclusão nas escolas
e nas turmas, as práticas pedagógicas utilizadas pelos docentes e as adaptações
curriculares adotadas pela escola para os alunos deficientes, o incentivo ao uso
das tecnologias assistivas na Sala de Recursos Multifuncionais, o trabalho das
cuidadoras educacionais de educando com necessidades especiais. Outro foco é o
de compreender a percepção dos professores que atuam com alunos de inclusão.
Na temática ambiente de aprendizagem, encontramos as investigações que
tratam das relações no interior das escolas, a gestão de conflitos, a indisciplina e
os desafios do trabalho do Coordenador Pedagógico com vista a criar ambiente
favorável à aprendizagem. Os trabalhos abordaram também a afetividade dos do-
centes em sala de aula e suas implicações na aprendizagem, as questões relativas
à violência no espaço escolar, os conflitos do cotidiano da escola, as relações dos
docentes com as famílias e dos docentes com a coordenação pedagógica, os tipos
de violência recorrentes nas escolas e as atividades e projetos de prevenção e tra-
tamento da violência, formação continuada de caráter vivencial aos professores
através das práticas circulares.
Os trabalhos sobre currículo analisaram as políticas curriculares propostas
na atualidade (BNCC7), os conteúdos das disciplinas do currículo escolar, as pro-
postas metodológicas utilizadas pelos docentes, o baixo rendimento dos alunos na
disciplina de matemática e o currículo das classes multisseriadas.
Na temática ensino e aprendizagem escolar, os estudos trataram dos processos
de ensino-aprendizagem, da interdisciplinaridade, das novas metodologias do
trabalho docente, das dificuldades e resistência dos docentes em trabalhar com
pesquisa nas ciências, o papel da família na aprendizagem dos alunos, a influência
da gestão democrática/coordenação pedagógica no planejamento coletivo inter-
disciplinar e sua contribuição para a formação integral do educando do Ensino
Médio, o educar para a pesquisa como um instrumento pedagógico que contribui
para a aprendizagem.
Sobre o tema avaliação foram dois os focos escolhidos. De um lado, a ava-
liação da aprendizagem, especialmente no ensino médio e politécnico e, de outro

7 BNCC – Base Nacional Comum Curricular, proposta pelo Ministério da Educação

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 161

lado, a progressão continuada/automática e seus reflexos e resistência por parte


dos docentes.
A temática formação continuada abordou principalmente o papel do Coorde-
nador Pedagógico na formação continuada dos docentes nas escolas, mapeamento
da trajetória profissional e as práticas de formação continuada dos docentes.
Na temática educação infantil, os estudos trataram da atuação do Coordenador
Pedagógico na educação infantil, analisando as práticas propostas para essa etapa
da educação básica e como estão inseridos os conteúdos da cultura africana na
primeira infância, assim como estudos sobre as transições entre a educação infantil
e o ensino fundamental.
A evasão escolar contou com estudos que abordaram a proposição de novas
metodologias, recursos didáticos e formação continuada em serviço aos professo-
res para reduzir a evasão, buscaram identificar os fatores internos e externos que
contribuem para a evasão escolar, os movimentos de evasão e retorno dos alunos
evadidos para a escola.
A temática Tecnologias de Informação (TI) apresentou estudos que analisaram
o papel de articulador do Coordenador Pedagógico para a utilização das tecnologias
em sala de aula, o uso de TI para contribuir para a aprendizagem, a interdiscipli-
naridade com uso de TI, como os docentes estão preparados para o uso de TI e
como planejam o trabalho com o uso dessas ferramentas.
Em relação à temática gestão escolar democrática, o foco foram as reuniões
pedagógicas, dos conselhos de classe, da atuação dos conselhos escolares na gestão
da escola e a análise do PPP como instrumento da gestão democrática.
Em relação à Educação de Jovens e Adultos (EJA), os trabalhos buscaram identi-
ficar as razões do retorno dos alunos para as turmas de EJA, as principais causas da
infrequência nesta modalidade de ensino, os contextos do ensino e aprendizagem
da EJA/EM observando as relações entre docentes e Coordenador Pedagógico, as
reuniões pedagógicas da EJA e as dinâmicas para administrar o tempo e os espaços
desta modalidade.
Sobre o Projeto Político-Pedagógico (PPP), os estudos refletiram sobre o pro-
cesso de construção do PPP, outros analisaram porque o PPP não se constitui como
referência das práticas pedagógicas e a participação do Coordenador Pedagógico
na construção do PPP.
Em relação à temática docência, os estudos analisaram os desafios da ativi-
dade docente frente à diversidade dos alunos, considerando o perfil, a formação
e os anseios desses profissionais, abordaram questões relacionadas às práticas dos
profissionais e os resultados de aprendizagem.
Sobre o Ensino Fundamental (EF), os estudos trataram das articulações para
qualificação dos processos de ensino aprendizagem nos anos iniciais, analisaram
a formação do Coordenador Pedagógico e se essa se mostra adequada ao trabalho
no EF, e também como se constitui a relação com os docentes desta etapa.

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162 Formação continuada de coordenadores pedagógicos

Os estudos sobre alfabetização e letramento analisaram os programas volta-


dos para a alfabetização (PNAIC) e letramento e as dificuldades enfrentadas pelos
docentes no processo de aprendizagem das crianças.
Em relação aos estudos sobre legislação educacional, os mesmos analisaram
diversos aspectos da legislação educacional brasileira e as práticas na escola, abor-
daram a implementação de normas tais como as Leis 10.639/03 e 11.645/08 e a
obrigatoriedade da educação infantil a partir da Emenda Constitucional nº 59/2009.
Os estudos sobre educação integral abordam os procedimentos, desafios e
obstáculos para as escolas com experiências de contra turno e tempo integral,
envolvendo o programa mais educação e outras experiências de redes locais para
a educação integral. A temática função social da escola apresentou reflexões sobre
aspectos que envolvem a escola e o seu papel na atualidade e a análise da nucleação
das escolas rurais e seus reflexos para a população. Os estudos buscaram pesquisar
e compreender a nucleação escolar em prol de identificar dificuldades, anseios,
conquistas vivenciadas pelas comunidades a partir do processo de fechamento
de escolas, a importância da manutenção das escolas nas comunidades rurais a
fim de entender sua relação com a continuidade das famílias no meio rural e o
desenvolvimento da agricultura familiar, a dimensão educativa e social da escola
interferindo no valor de pertencimento e no processo identitário dos estudantes,
e a função social da escola na atualidade.
O brincar na escola refletiu sobre o lúdico e a brincadeira na escola, ressaltando
sua importância nos processos de alfabetização de crianças.
Os estudos da temática as relações família-escola analisaram a importância da
família na escola para a aprendizagem dos alunos.
Três estudos da temática educação do campo trataram da atuação da coorde-
nação pedagógica nestas instituições. Resgataram a história destas instituições e
a realidade atual, apresentaram os desafios e possibilidades do trabalho docente.
Os estudos sobre diversidade abordaram a atuação do coordenador para ga-
rantir os dispositivos legais que protegem a diversidade na escola.
Em relação à educação ambiental, os trabalhos analisaram como o tema da
educação ambiental é tratado nas escolas e os desafios encontrados pelos docentes
para desenvolver atividades voltadas para o tema.
Por fim, um trabalho tratou dos processos de escolarização e o futuro dos
jovens das escolas públicas, analisando como eles se comportam em relação ao
seu futuro após a escolarização.
Ao percorrer um olhar atento ao que foi sistematizado nessas temáticas,
observa-se a riqueza de conteúdos desenvolvidos. Também são perceptíveis as
aflições do cotidiano das escolas públicas, muitas vezes aflições ancoradas na falta
de condições de trabalho. Não só condições materiais, mas de recursos humanos
de uma rede de atenção à criança, ao jovem e ao adolescente que dê suporte ao
trabalho pedagógico das escolas. Destaca-se o olhar para as políticas educacionais

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 163

vigentes no país e que se modificam com as alternâncias de poder, sem que o fazer
pedagógico consiga acompanhá-las, pois ensinar e aprender precisa de tempo.
Tempo que muitas vezes não é respeitado pelas alternâncias governamentais e,
consequentemente, políticas.
Contudo, observa-se também que compelidos a se movimentarem dentro de
um amplo espectro de situações político-governamentais e de avanços tecnológicos
e metodológicos, os coordenadores pedagógicos seguem a trajetória de mediadores
entre a permanente função da escola em promover um ensino que garanta aprendi-
zagens efetivas e propostas que muitas vezes se tornam transitórias por atenderem
somente a questões técnico-burocráticas que não se sustentam em face da realidade
de carências das escolas públicas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo apresentou uma reflexão sobre os conteúdos explorados pelos


alunos do Curso de Especialização em Coordenação Pedagógica oferecido pela
UFRGS, com o objetivo de ressaltar a produção dos discentes caracterizando as
temáticas estudadas pelos mesmos. A categorização em 25 temáticas possibilitou
um olhar mais atento às escritas considerando as semelhanças dos conteúdos a
partir dos títulos, objetivos e foco de estudos analisados.
Certamente não foi possível uma leitura detalhada de cada trabalho, tendo
em vista o volume de documentos. Todavia, para o objetivo aqui proposto, foi
possível uma apropriação quanto aos campos de interesse dos alunos que ocupam
a função de coordenadores pedagógicos e coordenadores de projetos em escolas
públicas do Rio Grande do Sul e realizar uma análise sobre os focos dos estudos
por eles apresentados.
A primeira percepção que se tem ao ler os títulos, focos e objetivos dos
trabalhos é de que, embora os focos se apresentem com especificidades aparente-
mente diversas, todas perpassam o lugar de relevo que esse profissional ocupa nas
instituições escolares.
Também se percebe que muitos desafios precisam ser superados. Muitos
estão associados às lacunas na formação dos professores de modo geral e daqueles
que ocupam a coordenação pedagógica. Não só pelo que manifestam em relação
ao outro (professor, pai, aluno), mas pelo que fica subentendido nas proposições
dos objetivos dos estudos por eles desenvolvidos. Por exemplo, quando referem
compreender a resistência dos professores em implementar políticas que asseguram
o direito à educação e a democratização da escola, não se percebe de parte dos
proponentes uma argumentação fundamentada para fazer o contraponto.
As atribuições dos coordenadores pedagógicos não estão consolidadas nas
escolas públicas do RS. Nem mesmo o perfil desses profissionais tem uma referência

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164 Formação continuada de coordenadores pedagógicos

única. Cada rede de ensino adota um formato diferente para a função. Possivel-
mente isso interfira na formação continuada para a função, tendo em vista que há
uma rotatividade de pessoas que a exercem, sem que isso seja acompanhado por
aprofundamento de estudos neste campo de atuação profissional.
Um ponto positivo das escolhas diz respeito à abrangência das temáticas
perpassando toda a educação básica. Etapas e modalidades, currículo, relações
interpessoais, educação integral e do campo, diversidade e as políticas educacionais
que se encontram em disputas no país foram contempladas nos TCC.
De certo modo, é possível afirmar que a estrutura proposta para o curso foi
apreendida pelos cursistas, tornando-os mais sensíveis a propostas e a políticas
públicas educacionais, distinguindo entre as que são passageiras e as que vêm para
ficar e que, portanto, precisam ser objeto do seu trabalho.

REFERÊNCIAS

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Livro Coordenação Pedagógica.indb 164 22/10/2018 14:27:28


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 165

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Significados atribuídos à inclusão 1 2
escolar por docentes e funcionários
de uma escola do interior do RS

Gustavo Andrada Bandeira


Leonardo Cardozo Vieira

INTRODUÇÃO

Pensar a inclusão escolar é uma necessidade emergente em todo o palco


educacional, pois, por mais que o termo educacional esteja bastante atrelado às
deficiências físicas, é importante ressaltar a sua amplitude conceitual. Para tanto,
esse artigo, fonte de um trabalho de conclusão do curso de Especialização em Co-
ordenação Pedagógica, idealiza-se com o intuito de compreender os significados
atribuídos à inclusão escolar por profissionais da instituição escolar.
O ingresso no curso de Especialização em Coordenação Pedagógica possibi-
litou aliar a teoria e a prática profissional, e direcionar-me à temática da inclusão
escolar, já que a comunidade escolar vivenciava a reconstrução do seu regimento
escolar e projeto político pedagógico, e precisava pautar-se nas discussões sobre
“escola inclusiva”. Sempre julguei necessário que antes de qualquer ação é necessário
que expressemos o entendimento, os sentidos e os significados acerca do assunto,
pois nossos valores, crenças, ideologias e habitus1 estarão alicerçando nossos pla-
nejamentos, atos e ações.
O cenário da pesquisa aqui descrita é uma escola municipal do interior do Rio
Grande do Sul, situada a 33 quilômetros da sede do município de Arroio Grande,
oferta a Educação do Pré-Escolar ao 9º ano do Ensino Fundamental, e conta com
128 discentes e 25 profissionais, entre docentes e funcionários/as.

1 Setton utiliza-se do conceito de Bourdieu para habitus: “Concebo o conceito de habitus como
um instrumento conceitual que me auxilia pensar a relação, a mediação entre os condiciona-
mentos sociais exteriores, e a subjetividade dos sujeitos. Habitus como uma matriz cultural que
predispõe os indivíduos a fazerem suas escolhas. Embora controvertida, creio que a teoria do
habitus me habilita a pensar o processo de constituição das identidades sociais no mundo con-
temporâneo” (2002, p. 61).

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168 Significados atribuídos à inclusão escolar por docentes e funcionários de uma ...

No ano de 2015, toda a rede municipal de ensino, por vontade dos/as ges-
tores/as políticos e educacionais, implantou o Sistema Positivo de Ensino, contra
o qual nos posicionamos. Muitos foram os motivos que nos fizeram discordar da
implantação desse método. Em primeiro lugar, por se tratar de posição unilateral e
não haver consulta às comunidades escolares. Num segundo momento, por desle-
gitimar um dos maiores princípios da Educação, a autonomia docente, e, por fim,
por se tratar de um apostilado produzido numa e para uma realidade totalmente
diferente da demanda dessa escola.
O deslumbramento pela estética do material não deixou ninguém pensar nos
indivíduos que possuem outros ritmos de aprendizagens, disléxicos/as, disortográ-
ficos/as, que não possuem as tecnologias digitais em suas casas, sendo que alguns
nem energia elétrica possuem nas residências. Afinal, o que é inclusão para esses
profissionais?
Foi motivado por esse questionamento que surgiu a pesquisa, aqui descrita,
tendo como objetivo “analisar os significados atribuídos ao termo inclusão escolar
por docentes e funcionários/as de uma Escola do município de Arroio Grande/RS.”
Entender os significados que esses/as profissionais atribuem à Inclusão Escolar
se coloca como uma importante ferramenta para que a escola projete suas metas
para uma educação inclusiva. Compreender os discursos desses/as sujeitos traz à
escola múltiplas possibilidades de ressignificar a sua práxis, não apenas projetando
ideias, mas criando condições para que a inclusão, de fato, aconteça.

DO CONCEITO DE EXCLUSÃO AO CONCEITO DE INCLUSÃO

Segundo Avelino da Rosa Oliveira:


[...] quem são, entretanto, os excluídos? Ora, o termo refere-se às minorias étnicas,
ora aos segregados pela cor; por vezes aos desempregados de longa duração, outras
vezes aos sem moradia,[...] em outros aos portadores de deficiência, aos aidéticos
[...], são os que não têm acesso à educação, à saúde, à previdência (OLIVEIRA,
2008, p. 181).

O professor Avelino, professor da Universidade Federal de Pelotas, descreve os/


as excluídos/as socialmente como marginalizados/as, e que segundo Freire (2002)
são produtos e vítimas do sistema, deixados às margens da sociedade, principal-
mente em relação aos seus direitos.
Boneti, não diferente de Freire, relaciona o conceito de exclusão ao mundo
dominante, ou seja, há grupos de indivíduos que não se enquadram nos parâmetros
e normas que regem a nossa sociedade, segundo os ideais das classes dominantes
e opressoras.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 168 22/10/2018 14:27:28


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 169

[...] excluir significa expulsar do mundo dominante, significa, literalmente, pôr para
fora dos parâmetros e das normas que regem as relações sociais, é não apenas margi-
nalizar e sim desconsiderar a existência humana. Excluir significa criar e perpetuar
condições sociais que tornam permanente o ato de morrer (BONETI, 1998, p. 15).

E, nessa ótica, é preciso considerar que o ambiente escolar, situado numa so-
ciedade cujas classes elitistas são opressoras, também leve para seu meio a exclusão.
Analisando as práticas pedagógicas e suas relações, ter-se-á um contexto escolar
mais includente ou excludente?
De acordo com Kátia Silva Santos:
A escola na modernidade passa a ser percebida como aquela que institui, que ensina
conhecimentos e inculca comportamentos. Historicamente, a escola foi exigindo,
estabelecendo regras de pertencimento e, neste dado momento histórico, um lugar
de destaque é conferido a escola e a família (SANTOS, 2005, p. 130).

A autora explicita a escola como uma inculcadora de comportamentos, e


estimuladora para que todos/as os/as discentes sejam e tenham comportamentos
iguais, o que leva à criação de conhecidos rótulos como “lentos/as”, “lerdos/as”,
“burros/as”, “retardados/as”, e esse movimento de estigmatização das crianças as
leva à exclusão.
A necessidade da inclusão social se torna legítima quando a Constituição Fe-
deral garante que todos/as são iguais perante a lei. Essa igualdade de condições deve
ser garantida em todos os aspectos, visto que, independentemente das limitações
ou condições, todas/as têm direito à vida em sociedade, em especial à educação.
Para Boaventura de Sousa Santos (1997, p. 122), “[...] as pessoas e os grupos
sociais têm o direito a ser iguais quando a diferença os inferioriza, e o direito de
ser diferentes quando a igualdade os descaracteriza”.
O processo de inclusão escolar deve se conceber no respeito à diversidade,
possibilitando a todos/as se desenvolverem na cidadania.
Nesse sentido, Mantoan sublinha a importância da inclusão na Escola:
[...] a escola, para muitos alunos, é o único espaço de acesso aos conhecimentos.
É o lugar que vai proporcionando-lhes condições de se desenvolverem e de se tor-
narem cidadãos, alguém com uma identidade sócio-cultural que lhes conferirá a
oportunidade de ser e de viver dignamente (MANTON, 2003, p. 53).

Rosita Edler de Carvalho, professora e pesquisadora da UNB, explicita mag-


nificamente a polissemia que o termo inclusão escolar pode carregar:
Existem inúmeras e contraditórias formas de pensar e de agir, no que respeita à in-
clusão, particularmente no espaço escolar, face à polissemia da aplicação do termo,
que tanto se diz respeito aos espaços onde ocorre (inclusão física, inclusão social,
inclusão no mundo do trabalho, inclusão na escola...), quanto aos sujeitos aos quais
se refere (minorias étnicas, religiosas, de grupos sociais em desvantagens, de pessoas

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170 Significados atribuídos à inclusão escolar por docentes e funcionários de uma ...

que frequentam ou não a escola, que estejam ou não em situação de deficiência...)


(CARVALHO, 2006, p. 01).

Carvalho descreve o quanto o termo inclusão escolar pode conter vários sig-
nificados e, a partir deles, ter várias “frentes” nas ações pedagógicas. Temos visto
uma prática pedagógica bastante comum nas escolas, que é o aglomeramento de
indivíduos por semelhanças, ou seja, turmas de alunos/as mais novos/as, outra só
de alunos/as “repetentes”, grupos de alunos/as com maiores facilidades de apren-
dizagem e assim sucessivamente. Dessa forma, salientamos a hipótese de que um
dos significados mais atribuídos à inclusão escolar está ligado às identidades e não
às diversidades. A própria legislação educacional, como já citada anteriormente,
remete a inclusão escolar às pessoas com deficiências, o que mais uma vez alavanca
a identidade.
Albuquerque (2009), num artigo publicado nos anais da 32ª Reunião da
ANPED, descreve resultados de pesquisas com representações sociais dos/as
professores/as frente à inclusão escolar, e conclui que: “[...] embora a inclusão dos
alunos com deficiência seja um avanço da legislação, em prol da construção de sua
cidadania, as representações sociais das professoras estão focadas na resistência e
impossibilidades para desenvolver práticas inclusivas” (p. 13).
A autora aborda também o fato de que inclusão não trata apenas do ingresso
na escola regular de pessoas com deficiências, mas significa garantir sempre condi-
ções de aprendizagem, desenvolvimento social, cognitivo e afetivo, e explicita que
“é preciso estar atento às representações sociais daqueles que são os responsáveis
diretos pela efetivação do direito: os professores” (p. 13).
O objetivo que originou esse ensaio busca justamente compreender os signifi-
cados que os/as docentes e funcionários/as atribuem à inclusão escolar. Dessa forma,
é importante entender a semântica com que utilizamos o termo “significados”.
A utilização do termo “significados” justifica-se pelo fato de a pesquisa buscar
compreender discursos de sujeitos sobre suas práticas ou vivências. De acordo com
Henn (2010, p. 05), “os conhecimentos situados nas experiências de vida se con-
cretizaram em vários tempos/espaços e estão carregados de sentidos e significados,
os quais já passaram inúmeras vezes por práticas de significação”.

METODOLOGIA

Para ser possível compreender os significados atribuídos por um grupo de


indivíduos à inclusão escolar, utilizamos uma pesquisa de cunho qualitativo. Mi-
nayo (1997, p. 22) sustenta que “o conjunto de dados qualitativos e quantitativos
não se opõe. Ao contrário, eles se complementam, pois a realidade abrangida por
eles interage dinamicamente, excluindo qualquer dicotomia”.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 170 22/10/2018 14:27:28


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 171

Como instrumento de coleta de dados, foi utilizado um questionário aberto.


A escolha desse instrumento se justifica em primeiro momento pelo pouco tem-
po para a realização da coleta de dados, como também pelo número razoável de
questões. Segundo Gil (1999), o questionário é uma técnica de investigação apre-
sentada por escrito às pessoas, com objetivo de conhecer suas opiniões, crenças,
sentimento ou situações.
Durante uma reunião administrativo-pedagógica foi, então, aplicado o
questionário. Incrivelmente, por se tratar de uma reunião, estavam 100% dos/as
docentes e funcionária/os.
Para organizar os dados obtidos na pesquisa, tabulá-los e analisá-los, utiliza-
mos o Discurso do Sujeito Coletivo (DSC). O interesse pelo DSC surgiu justamente
para dar suporte à análise das falas dos/as docentes e funcionários/as, visto que essa
metodologia “configura-se também como uma variável do qualitativo, na medida em
que tem de expressar as opiniões compartilhadas por um quantitativo de indivíduos,
que configuram a coletividade pesquisada” (LEFEVRE & LEFEVRE, 2006, p. 518).
Ainda esses/as autores/as afirmam que o DSC é uma proposta de reconstituição
de um ser coletivo, cujo discurso é emitido na primeira pessoa do singular, justa-
mente por serem representações sociais, significados ou sentidos, pois, geralmente,
indivíduos compartilham ideias semelhantes. Os discursos do sujeito coletivo se
mostram como excelente recurso para tabulação e análise dos dados obtidos, visto
que é considerado um “signo interpretante que busca reconstruir as representações
sociais num determinado nível” (LEFEVRE & LEFEVRE, 2006, p. 522).
Nesse sentido, o DSC traz os significados sobre um dado tema em que todos
os sujeitos se manifestam. Isso, porém, não implica que todos/as manifestem a
mesma ideia ou expressão que leve a uma homogeneidade, mas que, no coletivo,
esse discurso é representativo do pensamento de todos/as.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os dados obtidos nos questionários foram digitados em uma tabela do software


Microsoft Excel, quando foram utilizadas siglas para se referir aos/às professores/
as e funcionários/as, de modo que não fossem identificados no momento da
organização do discurso. A partir daí, num processo de análise mais minuciosa,
selecionaram-se discursos, cujas ideias traziam sentidos semelhantes dentro de
cada questionamento.
Num segundo momento, essas ideias foram extraídas na íntegra e organizadas
para dar origem ao texto do discurso.
Para a organização do texto do DSC, é necessário manter com a maior fide-
dignidade possível as falas dos sujeitos sendo, portanto, necessário acrescentar
conectivos linguísticos, vírgulas ou pontos, para que, ao juntar os diferentes trechos

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172 Significados atribuídos à inclusão escolar por docentes e funcionários de uma ...

dos discursos com as mesmas ideias centrais, seja possível organizar um texto coeso.
O Sujeito Coletivo acontece por meio de um discurso emitido na primeira pessoa
do singular, que representa o pensamento de uma coletividade através de depoi-
mentos de diferentes indivíduos com conteúdos discursivos de sentido semelhante
(LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2006).
Do resultado da análise, emergiram três discursos coletivos: 1. Inclusão
como conceito amplo e para todos, 2. Inclusão arraigada à Educação Especial e 3.
Dificuldades para uma escola inclusiva. A seguir, trago cada um desses discursos,
seguido de breves reflexões.

DSC 1. INCLUSÃO COMO CONCEITO AMPLO E PARA TODOS/AS

Quadro 1. DSC1: Inclusão como conceito amplo e para todos/as

Entendo por inclusão escolar como uma prática onde todos os alunos da Escola
estão incluídos, possibilitando a eles uma vida escolar e social mais justa e
humanizada, maior interação ao meio escolar que possibilitem aos excluídos a
chance de recomeçar e elevar a autoestima. Incluir é trazer o aluno para todas
as atividades desenvolvidas na sala de aula, com os demais colegas, levando
em consideração seus conhecimentos e seu tempo de aprendizagem. É incluir
todos os segmentos da escola, buscando o melhor caminho a se seguir. Dar a
possibilidade para que todos os alunos possam ter acesso a todas as atividades
que busquem o desenvolvimento, sem discriminação. Inclusão escolar me
remete a um lugar onde todos os alunos podem conviver sem serem isolados ou
excluídos e viver em harmonia com a comunidade escolar, ou seja, onde a escola
acolhe esse aluno se adaptando a ele e fornecendo condições de aprendizagem
e crescimento. Para mim, algumas atividades inclusivas acontecem quando
aluno e professor realizam diversas atividades com dinâmica e entusiasmo, nos
eventos com a comunidade e no ato de conviver. Quando a direção e alguns
profissionais empenhados em ajudar alunos independentes de religião, classe
social, sexualidade e deficiências, como futebol, taekwondo, vôlei e bingos.

Para os sujeitos, cujas falas compunham o DSC1, embora em uma minoria,


a inclusão é um conceito amplo, aplicado a todos que de alguma forma estão
excluídos. Segundo Mantoan (2003, p. 22), para garantir o direito à educação, “a
Constituição Federal não usa adjetivos e, assim sendo, toda escola deve atender
aos princípios constitucionais, não podendo excluir nenhuma pessoa em razão de
sua origem, raça, sexo, cor, idade ou deficiência”.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 173

A partir das falas dos sujeitos da pesquisa que compuseram o DSC 1, foi
possível elencar três premissas:
1) Inclusão escolar como sendo um espaço para todos independentemente de
limitações;
2) Inclusão escolar não é apenas acesso, é também permanência e participação
nas diversas atividades pedagógicas;
3) Inclusão escolar como uma práxis pedagógica, envolvendo todos os segmen-
tos da comunidade.
Mantoan corrobora com essas premissas, quando conceitua inclusão:
A inclusão total e irrestrita é uma oportunidade que temos para reverter a situação
da maioria de nossas escolas, as quais atribuem aos alunos as deficiências que são
do próprio ensino ministrado por elas sempre se avalia o que o aluno aprendeu,
o que ele não sabe, mas raramente se analisa “o que” e “como” a escola ensina, de
modo que os alunos não sejam penalizados pela repetência, evasão, discriminação,
exclusão, enfim. (MANTOAN, 2003, p. 18)

A autora sustenta que é preciso “expulsar a exclusão de nossas escolas e,


inclusive, mesmo de fora delas” (2003, p. 18) justamente por entender que as
práticas pedagógicas são, na sua grande maioria, excludentes, no próprio sistema
de avaliação escolar, como supracitada. Além disso, não é novidade que a escola é
quantitativa e classificatória.
Outra ideia da autora é justamente a descentralização da gestão administrativa
a fim de promover maior autonomia pedagógica, administrativa e financeira de
recursos materiais e humanos das escolas por meio da gestão democrática. Entender
a inclusão escolar do ponto vista da diversidade como um todo é um importante
passo para constituir práticas pedagógicas efetivamente inclusivas.

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174 Significados atribuídos à inclusão escolar por docentes e funcionários de uma ...

DSC 2: INCLUSÃO ARRAIGADA À EDUCAÇÃO ESPECIAL

Quadro 2. DSC2: Inclusão arraigada à Educação Especial

Compreendo por inclusão escolar a questão de buscar o ingresso dos discentes


a quem a sociedade exclui, que tenham problemas cognitivos ou físicos, ao
espaço escolar, visando tornar possível o processo de ensino aprendizagem
deste indivíduo, principalmente motoras ou intelectuais. Uma escola inclusiva
é aquela que tenha todos os requisitos para receber os alunos sem se importar
com seu jeito: fisionomia, deficiência, dificuldade, tratando todos iguais, alunos,
professores e funcionários. Inclusão escolar é tornar todos os lugares, espaços
da escola aptos por toda a comunidade escolar, de portadores de necessidades
especiais (cegos, surdos, autistas, cadeirantes), na instituição escolar desde que
esta oportunize à pessoa interagir no meio em que vive, incluindo-os na escola
regular, onde escola deve adaptar-se ao aluno e não os alunos adaptarem-se
a ela. Inclusão escolar para mim é dar a oportunidade para todas as pessoas e
acesso a permanecerem na escola o tempo que for necessário.

Através do DSC2, cujas falas dos sujeitos estão ligadas à inclusão do ponto de
vista da deficiência, é possível chegar às seguintes premissas:
1) Inclusão como ingresso na escola pública e regular;
2) Inclusão como associação às deficiências físicas e cognitivas;
3) Inclusão como pressuposto pedagógico de adaptação às diversas deficiências.
Embora as premissas estejam evidentes, o DSC utiliza uma expressão cha-
mada “ancoragem”, isto é, um ou mais sujeitos utilizam-se de falas que podem
estar nos discursos de teóricos sobre a temática. No caso do DSC 2, gostaria de
chamar atenção para a expressão “a escola deve adaptar-se ao aluno e não os alunos
adaptarem-se a ela”, que é justamente uma das ideias de escola inclusiva trazida por
Mantoan, embora não apenas ligada à integração de pessoas com deficiências. E
justamente sobre isso, a autora escreve:
O processo de integração escolar tem sido entendido de diversas maneiras. O uso
do vocábulo “integração” refere-se mais especificamente à inserção de alunos com
deficiência nas escolas comuns, mas seu emprego dá-se também para designar alunos
agrupados em escolas especiais para pessoas com deficiência, ou mesmo em classes
especiais, grupos de lazer ou residências para deficientes (MANTOAN, 2003, p. 15).

A maioria dos sujeitos da pesquisa relacionou a inclusão escolar às deficiências,


ou seja, ligou à educação especial, cuja legislação trata como modalidade de ensi-

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 175

no, e cujas escolas têm cada vez mais aberto espaços para alunos com deficiências
físicas e intelectuais.
A partir do DSC2, é possível compreender um discurso reproduzido nos
ambientes escolares de que inclusão estaria bastante ligada à deficiência, princi-
palmente física.

DSC 3: DIFICULDADES PARA UMA ESCOLA INCLUSIVA

Quadro 3. DSC3: Dificuldades para uma Escola Inclusiva

Ao meu ver quem cria as dificuldades são os profissionais que não querem
romper barreiras. Por outro lado, o excesso de carga horária, muitas vezes em
mais de uma escola, dificuldade de acesso a cursos de formação/capacitação,
falta de interesse dos próprios professores, falta de infraestrutura adequada
nas escolas e de recursos financeiros que são escassos para instrumentalizar a
inclusão. Outra dificuldade seria o próprio desconhecimento. Será que o que
penso ser educação inclusiva é realmente considerado uma educação inclusiva?
Também acredito que existe uma confusão entre educação especial e educação
inclusiva. É necessário que se conheça estas duas possibilidades para só depois
aprender a trabalhar com elas. Seria importante que o professorado recebesse
um curso antes de receber esses alunos. Ou uma ajuda da professora de
educação especial em sala de aula, pois uma grande dificuldade é a adaptação
professor-aluno-pais.

Segundo o DSC 3, é possível elencar quatro interpretações básicas das falas


dos sujeitos quanto às dificuldades de uma escola inclusiva:
1) Excesso de carga horária;
2) Escassez de cursos de formação;
3) Falta de estrutura e materiais (recursos);
4) Relação entre a comunidade escolar (pais e escola).
Mantoan (2003) argumenta que muitos professores utilizam o famoso discurso
de não estarem ou terem sido preparados quando resistem à inclusão. Os próprios
cursos de formação inicial não dão conta de uma formação para a diversidade; dessa
forma, para que a escola se vire do avesso, ou seja, sofra grandes transformações, é
necessário também rever a organização dos cursos de licenciatura.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 175 22/10/2018 14:27:28


176 Significados atribuídos à inclusão escolar por docentes e funcionários de uma ...

Roberto Nardi, numa pesquisa com professores/as, também obteve de seus


sujeitos de pesquisas diversos discursos que alegavam que a inclusão efetiva não
acontecia em função da grande carga horária dos/das docentes. Por isso, de forma
geral “acabam por homogeneizar os alunos involuntariamente apenas por não co-
nhecer a necessidade educacional do seu aluno, provocando muitas vezes prejuízo
ao seu aprendizado” (NARDI, 2009, p. 135).
Rosita Edler de Carvalho (2006, p. 17) relata:
Queixam-se das condições materiais em que trabalham, dos seus baixos salários, do
número de alunos por turma, do despreparo decorrente de sua formação inicial e
continuada, da falta de tempo para, nas escolas, estudarem juntos, discutirem práticas
pedagógicas, trocando “figurinhas”... Certamente não estou me referindo a nada de
novo, pois essas e outras justas reclamações dos nossos educadores são bem antigas.

A autora, de forma clara, afirma que todas as justificativas dadas pelos/as do-
centes e funcionários/as como dificuldade para uma escola, de fato, inclusiva, são
legítimas, porém é necessário entender que inclusão “não depende de boa-vontade
e sim de efetivas ações que garantam o funcionamento de escolas de boa qualidade
para todos e com todos” (CARVALHO, 2006, p. 9)
O DSC3 foi elaborado a partir de discursos de sujeitos que tanto atribuíram a
inclusão escolar ao sentido da diversidade quanto das deficiências, ou seja, do DSC1
e DSC2, permitindo fazer uma leitura de que muitos empecilhos ligados à escola
inclusiva residem na falta de conhecimento dos sujeitos, ou seja, pouco podemos
fazer daquilo que não conhecemos.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

A inclusão é uma realidade posta na educação brasileira pública. Porém, não


é novidade que, enquanto na legislação vigora uma escola inclusiva, construtivista
e para todos, muitos são os reais empecilhos para que a inclusão, de fato, aconteça.
Com o Discurso do Sujeito Coletivo, cujos textos foram organizados a partir
dos discursos de professores/as e funcionários/as de uma escola do interior do
município de Arroio Grande, através de um questionário aberto, percebeu-se que
o próprio conceito de inclusão ganha diferentes sentidos e que, na maioria das
vezes, estão ligados às deficiências.
A partir dos três DSCs, foi possível identificar que numa mesma instituição
há diferentes significados dados à inclusão escolar, pois cada sujeito da pesquisa
apresenta um contexto de vida, de formação, de valores, de crenças e habitus, que
lhe são peculiares.
Em suma, é possível sintetizar esses sentidos atribuídos à inclusão escolar em
dois grandes grupos. No primeiro, um sentido mais conceitual ligado à inclusão

Livro Coordenação Pedagógica.indb 176 22/10/2018 14:27:28


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 177

para todos/as, de forma mais construtivista, com práticas pedagógicas voltadas


aos estudantes e suas necessidades, sejam elas físicas, intelectuais, sociais, étnicas,
etc. E um segundo sentido atribuído às deficiências, ou seja, é bastante comum
ouvirmos dos/as profissionais da educação a inclusão como sendo para alunos/
as com diferenças físicas. Inclusive nos próprios discursos das escolas costuma
haver menção aos/às alunos/as com deficiência, como alunos/as de inclusão. Este
conceito é bem mais arraigado à educação especial.
Outro fato curioso, extraído dos DSCs, foi que mesmo os/as profissionais que
deram sentidos diferentes à inclusão, atribuíram aos mesmos fatores os motivos e
queixas pelos quais as escolas ainda não são inclusivas. São eles o excesso de carga
horária dos/as professores/as, a escassez de cursos de formação para docentes e
principalmente para funcionários/as, a falta de estrutura e materiais, incluindo
recursos humanos e a necessidade de maiores diálogos entre a comunidade escolar.
A partir desse ensaio, cujo objetivo consistiu em analisar os diferentes signifi-
cados que os/as docentes e funcionários/as atribuem à inclusão escolar, foi possível
compreender que, enquanto não se tiver a clareza do que realmente é a inclusão
escolar e qual o seu real objetivo, dificilmente conseguir-se-á construir metas para
uma escola inclusiva. Dessa forma, os resultados da pesquisa aqui descritos expli-
citam a necessidade de que o assunto “inclusão escolar” precisa ser mais refletido,
contextualizado e (re)significado com os/as profissionais da educação da escola
onde foi realizada a pesquisa, enfatizando, dessa forma, o papel do Coordenador
Pedagógico como mediador dessas reflexões.

REFERÊNCIAS

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inclusão de professoras. Anais da 32 Reunião anual da ANPED. Disponível em: <32reuniao.anped.
org.br/arquivos/GT15-5315—Int.pdf> Acesso em: março de 2016.
BONETI, L. W. Estado e exclusão social hoje. In: ZARTH, P. (Org.). Os caminhos da exclusão social.
Ijuí: Unijuí, 1988.
CARVALHO, Rosita Edler. Educação inclusiva: com os pingos nos “is”. 4. ed. Porto Alegre: Ed. Me-
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GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1999.
HENN, Iara Aquino. Os sentidos e significados atribuídos ao saber cultural no currículo. Avá, Po-
sadas, n. 16, p. 1, jul. 2010. Disponível em: <http://www.scielo.org.ar/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S1851-16942010000100004&lng=es&nrm=iso>. Acesso em março de 2016.
LEFEVRE, Fernando e LEFEVRE, Ana Maria Cavalcanti. O sujeito coletivo que fala. Comunic, Saú-
de, Educ. jul/dez 2006; 10(20):517-24.
MINAYO, M.C. de S. (Org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 7 ed. Petrópolis: Vozes, 1997.
MONTOAN, Mª Teresa Eglér. Inclusão escolar: o que é? Por quê? Como fazer? São Paulo: Moderna,
2003.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 177 22/10/2018 14:27:28


178 Significados atribuídos à inclusão escolar por docentes e funcionários de uma ...

NARDI, Roberto. (Org.). Ensino de ciências e matemática, I: temas sobre a formação de professores
[online].São Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009. 258 p. ISBN 978-85-7983-
004-4.Available from SciELO Books <http://books.scielo.org>
OLIVEIRA, Avelino da Rosa. Exclusão Social. In: STRECK, REDIN, ZITKOSKI. (Orgs) Dicionário
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SANTOS, Boaventura de Sousa. Uma concepção multicultural de Direitos Humanos. Lua Nova
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SETTON, Maria da Graça Jacintho Setton. A teoria do habitus em Pierre Bourdieu: uma leitura
contemporânea. Revista Brasileira de Educação, nº 20, maio/jun/Jul/ago, 2002.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 178 22/10/2018 14:27:28


As narrativas sobre o currículo 1 3
escolar da língua estrangeira
moderna: teoria versus prática

Angela de Fátima Linck de Jesus


Juliana Veiga de Freitas

O desejo pela escolha deste tema surgiu das experiências vivenciadas por uma
professora da rede estadual do Ensino de Línguas, atuante na assessoria pedagó-
gica do município de Ijuí/RS, e de uma orientadora educacional atuante em uma
instituição de Ensino Superior no município de Porto Alegre/RS, ambas instigadas
pelas discussões emergentes que envolvem o currículo e as políticas educacionais
brasileiras para o Ensino Básico.
Assim, tomamos o currículo como eixo central dessa pesquisa, buscando
embasamento nas inúmeras iniciativas políticas das últimas décadas em tornar
as referências curriculares o principal tema de reflexão, debate e produção de co-
nhecimento no espaço escolar. A existência de poucas pesquisas que investiguem
especificamente a relação entre o currículo da Língua Estrangeira Moderna (LEM)
nas Políticas Nacionais de Ensino e a sua aplicação na prática dos professores
instigou-nos a buscar problematizar as seguintes perguntas: Como os professores
de LEM compreendem a concepção do currículo escolar e de que forma esse co-
nhecimento embasa a prática pedagógica docente?
O presente trabalho encontra-se organizado em três partes. Na primeira, são
apresentadas as concepções de currículo, a revisão histórica das Políticas Nacio-
nais do Ensino de Língua Estrangeira Moderna no Brasil e apontamentos sobre o
currículo da Língua Estrangeira descritos na Base Nacional Comum Curricular.
Na segunda, é apresentada a metodologia da pesquisa, a descrição do contexto da
pesquisa, dos participantes e dos instrumentos de coleta e análise. Os procedimen-
tos metodológicos, a produção dos dados da pesquisa, o tratamento e a análise de
dados, são descritos na terceira parte onde apresentamos as considerações finais, os
resultados obtidos, construídos, comparados e relacionados seguidos da conclusão
e referencial teórico utilizado.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 179 22/10/2018 14:27:28


180 As narrativas sobre o currículo escolar da língua estrangeira moderna

O CURRÍCULO NO CAMPO DA LÍNGUA ESTRANGEIRA MODERNA

Consideramos um dos grandes desafios da educação básica, atualmente, a


construção da concepção e implementação do currículo escolar. É desafiante, pois
esse processo envolve os diferentes atores educacionais e seus contextos, e não
apenas os conteúdos a serem ministrados em sala de aula.
As diversas interpretações encontradas sobre o conceito de currículo nas
diferentes teorias existentes são uma das hipóteses para a dificuldade que muitos
professores têm para compreender o seu significado. Esses diferentes conceitos,
pautados por fatores socioeconômicos, políticos e culturais, contribuíram para
definições, tais como:
a) os conteúdos a serem ensinados e aprendidos; b) as experiências de aprendizagem
escolares a serem vividas pelos alunos; c) os planos pedagógicos elaborados por
professores, escolas e sistemas, educacionais; d) os objetivos a serem alcançados
por meio do processo de ensino; e) os processos de avaliação que terminam por
influir nos conteúdos e nos procedimentos selecionados nos diferentes graus da
escolarização (MOREIRA; CANDAU, 2008, p. 18).

Em entrevista1 ao programa Salto para o Futuro no ano de 2008 na TV Brasil,


Antônio Flavio Barbosa Moreira salientou que a relação entre currículo e sociedade
acontece, pois o currículo é organizado em um “dado momento histórico, numa
dada sociedade, e vai refletir aquilo que esta sociedade deseja formar”. Nesse sentido,
o autor defende que o currículo pode ser compreendido como:
[...] o conjunto de experiências de aprendizagem, organizado pela escola, sobre
responsabilidade da escola, que gira em torno do conhecimento escolar, que eu vejo
como a matéria-prima do currículo, e que vai contribuir para formar as identidades
de nossos estudantes (MOREIRA, 2008, p. 1).

Moreira e Candau nos dizem que o currículo é o “coração da escola, o espa-


ço central em que todos nós atuamos, o que nos torna, nos diferentes níveis do
processo educacional, responsáveis por sua elaboração” (2007, p. 19) e, por isso, o
professor ocupa um papel tão importante no processo. Como mediador de saberes,
ele tem a responsabilidade de vivenciar a construção e a implantação do currículo e
ainda refletir, elencar e decidir o que vai ser trabalhado na escola e na sala de aula.
A seleção dos conhecimentos relevantes e contextualizados com a realidade dos
educandos e da comunidade escolar é necessária para que ocorra o ensino reflexivo
aliado a uma aprendizagem significativa.
Para tanto, a escola necessita estar em constante formação articulando tempos
e espaços para que se estabeleça um ensino ativo e efetivo, com professores com-
prometidos com a escolha e a organização de saberes a fim de trabalhar os conhe-

1 Disponível em: http://www.tvbrasil.org.br/saltoparaofuturo/entrevista.asp?cod_Entrevista=28.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 180 22/10/2018 14:27:28


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 181

cimentos a serem apreendidos pelos estudantes (FOGAÇA; GIMENEZ, 2007). Por


esse motivo, no processo de construção curricular, é importante a organização de
espaços de reflexão, discussão de ideias, estudo dos documentos, socialização de
saberes e angústias e formação humana por meio do trabalho pedagógico.
A história mostra que o ensino de línguas teve momentos de altos e baixos nas
políticas nacionais para o ensino de LEM nas escolas públicas brasileiras. Houve
períodos de ascendência caracterizada por ampla carga horária com ensino de
idiomas como latim, francês, inglês e espanhol. E períodos de declive, como no
contexto atual em que é oferecido o ensino do Inglês no Ensino Fundamental e
Inglês e Espanhol no Ensino Médio.
A primeira medida educacional de caráter nacional implantada no Brasil foi
a Reforma Francisco Campos em 1931 e teve como objetivo organizar o currículo
do Ensino de Línguas Estrangeiras com vistas a proporcionar um ensino mais
dinâmico baseado não só na leitura e tradução, mas na comunicação. No decorrer
dos tempos, outras leis foram elaboradas, como a reforma Capanema em 1942, a
Lei de Diretrizes e Bases em 1961, a nova LDB em 1971. Em 1998 foram publicados
os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para complementar a nova LDB e
para propagar os princípios da reforma curricular. Já em 20 de dezembro de 1996
foi publicada a Lei nº 9.394 que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Na-
cional (LDBEN), a qual estabelece a obrigatoriedade do ensino de LEM nas escolas
públicas como disciplina que integra a parte diversificada do currículo.

OS CAMINHOS METODOLÓGICOS TRAÇADOS PARA A PESQUISA

Trata-se esta pesquisa de um estudo de caráter qualitativo, de inspiração etno-


gráfica, por considerar como os significados que caracterizam o mundo social são
construídos pelas pessoas, que interpretam e reinterpretam o mundo a sua volta,
fazendo assim com que as realidades sejam múltiplas (ANGROSINO, 2009). Como
ferramenta de coleta de dados, utilizou-se um questionário com perguntas abertas
visando proporcionar o tempo e a liberdade para a formulação das respostas. A
opção por “pergunta aberta” visa dar a liberdade de resposta, demonstrar a opinião,
sentimento, crença e atitude a respeito do que está sendo perguntado.
Os sujeitos de pesquisa foram selecionados levando em consideração a docên-
cia em LEM – inglês e espanhol de escolas da Rede Estadual de Educação de um
município do Noroeste do estado do Rio Grande do Sul. Foram distribuídos vinte
questionários, mas apenas três professores atenderam a solicitação para colaborar
com a pesquisa. Um professor de LEM Inglês de Ensino Médio (E.M.), um do En-
sino Fundamental (E.F.) e, um professor de LEM Espanhol do Ensino Médio. Os
professores têm entre 30 (trinta) e 40 (quarenta) anos de idade e são formados no

Livro Coordenação Pedagógica.indb 181 22/10/2018 14:27:28


182 As narrativas sobre o currículo escolar da língua estrangeira moderna

curso de Letras – Língua Estrangeira Moderna e Respectivas Literaturas por uma


Universidade do Noroeste do estado, há mais de cinco anos.
Para preservar a identidade dos sujeitos da pesquisa, optei por utilizar os pseu-
dônimos Profe1, Profe2 e Profe3, sem a divulgação de gênero. O Profe1 ministra
aulas de Inglês do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental, o Profe2 trabalha em duas
escolas e ministra aulas de Inglês para 8º e 9º ano do Ensino Fundamental e 1ºs
anos do Ensino Médio. O Profe3 ministra aulas de Espanhol do 1º ao 3º ano do
Ensino Médio. A fase exploratória da pesquisa foi realizada no mês de novembro
de 2015. O prazo da entrega dos questionários foi estabelecido para o início do mês
de dezembro de 2015; no entanto muitos professores não o fizeram. Elencamos
duas hipóteses para a baixa adesão ao questionário: a primeira pode ser que os
professores não possuem conhecimento sobre as leis que regem a educação básica,
principalmente sobre a BNCC, e a segunda o fato de que os meses de novembro e
dezembro são caracterizados por muitas tarefas, como preparação e correção de
provas e atividades de encerramento do ano letivo. Nesta perspectiva, os sujeitos da
pesquisa se limitaram aos três professores conforme mencionado anteriormente.

O CURRÍCULO NA TEORIA VERSUS O CURRÍCULO


NA PRÁTICA: UM QUEBRA-CABEÇA.

O termo “currículo” dá vasão a muitas interpretações; por isso é necessário que


se estabeleça previamente o seu entendimento. Kerr (apud KELLY, 1981) ressalta a
importância de estabelecer o conceito de currículo de forma neutra no que se refere
a valor e abrangente no que diz respeito ao planejamento de ações e atividades da
escola. Segundo o autor, currículo é “toda a aprendizagem planejada e guiada pela
escola, seja ela ministrada em grupos ou individualmente, dentro ou fora da escola”
(KERR, 1968, p. 16 apud KELLY, 1981, p. 4). Assim, a análise das respostas nos
mostra que os professores participantes utilizam uma linguagem metafórica para
conceituar o termo currículo, conforme pode ser verificado na resposta do Profe3:

Um currículo é um percurso. Um currículo escolar é como a escola organi-


za as disciplinas, metodologia, a avaliação

Esta mesma ideia de currículo também é observada nas demais respostas dos
participantes. Por isso, Moreira enfatiza a necessidade de o currículo ser “organiza-
do pela escola, sob responsabilidade da escola e girar em torno do conhecimento
escolar” (2008, p. 1). Em relação às ações de construção e elaboração do currículo,
é possível verificar que ocorre a participação do professor nas discussões que en-
volvem sua implementação, conforme resposta do Profe1:

Livro Coordenação Pedagógica.indb 182 22/10/2018 14:27:28


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 183

Quando cheguei na escola o currículo já estava pré-estabelecido, a cada


ano aprimoramos, conversamos e discutimos aquilo que deu certo, o que
deu errado e tentamos aprimorá-lo.

A resposta do Profe1 demonstra que o currículo pode ser “alterado em de-


terminado momento do ano letivo”. Assim, é possível inferir a existência de um
“currículo flexível” (MOREIRA, 2008, p. 2), que se caracteriza pela condição de
sofrer alterações conforme as necessidades da escola, dos alunos e da sociedade. O
conhecimento de mundo, a análise crítica das ações que fazem parte do cotidiano
escolar, a ampliação e aquisição de novos conhecimentos, são elementos que o
currículo flexível ajuda a fortalecer na escola.
O currículo escolar também pode indicar ações que não constam nos planos e
nas propostas da escola, o chamado “currículo oculto” que envolve, dominantemen-
te, atitudes e valores transmitidos, subliminarmente pelas relações sociais e pelas
rotinas do cotidiano escolar (MOREIRA; CANDAU, 2007). Quanto à representação
da aprendizagem no currículo escolar, pode-se constatar a presença do currículo
oculto na resposta do Profe1:

A Língua Inglesa é ensinada por etapas, níveis de aprendizado, se o currí-


culo não atente a necessidade do momento, o professor busca outros mé-
todos para melhorar a forma do aluno compreender determinado assunto
com mais clareza.

Nesse sentido, cabe ao professor criar oportunidades para que os estudantes


possam assumir o papel de participantes na construção do conhecimento, dis-
cutindo o planejamento de tarefas de sala de aula, selecionando conhecimentos
relevantes que contribuam para a ampliação dos horizontes para compreender
melhor o mundo em que vivem (MOREIRA, 2008).
Nas respostas dos professores, observa-se que as suas concepções de currículo
são embasadas pela teoria, porém, pode-se perceber que esse conhecimento teórico
não faz parte das suas práticas, pois os mesmos tiveram dificuldade de explicar
como acontece a construção do currículo na escola e como a aprendizagem é nele
representada. Desse modo, é possível inferir que o conhecimento teórico adquirido
na formação acadêmica não é vivenciado na prática docente.
Como em um jogo de encaixar peças, planejar o currículo escolar exige
que todos os profissionais da educação tenham uma visão global de ensino e de
aprendizagem. É necessário também ter a capacidade de projetar cenários e enca-
dear situações, sem deixar de lado os aspectos sociais e culturais dos educandos.
No entanto, conforme mencionado anteriormente, observa-se que trazer para a
prática o que está na teoria muitas vezes torna-se um verdadeiro quebra-cabeça
para os professores.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 183 22/10/2018 14:27:28


184 As narrativas sobre o currículo escolar da língua estrangeira moderna

A necessidade de uma participação efetiva dos professores na construção


do currículo escolar é fundamentada nas teorias do currículo (SILVA, 1999). Na
resposta do Profe1, sobre a forma como o currículo da língua estrangeira é ela-
borado na escola, é possível confirmar a hipótese de que os professores entendem
o currículo apenas como conteúdos a serem trabalhados nas aulas (MOREIRA;
CANDAU, 2007). É como se o “currículo do papel” instituído pelas legislações
vigentes não fosse o mesmo currículo vivenciado na escola.
De acordo com Assis-Peterson (1998), até pouco tempo, acreditava-se que
o fator crítico do ensino de línguas estrangeiras era o método de ensino, ou seja,
o bom professor era aquele que detinha o domínio do melhor método ou técnica
mais inovadora de ensinar. Pesquisas recentes demonstram o contrário, pois a
instrução baseada apenas no método não garante a aprendizagem. Os professores
precisam se comprometer com a educação dos seus alunos e “não podem deixar
de se interrogar sobre a importância e relevância daquilo que estão ensinando”
(SANTOS, 2009, p. 11).
Ao participar da construção do currículo, o professor precisa ter bem claro
seu compromisso com a instrução dos alunos. Na resposta do Profe2, pode ser
observada esta preocupação:

O currículo é organizado por ano/série. Os conteúdos são organizados


visando à aprendizagem de língua estrangeira desde o nível básico até o
nível avançado. Além disso, todas essas práticas são norteadas levando em
consideração: contexto intercultural, recursos didáticos no ensino e apren-
dizagem de LE, o papel do professor e do aluno, o ensino das habilidades e
a avaliação do processo de aprendizagem.

Em relação à existência de intervenientes para que se efetivem mudanças que


qualifiquem o ensino da Língua Estrangeira nas escolas, as respostas são evasivas,
superficiais, sem reflexão, embasamento e aprofundamento teórico e prático. Mais
uma vez observa-se restrito conhecimento do significado e da utilidade do cur-
rículo escolar. Uma hipótese pode ser a pouca participação na sua construção já
que é possível perceber nas respostas que na teoria o currículo é um caminho, um
percurso a ser seguido, mas na prática, é um verdadeiro quebra-cabeça. Isso pode
ser constatado na resposta do Profe1:

A Língua Inglesa está em constante processo sempre, palavras novas e


métodos eficazes sempre surgem, para aprimorar o ensino da mesma. Os
links dos livros didáticos dentro das unidades propostas sempre trazem
ideias para o professor utilizar, áudios, exercícios, filmes, sites, músicas
que fazem a diferença ao relacionar o assunto estudado a outros. Está
é uma boa maneira de aprender, fazer ligações com outras disciplinas é
importante.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 184 22/10/2018 14:27:28


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 185

Os professores precisam trazer para o “chão da escola” o que está descrito no


currículo escolar. A regulamentação da Base Nacional Comum Curricular para
integrar os currículos escolares de todo o Brasil poderá ser o primeiro passo para
que haja uma apropriação dos conceitos para serem efetivados na prática docente.
Para o Profe1, a proposta da BNCC, mesmo que amplamente divulgada, ainda não é
entendida, neste caso especificamente em relação à LEM. Sua resposta confirma isso:

Oferece ao aluno situações de aprendizado de LE no cotidiano, uma boa


maneira de utilizar a segunda língua com sua vivência e realidade. Além
do peso cultural e social que elenca um estudo sobre os costumes do país,
“qual estudamos” a língua. Todo o professor de LE acredita que o currículo
está correto no que se refere a conceitos básicos de ensino, cada professor
utiliza a ideia além de outros métodos coerentes para cada momento do
ano letivo.

A Base “retoma e atualiza” o que foi proposto pelas Políticas Nacionais em


relação à LEM, “em uma perspectiva de educação linguística, interculturalidade,
letramentos e práticas sociais” (BNCC, 2015, p. 121). A inovação ocorre na “elabora-
ção de objetivos de aprendizagem que privilegiam os usos de língua estrangeira” (p.
122). Esses conhecimentos irão fazer parte dos currículos escolares, pois o objetivo
principal da Base, após sua conclusão, será orientar a elaboração de currículos para
as diferentes etapas de escolarização (BNCC, 2015, p. 25), e nortear a “reflexão crítica
e propositiva, que deve subsidiar a formulação, execução e avaliação do Projeto
Político Pedagógico da escola” (BNCC, 2015, p. 31) influenciando diretamente a
trabalho dos professores.
A ser questionado sobre como a Base poderá refletir no seu trabalho, o Profe2
demonstra ter o entendimento de que:

Trará as diretrizes e os conteúdos mínimos para o trabalho e organização


nas escolas públicas, privadas e centros de Idiomas, referente ao ensino de
LE, bem como todas as áreas que compõem o currículo brasileiro.

A resposta do Profe1 confirma a hipótese de que o professor tem pouca par-


ticipação na construção do currículo escolar quando menciona que o currículo
é imposto, dando a entender que a Base irá impor os conceitos e conteúdos que
serão trabalhados na escola. Também é perceptível a noção de currículo instituído
como algo utópico, fora da realidade da escola, distante da prática do professor.
Ao afirmar que “a prática requer muito mais que a teoria”, fica implícita a distância
entre a teoria e a prática pedagógica.
Conversas sobre o currículo escolar são frequentes entre professores. A maio-
ria entende que planeja suas aulas de acordo com o que está previsto no currículo
escolar. Outros, no entanto, preferem seguir seus próprios métodos e dar continui-

Livro Coordenação Pedagógica.indb 185 22/10/2018 14:27:28


186 As narrativas sobre o currículo escolar da língua estrangeira moderna

dade ao planejamento de acordo com as suas concepções. Existe uma dicotomia


entre uns e outros, muitas vezes movida pela falta de reflexão do próprio trabalho
docente. Por outro lado, é importante que os professores entendam que a reflexão
sobre o seu trabalho colabora para que ocorra transformação no ambiente escolar
e na sociedade como um todo.
Nas falas dos professores participantes não se observa o conhecimento do
conteúdo dos documentos da escola, principalmente do Projeto Político-Pedagógico
no qual o currículo é fundamentado. Observa-se também que esses documentos
são construídos apenas para atender exigências da Coordenadoria ou da Secretá-
ria da Educação e não para servir como guia que orienta ações e atividades dos
professores e da escola.
Portanto, os dados levantados nesta pesquisa evidenciaram que os professo-
res entrevistados precisam ampliar seus conhecimentos sobre a importância do
processo de construção e elaboração do currículo escolar para que o mesmo seja
vivenciado na prática pedagógica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao concluir este estudo, apresentamos as reflexões finais resgatando as per-


guntas que nortearam sua construção. Enfocar a relação entre o currículo da língua
estrangeira e a sua aplicação na prática da sala de aula possibilitou desvelar algumas
concepções que permeiam essa problemática.
A escola e a educação como um todo enfrentam cotidianamente diversos
desafios. Um deles pode ser a resistência de alguns professores em se apropriar dos
conhecimentos contidos nos documentos da escola, a saber: o Projeto Político-
-Pedagógico, o Plano de Estudos e o Regimento Escolar. Esses documentos são
a base para a construção do Plano de Trabalho do professor no qual o currículo
escolar tem papel principal.
A revisão literária desenvolvida ao longo deste estudo contribuiu para entender
o conceito de currículo escolar e conhecer as alterações determinadas pelas Políticas
Nacionais de Ensino ao longo dos anos no currículo da LEM. A metodologia, através
de um questionário, teve o intuito de analisar as concepções de três professores de
LEM, no que diz respeito ao currículo da LEM e as Políticas Nacionais de Ensino.
Assim, a primeira pergunta de pesquisa visou compreender como os profes-
sores de LEM conceituam o currículo escolar. Em vista disso, é importante ressal-
tar que o currículo escolar é um dos fatores determinantes para implementação
e disseminação das práticas escolares. É “um local onde ativamente se produzem
e se criam significados sociais” (SILVA, 2003), o que contribui para que valores,
ideias e atitudes adquiram novas interpretações no que diz respeito às relações
pessoais e culturais. No entanto, pôde ser observado, através das respostas dos

Livro Coordenação Pedagógica.indb 186 22/10/2018 14:27:28


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 187

professores participantes, um conhecimento restrito acerca desse conceito e sobre


a sua importância na vida da escola. Pode-se inferir que o currículo escolar, para
esses educadores, resume-se apenas aos conteúdos que norteiam o ensino.
A segunda pergunta de pesquisa buscou entender de que forma o conheci-
mento do que está nas Políticas Nacionais de Ensino para a LEM embasa a prática
pedagógica dos professores. As respostas demonstram haver necessidade de apro-
fundar os estudos sobre o que essas políticas propõem, sendo essa possivelmente
a causa da inviabilidade da construção de uma prática pedagógica significativa.
Com esta pesquisa, foi possível confirmar a hipótese de que a maioria dos
professores adota o currículo que considera viável, de acordo com o seu tempo de
planejamento e as condições da sala de aula. Na maioria das vezes, é um currículo
centrado no livro didático, sem contextualização com a realidade dos alunos, da
escola e da sociedade. Assim, este estudo nos leva a crer que a padronização de
parte do currículo nas escolas públicas e particulares do Brasil, proposta pela Base
Nacional Comum Curricular, será a oportunidade para estas instituições e seus
docentes repensarem as práticas pedagógicas com vistas a melhorar o ensino e a
aprendizagem dos seus estudantes.
Todavia, concluímos com a esperança de que a Base Nacional Comum Cur-
ricular possibilite um avanço na educação brasileira, principalmente por almejar
a adequação do currículo escolar a “temas e gêneros do discurso que compõem
as práticas [...] indicados como possíveis geradores de objetivos de aprendizagem
que podem se tornar mais específicos e detalhados, de acordo com cada contexto
escolar” (BNCC, 2016, p. 377). Acreditamos que esta pesquisa contribuiu para
um melhor entendimento acerca do currículo escolar, uma vez que demonstra a
existência de tipos diferentes de currículo, usados de acordo com a necessidade
e contexto escolar. São eles: o “currículo instituído” nos documentos da escola é
aquele considerado pelos professores participantes como um caminho, um per-
curso a ser seguido ou a vida da escola. Esse é o currículo que está na literatura,
idealizado por teóricos, mas que dificilmente faz parte da prática pedagógica. O
“currículo vivenciado”, aquele que é a prática pedagógica dos professores, muitas
vezes representa o que está nos livros didáticos, nas atividades lúdicas, no chão da
sala de aula. E por último, o “currículo oculto”, que pode ter uma conotação positiva
ou negativa. São as ações, gestos, palavras, atividades que transitam no ambiente
escolar ou fora dele, mas que influenciam o ensino-aprendizagem.
Dessa forma, espera-se que este trabalho tenha contribuído para a reflexão
sobre a importância da formação continuada dos professores de LEM, para per-
ceber que a sua prática precisa estar alicerçada pela teoria e contextualizada na
realidade da escola.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 187 22/10/2018 14:27:28


188 As narrativas sobre o currículo escolar da língua estrangeira moderna

REFERÊNCIAS

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estrangeira. Contexturas – Ensino Crítico de Língua Inglesa, São Paulo: APLIESP, n. 4, 1998/1999.
BRASIL. Base nacional comum curricular. Brasília: MEC/CONSED/UNDIME. 2015. Disponível
em: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/documento/BNCC-APRESENTACAO.pdf>. Acesso
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___. Constituição da República Federativa do Brasil. Constituição 1988. Brasília: Senado Federal,
2006. 292p.
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2013. 562p.
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___. Parâmetros curriculares nacionais – 5ª a 8ª série. Brasília: Ministério da Educação/Secretaria da
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Brasília: Secretaria de Educação Fundamental, 1998. 175p.
FOGAÇA, F. C.; GIMENEZ, T. N. O ensino de línguas estrangeiras e a sociedade. Rev. Brasileira de
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GANDIN, L. A. Construção do conhecimento e visão de mundo. Revista de Educação AEC, ano 26,
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KELLY, A. V. O currículo: teoria e prática. São Paulo: Harbra, 1981.
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MOREIRA, A. F. Currículo, conhecimento e cultura. 2008. Disponível em: <http://www.tvbrasil.org.
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___; CANDAU, V. M. Currículo, cultura e sociedade. Revista Salto para o Futuro, Boletim 17/2007.
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<http://coordenacaoescolagestores.mec.gov.br/ufrgs/file.php/25/Bi blioteca_CCCE/CCCE_-_
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20/11/2015.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 188 22/10/2018 14:27:28


O perfil docente de um grupo de 1 4
professores de uma instituição
pública de ensino básico técnico
e tecnológico (EBTT): vocação
e comprometimento social

Daiane Scopel Boff


Igor Ghelman Sordi Zibenberg

O cenário no qual os professores atuam, o foco e as suas formas de atuação têm


demandado complexidade crescente. [...] Nessa complexidade, a própria consti-
tuição identitária dos docentes da educação básica coloca-se em tensão. (GATTI,
2011, p. 26)

Iniciamos este texto com um excerto que nos permite apresentar a docência
como um lócus de múltiplas problematizações. Nesse tempo de regulações, o traba-
lho docente aparece como imperativo em diferentes discussões sobre a carreira do
magistério, e a constituição da identidade profissional dos professores se apresenta
mediada por muitas tensões e contradições.
As pesquisas no campo de formação de professores ocupam posição de grande
relevância nos debates contemporâneos sobre educação. Entender quem são esses
sujeitos, qual o caminho percorrido até a docência, quais as concepções presentes e
os significados atribuídos ao ato de ensinar são elementos essenciais para construir
um perfil identitário que auxilie no desenvolvimento de estudos na área educacional
e na construção de políticas públicas de valorização dos profissionais com vistas a
melhorias no cenário educacional.
Em se tratando de trabalho docente, parece ser naturalizada a ideia de que,
embora o êxito nos processos educativos resulte de diferentes e complexos fatores
que atuam de forma conjunta e relacional sobre os sujeitos envolvidos no processo,
o professor tem grande influência e gerência sobre esse resultado.
As problematizações que serão delineadas neste texto seguem na esteira das
narrativas dos professores sobre suas trajetórias profissionais, evidenciando ele-
mentos que caracterizam seu ingresso na docência.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 189 22/10/2018 14:27:28


190 O perfil docente de um grupo de professores de uma instituição pública de ensino ...

Pesquisas sobre o perfil profissional dos docentes no Brasil, tais como as


apresentadas a partir de relatórios gerados pelo Censo Escolar, “têm-se proposto a
elaborar informações necessárias para o desenvolvimento de estudos e diagnósticos
do contexto educacional e indicadores para a formulação de políticas públicas de
programas na área da educação” (FLEURI, 2015, p. 43). Ao encontro disso, este
trabalho constrói um perfil, a partir dos docentes pesquisados, investigando algu-
mas características pessoais, tais como sexo, idade, titulação, trajetória acadêmica,
experiências de trabalho, tempo de docência, aderência a programas de iniciação
científica durante a formação inicial, bem como contextualiza aspectos que se
relacionam com a constituição da identidade profissional e com a forma pela qual
a docência é tomada para cada um.
O material empírico da pesquisa foi produzido por meio de um questionário
online, com 25 perguntas fechadas e abertas, construído pelos pesquisadores e
aplicado, por intermédio de listas de e-mails, a um grupo de professores de uma
instituição pública federal do Rio Grande do Sul no segundo semestre de 2015.
A amostra contou com a participação de 257 professores em efetivo exercício na
instituição pesquisada, o que remonta a aproximadamente 30% do universo de
professores da referida instituição.
Com uma abordagem de inspiração quantitativa, a pesquisa utilizou procedi-
mentos estruturados para a coleta de informações que foram analisadas a posteriori
por meio de procedimentos estatísticos de tabulação, organização e apresentação
de dados.
Interessados em problematizar elementos constituintes da docência, a partir
dos dados provenientes dos questionários, procurou-se mostrar a caracterização
de um grupo de professores que atuam no Ensino Básico, Técnico e Tecnológico
(EBTT) com o objetivo de responder as seguintes questões: Como os professores
da carreira EBTT descrevem suas trajetórias profissionais? Como esses professores
se tornaram professores? Por que se tornaram professores nesta instituição?
Tendo anunciado nosso objetivo com este texto, queremos explicitar que
nossas reflexões procuram olhar as narrativas dos professores com uma lente que
permita enxergar como a docência é tomada para cada um e quais relações podem-
-se estabelecer, a partir desses elementos, com os processos de profissionalização
da carreira docente.

A INTENSIFICAÇÃO DA NÃO ATRATIVIDADE DA


CARREIRA DOCENTE NA CONTEMPORANEIDADE

Várias pesquisas (GATTI; BARRETO, 2009; GATTI et al., 2010; GATTI,


2011; FLEURI, 2015) apontam que a profissão docente no Brasil tem uma história
recente. A formação de professores no Brasil em cursos específicos remonta ao final

Livro Coordenação Pedagógica.indb 190 22/10/2018 14:27:28


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 191

do século XIX com o início das Escolas Normais, em nível secundário, destinadas
à formação de docentes para as escolas primárias. A carreira docente, nesta época,
era vista com um potencial atrativo diretamente vinculado ao status conferido à
tarefa de ensinar e à importância do professor frente à condução da escolarização
da sociedade. Aliada a isso, a vocação se apresentava como palavra-chave para o
ingresso na carreira do magistério, constituindo-se referência importante para
pensar o ensino. Já nesse tempo, as condições materiais para o trabalho docente
(infraestrutura das instituições, jornada de trabalho, carreira, salário) não acom-
panhavam a natureza das demandas vindas da profissão, o que não inviabilizava
a atratividade na carreira.
No início do século XX, com a criação das Universidades, o movimento em
direção à formação de professores para os anos finais do Ensino Fundamental e
para o Ensino Médio se estabeleceu. Nesse tempo, a carreira docente no Brasil se
expandiu motivada pela crescente industrialização, que, alinhada a uma lógica de
mercado, via no sistema de ensino o meio apropriado para elevar a escolarização
dos trabalhadores.
Nesse contexto, nas primeiras décadas do século XX, os cursos de Licencia-
tura no Brasil destinados à formação de professores para os anos finais do Ensino
Fundamental e para o Ensino Médio foram criados, acrescentando-se um ano de
complementação pedagógica à formação específica de bacharel, já oferecida pelas
instituições. Tal fato teve reflexos na constituição da identidade docente e nas
representações da sociedade sobre o professor até os dias de hoje, uma vez que a
estrutura curricular presente no itinerário formativo dos professores não deixava
claro um perfil desejável para esse profissional.
A partir da reforma da Educação Básica no Brasil, em 1971, as Escolas Nor-
mais foram extintas e a formação de professores em nível secundário, chamada de
Magistério, passou a assumir grande parte do currículo já determinado a um curso
deste nível, o que reduziu consideravelmente a formação específica para a docência
e auxiliou na descaracterização dos saberes docentes.
Com a Lei 9394/96 que define as novas Diretrizes e Bases da Educação
Brasileira (LDB), fica impresso um novo conceito de profissionalização docente,
baseado em uma proposta de um “continuum” de formação (GATTI; BARRE-
TO, 2009, p. 42). Além disso, a LDB transferiu a formação dos professores, até
então feita em nível secundário, para o Ensino Superior, a partir da exigência de
escolarização em nível superior para todos os professores da Educação Básica.
Somente alguns anos depois foram propostas as diretrizes curriculares para a
formação inicial dos professores da Educação Básica e, posteriormente, as dire-
trizes específicas para cada curso de Licenciatura. Tais regulamentações traçam
um perfil formativo para os profissionais da educação, preconizando compe-
tências necessárias e indicando políticas de formação inicial e continuada e de
valorização desses profissionais.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 191 22/10/2018 14:27:29


192 O perfil docente de um grupo de professores de uma instituição pública de ensino ...

Paralelamente às reformas educacionais no Brasil e acompanhando os desafios


postos pela contemporaneidade, a atratividade da carreira docente sofreu muitas
modificações. Durante um longo tempo a docência foi considerada como uma
carreira valorizada socialmente e seu reconhecimento se estabelecia pelo potencial
humanizador embutido no exercício profissional expresso pelo compromisso com
a formação para a cidadania (CANDAU, 2014). Mesmo as condições de trabalho
não acompanhando, de forma adequada, o desenvolvimento da carreira docente, o
magistério era visto como uma profissão de prestígio. Na contramão disso, pesqui-
sas recentes, tais como as de Fleuri (2015), Gatti (2011), Gestrado (2010) e Roldão
(2007), mostram que a categoria de prestígio, que compunha a profissão docente,
já está longe de ser a mesma.
As crescentes mudanças no cenário educacional e na formação dos professores,
aliadas à precariedade de políticas públicas que acompanhem os desafios postos
na contemporaneidade, parecem fazer com que a carreira docente deixe de ser tão
atrativa como outrora.
Pesquisas como A atratividade da carreira docente no Brasil (GATTI et al.,
2010) têm mostrado uma crescente desvalorização da profissão, uma vez que baixos
salários, condições precárias de trabalho, baixo prestígio social e planos de carreira
não atrativos parecem tecer a trama do cenário educacional brasileiro.
Nos discursos reformistas sobre o ensino e a formação dos professores, a
profissionalização tende a ser, seja pela importância social delegada a esse grupo de
profissionais, ou pela problemática que se desenvolve em torno do trabalho docente
e da não atratividade da carreira, um dos maiores desafios da educação nesse tempo.
Diante de um cenário em que a profissão docente deixa de ser uma opção
para a maioria dos jovens, encontramos, por meio desta pesquisa, um grupo de
profissionais em um contexto de atratividade da carreira docente. Interessou-nos
então saber se o ingresso desses profissionais na docência guardava uma relação
próxima com a atratividade da carreira do contexto apresentado.
Mesmo concordando que um conjunto de fatores conflui para a não atrati-
vidade ou a não permanência na carreira docente e que tal fato contribui para a
escolha da profissão, entendemos ser importante chamar atenção para a forma como
esses professores narram, nesse contexto de atratividade, seu ingresso na docência.

O ENSINO BÁSICO, TÉCNICO E TECNOLÓGICO (EBTT):


O PERFIL DOS PROFESSORES PESQUISADOS

Com o objetivo de situar minimamente o leitor sobre a carreira EBTT, expli-


citando o contexto no qual os professores participantes da pesquisa estão imersos,
destacamos alguns elementos desta carreira que a coloca em um cenário de atra-
tividade docente.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 192 22/10/2018 14:27:29


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 193

A carreira EBTT está vinculada aos Institutos Federais (IFs) que nasceram a
partir de uma intencionalidade política, fruto de um contexto social e econômico,
institucionalizado por meio da Lei 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Esta Lei
estabeleceu, no âmbito do sistema federal de ensino, a Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica, vinculada ao Ministério da Educação.
O ingresso à carreira EBTT ocorre mediante concurso público, por meio de
provas de conhecimentos teóricos, práticos e de títulos. O plano de carreira está
estruturado por meio das Leis 11.784/2008 e 12.772/2012, e o avanço neste plano
ocorre por meio de progressão funcional e por promoção. As regulamentações
vigentes estabelecem critérios para o regime de trabalho, incluindo atividades de
ensino, de pesquisa e de extensão, bem como para as atividades de administração
e capacitação que são oportunizadas.
O grupo de professores pesquisados pertence à carreira EBTT e atua na do-
cência em um IF da região sul. Preliminarmente, a fim de que fosse caracterizada
a categoria pessoal do grupo pesquisado, foi solicitado aos professores que respon-
dessem sua idade, em anos, e seu sexo.
Quanto à variável sexo, a predominância do grupo amostrado mostrou ser
masculina (52%), embora não haja representatividade significativa de um dos
gêneros, uma vez que o grupo feminino perfaz 48% da amostra. Quanto à idade
dos amostrados, construiu-se uma escala intervalar, considerando as seguintes
categorias: professores com até 29 anos de idade, professores de 30 a 39 anos de
idade, professores de 40 a 49 anos de idade, professores de 50 a 59 anos de idade e
professores com mais de 59 anos. Os resultados mostram que grande parte dos pro-
fessores participantes da pesquisa (75%) tem entre 30 e 49 anos de idade. Ainda, os
dados mostram que 54% dos professores ainda não completaram 40 anos de idade.
Em relação à titulação (Figura 1), a pesquisa indica que 88% deles possuem
formação mínima em nível de mestrado, sendo que, destes, 40% têm titulação de
doutor. Ainda em relação à titulação, é possível identificar que, dos 48% que indi-
caram ter como maior titulação o mestrado, 25% está com o curso de doutorado
em andamento.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 193 22/10/2018 14:27:29


194 O perfil docente de um grupo de professores de uma instituição pública de ensino ...

Figura 1 – Gráfico da variável maior titulação

Fonte: Elaborado pelos autores

Quanto ao intervalo de conclusão do Ensino Médio (EM) e do Ensino Superior


(ES), percebe-se que 37% dos professores amostrados registraram um intervalo
entre o término do EM ao término do ES de até 5 anos. Isso pode indicar que
muitos desses professores não fizeram pausa ou fizeram uma pausa relativamente
pequena entre a conclusão do EM e a entrada em um curso superior. Ainda, os
dados mostram que 73% dos professores participantes da amostra concluíram o
curso superior em até 7 anos. Esse dado não registra o tempo de conclusão do curso
superior, uma vez que pode ter havido alguma pausa (antes de iniciar ou durante o
curso) não identificada pela pesquisa, mas mesmo assim, é possível inferir que tal
grupo não teve ou teve uma interrupção muito pequena em sua formação inicial.
Utilizando uma nova escala intervalar para a variável tempo, os dados tabu-
lados mostram que apenas 14% dos professores participantes da pesquisa (Figura
2) têm um intervalo entre a conclusão do ES e a conclusão do EM maior ou igual
a dez anos, o que corrobora com a hipótese explicitada anteriormente. Além isso,
percebe-se uma diferença percentual muito pequena entre os professores que têm
intervalo de 9 anos dos que têm 8 anos. Ainda observando a variável diferença de
tempo entre a conclusão do ES e EM, percebe-se que o maior percentual se encontra
na faixa de 5 anos, embora a média aritmética seja 6,9 anos.

Quanto à natureza das instituições de formação, 23% dos professores amos-


trados afirmam ter frequentado instituições públicas desde o Ensino Fundamental
(EF) até a Pós-Graduação, quando cursada. Esse percentual sobe para 52% quando
é analisada apenas a natureza das instituições de Educação Básica (Figura 3).

Livro Coordenação Pedagógica.indb 194 22/10/2018 14:27:30


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 195

Figura 2 – Variação de tempo entre a conclusão do ES e do EM

Fonte: Elaborado pelos autores

Figura 3 – Natureza das instituições de Educação Básica

Fonte: Elaborado pelos autores

Quanto ao ES, mais da metade dos participantes da pesquisa diz ter cursado
a formação inicial em instituição pública (Figura 4).

Livro Coordenação Pedagógica.indb 195 22/10/2018 14:27:32


196 O perfil docente de um grupo de professores de uma instituição pública de ensino ...

Figura 4 – Natureza da instituição de Ensino Superior

Fonte: Elaborado pelos autores

Em relação à iniciação à docência, 37% dos professores pesquisados apontam


ter participado de alguma atividade. Dentre essas, as mais citadas foram estágio,
monitoria, projetos de extensão, oficinas e aulas particulares (Figura 5).

Figura 5 – Atividades de iniciação à docência

Fonte: Elaborado pelos autores

Livro Coordenação Pedagógica.indb 196 22/10/2018 14:27:35


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 197

Quanto à participação em atividades de iniciação científica, 57% dos profes-


sores indicam que aderiram a algum projeto durante o curso de formação inicial.
Os mais citados foram projetos vinculados à Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS), ao Conselho Nacional de Desenvolvi-
mento Científico e Tecnológico (CNPQ) e às Instituições em que cursaram o ES.
Em relação à experiência profissional (Figura 6), verifica-se que os professores, por
exercerem atualmente a docência em uma instituição de Ensino Médio Técnico e
Ensino Superior, têm mais experiência nestes dois níveis. Porém, não se desconsi-
dera a experiência no EF de 41% dos participantes da pesquisa, o que mostra que
a instituição de exercício atual não foi (ou não é) o seu único local de trabalho.

Figura 6 – Experiência profissional nos níveis de ensino

Fonte: Elaborado pelos autores

Quanto à experiência profissional em outras atividades que não a docência, os


dados mostram que grande parte dos participantes da pesquisa já teve experiências
fora da docência. Uma possível hipótese para tal resultado é o grande número de
professores de áreas técnicas e/ou tecnológicas que podem ter exercido funções
correlatas a sua profissão em outros ramos que não o educacional e até mesmo
sujeitos que se constituíram professores após o ingresso no serviço público federal.
Essa estatística corrobora com a resposta dada por alguns participantes da pesquisa
à questão “O que te fez ser professor”, quando esses apontam o ingresso no serviço
público e na carreira EBTT como uma oportunidade de emprego.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 197 22/10/2018 14:27:35


198 O perfil docente de um grupo de professores de uma instituição pública de ensino ...

Em relação à experiência em gestão educacional, 53% dos professores par-


ticipantes afirmam ter exercido alguma função nesta área. Dentre as atividades
explicitadas, a função de coordenação de curso foi a mais listada, abrangendo 52%
dos que afirmaram ter exercido ou exercer tais funções. Outras atividades mais
citadas foram direção e coordenação de ensino, vice-direção de escola, coordenação
pedagógica e supervisão escolar, além de outras coordenações.

A VOCAÇÃO E O COMPROMISSO SOCIAL AINDA


JUSTIFICAM AS ESCOLHAS PROFISSIONAIS?

Com o objetivo de objetivo caracterizar alguns dos motivos pelos quais os


professores chegaram até o exercício da docência, bem como identificar algumas
concepções relacionadas ao ensinar, presentes nas narrativas dos professores, foi
solicitado a cada participante da pesquisa resposta à questão “O que te fez ser pro-
fessor?”. Para analisar os resultados dessa questão, as respostas foram agrupadas
em categorias construídas a partir das recorrências das narrativas dos professores,
conforme mostra a Tabela 1.

Tabela 1 – Categorias construídas a partir da questão: O que te fez ser professor?

CATEGORIA
Compromisso social
Exemplos positivos
Não respondeu
Oportunidade de Emprego (carreira EBTT/estabilidade/remuneração)
Outros
Possibilidade de fazer pesquisa
Vocação (gostar/desejar/admirar a profissão)

Fonte: Elaborado pelos autores

Para a análise das respostas, o grupo amostral foi dividido em dois subgrupos,
em virtude de algumas respostas se enquadrarem em apenas uma categoria e ou-
tras em duas das categorias construídas. Diante disso, a tabulação dos dados dessa
questão passou a contar com o subgrupo denominado G1 com 244 participantes
(cuja resposta foi alocada em uma categoria) e o grupo G2 com 13 participantes
(cuja resposta foi alocada em duas categorias).
Considerando o grupo G1, é notável perceber que 51% dos professores dizem
exercer a docência por motivos relacionados à vocação (Figura 7), explicitando,
na maioria das vezes, o gosto desde cedo por ensinar, o desejo por aprender e a

Livro Coordenação Pedagógica.indb 198 22/10/2018 14:27:35


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 199

admiração pela profissão. Desse percentual, 30% utiliza a própria palavra vocação
na sua narrativa; outros narram fatos ou fazem menção à ideia de que já estavam
destinados, desde muito cedo, à docência.

Figura 7– Resposta à questão: O que te fez ser professor?

Fonte: Elaborado pelos autores

Nessa questão, foi possível identificar que há recorrência na concepção de


ensino vinculada à ideia de vocação, uma vez que nas narrativas dos professores,
percebe-se a presença de “um movimento interior, [...] pelo qual nos sentimos
chamados a cumprir uma importante missão” (TARDIF, 2013, p. 555). Ainda,
para o grupo G2 (Figura 8), dos 13 professores que fizeram referência a duas das
categorias construídas, 8 dizem estar na docência também por amor ou por ter
vocação/afinidade com a área.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 199 22/10/2018 14:27:37


200 O perfil docente de um grupo de professores de uma instituição pública de ensino ...

Figura 8 – Resposta à questão: O que te fez ser professor?

Fonte: Elaborado pelos autores

Considerando os dois grupos construídos (G1 e G2), ou seja, considerando


257 participantes, aproximadamente 52% apresenta ideias que relacionam docência
com vocação, 17% relaciona-a com uma forma de poder contribuir com a sociedade,
em vista de um compromisso social e 18% a identificam inicialmente como uma
possibilidade de emprego. Esses resultados mostram que, mesmo em um cenário
atual de desvalorização social do professor em que a falta de prestígio é creditada
à profissão docente, em um contexto de atratividade, a vocação e o compromisso
social continuam a justificar o ingresso na carreira docente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa desenvolvida investigou algumas características pessoais de um


grupo de professores da carreira EBTT e suas narrativas sobre o seu ingresso
na docência. Nessa direção, o estudo exploratório constatou que, para o grupo
pesquisado, embora haja uma variação média entre as idades dos professores,
a grande maioria tem entre 30 e 40 anos, sendo 33 anos a idade mais frequente.
Ainda observou-se que não há diferença significativa entre o número de homens
e mulheres participantes da pesquisa e que a titulação mínima de 88% deles foi
obtida em curso de mestrado.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 200 22/10/2018 14:27:37


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 201

Do ponto de vista da trajetória escolar, mais da metade dos docentes pesqui-


sados cursou o EF e o ES em instituição pública. Esse percentual ainda sobe um
pouco quando analisada separadamente a natureza das Instituições em que o curso
superior de formação inicial foi cursado. Quanto à variação de tempo entre o EM
e o ES, a pesquisa mostrou que o grupo de docentes demorou, em média, 7 anos
entre o término do EM e a conclusão do curso superior, embora tenha-se mais de
um terço do grupo que fez isso em até 5 anos e quase dois terços em até 6 anos. Tal
estatística se justifica pela grande amplitude entre os dados amostrados, ou seja, a
diferença entre o que demorou menos e o que demorou mais é da ordem de 23 anos.
Em termos de atividades de iniciação à docência realizadas pelos sujeitos da
pesquisa durante o curso superior, destaca-se a realização de estágios com 48% e
monitorias com 17%. Quanto às atividades de iniciação científica, a maior parte
(57%) dos professores afirma ter participado de algum projeto vinculado princi-
palmente à FAPERGS e ao CNPQ.
No que diz respeito às experiências profissionais, mais de três quartos dos
professores (77%) afirma ter realizado atividades fora da docência e mais da me-
tade (53%) do grupo já exerceu ou exerce atividades na gestão educacional. Dentre
as mais citadas, encontram-se atividades correlatas à coordenação de curso e de
ensino, direção, vice-direção, supervisão escolar, entre outras.
Do ponto de vista das narrativas dos professores sobre o ser docente, a pesquisa
mostrou que mais da metade do grupo (52%) considera que está na docência por ter
vocação para tal. Ainda, um terço do grupo afirma que já gostava ou tinha vontade
de trabalhar com pessoas, tinha paixão por aprender, já ensinava seus próprios
colegas de escola ou admirava a profissão. Esses resultados mostram que, embora
a carreira EBTT seja um indicador importante de permanência ou ingresso na
docência e se estabeleça como um caso de atratividade profissional, apenas 4% do
grupo fez referência a algum elemento vinculado a ela, tal como estabilidade ou
remuneração e ainda apenas 10% do grupo pesquisado aponta a docência como
uma oportunidade de emprego.
Além disso, os resultados mostram que 15% dos professores afirmam que
escolheram ser professor pelo desejo de contribuir com a sociedade e auxiliar
no desenvolvimento do ser humano, com vistas a um mundo melhor. Ainda, de
forma complementar, a referência a outros professores que serviram de inspiração
durante o percurso formativo foi indicada por 6% dos participantes pesquisados,
e o ingresso na docência tendo em vista a possibilidade de fazer pesquisa aparece
nas narrativas de 2% dos professores.
Pesquisas já realizadas sobre o perfil profissional docente no Brasil, tais como
as apresentadas por Fleuri (2015), têm-se proposto a formular categorias que per-
mitam compreender as características identitárias e profissionais dos educadores
brasileiros. Tais pesquisas procuram reformular, ampliar ou avaliar instrumentos
de pesquisa sobre o perfil docente ou mesmo desenvolver novos projetos para

Livro Coordenação Pedagógica.indb 201 22/10/2018 14:27:37


202 O perfil docente de um grupo de professores de uma instituição pública de ensino ...

esse fim, além de auxiliar na definição de políticas públicas de valorização desses


profissionais.
Nessa investigação, foi possível mostrar que construir um perfil de docentes
pesquisados, contextualizando aspectos de cunho individual e social, é uma forma
de auxiliar nas discussões sobre identidade e trabalho docente, uma vez que tais
elementos mapeiam fatores que interferem na constituição profissional dos profes-
sores. A partir dessa discussão, pode-se dizer que a escolha profissional perpassa
fatores que não estão apenas relacionados às características pessoais do sujeito
ou ao contexto histórico e sociocultural vivido, uma vez que as relações que se
engendram na escolha profissional se apresentam como múltiplas e emergem em
diferentes contextos, considerando diferentes posições. Nesse sentido, é possível
apontar caminhos que vislumbrem como continuidade da pesquisa a análise dessas
relações, bem como o estudo das narrativas dos professores sobre a constituição
de sua docência.

REFERÊNCIAS

CANDAU, V.M.F. Ser professor/a hoje: novos confrontos entre saberes, culturas e práticas. Educação
(Porto Alegre, impresso), v. 37, n. 1, p. 33-41, jan./abr. 2014. Disponível em: http://revistaseletroni-
cas.pucrs.br/ojs/index.php/faced/article/view/15003. Acesso em: 20 jan. 2017.
FLEURI, R. M. Perfil profissional docente no Brasil: metodologias e categorias de pesquisa. Brasília:
Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2015.
GATTI, B. A.; BARRETTO, E. S. S. Professores do Brasil: impasses e desafios. Brasília, Unesco, 2009.
GATTI, B. A. et al. A atratividade da carreira docente no Brasil, in Estudos e Pesquisas Educacionais,
n. 1, São Paulo, FVC/Fundação Victor Civita, 2010 p. 139-210.
GATTI, B. A. Políticas docentes no Brasil: um estado da arte. Brasília: UNESCO, 2011.
GESTRADO. Grupo de Estudos Sobre Política Educacional e Trabalho Docente. Pesquisa trabalho
docente na educação básica no Brasil: sinopse do survey nacional /Universidade Federal de Minas
Gerais. Belo Horizonte, 2010. Disponível em: http://www.trabalhodocente.net.br/images/publica-
coes/28/SinopseSurveyNacional_TDEBB_Gestrado.pdf. Acesso em: 25 jan. 2016.
ROLDÃO, M. C.; Função docente: natureza e construção do conhecimento profissional. Revista
Brasileira de Educação, v. 12, n. 34, jan/abr. 2007.
TARDIF, M. A profissionalização do ensino passados trinta anos: dois passos para a frente, três para
trás. Educ. Soc., Campinas, v. 34, n. 123, p. 551-571, jun. 2013. Disponível em: http://www.scielo.br/
scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302013000200013&lng=pt&nrm=iso

Livro Coordenação Pedagógica.indb 202 22/10/2018 14:27:37


Perfil discente e repercussões 1 5
de um núcleo de educação
de jovens adultos (NEEJA)

Graziela de Lourdes Demétrio Nunes


Luciano Bedin da Costa

INTRODUÇÃO

Todo amanhã se cria num ontem, através de um hoje. De modo que nosso futuro
baseia-se no passado e se corporifica no presente. Temos de saber o que fomos e o
que somos para saber o que seremos. (FREIRE, 2010, p. 33)

A educação, enquanto processo de ensino-aprendizagem, envolve uma relação


de coparticipação entre docentes e discentes, em que fatores emocionais e sociais,
muitas vezes, superam os cognitivos. Isso nos leva a pensar que, paralelamente aos
conhecimentos técnico-didáticos acerca de seu ofício, cabe ao professor o manejo
de habilidades que muitas vezes ultrapassam os domínios intrínsecos a uma sala
de aula ou de uma gestão educacional. No caso da Educação de Jovens e Adultos
(EJA), pelo perfil específico de sua população, parece-nos que essa situação torna-
-se ainda mais evidente. Por lidar em sua grande maioria com adultos – ainda que
estejamos a presenciar um fenômeno de juvenilização, conforme pesquisas de Silva
(2010), Rodrigues (2012) e Camassola & Stecanella (2013) –, o trabalho com EJA
acaba mobilizando uma série de fatores, levando à desconstrução de tantos outros.
É o caso da própria noção de pedagogia, muitas vezes aplicada a toda e qualquer
atividade docente, levando-nos a esquecer que não são somente crianças que fazem
parte de nossa atividade de professores, mas que muitas vezes – como no caso da
EJA – estamos diante de sujeitos adultos ou mesmo idosos que necessitam de uma
compreensão e manejos andragógicos (PASSANO, 2011).
Este artigo pretende investigar algumas linhas acerca da Educação de Jovens
Adultos, mais especificamente do Núcleo de Educação de Jovens Adultos (NEEJA),
modalidade de ensino oferecida pela Secretaria de Educação do Rio Grande do
Sul, que tem por característica atender a essa população a partir da perspectiva
da Educação à distância (EAD), oportunizando exames supletivos fracionados na
modalidade de EJA.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 203 22/10/2018 14:27:37


204 Perfil discente e repercussões de um núcleo de educação de jovens adultos (NEEJA)

RETORNANDO AO ESTUDO

Para um adulto, voltar a estudar nem sempre é uma tarefa fácil. Mesmo com as
facilidades que a EAD apresenta, ele acaba por se deparar com algumas dificuldades
que fazem parte do momento da sua vida, como, por exemplo:
• a dificuldade em conseguir administrar o seu tempo para o estudo, pois
trabalha, tem família ou está fazendo outro curso técnico;
• a falta de uma metodologia de aprendizagem direcionada à sua fase da
vida (andragogia), em que o importante é saber por que e para que ne-
cessita aprender determinado conteúdo;
• a sua situação financeira, em que é necessário compensar os custos de
sua vida junto aos dispêndios ligados à educação (passagens de ônibus,
materiais didáticos, alimentação, etc.).
No entanto, quando consegue chegar à sala de aula, o adulto estudante costu-
ma enfrentar outras dificuldades: na maior parte das vezes está distante da escola
há muitos anos – às vezes nunca a frequentou. Esse fator o faz sentir-se excluído,
intimidado por não saber o que socialmente se espera que um adulto de sua idade
saiba. A própria modalidade EAD, aparentemente facilitadora, impõe determinadas
dificuldades, exigindo disciplina e comprometimento, valores que, pela sua história
de exclusão educacional, tornam-se difíceis de serem levados à risca.

O NÚCLEO DE EDUCAÇÃO DE JOVENS ADULTOS (NEEJA)

Uma opção de EAD que tem sido bastante procurada por alunos que preci-
sam e querem terminar seus estudos é o Núcleo de Educação de Jovens Adultos
(NEEJA), modalidade de EJA oferecida pela Secretaria de Educação do Estado do
Rio Grande do Sul (SEC/RS). A primeira experiência nesse tipo de modalidade
deu-se em 1984 através dos NEEJAs Prisionais. A Lei nº 7.210, de 11 de julho de
1984, chamada Lei de Execução Penal, previa a assistência educacional ao preso
e internado, sendo obrigatório o ensino fundamental a essa clientela. No entanto,
foi somente em 2003 que o NEEJA foi efetivamente constituído no estado do Rio
Grande do Sul, com a finalidade de proporcionar, por meio de uma modalidade
EAD, uma educação a jovens e adultos que não tiveram a chance de iniciar ou
continuar seus estudos regularmente. Atualmente os NEEJAs têm passado por
reformulações em seus regimentos com a finalidade de unificá-los, operando por
meio de duas grandes frentes:
1) atividades de apoio em que não é cobrada a presencialidade;
2) exames supletivos fracionados.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 204 22/10/2018 14:27:37


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 205

De acordo com informações disponíveis no site da Secretaria de Educação


do Rio Grande do Sul:
O NEEJA é um estabelecimento de ensino que não se caracteriza como uma “escola”,
mas um espaço educativo onde a oferta de exames supletivos fracionados é feita
ao jovem e adulto (...) O ingresso ao NEEJA é caracterizado como uma inscrição, a
exemplo dos exames supletivos da SEC (...) O NEEJA representa para o candidato
oportunidade de certificação de estudos, onde ele organiza seus momentos de
aprendizagem e avaliação formais na instituição, sem necessariamente se vincular
a ela com a obrigatoriedade da frequência, exigida nos cursos presenciais1.

Como supracitado, NEEJA é um estabelecimento credenciado e direcionado


a oportunizar exames supletivos fracionados na modalidade de EJA. Para realizar
a sua inscrição, o candidato deve ser maior de 18 anos, e lhe são ofertadas três
opções de exames:
1) por componente curricular (o candidato faz um exame para cada disciplina);
2) por área de conhecimento (o candidato faz um exame para cada área de co-
nhecimento);
3) por uma prova única (o candidato faz um exame para concluir o ensino fun-
damental ou médio). Caso o aluno tenha feito a prova do Exame Nacional
do Ensino Médio (ENEM), com a apresentação do histórico emitido pela Se-
cretaria de Educação, podem-se aproveitar as disciplinas já concluídas, não
sendo necessário fazê-las no NEEJA.
O turno de trabalho realizado junto ao NEEJA (manhã, tarde ou noite) está
organizado em quatro períodos de 50 minutos cada, em que os dois primeiros são
destinados à atividade de apoio e os dois últimos, à realização dos exames. Por
ser uma modalidade de EAD, o aluno não tem a obrigatoriedade de frequentar a
atividade de apoio. No entanto, quando o aluno se dispõe a comparecer, encontra
um professor (da disciplina que ele escolheu para atividade de apoio) disponível
a auxiliá-lo em suas dúvidas e dificuldades, sendo igualmente disponibilizados
polígrafos e/ou lista de conteúdos para nortear seus estudos. Como na maioria
das vezes esta é a primeira vez em que ele está estudando os conteúdos que serão
cobrados nos exames supletivos, o professor acaba por fazer um breve resumo do
conteúdo. A forma de condução da atividade de apoio fica a critério de cada profes-
sor, lembrando sempre que a prioridade é ajudar o aluno a resolver seus problemas
e dúvidas em suas especificidades. Quanto aos exames, ele os fará respeitando seu
próprio tempo, quando se sentir preparado ou apto, podendo repeti-los tantas vezes
quanto for necessário para sua aprovação. Por tais razões, costuma-se dizer que o
aluno do NEEJA é “flutuante”, aparecendo fisicamente na instituição em momentos
bastante específicos, muitas vezes apenas no momento da realização dos exames.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 205 22/10/2018 14:27:37


206 Perfil discente e repercussões de um núcleo de educação de jovens adultos (NEEJA)

No entanto, ele só irá receber o certificado após ser aprovado em todos os exames
– um processo que pode perdurar por anos. E essa demora se dá por uma soma de
fatores, dentre os quais presenciamos:
• falta de tempo para estudar ou realizar os exames;
• reprovação contínua em um mesmo exame;
• imprevistos em relação à família ou ao emprego;
• dificuldades emocionais.

PERFIL DO ESTUDANTE DO NEEJA

A pesquisa que norteia a elaboração deste artigo foi produzida a partir de um


Trabalho de Conclusão do Curso de Pós-Graduação em Coordenação Pedagógica
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFGRS defendido em 2016 no
polo de Santo Antônio da Patrulha (RS). No período de 24 de junho a 31 de julho de
2015, foram distribuídos 400 questionários aos alunos do NEEJA Cardeal Alfredo
Vicente Scherer, localizado na Rua Vigário José Inácio, no Centro de Porto Alegre/
RS. Trata-se de um local com uma média de 120 alunos que se inscrevem por semana
na busca da conclusão dos seus estudos com os mais diversos objetivos. Ao todo
foram contabilizados 312 questionários respondidos acerca do perfil do candidato
do NEEJA. Abaixo, serão apresentados alguns dados e gráficos referentes ao perfil
discente, juntamente com algumas discussões e inferências possíveis a partir deles.

Gráficos 1 e 2 – GÊNERO E IDADE

Fonte: elaborado pela autora.

Conforme os gráficos, ainda que tenhamos uma prevalência do sexo femini-


no (53%), o que se percebe é uma distribuição de gênero equilibrada. No que diz
respeito à faixa etária dos estudantes, percebe-se a prevalência do público entre
19 e 30 anos (56%), sendo 23% relacionados ao período entre 31 e 50 anos e 4%

Livro Coordenação Pedagógica.indb 206 22/10/2018 14:27:37


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 207

com 51 anos ou mais. No entanto, há um número expressivo de estudantes com


idades entre 15 a 18 anos (17%), dado que parece corroborar com as teses acerca
do fenômeno supracitado de juvenilização do EJA.

Gráfico 3 – OCUPAÇÕES, RENDA, PERÍODO SEM


ESTUDAR E HISTÓRICO DE ESTUDO

Fonte: elaborado pela autora.

O gráfico acima nos traz a confirmação de outro aspecto importante quando


falamos de EJA: 72% dos estudantes trabalham, sendo que 76,69% possuem renda
familiar entre 1 a 3 salários-mínimos. Estes são indicadores relevantes e que refor-
çam a importância social de uma modalidade de ensino voltada a jovens e adultos
historicamente excluídos da educação formal. Outro dado relevante e que contribui
nesse sentido é o tempo em que o estudante parou de estudar: 57,75% estão distantes
da escola entre dois a quinze anos. 66,77% dos sujeitos, antes de frequentar o NEEJA,
estudavam em uma instituição estadual, o que, mais uma vez, prova que são candi-
datos de classe média baixa e que procuram por uma melhor oportunidade de vida.

Gráfico 4 – OBJETIVOS DO ESTUDANTE AO PROCURAR O NEEJA

Fonte: elaborado pela autora.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 207 22/10/2018 14:27:38


208 Perfil discente e repercussões de um núcleo de educação de jovens adultos (NEEJA)

Uma característica recorrente do estudante de EJA é o pragmatismo em


relação aos seus estudos. Assim, quando procuram o NEEJA para concluir seus
estudos, é porque já têm objetivos imediatos que pretendem alcançar. Conforme
gráfico anterior, 28% dos estudantes têm como objetivo imediato concluir o nível
de estudo para acabar o curso em que estão matriculados; 22% procuram o NEEJA
para garantir o emprego atual; 17% querem conquistar uma promoção no local de
trabalho ou um emprego melhor. Apenas 4% dos sujeitos participantes da pesquisa
relataram ter por objetivo apenas a conclusão do ensino médio.

TEMPO DISPONÍVEL PARA AS ATIVIDADES DE APOIO

Um dos problemas citados no presente trabalho fica bastante nítido ao ana-


lisarmos essa questão: no item do questionário Tempo disponível para frequentar
a atividade de apoio, 41,48% dos alunos responderam não ter tempo disponível
para essa atividade, tendo em vista suas ocupações familiares e de trabalho (esse é
um fator que contribui para o que havíamos chamado de público “flutuante”). No
entanto, 44,31% dos alunos afirmam que a atividade de apoio facilita na aprovação
das avaliações, e que dela já fizeram uso com sucesso. A questão que nos parece
importante de ser pensada é que a pouca participação nas atividades de apoio não
se dá por uma desvalorização desse espaço pedagógico, mas por fatores extrae-
ducacionais e que acabam por dificultar a aceleração das aprovações no histórico
dos alunos.

HÁBITOS

Gráfico 5 – Frequência que utiliza a internet para estudar

Fonte: elaborado pela autora.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 208 22/10/2018 14:27:38


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 209

Gráfico 6 – Acesso a internet, onde?

Fonte: elaborado pela autora.

Gráfico 7 – Hábito de leitura

Fonte: elaborado pela autora.

O hábito da leitura de livros e brochuras está cada vez mais sendo substituído
pela internet, como constatamos na pesquisa: 50% dos alunos não leem livros, mas
utilizam a internet. Quanto ao acesso à internet, 49% têm internet em casa e 33%
possuem internet no celular. No entanto, 7% dos estudantes não possuem acesso,
dado que ainda revela a exclusão digital a que estamos submetidos. Por se tratar de
uma modalidade EAD, o trabalho do docente junto ao NEEJA acaba envolvendo
o incentivo ao uso da internet como material de apoio. Quanto à frequência de

Livro Coordenação Pedagógica.indb 209 22/10/2018 14:27:39


210 Perfil discente e repercussões de um núcleo de educação de jovens adultos (NEEJA)

utilização da internet, 51,67% dos alunos fazem uso uma a duas vezes por semana
para pesquisar conteúdos ou assistir a vídeo-aulas de assuntos relacionados com
as disciplinas.

SÍNTESE DO PERFIL DO ESTUDANTE DE NEEJA

De modo a tornar mais nítido o resultado desta pesquisa, elencamos quatro


características fundamentais que nos parecem importantes no que diz respeito ao
perfil do estudante de NEEJA:

A MAIORIA DE ADULTOS JOVENS QUE SE


INSCREVEM NA EJA SÃO DO SEXO FEMININO

A desigualdade entre os sexos é uma luta que vivemos até os dias atuais. As
mulheres eram obrigadas a deixar a escola prematuramente devido a diversos mo-
tivos, como casar, engravidar, ajudar a mãe a cuidar dos outros irmãos, trabalhar
para ajudar a família, etc. – fatores ainda bastante recorrentes. No entanto, e para
nossa grata surpresa, muitas mulheres inscritas no NEEJA relatam o prazer de es-
tudar como força-motriz de sua matrícula junto ao NEEJA, gesto que consideramos
politicamente significativo no empoderamento feminino na sociedade.

A MAIORIA DAS ALUNAS E ALUNOS QUE SE INSCREVEM


NA EJA SÃO TRABALHADORA(E)S COM BAIXA RENDA

Não ter a oportunidade de estudar no tempo certo acaba produzindo um re-


flexo direto na forma como os sujeitos se situam e se distribuem no que diz respeito
ao trabalho. Esse é um fator circular e que acaba produzindo efeito sobre si mesmo:
pelo fato de não estudarem, os sujeitos acabam se submetendo a subempregos,
reduzindo, pois, as chances de um retorno aos estudos. Por trabalharem demais e
em condições desfavoráveis, os sujeitos acabam não tendo disponibilidade, energia
e motivação para retornarem aos estudos.

A MAIORIA DOS ALUNOS E ALUNAS QUE SE INSCREVEM


NA EJA ESTÃO AFASTADO(A)S HÁ TEMPOS DA ESCOLA

O fato de estar distante da escola há muito tempo faz o(a) aluno(a) se sentir
diferente, atrasado(a) em relação aos adolescentes e jovens matriculado(a)s. Os
docentes de NEEJA entrevistados pela pesquisa relataram que esse fator acarreta a
própria postura aparentemente passiva desse tipo de estudante. Muitas vezes, por se
sentir envergonhado e subjetivamente excluído, o estudante acaba por não se expor

Livro Coordenação Pedagógica.indb 210 22/10/2018 14:27:39


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 211

junto à turma, dificultando seu próprio processo de aprendizagem – dado que a troca
entre os pares é um dos fatores pedagogicamente facilitadores de aprendizagem.

O NEEJA É VISTO COMO UMA ESPÉCIE SALVAÇÃO

O aluno que não teve a educação garantida na infância e adolescência precisa


de um retorno rápido, fator que nem sempre é favorável à aprendizagem. O que se
percebe em boa parte dos alunos matriculados no NEEJA é uma espécie de “última
cartada”, para que possam se manter no trabalho, para que obtenham progressão
na carreira ou mesmo para que possam ingressar no mercado de trabalho. Nes-
ses casos, o NEEJA é visto como uma espécie de salvação: é o início de uma vida
melhor e mais digna, ainda que para alguns represente o fim de uma jornada, na
qual o conhecimento adquirido completa um ciclo de trabalho e luta ao longo de
toda uma vida.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo de nossa pesquisa, deparamo-nos com dados que extrapolam a


dimensão meramente quantitativa. Ainda que os questionários possam nos for-
necer gráficos – com numerais e percentagens –, o que parece desprender-se é a
expressividade social do que se apresenta diante de nós.
O trabalho com jovens e adultos, em especial com o NEEJA, é mobilizador em
vários sentidos. Não estamos somente nos referindo à desvalorização do docente
por parte do Estado (temática que, com certeza, daria uma relevante pesquisa),
mas ao trabalho intrínseco e necessário desse mesmo docente junto ao público
atendido. Por trabalharem com estudantes socialmente apartados, com um his-
tórico de repetências e abandonos escolares, cabe aos professores de NEEJA uma
visualização mais nítida acerca do perfil de seus discentes, de modo que possam
romper com determinados preconceitos e não repetir práticas de segregação que
acabam por afastar ainda mais esses alunos da realidade educacional.
A oportunidade de discutir e pesquisar um tema como este em um Curso
de Pós-Graduação em Coordenação Pedagógica se fez, para nós, vital, ampliando
paradigmas outros que não apenas aqueles atrelados à pedagogia e ao ensino de
crianças e adolescentes. Instaurar-se em uma dimensão de aprendizagem an-
dragógica parece-nos um ato político dos mais nobres, tendo em vista a imensa
população de nosso país historicamente excluída dos processos de escolarização
ao longo de suas vidas.
Em tempos quando a Educação de Jovens Adultos parece receber ataques por
supostamente não apresentar resultados imediatos, é importante que, enquanto
professores e pesquisadores, saibamos olhar para nosso público e dimensionar

Livro Coordenação Pedagógica.indb 211 22/10/2018 14:27:39


212 Perfil discente e repercussões de um núcleo de educação de jovens adultos (NEEJA)

suas singularidades. O fato de a maioria dos estudantes de NEEJA serem mulheres


é um fator que diz muito, assim como a condição de baixa renda, de terem entre
19 e 30 anos e de terem de conciliar o estudo com o trabalho e atividades de casa.
Esses não são, para nós, dados frios e manipuláveis. Trata-se, portanto, de sabermos
disso para (com isso) apostarmos em uma educação de jovens e adultos ainda mais
significativa e, quiçá, socialmente mais valorizada e aquecida.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Na-
cional. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília/DF, 23 dez. 1996.
CAMASSOLA, Valessa; STECANELA, Nilda. A juvenilização da EJA no Ensino Médio: um estudo
no município de São Marcos. Anais do Seminário Diálogos com a Educação: desafios da EJA con-
temporânea. Universidade de Caxias do Sul, 2013. Disponível em: <http://ucsobservatorios.com.br/
uploads/2013/EJA_e_diversidade/Trabalho/08_13_35_A_JUVENILIZACAO_DA_EJA_NO_EN-
SINO_MEDIO.pdf>. Acesso em: 28 maio 2017.
FREIRE, Paulo. Educação e mudança. São Paulo: Paz e Terra, 2010.
PASSANO, Maria. Andragogía, educación durante toda la vida. Revista Uruguaya de Cardiología,
Montevideo, v. 26, n. 3, p. 171-172, dic. 2011. Disponível em: <http://www.scielo.edu.uy/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S1688-04202011000300001&lng=es&nrm=iso>. Acesso em: 31 maio
2017.
RODRIGUES, Delminda. A juvenilização dos alunos da EJA e do PROEJA. In: ARAÚJO, Judith.
M. VALDEZ, Guiomar (Org.). PROEJA: refletindo o cotidiano. Campos dos Goytacazes: Essentia,
v. 1, 2012.
SILVA, Líbia Suzana. Juvenilização na EJA: experiências e desafios. Trabalho de Conclusão de
Curso. Universidade Federal do Rio Grande dos Sul, 2010. Disponível em: <http://hdl.handle.
net/10183/27414>. Acesso em: 28 maio 2017.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 212 22/10/2018 14:27:39


As implicações da lei de gestão 1 6
escolar democrática no município de
Novo Hamburgo – RS no trabalho
da coordenação pedagógica

Delci Heinle Klein


Miriam Mallmann Prates

Este artigo é parte integrante da pesquisa1 realizada com professores, coorde-


nadores e ex-coordenadores da rede municipal de Novo Hamburgo, RS, município
do Vale do Rio dos Sinos, a partir de inquietações acerca do que chamamos de im-
plicação da Legislação de Gestão Democrática Escolar na construção da identidade
e dos fazeres da coordenação pedagógica das escolas desse município.
A Legislação de Gestão Escolar Democrática2 do município prevê a eleição
direta de diretores a cada três anos, permitindo uma única reeleição. Uma vez eleito,
o (a) diretor (a) tem a prerrogativa de indicar o (a) coordenador (a) pedagógico (a).
Assim, o tempo de exercício na função de coordenação se dará, a princípio, em três
anos, sendo prorrogável por mais três anos, caso o (a) diretor (a) seja reeleito (a) e
apresente o desejo de continuar a parceria da equipe diretiva com esse profissional.
É importante lembrar que até o momento o (a) coordenador (a) pedagógico (a)
não consta da composição da chapa inscrita na eleição3.
Ao analisar os dados sobre a eleição direta de diretores das escolas municipais,
ocorrida no município no final do ano de 20144, constatamos que em cinquenta

1 Pesquisa realizada no período de 2015 a 2016, como parte integrante da Monografia “As Impli-
cações da Lei de Gestão Escolar Democrática em um município do Vale do Rio dos Sinos-RS no
trabalho da coordenação pedagógica”, do Curso de Especialização em Coordenação Pedagógi-
ca/UFRGS, orientado pela Prof.ª Dra. Delci Heinle Klein.
2 A gestão democrática da escola pública é materializada e ganha força de lei na Constituição de
1988 e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996. O artigo 206 da Constituição apresenta
a gestão democrática do ensino público como um princípio base no qual o ensino será minis-
trado. No município de Novo Hamburgo, a Gestão Escolar Democrática foi instituída pela Lei
nº 2. 015/2009, de setembro de 2009, para regulamentar a gestão escolar das escolas da rede
municipal de ensino.
3 O Art. 3º da Lei nº 2.015/2009, de setembro de 2009, estabelece o processo de eleições diretas,
apontado como funções a serem compostas nas chapas inscritas, a direção e vice-direção das
escolas da Rede Pública Municipal de Ensino.
4 Em 2014, ocorreu a eleição direta de diretores em 75 escolas da rede municipal de ensino.

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214 As implicações da lei de gestão escolar democrática no município de Novo Hamburgo...

e duas escolas municipais (69,3%) ocorreu a troca de equipes diretivas, devido


aos ex-diretores não poderem concorrer, respeitando-se a legislação vigente no
município, e apenas vinte e três diretores (30,7%) foram reconduzidos ao cargo.
Percebeu-se ainda que, em sessenta e um por cento (61%) das escolas, ocorreu tam-
bém a mudança do profissional que exercia a coordenação pedagógica na instituição
de ensino, ou seja, mais da metade das novas equipes diretivas da rede municipal
compõem sua formação com novos coordenadores pedagógicos na escola.
Inquietados com esses dados, buscamos investigar possíveis consequências,
a médio e longo prazo, na caminhada pedagógica de cada escola que, de três em
três anos, vivencia a troca de Coordenador Pedagógico. Essa investigação ocorreu
de agosto de 2015 a abril de 2016, entrevistando cinco coordenadores, cinco ex-
-coordenadores e quatro professores, através de entrevista semiestruturada.

A PRÁTICA DA COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA

Ao olhar para o trabalho da coordenação pedagógica somos remetidos di-


retamente para a observação das interações e reflexões no interior do ambiente
escolar e também fora dele, visto que é nesse cenário que se consolida a construção
da identidade desse profissional. Assim, buscamos focar as análises nos processos
que se estabelecem quando um professor5assume a coordenação pedagógica, a
fim de compreender como se dá a construção da identidade desse profissional
no exercício de sua atividade, de maneira a permitir uma ação que se aproxima
daquela que é considerada autêntica, conforme Josso (2004), uma vez que cada
profissional assume posicionamentos distintos frente aos desafios e funções que a
ele se apresentam. O integrante da equipe da gestão da escola que vinha exercendo
sua profissão no papel de professor, marcado e constituído por atribuições diversas
às da coordenação pedagógica, ao assumir a coordenação, necessita colocar-se em
outra posição, redirecionando e ampliando seus olhares e suas significações.
Berger e Luckmann (1985, p. 228) nos apresentam “identidade como um
fenômeno que deriva da dialética entre um indivíduo e a sociedade”. Esse conceito
leva-nos a entender que a identidade da coordenação pedagógica é construída no
exercício da função, a partir das interações que são estabelecidas com professores,
alunos, pais e demais membros da equipe diretiva, no desempenho de seu trabalho.
As vivências do cotidiano escolar e as diferentes relações que se apresentam fazem
surgir o campo da ação em que o(a) coordenador(a) pedagógico(a) se constitui. As
experiências vivenciadas diariamente na escola e em seu contexto exercem um papel
central na sua constituição, aparecendo como possibilidade de apreender o que se

5 O Regimento Escolar das escolas deste município aponta que o Coordenador Pedagógico pre-
cisa ser membro do magistério público municipal, habilitado em curso superior de Pedagogia
ou Pós-Graduado em Supervisão Escolar.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 214 22/10/2018 14:27:39


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 215

vive, de forma a possibilitar novas relações que permitem construir conhecimen-


tos e uma subjetividade que corrobora com a prática de coordenação pedagógica.
Nessa perspectiva, a caminhada da construção da identidade do(a) coordenador(a)
pedagógico(a) inclui, além da formação continuada em serviço, as interações
vivenciadas na escola diariamente. O movimento, na busca pela construção de
conhecimentos teóricos e técnicos, aliado a uma postura que valoriza as intera-
ções e o crescimento tanto pessoal como profissional, acaba definindo elementos
estruturais na busca por uma ação inovadora e criativa, pois, como afirma Josso,
A conquista de uma subjetividade autêntica, isto é, refletida, capaz de autonomi-
zação e de criatividade apresenta-se, a partir daí, como uma conquista correlata e
indispensável para a emergência de um sujeito consciente da sua quota de respon-
sabilidade, não apenas em relação a essas escolhas de integração sociocultural, mas
igualmente nas atribuições que lhes atribui (JOSSO, 2004. p. 191).

Considerando que é na interação com o outro que a construção da identidade


profissional se torna possível, acreditamos que o tempo surge como fator funda-
mental, pois os diálogos, as reflexões e a formação continuada são ancorados em
um trabalho minucioso, sem atropelos, sustentado nas trocas, em ações conscientes
das responsabilidades inerentes à função. Um dos grandes desafios enfrentados
pelo coordenador é o de apoiar as práticas pedagógicas dentro da escola básica,
com todas as especificidades da contemporaneidade e das diferentes relações que
se estabelecem, ultrapassando o universo pedagógico.
O movimento para cruzar a linha que separa o trabalho burocrático das
fronteiras do diálogo, da reflexão e da inovação em conjunto apresenta-se frágil no
início do exercício da coordenação pedagógica; contudo, a acomodação pode vir a
inviabilizar o processo de construção da identidade profissional. A construção da
identidade pode ser pensada como um movimento constante na busca pela dife-
rença do múltiplo, como nos apresenta Silva (2014), sendo construída diariamente
na interação com o outro.
Ao observarmos atentamente as atribuições do(a) coordenador(a)
pedagógico(a) previstas no regimento6 das escolas públicas, percebemos a dimensão
do trabalho que está sob a responsabilidade desse profissional. Porém, o cumpri-
mento de forma automática e fragmentada das inúmeras atribuições previstas no
documento pode limitar uma prática consciente e criativa dentro da escola. Segundo
Silva (2014, p. 81), “a identidade, tal como a diferença, é uma relação social”, que se
constrói nas relações, inclusive de poder e força, numa disputa por espaço e escuta.
Portanto, é fundamental que haja lugar para “[..] abrir o campo da identidade para

6 O regimento das escolas do município expressa que o Coordenador Pedagógico é o profissional


que, na escola, é responsável pela gestão pedagógica, em consonância com a direção e os princí-
pios e diretrizes da mantenedora.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 215 22/10/2018 14:27:39


216 As implicações da lei de gestão escolar democrática no município de Novo Hamburgo...

as estratégias que tendem a colocar seu congelamento e sua estabilidade em xeque


[..]” SILVA (2014, p. 100), ultrapassando as atribuições expressas em regimento.
Na dança pela definição do que é e o que não é sua atribuição no exercício
da coordenação pedagógica, o(a) coordenador(a) assume posturas e ações, sendo
muitas vezes capturado(a) por aquilo que se espera dele, passando a responder
positivamente a essas expectativas. Um planejamento elaborado para criar espaços
de construção e autoria na prática diária contribui para evitar uma identidade fixa.
Segundo Silva,
Fixar uma determinada identidade como a norma é uma das formas privilegiadas de
hierarquização das identidades e das diferenças. A normalização é um dos processos
mais sutis pelos quais o poder se manifesta no campo da identidade e da diferença.
Normalizar significa eleger – arbitrariamente – uma identidade específica como o
parâmetro em relação ao qual as outras identidades serão avaliadas e hierarquiza-
das. Normalizar significa atribuir a essa identidade todas as características positivas
possíveis, em relação às quais as outras só podem ser avaliadas de forma negativa.
A identidade normal é natural, desejável, única (SILVA, 2014, p. 83).

O(a) coordenador(a) pedagógico(a) que objetiva construir autonomia, criati-


vidade e conhecimentos, há que ter espaço/tempo para que o natural/normal seja
pensado sob a ótica da diferença nas mais variadas ações produzidas, ao mesmo
tempo em que as produz como autor(a).

O TEMPO DA COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA

Assumir a postura de pesquisador(a) pode apoiar o(a) coordenador(a)


pedagógico(a) a priorizar ações que articulem diferentes possibilidades de inte-
ração, provocando questionamentos e reflexões, acompanhando, avaliando e (re)
avaliando suas ações, uma vez que cada momento vivido imprime novos desafios
e diferentes conhecimentos a qualquer pessoa.
A descrição de atribuições (pré) estabelecidas, inerentes a uma função, torna
possível pensá-la com determinadas marcas. A linguagem é formada por signos
que trazem uma significação a respeito da marca que expressam, e a marca que
carrega uma função não é a função em si, ela pode ser mais complexa e trabalhosa
do que parece. Logo, a construção do conceito da coordenação pedagógica pode
levar tempo para se efetivar no sujeito, uma vez que essa identidade não é ine-
rente à função ou à expressão coordenação pedagógica, ou seja, ninguém nasce
coordenador(a) pedagógico(a). A identidade vai sendo construída e constituída
em serviço, a partir das ações, interações e atribuições assumidas e, desse modo, a
expressão assume o sentido real. Berger e Luckmann (1985, p. 230) afirmam que
“qualquer teorização sobre identidade – e sobre os tipos específicos de identidade

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 217

– tem de fazer-se no quadro das interpretações teóricas em que são localizadas”.


Assim, surge a inquietação de como as equipes diretivas da rede pública de Novo
Hamburgo vem exercendo suas funções diariamente diante das frequentes trocas
que estão ocorrendo nos quadros das equipes pedagógicas.
A partir dos dados levantados na pesquisa, propomos uma reflexão sobre o
tempo do(a) coordenador(a) no cotidiano escolar e o tempo que leva para constituir-
-se na sua função. Noventa por cento (90%) dos entrevistados, ao comentarem sobre
o tempo de mandato previsto na legislação municipal, afirmaram considerá-lo pou-
co para desenvolver um trabalho significativo dentro de uma proposta pedagógica,
apontando como ideal o prazo de cinco anos, sendo que os outros dez por cento
(10%) consideraram o tempo razoável. Partindo do pressuposto de que a identidade
se constitui na interação com o meio e com o outro para constituir-se em trabalho,
o tempo necessário para essa construção apresenta-se como fundamental. Isso se
evidencia na fala de CA7, que afirmou:
“Para a ação do coordenador em si, ele (tempo) poderia ser maior. Porque como
eu disse, eu estou ainda construindo a minha identidade. Então, a gente está cons-
tituindo uma proposta, e precisa de mais tempo” (CA, pesquisa de campo, 2016).

A partir dos dados acessados, a fala de CA representa os noventa por cento


(90%) dos coordenadores entrevistados que referem a necessidade de um tempo/
espaço ampliado para que esse profissional possa construir sua identidade, de
maneira a desempenhar suas atribuições favorecendo a prática pedagógica no
cotidiano escolar. Cabe refletir, contudo, como o(a) coordenador(a) pedagógico(a)
poderá acompanhar o desenvolvimento dos alunos em tão pouco tempo, se esse
acompanhamento demanda a prática de observação do processo histórico da
construção da aprendizagem, olhar, escutar e interagir, além de construir novos
conhecimentos, conceitos e a possibilidade do novo para propor e formular a
formação continuada do corpo docente. Todas essas ações requerem tempo para
criar vínculos, confiança e unir forças para fazer com que as diferenças apareçam
como aliadas na construção da aprendizagem. Assim, cabe refletirmos se os três
anos previstos na legislação vigente no município são suficientes para que o(a)
coordenador(a) desempenhe suas atribuições com qualidade.
O regimento escolar prevê como atribuição desse profissional articular-se com
a comunidade escolar para promover o processo de aprendizagem do aluno e a
gestão democrática. Dada a importância dessa atribuição, desponta-se a necessidade
da elaboração de um plano de intervenção para encontrar formas de incentivar
a participação de alunos e de suas famílias e, ao mesmo tempo, buscar construir,
com o corpo docente da escola, a participação nos órgãos colegiados. O desen-

7 Ao tratar das falas dos entrevistados, serão utilizadas letras para preservar sua identidade. Será
utilizado P (para professores) e C (para coordenadores). A sequência dos mesmos será alfabéti-
ca. Ex: CA- coordenador A.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 217 22/10/2018 14:27:39


218 As implicações da lei de gestão escolar democrática no município de Novo Hamburgo...

volvimento dessas habilidades esperadas dos(as) coordenadores(as), e que dessa


forma são compreendidas e apresentadas como corretas, dependem da constituição
do(a) coordenador(a) como profissional nessa função, que se consolida no decorrer
da caminhada, cada um em seu tempo, para que possa apoiar o corpo docente,
favorecendo assim a aprendizagem dos alunos na instituição. Logo, perguntamos
que articulação se torna possível para o processo de desenvolvimento dessas habi-
lidades e aprendizagens do (a) coordenador (a), em um curto espaço de tempo, ou
se esse tempo deveria ser ampliado e, desse modo, favorecer o acompanhamento
dos professores, dos alunos e demais membros da comunidade escolar, nas suas
necessidades pedagógico-escolares.
As falas dos professores entrevistados expressam a percepção de que existe
um número elevado de trocas de coordenadores pedagógicos nas escolas, o que,
segundo eles, acarretaria uma fragilidade imposta à prática pedagógica das institui-
ções de ensino. No decorrer das entrevistas, apontaram ainda que surgem rupturas
na prática escolar e um sentimento de abandono, como vemos nas falas a seguir:

“Durante os três anos que estou na escola, vivenciei a mudança de co-


ordenador (a) pedagógica (a) por cinco vezes, e a troca de coordenador
acarreta em muitos casos na pausa do trabalho que está sendo feito e, até
prejudica o andamento da escola”. (PA, pesquisa de campo, 2016)

“Não tem continuidade no trabalho, me sinto perdida e sem apoio no tra-


balho diário e contínuo”. (PB, pesquisa de campo, 2016)

“Acho complicado, pois com as trocas me sinto abandonada. A Escola fica


sem apoio necessário, desorganizada e as propostas se perdem no cami-
nho”. (PC, pesquisa de campo, 2016)

Considerando a importância do trabalho da coordenação pedagógica para


a prática diária desenvolvida na escola, tendo em vista a necessidade de amparar
o bom trabalho docente para refletir-se no ensino-aprendizagem, consolidando
assim uma educação de qualidade na instituição, o fator tempo revela-se como um
empecilho para que o (a) coordenador (a) pedagógico (a) possa construir habili-
dades na sua prática, no sentido de conduzir com segurança uma ação formadora
na instituição.
A rotatividade dos coordenadores pedagógicos que compõem as equipes
diretivas das escolas públicas é apontada como negativa conforme vemos nas falas
trazidas, quando os professores mencionam rupturas, pausas e descontinuidades
que desassistem o seu trabalho e acompanhamento pedagógico.
Novos olhares agregam diferentes posicionamentos ao percurso. Assim,
propomos uma reflexão sobre a possibilidade de se estabelecer uma forma para
que esses profissionais tenham um período ampliado para percorrer o caminho

Livro Coordenação Pedagógica.indb 218 22/10/2018 14:27:39


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 219

necessário à construção das suas identidades, a partir da interação no trabalho


diário, viabilizando a parceria que sustenta objetivos comuns, a constante (re)visão
de práticas e o (re)pensar das crenças já instaladas.
Talvez a gestão democrática escolar8 devesse ser (re)pensada para além da
possibilidade de oportunizar a participação da comunidade escolar na decisão
sobre qual equipe diretiva vai conduzir a gestão, incluindo-se também o tempo
escolar, de modo a permitir que as interações favoreçam as múltiplas aprendizagens
que circundam a instituição educacional. Assim, o poder da legislação poderá ser
utilizado, como menciona Silva (2014), sob a cunha da diferença, evitando pro-
duzir rupturas em favor da democratização da gestão escolar, até mesmo porque
democratizar essa modalidade de gestão parece ser mais amplo que realizar uma
eleição direta para diretores.
Ao acompanharmos o processo de democratização das relações que envolvem
o funcionamento e a organização da escola, no sentido de implantar medidas na
tentativa de possibilitar que o poder seja compartilhado entre todos os segmentos
que fazem parte da escola pública, está-se caminhando para que as diferenças sejam
respeitadas e que se forme a coletividade.
Segundo Paro (2007), a escolha democrática dos diretores escolares foi reivin-
dicada por usuários e servidores da escola pública, na busca pela democratização
do espaço escolar. Contudo, essas medidas não conseguiram modificar conside-
ravelmente a estrutura da escola básica. Cabe ressaltar que essa estrutura compre-
ende todas as relações que surgem a partir do convívio social no seu interior. A
legislação regulamenta o processo, no entanto, não pode prever as formas de agir
e de posicionar-se dos diferentes segmentos da comunidade escolar. Desse modo,
quando uma legislação estipula um prazo de três anos para um mandato, impondo
que seja permitida apenas uma reeleição, acaba por limitar as interações possíveis,
fechando o tempo para que uma proposta de trabalho pedagógico se consolide.
No percurso em direção à democratização da educação, acreditamos que
não basta regulamentar a escolha de gestores escolares, criando leis que deliberem
acerca do assunto. Para alcançar os objetivos de uma administração escolar, faz-se
necessário considerarmos a instituição de ensino como um grupo social no qual
a interação é fator essencial. Pois, como aponta Paro (2007)
[…] Levar em consideração as condições que propiciem ao educando fazer-se sujeito
na prática pedagógica escolar envolve, entre outras providências, dotar a escola de
uma estrutura que esteja de acordo com essa prática democrática. É este, portanto,
o problema que se apresenta: que configuração deve ter a estrutura da escola se se

8 A democratização da gestão escolar é pensada e regulamentada no município, como sendo uma


possibilidade de realizar uma modalidade de gestão participativa, transparente e democrática
nos processos decisórios, assegurando a condição de sujeitos do processo educativo aos mem-
bros dos segmentos que compõem a comunidade escolar.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 219 22/10/2018 14:27:39


220 As implicações da lei de gestão escolar democrática no município de Novo Hamburgo...

adotar, como objetivo a ser atingido, a realização da educação como prática demo-
crática? (PARO, 2017, p. 6).

Paro (2007) leva-nos a pensar que a estrutura de que fala pode ser tomada
como um encadeamento das ações e relações na escola: coordenação/professor/
aluno/direção/processos educativos/aprendizagens. Esses encadeamentos, muitas
vezes, dependem das perspectivas adotadas pela direção e pela coordenação nos
processos escolares, numa forma de fazer que pode modificar-se conforme a equipe
gestora, tornando o tempo necessário variável para que o Coordenador Pedagó-
gico possa construir sua identidade profissional e apoiar a prática pedagógica na
instituição.
Ao destacar esses aspectos, não temos a pretensão de quantificar o tempo
necessário, pois é preciso considerar as diferenças entre os indivíduos e o fato de
que as construções ocorrem em espaços e tempos diversos, mas acreditamos na
necessidade de uma reflexão sobre o assunto, além de problematizar o espaço da
ação da coordenação pedagógica no coletivo escolar que, em um fazer conjunto
e integrado, rege o ritmo das articulações dos diferentes atores que compõem a
comunidade escolar.

REFLEXÕES E POSSIBILIDADES – POR UMA AÇÃO COORDENADORA

A legislação é criada a partir de uma intencionalidade que muitas vezes vai


além daquela que está expressa, na tentativa de controle das relações acessadas por
um determinado grupo social quanto à autoridade, mesmo que esse controle não
esteja explicitamente registrado. Logo, cabe a reflexão sobre o tempo que uma equipe
gestora leva para constituir-se na função e posicionar-se sobre algumas determi-
nações da Lei 2015/2009 e do artigo 11, o que pode nos fazer pensar se há algumas
consequências das mudanças constantes e que ainda não foram mensuradas. Talvez
haja outras implicações, como por exemplo, a incorporação administrativo-jurídica
da função gratificada no salário da equipe diretiva. Ficam as dúvidas e o desejo de
que esta pesquisa possa contribuir para lançar pontos de reflexão sobre o assunto.
A Lei Municipal 2015/2009, no Artigo 2 expressa como um de seus princí-
pios a democracia nos processos decisórios e na busca por assegurar a condição
de sujeitos do processo educativo aos diferentes segmentos da comunidade esco-
lar; contudo, no artigo 11, estabelece-se que é permitida uma única reeleição às
funções de Diretor ou Vice-Diretor. Percebe-se uma contradição entre a intenção
expressa nos dois artigos. Enquanto o primeiro artigo acena com a democracia nos
processos decisórios, o segundo limita a participação nesses mesmos processos,
impondo apenas uma recondução da equipe gestora. Há que se considerar que
a gestão democrática é algo recente e, portanto, necessita estar em permanente
análise/adequação, pois, como todo novo processo, apresenta pontos positivos

Livro Coordenação Pedagógica.indb 220 22/10/2018 14:27:39


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 221

e negativos que podem e devem ser alvo de estudos e pesquisas, no sentido de


contribuir para que possamos viabilizar avanços, não só teóricos como na prática
desta modalidade de gestão escolar.
Destacamos a necessidade de reflexão sobre quais caminhos podem ser
percorridos na construção da identidade dos coordenadores pedagógicos em um
curto espaço de tempo, uma vez que oriundos da docência terão de ter condições
de construí-la, se a cada triênio vivenciam a possibilidade ou a mudança de fato
nos rumos do caminho até então significado e percorrido na instituição. Surge
a dúvida do que será preciso estudar e debater na formação continuada de cada
escola, a fim de possibilitar que os diferentes integrantes do corpo docente possam
assumir esses papéis com uma identidade assentada na autoria e na diversidade.
Diante da necessidade do(a) coordenador(a) envolver seu grupo no processo
de construção pedagógica, imprimindo as marcas da identidade dele(a) e de cada
integrante do corpo docente, discente e da comunidade, questionamos sobre quem
se beneficia e quem é prejudicado com a organização de gestão expressa na legisla-
ção de que falamos, e como se posicionam e/ou são posicionados as crianças e os
jovens que vêm sendo atores dessas constantes mudanças. O diálogo e a reflexão
contínuos sobre a realidade expressa no atual quadro da gestão escolar da rede de
ensino podem contribuir significativamente no sentido de estabelecer possíveis
novos contornos, capazes de possibilitar discursos e práticas que considerem a
voz da coletividade, dando suporte à construção de identidades propícias à gestão
escolar democrática.
De acordo com os princípios da gestão democrática a escola é um local onde
estudantes, docentes, funcionários e comunidade experimentam a discussão e a
participação na busca por uma construção coletiva e, para tanto, necessitam trilhar
os caminhos do envolvimento com a construção da democracia na gestão escolar.
Torna-se, portanto, indispensável considerar o aspecto histórico, ético e político da
gestão escolar, bem como das ações individuais e sociais, que darão suporte não só
à gestão, como também a um currículo singular na prática de cada instituição de
ensino, em que as diferentes vozes possam ser escutadas, sem deixar de preservar
as aprendizagens das crianças e dos jovens.
Esses questionamentos buscam um olhar a respeito das implicações da Lei
2015/2009, que define a Gestão Escolar Democrática no trabalho do Coordenador
Pedagógico. Entendemos que a educação é um processo dinâmico e, portanto,
estará em um constante (re)pensar, sendo necessário estudar, debater e (re)avaliar
a legislação de que falamos, para compreender suas implicações e apontar possi-
bilidades de (re)ordenamento, se necessário.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 221 22/10/2018 14:27:39


222 As implicações da lei de gestão escolar democrática no município de Novo Hamburgo...

REFERÊNCIAS

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BERGER, P. & LUCKMANN, Th. A construção social da realidade. 5 ed. (F. de S. Fernandes, Trad.).
Petrópolis: Vozes, 1985.
JOSSO, Marie Christine. Experiências da vida e formação. São Paulo, SP: Cortez, 2004.
NOVO HAMBURGO, Lei n.º 2.015/200, de 13 de setembro de 2009. Institui a Eleição Direta para
Diretores de Escolas da Rede Municipal de Novo Hamburgo. Novo Hamburgo, 2009.
PARO, Vitor Henrique. Estrutura da Escola e Prática Educacional Democrática. Reunião Anual da
ANPEd, 30. GT5 – Estado e Política Educacional. Caxambu, 2007.
SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de Identidade: Uma introdução a teoria do currículo. Belo
Horizonte: Autêntica, 2003
SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.), Hall Stuart, Woodward Katryn. Identidade e Diferença: A perspectiva
dos Estudos Culturais. 15 ed. São Paulo: Vozes, 2014.

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Planejamento do professor 1 7
em “tempos de internet”

Daiana Gisele Rosário da Rocha


Delci Heinle Klein

INTRODUÇÃO

Planejamento e internet: uma, a primeira, faz parte da vida do homem desde


os primórdios da humanidade, e a outra surgiu muito tempo depois e evoluiu de
tal forma que parece ter-se tornado uma extensão do ser humano. Assim, pode-
-se pensar que na contemporaneidade, para estar “vivo”, o homem necessita de
ambas. As reflexões trazidas aqui integram um estudo realizado durante o Curso
de Especialização em Coordenação Pedagógica1 que buscou compreender como
vem acontecendo a relação “planejamento e internet” no âmbito escolar e como os
professores têm convivido com ambos, em favor de uma educação de qualidade.
Vasconcellos (2014) e Gandin (2007) fundamentam os estudos que discutem como
se dá a prática do planejamento nos dias atuais, e a reflexão sobre o avanço da “rede
das redes”, a internet, suas características na contemporaneidade, sua relação com
os professores, está fundamentada nos estudos de Moran (2007).
Os dados coletados na pesquisa com vinte professores indicam-nos como
vem acontecendo a prática do planejamento em tempos de internet. Este estudo
possibilita a reflexão dos profissionais da educação sobre seu planejar, e o quanto
esse processo pode qualificar (ou não) sua prática, dependendo da forma como
vem sendo (ou não) realizado.

PLANEJAMENTO: ESTAMOS “VIVOS” OU “MORTOS?”

O planejar faz parte do cotidiano do homem desde os primórdios da humani-


dade, mesmo que de forma não sistemática e sem a utilização de um instrumento
1 Curso de Pós-Graduação Latu Sensu em Coordenação Pedagógica, implementado pela Univer-
sidade Federal do Rio Grande do Sul em parceria com o Ministério da Educação. Monografia
“Planejamento do professor em “tempos de internet””, orientada pela Professora Doutora em
Educação Delci Heinle Klein.

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224 Planejamento do professor em “tempos de internet”

técnico para fazê-lo. Ao ter metas e objetivos, o ser humano planeja o que fazer
para atingi-los, traçando caminhos. Quando falamos em educação, o planejamento
é presença marcante. Algumas vezes utilizado apenas para cumprir “requisitos”,
em outras, de forma significativa para um bom trabalho escolar, constitui-se em
um dos principais assuntos de discussão e estudo nas escolas, entre os professores
e nas Secretarias responsáveis pelas Redes de Ensino. Em vários segmentos da
educação, percebe-se que os planos estão desacreditados, o que pode ser resultado
do fato de historicamente o planejamento ter sido utilizado como uma forma de
“fiscalizar” o trabalho do professor. Outros fatores que contribuem para isso são
o formalismo e a burocracia, que acabam desprestigiando o planejamento, saindo
do seu real sentido.
Na educação escolar, o planejamento acontece em diversos níveis de abran-
gência. Neste trabalho será dada ênfase ao planejamento que está mais próximo
do professor e do aluno, ou seja, o plano de aula do professor, que está diretamente
ligado à sua prática e às práticas dos seus alunos. Para Vasconcellos (2014, p. 35),
“planejar é antecipar mentalmente uma ação a ser realizada e agir de acordo com
o previsto, é buscar fazer algo incrível, essencialmente humano: o real ser coman-
dado pelo ideal”. A partir dessa definição, pode-se dizer que planejar é pensar em
maneiras de atender metas e objetivos, a fim de atingir aquilo que se almeja, é uma
atividade, um processo que faz parte do ser humano e tem como objetivo chegar a
uma ação que seja eficaz e inovadora, uma ferramenta que busca intervir e mudar
a realidade, um projeto de emancipação humana. Assim, “planejar, ter projetos,
portanto, é uma das grandes marcas humanas” (VASCONCELLOS, 2014, p. 67).
Nas tarefas mais comuns do cotidiano humano, o planejar está presente, pois
alterar a realidade é o grande desafio do homem. Essa ferramenta só tem valor se
transformar o que se deseja, modificando a realidade, interferindo na realidade.
Para Vasconcellos (2014), o planejar vem antes do agir. Trata-se de:
[...] antever, projetar uma ação, mas não qualquer: é uma ação a ser realizada (re-
alizar = tornar real); é uma ação, portanto, que visa um fim (age-se de tal forma
para...), e por sua vez, tanto o fim quanto a ação estão referidos a uma realidade a
ser transformada. (VASCONCELLOS, 2014, p. 79).

Do ponto de vista educacional, pode-se afirmar que o planejamento é um ato


político-pedagógico, porque carrega em si intenções e intencionalidades, mostran-
do o que se deseja realizar, o que se busca atingir. Vasconcellos (2014) aponta três
grandes concepções de planejamento2, historicamente falando. Essas concepções
podem ser alteradas de acordo com o contexto sócio-político-econômico-cultural,
e são: 1) O Planejamento como princípio prático; 2) Planejamento Instrumental/
Normativo; 3) Planejamento participativo.

2 As três concepções apontadas por Vasconcellos (2014) estão detalhadas na monografia intitula-
da: “Planejamento do Professor em tempos de internet” ( ROCHA, 2016).

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 225

O planejamento é uma prática importantíssima na realização do trabalho do


professor, ferramenta de trabalho intelectual que permite organizar seu pensamento,
tendo em vista a prática pedagógica. É um momento de tomada de decisões, de resgate
de princípios que embasarão a prática, pois permite a ele “projetar” o que irá acontecer,
refletir sobre a prática e sobre seus objetivos. Ao planejar suas aulas, o professor está
organizando seu trabalho, sua prática docente, sua ação educativa, pois é uma ferramenta
fundamental na organização e benefício de seu trabalho. Vasconcellos (2009) refere que:
O que é importante, do ponto de vista do ensino, é deixar claro que o professor
necessita PLANEJAR, REFLETIR sobre sua ação, pensar sobre o que faz antes,
durante e depois. Na busca de uma educação democrática é necessário que se tenha
um projeto bem definido nesta direção, rompendo com a reprodução do “mundo
que está dado”, pois se os professores não tiverem um projeto bem claro, estarão
sendo dirigidos por alguém (VASCONCELOS, 2009)3.

No planejamento é esperado que o professor elabore uma organização de ideias


e informações, num processo de reflexão permanente a respeito de sua prática,
pois é uma prática que exige organização, sistematização e previsão, entre outros
aspectos. Considerado por muitos professores como “planejamento que importa
mesmo”, o plano de aula é a proposta de trabalho do professor para uma aula ou
conjunto de aulas (o que pode ser chamado de Plano de Unidade) e orienta o fazer
cotidiano, articulado ao Projeto de Curso e ao Projeto Político-Pedagógico da escola.
O quadro a seguir apresenta as três dimensões básicas do planejamento e os
elementos que podem estar presentes em cada uma dessas dimensões. Esse conjunto
de elementos, segundo Vasconcellos, em uma mesma aula, pode se repetir diversas
vezes, de acordo com o tempo disponível.

Quadro 1 – Dimensões e Elementos do Plano de Aula

DIMENSÃO ELEMENTOS
□□ Assunto
Análise da realidade
□□ Necessidade
↕ ↕
Projeção de finalidades □□ Objetivo
↕ ↕
□□ Metodologia
□□ Tempo
□□ Recursos
Formas de mediação
□□ Avaliação
□□ Tarefa
□□ Observações
Fonte: reproduzido de Vasconcellos, 2014, p. 149.

3 Entrevista concedida por Celso dos Santos Vasconcellos à revista Nova Escola sobre o planeja-
mento escolar. Disponível em: https://novaescola.org.br/conteudo/296/planejar-objetivos Aces-
so: 02/02/16.

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226 Planejamento do professor em “tempos de internet”

O plano de aula é o planejamento que está mais diretamente ligado à prática


do professor, seu “fazer” em “sala de aula”, interferindo diretamente no processo
de construção do conhecimento, que envolve diretamente o aluno. O professor
deve contemplar as três dimensões básicas do planejamento através dos diferentes
elementos que podem constituí-lo. Assim, estará promovendo uma prática capaz de
transformar a realidade que se deseja transformar. Alguns educadores, marcados
pela experiência da elaboração de planos burocráticos, formais e controladores,
muitas vezes têm desconfianças quanto a sua importância. Fatores exteriores ou
interiores como, por exemplo, a “desistência” do próprio professor em relação ao
planejamento educacional, podem resultar na “morte” do verdadeiro trabalho peda-
gógico. Para Vasconcellos (2014, p. 36), “o ponto de partida é uma pergunta básica:
há algo em nossa prática que precisa ser modificado, transformado, aperfeiçoado?”.
Se não há nada que precisa ser mudado, não existe a necessidade de um projeto.
Se não existe o desejo, é sinal de estagnação ou, podemos dizer, de “morte”. Cabe
ressaltar que o desejo e as ideias não farão sentido se não forem colocados em ação,
tendo como perspectiva a mudança de uma realidade. Perceber essa necessidade
de mudança é muito importante, pois quem não percebe não sente a necessidade
de planejar, “está morto”.
Ao compreender o ato de planejar como uma necessidade do professor que
está “vivo”, esse profissional poderá alcançar uma ação que seja eficaz, inovadora,
uma prática de qualidade, transformadora, uma forma de organizar seu pensa-
mento quanto à prática pedagógica, de estabelecer sua síntese. É um processo
extremamente complexo, pois “trata-se da formação da consciência, do caráter e
da cidadania, ao mesmo tempo, de 20, 30, 40 pessoas, por isto exige também um
planejamento à altura” (VASCONCELLOS, 2014, p. 45), não podendo ser tratado
na improvisação, nem com sistemas burocráticos, quando “cobranças autoritárias”
podem tornar o planejamento do professor mera reprodução do livro didático ou
de outros planos.

INTERNET: FERRAMENTA TECNOLÓGICA


DA CONTEMPORANEIDADE

Internet – uma grande rede de computadores interligados pelo mundo inteiro,


independentemente do tipo de máquina que está sendo utilizada, promovendo
a conectividade; uma “rede de redes”, sendo necessário, para manter essa multi-
-compatibilidade, um conjunto de protocolos e serviços em comum, permitindo
que os usuários a ela conectados possam ter acesso a serviços e informações mun-
diais. A internet não possui um único dono, nem um gerenciamento centralizado,
mas uma reunião de milhares de redes e organizações individuais que colaboram
entre si, dirigindo o tráfego da internet para que as informações possam percorrê-

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 227

-las, sendo administradas e sustentadas pelos próprios usuários, a partir de um


acordo geral sobre alguns itens, tais como procedimentos de internet e padrões de
protocolos. Atualmente é impossível pensar em um mundo sem internet. Dados
do IBGE apontam que, em 2013, metade dos brasileiros, de dez anos de idade ou
mais, acessaram a internet, ou seja, 86,7 milhões de pessoas. A internet tornou-se
uma extensão do ser humano. “O mundo virtual é uma extensão do nosso mundo
físico, e se integra o tempo todo” (MORAN, 2013)4, permitindo acesso a um mar
de informações textuais e audiovisuais que se entrelaçam, uma conduz à outra. A
inserção nessa rede de redes passou a ser uma realidade até para as crianças. É a
mídia mais aberta e descentralizada, é um verdadeiro fenômeno mundial e tem
causado enormes transformações nas comunicações, comércio, trabalho e entre-
tenimento, produzindo um grande impacto no comportamento humano.
Muitos são os impactos positivos da internet na nossa vida: vivemos em um
tempo em que o espaço, a distância física já não é mais problema para que as pessoas
se comuniquem em tempo real, pois todos podem estar virtualmente conectados.
“As paredes das escolas e das universidades se abrem, as pessoas se intercomunicam,
trocam informações, dados, pesquisas” (MORAN, 2013). Temos acesso imediato
a uma enorme quantidade de informações e serviços, qualificando o uso do nosso
tempo. O computador com acesso à internet permite a pesquisa, a simulação de
situações, a descoberta de novos conceitos, a troca, o diálogo e a criação indivi-
dual ou coletiva. Apesar dos impactos positivos, a internet também tem causado
transtornos. O uso descontrolado da internet na vida das pessoas pode colocar o
trabalho e as relações das pessoas em risco. Muitos casos de dependência tecnológica
têm surgido, pessoas que acabam com dificuldade de administrar o próprio tempo
e enfrentam transtornos ligados ao isolamento, o que tem aumentado a demanda
em consultórios psicológicos.
A internet pode ser uma importante ferramenta da escola, do trabalho reali-
zado pelo professor, pois está presente em muitos sentidos da vida e não é possível
pensar um modelo vivo de aprendizagem distante da vida. Mas como o acesso a
ela pode interferir na prática do professor? Segundo Moran, “as tecnologias nos
ajudam a realizar o que já fizemos ou desejamos. Se somos pessoas abertas, elas nos
ajudam a ampliar nossa comunicação; se somos fechados, ajudam a nos controlar
mais” (MORAN, 2007, p. 27-28).
As propostas de trabalho e o uso desta tecnologia mudarão conforme o perfil
do professor e seu desejo ou não de que elas sejam inovadoras. O uso do compu-
tador, mais precisamente da internet, pode ser suporte para realidades diferentes,
de acordo com a maneira como for utilizada. Pode reforçar o ensino “tradicional”,
“convencional” ou embasar situações mais ricas, focadas na “aprendizagem signi-

4 Conversa com internautas no Portal EducaRede, realizada no dia 06 de novembro de 2013.


Disponível em: http://www.aberta.org.br/educarede/2013/05/21/jose-manuel-moran/ Acesso:
02/05/2016.

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228 Planejamento do professor em “tempos de internet”

ficativa, colaborativa e baseada em pesquisa por projetos” (MORAN, 2013). Ao


mergulharmos na sociedade da informação, percebemos que as demandas por
respostas rápidas e instantâneas são cada vez maiores, o que acaba fazendo com
que a “significação” dos resultados obtidos não seja aprofundada, ou seja, cada
vez mais se foca na quantidade de informações que acabam, na maioria das vezes,
não se tornando conhecimento efetivo, deixando de lado a preocupação com a
qualidade. Para Moran, “a tecnologia nos atingiu como uma avalanche e envolve a
todos”, mas cabe ao professor definir sua “ação”, sua prática, seu “caminho” (MO-
RAN, 2007, p. 8). O professor precisa estar atento e construir estratégias para que
esse acesso à tecnologia venha favorecer a qualidade do seu trabalho, refletindo
constantemente sobre a forma como tem utilizado essa ferramenta, pois, “ensinar
é um processo social, mas também um processo profundamente pessoal: cada
um de nós desenvolve um estilo, seu caminho dentro do que está previsto para a
maioria” (MORAN, 2007, p. 13).
É importante que o professor possa refletir sobre a forma como vem utili-
zando esse recurso, buscando sempre uma educação de qualidade, transformadora
da realidade, integrando todas as dimensões da vida.

A INTERNET COMO FERRAMENTA PARA O PLANEJAMENTO


DO PROFESSOR: ALGUMAS CONSTATAÇÕES

“Estamos sem internet?”, “O que aconteceu?” Perguntas comuns nos mo-


mentos de Hora Atividade dos professores quando ocorre algum problema com o
acesso à internet da escola.
Ao observar essas questões no cotidiano da escola, busca-se compreender o
que ocorre e como ocorre a prática na hora destinada ao planejamento do professor.
O que torna a internet tão importante durante esse período de tempo, destinado
à organização e ao estudo do professor, ou seja, o momento em que realiza o seu
planejamento? Devido a sua extrema importância, esse momento é garantido por
lei aos professores, ou seja, eles têm garantido ⅓ de hora atividade de sua carga
horária, regulamentada na Resolução do Conselho Nacional de Educação/Câma-
ra de Educação Básica nº 03, de 8 de outubro de 1997 (art. 6º, IV) e praticada no
município de Novo Hamburgo-RS.
Verificar como vem acontecendo o momento de planejamento, e por que a
internet faz tanta falta, é o foco do trabalho aqui trazido. Os dados foram coletados
através de um questionário virtual, com perguntas abertas e fechadas, enviado para
cerca de 30 professores de diferentes redes de ensino (municipal, estadual e privada),
dos quais 20 responderam, sendo 18 da Rede Municipal, um da Rede Estadual e
um da Rede Privada. Os pertencentes à Rede Municipal e Privada atuam, em sua
totalidade, na Cidade de Novo Hamburgo e o da Rede Estadual atua na cidade

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 229

de Pareci Novo. Ao trazer fragmentos das entrevistas, será utilizada a seguinte


simbologia: P – para professor participante e a sequência de números cardinais,
que seguirá a ordem de envio das respostas (Ex.: P1 para Professor participante 1).
Ao serem questionados – Ao planejar suas aulas, que tipo de recursos você
utiliza (cite alguns)? – foram obtidas as seguintes respostas:

Gráfico1– Recursos utilizados pelos professores no seu planejamento escolar

Fonte: dados da pesquisa

Nas respostas trazidas pelos professores, surgem os livros, o uso da internet,


de computadores, entre outros. Apesar da presença marcante do livro e da inter-
net, as respostas mostraram que o professor lança mão de recursos variados neste
importante momento de estudo e organização de sua prática, o que pode qualificá-
-la, torná-la mais dinâmica, rica em diversidade de atividades.
Sobre quais destes recursos não poderiam faltar, as respostas enfatizaram os
recursos que esses professores consideram fundamentais e indispensáveis. As res-
postas reafirmaram as respostas da primeira pergunta e mostram o fato de que o
mundo virtual, além de fazer parte da vida dos professores, tem feito parte de sua
prática, tornando-se indispensável.

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230 Planejamento do professor em “tempos de internet”

Gráfico 2 – Recursos indispensáveis na hora de planejar

Fonte: dados da pesquisa

Quando questionados sobre o uso da internet, 100% dos professores afirmaram


utilizá-la em seu momento de planejamento, e a sua maioria, sempre a utiliza. Parece
que estamos em uma época em que o planejamento do professor já não pode ser
visto sem o acesso à internet. Segundo dois professores:

“Acredito que o acesso à internet é fundamental para o desenvolvimento


do planejamento de um professor na atualidade” (P 7, pesquisa de campo,
2016)

“A internet se tornou imprescindível, não única, mas necessária”. (P 10,


pesquisa de campo, 2016)

A partir das respostas é possível constatar que os professores buscam dife-


rentes tipos de materiais e recursos na rede das redes, compartilham experiências,
pesquisam, acessam informações e utilizam alguns materiais, na maioria das vezes
de forma adaptada, conforme a realidade da sua turma. O fato de 100% dos pro-
fessores acessarem a internet durante o seu momento de planejamento em busca
de recursos variados, muitas vezes, vindos de lugares distantes da sua realidade
e de forma mais rápida, acaba enriquecendo o seu planejamento, fato que acaba
tornando a internet tão necessária. É possível também compreender o porquê dos
questionamentos quando, por algum motivo técnico, a escola perde esse acesso à
rede. Surgem, assim, outras perguntas como: De que forma esse acesso tem contri-
buído para qualificação da prática do professor? Como esse profissional tem utili-

Livro Coordenação Pedagógica.indb 230 22/10/2018 14:27:42


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 231

zado este mar de informações? Esse uso tem servido para uma prática libertadora,
transformadora ou fortalece uma prática tradicional, uma educação bancária5?
Constatou-se que os professores buscam materiais variados na rede das re-
des: vídeos, sugestões de brincadeiras, jogos, atividades, poesias, histórias, livros
digitalizados, músicas, receitas, aplicativos (smartphone), blogs, sites educacionais,
conceitos, artigos sobre os assuntos trabalhados, imagens, sugestões de atividades,
ideias de atividades pedagógicas, jogos, músicas, livros digitalizados, enciclopédias e
dicionários, sites onde possam ser criadas atividades para os alunos, dicas, imagens
e textos. Ao serem questionados sobre o que buscam, alguns professores referiram:

“pesquisa de informações e conhecimentos” (P10, pesquisa de campo,


2016).

“sites educativos para pesquisa tanto para me atualizar como para orien-
tar os alunos em suas pesquisas” (P 13, pesquisa de campo, 2016).

“sites específicos sobre a área desejada” (P14, pesquisa de campo, 2016).

“temas e atividades referentes à proposta que estou trabalhando” (P5, pes-


quisa de campo, 2016).

“pesquisas sobre conteúdos que tenho interesse ou dos quais preciso saber
mais”. (P 17, pesquisa de campo, 2016).

As respostas apontam a busca pela qualificação no planejamento do profes-


sor. Percebe-se que os profissionais da área da educação têm buscado informação,
porém sabe-se que informação não significa aprendizagem e que a quantidade de
recursos e materiais acessados não significam a garantia da qualidade.
Ao serem questionados sobre a forma como esses recursos vêm sendo utiliza-
dos, constatamos que 90% dos professores responderam que utilizam os recursos
para orientar suas propostas, e não utilizam material acessado como se fosse uma
“cartilha”, um “livro didático” a ser trabalhado de ponta a ponta.
Sabe-se que todo material disponível na rede foi publicado por alguém, algu-
ma equipe, instituição, usuários diversos, com fins lucrativos ou não. Desse modo,
inquieta saber: Que tipo de diálogo os professores que fazem uso desses materiais
têm com seus criadores? Eles têm a preocupação de não apenas consumir, servir-se
desses materiais? Eles também contribuem com o trabalho de outras colegas? Estão
“vivos” ou “mortos”, acomodados, apenas retirando materiais e multiplicando-os,

5 Termo utilizado por Paulo Freire, no livro Pedagogia do Oprimido (Rio de Janeiro, Paz e Terra.
1970 2ª Edição, Capítulo 2, p. 62.), para definir uma educação “em que a única margem de ação
que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los”, nesta vi-
são de educação “não há criatividade, não há transformação, não há saber”. “Na visão “bancária”
da educação, o “saber” é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber”.

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232 Planejamento do professor em “tempos de internet”

repassando aos seus alunos, sem a devida reflexão? As questões apontadas necessi-
tam de reflexão e discussão quando utilizamos uma rede, com a qual cada usuário,
além de consumir, também pode colaborar.
Perguntados sobre se contribuem com atividades na rede e de que forma o
fazem, verificou-se que os professores, em sua maioria, têm contribuído com a
rede, relacionando-se com os responsáveis pelo material pesquisado e interagin-
do, produzindo e publicando materiais. As publicações dos professores vão desde
registros escritos e fotográficos de suas práticas, publicações em ambientes virtuais
para serem acessadas pelos alunos, até artigos e resultados de pesquisas.
Vasconcellos (2014) refere que o planejamento inclui a execução, isto é,
colocá-lo em prática. Ao observar os dados levantados, percebe-se que os mesmos
apontam para o fato de que os professores, ao acessarem a internet para publicar
resultados, imagens de suas práticas, estão, aparentemente, realizando o planeja-
mento em sua integralidade, podendo olhar atentamente para o processo. Sabe-se
que, do ponto de vista do ensino, é fundamental que, no decorrer do mesmo, o
professor planeje e reflita sobre a sua ação. Cabe ainda ressaltar o tempo de atuação
desses profissionais, a maioria deles com mais de dez anos de docência. Se levar-
mos em consideração o período em que a internet passou a alcançar a maior parte
da população, percebemos que esses profissionais presenciaram a seu advento, a
“avalanche” que atingiu a todos e a grande transformação que ela causou na vida
das pessoas e, consequentemente, na sociedade. Ainda é possível observar que
eles não se encontram acomodados. Também é importante referir que a cidade
de Novo Hamburgo é pioneira no trabalho com Informática Educativa, buscando
aperfeiçoamento e formação continuada de professores nessa área há muitos anos.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES – (RE)PLANEJANDO

A partir dos resultados obtidos nesta pesquisa, e levando em consideração as


características e o processo que envolve um planejamento na era da informação,
pode-se afirmar que “Planejamento e internet” tiveram grandes transformações
nos últimos anos. No entanto, ambos só terão significados efetivos se puderem
contribuir para um trabalho de qualidade do professor que leva à formação de
uma sociedade mais justa e igualitária. Para tanto, é fundamental o processo de
reflexão-ação-reflexão. Apesar da importância da internet, o que fará a diferença na
prática do professor não será o acesso farto à informação, mas o perfil e a prática
do profissional, pois, como já mencionado, o acesso à informação pode reforçar
tanto uma prática tradicional como uma prática libertadora. É possível pensar
que os professores pesquisados, em sua maioria, estão “vivos”, pois, a partir dos
dados, percebe-se que eles estão conectados e, principalmente, não se encontram
alienados, mas buscam formas para transformar o seu trabalho e o contexto em

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 233

que estão inseridos. Estar rodeado por um oceano de informações não significa
conhecimento. Segundo Moran (2007, p. 54), “O conhecimento não se passa, o co-
nhecimento cria-se, constrói-se”. A informação é integrada ao nosso referencial, ao
nosso paradigma e, quando nos apropriamos dela, tornamo-la significativa para nós.
Os resultados desta pesquisa podem contribuir para que os professores re-
flitam sobre a forma como têm utilizado a internet no momento destinado ao seu
planejamento, reestruturando, se necessário, sua prática pedagógica. Moran (2007,
p. 16) afirma que “O educador autêntico é humilde e confiante. Mostra o que sabe
e, ao mesmo tempo, está atento ao que não sabe, ao novo”. A internet pode ser uma
ótima ferramenta para aqueles professores inquietos, que estão sempre em busca de
qualificação e reflexão, pois permite ir muito longe, acessar recursos, informações e
conhecimentos especializados, em todo o mundo, avaliar sua prática e reestruturá-
-la sempre que necessário.

REFERÊNCIAS

MORAN, José Manoel. Como utilizar a internet na educação. Ciência da Informação. V. 26, n. 2.
May/Aug. Brasília, 1997.
MORAN, José Manoel. Novas tecnologias e mediação pedagógica. Campina: Papirus, 2007.
VASCONCELLOS, Celso dos Santos. Celso dos Santos Vasconcellos fala sobre planejamento esco-
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Acesso em: 22 de abr. de 2016.
VASCONCELLOS, Celso. Planejamento – Projeto de Ensino-Aprendizagem e Projeto Político-Peda-
gógico. São Paulo: Editora Libertad, 2014.

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Educação integral: 1 8
uma construção coletiva a partir de
diversos saberes e atividades formativas

Andréa Lauermann Tassinari


Joseane Leonardi Craveiro El Hawat

INTRODUÇÃO

A educação integral no Brasil passou a ser discutida, desde a metade do sé-


culo 20, quando passou-se a ver o indivíduo como um ser completo, um homem
por inteiro. A criação das escolas de turno integral efetivou-se somente a partir do
século 20. Este artigo procura mostrar como professores e alunos veem a escola de
educação integral, como autores contextualizam essa temática e o relato do modelo
de escola de Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro.
Também se discute a importância da formação docente para construir uma
escola de qualidade que corresponda às expectativas dos alunos, professores e co-
munidade escolar, onde os professores possam ter suporte técnico formativo para
promover atividades que transformem a escola em um lugar de troca de saberes.
Tal esforço se justifica a fim de que o professor crie sua identidade profissional e,
com isso, possa auxiliar o aluno a ser o protagonista de suas ações, com o intuito
de transformar-se e transformar a sociedade em que vive. Para tanto, foi realizado
um questionário com perguntas abertas e fechadas aos professores, que atuavam
no turno integral, e aos alunos do último ano de cada ciclo. Sendo assim, o objetivo
deste artigo é analisar como se deve construir uma escola de forma coletiva, sendo
fundamental a formação continuada do professor.

A ESCOLA DE TURNO INTEGRAL NO BRASIL

O primeiro registro de discussão da escola de turno integral no Brasil se dá


com a proposição de Anísio Teixeira, especificamente na década de 50, quando se
ampliou o tempo escolar dos alunos e professores com o objetivo de proporcionar
atividades que abrangessem o indivíduo por inteiro em suas necessidades.

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236 Educação integral: uma construção coletiva a partir de diversos saberes e atividades ...

Nesse período, Anísio Teixeira criou o Centro Educacional Carneiro Ribeiro,


também conhecido como Escola Parque e Escola Classe, que chamou de tempo
integral, onde ofereciam atividades variadas, alimentações e atendimentos médicos
e dentários. Sobre a proposta de Anísio Teixeira, Coelho nos diz:
O que contém a proposta de Anísio Teixeira para o então ensino primário, aqui
sintetizado em uma de suas falas, senão uma concepção curricular baseada na
formação completa do ser humano? O que significa pensar em uma construção de
currículo em que se desenvolvam atividades de cunho cognitivo, físico e estético,
alicerçadas em um horário que contemple, também, uma alimentação saudável,
levando em conta – na maioria das vezes – a ausência desse alimento na mesa da
família brasileira? (2009, p. 89).

Coelho definiu muito bem a proposta de Anísio Teixeira, porém esse modelo
de escola, conquanto tenha servido de modelo para outras escolas em outros estados,
não recebia o devido reconhecimento.
Para Nunes, a criação da Escola Parque por Anísio Teixeira tinha o seguinte
fundamento:
Em sua concepção, a escola primária deveria oferecer aos estudantes oportunidades
amplas de vida, compreendendo atividades de estudos, de trabalho, de sociabilidade,
de arte, recreação e jogos. Era preciso um novo currículo, um novo programa, um
novo docente. Tratava-se, portanto, de expandir, do ponto de vista da cultura geral, a
instrução primária – até então caracterizada praticamente como escola alfabetizadora
– para que a população, sobretudo das áreas mais pobres, se integrasse no contexto
de uma sociedade moderna. O Centro de Educação Popular ou Centro de Educa-
ção Primária na Bahia aparecia como ensaio possível de solução. (NUNES, 2009).
A ideia da escola de turno integral para todos tinha por objetivo preparar o
indivíduo para a vida em sociedade, para a convivência coletiva. (BOMENY, 2009)
No Rio de Janeiro, na década de 80, Darcy Ribeiro defendia a ideia de que
as escolas deveriam ser em tempo integral, atendendo a todos, principalmente a
população mais marginalizada, preparando-os para a vida em sociedade. Conforme
Bomeny (2009, p. 115):
Darcy Ribeiro estava convencido de que a escola pública brasileira ainda não podia
ser chamada de pública. Elitista e seletiva, ela não estava preparada para receber
quem não tivesse acesso a bens materiais e simbólicos que contam e interferem
diretamente no desempenho. Exigia da criança pobre o rendimento da criança
abastada. Remava na direção contrária à de sua clientela principal. Convencido do
desvirtuamento do projeto escolar público.
A proposta política de Darcy Ribeiro era atingir principalmente o público
infantil, priorizando a formação do indivíduo, acreditando que caberia à escola
suprir as demandas que a família e outras instituições não conseguiam atender,
tais como alimentação saudável, lazer, atendimento médico, odontológico e demais

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 237

serviços de saúde. Seu projeto apresentava um cunho político-sociológico, em que,


além de ofertar a educação, supriria aspectos como saúde, cultura, atendimento
familiar. Foram inaugurados 501 CIEPs, os quais também realizavam atendimentos
aos finais de semana. Além das atividades já citadas, os alunos também recebiam
alimentação, uniforme e banho.
Segundo Monteiro (2009, p. 41):
Essas propostas ofereceram importantes contribuições para movimentos que, di-
ferentemente de visões extremamente pessimistas em relação à escola, vista como
instrumento de reprodução das desigualdades e hierarquias sociais, passaram a
considerá-la um espaço político com potencial para lutas de resistência e para a
transformação social e emancipação de grupos dominados e oprimidos.
Os modelos de escolas realizadas por Anísio e Darcy tiveram semelhanças e
diferenças, ambas ocupavam um maior tempo escolar, aumentando as atividades
ofertadas; no entanto, Darcy Ribeiro, nos CIEPs, procurava desenvolvê-las no
mesmo espaço, integrando com as atividades escolares, visando à formação do
aluno. A proposta de Anísio Teixeira tinha o espaço escolar dividido entre Escola
Classe e Escola Parque (COELHO, 2009).
De acordo com as pesquisas bibliográficas, o conceito de educação integral
é diversificado, considerado como forma de melhor desenvolver as atividades pe-
dagógicas e preparar os alunos para a vida em sociedade; para outros, a educação
passa a ser vista como instrumento para corrigir deficiências sociais.
A autora Cavaliere diferencia o que chamaremos de Escola de Tempo Integral,
de outro modelo chamado de Aluno em Tempo Integral. No primeiro modelo, as
atividades são realizadas pelos próprios professores no ambiente escolar, que deve
ser adaptado, enquanto, no outro modelo, os alunos devem vir no turno inverso
para realizar atividades diversas, podendo utilizar outros espaços que não sejam o
escolar. (CAVALIERE, 2009).
Na região Sudeste e no estado do Rio Grande do Sul são desenvolvidos projetos
ou programas utilizando-se desses dois modelos (CAVALIERE, 2009). Isso nos faz
refletir a falta de identidade sobre a escola de turno integral, fazendo com que se
questionem as atividades que devem ser realizadas no contraturno escolar, quanto
ao ambiente, ao tempo, as atividades e quem as deve ministrar.
Para Maurício (2009, p. 26):
A concepção de educação integral com a qual partilhamos que embasa a propos-
ta de extensão do tempo escolar diário reconhece a pessoa como um todo e não
como um ser fragmentado, por exemplo, entre corpo e intelecto. Entende que esta
integralidade se constrói através de linguagens diversas, em variadas atividades e
circunstâncias. A criança desenvolve seus aspectos afetivo, cognitivo, físico, social
e outros conjuntamente. Não há hierarquia do aspecto cognitivo, por exemplo,
sobre o afetivo ou social. Por isso, as atividades a que é exposta devem envolver
multiplicidade de aspectos para benefício de seu desenvolvimento.

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238 Educação integral: uma construção coletiva a partir de diversos saberes e atividades ...

Ana Maria Monteiro conceitua a educação de tempo integral como local


em que professores e alunos permanecem todo o tempo juntos, desenvolvendo
atividades:
É necessário um planejamento integrado, realizado de forma articulada pelos dife-
rentes profissionais, uma vez que as atividades devem se relacionar de forma inter
e transdisciplinar, possibilitando o aprofundamento de questões e a ampliação dos
enfoques. (MONTEIRO, 2009, p. 38).

A escola de turno integral procura atender os alunos menos favorecidos.


A fim de incluí-los socialmente, espera-se que as atividades desenvolvidas tanto
pela escola, como pelas organizações sociais ofereçam uma melhor qualidade na
aprendizagem das crianças e jovens (GUARÁ, 2009).
Conforme Brandão (2009, p. 106-107):
Enfim, o tempo integral parece-me ser uma condição de cidadania escolar para
crianças e jovens que são, até hoje, penalizados pela baixa qualidade do ensino que
o sistema público lhes oferece, apesar das honrosas exceções. É preciso, no entanto,
que não se perca o horizonte da especificidade da instituição escolar e que não se
descure da qualidade de instalações e equipamentos didático-pedagógicos que
tornam o espaço escolar um ambiente rico de possibilidades de aprendizagem, seja
para os alunos, seja para os professores e as equipes administrativas.

A PESQUISA NA ESCOLA PORTO NOVO

Após discorrer acerca da concepção da escola de turno integral no Brasil, a


partir das propostas de Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro, passa-se neste momento
a explanar a pesquisa realizada pelo presente estudo.
A escola em que ocorreu a pesquisa está localizada no bairro Rubem Berta, na
cidade de Porto Alegre. No período da manhã, os alunos tem seu ensino regular,
como uma escola ciclada do município de Porto Alegre, atendendo da educação
infantil ao ensino fundamental séries finais, em um total de 340 alunos. Às 7 ho-
ras é servido o café aos alunos que forem chegando à escola, as aulas ocorrem das
7h30min às 16h30min ininterruptamente. No turno da tarde, os alunos a partir
do 2º ciclo realizam oficinas oferecidas pelos professores da escola, eles têm livre
adesão e praticam essas oficinas durante um trimestre.
Os alunos da educação infantil e do 1º ciclo realizam atividades com seu
próprio professor referência da turma.
No período da pesquisa, a escola contava com 34 professores e 14 funcionários
para atender os 340 alunos.
Optou-se pela Pesquisa-Ação na qual o indivíduo responsável pela pesquisa
tem uma participação direta. Assim, uma das autoras do presente artigo também

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 239

respondeu ao questionário proposto e contribuiu para as ações a serem sugeridas.


Segundo Tripp:
“A pesquisa-ação educacional é principalmente uma estratégia para o desen-
volvimento de professores e pesquisadores de modo que eles possam utilizar suas
pesquisas para aprimorar seu ensino e, em decorrência, o aprendizado de seus
alunos...” (sd, p. 444).
Essa pesquisa teve por objetivo integrar a coordenação pedagógica com os
docentes da escola, a fim de construírem uma escola que visasse ao interesse da
comunidade e oferecesse sugestões para formação dos professores e trocas de ati-
vidades para melhor atender aos alunos.
Segundo Franco (sd, p. 4):
A condição para ser pesquisa-ação crítica é o mergulho na práxis do grupo social
em estudo, do qual se extraem as perspectivas latentes, o oculto, o não familiar que
sustentam as práticas, sendo as mudanças negociadas e geridas no coletivo. Nessa
direção, as pesquisas-ação colaborativas, na maioria das vezes, assumem também
o caráter de criticidade.

Para a realização da pesquisa foram feitas entrevistas semiestruturadas, utili-


zando-se um questionário para os professores que trabalhavam no turno integral e
para os alunos do último ano de cada ciclo, contendo perguntas abertas de múlti-
plas escolhas e perguntas fechadas. O questionário perguntava se os professores já
estiveram em outras escolas de turno integral, sobre as atividades realizadas, seus
anseios frente a esse novo modelo de escola, se receberam formações docentes e que
temas gostariam de debater, a formação e tempo de atuação dos professores, bem
como quais os benefícios de uma escola de turno integral e se estavam satisfeitos
com a proposta de trabalho.
Foram contatados 23 professores, mas participaram da pesquisa 16. Os
professores que participaram da pesquisa eram aqueles que ficavam no turno da
tarde, realizando as atividades. Dos professores que responderam ao questionário,
nenhum deles tem menos de cinco anos de atuação na área da educação, tem-
-se quatro entre 5 e 10 anos; seis entre 10 e 20 anos e seis com mais de 20 anos.
Desses professores, 3 atuam apenas na educação infantil, 1 na educação infantil e
nos anos iniciais, 3 nos anos iniciais e anos finais, 2 nos anos finais, 1 somente na
gestão,1 nos anos iniciais, anos finais e equipe gestora, 4 nos anos iniciais e 1 nos
anos iniciais e equipe gestora.
Quanto à formação dos professores, 10 possuíam magistério, sendo que apenas
uma professora tinha somente esta titulação, as demais possuíam graduação em
pedagogia, letras língua portuguesa, letras língua inglesa, letras língua espanhola,
jornalismo, terapia ocupacional. Dos professores que não possuem magistério,
sua formação é em matemática, geografia e educação física. Dez dos professores
possuem pós-graduação, sendo que alguns possuem mais de uma especialização.

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240 Educação integral: uma construção coletiva a partir de diversos saberes e atividades ...

Dos 16 professores participantes da pesquisa, 9 deles já trabalharam em escolas


que tinham turno integral e 7 nunca haviam trabalhado. Dos 9 professores apenas
um achou que as escolas eram semelhantes por oferecerem alimentação e por seus
mobiliários assemelharem-se.
Através deste estudo, procurou-se saber se os professores haviam recebido
formação para atuar na educação integral, sendo que todos responderam não ter
recebido qualquer orientação.
Quando questionados acerca de quais temas consideravam relevantes para
serem tratados nas formações docentes, relacionados ao turno integral, os profes-
sores fizeram as seguintes sugestões de temas, conforme quadro abaixo.

Quadro 1– Sugestões de temas para formação docente

LEGISLAÇÃO/ TEMPO/
ATIVIDADES OUTROS
PROPOSTA PEDAGÓGICA BENEFÍCIOS
Atividades lúdicas para O turno integral deve ser
O tempo para cada atividade. Saúde dos professores.
o contraturno. obrigatório?
Atividades de Propostas de Educação Tempo de concentração dos
Saúde mental.
cooperação. integral que deram certo. alunos.
Seus valores, seu modo
Técnica de socialização. Legislação. Benefícios do turno integral.
de vida.
As diferenças na forma
Parcerias para viabilizar
Recreio diferenciado. Propostas pedagógicas. de tratar crianças e
projetos.
adolescentes.
Estudar mais o
desenvolvimento do
Atividades lúdicas e Integração entre alunos de
Papel do turno integral. adolescente, tanto do
artísticas. diferentes ano ciclos.
ponto de vista físico
quanto psicológico.

Oficinas e atividades Estratégias de ensino


Interpenetração das disciplinas
práticas que possam ser realizadas por outras escolas
escolares na vida.
desenvolvidas em aula. de turno integral.

Educação integral
Atividades lúdicas e
# Educação de tempo
brincadeiras.
integral. Conhecer melhor as Como um adolescente
comunidades com as quais aprende?
trabalhamos, na perspectiva
Atividades voltadas as Planejamento e Avaliação de antropológica, já que vamos
artes plásticas. resultados. interferir no seu dia a dia,
nas relações familiares e de
Sugestões de atividades. Metas e indicadores. vizinhança.
Estratégias de atividades
diversificadas. Inclusão.
Uso de tecnologias.

Fonte: TASSINARI, Andréa. Trabalho de conclusão do Curso de especialização em Coordenação Pedagógica


da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2016.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 241

A partir das propostas dos professores, percebe-se a constituição de quatro


grupos ou eixos que concentram as sugestões de temas a serem trabalhados nas
formações docentes. O primeiro eixo, intitulado neste trabalho de “atividades”, con-
centrou o maior número de indicações dos professores. Neste eixo estão agrupadas
as sugestões voltadas para atividades lúdicas, artes plásticas, bem como aquelas que
mobilizam o uso de tecnologia.
No segundo eixo, “legislação/proposta pedagógica”, são encontradas as
sugestões de formações que discutam a educação integral a partir da legislação,
considerando sua obrigatoriedade e o papel do turno integral.
O terceiro eixo de temas sugeridos pelos docentes foi intitulado “tempo/bene-
fício”, pois concentrou as indicações que orbitavam as questões relativas ao tempo
para realização das atividades no turno integral ou os benefícios do turno integral.
Por fim, o último eixo, “outros”, concentrou as indicações de temas de forma-
ções que não se aproximaram das propostas anteriores. No entanto, a partir desse
último grupo, é possível perceber duas preocupações por parte dos docentes: saúde
(dos professores) e a temática dos adolescentes (tratamento e desenvolvimento).
Verifica-se que, diante de tantas dúvidas frente ao novo modelo de escola, per-
manecem algumas angústias, como a temática do tratamento dos adolescentes. De
qualquer forma, o quadro com os eixos de sugestões formado nos permite visualizar
a existência das necessidades apontadas pelos professores na presente pesquisa.
Segundo Azambuja (2007, p. 47), “a formação de professores é um processo que
perpassa a dinâmica cultural, caracterizando-se como um movimento constante que
sofre mudanças conforme as necessidades apresentadas pelo espaço social vivido”.
Além das formações, também são muito importantes as reuniões pedagógicas
como um espaço de trocas, quando a coordenação pedagógica e docentes discutem
a sua melhor prática na escola para motivar os alunos e qualificar a educação.
Algumas vezes, as escolas oferecem a formação docente, mas essa não é sig-
nificativa para os docentes, pois não condiz com a realidade daquela escola. Cabe
ao Coordenador Pedagógico diagnosticar, junto com o grupo, o que de fato eles
necessitam para desenvolver um trabalho de qualidade.
Estar à frente da gestão escolar pressupõe o conhecimento dessa complexi-
dade, o que faz com que esses sujeitos vivenciem situações de desafios constantes.
Botero afirma:
Por eso, una de las propuestas para mejorar la calidad está relacionada con la
planificación de programas de capacitación dirigidos a la formación docente que
proporcionen al profesor elementos teóricos y prácticos, ubicados históricamente,
que le permitan entender su sociedad y brindar a los estudiantes las herramientas
conceptuales que orienten su destino en forma racional, crítica y autónoma. (BO-
TERO, 2009, p. 05).

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242 Educação integral: uma construção coletiva a partir de diversos saberes e atividades ...

Os professores deverão trabalhar de forma interdisciplinar, ou seja, integrando


saberes, trocando experiências, pensando no bem-estar e aprendizagem de todos.
As dificuldades financeiras encontradas em algumas escolas podem limitar a
formação continuada ao corpo docente. Uma estratégia possível é a promoção de
palestras, cursos, aproveitando a formação de alguns educadores de nossa escola
ou de escolas parceiras, que desenvolveriam esse trabalho com os professores, bem
como, aproveitando a formação e o saber dos pais e familiares dos alunos.
Promover formação continuada ao corpo docente é necessário para que se
tenha uma educação de qualidade. Outra opção seriam convênios com Instituição
de Ensino Superior e parcerias com seus profissionais para melhoria da qualidade
do aluno em nossa escola, contato com o posto de saúde e demais instituições
presentes na comunidade. Conforme Possenti:
(...) As únicas pessoas em condições de encarar um trabalho de modificação das
escolas são os professores. Qualquer projeto que não considere como ingrediente
prioritário os professores – desde que estes, por sua vez, façam o mesmo pelos
alunos-certamente fracassará. (2002, p. 56)

A CONSTRUÇÃO COLETIVA DA ESCOLA DE EDUCAÇÃO INTEGRAL

A escola precisa aprender, acompanhar os avanços tecnológicos, em suma,


se reinventar. Conforme Paviani (2010, p. 65), a alteração da situação atual deve
iniciar na própria escola, a qual deve tornar-se uma comunidade, estimulando a
participação e a convivência de professores, alunos e funcionários. Nesta concepção,
o aluno não é um cliente e o professor não é somente um funcionário. Assim, a escola
deve ser espaço para aquisições de conhecimentos, socializações, bem como, um
lugar onde o aluno sinta-se inserido nesse sistema, tenha vontade de frequentá-la,
vincule-se ao professor e a colegas, tendo em vista que tudo isso favoreça para que
sua aprendizagem ocorra de maneira mais agradável.
Conforme Antunes (2008, p. 10):
Educar é entre outras premissas, olhar para frente. Mas esse olhar não nos leva a
nada se uma multidão nos separa do horizonte. Em circunstâncias como essas é que
precisamos de um ombro amigo e seguro, pois se sobre eles pudermos nos apoiar,
enxergaremos longe, muito além da multidão.

Dessa forma, a escola integral deve oportunizar espaço para que, juntos, alunos
e comunidade escolar construam uma educação de qualidade, voltada para uma
aprendizagem significativa e prazerosa, formando parcerias e redes de apoio. Uma
possibilidade para essa construção coletiva é trazer a comunidade para dentro da
escola, isso pode ocorrer por meio das reuniões, assembleias gerais, festividades

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 243

da escola e, principalmente, como colaboradores voluntários. Nessa proposta, pais


e demais membros da comunidade local levam para dentro da instituição escolar
seus saberes, promovendo um ambiente de aprendizagem aos alunos por meio de
oficinas.
Através dessa prática, é possível observar uma escola acolhedora, a qual
valoriza o trabalho em equipe, as iniciativas e propostas procedentes dos diversos
segmentos da comunidade escolar. Nesta escola acolhedora prevalece o diálogo,
fortificam-se as relações interpessoais e ela está sempre conectada com o mundo,
como nos diz Nóvoa (1999, p. 177):
Numa escola há sempre outras escolas, grupos diferentes que interactuam, pro-
jectos pessoais e colectivos que se cruzam, dinâmicas exteriores que se projectam
no quotidiano, processos onde se tecem regras de relacionamentos que importa
clarificar, esclarecer e aprofundar no sentido de apropriação das explicações dos
acontecimentos e de intervenção esclarecida na mudança.

Assim, é possível considerar que as mudanças do mundo moderno levam


as escolas a repensarem o processo pedagógico frente à realidade desafiadora e
complexa, acompanhando os avanços tecnológicos e, especialmente, promovendo
uma maior integração à comunidade escolar. As atividades integradoras viabilizam
conhecer os alunos, sua família, a comunidade na qual está inserido e o quanto ele
tem a nos ensinar de suas vivências, bem como constatar a existência de saberes e
diversidades culturais e de linguagem, ultrapassando os ensinamentos da escola.
Outro aspecto relevante é o currículo escolar, o qual deverá estar em sintonia
com as práticas do cotidiano, com o mercado de trabalho, com os avanços tecnoló-
gicos e também voltada para a formação de sujeitos críticos, criativos, dialógicos,
políticos. O currículo deve oportunizar que tais sujeitos adquiram conhecimento
através das atividades lúdicas e de projetos nos quais possam participam dentro e
fora da escola.
Desse modo, a escola em reflexão neste estudo é um espaço para aquisição
de conhecimentos e valores que preparem o indivíduo para a vida, desenvolvendo
suas habilidades e competências a fim de torná-lo sujeito responsável por suas ações
e transformador consciente do seu meio. Com isso, passa-se a examinar a função
social da escola na atualidade, a qual procura estimular no aluno a autonomia,
a responsabilidade, o comprometimento de torná-lo jovem protagonista de sua
transformação, proporcionando-lhe instrumentos que o levem à reflexão, não só
na escola, mas também no ambiente social.
Deve-se considerar também que temos grandes desigualdades sociais e o papel
da escola é o de buscar minimizar estas distâncias, valorizando as diferenças e evi-
tando qualquer tipo de preconceito. Nesse sentido Alonso (2000, p. 173) afirma que:
Dadas as crescentes condições de desigualdades sociais, entende-se que à escola
cabe uma função compensatória que ajude a reduzir esta distância – abrindo pos-

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244 Educação integral: uma construção coletiva a partir de diversos saberes e atividades ...

sibilidades de atendimento para as diferenças existentes –, o que requer deixar sua


função homogeneizadora, tornando-se mais pluralista, diferenciada, e isso implica
a abertura de novos espaços, flexibilidade, autonomia.

Conforme o autor, a escola deverá estar voltada para atender diferentes culturas
e aproveitar os saberes dos alunos, deixando para trás o papel de transmissora do
conteúdo e passando a ser construtora de conhecimento junto aos alunos. Com
isso, a escola deverá atuar num outro nível que não o da transmissão, deverá ser
a sistematizadora do conhecimento adquirido e, sobretudo, garantir a produção
de conhecimento mais elaborado que aproveite todas as experiências adquiridas
(ALONSO, 2000).
Sabe-se que com dedicação, envolvimento, pesquisa e muita afetividade por
parte dos professores é possível conseguirmos cumprir a função social da escola
em busca de uma educação de qualidade.
Assim, contata-se que os professores deverão usar seus saberes e realizar seus
fazeres desenvolvendo suas competências de criar, agir, dinamizar sua sala de aula,
promovendo a aprendizagem significativa nos seus alunos e tratar com naturalidade
e com respeito as diferenças. Para Bagno (2007, p. 78), é importante “reconhecer
que a escola é o lugar de interseção inevitável entre o saber erudito-científico e o
senso-comum, e que isso deve ser empregado em favor do/a estudante e da for-
mação de sua cidadania”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo buscou realizar uma reflexão acerca da construção de um novo


modelo de escola, ou seja, a escola de educação integral no Brasil, mobilizando
para isto as contribuições de Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro.
Mediante a análise de questionários, foi possível perceber que grande dos
professores entrevistados relatou não terem recebido qualquer tipo de formação
para trabalhar com o turno integral. Contudo, conforme buscamos apresentar neste
artigo, foram inúmeras as sugestões para formação docente citada pelos professores
que participaram da pesquisa, conforme os eixos temáticos estruturados: atividades,
legislação/proposta pedagógica, tempo/benefícios, outros.
Por fim, cabe ressaltar que a implementação de uma escola de turno integral
não pode ser apenas de responsabilidade de um único setor, deve envolver todos,
como o governo municipal, gestores, professores, funcionário, pais e alunos. Nesse
processo de construção pode-se compreender que, além de ampliar o tempo de
permanência em horas na escola, tem-se que promover oportunidades de conhe-
cimento do mundo e uma formação integral ao indivíduo. Não podemos apenas
aumentar o tempo, temos que torná-lo útil à comunidade escolar.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 245

REFERÊNCIAS

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TRIPP, David. Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. Universidade de Murdoch [sd] Dispo-
nível em: www.scielo.br/pdf/ep/v31n3/a09v31n3.pdf. acessado em 28/02/2016 às 17hs.

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O papel do 1 9
Coordenador Pedagógico na
atuação do professor na Sala
de Recursos Multifuncionais

Carla Ferreira Aguirre


Gabriela Maria Barbosa Brabo

INTRODUÇÃO

Com a implementação de uma política educacional baseada nos princípios


inclusivos, tornou-se cada vez mais imprescindível a atuação da Educação Espe-
cial como uma modalidade de apoio à inclusão escolar de alunos com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas salas
comuns do ensino regular. Assim, o espaço das salas de recursos multifuncionais
(SRM) tornou-se fundamental tanto para tal apoio quanto para a introdução de
novos avanços no campo da educação dentro da realidade escolar. Avanços que
vão desde o domínio de novos conceitos – tais como diversidade, equidade, equi-
paração de oportunidades, deficiência, diferença, etc. – até a aquisição de novas
habilidades. Entre estas últimas, encontra-se a aprendizagem no manuseio de novas
tecnologias – mais especificamente, tecnologias assistivas.
Contudo, há de se perguntar: que formação os professores que realizam o
Atendimento Educacional Especializado (AEE) nas SRM recebem para que pos-
sam auxiliar os alunos sujeitos da Educação Especial na aquisição das habilidades
envolvendo tecnologias assistivas? Em sua maioria, os professores que atuam nesse
serviço não tiveram, em sua formação, contato com disciplinas que os capacitem
para o manuseio dessas tecnologias. Sem contar que são de uma geração que só
começou a lidar com computadores na fase adulta. Tal situação se agrava se as SRM
se situam em cidades do interior.
Assim, não é raro nos depararmos com salas de Recursos repletas de aparelhos
e recursos tecnológicos que nem sempre são explorados pelo professor especia-
lizado que ali trabalha. Perder um ferramental tecnológico como o ofertado nas

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248 O papel do Coordenador Pedagógico na atuação do professor na Sala de Recursos ...

SRM pode ser visto como um desrespeito com a comunidade escolar, visto que,
seja por desconhecimento ou acomodação, não vem sendo explorado com deveria.
Daí, surge a necessidade de desenvolver ações que possam não só resgatar, mas
ampliar o campo de atuação de uma SRM. Para tanto, o Coordenador Pedagógico
da escola pode fazer a diferença.
Dentro do espaço escolar são vários os atores que criam, recriam e renovam
o fazer educacional. Entre eles, o Coordenador Pedagógico possui uma função
primordial: estimular o grupo docente na busca por formação e aprimoramento
das metodologias aplicadas aos alunos. Assim, o Coordenador surge como um
recurso prático e fundamental dentro das escolas. É ele que conversa com as áreas
do conhecimento e com a legislação a fim de reunir elementos que embasem o
processo de ensino e de aprendizagem.
Por isso, é fundamental possuir uma visão sistêmica da escola, além do co-
nhecimento legal sobre a estrutura e funcionamento da educação nacional. Essa
necessidade se amplia ainda mais em pleno cenário inclusivo. Incluir continua
sendo um assunto difícil de conversar de forma ampla por todos os componentes
do âmbito escolar. Nesse sentido, o Coordenador Pedagógico pode vir a ser peça-
-chave para mediar o diálogo entre o Ensino Regular e a Educação Especial com
vistas a propiciar o melhor atendimento aos alunos com deficiência favorecendo
sua inclusão efetiva.

AS SRM E O COORDENADOR PEDAGÓGICO

As salas de recursos surgiram como um serviço que oportuniza aos alunos


sujeitos da Educação Especial a possibilidade de fazerem sua trajetória escolar em
condições de igualdade aos demais alunos. Disponibilizam, através das ações dos
professores especializados e dos artefatos, mecanismos para que os alunos cons-
truam suas identidades e suas próprias aprendizagens. Mas um de seus pontos
fracos tem sido o despreparo dos profissionais que nelas atuam. E quando se trata
de trabalhar com o computador, esse ponto se agrava. Urge investigar o porquê
dessa situação, afinal, trata-se de um objeto que faz parte da realidade social de
nosso tempo.
Vivemos cercados por tecnologias: caixas eletrônicos, semáforos, televisores,
a própria iluminação dos ambientes que frequentamos, mas existe uma que ainda
cativa e desafia muitas pessoas: o computador. Ele se constitui num artefato que
circula no imaginário de muita criança que não o tem em casa somente em outros
locais como em lan houses ou na escola. Na SRM, isso não poderia ser diferente.
Segundo o programa de implementação de Sala de Recursos Multifuncionais,
há dois tipos em vigor no Brasil: a tipo I e a tipo II (BRASIL, 2010). A sala I traz em
sua estrutura um conjunto de aparelhos que contemplam alunos com deficiência,

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 249

transtornos globais de desenvolvimento ou altas habilidades/superdotação. Possui


microcomputadores, scanner, impressora laser, TV, DVD, fone de ouvido, de jogos
pedagógicos e brinquedos, teclado adaptado, mouse adaptado, conjunto de mesa
redonda e quatro cadeiras, conjunto de mesa e cadeiras para computador, armário,
mesa para impressora e quadro melânico.
Já a sala de tipo II contém os mesmos itens da sala I, porém oferecem uma
atenção maior aos alunos com déficit de visão (ou cegueira) e surdez (parcial ou
total): impressora Braille e máquina de escrever em Braille, calculadora sonora,
conjunto de lupas, reglete de mesa, punção, soroban, guia de assinatura, bengala
dobrável, globo terrestre adaptado, caderno com pauta ampliada, kit de desenho
geométrico, prancheta para leitura e pacote de papel gramatura.
É possível constatar, portanto, que a SRM contém um vasto material tec-
nológico a ser utilizado em prol não só do processo de aprendizagem dos alunos
nela atendidos, mas também da aquisição de autonomia para que possam viver de
forma independente.
Tecnologias digitais, especialmente as ferramentas de comunicação e de informa-
ção, potencializam a compreensão multissensorial da realidade e instituem novas
interfaces para o ensinar e o aprender, diferenciando-se das que tradicionalmente
estruturam o processo educativo (CONFORTO E SANTAROSA, 2010, p. 343).

Sendo assim, a figura do professor especializado funde-se com a do com-


putador para a potencialização de seu fazer pedagógico. Não aquele computador
que fica no cantinho da sala para servir como escape na hora da agitação ou falha
da metodologia, mas sim, uma “caixinha mágica” onde os softwares surgem como
elementos-surpresa na criação e construção da práxis pedagógica de uma SRM.
O uso do computador se torna cada vez mais um aliado do professor, pois auxilia na
aprendizagem do aluno. [...] o uso do computador deve propiciar a construção do
conhecimento. Quando se trabalha com o aluno utilizando as TIC’s1, a aprendiza-
gem fica mais centrada no aluno, há uma estimulação multissensorial, favorece ao
trabalho colaborativo, há troca de informações, a aprendizagem é mais exploratória
e o pensamento se torna mais crítico (PONTES, 2013, p. 19).

Portanto, é saudável a utilização da tecnologia, em especial o compu-


tador na sala de recursos, a fim de que seus alunos se apropriem de novas
culturas (digital) e o professor perceba quão rica se torna sua metodologia
quando agrega outros métodos nas atividades desenvolvidas diariamente
com as crianças que atende. Mas o que fazer quando esse professor desco-
nhece como usar essa tecnologia? Muitos professores mais “experientes”

1 Tecnologias da Informação e Comunicação.

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250 O papel do Coordenador Pedagógico na atuação do professor na Sala de Recursos ...

demostram certa relutância ao utilizar alguns artefatos (computador em


especial) pelo próprio desconhecimento das máquinas.
A inserção das tecnologias digitais na escola exige, entretanto, dos profissionais
da educação, uma formação inicial e continuada que os faça capazes de utilizar-se
dessas tecnologias, de apropriar-se de suas funcionalidades e de descobrir as suas
potencialidades, que os torne letrados digitalmente (MELO, 2011, p. 13).

Para além do desconhecimento, de nada adianta todos os esforços se o pro-


fessor não se dispõe a mudar. São vários os relatos de professores que não aceitam
aprender sobre inovações tecnológicas, prejudicando dessa forma o desenvolvi-
mento de seus alunos.
De acordo com Montoan (2003), um dos problemas que a escola enfrenta quando se
trata de inclusão é que embora tenha se democratizado, abrindo as portas para novos
grupos sociais, a escola não se abriu para novos conhecimentos. Em suma, a escola
continua valorizando antigos preceitos, sem se dar conta de que o mundo mudou
e que novos saberes transitam na sociedade, pois a maioria desses equipamentos e
softwares são desconhecidos por parte dos educadores (LINKIEVICZ, 2012, p. 15).

Nessas situações, a intervenção do Coordenador Pedagógico pode ser decisiva.


É ele quem cria meios e ferramentas para que seu grupo venha a ser pesquisador,
questionador e dono do seu fazer metodológico. É por meio de uma postura inda-
gadora e questionadora que ele alcançará e motivará os demais a se transformarem.
Como ações para que isso se efetive, torna-se necessário que o coordenador:
• Instigue a prática da pesquisa em seus docentes.
• Proporcione ferramentas de reformulação da metodologia desempenha-
da.
• Explore temas que favoreçam a interdisciplinaridade.
• Ouça os alunos e tente extrair deles seus anseios e curiosidades.
• Leia e crie um arcabouço bibliográfico que norteie seus estudos e con-
versas.

Compete-lhe, então, em seu papel formador, oferecer condições ao professor para


que aprofunde sua área específica e trabalhe bem com ela, ou seja, transforme seu
conhecimento específico em ensino (ALMEIDA, PLACCO, SOUZA, 2011, p. 230).

Para que obtenha êxito em suas ações, a formação continuada é fundamental.


É ela que conseguirá adaptar e transformar condutas colocadas em prática nas salas
de aula atuais, em especial as salas de recursos multifuncionais.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 251

A PESQUISA

O interesse pela contribuição da tecnologia assistiva – em especial o compu-


tador – para o Atendimento Educacional Especializado e o trabalho do professor
especialista na Sala de Recursos Multifuncionais surgiu da observação de comen-
tários e visualização de um material que “não poderia” ser utilizado pelos demais
professores por ser da sala de recursos. Tratava-se de um maquinário “estranho e
amarelo” que ocupava um espaço dentro do laboratório de informática, além de
chamar a atenção dos demais alunos que ali frequentavam para realizar atividades
de pesquisa em máquinas que eram utilizadas de forma compartilhada.
Inicialmente, conversas “despretensiosas” foram feitas com diferentes profis-
sionais da escola em busca de saber o que eram e para que serviam aquelas máqui-
nas. Descobriu-se que eram alguns dos componentes da sala de recursos. Novas
inquietações surgiram para saber o porquê de não estarem sendo aproveitados. As
respostas surgiram e induziram à realização desta pesquisa, no intuito de que se
conheça melhor a realidade de uma sala de recursos, seus artefatos, o trabalho do
professor especialista e a importância da intervenção de um Coordenador Peda-
gógico na formação desse professor.
A pesquisa visou responder ao seguinte questionamento: de que forma as
tecnologias assistivas estão sendo desenvolvidas no interior das salas de recursos
multifuncionais? E qual é o papel do coordenador pedagógico nesse processo?
De abordagem qualitativa, caracterizou-se como exploratória-descritiva (GIL,
2002), pois foi realizada uma investigação para descrever a associação da utilização
do computador pelo professor especialista e o incentivo do Coordenador Pedagó-
gico para a utilização das tecnologias assistivas presentes na SRM. Foi exploratória,
pois se pretendeu obter o máximo de familiaridade com o tema de estudo, ou seja,
a contribuição da tecnologia assistiva – em especial o computador – para o Aten-
dimento Educacional Especializado e o trabalho do professor especialista na Sala
de Recursos Multifuncionais.
O contexto investigativo se constitui de uma escola estadual situada no muni-
cípio de Sant’Ana do Livramento-RS. Possui aproximadamente 300 alunos divididos
entre ensino fundamental e ensino médio. Abriga uma SRM que atende um total
de 30 alunos apresentando desde distúrbios na fala, déficits cognitivos, até severos
comprometimentos motores (paralisia cerebral) que se valem de cadeira de rodas
e ajuda de monitores para que possam desenvolver e interagir dentro do espaço
escolar. A sala objeto de estudo deste trabalho classifica-se no tipo I.
Foram selecionados três sujeitos, professoras que atuam na SRM da referida
escola. Uma delas (P¹) estava em processo de aposentadoria, mas foi entrevistada
porque trabalhava há sete anos na sala e contribuiu na adaptação e construção do
espaço estudado. A outra (P²) desempenha a função de professora e vice-diretora,

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252 O papel do Coordenador Pedagógico na atuação do professor na Sala de Recursos ...

já está na sala há cinco anos e a última (P³) chegou à escola para substituir aquela
que estava em processo de aposentadoria.
A coleta dos dados foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas.
Para Marconi e Lakatos (2003), a coleta de dados é uma etapa da pesquisa em que
se inicia a aplicação dos instrumentos que foram previamente pensados e elabo-
rados e do uso de técnicas que foram escolhidas como ideais para a pesquisa, com
o objetivo de coletar os dados necessários.
Com a política de informatização implantada no estado do Rio Grande do Sul
no ano de 2011, uma parcela do alunado gaúcho teve a oportunidade de usufruir
de um netbook para os trabalhos escolares e a própria informatização da família.
O município de Sant’Ana do Livramento foi um dos pioneiros nessa iniciativa
gerando, assim, uma avalanche de dúvidas e necessidade de capacitação para o
trabalho com computadores em sala de aula.
Como muitos dos alunos atendidos na SRM da escola objeto deste trabalho
também ganharam o “netzinho”, seus professores passaram por alguns cursinhos
que capacitavam os trabalhos com a nova ferramenta. Depois, o governo lançou
capacitações continuadas para o trabalho; contudo houve relutância por parte de
professores em não querer aceitar mais uma nova ferramenta de trabalho peda-
gógico.
Dessa forma, foi fundamental o trabalho desenvolvido pela coordenação pe-
dagógica a fim de motivar os professores e resgatar essas ações. Vieira, Bianconcini
e Alonso (2003) também reforçam essa ideia, já que a manutenção de uma prática
pedagógica salutar depende de um estado constante de evolução e mudança, co-
brado por essa “sociedade mutante” onde nos inserimos.

ANÁLISE E RESULTADOS

Os resultados desta pesquisa foram subdivididos em duas categorias de aná-


lise: a atuação do Coordenador Pedagógico diante do trabalho realizado na sala de
recursos e o uso da tecnologia assistiva (em especial o computador) no atendimento
educacional especializado.

ATUAÇÃO DO COORDENADOR PEDAGÓGICO DIANTE


DO TRABALHO REALIZADO NA SALA DE RECURSOS

Com relação à atuação do Coordenador Pedagógico diante ao trabalho re-


alizado na sala de recursos, as entrevistadas foram categóricas ao afirmar que há
uma atuação efetiva da coordenação pedagógica na sala de recursos, porém com
um viés conflitante, em que o coordenador assume funções outras que fogem às
suas atribuições – formar e incentivar.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 253

A supervisão2 sempre controla a frequência dos alunos e faz o chamamen-


to dos pais quando tem reunião. (P¹)

A professora (P¹) possui formação em magistério (curso normal), superior


em pedagogia e especialização em TIC’s na educação e capacitação em deficiência
mental, o que possibilitou a atuação na sala de recursos. Foi a que atuou por mais
tempo nesse espaço. Durante a entrevista, ela afirmou estar satisfeita com o desem-
penho da coordenação pedagógica na escola contexto deste estudo. Porém, não
fez nenhuma referência ao incentivo à formação continuada, sendo que todas as
atualizações foram por conta do seu próprio interesse, por conta do qual realizou
capacitações nos últimos seis meses.
Retomando a atuação dos coordenadores na sala de recursos, P¹ reforçou mais
de uma vez, em suas falas, a visão equivocada que se tem da atuação desse setor
fundamental na gestão escolar.

...sempre que necessário, informava os alunos que não estavam frequentes


na aula, e solicitava aos pais que mandassem os alunos na sala, e incenti-
vava a sua participação/atenção nos estudos. (P¹)

Essa declaração confirma o pensamento de Lima e Santos (2007), quando o


próprio coordenador não sabe o que fazer dentro da escola e acaba orientando e
conversando com os pais em vez de seu grupo de docentes e discentes. Tal fato
ocorre, talvez, pela mantenedora que supre essas lacunas com profissionais des-
preparados ou não capacitados, ou pela própria gestão escolar que ainda possui
uma visão “assistencialista” para proteger alguns pares, valendo-se de sua faceta
política. O que fere os princípios da gestão democrática descritos no Projeto
Político-Pedagógico e no Regimento Escolar.
As falas de P² não fogem muito do contexto ora apresentado. Mesmo fazendo
parte da equipe diretiva da escola, P² ainda vê o supervisor como a pessoa que “se-
gura as pontas” quando a direção não consegue realizar plenamente suas funções.
Assim, é mais fácil para ela ver o coordenador supervisionando o andamento da
escola do que incentivando novas práticas e metodologias dentro do espaço escolar.

Solicitando ao professor regente (sala de recursos) o controle da frequência


dos alunos, chamamento aos pais... (P²)

A professora (P²) é formada em pedagogia e especialista em educação especial,


o que permitiu uma convocação para atuar na sala de recursos. Durante a entrevista,
ressaltou o empenho dedicado pela supervisão em esclarecer e motivar as famílias
a respeito do trabalho desenvolvido na SRM. Contudo, não relatou nada sobre
formação continuada, sendo a única das três entrevistadas que não participou de

2 Outra denominação dada ao serviço de coordenação pedagógica.

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254 O papel do Coordenador Pedagógico na atuação do professor na Sala de Recursos ...

nenhum curso de capacitação, formação ou atualização nos últimos doze meses.


Talvez o motivo esteja relacionado ao fato de ser uma profissional que tem uma
carga horária de sessenta horas e assumir o cargo de vice direção.
Uma possível solução para sanar as distorções quanto às atribuições do Co-
ordenador Pedagógico pode estar numa maior proximidade e diálogo entre esse
profissional e seus professores. A reformulação curricular já seria um dos passos
a serem dados a fim de que as funções sejam elucidadas e executadas de forma
adequada, buscando o bem-estar de todos da escola. Um ambiente harmonioso e
dialogado é salutar para o processo educativo.
Campos (2006) cita o que espera de um coordenador atuante em uma SRM:
“[...] entendo que é preciso ter um equilíbrio entre os diferentes tipos de conheci-
mento, [...] é preciso vislumbrar o horizonte da formação coletiva e comunitária
do conhecimento” (CAMPOS, 2006, p. 44 apud RIBEIRO, 2007, p. 215). E esse
vislumbrar está em um profissional sensível, capaz de mostrar a seu grupo a im-
portância da formação e da busca por novos caminhos para a realização de um
bom trabalho pedagógico na escola em que trabalha.
A entrevistada P³ é a única a possuir graduação e especialização em educa-
ção especial, além de ter estudado magistério na modalidade curso normal. Está
passando por capacitação e participa de formações continuadas, sejam ofertadas
pela mantenedora, sejam por vontade própria. Assumiu a SRM da escola no final
do ano letivo de 2015, substituindo a professora P¹.
Assim como as demais professoras, P³ ratificou a disponibilidade da coor-
denação em atender a qualquer de suas dúvidas quanto ao trabalho. Também foi
possível observar a atenção empregada pela coordenadora do turno da tarde em
tentar “acomodar” a P³ para que seu trabalho de reconhecimento e adaptação aos
alunos não fosse prejudicado.

...está sempre disponível para qualquer esclarecimento. (P³)


Em linhas gerais, ao entrevistar as três profissionais, foi possível perceber que
parte do segmento de professores ainda vive à sombra de um conceito equivocado
sobre coordenação pedagógica. Como se a coordenação vivenciasse somente a
inspeção, orientação e supervisão do trabalho burocrático aliado ao pedagógico,
conforme as legislações anteriores à LDB nº 9.394/96.
Também se constatou, por meio das falas e comportamentos observados, uma
falta de políticas internas da escola que incentivassem a formação continuada. Se
os coordenadores investissem em formações internas ou utilizassem as reuniões
pedagógicas como um recurso a mais para que os profissionais se motivassem, o
trabalho da SRM lograria mais sucesso em suas ações juntamente com os alunos
e as famílias.
Por isso, é necessário que o Coordenador Pedagógico calque suas formações
continuadas sobre os impactos e resultados que uma articulação entre sala regular

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 255

e sala de recursos venha a gerar nos alunos frequentadores, bem como nos profis-
sionais envolvidos. Incluir não é somente falar de inclusão, mas sim, permitir que
todos os atores se sintam parte desse processo.
Quando se pensa em escola inclusiva, a primeira coisa que vem à cabeça é
a sala de recursos. No entanto, inclusão vai muito mais além do que isso. Implica
uma ação conjunta e responsável para que atenda todas as situações diferentes e
desafiadoras que envolvam a aprendizagem (BEYER, 2013). E para isso, a escola
precisa de um PPP (Projeto Político-Pedagógico) que englobe todos os segmentos
escolares, transformando espaços e mentalidades, o que realmente articula ou
deveria articular os coordenadores pedagógicos.

USO DA TECNOLOGIA ASSISTIVA (EM


ESPECIAL O COMPUTADOR) NO ATENDIMENTO
EDUCACIONAL ESPECIALIZADO

Com relação ao uso de tecnologia assistiva, as três profissionais disseram


conhecer e utilizar ferramentas tecnológicas dentro da SRM da escola investigada.
Entretanto, quando foram questionadas sobre a utilização específica do computa-
dor, suas repostas fugiram do que se esperava. Ou seja, elas disseram utilizar seus
próprios computadores (notebooks) em vez dos que se encontram disponíveis na
escola.
As respostas das professoras parecem um contrassenso, uma vez que a es-
cola possui dois computadores de mesa (os “amarelos-ovo”, assim chamados por
alguns alunos e professores) e três notebooks cujo destino seria a sala de recursos.
Anteriormente, quando havia uma professora responsável pelo laboratório de
informática da escola, as máquinas que ficavam lá eram usufruídas pelos alunos
atendidos pela Educação Especial. Atualmente, tais máquinas estão trancadas no
referido laboratório e sem uso.

Eu já vi os computadores amarelos, mas nunca usei, e os notebooks, nem


sabia que a escola tinha recebido... (P¹)

A equipe diretiva da escola, quando questionada sobre o desvio dos com-


putadores para o laboratório de informática, respondeu que não pode deixar as
máquinas na SRM devido à falta de grades na porta e nas janelas.

Os computadores amarelos estão no laboratório e os notebooks na vice,


porque não tem grade nas janelas. Podem invadir a escola novamente e
levar... (Equipe diretiva)

Embora a justificativa da falta de segurança na SRM seja razoável, questiona-


-se o que impede as professoras da SRM de levarem os alunos até o laboratório de

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informática para manusearem os computadores. Comodismo, despreparo ou outro


aspecto que não foi percebido durante a execução da entrevista? São indagações
que ainda não foram respondidas e que esbarram em questões estruturais e pessoais
que infelizmente interferem no atendimento da sala de recursos.
As tecnologias da informação e da comunicação validam a mobilidade humana e,
ao multiplicar proximidades cognitivas e afetivas, apontam para a heterogeneidade
do coletivo, e otimizam o reconhecimento e a valorização da diversidade humana.
São as ferramentas digitais que, ao atuarem como objetos catalisadores da inteli-
gência coletiva, tornam-se entidades que propiciam o acolhimento da diversidade
(CONFORTO & SANTAROSA, 2010, p. 346).

A comunidade educacional já deixou clara a importância das tecnologias na


sala de aula. Por isso é lamentável quando nos deparamos com cenários que ainda
renegam a função educativa que um computador possui dentro da sala de aula
de uma escola, bem como com professores que ainda não se conscientizaram da
necessidade de aprenderem a manuseá-lo para auxiliarem no processo de apren-
dizagem de seus alunos.
[...] torna-se incontestável o potencial das tecnologias [...] enquanto ferramentas
para o desenvolvimento de aspectos cognitivos e sociais do aluno com necessidades
educacionais especiais [...] no sentido de romper com o isolamento do indivíduo
com deficiências [...] (BRASIL, 2004).

Nessa perspectiva, torna-se importante conhecer e estimular o uso dos com-


putadores que instrumentalizem a sala de recursos. Afinal, eles vêm preparados
e equipados com diversos softwares voltados ao atendimento dos alunos que re-
correm essa sala. Além disso, é crucial motivar o grupo de professores de toda a
escola para que se volte à inclusão de todos os alunos, e o espaço “Sala de Recursos
Multifuncionais” é mais uma sala de aula que deve trabalhar com afinco em busca
de ganhos cognitivos e sociais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste trabalho – verificar o papel do Coordenador Pedagógico


no incentivo ao uso das tecnologias assistivas na sala de Recursos de uma escola
pública do município de Sant’Ana do Livramento – foi alcançado. Por meio do le-
vantamento de dados, foi possível investigar e constatar o nível de participação do
Coordenador Pedagógico na sala de recursos e verificar de que forma ele instiga o
uso de tecnologias assistivas, em especial o computador, pelo professor especialista.
De um modo geral, a população e o universo selecionados para o desenvol-
vimento deste estudo se encontram aquém do que se espera para um atendimento

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 257

especializado, de acordo com o que se encontra descrito em alguns tratados e


convenções voltados ao atendimento de alunos sujeitos da Educação Especial.
No caso das três profissionais que atuam na SRM da escola-alvo do trabalho
de pesquisa, verificou-se que a influência e a participação do Coordenador Peda-
gógico são falhas e frágeis. Isso, devido ao erro de interpretação quanto à função
do coordenador pelos professores, como também quanto ao desconhecimento de
suas atribuições por parte dos próprios coordenadores (supervisoras) que atuam
nesse espaço escolar.
Duas professoras que atuam como coordenadoras pedagógicas não possuem
formação inicial específica para a coordenação ― uma estudou pedagogia e a outra
é formada em matemática com pós-graduação em TIC’s. Daí talvez resulte que as
atribuições e colaborações possíveis esperadas para uma coordenação pedagógica
não sejam as adequadas. Contudo, ambas se dedicam e fazem o que é possível
para assistir às professoras da sala de recursos. Chamam os pais para conversas,
mantêm diálogos com as professoras e sugerem novas metodologias para aplicação
em sala de aula.
Outro aspecto observado foi a falta de interação da sala de recursos nas fes-
tividades da escola, o que poderia ser feito além das participações dos alunos em
suas salas regulares.
Talvez um dos entraves no auxílio pedagógico dentro da sala de recursos seja a
falta de conhecimento e diálogo da coordenação com as professoras regentes e com
as dessa sala. Não quer dizer que não haja essa conversa durante o ano letivo: o que
foi possível verificar é uma falta de propriedade por parte das coordenadoras em
relação aos alunos e suas dificuldades. O trabalho das coordenadoras fica calcado
apenas nos laudos emitidos pelos profissionais que acompanham as crianças e por
conversas realizadas com os responsáveis.
Outra fragilidade constatada é o não envolvimento das famílias com a SRM.
Infelizmente, uma parcela de pais e/ou responsáveis ainda não consegue vislumbrar
o benefício que a sala traz para seus filhos ― seja por desconhecimento, seja pela
ausência de um trabalho mais efetivo por parte das coordenadoras no sentido de
favorecer esse envolvimento. Da mesma forma, tais profissionais também falham
no que tange a motivar as professoras especializadas na apropriação de inovação
das metodologias a serem desenvolvidas no atendimento especializado da sala de
recursos, contribuindo para a efetiva ação dessas profissionais no AEE.
A análise das respostas dos sujeitos trouxe à tona que a educação inclusiva
está caminhando a passos lentos em busca de espaço. Por ser uma temática recente,
ainda que não desconhecida das escolas, vem exigindo esforços de todos e todas
que fazem parte da educação. Os programas de formação continuada e de capaci-
tação para gestores, coordenadores e professores já sinalizam que a inclusão é uma
preocupação. Espaços de diálogo e escuta com todos os segmentos e colegiados

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258 O papel do Coordenador Pedagógico na atuação do professor na Sala de Recursos ...

também surgem como um recurso a mais na práxis pedagógica, compartilhando


e não deixando sozinho o professor da SRM e nem o Coordenador Pedagógico.
Ainda não há uma “receita de bolo” para que a inclusão seja trabalhada
dentro das escolas de maneira uniforme. E acredita-se que nunca haverá, pois os
indivíduos são diferentes, bem como as deficiências e dificuldades que invadem
o universo escolar a cada dia. Caberá ao Coordenador Pedagógico buscar formas
de motivar e incentivar seu grupo de docentes para que todos sejam atendidos de
forma equânime, ou seja, de acordo com seus níveis de aprendizagem e dificuldades.
Por outro lado, Conforto e Santarosa (2010) fazem o seguinte alerta:
É importante destacar que toda tecnologia é provisória e, em caso de o sujeito ter
capacidade para desenvolver uma ação de forma autônoma sem apoio de tecno-
logias, deve ser encorajado a fazê-lo (CONFORTO e SANTAROSA, 2010, p. 337).

Assim, nem o professor e nem o coordenador devem dar excessiva importância


a tecnologias, visto que elas por si sós não são responsáveis pela construção cogni-
tiva. Essa se dá pela união de vários fatores exógenos e endógenos que, somados,
levam à adaptação e absorção dos conhecimentos repassados durante os períodos
desfrutados na escola.
Enfim, estudar o papel do Coordenador Pedagógico proporciona novos olhares
sobre esse profissional multifacetado e tão importante nos diálogos relacionados
à escola. Então, dar continuidade a estudos sobre essa temática agrega valor e cria
subsídios para estudos acadêmicos que venham a ser desenvolvidos a posteriori.
A coordenação pedagógica é uma área que permeia muitos caminhos e conquista
alguns adeptos que se sintam instigados pela pesquisa, estudo e desafios.
Portanto, o Coordenador Pedagógico não é o que cuida dos horários, pais e
reuniões, mas sim, é o agente transformador de cenários e de personagens dentro do
grande universo chamado “escola”. O braço direito do gestor escolar na organização
pedagógica de uma escola. O profissional que consegue ver à frente e estimular a
procura por caminhos e estratégias que aproximem os atores escolares.

REFERÊNCIAS

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visan de. O Coordenador Pedagógico (CP) e a formação de professores: intenções, tensões e contradi-
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Livro Coordenação Pedagógica.indb 260 22/10/2018 14:27:43
O processo de construção da nova 2 0
grade curricular da escola estadual
de ensino fundamental Mercedes
Motta – Santa Rosa – RS

Amanda Cabette
Tatiane Mattiazzi

INTRODUÇÃO

Muitos são os discursos que tratam da importância de a escola mudar frente


à realidade vivenciada todos os dias pelo desinteresse da maioria dos alunos diante
da aprendizagem, bem como da pouca participação dos pais na vida escolar de seus
filhos. Somada a esse discurso, está a pouca atratividade do currículo e da escola,
considerada atrasada e ineficaz nesse contexto.
Na tentativa de modificar esse discurso e ao mesmo tempo esta realidade,
renovam-se as falas sobre a Escola de Tempo Integral. Busca-se nesta a saída con-
creta, talvez não para resolver, mas amenizar as questões citadas, pois compreende-
-se que, quando o aluno está na escola realizando atividades supervisionadas,
diferenciadas e atrativas, que possuem relação concreta com as suas vivências, que
o abordam e o escutam em sua integralidade, o acesso, a permanência e o sucesso
na vida escolar estarão garantidos.
O grande questionamento recai sobre a questão: como conseguir esta escola
dita “Integral”? Que subsídios nos levarão a trilhar o caminho se não perfeito, pelo
menos, o mais próximo disso?
Procurando responder a estas questões, o presente estudo concentra a aten-
ção no processo de construção da nova grade curricular da Escola Estadual de
Ensino Fundamental Mercedes Motta-Santa Rosa/RS, frente à implantação do
Tempo Integral, pois consideramos que esta escola diferente só será possível de
ser realidade quando seu currículo estiver intrinsecamente baseado no contexto
de sua comunidade.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 261 22/10/2018 14:27:43


262 O processo de construção da nova grade curricular da escola estadual de ensino ...

Na busca desse objetivo, utilizou-se a pesquisa-ação, com a aplicação de um


questionário que continha 36 questões (objetivas e subjetivas), a qual se denominou
na escola como uma pesquisa socioantropológica. Essa foi aplicada primeiramente
aos pais e alunos do 1º ao 9º ano, com foco na questão de nº 36. Posteriormente,
houve o diálogo com os alunos do 1º ao 9º ano com relato escrito ou em forma de
desenho sobre a escola que temos e a escola que queremos. Esse mesmo processo
foi realizado com os professores e agentes educacionais.
Além disso, a Coordenadora Pedagógica conversou de modo informal com os
pais e alunos, perguntando: “Se você pudesse escolher as disciplinas, os conteúdos
que quisesse aprender, o que escolheria? Por que escolheria?” Todo esse processo
enriqueceu e deu vida à proposta curricular.
É preciso destacar que o estudo desta temática, através da pesquisa socioantro-
pológica, permitiu a participação coletiva – de todos os segmentos da comunidade
escolar – buscando consolidar uma grade curricular contextualizada e democrática,
considerando que para o aluno é mais significativo aprender dentro de um contexto
no qual ele pode participar da discussão, reflexão e construção dos conhecimentos a
serem trabalhados pelo grupo de professores a fim de proporcionar aprendizagem.
A realidade nos mostra que conteúdos pré-estabelecidos ou impostos já não são
atrativos aos alunos.
O interesse por essa temática surgiu após a experiência que tivemos na Coor-
denação das Escolas de Tempo Integral em 2014, na 17ª Coordenadoria Regional de
Educação e pelo fato de que a escola em que estamos atuando no momento como
coordenadora pedagógica e vice-diretora terá até 2016 implantado o Tempo Integral.
Dentro desse contexto, a experiência levou-nos a constatar que a grade curricular
deve ser uma construção coletiva e contextualizada da escola e não algo imposto.
A principal hipótese para que o currículo seja colocado como está atualmente
se deve ao fato de a Escola de Tempo Integral ser algo novo e pouco pesquisado e
difundido até o momento. Da mesma forma, acreditamos ser preferível aos governos
impor uma grade curricular baseada nos estudiosos que defendem a sua concepção
de educação, o que também facilita o trabalho, pois não exige diálogo e pesquisa
permanente para a escola. No entanto, tal conduta não condiz nem atende as ne-
cessidades das escolas e da comunidade em que estão inseridas. Compreendemos
que o currículo atrativo e eficaz é aquele que envolve as necessidades, realidade e
potencialidades do contexto que o cerca.
No entanto, para que isso seja possível, a escola não pode mais ficar entre
seus muros, com olhar vertical. Ela deve abrir-se, seus professores devem abrir-se
ao novo, ao diferente, ao inovador e principalmente ao concreto – entendido aqui
como a real necessidade de seus alunos. É necessário não apenas olhar, mas co-
nhecer seu aluno e a comunidade em que esse está inserido. É importante também
reconhecer falhas e possibilidades de ação em cada gesto, fala e até pensamento do
aluno, dos pais e, inclusive, professores e funcionários, porque esses também são

Livro Coordenação Pedagógica.indb 262 22/10/2018 14:27:43


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 263

parte desta comunidade diversificada. Entretanto, é fundamental que a necessidade


do aluno esteja acima da necessidade de seu professor, porque compreendemos
que o professor deve, a partir daquilo que o aluno lhe apresenta, saber aproximar e
aproveitar esse conhecimento a fim de aprimorá-lo, de despertar nele o gosto pelo
que ele ainda não sabe, mas logo saberá.
Todo esse pensamento, que pode parecer aos olhos de muitos uma utopia,
mas na qual acreditamos de fato, só será possível através do diálogo e participação
efetiva e ativa de todos os que pertencem à referida comunidade. É através das
trocas que todos consolidamos nossos aprendizados.

O INÍCIO DO SONHO: HISTÓRIA, LEGALIDADE,


PROCESSOS E POSSIBILIDADES

As matrizes do debate quanto à Educação Integral no Brasil podem ser encon-


tradas no Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova que, em 1932, já colocava a
importância de se romper com a educação fragmentada e desarticulada do contexto
e necessidades/interesses dos alunos. Embora esse discurso exista há muito tempo, a
prática referente à Educação Integral e à Escola de Tempo Integral é muito recente.
Mas é com Anísio Teixeira que a Educação Integral e a Escola de Tempo
Integral ganham status. Esse propunha que a escola “desse às crianças um progra-
ma completo de leitura, aritmética e escrita, ciências físicas e sociais, e mais artes
industriais, desenho, música, dança e educação física, saúde e alimento à criança,
visto não ser possível educá-la no grau de desnutrição e abandono em que vivia”
(MEC, 2009, p. 16).
Então, em 1950, Anísio Teixeira pôde colocar em prática a sua concepção de
Educação e Escola Integral no Centro Educacional Carneiro Ribeiro, em Salvador,
na Bahia. Neste centro, as atividades entendidas como escolares eram trabalhadas
nas Escolas-Classe e, no contraturno, atividades diferenciadas, trabalhadas nas
Escolas-Parque.
A Escola-Parque era para Anísio Teixeira:
Escola pensada e construída para ser uma escola republicana, de horário integral,
focada no aluno e em suas necessidades individuais, preocupada com que o aluno
realmente aprenda e seja preparado para ser um verdadeiro cidadão, consciente de
seus deveres e de seus direitos, integrado ao projeto de pais que surgia, desenvol-
vimentista, ligado ao mundo do trabalho, mas sem se deixar alienar pelo mercado,
com a possibilidade de atender as vocações ou tendências dos alunos, uma escola
integrada socialmente à comunidade (SOUZA et. al., 2012, p. 75).

Posteriormente, na década de 1980, Darcy Ribeiro consegue, com o apoio de


Leonel de Moura Brizola, governador do estado do Rio de Janeiro, concretizar o ideal

Livro Coordenação Pedagógica.indb 263 22/10/2018 14:27:43


264 O processo de construção da nova grade curricular da escola estadual de ensino ...

de Escola de Tempo Integral de Anísio Teixeira sobre a égide dos Centros Integrados
de Educação Pública (CIEPs). Assim como Anísio, Darcy reviveu nos anos de 1980 e
1990 a intolerância dos opositores à proposta de uma escola pública, laica e democrática.
Na atualidade a grande defensora da Escola de Tempo Integral é Jaqueline
Moll, que esteve à frente da Diretoria de Educação Integral, Direitos Humanos e
Cidadania no Ministério da Educação até o ano de 2013. Coordenou a efetivação
do Programa Mais Educação, meta do Plano de Desenvolvimento da Educação, que
se transformou em uma estratégia para implantação e implementação da Educação
Integral em Jornada Ampliada ou da Escola de Tempo Integral.
Com seu trabalho, “o sonho de uma escola de dia inteiro, de uma escola cujo
projeto tenha a educação integral em seu horizonte, adiado pelo menos duas vezes,
com Anísio Teixeira e depois com Darcy Ribeiro, é retomado no final da primeira
década do século XX, com todos os desafios de uma “megapopulação” na educa-
ção básica, em contextos sociais configurados por desigualdades, complexidades
e diversidades” MOLL (2012, p. 28).
Foi neste período que surgiu o Programa Mais Educação, que podemos de-
finir como:
[...] política estratégica do Governo Federal para viabilizar uma proposta de Educa-
ção Integral, constituiu-se a partir da Portaria Interministerial no. 17/07, fortificada
pelo Decreto no. 7083/10, com o objetivo de promover a oferta da educação integral a
crianças, adolescentes e jovens, através de atividades sócio-educativas desenvolvidas
no período de jornada ampliada escolar. A oferta de diferentes atividades educa-
cionais aos estudantes sustenta-se pela necessidade de se considerar as múltiplas
dimensões formativas dos sujeitos e pela compreensão de que somente os saberes
acadêmicos e reconhecidos socialmente não englobam a totalidade da formação
humana (FREITAS & VIVIAN, 2015, p. 3).

Além de uma história, ainda que breve da Escola de Tempo Integral, há


também os norteadores legais desta ideia, os quais são: a Constituição de 1988 em
seu art.6º; a Constituição Estadual em seu art. 196; a Lei Federal nº 9394 de 20 de
janeiro de 1996 em seu art. 34; o Plano Nacional da Educação (2001-2010); o Plano
Nacional da Educação (2014-2024); o Decreto nº43.260 de 28 de julho de 2004;
Lei Estadual nº 14.461 de 6 de janeiro de 2014; Decreto nº 51.316 de 21 de março
de 2014; Ordem de serviço nº 3 de 2014; Indicação nº 43 CEEd, de 4 de novembro
de 2015 e o Documento Orientador para Reestruturação Curricular das Escolas
de Tempo Integral de 2014.
Dentre esses norteadores, o maior embasador dentro do processo de cons-
trução da nova grade curricular foi o Documento Orientador para Reestrutura-
ção Curricular das Escolas de Tempo Integral de 2014, que traz como princípios
orientadores a politecnia e o trabalho como princípio educativo, a pesquisa como
princípio pedagógico, a interdisciplinaridade, a relação parte-totalidade, a relação
teoria-prática, o reconhecimento dos saberes e a avaliação emancipatória.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 264 22/10/2018 14:27:43


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 265

A grade curricular proposta estava organizada da seguinte forma:


• Formação geral: Linguagens (Língua Portuguesa, Língua Estrangeira
Moderna, Arte e Educação Física); Ciências Humanas (História, Geo-
grafia e Ensino Religioso); Ciências da Natureza e Matemática.
• Atividades curriculares obrigatórias: Iniciação à Pesquisa (2 períodos
semanais, em forma de reagrupamento), Leitura e Produção Textual (2
períodos semanais), Experiências Matemáticas (2 períodos semanais),
Educação em Direitos Humanos (1 período semanal), Arte e Cultura (2
períodos semanais), Esporte e Recreação (2 períodos semanais, sendo
que nos anos finais são 3 períodos semanais), Orientação de Estudos e
Leitura (2 períodos semanais), Centro de Línguas (2 períodos semanais).
• Atividades eletivas (3 períodos semanais, sendo de escolha qual/quais
componente(s) ofertar): Saúde e Qualidade de Vida, Educação Ambien-
tal e Desenvolvimento Sustentável (nos anos iniciais são obrigatórios 2
períodos semanais), Memórias e Histórias da Comunidade, Educação
para a Paz, Cultura Digital/Informática Educacional.
Mesmo que de forma breve, é possível perceber que o currículo estava organi-
zado de forma interdisciplinar, resgatando o aluno em sua unidade e diversidade,
valorizando o trabalho coletivo, a cultura da paz e o reconhecimento e acolhimento
das diferenças.
Quando falamos em currículo, vários conceitos nos vêm à cabeça. Pensar
em currículo é decidir quais conhecimentos devem ser ensinados, o que deve ser
ensinado e por que ensinar este ou aquele conhecimento. Com base nisto, podemos
dizer que:
o currículo é sempre resultado de uma seleção de um universo mais amplo de co-
nhecimentos e saberes; seleciona-se aquela parte que vai constituir, precisamente,
o currículo. As teorias do currículo, tendo decidido quais conhecimentos devem
ser selecionados, buscam justificar por que “esses conhecimentos” e não “aqueles”
devem ser selecionados (PADILHA apud SILVA, 2012, p. 192).

Não citaremos nenhuma das teorias, pois acreditamos que cada uma delas
serve em determinado espaço/tempo da construção deste currículo de acordo com
a realidade no qual se constrói, pois:
o currículo tem significados que vão muito além daqueles aos quais as teorias tradi-
cionais nos confinaram. O currículo é lugar, espaço, território. O currículo é relação
de poder. O currículo é trajetória, viagem, percurso. O currículo é autobiografia,
nossa vida, curriculum vitae: no currículo forja-se nossa identidade. O currículo
é texto, discurso, documento. O currículo é documento de identidade (PADILHA
apud SILVA, 2012, p. 193).

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266 O processo de construção da nova grade curricular da escola estadual de ensino ...

O currículo que trabalhamos traz como conceito e significado tudo o que se


passa na escola e, por isso, carrega em si um grau enorme de complexidade.
Para ressignificar o currículo numa Escola de Tempo Integral, é preciso
inovar. Busca-se uma concepção de currículo não baseada apenas num rol de co-
nhecimentos a serem transmitidos, mas que contemple as dimensões da cultura,
considerando a seleção de conteúdos, a articulação entre os vários tipos de conte-
údos e uma adequação estrutural da escola com vistas a essa nova concepção, pois:
[... ] qualquer tentativa de inovação educacional deve considerar que ela exige o
conhecimento do instituído, a motivação para a sensibilização e o reconhecimento
das necessidades existentes, a identificação de um referencial teórico que imprima
consistência à proposta, uma comunicação eficiente, um sentido explícito, objeti-
vidade, flexibilidade e exequibilidade sobre o que se quer inovar, além das práticas
processuais de avaliação e autoavaliação sobre as propostas de inovação que será/
está sendo implementada (GADOTTI, 2012, p. 194).

Isto só é possível através da pesquisa socioantropológica, ação indicada no


Documento Orientador (Seduc, 2014), pois é preciso conhecer de fato a realidade
da escola, buscando a participação ativa e efetiva de todos os segmentos escolares
– toda a comunidade escolar. É preciso ouvir suas necessidades, seus anseios e de-
sejos e, a partir desses, descobrir o meio pelo qual o conhecimento dito “formal e
científico” se aproxima do conhecimento popular, abrindo as portas de um processo
de ensino e aprendizagem atrativos e eficientes.
Embora pensar e construir um novo currículo seja um processo coletivo, há
a necessidade de um profissional específico com conhecimentos e habilidades para
direcionar e organizar esse processo. Esse profissional é o Coordenador Pedagógico,
cujo papel podemos descrever como sendo:
[...] uma atividade voltada essencialmente à organização, à compreensão e trans-
formação da práxis docente, para fins coletivamente organizados e eticamente
justificáveis (FRANCO, 2008, p. 120).

Em outras palavras, cabe a esse proporcionar a formação continuada dos


professores, sempre atento ao contexto no qual está inserido. Há que se ter atenção
para que esse profissional, no exercer de sua função, não recaia sobre os velhos há-
bitos tecnicistas, como se existissem fórmulas prontas para resolver os problemas
que perpassam a escola.
É preciso que o Coordenador Pedagógico perceba-se como um educador
capaz de articular a reflexão crítica entre professores e o contexto, teoria e prática,
entre o ser e o fazer educativo, num processo comprometido com a formação e a
emancipação. No entanto, abrimos uma ressalva aqui, quando Franco diz “...para
fins coletivamente organizados e eticamente justificáveis”. Quando pensamos em
coletivo, ou falamos em coletivo dentro da escola, nos referimos à comunidade

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 267

escolar. Não há como decidir ações somente com um segmento da escola quando
o assunto em questão são processos pedagógicos. Até porque não conseguimos
separar o que acontece dentro da escola, pois percebemos tudo interligado... Pe-
dagógico se relaciona com RH, com financeiro, com jurídico, com administrativo,
com relações interpessoais... Tudo está conectado!
Pensando assim, o Coordenador Pedagógico provoca esse mesmo processo
de reflexão com os pais, com as famílias, com o entorno da escola. E isto nos leva a
pensar que esse Coordenador Pedagógico deve ter primeiro (e se não tiver, deverá
buscá-lo) um grande conhecimento do contexto no qual está inserido. É preciso
conhecer para poder intervir e provocar mudanças.
Para realizar esse processo todo, a atuação do Coordenador Pedagógico foi
fundamental. A coordenadora pedagógica da Escola Estadual de Ensino Funda-
mental Mercedes Motta iniciou seu trabalho buscando conhecer a realidade na qual
está inserida. Primeiro, foram conversas aleatórias com alunos, pais, professores
e funcionários. Após isto, percebeu que o universo era muito complexo e decidiu
realizar a pesquisa sócio-antropológica. Mediou todo o processo, quantificou os
dados, estabeleceu relações e trouxe para a discussão da comunidade escolar.
Escutou todos os segmentos e foi juntando a teoria existente à realidade da
escola, que resultou numa grade curricular específica para a escola.
Do questionário aplicado, todas as questões nos levaram a compreender a
realidade que nos cerca; no entanto, para este estudo, focou-se na questão nº 36,
na qual de fato aparecem os interesses dos alunos, pais, professores e agentes edu-
cacionais. A questão pedia que enumerassem por ordem de interesse as áreas que
consideram mais importantes para serem trabalhadas na escola, ou aquelas que
mais lhes provocam interesse.
Os resultados obtidos nesta questão seguem a importância das seguintes
áreas: 1º) Esportes; 2º) Tecnologia; 3º) Educação; 4º) Segurança; 5º) História; 6º)
Economia; 7º) Religião; 8º) Beleza; 9º) Arte e cultura; 10º) Política; 11º) Saúde; 12º)
Meio Ambiente; 13º) Jogos, ciências, direitos e deveres, novelas.
Na sequência apresentamos a análise dos dados, contrastando com as respostas
vindas dos professores e funcionários, que colocam a seguinte ordem de importân-
cia: 1º) valores éticos e morais; 2º) cuidado com o bem público; 3º) condições para
que o aluno aprenda afazeres básicos do dia a dia (como fazer comida, costurar,
limpar, jardinagem, etc...); 4º) capacidade de reflexão e análise crítica da realidade
e; 5º) capacidade de pensar soluções diante dos problemas encontrados.
Além disso, houve vários encontros individuais com alunos e pais quando
lhes era questionado: “se você pudesse escolher os componentes que gostaria de
ter na escola, podendo tirar ou incluir “disciplinas”, o que você escolheria?” Essa
conversa mais pessoal foi fator decisivo na concretização da proposta, porque se
criou um espaço de diálogo e escuta. Tomou-se essa decisão porque queríamos
sentir o que o aluno almejava.

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268 O processo de construção da nova grade curricular da escola estadual de ensino ...

Durante este processo de construção, houve vários empecilhos, principal-


mente por questões burocráticas que deveriam ser respondidas ora pela Secretaria
Estadual de Educação – SEDUC, como a questão dos recursos humanos; ora pelo
Conselho Estadual de Educação.
Quando se pensa numa grade curricular, deve-se pensar se existe este suporte
em termos de recursos humanos qualificados. Em nossa escola, após conversas com
alunos e professores, primeiramente chegou-se a uma grade curricular muito espe-
cífica, com capoeira, dança, teatro, por exemplo. No entanto não existe no quadro
de RH, em se tratando de Estado, um profissional nomeado para dança, teatro ou
capoeira. Isto inviabiliza qualquer grade curricular. A saída então foi repensar:
como ter uma grade curricular e um quadro de RH que lhe dê sustentabilidade?
Recorremos novamente ao Documento Orientador para a Reestruturação
Curricular das Escolas em Tempo Integral. Após muita leitura e discussão, chegou-se
ao entendimento de que esse documento apresenta os componentes de uma forma
bastante ampla e assim poderíamos especificar as ações e objetivos nos planos de
estudos. Desta forma, ficou mais fácil conseguirmos o recurso humano necessário
dentro da nossa proposta. Ou seja, os nomes dos componentes, pelo menos de
alguns deles, foram mantidos conforme o Documento Orientador, mas sua espe-
cificidade dar-se-á nos Planos de Estudos. Além disso, houve outras sugestões que
não estão contempladas diretamente no documento. Estas estão nos componentes
de Cultura Digital, Práticas de Saúde e Qualidade de Vida e Relações Humanas.
Com base nesses dados, através de discussões e com base no Documento
Orientador para a Reestruturação Curricular das Escolas em Tempo Integral, a
proposta elaborada a princípio trouxe a nova grade curricular da seguinte maneira:
1) Séries Iniciais do Ensino Fundamental
1.1) Base Comum
• um professor referência (20 horas), que trabalhará com a base comum,
ou seja, os componentes que atualmente compõem o currículo. Esse pro-
fessor não perderá sua unidocência.
1.2) Parte diversificada, composta por
• Atividades Curriculares Obrigatórias:
a. Esporte e recreação (3 aulas), sendo ministradas por um professor
especialista. Visa desenvolver integralmente o educando através de
práticas esportivas, recreativas e lúdicas levando-o a conhecer a di-
versidade cultural motora que o cerca (capoeira, dança, expressão
corporal, esportes radicais);
b. Arte e Cultura (2 aulas), sendo ministradas por um professor espe-
cialista. Visa desenvolver atividades que levem o educando a produ-

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 269

zir e refletir sobre a cultura em que está inserido, sentindo-se autor


desta construção de memórias culturais e artísticas (teatro, dança,
artes plásticas, artes visuais);
c. Centro de línguas (2 aulas), sendo ministradas por um professor es-
pecialista, com ênfase na Língua Estrangeira Moderna/Língua Ingle-
sa. Visa possibilitar, através de atividades lúdicas, a iniciação a esta
língua com conceitos e palavras básicas;
d. Iniciação à Pesquisa (2 aulas), atuando como um componente em
forma de agrupamento, em que todas as turmas terão esta atividade
e poderão escolher qual a temática que mais lhes atrai, mais lhes cha-
ma atenção. Isto requer planejamento coletivo e propõe um trabalho
em que, por mais que haja um professor responsável pelo compo-
nente, ele não estará sozinho, pois toda a escola “para” literalmente
para auxiliar e participar deste momento.
e. Experiências Matemáticas (2 aulas), em que através de jogos lúdicos
e atividades concretas possa ser desenvolvido e aprimorado o racio-
cínio lógico;
f. Relações Humanas (1 aula), visa trabalhar a questão dos valores e
da ética, desenvolvendo e trazendo reflexões sobre o cotidiano do
aluno;
g. Educação em Direitos Humanos (1 aula), que visa trabalhar com a
cultura da paz, refletindo sobre aspectos da sociedade de forma que
o educando sinta-se parte desta sociedade, reconhecendo seu papel,
seus direitos e seus deveres;
h. Leitura e Produção Textual (2 aulas), que visa trabalhar com situa-
ções diferentes, como o jornal escolar, rádio escolar e outros projetos
que auxiliem e levem o educando a apropriar-se do sistema de leitura
e escrita;
i. Orientação de Estudos e Leitura (1 aula), que atua como um comple-
mento aos demais componentes, em que o aluno, por estar na escola
em torno de 8 horas, terá tempo e espaço para realizar seus temas e
trabalhos sob a supervisão de um profissional qualificado, da mesma
forma que agirá como um reforço escolar para as dificuldades;
• Atividades Curriculares Eletivas
a. Cultura Digital (2 aulas), que visa oferecer ao aluno suporte para
trabalhar com as mídias, entendendo como utilizá-las para seu apri-
moramento pessoal, bem como um recurso para os demais compo-
nentes que o utilizarão como subsídio aos seus conteúdos;
b. Práticas de Saúde e Qualidade de Vida (2 aulas), que visa fornecer
ao educando práticas que hoje não são difundidas nem pela família

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270 O processo de construção da nova grade curricular da escola estadual de ensino ...

nem pela escola, por falta de tempo ou vontade. Articulam-se com


as antigas técnicas domésticas e agrícolas. Os educandos terão a pos-
sibilidade de vivenciar ações como: cultivo de horta, jardim, hábitos
de higiene, limpeza de ambientes, como produzir determinados ali-
mentos, artesanato popular, crochê, tricô, etc.
2) Séries Finais do Ensino Fundamental
2.1) Base Comum: Língua Portuguesa (3 aulas); Língua Estrangeira Moder-
na – Língua Inglesa (2 aulas); Educação Física (2 aulas); Arte (2 aulas);
Matemática (4 aulas); Ciências (3 aulas); Sócio-históricas (4 aulas), com-
preendendo os componentes de história e geografia que deverão atuar de
forma interdisciplinar e complementar;
2.2) Parte diversificada, composta pelos mesmos componentes das Séries Ini-
ciais do Ensino Fundamental, no entanto, com a complexidade das ações
aumentando conforme as possibilidades dos educandos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Educação Integral e a Escola de Tempo Integral são propostas que andam, ou


pelo menos deveriam, andar juntas. Ampliar o tempo de permanência do aluno na
escola, mantendo os antigos padrões e métodos não alcançará os efeitos desejáveis.
Quando falamos em efeitos desejáveis, não nos interessam, ou pelo menos,
o que menos nos interessa, é a cobrança dos órgãos externos, mas sim, aquilo que
hoje sabemos ser a real necessidade da comunidade escolar a qual pertencemos.
Pensamos que, se existe escola, é porque temos alunos e nosso papel é auxiliá-los no
seu desenvolvimento integral (cognitivo, motor, afetivo, psicológico, relacional...).
Não há por que ter escola se esta não atua a favor de diminuir a distância entre os
ditos “mais favorecidos” e “menos favorecidos”.
Também não queremos que pensem a Escola de Tempo Integral como uma
instituição de assistência social, pois temos objetivos, metas definidas, e, como já
dissemos, definidas para a nossa realidade, embasada numa pesquisa socioantropo-
lógica. Da mesma forma, não pensamos, nem sequer a comunidade escolar pensa,
a escola como algo imutável. Pelo contrário, queremos mudar pelas necessidades
que hoje sabemos ter, mas tivemos que seguir o viés que nos foi definido, e assim
tivemos que mudar de novo, repensar e adaptar algumas questões buscando o
equilíbrio já falado anteriormente. Ou seja, temos plena convicção de que a escola,
suas ações, seus quereres e saberes são mutáveis. Estamos em constante mudança,
progressão e aperfeiçoamento. E é isto o que nos dá força para continuar.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 270 22/10/2018 14:27:44


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 271

Todo o processo realizado nos deu uma visão totalmente diferente da comu-
nidade, dos alunos, dos professores. Foram descobertas que hoje nos levam a olhar
tudo o que perpassa a escola de forma diferente.
Um fator importantíssimo a destacar foi a possibilidade que o processo trouxe
quanto à participação dos pais e alunos. Esse diálogo, troca e questionamento, es-
cutando seus quereres, suas aflições foi o auge do processo. Talvez não tenha ficado
claro no todo do processo, pois não foi somente a pesquisa sócio-antropológica
que nos deu os dados para conhecer, mas o trabalho de conversa da Coordenadora
Pedagógica diretamente com os alunos e pais. Esse “aproximar-se” espontaneamente
por meio do bate-papo informal, onde não havia a pressão do “eu estou sendo ques-
tionado para atingir tal objetivo”, é que trouxe a essência da comunidade. Durante
esse processo de conversa, a Coordenadora teve aprendizados dos alunos e pais sobre
assuntos que hoje estão no nosso currículo, como a horta e alimentação saudável.
Cabe aqui ressaltar a importância que o Coordenador Pedagógico possui
na escola e, em especial, no processo realizado. Ser um mediador de práticas, de
possibilidades, conseguindo trazer as concepções dos diferentes segmentos da
Comunidade Escolar, agregando valores a todos eles, proporcionando um caminho
que una todos esses anseios e necessidades a fim de proporcionar um aprendizado/
conhecimento melhor, é tarefa árdua e contínua, mas essencial para o bom anda-
mento das atividades que perpassam a escola.
Nesta perspectiva, fica clara a importância do Coordenador Pedagógico como
formador dos demais colegas de trabalho. Levá-los a refletir sobre sua prática, o
que ensinam, por que ensinam, como ensinam, para que ensinam, é uma ação
constante. Ser capaz de interrelacionar este universo com o universo do aluno, dos
pais, dando-lhes um significado concreto é o que torna esta função um desafio,
mas também uma magia. É necessário que esse profissional tenha a capacidade da
escuta, livre de autojulgamentos, bem como, uma base teórica muito consistente,
para que não caia em “achismos” e mantenha sempre um olhar e pensar crítico
diante das situações.
Outra questão importante é que este trabalho é contínuo dentro da escola,
pois, com a implantação do Tempo Integral, o quadro de RH da escola modificou-
-se drasticamente. Todos, porém, estão buscando conhecer esta realidade com
base no que já foi trabalhado, acrescentando suas percepções e, embora ainda não
tenhamos colocado tudo no papel, já há mudanças.
Foi necessário muito diálogo, pesquisa e trocas de experiências com outras
escolas, entidades. Hoje, nosso Plano de Estudos está sendo consolidado, com uma
visão de que se trata de uma primeira experiência, a ser modificada no próximo ano
e assim sucessivamente. Temos impregnada em nós esta flexibilidade, nas práticas,
ações e inclusive, nas burocracias tão presentes na escola atualmente.
Sabemos que nosso currículo não revela 100% a realidade de nossa comuni-
dade escolar, mas não desistimos desta luta. Para que esse estivesse plenamente de

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272 O processo de construção da nova grade curricular da escola estadual de ensino ...

acordo, a prioridade estaria mais em questões práticas como: capoeira, artesanato,


horta, saúde. Nas conversas da coordenadora pedagógica com os pais e alunos
apareceu muito sobre dança, teatro e as antigas técnicas domésticas e agrícolas.
O que foi muito interessante ouvir dos pais, principalmente, é que gostariam que
seus filhos aprendessem a cozinhar, limpar, costurar. De certa forma, eles estão no
currículo, mas não como gostaríamos, cada um sendo um componente curricular
separado, único.
Compreendemos os momentos históricos e sabemos que é devagar que alcan-
çaremos nossos objetivos, afinal, estes são nossos primeiros passos na direção de
uma Escola de Tempo Integral e Educação Integral, tal como disse Darcy Ribeiro
citado por Moll (2012, p. 79):
Aprendi com o mestre Anísio Teixeira – e a duras penas tento cumprir este preceito
– que o compromisso do homem de pensamento é com a busca da verdade. Quem
está comprometido com suas ideias e a elas se apega, fechando-se à inovação, já não
tem o que receber nem o que dar. É um repetidor. Só pode dar alguma contribuição
que está aberto ao debate.

Desejamos que nossos mantenedores possam abrir-se ao debate, possibilitando


a inovação a fim de alcançar uma educação de qualidade social e não classificatória.
Que neste diálogo a Escola, aqueles que a representam, que de fato a conhecem,
possam ser ouvidos na construção de um currículo que atenda as necessidades
e complexidades do seu contexto. Somente partindo da premissa de um diálogo
entre os envolvidos na questão da Escola de Tempo Integral e Educação Integral é
que este “sonho possível” será concretizado.

REFERÊNCIAS

ARROYO, Miguel G. O direito a tempos-espaços de um justo e digno viver. In: MOLL, Jaqueline.
Caminhos da Educação Integral no Brasil: direito a outros tempos e espaços educativos. Porto Alegre:
Penso, 2012, p. 33 – 45.
BRASIL. MEC, SECAD. Educação Integral: texto referência para o debate nacional. Série Mais Edu-
cação. Brasília, 2009. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/cadfinal_educ_inte-
gral.pdf. Acesso em: 07/04/2015.
CHAGAS, M.A.M. et.al. Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro: contribuições para o debate atual. In:
MOLL, Jaqueline, Caminhos da Educação Integral no Brasil: direito a outros tempos e espaços edu-
cativos. Porto Alegre: Penso, 2012, p. 72-81.
FRANCO, Maria Amélia Santoro. Coordenação Pedagógica: uma práxis em busca de sua identida-
de. In: Revista Múltiplas Leituras. V.1,n.1, jan/jun 2008, p. 117-131.
PADILHA, Paulo Roberto. Educação Integral e currículo intertrans cultural. In: MOLL, Jaqueline.
Caminhos da Educação Integral no Brasil: direito a outros tempos e espaços educativos. Porto Alegre:
Penso, 2012, p. 189-206.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 272 22/10/2018 14:27:44


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 273

RIO GRANDE DO SUL. Secretaria de Educação. Documento orientador para a reestruturação curri-
cular das escolas em Tempo Integral. Ensino Fundamental. 2014. Disponível em: http://www.educa-
cao.rs.gov.br/dados/dp_cga_doc_orient_tempo_integ.pdf. Acesso em: 23/02/2015.
VIVIAN, D. ; FREITAS, J.V. As representações culturais sobre o currículo escolar da Educação Integral
a partir do olhar docente. UFRGS. Disponível em: http://educacaointegral.org.br/materiais. Acesso
em: 13/11/2015.

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Livro Coordenação Pedagógica.indb 274 22/10/2018 14:27:44
Parte III

A GESTÃO ESCOLAR E A
COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA

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Livro Coordenação Pedagógica.indb 276 22/10/2018 14:27:44
Escola de gestores: o perfil do 2 1
Coordenador Pedagógico

Mariângela Bairros
Patrícia Souza Marchand

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como objetivo apresentar pesquisa realizada junto aos
coordenadores pedagógicos de escolas da rede pública do RS que participaram do
Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Coordenação Pedagógica, desenvolvido
no âmbito do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica Pública
ofertada pelo MEC em parceria com a UFRGS no ano de 2015/2016. O objetivo da
pesquisa, por sua vez,foi reconstituir o perfil desses coordenadores pedagógicos.
O Curso de especialização Escola de Gestores já possui uma década de acú-
mulo na formação de gestores e coordenadores escolares que atuam na educação
básica. Avanços e retrocessos frente aos vinte anos de normatização da gestão
democrática na LDBEN são aspectos importantes que nortearam a pesquisa e que
apresentaremos neste artigo.
A pesquisa foi realizada através da aplicação de um questionário que contou
com a participação de 189 coordenadores pedagógicos. O objetivo da pesquisa,
além de traçar o perfil dos participantes, foi verificar a possibilidade de retorno de
suas aprendizagens para as suas escolas.
O curso de especialização Escola de Gestores está em sua segunda edição e
trabalha com um conjunto de questões que consideramos cruciais para a educação.
A qualidade da educação materializa-se na medida em que coordenadores pedagógi-
cos aprofundam conhecimentos relativos à gestão educacional democrática, projeto
pedagógico, educação inclusiva, domínio das novas tecnologias, financiamento da
educação, dentre os vários temas abordados durante o curso.
O curso de especialização Escola de Gestores esteve junto com os coordena-
dores pedagógicos durante um ano e meio, aprofundando temáticas que necessitam
permanente reflexão: o tempo necessário para a formação de uma criança, que é
longo e exige, no mínimo 14 anos, considerando o ensino obrigatório dos 4 aos 17
anos. Falar em educação é falar em décadas, logo, uma educação comprometida

Livro Coordenação Pedagógica.indb 277 22/10/2018 14:27:44


278 Escola de gestores: o perfil do Coordenador Pedagógico

com a qualidade tem que ter um compromisso com a necessária urgência de qua-
lificação social dos docentes que estão dentro das escolas, à frente da formação de
alunos da educação básica.
Os processos educacionais são dinâmicos, mutáveis e exigem tempo e recursos
que acompanhem tais transformações e demandas.
A qualidade da educação almejada deve ser definida em consonância com o projeto
social que deverá orientar a construção de uma política nacional. A educação deve
ser compreendida como espaço múltiplo em que diferentes atores, ambientes e
dinâmicas formativas se interrelacionam e se efetivam por processos sistemáticos
e assistemáticos. A educação é intrinsecamente articulada às relações sociais mais
amplas, podendo contribuir para sua manutenção, como para sua transformação
(CONAE, 2014, p. 145).

Através da formação dos coordenadores pedagógicos do curso, almejamos


alcançar parte de um processo mais amplo de educação. Quando falamos em for-
mação do discente, queremos defender uma formação muito mais ampla, voltada
para a justiça social, inclusão e direitos humanos, o que inclui respeito à efetivação
de uma educação pública, cada vez mais pública e de qualidade social em todas as
instituições educativas em todas as etapas, níveis e modalidades.
Partimos do pressuposto estabelecido na Constituição Federal (CF) de 1988 e da
premissa da educação como direito público subjetivo, que deve garantir acesso, per-
manência e sucesso escolar, baseados na tríade democracia, justiça social e inclusão.
O artigo 206 da CF/1988 afirma que o ensino será ministrado com base nos
seguintes princípios:
I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II – liberdade de
aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III – pluralis-
mo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e
privadas de ensino; IV – gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
V – valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei,
planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e
títulos, aos das redes públicas; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53,
de 2006) VI – gestão democrática do ensino público, na forma da lei; VII – garantia
de padrão de qualidade. VIII – piso salarial profissional nacional para os profissio-
nais da educação escolar pública, nos termos de lei federal (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 53, de 2006).

A qualidade da educação está assegurada nos princípios constitucionais,


destacada também na LDB 9.394/1996 em seu artigo 4º inciso IX que afirma:
padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a variedade e quantidade
mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de
ensino-aprendizagem. Esse conceito tem se constituído em desafio permanente,
pois depende de um conjunto de atributos e parâmetros que podem atender de-

Livro Coordenação Pedagógica.indb 278 22/10/2018 14:27:44


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 279

terminada escola e outra não. O curso procurou debater um sistema de valores que
envolvem uma elaboração teórica e empírica, a partir de relações sociais, políticas,
econômicas e culturais. Um primeiro parâmetro deste curso que gostaríamos de
destacar diz respeito à educação como um processo emancipador.

A CONSTRUÇÃO COLETIVA: UMA BÚSSOLA

Durante o período de um ano e meio de curso, empenhamo-nos na forma-


ção cidadã e em uma educação com compromisso histórico, mas não só: também
com um futuro, com algo que está por se construir, pois o papel do Coordenador
Pedagógico está articulado com todas as áreas de conhecimento e com a formação
continuada desses professores. O sentido do trabalho do Coordenador Pedagógico
diz respeito ao que a escola sonha para os alunos, o projeto de escola e de como
chegar ao que é almejado e se existe um compromisso com o aprofundamento de
processos plurais, democráticos, mas, sobretudo, com capacidade de tomar parte
nos assuntos públicos de forma responsável e ativa. Trata-se de pensar a gestão
educacional para além de conteúdos.
O papel do Coordenador Pedagógico é desafiador, pois se desdobra na gestão
educacional e nos rumos por ela assumida, tem aspectos multifacetados e não
explicitados na legislação, vai além de ensinamentos de leitura e de escrita, proje-
tando conhecimentos que possibilitem uma formação mais ampla. O Coordenador
Pedagógico tem sob sua responsabilidade o planejamento das ações pedagógicas,
o auxílio no trabalho do professor em seu cotidiano, o planejamento das reuniões
pedagógicas, as reuniões com pais conjuntamente com os professores, o auxílio aos
diretores e vices, mas não só isso, pois ele é um emulador das ações pedagógicas
dentro do sistema escolar. Emulador no sentido de emular a dinâmica educacional
dentro da escola. Se o papel do Coordenador Pedagógico parece em um primeiro
momento difícil, fica ainda mais se não for realizado em parceria com outros pro-
fessores e com a direção da escola. Sem tal pareceria, é quase impossível realizar
um bom trabalho.
Pensar uma educação que tem como lócus o espaço privilegiado da escola,
mas não exclusivamente, pode e deve contar com as demais instituições educativas
que são espaços de garantia de direitos, no entorno da escola e para além dele.
Esse conceito ainda precisa ser aprofundado, mais bem entendido. Para tanto,
é fundamental atentar para as demandas da sociedade como parâmetro para o
desenvolvimento de todas as atividades educacionais.
A escola de educação básica pública encontra-se permanentemente sendo
atacada com questionamentos sobre sua capacidade de educar e, cada vez mais,
mostra que, apesar de todas as dificuldades, como a falta de investimentos e de
formação continuada, segue realizando um trabalho de excelência.

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280 Escola de gestores: o perfil do Coordenador Pedagógico

Os direitos já inscritos e garantidos em nossa legislação precisam ser recupe-


rados cotidianamente dentro da escola, assegurando processos mais amplos “como
garantia de que a formação será fator efetivo e decisivo no exercício de cidadania
e na melhoria da qualidade de vida” (CONAE, 2014, p. 147)1.
Ao Coordenador Pedagógico cabe, em sua função precípua, pensar na qua-
lidade da educação. Começa desde o acesso da criança e do adolescente à escola,
a partir do direito de acesso e permanência na escola, até a conclusão das três
etapas da educação básica e que conduz para a formação e para o pleno exercício
de cidadania. O Coordenador Pedagógico tem em suas mãos a possibilidade de
considerar as dimensões extraescolares que servirão para o resto da vida dos alunos.
Elas dizem respeito às possibilidades de superação das condições de vida das cama-
das sociais menos favorecidas e assistidas. Estudos e pesquisas mostram que essas
dimensões afetam sobremaneira os processos educativos e os resultados escolares
e não podem ser desprezadas se queremos produzir uma educação de qualidade
para todos (CONAE, 2014, p. 148).

Nesse sentido, o curso de especialização dos coordenadores pedagógicos


procurou a construção de um referencial de autonomia para a formação pedagó-
gica. É importante afirmar que a formação continuada pode partir do princípio de
que as instituições escolares, gestores, professores, pais, alunos e trabalhadores da
educação têm em suas mãos as tomadas de decisões, logo, também da formação.
Os processos educativos efetivam-se na medida em que buscam uma educação
emancipadora, com apropriação do que é necessário para se viver em sociedade
em seus diferentes aspectos, humano, político, social e econômico. Defendemos
que a escola seja capaz de participar da elaboração de um planejamento participa-
tivo autônomo, de construir itinerários próprios, que busquem um reforço para a
aprendizagem de seus alunos, a escola tem que ser livre para decidir seus rumos.
Acreditar na democracia. Exercitá-la. A democracia é um processo em permanente
construção e aprendizagem e que exige vigilância constante.
O curso investiu na formação dos coordenadores pedagógicos com o objeti-
vo de promover uma mobilização dentro da escola, com mudança de atitude em
relação aos rumos da escola pública, da sua escola e de seus pares. Os professores
são atores institucionais importantíssimos, cumprem uma função social, têm em
suas mãos a possibilidade concreta de oportunizar a crianças e jovens tornarem-se
cidadãos críticos, reflexivos e atualizados. Para isso é necessário e estratégico lançar
mãos à construção coletiva de formação para construir uma escola democrática,
de qualidade e, finalmente, transformadora.

1 A CONAE – Conferência Nacional de Educação –, ocorrida em 2014 em municípios de diferen-


tes estados, culminou com a conferência final em Brasília, com mais de 3000 delegados de todo
o Brasil.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 281

METODOLOGIA

A partir dessa caminhada e com esse compromisso, construímos neste artigo


um levantamento do perfil dos coordenadores pedagógicos que realizaram o curso.
Foram analisados 189 questionários, respondidos online pelos cursistas ao término
do curso, com o objetivo de realizar um mapeamento do perfil dos coordenadores
pedagógicos participantes do curso de especialização Escola de Gestores.
O Curso teve por objetivo oportunizar a formação continuada, mas também
estimular a formação em serviço, realizada a partir da escola, de Coordenador
Pedagógico e professores, tão necessário para professores e gestores que atuam
em escolas da rede pública. Conforme Imbernón (2010), o século XXI ainda
impõe a retomada de um conjunto de conceitos que pareciam já resolvidos nas
últimas décadas do século XX como: gestão educacional democrática, teorias e
práticas sobre o pensamento docente, processos de pesquisa-ação, dentre outros,
que segundo o autor sofreram um retrocesso ou estancamento (NÓVOA, 1999).
Para uma reflexão e projeção entre um passado histórico da profissionalização dos
professores e da importância de uma ação coletiva, plural e comum no interior da
escola, recorremos a Nóvoa (1999).
A metodologia consistiu em uma análise qualitativa dos dados coletados
através de um questionário com 35 questões disponibilizado ao final do curso e
aplicado aos alunos/coordenadores pedagógicos do Curso de especialização Escola
de Gestores.
As questões tratavam do polo do cursista, idade, sexo, município de residência,
de trabalho, titulação, instituição em que concluiu a graduação, se já havia realizado
outra especialização, rede em que atua como Coordenador Pedagógico, tempo em
que atua em cada cargo ou função exercida, turno de trabalho, jornada de trabalho,
etapa ou modalidade da educação básica em que atua, motivação para a realização
do curso, carga horária autorizada pelo sistema para a realização do curso, ques-
tões específicas de avaliação do curso sobre as questões teóricas/metodológicas,
interação com os professores e uso da plataforma, grau de satisfação com o curso
e o que consideramos mais importante: a possibilidade de repassar os estudos do
curso para seus pares na escola e região.

OS RESULTADOS A PARTIR DAS RESPOSTAS


DOS COORDENADORES PEDAGÓGICOS

Apresentaremos a seguir um conjunto de dados a partir das respostas aos


189 questionários respondidos pelos coordenadores pedagógicos que realizaram
o curso de especialização.

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282 Escola de gestores: o perfil do Coordenador Pedagógico

Uma das questões solicitadas e respondidas pelos coordenadores foi a etapa


ou modalidade em que atuavam como coordenadores pedagógicos. As respostas
foram assim classificadas:
• Educação Infantil 23,8%
• Ensino fundamental 55%
• Ensino médio 39,2%

Figura 1 – ETAPA/MODALIDADE DA EDUCAÇÃO BÁSICA EM QUE ATUA

Figura 2 – QUANTO AO SEXO DOS PARTICIPANTES NO CURSO

Quanto ao sexo dos participantes do curso, majoritariamente foram mulheres,


96,3% contrastando com apenas 3,7% de homens coordenadores pedagógicos.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 282 22/10/2018 14:27:46


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 283

Figura 3 – REDE PÚBLICA A QUE PERTENCEM OS


COORDENADORES PEDAGÓGICOS

A partir dos dados coletados, conforme figura 3, constatou-se que 55,6% dos
coordenadores atuam na rede pública estadual do RS e 44,4% da rede pública de
diferentes municípios.

Figura 4 – QUANTO À LIBERAÇÃO DAS REDES PARA REALIZAÇÃO DO CURSO

Conforme a figura 4, 24% obteve licenciamento autorizado integralmente


para a participação no Curso, 68% realizou o Curso de forma simultânea à carga
horária de trabalho, ou seja, sem licenciamento autorizado ou redução de carga
horária para a realização do mesmo. Apenas 8% obteve redução da carga horária
de trabalho para a realização do Curso.

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284 Escola de gestores: o perfil do Coordenador Pedagógico

Esses dados evidenciam que os professores coordenadores pedagógicos rea-


lizaram o Curso na sua grande maioria de forma simultânea às demais atividades
a serem desenvolvidas na escola.

Figura 5 – MOTIVAÇÃO PARA A REALIZAÇÃO DO CURSO

Em relação aos fatores de motivação para a realização do Curso, a maioria


das respostas indicou a busca por qualificação profissional representando 39% das
respostas, 19% das respostas indicaram como elemento motivador a melhoria da
titulação academica, 17% a gratuidade do curso, 12% a preparação para ingresso
no mestrado ou doutorado, 8% pela pontuação para progressão funcional e 5%
para garantia de permanência no cargo ou função de Coordenador Pedagógico.
Esta questão, por se tratar de múltipla escolha, isto é, podendo ter mais de
uma resposta, teve um total de 464 respostas, o que indica que muitos professores
coordenadores pedagógicos tiveram mais de um elemento motivador.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 285

Figura 6 – CARGA HORÁRIA AUTORIZADA PELO SISTEMA DE


ENSINO/ESCOLA PARA A REALIZAÇÃO DO CURSO

Podemos verificar na figura 6, no que diz respeito à carga horária para a re-
alização do Curso, que 47,1% informou dedicar-se até 10 horas semanais, 24,3%
entre 11 e 15 horas semanais, 19,6% menos de 10 horas, 6,9% dedicou entre 16 e
20 horas semanais e 2,1% dedicou mais de 20 horas semanais.
Estes dados estão relacionados com a liberação de carga horária pelos sistemas
de ensino para a realização do curso, ou seja, o fato de os professores coordenadores
na sua grande maioria terem realizado o curso de forma simultânea à realização
de outras atividades na escola reflete no menor tempo de dedicação que esses
profissionais tiveram para a realização do Curso.

Figura 7 – MODALIDADE EM QUE A GRADUAÇÃO FOI REALIZADA

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286 Escola de gestores: o perfil do Coordenador Pedagógico

Dentre os coordenadores pedagógicos que participaram do curso, conforme


a figura 7, 15,3% cursou suas graduações à distância e 84,7%, presencial. Esse dado
mostra que, ainda que em número bem menor, parte dos coordenadores teve con-
tato e familiaridade com a educação à distância.

Figura 8 – QUANTO À SUA JORNADA DE TRABALHO

A maioria dos coordenadores pedagógicos (75,1%) trabalhou 40 horas sema-


nais durante a realização do curso, enquanto 17,5% trabalhou no turno da noite e
apenas 7,4% trabalhou 20 horas. A maioria dos coordenadores pedagógicos tem
uma carga horária de 40 horas e, com isso, teve muito menos horas de dedicação
ao curso.

Figura 9 – POSSIBILIDADE DE TRANSPOSIÇÃO DOS


ESTUDOS REALIZADOS PARA AS ESCOLAS

Livro Coordenação Pedagógica.indb 286 22/10/2018 14:27:53


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 287

Como mostra a figura 9, apesar das dificuldades enfrentadas por grande parte
dos cursistas principalmente no que diz respeito ao suporte das redes de ensino
para que eles pudessem realizar o curso com tranquilidade e qualidade, 54% dos
cursistas indicaram ser alta a possibilidade de que os estudos poderiam ser aplica-
dos na escola em que atuam; dentre o conjunto dos cursistas, 33% indicaram ser
muito alta a possibilidade de levar para a escola os estudos realizados. O percentual
de 87% dos participantes dizendo ser possível reproduzir seus estudos na escola
é um ótimo índice.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES E REFLEXÕES A PARTIR DA


ESCUTA DOS COORDENADORES PEDAGÓGICOS

Por fim, gostaríamos de destacar a importância da realização deste Curso para


docentes de escolas públicas que na maioria não recebem formação continuada em
serviço. O curso funcionou como um estímulo ao pensar sobre a prática cotidiana
na escola. Apesar das dificuldades enfrentadas durante a realização do curso por
grande parte dos cursistas, principalmnete no que diz respeito ao suporte das redes
de ensino para que eles pudessem realizar o curso com tranquilidade e qualidade,
pouco mais da metade dos cursistas (54%) indicaram que a possibilidade dos es-
tudos realizados poderiam ser aplicados na escola em que atuam. Cabe destacar
que, para que isso aconteça, é muito importante que o conjunto da equipe diretiva
forneça um apoio ao Coordenador Pedagógico e um estímulo ao estudo, ao pensar
sobre as dificuldades, mas também a possibilidade de reproduzir e compartilhar as
boas práticas com outros educadores, inclusive de outras escolas.
Temáticas como gestão democrática, planejamento particpativo, avaliação
institucional, direito à educação, tecnologias para a educação, elementos para
qualidade da educação, são de extrema relevância para a formação continuada de
professores.
Outro fator preocupante, já nosso conhecido, mas observado novamente, é
que os professores coordenadores que participaram do curso trabalham, na sua
maioria, entre 40 e 60 horas semanais. Dentre esses, 18% trabalham 60 horas se-
manais; 75%, 40 horas semanais e 7% trabalham 20 horas semanais.
Os dados aqui apresentados indicam que, apesar de os cursistas não terem
as melhores condições para a realização da formação continuada, ela permanece
sendo importante para a qualificação da atuação desse profissional nas instituições
escolares. O que devemos nos perguntar é se, tendo tais profissionais melhores
condições para realização desta formação, tempo para leitura, articulação entre
teoria e prática, tempo para reuniões pedagógicas qualificadas, este processo de
formação continuada não poderia ficar muito mais qualificado na prática.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 287 22/10/2018 14:27:53


288 Escola de gestores: o perfil do Coordenador Pedagógico

Pensar criticamente o lugar da formação continuada para melhoria da qua-


lidade dos sistemas públicos de ensino brasileiro foi um dos pilares deste curso. O
curso nos alertou também para a questão da formação em serviço. É importante
destacar o papel da formação continuada para o fortalecimento de uma gestão
educacional comprometida com a qualidade e com o avanço de práticas demo-
cráticas nas escolas.

REFERÊNCIAS

BATISTA, Neusa; FLORES, Maria. Formação de gestores escolares para a educação básica: avanços,
retrocessos e desafios frente aos 20 anos de normatização da gestão democrática na LDBEN. Porto
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Livro Coordenação Pedagógica.indb 288 22/10/2018 14:27:53


O papel da coordenação 2 2
pedagógica no fortalecimento
da participação da comunidade
na gestão escolar

Neusa Chaves Batista


Eliane Helena Menegotti
Fátima Ehlert
Lúcia Fernanda Félix

INTRODUÇÃO

A educação brasileira tem sido pauta recorrente nos grandes debates nacionais
e tem, nesse percurso, motivado a análise do já posto e a construção de novas pro-
postas e alternativas no sentido de transformar a escola em um espaço democrático
de tomada de decisões, que garanta as condições de aprendizagem e de formação
humana a todos e todas.
No movimento de redemocratização do país, deu-se também a democratiza-
ção da educação. Essa se fez não somente com a garantia de acesso e permanência
na escola, mas também com a garantia de espaços para o exercício democrático
através da participação.
Sendo assim a educação passa a ser entendida como impulsionadora das
transformações por que passa a sociedade. A gestão da escola pública passa tam-
bém por transformações, especialmente após a Constituição Federal de 1988, que
abriu espaços para a participação da sociedade. Nesse período, os profissionais da
educação apropriaram-se do seu papel e lutaram pela construção de uma escola
democrática, que oportunizasse o acesso a todos e que garantisse condições de
trabalho, valorização e qualidade do ensino público.
Com certeza, nestes últimos anos, houve muitos avanços na educação,
governos, instituições, profissionais da educação e comunidade escolar tiveram
oportunidade de repensar seu papel na educação, não como meros cumpridores
de papéis, leis, normas e decretos; mas como sujeitos envolvidos neste processo em
construção que quer sair de uma relação autoritária para uma relação democrática
em que o coletivo prepondere sobre interesses individuais.

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290 O papel da coordenação pedagógica no fortalecimento da participação da ...

Nesse contexto, garante-se através da Lei de Diretrizes e Bases da Educação


(LDB) a gestão democrática da escola pública como um processo no qual se vislum-
bra a criação de oportunidades reais de efetiva participação de toda a comunidade
escolar na gestão da escola.
A gestão democrática no contexto da educação brasileira nos reporta a pro-
cessos que se inserem no rol das políticas educacionais, influindo decisivamente
nas mudanças de referenciais dos atores sociais que trabalham no ambiente escolar,
dando-lhes um novo sentido a cada período, que afetam, ao longo da história,
diretamente o dia a dia das escolas públicas brasileiras.
O presente artigo busca discutir as narrativas do papel da coordenação pe-
dagógica em diferentes momentos históricos, políticos e pedagógicos, procurando
compreender o papel do Coordenador Pedagógico como princípio da gestão escolar
democrática. Discutiremos como fio condutor a apresentação e as implicações
teórico-práticas sobre as políticas de educação e a gestão escolar democrática, com
o objetivo de relacionar o incremento da participação da comunidade escolar nesse
processo de materialização do papel do Coordenador Pedagógico na escola pública.
As mudanças do papel do Coordenador Pedagógico mostram que esse mo-
vimento tem gerado paradigmas que, por um determinado período, acabam por
serem incorporados como soluções preconizadas pelas legislações vigentes, como
soluções formatadas para qualquer comunidade escolar se considerarmos que
visam à eficácia das políticas educacionais. O Coordenador Pedagógico passa de
fiscalizador do processo educacional a mediador e articulador dos diversos sujeitos
envolvidos nesse processo.
No Brasil, a formulação de uma concepção sobre o papel do Coordenador Pe-
dagógico vem sendo repensada como consequência de uma reestruturação da gestão
escolar associada ao que é dito no ordenamento legal brasileiro e desdobramentos
das políticas e sistemas de ensino. Ao refletirmos sobre a história do Coordenador
Pedagógico e sua importância para o avanço na qualidade da educação, torna-se
central conhecermos as políticas públicas desenvolvidas para seu aperfeiçoamento.
Neste sentido, o Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica que a
partir do ano de 2006 oferece formação continuada aos membros das equipes ges-
toras das escolas, dentre eles o Coordenador Pedagógico, pretende contribuir para a
qualificação do gestor escolar na perspectiva da gestão democrática e da efetivação
do direito à educação escolar com qualidade social. Apresentaremos, portanto, a
estrutura geral do programa, seus objetivos, sua justificativa, seus princípios, bem
como as parcerias estabelecidas para a realização do curso em todo Brasil.
A metodologia de análise utilizada no artigo deu-se pela análise de conteú-
do. Realizou-se a leitura dos diferentes documentos e referenciais teóricos, bem
como utilizaram-se as experiências e conhecimentos das autoras sobre o conteúdo
abordado, assim como as práticas de trabalho como Coordenadoras Pedagógicas e
cursistas da Escola de Gestores, de modo a enriquecer o estudo (BARDIN, 1977).

Livro Coordenação Pedagógica.indb 290 22/10/2018 14:27:54


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 291

Destacamos a corroboração do diálogo a partir das perspectivas do papel


do Coordenador Pedagógico como figura de mediação na gestão das escolas, de
Sabrina Moehlecke. O mesmo vale para os estudos de Neusa Chaves Batista sobre
o Conselho Escolar, o qual, ao fazer parte do processo de democratização das re-
lações de poder com os diferentes segmentos da comunidade escolar, poderá, por
decorrência, contribuir para o incremento da participação na gestão das escolas.
Também destacamos aproximações com estratégias governamentais orientadas por
métodos e técnicas do setor privado para a gestão do setor público, com Jonh Clarke
e Janet Newman, José Carlos Libâneo, Paulo Freire e Demerval Saviani, entre outros.
A abordagem do papel do Coordenador Pedagógico é realizada com o refe-
rencial teórico que possibilita a compreensão da realidade articulando elementos
que passam entre, além e através das políticas educacionais, numa busca de en-
tendimento da complexidade de seus processos e práticas, em combinações com
conexões que dão sentido e significado, respondendo às necessidades da comuni-
dade escolar frente aos desafios que são impostos às escolas públicas brasileiras.

ABORDAGEM HISTÓRICA DO PAPEL DO


COORDENADOR PEDAGÓGICO DA ESCOLA

A gestão democrática tornou-se um dos temas mais discutidos entre os es-


tudiosos da área educacional a partir da década de 1990. “Gestão significa ato de
gerir, gerência, administração” (HOLANDA FERREIRA, 1999, p. 985); “a gestão
da educação é responsável por garantir a qualidade de uma mediação no seio da
prática social global” (SAVIANI, 1980, p. 120), “um processo de gestão que construa
coletivamente um projeto pedagógico de trabalho tem já, na sua raiz, a potência de
transformação” (FERREIRA, 2000, p. 113): refletir sobre o papel do Coordenador
Pedagógico diante desses conceitos de gestão é de extrema relevância. Como um
articulador no processo de gestão da escola, o Coordenador Pedagógico torna-se
indispensável como agente de transformação que possibilita a participação de
todos nesse espaço escolar.
Assim, torna-se importante iniciar essa reflexão apresentando como se deu a
introdução dessa função no contexto escolar. Com a tarefa de uniformizar propostas
pedagógicas, hierarquizar competências e controlar as práticas pedagógicas, nasceu
no Brasil, na década de 1920, a função de coordenação pedagógica com a deno-
minação de inspetor pedagógico1, que tinha como principal função coordenar um
currículo único, centralizado e homogeneizador, afastando qualquer possibilidade
de uma prática mais reflexiva e crítica.

1 Função de inspetor escolar criada por meio dos Decretos-Lei nº 19.890/31 e nº 21.241/32 no
contexto da Reforma Francisco Campos.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 291 22/10/2018 14:27:54


292 O papel da coordenação pedagógica no fortalecimento da participação da ...

Na década de 1970, dentro de uma concepção tecnicista, criou-se a função


de supervisor pedagógico, e, dentre as atribuições a ele conferidas, estavam definir
metodologias e apostilas, bem como fiscalizar a sua aplicação com o intuito de
controlar a escola e o que acontecia no interior dela. Nesse momento, o supervisor
pedagógico estava fortemente associado à fragmentação do trabalho escolar, dentro
de uma rígida hierarquia de poder dentro da escola (LIBÂNEO, 2005). Em muitas
escolas ainda podemos verificar várias marcas dessa fiscalização desempenhada
por muitos anos pelos profissionais que atuavam na função.
A partir da década de 1980, muitas mudanças aconteceram e, com a redemo-
cratização do país, o Coordenador Pedagógico passou a estabelecer relações mais
horizontais e descentralizadas, conquistando um espaço de articulação e formação
dentro do processo educativo.
O Coordenador Pedagógico recebeu destaque na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDBEN), nº 9.394/96, que ressignificou seu papel, colocando-o
como responsável por organizar um trabalho em conjunto com a comunidade esco-
lar, corroborando com a gestão democrática. A LDBEN foi um marco importante
para a educação brasileira, pois definiu a atuação das instituições e dos profissionais
da educação. Vale salientar que o Art. 3º, Inciso III da LDBEN estabelece a gestão
democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de
ensino, cabendo ao diretor promover essa gestão em sua escola através da articu-
lação com todos os segmentos envolvidos no processo educacional.
A gestão democrática será garantida através da autonomia financeira, peda-
gógica e administrativa, sendo necessária a divisão de competência pelo diretor,
que não conseguirá aglutinar e dar conta de toda essa complexidade sem a atuação
de um Coordenador Pedagógico comprometido com a gestão.
O papel do Coordenador Pedagógico ganhou novas feições em meio a essas
transformações, fruto de uma visão mais progressista que pretendia romper com a
gestão autoritária das instituições do Estado brasileiro, em que uma nova forma de
gestão escolar está sendo colocada em prática, ancorada em uma nova concepção,
a gestão democrática do ensino público.
Neste processo, o coordenador assume o papel de articulador e formador,
voltado ao trabalho de ensino e aprendizagem junto aos docentes e aos processos
de gestão, partindo de uma proposta de construção pela escola, de forma coletiva e
participativa, de seu Projeto Político-Pedagógico, envolvendo professores, alunos,
pais, funcionários e comunidade local.
O Coordenador passa a ter um papel articulador, formador e transformador, é
o elemento mediador entre currículo e professores, é aquele que fará a articulação
do processo educacional. As expectativas quanto a sua atuação envolvem a supe-
ração da antiga divisão do trabalho escolar e a dicotomia entre pensar/planejar e
fazer/executar. (ALMEIDA; PLACCO, 2001)

Livro Coordenação Pedagógica.indb 292 22/10/2018 14:27:54


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 293

Este novo papel contrapõe-se ao tempo em que a função do Coordenador


Pedagógico esteve relacionada à necessidade de controlar o processo educativo,
controle esse influenciado por questões históricas, culturais ou políticas. A função
também tinha a finalidade de manter o bom andamento das atividades no esta-
belecimento escolar, supervisionar as práticas pedagógicas do professor e analisar
o resultado obtido pelos alunos. Posteriormente foi dividida entre o trabalho de
supervisão e orientação educacional, havendo um entendimento de que o super-
visor acompanharia o trabalho docente e o orientador, a aprendizagem e o com-
portamento dos alunos. Dividido entre essas tarefas, pouco tempo era destinado à
articulação do processo educacional com os atores da escola e com a comunidade
escolar. Após a aprovação da LDB de 1996, abriram-se novas possibilidades de
atuação da coordenação pedagógica ressignificando esse trabalho.
Para Libâneo (2001, p. 183),
[...] o Coordenador Pedagógico é aquele que responde pela viabilização, integração
e articulação do trabalho pedagógico, estando diretamente relacionado com os pro-
fessores, alunos e pais. Junto ao corpo docente o coordenador tem como principal
atribuição a assistência didática pedagógica, refletindo sobre as práticas de ensino,
auxiliando e construindo novas situações de aprendizagem, capazes de auxiliar os
alunos ao longo da sua formação.

Com essa base e seguindo as orientações da LDBEN, espera-se que o Coor-


denador Pedagógico conquiste autonomia para organizar sua atuação pedagógica,
procurando contribuir com a garantia de uma gestão participativa e democrática
na escola. Para tal, quatro funções devem ser assumidas pelo Coordenador na sua
atuação: a mediadora no sentido de revelar/desvelar os significados das propostas
curriculares permitindo que os professores elaborem seus próprios sentidos; a arti-
culadora a fim de criar as condições para que os docentes trabalhem coletivamente
as propostas curriculares; a formadora ao dar condições para o docente aprofundar
na sua área; a transformadora ao se trabalhar com questionamentos, ajudando o
docente a ser reflexivo e crítico.
Piletti (1998, p. 125) ainda aponta algumas atribuições do Coordenador Pe-
dagógico frente ao processo da gestão democrática listadas em quatro dimensões:
[...] acompanhar o professor em suas atividades de planejamento, docência e
avaliação; fornecer subsídios que permitam aos professores atualizarem-se e
aperfeiçoarem-se constantemente em relação ao exercício profissional; promover
reuniões, discussões e debates com a população escolar e a comunidade no sentido
de melhorar sempre mais o processo educativo e estimular os professores a desen-
volverem com entusiasmo suas atividades, procurando auxiliá-los na prevenção e
na solução dos problemas que aparecem.

O Coordenador Pedagógico faz parte da equipe gestora da escola e, devido ao


seu papel de articulador e mediador, acaba por transitar em diferentes contextos

Livro Coordenação Pedagógica.indb 293 22/10/2018 14:27:54


294 O papel da coordenação pedagógica no fortalecimento da participação da ...

escolares e, com isso, tem uma escuta diversificada de diferentes olhares sobre
situações idênticas. Dessa forma, cabe ao Coordenador propor ações, projetos e
possibilidades que possam construir uma gestão democrática na escola, com a
participação dos diferentes atores na perspectiva de atender a diversidade, incen-
tivar a construção do conhecimento e promover a aprendizagem. Avaliar o Projeto
Político-Pedagógico numa constante reflexão possibilita um redimensionar prá-
ticas a partir de uma análise detalhada do proposto e do efetivamente realizado, e
essa ação deve ser incorporada à atuação do Coordenador Pedagógico de forma
participativa.
O Coordenador Pedagógico precisa impor-se enquanto mediador e articulador
do processo educativo, não aceitando o acúmulo de tarefas que facilmente lhe são
delegadas devido ao compromisso político e pedagógico na gestão da escola, que
perpassa elaborar horários, contar horas aulas, substituir professores, recepcionar
pais e alunos.
Lima e Santos (2007, p. 79) afirmam que várias metáforas são construídas
com relação ao trabalho do Coordenador Pedagógico:
[...]a de “bom-bril” (mil e uma utilidades), a de “bombeiro” (o responsável por apagar
o fogo dos conflitos docentes e discentes), a de “salvador da escola” (o profissional
que tem de responder pelo desempenho de professores na prática cotidiana e do
aproveitamento dos alunos). Além destas metáforas, outras aparecem definindo-o
como profissional que assume uma função de gerenciamento na escola, que atende
pais, alunos, professores e também se responsabiliza pela maioria das “emergências”
que lá ocorrem, isto é, como um personagem “resolve tudo” e que deve responder
unidirecionalmente pela vida acadêmica da escola.

Ainda acrescentam: “fica sob sua responsabilidade realizar trabalhos burocrá-


ticos e de secretaria, substituir professores, aplicar provas para aliviar sobrecarga
de horário, resolver problemas com pais e alunos” (LIMA e SANTOS, 2007, p.
82). Por muito tempo o Coordenador foi considerado um “faz tudo” nas escolas.
O maior desafio do Coordenador Pedagógico talvez seja reconstruir sua fun-
ção mediante toda a trajetória vivenciada por esse profissional ao longo da história
educacional e reafirmar uma nova atuação, mediando e articulando os processos
democráticos dentro da escola. Para que isso aconteça e para que todo o trabalho
realizado seja para afirmar esse novo entendimento, é necessário que todos se
conscientizem da verdadeira função do Coordenador.
O grande desafio está em articular e mediar o processo educacional num tra-
balho conjunto com os professores no sentido de significar a atuação pedagógica
como real possibilidade de aprendizagem, construção do conhecimento e estabe-
lecimento de relações horizontais e democráticas no interior da escola.
Freire (1982, p. 69) defende essa ideia ao sustentar que:

Livro Coordenação Pedagógica.indb 294 22/10/2018 14:27:54


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 295

[...] o Coordenador Pedagógico é, primeiramente, um educador e como tal deve estar


atento ao caráter pedagógico das relações de aprendizagem no interior da escola. Ele
leva os professores a ressignificarem suas práticas, resgatando a autonomia docente
sem se desconsiderar a importância do trabalho coletivo.

O Coordenador precisa estar presente em todos os espaços escolares, precisa


construir na escola o espaço de formação, de interação, de interlocução e de cons-
trução de alternativas capazes de aproximar o cotidiano escolar do ideal de escola
definido no PPP – Projeto Político-Pedagógico.
A escola como espaço de interação, troca de experiências significativas e ga-
rantia da aprendizagem necessita do efetivo comprometimento do Coordenador
Pedagógico. Todas as funções são importantes, mas a do Coordenador Pedagógico
permite ao gestor da escola estar presente em todos os espaços através do seu olhar.
Ele está diretamente ligado aos professores, aos pais e aos alunos.
Em meio a este processo, emerge a necessidade de formação continuada do
Coordenador Pedagógico. Foi com esse sentido que a Universidade Federal do
Rio Grande do Sul (UFRGS) por meio de convênio com o Ministério da Educação
(MEC) implementou o Curso de Especialização em Coordenação Pedagógica na
modalidade à distância.

UM BREVE DESENHO DO PROGRAMA NACIONAL


ESCOLA DE GESTORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA

Após a trajetória histórica que traçamos da atuação do Coordenador Peda-


gógico, apresentaremos a política do Programa Nacional Escola de Gestores da
Educação Básica, que se tornou um instrumento de formação continuada não só do
Coordenador Pedagógico, como também de toda equipe gestora da escola, pensando
a mesma como um organismo interligado, que tem um papel central na concepção
do fazer pedagógico. Para realizar uma formação com concepções democráticas, é
necessário, deste modo, reconhecermos as estratégias que a política utilizou para
alcançar todos os estados da federação, bem como os objetivos e concepções que
compreendem o Programa.
Em 2007, em conjunto com o Plano de Metas Compromisso Todos pela Educa-
ção (instituído pelo Decreto Lei nº 6.094), foi lançado o Plano de Desenvolvimento
da Educação (PDE), formado por um conjunto de programas que propõe como
objetivo a melhora da educação no Brasil. O plano se estrutura em cinco eixos prin-
cipais: Educação Básica; Educação Superior; Educação Profissional, alfabetização
e diversidade. Dentro do primeiro eixo encontramos o Programa Nacional Escola
de Gestores da Educação Básica.
O Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica é um programa
do Ministério de Educação (MEC) e possui dois objetivos gerais: formar, em nível

Livro Coordenação Pedagógica.indb 295 22/10/2018 14:27:54


296 O papel da coordenação pedagógica no fortalecimento da participação da ...

de especialização (lato sensu), gestores educacionais efetivos das escolas públicas


da educação básica, incluídos aqueles de educação de jovens e adultos, de educação
especial e de educação profissional; contribuir com a qualificação do gestor escolar
na perspectiva da gestão democrática e da efetivação do direito à educação escolar
com qualidade social. Através do programa, o MEC tem a expectativa da melhora
dos índices educacionais nos estados e municípios.
Em 2005, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (INEP)
ofereceu uma extensão em gestão escolar, com carga horária de 100 horas, para
dez estados da federação, com vagas para 400 dirigentes de escolas, o qual foi
considerado um piloto. Para estruturar o curso, portanto, os elaboradores do pro-
grama utilizaram como base não só o curso piloto, mas também um total de cinco
cursos voltados para os gestores escolares, sendo eles: Programa de Capacitação
a Distância para Gestores Escolares – PROGESTÃO, Programa Nacional Escola
de Gestores da Educação Básica Pública, Programa de Formação Continuada de
Gestores da Educação Infantil e Fundamental – PROGED, Centro Interdisciplinar
de Formação Continuada de Professores – CINPOP, Programa de Formação de
Gestores da Educação Pública – UDJF.
O Programa passou a ser coordenado pela Secretaria de Educação Básica
(SEB), contando com a colaboração da Secretaria de Educação à Distância (SEED)
e do Fundo de Fortalecimento da Escola – FUNDESCOLA\FNDE, no ano de 2006.
O curso é destinado aos profissionais de escolas públicas e de educação básica,
no âmbito municipal e estadual. Para oferecer a formação em todos os estados
da federação e Distrito Federal, a União realizou parcerias com a União Nacional
de Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME) e com o Conselho Nacional
de Secretários de Educação (CONSED), bem como descentralizou as formações
para 31 Instituições de Ensino Superior (IES) públicas. Estas parcerias evidenciam
a valorização dos IES, por parte da União, como produtoras de conhecimento, e
capacitadas para a sua difusão. De acordo com o MEC:
As políticas da SEB/MEC para articulação e/ou fortalecimento dos sistemas de
ensino e das escolas públicas sustentam-se nos princípios de descentralização e
parceria com entes federados e entidades nacionais do campo da educação, tendo
como pilares a afirmação do direito à educação e a gratuidade do ensino, inclusive
no âmbito da formação continuada dos profissionais de educação. (MEC, 2009. p. 3)
O desenvolvimento do Programa contou com três estágios de implementação.
O primeiro, no ano de 2006, deu início à Pós-Graduação (lato sensu) em Gestão
Escolar, a qual oferecia um curso de carga horária de 400 horas, destinado aos di-
retores e vice-diretores. O segundo, no ano de 2009, foi o Curso de Pós-Graduação
Lato Sensu em Coordenação Pedagógica, destinado aos profissionais que exercem a
função na escola, com carga horária de 405 horas. E o terceiro, no ano de 2010, foi
o Curso de Aperfeiçoamento em Gestão Escolar, com carga horária de 200 horas,
que abrangia a equipe gestora do estabelecimento de ensino.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 297

Compreendemos, como ponto central na elaboração de uma política, traçar


o perfil do seu público alvo, neste caso gestores das escolas, tanto municipais como
estaduais, que se distribuem no território nacional em capitais e regiões periféricas.
A partir desta perspectiva, portanto, é possível eleger instrumentos que possibilitem
o alcance dos destinatários dos serviços. Com essa visão, o formato do curso nas
universidades ocorreu pela Educação à Distância (EAD), possibilitando, assim,
uma maior cobertura. Conceituamos EAD neste momento como:
Educação à distância é uma estratégia para operacionalizar os princípios e os fins da
educação permanente e aberta, de tal maneira que qualquer pessoa, independente
do tempo e do espaço, possa converter-se em sujeito protagonista de sua própria
aprendizagem graças ao uso sistemático de materiais educativos, reforçados por
diferentes meios e formas de comunicação. (MARTINEZ, 1985 apud GARCÍA
ARETIO, 2001b, p. 26).

A Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) iniciou a parceria com


o Governo Federal no ano de 2007, oferecendo o curso através da Faculdade de
Educação (FACED) em colaboração com o Centro Interdisciplinar de Novas Tec-
nologias na Educação (CINTED). A primeira edição do curso ocorreu nos anos de
2007/2008, já a segunda edição, oferecida aos Coordenadores Pedagógicos, ocorreu
nos anos de 2009/2010, com um total de 1.100 vagas oferecidas aos gestores de todo
o estado nas duas edições. A terceira edição ocorreu nos anos de 2012/2013, e foi
ofertada aos diretores e vice-diretores, com o objetivo de “melhorar e democratizar
a gestão político-pedagógica das escolas da rede pública” (UFRGS, 2012), tendo
alcançado 116 municípios do estado do Rio Grande do Sul. Na quarta edição do
curso, ofertada nos anos de 2014/2015 aos diretores e vice-diretores, a demanda
de vagas foi feita pelo estado através da divulgação realizada pela UNDIME, pela
FAMURS, pela SEDUC e pelas CREs, não mais pelo MEC, e contemplou um total
de 399 cursistas.
Os documentos elaborados pelo MEC para nortear a concepção e a estrutu-
ração dos cursos oferecidos pelas universidades são: a Resolução 24/2010; Projeto
do Curso de Especialização em Coordenação Pedagógica; Projeto do Curso de
Aperfeiçoamento em Gestão Escolar; Projeto do Curso de Especialização em Gestão
Escolar. Após a contextualização do Programa, tanto em nível nacional, como em
nível regional, tomaremos com mais atenção, neste momento, o texto do documento
referente ao curso oferecido aos Coordenadores Pedagógicos.
O Projeto Pedagógico do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Coordena-
ção Pedagógica descreve o público alvo do programa, a justificativa, os objetivos, a
estrutura, bem como orientação curricular e orientações metodológicas. O curso
destina-se a Coordenadores Pedagógicos e\ou profissionais que exercem função
equivalente e integram a equipe gestora da escola de Educação Básica. Destacamos
como pré-requisito o pertencimento à rede pública municipal e/ou estadual de

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298 O papel da coordenação pedagógica no fortalecimento da participação da ...

educação básica, incluindo a Educação de Jovens e Adultos, a Educação Especial


e a Educação Profissional, o que demonstra o reconhecimento das diversas moda-
lidades dos estabelecimentos de ensino da rede.
O curso se justifica pelo reconhecimento do papel do Coordenador Pedagógico
como membro da equipe gestora da escola que possui influência direta na melhoria
da qualidade do ensino. Apresenta-se ainda a realidade complexa que o profissional
encontra ao desenvolver suas atividades, muitas vezes através do desvio de função,
responsabilidade demasiada e o isolamento para resolução de problemas. Sendo
assim, o curso deve contribuir para que o gestor consiga modificar essas realidades,
bem como capacitá-lo para exercer suas funções, de modo que:
Espera-se, pois, que sua atuação e seu trabalho contribuam, de maneira significativa,
para que se realize no interior da escola um ambiente educativo capaz de promo-
ver o desenvolvimento da aprendizagem, do conhecimento, do trabalho coletivo
e interdisciplinar, da ética e da cidadania, na perspectiva de uma educação e uma
sociedade cada vez mais inclusiva. (MEC, 2009, p. 5)

O objetivo geral do curso é formar, em nível de pós-graduação lato sensu,


coordenadores pedagógicos que atuam em instituições públicas de educação bá-
sica, visando à ampliação de suas capacidades de análise e resolução de problemas,
elaboração e desenvolvimento de projetos e atividades no âmbito da organização
do trabalho pedagógico e do processo de ensino-aprendizagem. Dentro os cinco
objetivos específicos, ressaltamos os de promover a reflexão sobre o trabalho peda-
gógico e gestão democrática que favoreçam a formação cidadã do estudante e o de
dominar e utilizar ferramentas tecnológicas no campo da organização dos processos
de trabalho nos sistemas e unidades de ensino, tomando-as como importantes
ferramentas para realização da gestão democrática da educação.
O curso tem como base cinco princípios orientadores, sendo eles: direito
à educação; gestão democrática; formação continuada crítica e promotora da
identidade profissional; articulação teórico-prática; integração dos elementos
curriculares. Em sua estruturação, o curso deve ter a carga horária de 405 horas,
e extensão mínima de 12 meses, e máxima de 18 meses. Na orientação curricular
e metodológica, o curso se organiza em 9 salas-ambiente, que possuem temáticas
específicas, porém a elaboração do conteúdo de cada temática é de responsabilidade
dos professores do IES, sendo previstos, no mínimo, três encontros presenciais. O
MEC prevê ainda uma avaliação realizada pela SEB/MEC e um acompanhamento
pela Coordenação Geral do Programa.
Ao visualizarmos os diferentes pontos que estruturam o programa como um
todo e o curso, especificamente, é possível depreender sua importância não só para
a capacitação do Coordenador Pedagógico, como também para avançarmos na
qualidade da educação nacional. O programa trabalha de forma descentralizada,
o que possibilita a interação de atores nacionais e regionais, bem como valoriza e

Livro Coordenação Pedagógica.indb 298 22/10/2018 14:27:54


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 299

evidencia o trabalho dos especialistas em educação, IES. A forma participativa como


o programa foi implementado possibilita ainda que as características regionais,
que um país com tamanho continental possui, sejam respeitadas e consideradas
na elaboração dos materiais. Já o formato EAD contribuiu para que o curso alcan-
çasse todos os estados da federação e o Distrito Federal, respeitando o princípio
da universalização do ensino.
O texto do Projeto Pedagógico reconhece os entraves à efetivação do papel
do Coordenador na escola, sendo o curso um momento de socialização tanto da
realidade escolar como de conhecimentos, gerando, em muitos casos, um panora-
ma mais geral que perpassa os muros da escola e operacionaliza para a superação
de crises. Ao trabalharmos com a educação básica, encontramos hoje uma grande
dificuldade no relacionamento entre o jovem e o profissional da educação, de modo
que a capacitação deste para o trabalho com as tecnologias não só favorece a ges-
tão escolar como aproxima estes atores para um diálogo ao manter o profissional
atualizado. Sendo assim, instrumentalizar o gestor e dar voz a sua realidade é o
primeiro passo para superarmos os obstáculos antes instransponíveis, de modo que
se valoriza a atuação do Coordenador Pedagógico, bem como se demonstra que
a educação é um bem de todos e deve ser construída de maneira conjunta entre
escolas, gestores, universidades e governos.

O COORDENADOR PEDAGÓGICO E A PARTICIPAÇÃO


DA COMUNIDADE ESCOLAR

No contorno de outras apreciações, o que as sínteses sócio-históricas e po-


líticas acima indicam são as mudanças e transformações fundamentais para que
se possa ampliar o olhar para a matriz cotidiana do Coordenador Pedagógico e o
espaço escolar no qual ele está inserido. Por conta disso, os espaços escolares, como
contextos do desdobramento das políticas educacionais, que são balizadas por suas
histórias, características, interesses, contradições, mais ou menos favoráveis, com
as políticas globais ou locais, produzem efeitos e consequências que “não são sim-
plesmente implementadas nessa arena, mas estão sujeitas à interpretação e, então,
a serem recriadas”. (BATISTA, 2013 apud MAINARDES, 2007)
O incremento de formas participativas está imbricado com as diretrizes e
políticas educacionais brasileiras que, como tais, devem ser desenvolvidas no
sentido de contribuir para a democratização e qualificação da educação, por meio
do compartilhamento das decisões sobre as ações nas escolas públicas, trazendo à
tona uma das mais importantes mudanças paradigmáticas dos quase trinta últimos
anos da educação brasileira (BATISTA, 2006). Destaca-se que paradigma, segundo
Capra (1993, p. 17), “significaria a totalidade de pensamentos, percepções e valores
que formam uma determinada visão da realidade, uma visão que é a base do modo

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300 O papel da coordenação pedagógica no fortalecimento da participação da ...

como uma sociedade se organiza”. Nesse sentido, a mudança de paradigma significa


a organização do processo de participação dentro dos ambientes escolares.
Acreditamos, ademais, que essas mudanças têm influenciado as realidades
das escolas deixando em aberto os caminhos a serem percorridos. A participação
como prática escolar se constrói todos os dias, e sua importância e legitimidade
social se produz nos processos administrativos, políticos, sociais e pedagógicos
que configuram o dia a dia escolar. Nessa medida, fortalecer a participação da
comunidade escolar e local é, portanto, um elemento que se traduz em uma das
dimensões fundamentais inerentes ao papel da coordenação pedagógica na esfera
da escola pública.
Isso posto, ao se instituir como teoria e prática, a participação é uma ferra-
menta essencial de ‘democratização da democracia’, conforme Boaventura de Sousa
Santos (2002). Entende-se, a partir dessa compreensão, que pais, alunos, professores
e funcionários contribuem para o combate às desigualdades escolares e sociais no
sistema educativo público, uma vez que, ao participarem das ações concretas que
são desenvolvidas na escola, todos passam a ser responsáveis pela busca de soluções
adequadas às suas necessidades e expectativas.
Há espaços nos quais as potencialidades da democracia participativa se in-
corporam na tessitura escolar, portanto, discutir o papel da coordenação pedagó-
gica da escola sob o viés da participação da comunidade escolar implica discutir
também o papel do Conselho Escolar (CE), já que o CE tem, em sua essência, a
participação do coletivo de professores, equipe diretiva, funcionários, pais, alunos
e comunidade local.
Por meio do CE, todos os atores ligados à escola podem se fazer representar e
decidir sobre todos os aspectos que dizem respeito às dimensões administrativas,
financeiras e pedagógicas da unidade escolar (BATISTA, 2016), participando e
interferindo nos rumos da escola. Desse modo, esse colegiado pode se tornar não
só um elo de participação, mas também de instrumento de gestão da própria es-
cola, pois, trata-se de, no coletivo, partilhar saberes e poder nas decisões centradas
em alcançar um ensino de qualidade que se reverta para todos os alunos em uma
aprendizagem significativa.
Tanto quanto Libâneo (2004, p. 102), acreditamos que ter como princípio a
participação
[...] é o principal meio de assegurar a gestão democrática da escola, possibilitando
o envolvimento de profissionais e usuários no processo de tomada de decisão e no
funcionamento da organização escolar. Além disso, proporciona um melhor co-
nhecimento dos objetivos e metas, da estrutura organizacional e de sua dinâmica,
das relações da escola com a comunidade, e favorece uma aproximação maior entre
professores, alunos, pais.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 300 22/10/2018 14:27:54


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 301

Temos que apreender a participação como um meio de assegurar o engajamen-


to de todos na organização escolar. Afinal de contas, não basta seguir as normati-
zações legais para democratizar a gestão da escola: faz-se necessário democratizar
as práticas da comunidade escolar. Trata-se, aqui, do fortalecimento da democracia
participativa, de “incorporar às práticas escolares um modelo de justiça social que
reconheça o direito da comunidade escolar e local de participar nas decisões sobre
todas as dimensões de organização da escola”. (BATISTA, 2016, p. 140)
É nessa perspectiva que vão se construindo, ao longo da história, sentidos
que colocam o «papel de articulador» do Coordenador Pedagógico, especialmente
no que a gestão escolar pode aportar na participação da comunidade escolar na
construção do Projeto Político-Pedagógico (PPP), «envolvendo professores, alunos,
pais, funcionários, comunidade», reconhecendo interesses, diversidades e ainda a
história cultural e pedagógica da escola. (MOEHLECKE, 2017, p. 227)
Há, portanto, nesse processo de formação continuada uma tarefa básica: a de
ir questionando-se na prática quais os fatores que podem limitar o papel do Coor-
denador Pedagógico na escola pública. Nessa perspectiva, a função da coordenação
pedagógica que muitas vezes é segmentada em coordenação da educação infantil,
anos iniciais e finais do ensino fundamental, na esfera municipal, tem respondido,
em grande medida, ao acompanhamento dos planos anuais, trimestrais e diários do
professor, controle dos registros diários de documentação e elaboração e divulgação
à família dos rendimentos bimestrais/trimestrais dos alunos.
Apesar dessa “naturalização” expressa e reforçada em muitos planos muni-
cipais em relação à dimensão de funções do Coordenador Pedagógico, cabe res-
saltar que o desafio não é apenas numérico com fechamento de notas e índices de
aprovação, reprovação, evasão, distorção idade-série, conselhos de classe, reunião
com os professores, etc. Ela envolve outros fatores que perpassam este universo tão
particular de cada escola. Em relação à realidade da educação brasileira, em que
os índices são sempre superlativos, percebemos que há cada vez mais necessidade
de analisar e avaliar o papel do Coordenador, uma vez que se espera dos gestores e
dos coordenadores pedagógicos um movimento de abertura e participação efetiva,
tanto no trabalho como nas decisões e nos resultados.
Nesses termos, articular teoria e prática em cursos de formação continuada
favorece o diálogo com perspectivas que acentuam o papel do coordenador pe-
dagógico no fortalecimento da participação da comunidade como prática escolar
necessária para a construção de propostas alternativas de organização e gestão da
escola. Tal articulação instiga o próprio Coordenador Pedagógico a refletir sobre
o seu papel social frente às questões e problemas escolares.
Com efeito, refletir sobre a gestão escolar democrática e suas narrativas, por-
tanto, significa destacar avanços significativos, mas também os limites e contradições
já encontrados nos “governo da educação”, como sugere Tedesco (2010, p. 20), que

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302 O papel da coordenação pedagógica no fortalecimento da participação da ...

colocam as políticas relativas à gestão escolar que não alcançam os índices desejados
em um marco de governo, ou de governos que se sucedem.
Isso porque, entende-se que a melhoria da qualidade da educação pública
tem sido a justificativa, de diferentes esferas de governo, para reformas realizadas
na política educacional brasileira ao introduzirem nas redes de ensino uma gestão
mais eficaz, com melhores resultados e aproveitamento com um ensino escolar
qualificado.
Com esse intuito, tais políticas reformadoras sinalizam o movimento de em-
pregar eficiência e competitividade nos sistemas de ensino, provocando alterações
que, considerando esses preceitos, estabelecem a relação de um novo modelo de
gestão pública, incorporado pela atuação do Terceiro Setor com parcerias do público
não-estatal que, conforme pesquisas de Theresa Adrião e Vera Peroni, trata-se de
uma “transferência da responsabilidade sobre a oferta das políticas sociais da esfera
estatal para as instâncias de natureza privada dos mais diversos formatos: empresa,
sociedades sem fins lucrativos, fundações, etc.”. (ADRIÃO e PERONI, 2005, p. 142)
Em consequência, para Clarke e Newman (2012, p. 353), o “novo geren-
cialismo” como forma de governo é “para pensar sobre projetos de reforma do
estado”. Desde então, no caso brasileiro, partindo de mecanismos de controle e de
resultados, as políticas implementadas buscam alternativas de mudanças na ges-
tão da escola pública para superar a crise do capital, por meio, principalmente, de
estados e municípios redefinindo seus papéis. Há, portanto, uma reconfiguração
da organização e da gestão da educação pública que incorpora uma nova lógica
de administração pautada a partir de ferramentas e estratégias empresariais, com
o intuito de “minimizar custos” do setor público (BATISTA, 2013, p. 21).
Segundo Batista “esta questão aparece com frequência em pesquisas sobre
políticas e gestão da educação no Brasil” (2013, p. 21). A autora cita Azevedo (2001),
Peroni (2003), Sander (2006) e Oliveira (2007), para dizer que:
[...] existe na atualidade um movimento na sociedade capitalista que introduz na
agenda dos Estados nacionais em âmbito global um modelo de gestão pública
norteado por pressupostos oriundos de organismos internacionais e baseados em
paradigmas do sistema econômico. Trata-se de estratégias governamentais orien-
tadas por métodos e técnicas do setor privado para a gestão do setor público cuja
ação recai sobre uma administração voltada para o critério de eficiência gerencial,
no sentido de racionalizar processos de gestão com o objetivo de minimizar custos
para os governos. (BATISTA, 2013, p. 21)

Têm-se aqui, claramente, pressupostos que anestesiam a gestão democrática da


escola pública, cujos expoentes estão ditos nas normatizações legais. A esse modelo,
que Batista (2013) refere como de “estratégias governamentais”, no qual a lógica de
administração da esfera privada é mais eficiente do que a forma de gestão da esfera
pública, Clarke e Newman (2012, p. 358) atribuem o conceito de ‘gerencialismo’.
Pode-se compreender o gerencialismo como a introdução de “novas lógicas de

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 303

tomadas de decisão que privilegiam a economia e a eficiência gerencial acima de


outros valores públicos”, com um deslocamento e inserção de “métodos e técnicas
do setor privado para a gestão do setor público” (BATISTA, 2013, p. 21) e, assim,
legitimando na gestão pública o gerencialismo do setor privado.
Dessa forma, no que diz respeito à gestão escolar, é cada vez mais frequente
os governos tomarem a decisão de implementar nas escolas públicas programas
de formação continuada aos professores e coordenadores pedagógicos que seguem
a lógica do setor privado, incentivando: administração de procedimentos, metas,
etapas de desenvolvimento e avaliação de processos, busca de mudanças nos re-
sultados que visam à eficiência no desempenho dos alunos e alunas com vistas à
obtenção de melhores índices nas avaliações externas.
Diante disso, além da transferência de responsabilidade para as escolas, elas
começam a perder sua autonomia, minimizando os espaços para desenvolverem
seus Projetos Políticos-Pedagógicos e, em grande medida, passaram a serem cobra-
das por sua produtividade sendo, inclusive divulgados e comparados os índices e
resultados entre as instituições de uma mesma rede, estimulando a competitividade.
Dizer isso sobre a gestão gerencialista implica reconhecer que as estratégias
ou práticas constituem-se por um mercado ‘competitivo’, e o que está em jogo,
portanto, segundo os autores, é a exigência de um desempenho, o que passa por
“oferecer toda gama de boas práticas em negócios que as organizações no setor
público precisavam aprender”. (CLARKE, NEWMAN, 2012, p. 358)
Essa formatação no trabalho pedagógico escolar acaba por desenvolver um
processo centralizador de resultados e metas a serem alcançados, ou seja, a escola
passa a ser um cliente a partir do momento em que algo de fora vem alterar sua
rotina de modo a impor regras e estratégias de desenvolvimento do trabalho pe-
dagógico, em diferentes modalidades da Educação Básica brasileira.
Essa compreensão da “gestão eficaz” nos direciona para um caminho que
acarreta a transformação do gestor escolar e coordenadores em ‘gerentes das escolas’,
quando então a narrativa da realidade não é perceptível em processos diferenciados
para cada situação, mas, sim busca-se tão somente um resultado final.
Desta forma, o “novo gerencialismo público” tem sido uma das chaves políticas
para as mudanças na gestão escolar, na qual o papel do Coordenador Pedagógico
vem limitando-se a acompanhar o desenvolvimento dos programas implantados,
e os obstáculos colocados por esta formatação na educação pública passam a ser
inversamente proporcionais às condições participativas e subjetivas da gestão escolar
democrática, paradoxalmente “às conquistas, em especial a gestão democrática do
ensino público”. (BATISTA, 2013 p. 21-22)

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304 O papel da coordenação pedagógica no fortalecimento da participação da ...

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Retomamos, nestas considerações finais, a argumentação central posta para


reflexão neste texto. Buscamos discutir as narrativas do papel da coordenação pe-
dagógica em diferentes momentos históricos, com a finalidade de contextualizá-lo a
partir da emergência do princípio de gestão democrática do ensino público, a qual
exige medidas de maior participação e inclusão social na organização e gestão dos
sistemas de ensino e das escolas públicas. Argumentamos ainda sobre a importância
da formação continuada destes profissionais por meio de cursos de especialização
ofertados por convênios entre universidades federais (Faculdades de Educação) e
Ministério da Educação (MEC) por meio do programa Escola de Gestores. Neste
texto, exemplificamos o caso de formação de coordenadores pedagógicos através
do convênio realizado entre a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS-
-FACED) e o MEC e, ao fazê-lo, procuramos dar foco ao papel de mediação do
coordenador na organização e prática da gestão escolar democrática.
Como se pode observar, o papel do Coordenador Pedagógico tem tido a
marca da escola autocrática e centralizadora; contudo, a atuação deste profissional
passa a ser fundamental para a mudança das práticas escolares exigida pela gestão
democrática. Neste contexto, sua atuação implicou uma formação continuada que
incorporasse os conteúdos e práticas associados ao novo modo de gerir as escolas
públicas.
Podemos dizer que, conforme indica Enguita (2004), a principal função da
escola nunca foi ensinar, mas sim educar. Para o bem ou para o mal, o objetivo
da instituição escolar, como de qualquer forma de educação, sempre foi mais o
de modelar a conduta, as atitudes, as disposições, etc., do que o conhecimento
teórico ou as atividades práticas. Essa função da escola na perspectiva da gestão
democrática precisa ser problematizada e tensionada tanto no âmbito das relações
intraescolares quanto no âmbito da formação dos profissionais da educação: dire-
tores, coordenadores pedagógicos, professores e funcionários. É neste sentido que
o Coordenador Pedagógico assume importância como mediador das instâncias
escolares e da organização do seu trabalho, para fortalecer a participação de toda
a comunidade escolar no processo de construção de novas concepções para a
prática da gestão escolar democrática, uma vez que o bem coletivo só ocorre com
a participação de todos.
Para finalizar, destacamos que o fortalecimento da participação da comuni-
dade escolar na organização e gestão da escola pública é elemento fundamental
para a emergência de uma escola mais socialmente justa. Para tal, é preciso ten-
sionar constantemente o conceito de justiça escolar, admitindo-se que a sociedade
capitalista possui uma estrutura de classe que institucionaliza alguns mecanismos
econômicos que negam de forma sistemática para alguns de seus membros os
meios e as oportunidades de que necessitam para participar na vida social em pé

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 305

de igualdade com os demais. De modo semelhante, é preciso também reconhecer


que a sociedade reproduz uma hierarquia de status que institucionaliza padrões
de valor cultural que negam por completo a alguns membros o reconhecimento de
que necessitam para participar plenamente da interação social (FRASER, 2006).
Logo, a construção de novas concepções e práticas escolares passa pela formação
e redefinição de novos papéis sociais, a exemplo do Coordenador Pedagógico, cuja
base está referenciada pela inclusão e participação democrática.

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O Coordenador Pedagógico e a 2 3
avaliação institucional na perspectiva
da gestão democrática

Andréia da Silva Mafassioli

INTRODUÇÃO

Trato neste texto do papel exercido pela coordenação pedagógica, na esfera da


gestão escolar, na perspectiva da gestão democrática, princípio constitucional. Este
princípio básico deve nortear o ensino público brasileiro, conforme estabelecido
pela Constituição Federal (CF) de 1988 e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educa-
ção Nacional (LDB), Lei nº 9.394/96. Entre as diferentes estratégias e formas de
estabelecer processos democráticos na gestão escolar, está o processo de avaliação
institucional participativo, foco deste artigo. Apresentarei elementos teóricos e
práticos sobre a atuação da coordenação pedagógica na escola de educação básica
e sua contribuição para estabelecer estratégias de avaliação institucional que con-
templem as dimensões de autoavaliação e avaliação em larga escala.

A COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA: SUAS FUNÇÕES


E O SEU PAPEL NA GESTÃO ESCOLAR

A função de coordenação pedagógica1 no meio educacional inicia a partir dos


anos 1980, em substituição ao serviço de supervisão escolar, que tinha como papel
fiscalizar o trabalho docente, totalmente ligada ao curso de pedagogia e à LDB nº
5.692/71, outorgada no período ditatorial. O curso de pedagogia desde a sua ori-
gem, no ano de 1939, “vem sofrendo alterações, ora se adaptando às necessidades
do mercado de trabalho, ora como resultado de proposições da própria área de
conhecimento” (FURLAN, 2008, p. 3863).
Para compreendermos as mudanças ocorridas no papel do pedagogo na es-
cola, é importante retomar as orientações anteriores à LDB 9394/96. A função de

1 Tomando por base estudos de Furlan (2008), Fernandes (2013), Pires (2014) e Lima (2016).

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308 O Coordenador Pedagógico e a avaliação institucional na perspectiva da gestão ...

supervisão escolar foi criada em um contexto que direcionava para uma atuação
de controle sobre o trabalho dos professores. Com a redemocratização política
no país a partir da década de 1980, foi possível verificar o amadurecimento do
movimento sindical e do debate sobre a reformulação do modelo político, com
a promoção de eleições diretas e promulgação de uma nova Constituição. A luta
por um regime político democrático e participativo ganhou força, sendo preciso
levar para dentro das escolas novas configurações dos papéis dos seus diferentes
profissionais. Segundo estudo de Lima (2016),
ocorreu, então, a pressão para que a função de controle e fiscalização do trabalho
docente fosse substituída no ambiente escolar pela função de acompanhamento
das atividades pedagógicas de planejamento e avaliação. Em alguns Estados, o
supervisor redimensionou suas atribuições para cumprir com essa função. Em
outros, começou a ser usado o termo “Coordenador Pedagógico” para designar
o professor que passaria a exercer esta função de apoio e organização do trabalho
docente em colaboração com o supervisor. Assim, a partir da década de 1980, passa
a ser possível encontrar em documentos oficiais o uso da expressão Coordenador
Pedagógico (LIMA, 2016, p. 48).

Os movimentos docentes organizados lutavam há vários anos para ter nas


escolas sujeitos capazes de desenvolver ações de articulação do trabalho coletivo
em torno de um verdadeiro projeto pedagógico. O Coordenador Pedagógico tem
forte relação com a gestão democrática das escolas, representando uma possibi-
lidade de superação da rígida estrutura hierárquica que predominou nas escolas
brasileiras por vários anos e na qual se situaram em polos opostos especialistas e
docentes. (FERNANDES, 2009, p. 1)
A função de Coordenação Pedagógica (CD) passa a se estabelecer, em vários
estados brasileiros, numa perspectiva democrática, com ênfase na organização de
processos coletivos que visam integrar os docentes. O papel fiscalizador, exercido
no período de recessão pela supervisão pedagógica, desfez-se e o Coordenador Pe-
dagógico tornou-se um articulador de ações pedagógicas, mediando as orientações
dos sistemas de ensino com as demandas internas das comunidades escolares. Essa
redefinição da função profissional para o acompanhamento das atividades docentes,
seja por um supervisor licenciado em pedagogia ou por um professor especialista
escolhido por seus pares, assinalou as dimensões política, técnica e pedagógica para
sua atuação. Em alguns estados do país houve a criação do cargo de Professor Co-
ordenador Pedagógico, em outros se manteve a função do Supervisor Pedagógico.
Durante a década de 1990, entrou em cena uma nova cartilha em que consta-
vam lições modernas que evocavam conceitos como desestatização, reinserção no
sistema internacional, abertura da economia, desregulamentação e privatização, no
sentido de colocar o Brasil na corrida para o desenvolvimento nos moldes neolibe-
rais. Ao longo dessa década, a CD será repensada, em função dos reflexos vividos
na década anterior e, sobretudo, pela influência dos organismos internacionais, que

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 309

passam a ter uma presença sistemática por toda a década, reapresentando, perante
o governo federal e secretarias estaduais, a importância do sistema educacional
para uma sociedade capitalista, as formas como ele deve ser monitorado e o papel
que os atores sociais e históricos têm dentro dele no desenvolvimento dos objetivos
traçados por tais órgãos na equiparação a outras economias capitalistas.
Dessa forma, a educação brasileira passou por reformas em sua estrutura e
orientações, reformas essas que mesclaram conquistas da transição democrática
com referências do ideário neoliberal2, destacando-se as seguintes: redistribuição de
recursos, descentralização da execução do gasto, descentralização, desconcentração
dos recursos e funções. As principais mudanças encaminharam a redefinição dos
currículos, da gestão e da avaliação do sistema educacional.
Nos anos 2000, com o término do governo Fernando Henrique, um novo
paradigma de administração pública foi sustentado no período Lula da Silva, vol-
tado para promover mais inclusão social e combater as desigualdades sociais. A
partir daí, o Estado é que teria que se adequar a essa premissa, pois modernizar e
transformar a administração pública para torná-la mais eficiente e eficaz implicava
necessariamente torná-la a serviço e sob a participação e controle de seus usuários.
A reforma do Estado era possível, desde que atendesse às reais necessidades do
cidadão e contemplasse políticas públicas de qualidade, abrangentes e democráticas.
(SOUZA, 2003)
Na educação, o MEC apresentou em 2007 o Plano de Desenvolvimento da
Educação (PDE), com o objetivo de comprometer os estados e municípios brasilei-
ros com a melhoria da qualidade da educação. A partir daí, inúmeros programas e
políticas públicas de educação passaram a ser implementados nas escolas públicas
brasileiras3. Entre eles, diferentes modalidades do Programa Dinheiro Direto na
Escola (PDDE): PDE escola, PDDE escola aberta, PDDE água na escola, acessi-
bilidade, educação integral, escola do campo, escolas sustentáveis, entre outros.
Frente às inúmeras políticas e demandas destinadas às instituições públicas de
ensino no Brasil, ocorreu uma intensificação no trabalho exercido pelos gestores
escolares, entre eles os coordenadores pedagógicos, que tiveram suas responsabili-
dades ampliadas, principalmente em ações avaliativas, administrativas e financeiras.
Devido a isso, assumiram diferentes responsabilidades na gestão escolar, tais como:
questões de aprendizagem, diversidade, inclusão, gestão democrática, acompanha-
mento de avaliação externa, avaliação institucional, entre outras tarefas ampliadas
a partir de reformas econômicas e políticas e a inserção dentro da globalização.
Desta forma, a CD nas escolas públicas de educação básica precisou desenvol-
ver a capacidade de trabalhar com as diferenças étnicas, raciais, religiosas, físicas,
entre outras. Coube ainda a esse profissional articular os processos educativos no
âmbito da escola. As propostas pedagógicas assumiram um caráter mais progres-

2 Conforme Draibe (1999).


3 PDE escola, PDDE modalidades: Mais Educação, Acessibilidade.

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310 O Coordenador Pedagógico e a avaliação institucional na perspectiva da gestão ...

sista, enfatizando a ética, a cidadania e a inclusão como componentes norteadores


dos Projetos Político-Pedagógicos (PPP), contribuindo assim para a construção de
um trabalho pautado em um processo de gestão democrática.
A partir dessa breve retomada histórica sobre as reformas políticas, econômi-
cas, estruturais que modificaram o cenário educacional brasileiro e que estabele-
ceram mudanças no trabalho da CD, entendo que o principal compromisso desse
profissional atualmente é mobilizar os demais membros da gestão escolar para
a elaboração e a implementação de um PPP que fortaleça o princípio da Gestão
Democrática (GD) na escola.
Exerço há mais de vinte anos a função de Coordenadora Pedagógica em escola
pública no sistema municipal de ensino. Ao longo desses anos, tenho clareza de
que somente praticando a GD podemos ampliar a qualidade da educação pública.
Esse processo envolve a participação efetiva dos segmentos da comunidade escolar
em processos coletivos para estabelecer um PPP de qualidade. Para isso, cabe ao
Coordenador mobilizar e articular ações pedagógicas no cotidiano escolar numa
concepção de educação libertadora e inclusiva, que contemple temas da diversidade
humana, estimulando a leitura crítica do mundo, superando os padrões de uma
sociedade ainda machista, racista, homofóbica e classista.
Compete ainda à CP orientar, coordenar, propor alternativas de trabalho para
melhorar o ensino e a aprendizagem, mediar conflitos, dialogar com as famílias
e realizar atividades administrativas. Com esta gama de trabalho, a CP enfrenta
algumas vezes a falta de identidade. Em um espaço de trabalho onde há restrição na
quantidade de funcionários para o número de alunos, o trabalho não é tarefa fácil.
Porém, ao refletir sobre a função no cotidiano escolar, percebe-se a fundamental
importância do Coordenador nas atividades formativas para que assim seja possível
levar mais reflexão à prática pedagógica. Na próxima seção do texto, apresentarei
de forma mais detalhada os processos que envolvem a gestão escolar exercida de
forma democrática e o papel da coordenação pedagógica nesse cenário.

A GESTÃO ESCOLAR NA PERSPECTIVA DA GESTÃO DEMOCRÁTICA


E O PAPEL DA COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA NESTE CONTEXTO

A escola, uma organização social, é parte constituinte e constitutiva da so-


ciedade na qual está inserida. Assim, estando a sociedade organizada sob o modo
de produção capitalista, a escola contribui tanto para manutenção desse modo de
produção, como também para sua superação, tendo em vista que é constituída
por relações contraditórias e conflituosas estabelecidas entre grupos antagônicos.
A possibilidade da construção de práticas de gestão na escola, voltadas para a
transformação social com a participação cidadã, reside nessa contradição em seu
interior. Deste modo, a gestão escolar é vista por alguns estudiosos como a media-

Livro Coordenação Pedagógica.indb 310 22/10/2018 14:27:54


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 311

ção entre os recursos humanos, materiais, financeiros e pedagógicos, existentes na


instituição escolar, e a busca dos seus objetivos, não mais o simples ensino, mas a
formação para a cidadania.
Para compreender o campo de atuação e os limites da gestão na educação,
é importante traçar uma diferenciação entre gestão educacional e gestão escolar.
Segundo Vieira (2006, p. 63), a gestão educacional refere-se à esfera macro, envol-
vendo um amplo espectro de iniciativas desenvolvidas pelas diferentes instâncias
de governo. A gestão escolar situa-se no plano da escola, esfera micro, promovendo
o ensino e aprendizagem, viabilizando a educação como um direito de todos.
A gestão escolar se estabelece em modelos distintos de atuação voltados para
contemplar interesses diversos. Entre esses modelos, destaco o autocrático, o parti-
cipativo, o gerencial ou gerencialista (estratégico) e o da gestão democrática. Cada
um desses modelos apresenta uma base ideológica e uma concepção política e pe-
dagógica que direciona o sentido da visão de mundo, de homem e de sociedade. Os
objetivos da organização escolar democrática e da organização escolar gerencialista
não são apenas diferentes, mas antagônicos. A escola objetiva o cumprimento de
sua função de socialização do conhecimento historicamente produzido e acumu-
lado pela humanidade, ao passo que a empresa visa à expropriação desse saber na
produção de mais valia para a reprodução do capital, para manter a hegemonia do
modo de produção capitalista. (DOURADO, 2006)

A GESTÃO ESCOLAR NA PERSPECTIVA DA GESTÃO DEMOCRÁTICA

Somente no final da década de 1980, conforme destacado anteriormente, foi


possível avançar no reconhecimento da gestão da escola numa perspectiva de-
mocrática. Esse processo de retomada democrática no Brasil, entre outras ações,
encaminhou a aprovação do princípio de “Gestão Democrática do Ensino Público”,
na CF de 1988. No artigo 206, ela estabelece os “princípios do ensino” e inclui, no
Inciso VI, a “gestão democrática do ensino público”, princípio esse retomado na LDB
de 1996, que também estabelece (Art. 3) que o ensino será ministrado com base
em diversos princípios, entre os quais, a “gestão democrática do ensino público, na
forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino”. A partir dessas conquistas
legais, as escolas passaram a ter legitimidade para promover a democratização da
gestão como possibilidade de melhoria do processo educacional.
Diferentes estudos4 aprofundam o tema da gestão escolar pública na perspec-
tiva da GD. Para estabelecer essa dinâmica na escola, ou seja, praticar a democracia,
Cury defende a seguinte ideia:

4 Barroso (2000), Cury (2005), Dourado (2001, 2006, 2007), Luce e Medeiros (2006), Paro (2000,
2001, 2007) Oliveira (2006), Vieira, (2007), entre outros.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 311 22/10/2018 14:27:54


312 O Coordenador Pedagógico e a avaliação institucional na perspectiva da gestão ...

[...] gestar é produzir o novo e gestar é crescer junto. Gestar é um ato pelo qual se
traz em si e dentro de si algo novo, diferente: um novo ente. Isso significa que o
gestor não pode ter um contrato com a desesperança. A gestão implica um ou mais
interlocutores com os quais se dialoga pela arte de interrogar e pela paciência em
buscar respostas que possam auxiliar no governo da educação segundo a justiça.
Nesta perspectiva, a gestão implica o diálogo como forma superior de encontro das
pessoas e solução dos conflitos (CURY, 2005, p. 11).

O sentido da gestão escolar que promove o encontro das pessoas, o diálogo,


a troca de ideias para a solução de conflitos é o sentido da GD, em que as decisões
da escola devem ser compartilhadas entre os diferentes segmentos, administrando
ideias, conflitos e opiniões divergentes na busca de consensos temporários para
a resolução de questões da escola. Esses processos de participação e do trabalho
coletivo devem ser estabelecidos nos espaços de ação colegiada (Conselho Escolar,
Grêmio Estudantil) a serem previstos no PPP, como mecanismos que podem fazer
a diferença.
Para o exercício da GD, alguns elementos tornam-se indispensáveis. Entre
eles destaco a participação, a autonomia e a descentralização. A participação não
é um processo que está dado. Os indivíduos não nascem sujeitos participativos,
tendo, portanto, que aprender a participar na pólis, a cidade entendida como a
comunidade organizada, formada pelos cidadãos, no exercício cotidiano e coletivo,
quando são disponibilizados tempo e espaço para isso.
A democracia e a participação são tão indispensáveis à concretização de uma
educação democrática quanto a educação democrática é imprescindível à realização
da democracia e da participação. É esse o objetivo central da democracia participa-
tiva defendida pelos teóricos da educação numa perspectiva crítica. A participação
envolve escolha, compromisso e exposição de diferentes ideias. Tal é o sentido da
democracia participativa.
Outros elementos indispensáveis neste processo de fortalecimento da demo-
cracia são os da autonomia e o da descentralização. A autonomia, na perspectiva da
democratização da gestão, requer responsabilidade para com os outros. As escolhas
não são individuais, a tomada de decisão é partilhada e coletiva. Nas palavras de
Barroso (2000, p. 16-17):
A autonomia é também um conceito que exprime sempre certo grau de relatividade:
somos mais, ou menos, autônomos, podemos ser autônomos em relação a umas
coisas e não em relação a outras. A autonomia é, por isso, uma maneira de gerir,
orientar, as diversas dependências em que os indivíduos e os grupos se encontram
no seu meio biológico ou social, de acordo com as suas próprias leis [...].

Para exercer a autonomia escolar, Veiga (2008) defende que há quatro dimen-
sões consideradas básicas para o bom funcionamento de uma instituição educativa,
as quais, segundo ela, devem ser relacionadas e articuladas entre si. São elas:

Livro Coordenação Pedagógica.indb 312 22/10/2018 14:27:54


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 313

Quadro 1 – Dimensões da autonomia escolar

AUTONOMIA AUTONOMIA AUTONOMIA AUTONOMIA JURÍDICA


PEDAGÓGICA ADMINISTRATIVA FINANCEIRA
Liberdade de propor Possibilidade de elaborar Disponibilidade de Possibilidade de a escola
modalidades de ensino e gerir seus planos, recursos financeiros elaborar suas normas
e pesquisa. Está programas e projetos. capazes de dar à e orientações escolares
estreitamente ligada à instituição educativa em consonância com a
identidade, à função condições de legislação educacional,
social, à clientela, à funcionamento efetivo. como, por exemplo,
organização curricular, à matrícula, transferência
avaliação, bem como aos de alunos, admissão de
resultados e, portanto, professores, concessão
à essência do projeto de grau.
pedagógico da escola.
(VEIGA, 1998, p. 16-19)

Fonte: Veiga (2008). Nota: Elaborado pela autora.

Em relação à dimensão administrativa, a conquista da autonomia da escola


passa pela descentralização das decisões que contribui de maneira significativa
para a construção da autonomia da escola e essa constitui um aspecto fundamental
da GD.
Teórica e legalmente, o exercício da GD parece simples de ser estabelecido.
Porém, na prática de escolas públicas, não é isso que as pesquisas sobre o tema
indicam. Nas palavras de Vieira (2007),
[...] parte da dificuldade da gestão diz respeito ao fato de ela se situar na esfera das
coisas que têm que ser feitas. E o que tem que ser feito nem sempre agrada a todos.
Não dá votos; ao contrário, fere interesses. Desestabiliza o que está posto. Por me-
nores que sejam as mudanças pretendidas, atingem pessoas. Corporações. Mudar
nunca é simples, o que pode ser detectado nas coisas mais elementares: desde a
simples cor de uma parede até a inclusão ou retirada de uma disciplina. Isto para
não falar de vantagens corporativas. Gente é assim. Resiste. Reage. Faz corpo mole.
Abandona a gestora na primeira medida antipática à vontade da maioria. E gestão
se faz em interação com o outro. Por isso mesmo, o trabalho de qualquer gestor
ou gestora implica sempre em conversar e dialogar muito (VIEIRA, 2007, p. 59).

Portanto, há fragilidades em estabelecê-la, e muitos inclusive consideram-na


ultrapassada, sem nem mesmo ter sido suficientemente exercitada. Colocar em
prática essa concepção ainda é um desafio nas escolas públicas brasileiras, pois
implica romper com paradigmas tradicionais e práticas autoritárias.
Para estabelecer a GD na escola, são necessárias algumas práticas permanentes.
Destaco como primordial o exercício da tríade: formação – comunicação – in-
formação. Compete ao profissional, Coordenador Pedagógico, juntamente com a
equipe gestora, colocar em prática esses processos, por meio de ações pedagógicas
planejadas no PPP e avaliadas periodicamente.

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314 O Coordenador Pedagógico e a avaliação institucional na perspectiva da gestão ...

A CP é vista como multiplicadora das atividades formativas para a equipe do-


cente. Cabe a esse profissional, com o apoio da gestão escolar, organizar atividades
de formação, promovendo encontros periódicos para refletir e debater sobre temas
da educação com a finalidade de qualificar os processos de ensino e de aprendi-
zagem. A formação continuada dos profissionais da escola deve ser planejada em
projeto específico, prevista no calendário escolar, em tempos e espaços qualificados
de estudo e reflexão. O coordenador é, sem dúvida, um agente muito importante
na formação dos docentes. Ele leva os professores a ressignificarem suas práticas,
resgatando a autonomia docente sem se desconsiderar a importância do trabalho
coletivo.
A comunicação entre os diferentes setores e profissionais da escola é o segundo
processo a ser estabelecido na tríade. A equipe gestora deve organizar estratégias
que facilitem a comunicação entre as pessoas da comunidade escolar, mantendo o
grupo ciente dos projetos e ações planejados pelos coletivos de trabalho da escola. A
informação completa essa tríade facilitadora de processos democráticos na escola.
Os diferentes segmentos precisam estar informados dos processos pedagógicos da
instituição. Esse ciclo – formação, comunicação e informação– quando colocado
em prática pela gestão escolar, na perspectiva da GD, conduzido pela coordenação
pedagógica, compromete os sujeitos da escola com o PPP, pois os mesmos se sentem
ativos e participantes da/na vida escolar.
Um dos mecanismos essenciais para o fortalecimento da gestão escolar na
perspectiva da GD é a avaliação periódica dos processos pedagógicos da instituição.
Para isso, defendo o estabelecimento de processos participativos de avaliação. Na
próxima seção do texto, destaco os principais elementos para a prática da avalia-
ção institucional, enfatizando o papel da coordenação pedagógica nesse processo.

OS PROCESSOS DE AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO BÁSICA

Nas últimas décadas, a avaliação e as formas de avaliar têm sido tema predomi-
nante nos discursos e textos da política educacional brasileira como estratégia para
melhoria da qualidade da educação básica. Em cada período, a avaliação assume
diferentes modelos e funções. Entre avanços e retrocessos, seguimos com o desafio
de superar os índices do fracasso escolar, estabelecendo uma forma de avaliação
educacional para além da lógica classificatória que resulta em reprovação e faz com
que muitos alunos percam o interesse pela escola e a abandonem. Além disso, nos
últimos anos, aumentou o espaço ocupado pelas avaliações externas no contexto
das políticas públicas de educação em nível nacional, com poucas experiências
no uso de avaliações internas. A avaliação institucional (AI) na educação básica
ainda não se constitui uma prática consolidada no contexto educacional brasileiro.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 314 22/10/2018 14:27:54


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 315

Na avaliação externa, mesmo contando com a colaboração dos profissionais


da escola avaliada, o processo avaliativo é realizado por agentes externos à escola
(pertencentes a agências públicas ou privadas). Já o processo de AI, defendido neste
estudo, é produto da integração e entrelaçamento dos processos de avaliação exter-
na e interna. Frente aos inúmeros desafios para garantir o direito a uma educação
pública de qualidade que oportunize acesso, aprendizagem e conhecimento, faz-se
necessário estabelecer processos de avaliação que envolvam todos os sujeitos res-
ponsáveis pela educação nos sistemas de ensino: gestores, professores, especialistas,
alunos, comunidade escolar.
Um dos estudos referência sobre o tema, organizado por Freitas et al (2009),
apresenta diferentes níveis para realização da avaliação educacional integrados entre
si: da aprendizagem, institucional e das redes de ensino (sistemas). A avaliação da
aprendizagem é realizada pelos professores e envolve os processos pedagógicos ocor-
ridos na escola e em sala de aula. A avaliação institucional requer o envolvimento da
comunidade escolar: professores, gestores, alunos, funcionários e pais participam e
avaliam a instituição, verificando seus limites e suas possibilidades, estabelecendo
ações que fortaleçam o projeto pedagógico da escola. Essa estratégia de avaliação
deve, segundo os autores, ser um ponto de encontro entre os dados provenientes
da avaliação dos alunos realizada pelos professores e a realizada pelo sistema, pois
ambas têm como sujeito o aluno, figura central da escola. Na avaliação das redes
de ensino, os autores sugerem que essas avaliações seriam mais eficazes se fossem
planejadas e conduzidas no nível dos municípios pelos conselhos municipais de
educação, que atuariam como reguladores dos processos de avaliação das redes
de educação básica. Nessa proposta, os autores defendem uma avaliação em que a
unidade é o município e não a federação ou o estado, prática até então predomi-
nante no Brasil quando se trata da avaliação em larga escala de redes de ensino.
A avaliação da aprendizagem e a avaliação do sistema ocuparam, nas últi-
mas décadas, um espaço privilegiado. Desde a década de 1990, o Brasil investiu
fortemente na avaliação dos sistemas de educação básica. A ênfase na avaliação
em larga escala, que apresenta indicadores sobre o acesso e a aprendizagem dos
alunos, foi implementada de modo associado a medidas de descentralização de
responsabilidades, difundindo a ideia de autonomia administrativa e pedagógica
das escolas, com a tendência de induzir à padronização curricular.
Conforme Dias Sobrinho (2002), a avaliação serviu como instrumento
fundamental nas reformas que levaram à descentralização e à expansão privada
do sistema educacional, exercendo as funções de regulação, prestação de contas
e responsabilização (accountability) e não a de subsidiar a tomada de decisões na
solução dos problemas.
A noção de responsabilização pelos resultados das avaliações, comumente
atribuída à escola ou aos seus profissionais, difunde modalidades diferenciadas de
relações contratuais entre Estado e funcionários, baseadas em desempenho. Por

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316 O Coordenador Pedagógico e a avaliação institucional na perspectiva da gestão ...

meio da avaliação em larga escala, disseminou-se uma lógica de gestão da educação


pelo Estado, que vem se materializando por meio da ação do governo central, de
governos subnacionais e hoje adentra as escolas. (Sousa, 2013 p. 66)
Constata-se, nas pesquisas5 sobre o tema, que os resultados das avaliações
externas permanecem no campo da gestão e das políticas e ainda não atingiram
a sala de aula. Esses diagnósticos, realizados através da aplicação de provas por
aplicadores e técnicos que analisam os dados, sem vínculos com a escola, perma-
necem muito distantes de quem está dentro da instituição escolar. Neste sentido,
Ronca argumenta:
[...] As avaliações externas, baseadas nos testes de larga escala, não são suficientes
para compreender a amplitude e a complexidade da realidade da escola, ainda mais
quando somente dois fatores avaliativos de qualidade (fluxo e desempenho) são
utilizados e são contempladas apenas as dimensões de leitura e matemática. São
muitos os fatores que interferem na vida da escola e não podemos cultivar a ilusão
de um indicador único de qualidade. A escola é uma instituição complexa que exige
muitos olhares. A verdade está no todo e o desafio da complexidade é o desafio da
visão global. [...] (2013, p. 79).

Entre diferentes estudos que aprofundam este tema6, analisando dados,


elementos e influências, Werle (2012) apresenta a evolução do uso das avaliações
externas. Conforme a autora, na entrada do século XXI, o Brasil submeteu-se a
avaliações internacionais e foi justamente no início deste século que a avaliação foi
fortemente incluída nos processos de planejamento educacional.
O quadro geral de políticas públicas de educação apresenta uma estrutura
de avaliação implementada no final dos anos oitenta e incrementada a partir de
1995 pelo Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb). Além do Saeb, vários
outros instrumentos de avaliação foram sendo criados. Entre eles, o ENC-Provão
em 1996, focalizando cursos de graduação de Nível Superior e, em 1998, com foco
no desempenho de concluintes do Ensino Médio, o Enem. A avaliação em larga
escala é, no sistema educacional brasileiro, uma proposta com origem no governo
federal, nos estados, em alguns municípios e também com origem internacional.
No ano de 2000, o Brasil participou do Programa Internacional de Avaliação
de Estudantes (Pisa). Internamente, continuou mantendo a diversificação de suas
propostas de avaliação de larga escala. Em 2004, o ENC se reestruturou na forma
de Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade)7 e no Sistema Nacional
de Avaliação da Educação Superior (Sinaes)8. Em 2005, ocorreu a primeira apli-

5 Barreto e Pinto, 2001; Vianna, 2005; Castro, 2007; Freitas, 2007; Oliveira, 2011; Ronca, 2011;
Bonamino e Sousa, 2012.
6 Gatti, 2004 e 2013; Peroni, 2009; Bonamino, 2002; Bonamino e Sousa, 2012; Sousa, 2006 e
2013; Araújo, 2012; Werle, 2011 e 2012; Ronca, 2013.
7 http://portal.inep. gov.br/enade
8 http://portal.inep. gov.br/superior-sinaes

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 317

cação da Prova Brasil, que se constituiu em um marco importante por possibilitar


a especificação de informações por município e escola. É nesta fase que as metas
formuladas no PNE 2001 e os dados das avaliações em larga escala foram rearticu-
lados e alçados para um nível mais operativo, favorecendo ações mais pragmáticas
e interventivas nos sistemas de ensino.
Entre as ações ocorridas nesse período, destacam-se o Programa Universidade
Para Todos (Prouni) e o Sistema de Seleção Unificada (Sisu), que utilizam os dados
do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), modificando a prática de vestibulares
e fortalecendo de maneira mais definitiva o Enem.
No ano de 2007, com a política PDE9/Plano de Metas, o governo federal pre-
tendia a conjugação de esforços da União, estados, DF e municípios pela melhoria
da qualidade da educação básica, estabelecendo 28 diretrizes, relacionadas ao acesso
e à permanência na escola, à organização do trabalho pedagógico, à formação e à
carreira dos profissionais da educação, à gestão das escolas e das redes de ensino,
entre outros. Essas diretrizes foram colocadas em prática nos estados e municípios
brasileiros através da elaboração e execução do Plano de Ações Articuladas (PAR),
um plano plurianual com ações previstas para ocorrer, em sua primeira etapa, entre
os anos de 2008 a 2011 e segunda etapa entre os anos de 2011 a 2014. Os entes
federados que fizeram a adesão ao Plano de Metas e elaboraram o PAR passaram
a receber assistência técnica e financeira da União.
Nesse período, o MEC introduziu o Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica (Ideb)10, indicador utilizado para avaliar a qualidade da educação. Esse índice
começou a operar na educação brasileira, projetando metas para as escolas e redes
de ensino. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
(INEP) calcula o Ideb a partir da equação que combina o desempenho dos alunos
nos exames nacionais Prova Brasil ou Saeb (5º e 9º ano do ensino fundamental e por
amostragem 3º ano do ensino médio) vinculado às taxas de aprovação, reprovação
e abandono (Censo escolar).
As estratégias de planejamento e gestão, implementadas nesse período, dão
um sentido mais operativo aos dados das avaliações e propõem ações concretas de
interferência no quadro da educação básica. A demanda por essa etapa de ensino
tornou-se uma face da crescente vinculação da educação ao desenvolvimento
econômico de determinada região.
Bonamino e Sousa (2012), a partir da análise dos desenhos das avaliações
em andamento no Brasil, identificam três gerações de avaliações da educação em
larga escala, com consequências diferenciadas para o currículo escolar. A primeira
geração enfatiza a avaliação com caráter diagnóstico da qualidade da educação
ofertada no Brasil, sem atribuição de consequências diretas para as escolas e para
o currículo. As avaliações de segunda geração, por sua vez, contemplam, além da

9 Mais informações em: http://portal.mec.gov.br/par/apresentacao


10 Mais informações: http://portal.inep. gov.br/web/portal-ideb

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318 O Coordenador Pedagógico e a avaliação institucional na perspectiva da gestão ...

divulgação pública, a devolução dos resultados para as escolas, sem estabelecer


consequências materiais. Nesse caso, as consequências são simbólicas e decorrem
da divulgação e da apropriação das informações sobre os resultados da escola pelos
pais e pela sociedade. Já as avaliações de terceira geração são aquelas que referen-
ciam políticas de responsabilização forte ou high stakes, contemplando sanções ou
recompensas em decorrência dos resultados de alunos e escolas.
A pesquisa realizada pelas referidas autoras, entre as considerações apresen-
tadas, indica que tal tipo de avaliação parece estar reforçando o alinhamento, nas
escolas e secretarias de educação, entre o currículo ensinado e o currículo avaliado.
O que esses trabalhos evidenciam, em conjunto, é a importância que vêm assu-
mindo as avaliações de segunda e terceira geração no delineamento das políticas
educacionais e, em consequência, seu potencial de direcionar o que, como e para
que ensinar. Nesse sentido, Sordi (2012) argumenta:
[...] Não podemos ignorar que a insistência em modelos de avaliação, cuja base é
meritocrática e ranqueadora, pode ainda induzir a decisões que discriminam os
estudantes, penalizando aqueles que mais precisam da escola, tornando-os invisíveis
nos dias dos exames para não prejudicarem o rendimento da turma. Reações a estas
distorções, que legitimam a exclusão de estudantes em nome de uma qualidade de
ensino artificialmente produzida, requerem proposição de modelos alternativos de
avaliação. (SORDI, 2012, p. 487)

De acordo com os resultados de pesquisa, é o uso de provas padronizadas no


contexto de avaliações referentes a políticas de responsabilização com consequên-
cias fracas e fortes para as escolas – principalmente as fortes – que exacerbaria a
preocupação de diretores e professores em preparar os alunos para os testes e para
o tipo de atividade neles presente.
O Plano Nacional de Educação (PNE), Lei Nº 13.005, de 25 de junho de 2014,
aprovado para o decênio 2014-2024, apresenta as diretrizes, metas e estratégias a
serem consideradas pelos demais sistemas de ensino, envolvendo redes municipais,
estaduais, federais e as instituições privadas que atuam em diferentes níveis e mo-
dalidades da educação, das creches às universidades. Trata-se, pois, do principal
instrumento da política pública educacional, pois orienta a gestão educacional e
referencia o controle social e a participação cidadã. Entre os artigos apresentados
no PNE, o Artigo 11 orienta sobre a avaliação da qualidade da educação básica:
Art. 11. O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica, coordenado pela
União, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, consti-
tuirá fonte de informação para a avaliação da qualidade da educação básica e para
a orientação das políticas públicas desse nível de ensino.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 318 22/10/2018 14:27:54


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 319

Conforme explicitado no documento referência11, o PNE torna-se norteador


para o planejamento do setor educacional, para o qual assume caráter de norma,
em consonância, mas não subordinada, a planos plurianuais. Esse parece ser o en-
tendimento compatível com a EC nº 59/2009, uma vez que o PNE, plano decenal,
conviverá com três PPAs (MARTINS, 2010). A visão processual do planejamento
reflete no entendimento de sua execução, já que não pode ser visto como um produto
que congela a realidade. Daí a previsão, conforme descrito na lei, de que a execução
do PNE e o cumprimento de suas metas serão objeto de monitoramento contínuo
e de avaliações periódicas, realizados por quatro instâncias: MEC; Comissões de
Educação da Câmara dos Deputados e Comissão de Educação, Cultura e Esporte
do Senado Federal; Conselho Nacional de Educação (CNE); Fórum Nacional de
Educação (FNE).
A essas instâncias, cabe analisar e propor políticas públicas para assegurar a
implementação das estratégias e o cumprimento das metas, assim como a revisão
do percentual de investimento público em educação.
De acordo com FNE, a avaliação deve considerar não só o rendimento escolar
como ‘produto’ da prática social, mas precisa analisar todo o processo educativo,
levando em consideração variáveis que contribuem para a aprendizagem, tais
como: os impactos da desigualdade social e regional nas práticas pedagógicas; os
contextos culturais nos quais se realizam os processos de ensino e aprendizagem;
a qualificação, os salários e a carreira dos/das professores/as; as condições físicas
e equipamentos das instituições educativas; o tempo diário de permanência do/
da estudante na instituição; a GD; os Projetos Político-Pedagógicos e planos de
desenvolvimento institucionais construídos coletivamente; o atendimento no turno
inverso aos/às estudantes; e o número de estudantes por professor/a na educação
em todos os níveis, etapas e modalidades, nas esferas pública ou privada (BRASIL,
2013, p. 54). Essa afirmação já fornece pistas de possíveis dimensões e indicadores
a serem considerados num Sistema Nacional de Avaliação da Educação.
Com o objetivo de aprofundar o debate sobre a avaliação institucional para
construção do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Sinaeb), previsto
no artigo 11 do PNE, diferentes entidades12, universidades e instituições ligadas à
educação pública têm reunido pesquisadores e especialistas13, identificados com
uma concepção de educação democrática, participativa e com qualidade social.
Foram abordados mecanismos para realizar essa avaliação, como os Indicadores

11 http://www.observatoriodopne.org.br/uploads/reference/file/439/documento-referencia.pdf
12 Ação Educativa, UNDIME, Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Fórum Nacional de
Educação (FNE), Conselho Nacional de Educação (CNE).
13 Palestrantes do seminário: Adolfo Samuel Oliveira e Rosilene Cerri (INEP); Antonio Carlos
Ronca (CNE); Daniel Cara (Campanha Nacional Pelo Direito à Educação); Elba Sá Barreto e
Sandra Zákia (USP); Mara de Sordi (UNICAMP); Denise Carreira (Ação Educativa).

Livro Coordenação Pedagógica.indb 319 22/10/2018 14:27:54


320 O Coordenador Pedagógico e a avaliação institucional na perspectiva da gestão ...

da Qualidade na Educação14. Nessa proposta, defendida pelas entidades ligadas à


educação pública, a avaliação institucional é pensada de acordo com alguns critérios:
• As autoavaliações das escolas devem ser feitas de forma efetivamente
participativa.
• Na abordagem da autoavaliação institucional participativa, o protago-
nismo está nas mãos dos atores da escola: professores/as, equipes de ges-
tão, estudantes, familiares, funcionários, etc.
• A avaliação da escola deve ser realizada em todas as suas dimensões des-
de a infraestrutura, as questões de trabalho dos professores, a formação,
as condições de acesso e permanência do aluno na escola, a questão pe-
dagógica e de avaliação e a questão da gestão, os órgãos colegiados.
• As autoavaliações institucionais utilizadas por redes devem contribuir
tanto para os PPP das escolas, como para as políticas educacionais.

A AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL PARTICIPATIVA COMO


FERRAMENTA DE GESTÃO DEMOCRÁTICA

O uso da avaliação institucional (AI) no meio educacional brasileiro, princi-


palmente nas instituições que atendem a educação básica, é incipiente. Essa mo-
dalidade de avaliação no Brasil iniciou pelo ensino superior a partir das avaliações
realizadas nas Universidades.
A primeira experiência brasileira de avaliação institucional, conforme estudo
de Dias Sobrinho (2008), foi realizada pela Unicamp nos anos 1990. Mais tarde,
foi elaborado coletivamente o Sinaes, um modelo de avaliação institucional que
se assemelhou ao realizado pela Unicamp. Com a sua crescente importância para
a educação, ganhou visibilidade e chegou até a educação básica. Hoje, já existem
alguns estudos sobre a prática da AI na educação básica15.
Segundo estudo apresentado por Brandalise (2010),
[...] a avaliação institucional numa perspectiva crítica é aquela que consegue captar
o movimento institucional presente nas relações da instituição. Toda instituição é
constituída por dois princípios em permanente tensão: o instituído e o instituinte.
Castoriades (1975) explica que o instituído é o conjunto de forças sedimentadas,
consolidadas, que buscam a conservação e reprodução do quadro institucional
vigente. O instituído é a forma. Já o conjunto de forças em constante estado de
tensão, de mudança, de transformação, de recriação é o instituinte. O instituinte é

14 http://www.acaoeducativa.org.br/index.php/educacao/48-acao-na-escola/77-acao-na-escola-
-indicadores-da-qualidade-na-educacao
15 Brandalise, 2010, 2011, 2015; Peroni, 2009; Ronca, 2013; Sousa,, 2013; Sordi e Ludke 2009;
Sordi, 2012.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 321

o campo de forças. A avaliação institucional é formalmente a avaliação desse insti-


tuído e instituinte. Ela tem que identificar aspectos concretos, formais e informais,
explícitos ou não, internos e externos, que viabilizam a realização dos objetivos e
fins educacionais propostos num projeto institucional. (2010, p. 318)

A referida autora defende a AI como instrumento de autonomia, de autoco-


nhecimento, um processo de reflexão que visa à responsabilização da escola pela sua
gestão pedagógica, administrativa e comunitária. É nesse processo que ela reflete
sobre si própria, que ela passa a se conhecer e a exercer a sua autonomia, decidindo
sobre o seu próprio destino e impedindo que a rotina, as pressões internas e exter-
nas e as políticas governamentais determinem suas prioridades e o seu cotidiano.
A aprendizagem da avaliação interna inclui o saber posicionar-se diante dos
dados oferecidos pela avaliação externa, usando-os para esclarecer a realidade es-
colar, pela aceitação das evidências ou pela refutação das mesmas. Aprender a AI
significa assumir o monitoramento ativo do cotidiano escolar, sem que se resvale
para o controle, assegurado pela excessiva produção de regras sobre a realidade e
a comunidade. (SORDI & LUDKE, 2009, p. 327)
A partir de experiências vividas de AI em escolas públicas e secretarias de
educação, exercendo a função de coordenação pedagógica, defendo que compete a
este profissional, como membro da gestão escolar, a elaboração de estratégias para
que a instituição se avalie periodicamente. Entre as estratégias para o estabeleci-
mento desse formato de avaliação, destaco que compete à coordenação pedagógica
da instituição:
• Indicar no calendário escolar os períodos de realização de AI na escola;
• Promover encontros de estudo, reflexão e troca de experiências sobre o
tema, que motivem a gestão escolar e demais segmentos da instituição a
se envolverem com a melhoria da qualidade do PPP da escola;
• Comprometer o conselho escolar, por ter a representação de todos os
segmentos, na coordenação de todo o processo de AI, juntamente com
o Coordenador Pedagógico, envolvendo os segmentos: pais, alunos, pro-
fessores e funcionários;
• Organizar o roteiro de AI, no qual conste o que será avaliado na institui-
ção: funcionamento dos setores; processos de ensino e de aprendizagem;
projetos realizados; clima organizacional; participação da comunidade
escolar, entre outros pontos a serem avaliados conforme a dinâmica de
trabalho e o PPP da instituição.
• Realizar as rodadas de AI, primeiro por segmento e posteriormente cada
grupo socializa suas considerações.
O Coordenador Pedagógico tem grande responsabilidade, como mobilizador
da gestão escolar, na execução de cada etapa de AI. Todo este processo terá signi-

Livro Coordenação Pedagógica.indb 321 22/10/2018 14:27:54


322 O Coordenador Pedagógico e a avaliação institucional na perspectiva da gestão ...

ficado se envolver todos os segmentos da comunidade escolar. Ou seja, o processo


de AI deve ser participativo. E isso se torna viável quando a gestão é democrática.
Nas palavras de Sordi:
Quando o coletivo da escola assume seu protagonismo no processo de avaliação, este
artifício deixa de fazer sentido, posto que a manipulação dos dados para melhorar
o lugar da escola no ranqueamento externo não resolve a questão da qualidade
da escola pública no âmbito interno. Esta qualidade será diretamente afetada pela
capacidade deste coletivo se organizar e aprender a negociar condições para o
cumprimento de metas, em cuja definição possui titularidade. Evidentemente, este
coletivo organizado, ao decidir sobre o destino do projeto pedagógico da escola,
compromete-se desde o início do processo até a avaliação da qualidade dos produtos
(2012, p. 498).

Modelos de avaliação institucional participativa, ao elegerem a negociação


como categoria de ação mobilizadora dos atores envolvidos no processo, positiva-
mente os afetam ao despertar-lhes o sentimento de pertencimento a um coletivo
no qual podem fazer diferença. Geram comprometimento de todos com o projeto
político pedagógico de sua instituição.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo teve por objetivo apresentar elementos teóricos e práticos


da atuação da coordenação pedagógica, na gestão escolar, no contexto da escola de
educação básica. A gestão democrática, princípio constitucional vigente, é basilar
nessa atuação. O processo de avaliação institucional participativa foi enfatizado
como uma das ferramentas de fortalecimento das relações democráticas na insti-
tuição educacional. Construir um ambiente democrático é uma tarefa complexa,
portanto são necessárias estratégias que estimulem a participação das pessoas.
Nessa caminhada, o Coordenador Pedagógico atua como articulador e
mobilizador dos processos de avaliação institucional na escola. Compete a este
profissional, juntamente com a equipe diretiva, estimular a participação e o en-
volvimento dos diferentes segmentos na avaliação do PPP e de todas as ações e
processos pedagógicos da instituição.
Em tempos de retrocesso e ataques à democracia, precisamos ampliar e en-
volver as pessoas nos assuntos da educação. A garantia de uma educação pública,
gratuita, de qualidade, laica e inclusiva, que garanta a gestão democrática e a diver-
sidade, exige participação, comprometimento e avaliação periódica dos processos
realizados na instituição.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 322 22/10/2018 14:27:55


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 323

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Ferramentas dialógicas em uma 2 4
perspectiva freireana: um foco no
fórum e no editor de texto coletivo

Claúdia Zank
Patricia Alejandra Behar

Este capítulo tem por objetivo discutir recursos digitais que podem oportuni-
zar e favorecer o diálogo nas práticas pedagógicas, caracterizando-se, assim, como
ferramentas dialógicas.
Para tanto, parte do pressuposto de que tanto os recursos quanto as práticas
estão sempre relacionados a uma concepção de educação. Neste viés, são compreen-
didos como produtos da ação humana e, portanto, “[...] carregam consigo relações
de poder, intenções e interesses diversos”. (OLIVEIRA, 2001, p. 102)
O diálogo freireano, perspectiva adotada por este texto, está presente em uma
concepção de educação que entende a participação popular e a gestão democrática
como partes de uma “pedagogia participativa” que influenciam positivamente a
aprendizagem. (GADOTTI, 2014)
Assim, com o intuito de atingir o objetivo proposto, o capítulo apresenta na
próxima seção as práticas pedagógicas dialógicas a partir de uma compreensão
do diálogo freireano. Na sequência discute as ferramentas chat, fórum e editor de
texto coletivo, dando foco às duas últimas. Após, apresenta a análise e discussão
dos dados e, por fim, as considerações finais.

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DIALÓGICAS

É preciso pontuar inicialmente que, neste texto, diálogo não é entendido


como simples comunicação. Ao adotar a perspectiva freireana, entende-se diálogo
como o “encontro dos homens, mediatizados pelo mundo, para pronunciá-lo, não
se esgotando, portanto, na relação eu-tu” (FREIRE, 2014, p. 109, grifo do autor).
Nesta perspectiva, o diálogo precisa ser vivenciado, precisa ser comprometido com
a transformação da realidade (FREIRE, 2006). Exige, portanto, uma criticidade,
que permite e instiga à ação. Para Freire (2014), não há diálogo verdadeiro sem
um pensar crítico que compreenda a realidade como processo. Entende-se, assim,
que é por meio do diálogo e, portanto, da educação dialógica, que se pode atuar

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326 Ferramentas dialógicas em uma perspectiva freireana

criticamente no mundo, transformando a realidade e proporcionando a liberdade


e a humanização do homem. (FREIRE, 1986; 2014)
Zitkoski (2011, p. 97), tratando das relações que se travam no âmbito escolar,
afirma que o diálogo “exige de nós, professores, sobretudo, uma postura de hu-
mildade e de abertura diante das relações de poder que estão em jogo no contexto
da Educação escolar [...]”. Assim, é importante que, na educação dialógica, os
professores reconheçam e valorizem os saberes advindos das experiências de vida,
laborais e mesmo escolares dos alunos.
Esta postura de humildade não significa que o professor deve renunciar dos
seus saberes, mas que compreenda que eles podem ser reaprendidos no processo
dialógico. Trata-se, segundo Zitkoski (2011, p. 97), de uma desconstrução do “ha-
bitus pedagógico”, ou seja, daquele modo autoritário de entender que educação é
o professor ensinar e o aluno aprender, o professor expor e o aluno ouvir. Na edu-
cação dialógica, o conhecimento não é uma exclusividade do professor, pois “[...]
o objeto a ser conhecido medeia os dois sujeitos cognitivos”. (FREIRE, 1986, p. 65)
Freire (1997) esclarece que isso não significa retirar do professor o ato de
ensinar. Também na educação dialógica o professor deve se empenhar para que
seus estudantes apreendam aquilo que ele objetiva com sua prática pedagógica
(ZITKOSKI, 2011). Neste sentido, Freire em seu diálogo com Ira Schor (1986)
destaca a importância de que as experiências dialógicas se baseiem em seriedade
e competência. Alunos e professores devem ser sujeitos críticos do processo de
conhecimento, o que implica que também o aluno deve compreender que a cons-
trução do conhecimento exige seriedade e disciplina. (FREIRE e SHOR, 1986)
Para tanto, contudo, o professor dialógico não precisa impor sua posição, sua
opinião, mas sim estimular o questionamento e fomentar o debate, compreendendo
que o diálogo não é aquele se dá de “A” para “B” ou de “A” sobre “B”, mas de “A” com
“B” (FREIRE, 2008), como ilustra a Figura 1 (grifo nosso):

Figura 1 – Como se dá o diálogo

Fonte: Freire (2008, p. 116).

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 327

Conforme, contudo, apontam Freire e Shor (1986, p. 66), proporcionar e


incentivar o diálogo em âmbito escolar não significa permitir um espaço onde
tudo seja possível. Para que a educação seja verdadeiramente dialógica, o diálogo
deve implicar “[...] responsabilidade, direcionamento, determinação, disciplina,
objetivos”.
Deste modo, as práticas pedagógicas que têm o diálogo como princípio edu-
cativo exigem planejamento, exigem pensar nos objetivos educacionais. Segundo
Freire, o ponto de partida é o que o professor sabe sobre o objeto, e onde quer
chegar com ele. (FREIRE, 1986, p. 67)
Como princípio educativo, o diálogo se faz presente em práticas pedagógicas
que incentivem os alunos a procurar informações/pesquisar; expor seus saberes/
realizar trocas com os colegas; interagir com o material, inserindo novas infor-
mações, formatos e linguagens; relacionando, contextualizando, compreendendo
sua realidade e se posicionando; criando e aceitando novos desafios, perspectivas
e olhares (ZITKOSKI, 2011).
Assim, e porque apontam Freire e Shor (1986, p. 11) que o “o diálogo sela o
ato de aprender, que nunca é individual, embora tenha uma dimensão individu-
al”, a próxima seção discorrerá sobre recursos digitais que podem oportunizar e
favorecer o diálogo.

FERRAMENTAS DIALÓGICAS

Ainda que Freire não tenha podido vivenciar as interações nas redes sociais
nem experimentar os diversos recursos digitais disponíveis atualmente na inter-
net, seu pensar, sempre voltado para as possibilidades de uma educação crítica
e criticizadora, não se opunha à incorporação das Tecnologias de Informação e
Comunicação (TIC), desde que a serviço dessa educação. Gadotti (1997) conta que
o educador sempre buscou a utilização de recursos audiovisuais e experimentou
vídeo, televisão e mesmo informática a fim de proporcionar experiências interativas
nos processos de ensino e aprendizagem. Contudo, como salienta Gadotti (1997),
Freire não aceitava a utilização acrítica dessas tecnologias.
Com foco na concepção dialógica de Paulo Freire, este texto retoma os estudos
de Abegg (2009) e David (2010), que realizaram pesquisas com diferentes recursos
digitais a partir de uma perspectiva freireana. A pesquisa de David (2010) buscou
construir um sistema de análise, incorporando a categoria “Diálogo” (na perspec-
tiva freireana) para compreender as interações nas ferramentas fórum e chat. Já a
pesquisa de Abegg (2009) teve por objetivo investigar o potencial da mediação das

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328 Ferramentas dialógicas em uma perspectiva freireana

TIC livres1, por meio da ferramenta Wiki, como modo de produção colaborativa
no processo escolar de escopo dialógico-problematizador.
O termo Wiki é utilizado, segundo Abegg (2009, p. 81), “para definir o software
colaborativo que cria coleções de páginas interligadas formando um hipertexto ou
hipermídia”. Estas páginas podem ser editadas, ou seja, os participantes de um Wiki
podem alterar seu conteúdo, permitindo a escrita colaborativa (MACEDO, 2010;
ABEGG, 2009). Neste sentido, Wikis são plataformas de edição coletiva.
Para Abegg (2009, p. 72), a atividade escolar mediada pelo editor Wiki “pode
ser entendida como palavra viva, traço do diálogo existencial efetivamente ocorrido.
Em outras palavras, pode expressar a elaboração da comunicação e colaboração”. A
autora (2009) entende, portanto, que a participação em uma atividade Wiki possi-
bilita ao estudante ser sujeito da produção coletiva, de modo a se reconhecer como
coautor e codesenvolvedor. Neste sentido, por meio do editor de texto Wiki se pro-
duz coletivamente e colaborativamente, e onde há colaboração, ou “co-laboração”
(FREIRE, 2014), há comunicação, há diálogo. (ABEGG, 2009)
Segundo David (2010), a educação à distância pode ser uma oportunidade
de colocar em prática a pedagogia do diálogo, uma vez que conta com uma série
de ferramentas de comunicação (chat, fórum, mural, blog), as quais “permitem aos
alunos expressarem e reformularem seus pontos de vista várias vezes ao longo do
curso” (DAVID, 2010, p. 49).
David (2010) retoma os princípios do diálogo freireano2 e busca verificar se os
pesquisados conseguem colocar esses princípios em prática através das interações
no fórum e no chat, comprovando, assim, a prática do diálogo.
A pesquisa de David (2010, p. 206) concluiu que “a presença das características
do Diálogo freireano confirmou a possibilidade não somente de observar, como
também de vivenciar a dialogicidade em interações educacionais à distância”. As
pesquisas realizadas por Abegg (2009) e David (2010) abordam, assim, três recursos
digitais que podem ser utilizados como apoio a práticas pedagógicas dialógicas
na perspectiva de Freire: o fórum, o chat e o editor de texto Wiki (ao ser usado
coletivamente).
Em uma perspectiva computacional, essas ferramentas também são caracte-
rizadas como dialógicas, uma vez que:
Dialogicidade, ou dialogismo, refere-se à interação textual, ao diálogo que um texto
estabelece com outros textos. O princípio dialógico contrapõe-se ao monológico,

1 Abegg (2009) refere-se, especificamente, ao contexto do software livre na concepção da Free


Software Foundation, ou seja, um software é considerado livre quando atende a quatro tipos
de liberdade: (1) para executar o programa; (2) para estudar e adaptar o programa (acesso ao
código fonte); (3) para redistribuir cópias, ajudando ao próximo; (4) para modificar o programa
(também necessita acesso ao código fonte).
2 Humildade, esperança, afetividade e pensar crítico.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 329

que se refere à prática do monólogo, que não conversa, que é autocontido, sem
referência a outros textos (PIMENTEL; GEROSA; FUKS, 2011, p. 85).

Há que se observar que o chat é uma ferramenta síncrona, enquanto o fórum e


a edição de texto são assíncronos. Essa diferença faz com que o diálogo que ocorre
por meio das ferramentas também se dê de modo diferenciado, pois “as caracte-
rísticas de um sistema influenciam o discurso dos interlocutores”. (PIMENTEL;
GEROSA; FUKS, 2011, p. 85)
Assim, no chat a comunicação ocorre em tempo real: “emissor e receptor en-
viam e respondem mensagens em um intervalo de tempo pequeno, quase imediato”
(VIVACQUA; GARCIA, 2011, p. 41). Para Pimentel, Gerosa e Fuks (2011, p. 85),
as características da comunicação em chat mostram a ocorrência de “um discurso
informal (induzido pelas mensagens curtas), com alta dialogicidade3 e muito inte-
rativo (consequência da comunicação síncrona), e muitas vezes intimistas (quando
os interlocutores são amigos)”. Para Garibay (2014, p. 38, tradução nossa4), ainda
que no chat a comunicação ocorra por escrito, ela se assemelha muito com a oral,
pois “[...] as intervenções são breves e espontâneas, têm uma estrutura sintática
menor e uma maior expressividade emotiva reforçada pelos ‘emoticons’”.
Contrariamente ao que acontece nos chats, no fórum e no editor de texto
coletivo, “o emissor envia uma mensagem e não espera resposta rapidamente” (VI-
VACQUA; GARCIA, 2011, p. 41). Por serem ferramentas assíncronas, podem ser
utilizadas e consultadas a qualquer momento. Assim, não é necessário, por exemplo,
os usuários combinarem um horário para se conectarem e as contribuições podem
ser postadas/publicadas de forma permanente, podendo receber comentários dos
outros usuários a qualquer momento (PÉREZ SÁNCHEZ, 2005).
A característica assíncrona permite leitura e redação mais pausadas, o que,
segundo Garibay (2014), proporciona consulta, melhores intervenções e reflexões.
Também Pérez Sánchez (2005) entende que o caráter assíncrono permite um grau
maior de reflexão, além de proporcionar ao usuário mais tempo para organizar e
escrever suas ideias. Para Guisso et al (2012, p. 69), as discussões em ferramentas
assíncronas podem “[...] acontecer de forma mais aprofundada se comparadas às
ferramentas síncronas, oportunizando uma maior reflexão sobre o que foi postado
e sobre o que será postado”.
Vê-se, portanto, que, nas ferramentas fórum e editor de texto coletivo, os
diálogos não ocorrem de modo tão veloz quanto em um chat. Por outro lado, há
mais tempo para a reflexão, tanto ao escrever quanto ao ler. Em pesquisa de Paiano
e Castro Filho (2008) sobre a utilização de ferramentas síncronas e assíncronas na
modalidade à distância, os dados apontaram que, ao compararem chat e fórum, a

3 Aqui significando muitas interações textuais entre duas ou mais pessoas.


4 No original: “[...] las intervenciones son breves y espontáneas, tiene una menor estructuración
sintáctica y una mayor expresividad emotiva reforzada con ‘emoticonos’”.

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330 Ferramentas dialógicas em uma perspectiva freireana

totalidade de professores e a maioria dos alunos apontaram o fórum como mais


apropriada para a ocorrência de interação e mediação. Os pesquisados apontaram
o fórum como benéfico, uma vez que “as respostas não precisam ser imediatas,
podendo ser cuidadosamente elaboradas e fundamentadas”. (PAIANO; CASTRO
FILHO, 2008, p. 53)
Em outras palavras, segundo sugerem os estudos de Garibay (2014), Pérez
Sánchez (2005) e Guisso et al (2012), ferramentas assíncronas, como o fórum e o
editor de texto coletivo, podem ser mais adequadas para atividades de análise e in-
vestigação. A possibilidade de analisar, questionar e refletir é elemento fundamental
à crítica. Diante disto, e entendendo que a reflexão é fundamental à criticidade e
este deve estar presente em uma educação que se diz dialógica, o presente texto
passa a discutir os recursos fórum e editor de texto coletivo, apresentando-os nas
próximas seções.

FÓRUM

O fórum surgiu nos anos 1970 e, desde então, cada vez mais as pessoas estão
aprendendo a discutir e debater, seja por fins profissionais, educacionais ou por
outros interesses, por meio de sistemas computacionais (PIMENTEL; GEROSA;
FUKS, 2011).
Quando implementados em redes sociais e AVA (Ambientes Virtuais de
Aprendizagem), os fóruns fazem parte de um groupware5, ou seja, fazem parte de
um conjunto de ferramentas ou funcionalidades que dão suporte a interações e
atividades de trabalho, sejam essas concretas, como um texto, ou abstratas, como
a tomada de decisões (ZANK, 2010).
Pimentel, Gerosa e Fuks (2011) nomeiam o conjunto de ferramentas de co-
municação de um groupware como serviço de comunicação e classificam os fóruns,
dentro deste serviço, como sistema de discussão. Os autores (2011) destacam que
sistemas de discussão geralmente são organizados por tópicos. Já as mensagens
“são organizadas hierarquicamente em função do encadeamento entre as respostas
(threads)” (PIMENTEL; GEROSA; FUKS, 2011, p. 75).
Contudo, a organização das mensagens pode variar de acordo com as confi-
gurações de cada fórum (GUISSO et al, 2012), ou seja, na educação, “dependendo
do AVA, a visualização das mensagens postadas pode acontecer de forma linear e/
ou hierárquica, cronológica ou por assunto” (AZEVEDO, 2011, p. 48).
Conforme aponta Kratochwill (2006), a ferramenta fórum é uma das mais uti-
lizadas para os processos de ensino e aprendizagem mediados por um AVA. Guisso

5 O groupware é produto de duas áreas de pesquisa: CSCW (Computer SupportedCooperativeWork


– Trabalho Cooperativo Apoiado por Computador) e CSCL (Computer SupportedCollaborative
Learning) ou ACAC (Aprendizagem Colaborativa Apoiada por Computador). Esta última área,
devida ao seu foco na aprendizagem colaborativa, cria aplicativos groupware que integram ferra-
mentas de comunicação e trabalho conjunto/coletivo como apoio à aprendizagem colaborativa.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 330 22/10/2018 14:27:55


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 331

et al (2012) e Coutinho, Rodrigues e Ferreira (2012, p. 2) concordam com este ponto


de vista. Para estes autores, os fóruns “são muito importantes para dar condição
à interação, à promoção e socialização do conteúdo, e às visões dos estudantes”.
Conforme lembram Guisso et al (2012, p. 71), os fóruns funcionam
[...] como um espaço bibliográfico permanente, que se complementa e se ressignifica
a cada instante com as novas participações. A partir dessa interface e dos dispositivos
oferecidos no fórum online, os AVA possibilitam a interatividade e a aproximação
das distâncias. Neste espaço permeiam a colaboração, o diálogo, a socialização e as
trocas de informação, experiências e reflexões.

Assim como Guisso et al (2012) e Coutinho et al (2012), diversos autores têm


apontado as possibilidades do fórum. Estas são sintetizadas no Quadro 1:

Quadro 1 – Possibilidades do Fórum

Articulação de ideias a partir de diferentes fontes de discussão, debate, consulta


Garibay (2014)
e o consenso de ideias, trabalho em pares, compartilhamento de documentos.
Coutinho et al (2012) Interação, promoção e socialização do conteúdo e das visões dos estudantes.
Colaboração, diálogo, debate, socialização, questionamentos, e trocas de
Guisso et al (2012)
informação, experiências, ideias, fundamentações teórica e reflexões.
Nardocci (2012) Discussão, debate, argumentação sobre ideias muitas vezes polêmicas.
Interação, construção de relacionamentos, registro dos pensamentos,
Pimentel et al (2011)
informação.
Debate, identificação de melhores práticas, ideias, resolução de problemas e
Souza et al (2011)
geração de novos conhecimentos.
Kratochwill (2006) Interação, aproximando os sujeitos.
Fonte: Zank (2016, p. 101).

A partir das palavras grifadas, percebe-se a interação, portanto, a possibilida-


de de proporcionar o diálogo, como a maior vocação da ferramenta fórum. Neste
sentido, Nardocci (2012, p. 250) destaca a função social do fórum:
Embora as discussões no ambiente digital ocorram de maneira assíncrona, são
marcadas por objetivos e temas comuns aos participantes, que suscitam questões a
serem discutidas. O diálogo assinala-se pela retomada de tópicos apresentados por
outros participantes e por regras de conduta que visam tornar o espaço de discussão
mais cooperativo. Trata-se, então de uma atividade social [...].

Sem a atividade social, não há conexão entre os participantes. Deste modo,


a criação de fóruns, mesmo que não diretamente relacionados com o conteúdo,
pode ajudar na apresentação e no fortalecimento das relações entre os participantes.
Conforme aponta Kratochwill (2006, p. 125):

Livro Coordenação Pedagógica.indb 331 22/10/2018 14:27:55


332 Ferramentas dialógicas em uma perspectiva freireana

Em se tratando de um processo educacional não presencial, o fórum mostrou-se


também um qualificado arquivo das manifestações pessoais, muitas das vezes sendo
uma das poucas possibilidades do estudante demonstrar suas angústias e ansiedades
acerca dos conteúdos estudados e tudo que o cerca.

Devido às razões apontadas, muitos professores criam tópicos como espaços


de socialização, nos quais pode haver a criação de vínculos e de novos relaciona-
mentos. Além dos fóruns sociais, existem os argumentativos, nos quais diferentes
pontos de vista são apresentados e defendidos, e os pragmáticos, mais colaborativos.
Com base nestas características, Arango (2003) sugere como categorias o Fórum
Técnico, para ajudar/esclarecer dúvidas dos estudantes quanto às questões técnicas;
o Fórum Social, que tem como objetivo a criação de vínculos, a aproximação entre
as pessoas; e o Fórum Acadêmico, o qual deve dar conta das discussões acerca dos
conteúdos de interesse.
Guisso et al (2012) apontam ainda outros tipos de fórum, entre eles: de notí-
cias (nos quais coordenadores e professores publicam informações sobre o curso/
aulas); de perguntas e respostas (nos quais cada participante elabora um tópico);
e de única discussão, em que todos participam no mesmo espaço.
Dependendo da categoria (ARANGO, 2003) ou do tipo (GUISSO et al, 2012)
de fórum, mudam a quantidade e a qualidade das contribuições. Existem ainda
outras variáveis que influenciam nas postagens:
Em um fórum, dependendo do tema abordado, do perfil dos discentes, do interesse
despertado pelo tópico, podem-se ter centenas de contribuições textuais. Algumas
delas apresentam argumentos favoráveis ao tema proposto e outras relatam posi-
cionamentos contrários. Alguns textos redigidos pelos alunos possuem relevância
com relação ao assunto tratado, e outros não (AZEVEDO, 2011, p. 50).

Ao contrário do que se pode supor, nem sempre uma grande quantidade de


postagens é benéfica. Neste sentido, Garibay (2014, p. 40) destaca que postagens em
excesso podem se tornar uma desvantagem, pois “o estudante tem uma sobrecarga
de material de leitura: a própria do curso mais as intervenções dos companheiros
no fórum”. Outro problema que pode ocorrer, contrário ao excesso de mensagens,
é a falta de interação. Para Guisso et al (2012, p. 71), se o professor não provocar
os diálogos, “a comunicação acaba sendo construída de forma monológica em que
terão o tema que o originou como único ponto em comum”.
Para além da quantidade de contribuições, Garibay (2014) cita ainda como
desvantagem do fórum o sentimento de abandono quando não se recebe resposta
imediata. Vê-se, portanto, que a mediação do professor tem papel fundamental
para que as interações tenham êxito e se alcance o objetivo planejado. Guisso et al
(2012) responsabilizam a mediação do professor como fator de sucesso ou fracasso
de um fórum:

Livro Coordenação Pedagógica.indb 332 22/10/2018 14:27:55


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 333

A interação dos participantes é uma consequência de como o fórum é mediado e


os envolvidos se sentirão motivados ou não a participarem da discussão proposta,
mediante as interferências do educador/mediador [...] (GUISSO et al, 2012, p. 71).

Assim, não basta que o professor crie um fórum, é preciso planejamento. Para
Kratochwill (2006, p. 67), o fórum não pode ser aberto como mais uma atividade
para os alunos. É preciso definir os objetivos que se pretende atingir ao utilizar
esta ferramenta.
A ausência de planejamento e de mediação pode distanciar o fórum daquilo
que Kratochwill (2006, p. 67) aponta como “seu maior propósito, ou seja, o debate
pautado na dialógica”. A autora (2006, p. 67) comenta as características dialógicas
do fórum:
Torna-se interessante a dinâmica desenvolvida no fórum pela sua perspectiva dialó-
gica. Todos os participantes têm a oportunidade de se expressar, interferir e receber
interferências, se constituir a partir da constituição do outro e da percepção do
outro sobre a expressão do primeiro. Dentro desse processo dialógico, a autonomia
e a autoria se constituem em respeito à alteridade, à individualidade e ao mesmo
tempo em que coletivamente.

Também Guisso et al (2012, p. 71) veem o fórum como um processo dialógico


evolutivo que acontece “a partir dos diálogos que o interpõem”.
Diante do exposto nesta seção, entende-se que, em termos computacionais,
o fórum é considerado uma ferramenta dialógica (PIMENTEL; GEROSA; FUKS,
2011). Contudo o diálogo somente ocorrerá se houver uma intenção pedagógica,
um planejamento que leve em consideração também a mediação do professor
(GUISSO et al, 2012; KRATOCHWILL, 2006).
Da mesma forma, ainda que a ferramenta fórum ofereça condições de propor-
cionar o diálogo freireano, este somente ocorrerá se o professor trabalhar a partir
de uma concepção humanista, realizando um planejamento com base na educação
dialógica de Paulo Freire (2014).

EDITOR DE TEXTO COLETIVO

No campo da escrita colaborativa vêm sendo desenvolvidos muitos aplicativos


que integram ferramentas bastante sofisticadas de revisão e coedição de texto (BER-
DUGO, HERRERA E VALDIRI, 2010). Essas ferramentas evoluíram de sistemas
monousuários de edição de texto (VIVACQUA; GARCIA, 2011) a plataformas mais
complexas, como o Google Drive, que “oferecem um alto grau de interação graças
aos sistemas de comunicação em tempo real” (BERDUGO; HERRERA; VALDIRI,
2010, p. 356, tradução nossa6).

6 No original: “que oferecen un alto de grado interactividad gracias a sistemas de comunicación


en tiempo real”.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 333 22/10/2018 14:27:55


334 Ferramentas dialógicas em uma perspectiva freireana

Calvo et al (2011) apontam que a escrita colaborativa é vista como um meio


para aprofundar o envolvimento dos alunos com os estudos e para a construção
do conhecimento através do desenvolvimento de um texto ou hipertexto. Esses
autores (2011, p. 89), citando Lorryet al (2004, p. 8, tradução nossa7) entendem
a escrita colaborativa como “[...] um processo interativo e social que envolve um
grupo focado em um objetivo comum que negocia, coordena e se comunica du-
rante a criação de um documento”. Broch (2008) também entende assim. Para a
autora (2008), “a escrita coletiva pode ser definida como um processo em que mais
de um autor com habilidades e responsabilidades diferentes ou não interagem na
elaboração de um texto” (BROCH, 2008, p. 45).
Segundo Calvo et al (2011), a edição de texto coletivo8 refere-se a um trabalho
em grupo bastante complexo, pois envolve uma série de ações, tais como: divisão
de tarefas, definição de funções, planejamento, negociações a respeito do conteúdo,
além da própria produção textual e, possivelmente, da revisão.
Tais ações do processo de edição coletiva demandam, portanto, outras funcio-
nalidades que não somente as relativas à escrita do texto. Ou seja, além do espaço
de trabalho (o editor de texto) é preciso que haja ferramentas de apoio à construção
coletiva, quais sejam, as ferramentas de interação (ZANK, 2010). O editor de texto
coletivo do Google Drive9 (Documentos Google), por exemplo, conta com uma
ferramenta síncrona, “bate-papo”, com a funcionalidade “Comentários” e com a
possibilidade de enviar e-mail aos colaboradores (participantes do texto).
Também o ETC10 (Editor de Texto Coletivo) disponibiliza ferramentas de
apoio à edição de texto: o “Comunicador”, síncrono, e os “Comentários” Além
disso, os usuários contam com a funcionalidade “Mensagem”, a qual é enviada
diretamente para o e-mail.
Editores de texto Wiki geralmente não contam com muitas ferramentas de
comunicação. O PBworks11, por exemplo, não tem nenhuma ferramenta síncrona,
disponibilizando apenas a funcionalidade “Comentários”. Já os professores que fa-

7 No original: “...an interative and social process that involves a team focused on a common ob-
jective that negotiates, coordinates, and communicates during the creation of a common docu-
ment”.
8 Termo adotado por este estudo para se referir à produção textual realizada coletivamente e à
distância por meio de um groupware. Para processos não apoiados pelo computador, o estudo
utiliza “escrita coletiva”.
9 Serviço online que permite a criação e armazenamento de arquivos na nuvem do Google. Conta
com editor de texto, planilha, formulário, etc. Disponível em: <https://www.google.com/intl/
pt-BR_ALL/drive/>. Acesso em: 02 set. 2017.
10 O ETC (Editor de Texto Coletivo) foi desenvolvido pelo NUTED/UFRGS (Núcleo de Tec-
nologias Educacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e está disponível em:
<<http://nuted.ufrgs.br/, etc/>. Acesso em: 16 set. 2017.
11 PBWORKS. Online teamcollaboration. [2016]. Disponível em: <http://www.pbworks.com/>.
Acesso em: 13 out. 2016. Mais detalhes sobre o PBworks em Zank (2010) ou em Macedo, Zank
e Behar (2013).

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 335

zem uso do MOODLE podem planejar práticas pedagógicas utilizando a ferramenta


Wiki e, como apoio à escrita coletiva, agregar as funcionalidades de interação do
ambiente (como chat e mensagem). Esta seleção dependerá, contudo, dos objetivos
do professor e de seu planejamento.
Destaca-se, neste sentido, a necessidade de o professor dominar as ferramentas
de trabalho coletivo e de interação, independentemente de qual editor utilizará.
Em outras palavras, “o professor precisa ter fluência tecnológica, administrando
os recursos em prol do desenvolvimento e de novas construções feitas por cada
aluno” (MACEDO, 2010, p. 21).
O professor também precisa realizar um planejamento flexível que dê conta
das diferentes situações que podem ocorrer durante a edição de texto coletivo.
Como alerta Costa (2008), cada grupo tem uma forma diferente de conviver no
virtual e de construir coletivamente. Macedo (2010, p. 25) sugere ainda um plane-
jamento que favoreça a liberdade entre os participantes: “liberdade para questionar,
posicionar-se, contra-argumentar. Dessa forma, novos temas e novas soluções
poderão emergir dos debates, favorecendo a continuidade no processo de troca e
construção de novos saberes”.
A edição de texto coletivo não trata, portanto, apenas de um processo cog-
nitivo. Trata-se também de um processo social. Assim, para Calvo et al (2011), a
produção coletiva tem dupla função: por um lado a aprendizagem, a criação de
novas ideias e de textos mais compreensíveis e efetivos; por outro, a socialização.
A convivência social, contudo, traz consigo os conflitos, inerentes às relações
humanas. Segundo Macedo (2010, p. 25), é mais complexo resolver conflitos em
contexto digitais do que presenciais, pois “a interpretação que pode ser dada para
uma ou outra escrita/argumentação sobre determinado tema, por vezes, cria di-
mensões difíceis de administrar”.
Além dos possíveis conflitos, outros problemas que afligem os participantes
de um texto coletivo são os relacionados à questão da autoria e do tornar público
algo que ainda está em construção. Sobre isto discorre Broch (2008, p. 46):
Escrever um texto coletivo implica tornar público o que eu escrevi, ou seja, compar-
tilhar com outros autores/parceiros do grupo e com o professor. Pode levar algum
tempo para que o aluno se acostume com a ideia de deixar a sua marca de autoria
no texto e assumir aquilo que escreveu ou ainda assumir um possível erro, que pode
ser algo que ele ainda não tenha certeza: uma hipótese.

Assim, para Broch (2008), o participante de uma edição de texto coletivo


passa por dois estranhamentos: o primeiro é o do produto inacabado; o segundo
é perceber que seu texto foi alterado, modificado por outra pessoa.
Por fim, ainda em relação ao planejamento, ressalta-se a necessidade de o
professor pensar na sua atuação como mediador tanto do processo de interação
quanto do de produção textual dos alunos. Afinal,

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336 Ferramentas dialógicas em uma perspectiva freireana

Sendo a troca entre os sujeitos o foco, é fundamental que as atividades apoiem-se


num processo coletivo em que a interação seja uma prática constante, e que esta
prática seja a base para sucessivas construções (MACEDO, 2010, p. 24).

Para Costa (2008), o que se espera de uma produção textual realizada cole-
tivamente é que seja colaborativa e se dê a partir da confiança mútua. No entanto,
assim como a escrita, também a colaboração e a confiança são construídas. Neste
sentido, em grupos em que não há nem confiança nem colaboração, o produto
final pode não ser tão bom. Para Bustos Sánchez (2009), o compartilhamento de
responsabilidades (ler os materiais, se encontrar nos espaços de comunicação,
distribuir as tarefas, melhorar seu texto e dos colegas) é fator fundamental para
um texto bem acabado.
Deve-se destacar, contudo, que nem sempre o texto/produto final é o que
importa em uma prática pedagógica utilizando edição de texto coletivo. Depen-
dendo do objetivo do professor, o processo de escrita pode ser mais relevante, pois
é durante o processo que “se favorece o pensamento reflexivo (sobretudo se os
participantes colocam em ação mecanismo para defender e explicar melhor suas
ideias)” (BUSTOS SÁNCHEZ, 2009, p. 38, tradução nossa12). É durante o processo
de construção textual que a função cognitiva é colocada em ação e a escrita torna-se
“ferramenta do pensamento” (BUSTOS SÁNCHEZ, 2009, p. 34):
Para autores como Miras (2000), escrever reflexivamente supõe algo mais que o
domínio das estratégias de redação, supõe a capacidade e a intenção de refletir
e questionar os próprios conhecimentos, a habilidade de identificar os aspectos
confusos e contraditórios do texto, a capacidade de ler de maneira mais estratégica
e, sobretudo, a capacidade de reler-se (BUSTOS SÁNCHEZ, 2009, p. 35, tradução
nossa13).

A função cognitiva não anula a social, pois o autor, ao transformar suas ideias
em um discurso por escrito, sempre pensa nos possíveis destinatários (TINAJERO,
ROJAS-DRUMMOND, 2012). Neste sentido, para Bustos Sánchez (2009), a escrita
tem duas funções, uma comunicacional ou interpessoal (escreve-se para interagir
ou se comunicar), e outra representativa ou ideacional (escreve-se para expressar
ideias, sentimentos, conhecimentos).
Para Tinajero e Rojas-Drummond, a edição de texto coletivo é “uma forma
social de pensar”, um convite ao debate e à reflexão conjunta:

12 No original: “se favorece el pensamiento reflexivo (sobre todo si los participantes ponen em
marcha mecanismos para defender o explicar mejor sus ideas)”.
13 No original: “Para autores como Miras (2000), escribir reflexivamente supone algo más que el
dominio de las estrategias de composición, supone la capacidad y la intención de reflexionar y
cuestionar los propios conocimientos, la habilidad de identificar los aspectos confusos y con-
tradictorios en el texto, la capacidad de leer de manera estratégica y, sobre todo, la capacidad de
releerse.”

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 337

Na escrita colaborativa a noção dialógica do processo de redação é evidente à medida


que os participantes compartilham, integram, analisam e criticam ideias para um
propósito determinado. Além disso, cada expressão faz parte de um todo maior, em
que os significados interagem, entram em conflito e afetam o sentido de conversação
e do texto (TINAJERO, ROJAS-DRUMMOND, 2012, p. 220, tradução nossa14).

Os autores Tinajero e Rojas-Drummond (2012) e Bustos Sánchez (2009)


exaltam, assim, a potencialidade de ferramentas de edição de texto coletivo para a
promoção do diálogo inter e intrapessoal.
Diante do exposto, o texto concorda com Abegg (2009) que é possível propor-
cionar uma perspectiva freireana ao diálogo que ocorre por meio de um editor de
texto coletivo, seja ele Wiki ou não. Sem dúvida, a ferramenta pode potencializar o
diálogo problematizador como prática pedagógica; para que isso ocorra, contudo,
faz-se necessário o planejamento de práticas pedagógicas na perspectiva do diálogo
freireano (ABEGG, 2009).

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

Esta seção analisa e discute dados relacionados às ferramentas dialógicas


fórum e editor de texto coletivo, apresentadas na seção anterior como recursos
digitais que podem ser utilizados como apoio a práticas pedagógicas dialógicas na
perspectiva freireana (ABBEG, 2009; DAVID, 2010).
A pesquisa foi desenvolvida em uma abordagem qualitativa a partir da estra-
tégia de pesquisa estudo de caso. Os dados foram coletados nas seguintes fontes
de evidência: entrevista semiestruturada; observação dos registros no fórum;
observação das ações dos participantes no fórum e no editor de texto coletivo; e
observação dos registros na ferramenta Mensagem do ETC15 (ZANK, 2016).
O estudo ocorreu através da realização de três cursos de extensão16, sendo o
primeiro considerado piloto. Os cursos foram na modalidade semipresencial, e o
ETC foi o ambiente utilizado nas aulas à distância.
A análise dos dados apresentados busca confirmar o fórum e o editor de texto
coletivo como ferramentas dialógicas.

14 No original: “En la escritura colaborativa la noción dialógica del proceso de composición es evi-
dente ya que los participantes comparten, integran, analizan y critican ideas para un propósito
determinado. Además, cada expresión es parte de un todo más amplio, en el que los significados
interactúan, entran en conflicto y afectan el sentido de la conversación y del texto.
15 O ETC (Editor de Texto Coletivo) foi o ambiente virtual que serviu de espaço para a coleta de
dados desta pesquisa. Está disponível em: <<http://nuted.ufrgs.br/, etc/>. Acesso em: 16 set.
2017.
16 Os cursos foram oferecidos na modalidade semipresencial em 2015/02, 2016/01 e 2016/02.

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338 Ferramentas dialógicas em uma perspectiva freireana

ENTENDIMENTO DOS PROFESSORES ACERCA


DO TRABALHO REALIZADO NO FÓRUM

A socialização, a possibilidade de aprendizagem e a quantidade e qualidade


das postagens foram aspectos tratados na seção anterior e são aqui apresentados
como indicadores de como os professores entendem o trabalho no fórum.
Destaca-se assim e, inicialmente, a característica social da ferramenta. Por
ser um espaço onde os participantes encontram-se virtualmente, o fórum tem,
naturalmente, vocação para as socializações e para manifestações, as quais são
muitas vezes pessoais (KRATOCHWILL, 2006). Nesse contexto, apresenta-se a
fala da professora Onai17 sobre o fórum:

Onai: A facilidade de interagir, né? Tu interage direto. É como se tu tivesse


conversando com a pessoa, né? [...] É uma conversa, só que é uma conver-
sa a distância, né? Que tu escreve, né? É um pouco diferente [...]

A interação entre as pessoas a partir de respostas a postagens, conforme des-


crito pela professora Onai, é apontada como atividade social por Nardocci (2012).
Conforme destacado anteriormente, é essa atividade social que permite a conexão
entre os participantes e também o fortalecimento das relações, como mostra a
professora Assu:

Assu: No fórum achei assim...uma coisa mais light, mais tipo...assim, ah,
uma forma prazerosa do pessoal se comunicar, coisa e tal, né? Porque, às
vezes, não era só coisa da... eu gostava muito das coisas que a Ale escrevia,
que às vezes não era só sobre criticidade. [...] Eu achava aquilo muito legal
e me familiarizava mais, assim, me aproximava dela. Então sempre que
eu escrevia alguma coisa eu dava preferência a responder pra ela, porque
era as coisas que eu gostava de ler.

A criação de conexões e vínculos entre os participantes bem como o forta-


lecimento das relações são fundamentais à educação dialógica. Conforme aponta
Freire, em seu diálogo com Shor (1986), ainda que o conhecimento refira-se a uma
dimensão individual, trata-se de um evento social.
Outro importante aspecto que aparece nas manifestações dos professores
acerca do uso do fórum é sobre a quantidade de postagens. Segundo Garibay (2014),
participações muito frequentes e em grande quantidade podem não ser benéficas.
Os extratos que seguem corroboram com o apontado pela autora (2014):

17 O anonimato dos sujeitos participantes da pesquisa foi preservado a partir da criação de codi-
nomes.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 339

Ytan: E o fórum, como é muito dinâmico, aconteceu paralelo diversos as-


suntos, não foi um assunto bem pontual, enfim, eu não conseguia acom-
panhar, né?

Alima: Às vezes eu tava preparando uma fala sobre uma fala que tava
acima e aí, no “Responder para”, e daí outra pessoa já tinha respondido e
quando eu respondia, já aparecia muito lá [...]

A análise do número de postagens dessas professoras mostra que, de fato,


elas participaram pouco dos fóruns (em 03 diferentes tópicos, escreveram de 02
a 04 postagens). No entanto, em outros momentos das entrevistas, as professores
revelam outras causas para a pouca participação:

Enila: “Então eu acho que o tempo impactou também.”

Ytan: [...] mesmo que eu não conseguisse parar para escrever e contribuir
tanto quanto eu gostaria, mas achei um espaço bom, né?

Alima: E aí então eu acabei sobrepondo muitas coisas. Então eu acho que


muito da minha dificuldade de acessar e de ler muitas coisas era porque
eu acabei me envolvendo com outras leituras [...]

Em oposição ao exposto por Garibay (2014), alguns professores, como Élav e


Assu, declararam que as muitas postagens fóruns foram até benéficas:

Élav: Eu acho até que bastante postagens é mais interessante porque tu


pode lê, como eu falei, as outras opiniões e complementar o teu conheci-
mento. [...]

No diálogo travado entre Freire e Shor (1986), fica claro que o aluno, como
sujeito crítico do processo de conhecimento, precisa compreender que esse processo
exige seriedade e respeito. No caso de práticas pedagógicas que se realizem no fó-
rum, esta seriedade e respeito se concretizam na participação efetiva dos alunos. É o
caso da docente Assu que assim explicou porque um fórum longo não a atrapalhou:

Não, porque eu lia sempre.

Broch (2008), que trata da edição de texto coletivo, refere-se a algumas dificul-
dades pelas quais podem passar os membros de uma produção coletiva. Uma delas
é a de tornar público o que se pensa, compartilhando com professor(a) e colegas
aquilo que considera que pode não estar correto. A análise dos dados sugere que
essa dificuldade também pode ocorrer com participantes de um fórum, pois ainda

Livro Coordenação Pedagógica.indb 339 22/10/2018 14:27:55


340 Ferramentas dialógicas em uma perspectiva freireana

que não se trate, normalmente, de um espaço de edição coletiva, é um espaço de


compartilhamento de ideias:

Alima: [...] Até agora eu tô falando contigo e eu tô pensando... talvez até foi
isso que me deixou com um pouco de medo do fórum, né? A gente não tá acos-
tumado com um espaço pra ti falar da tua ideia, pra ti expressar tua ideia.

Para Broch (2008), pode levar algum tempo para que o aluno se acostume
com a ideia de assumir o que escreveu. Foi o caso de Ait que não estava acostumada
a escrever em fóruns, mas após um tempo começou a se articular e, ao final, teve
uma participação ativa:

Ait: Na verdade eu demorei um tempão pra entrar no fórum porque eu


tava morrendo de medo. Eu não sabia, eu nunca tinha participado de um
trabalho assim, então eu não sabia como é que...que eu ia escrever, o que
que eu ia fazendo. Eu demorei, né? Eu tava com medo. É sempre assim: eu
fico mais observando, depois eu vou.

A participação ativa de Ait a levou a considerar a ferramenta fórum como


fundamental a sua aprendizagem no curso. Conforme Kratochwill (2006) e Guisso
et al (2012), o mmediados por um AVA. Destaca-se, assim, as possibilidades de
aprendizagem oportunizadas pelo fórum a partir de trecho do texto coletivo escrito
por Ait e suas colegas Iram e Aran:

O planejamento das aulas, os fóruns e a expertise da professora foram im-


portantes para o nosso crescimento intelectual a que o curso foi proposto e,
para nós, um novo caminho de aprendizagem.

Conforme salienta Nardocci (2012, p. 250), propostas de discussão em fórum


podem levar os alunos a ter “experiências que avancem para além das opiniões que
já possuem sobre o assunto” e construir conhecimento. É o caso da professora Élav:

Élav: Mas eu acho que o fórum a gente pode lê, lê as opiniões, refletir, pro-
duzir opinião diferente, pesquisar. Então, assim, a nível de conhecimento,
eu acho que o fórum acabou sendo mais importante, assim, nesse sentido.
[...] então com o fórum a gente tem esse momento que a gente pode pesqui-
sar, depois voltar e fazer as leituras, né? Interagir. Então por causa das pos-
sibilidades, acho que o fórum acabou sendo o melhor aprendizado em si.

O relato da professora corrobora com o apontado por Coutinho, Rodrigues


e Ferreira (2012), de que o fórum, por dar condições de interação, compartilha-
mento de conteúdos e pontos de vista, é uma das ferramentas que pode garantir
aprendizagens efetivas na EAD.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 341

ENTENDIMENTO DOS PROFESSORES ACERCA DO


TRABALHO REALIZADO NO EDITOR DE TEXTO COLETIVO

A partir do embasamento teórico construído anteriormente, as questões


referentes a processos sociais e autoria tornam-se indicadores do modo como os
professores utilizaram a ferramenta durante a realização dos cursos de extensão.
A edição coletiva é defendida por Calvo et al (2011) como uma atividade com
potencial de construção do conhecimento. No entanto, são diversos os autores, entre
eles, Calvo et al, 2011; Tinajero, Rojas-Drummond, 2012; Bustos Sánches, 2009),
que afirmam que a ferramenta contribui não somente para o processo cognitivo,
mas também para o social.
Conforme aponta Bustos Sánchez (2009), a edição de texto coletivo pressupõe
destinatários, ou leitores, que são os outros autores do texto. Assim, quando um
participante tem que realizar o trabalho de modo individual, a escrita que se realiza
no editor pode ficar prejudicada quanto à sua função interpessoal18 e ideacional19.
Nos extratos20 da professora Élav, que teve que fazer o texto individualmente21, é
possível perceber que ela criou uma expectativa de trabalho coletivo e, na impossi-
bilidade desse, o processo social ocorreu a partir de trocas com a tutora/professora:

Oi Cláudia!!
Tentei marcar um encontro online e o Epil até concordou mas o Ona es-
tava totalmente sem tempo e o Epil acabou não aparecendo.. continuei o
texto sozinha mas não publiquei mais...vou tentar te enviar mais tarde
para dares uma olhada tá...
bjs

Élav: Tu [dirigindo-se à autora] fez um comentário ali [no texto], né? Foi
a única pessoa que interagiu comigo e quando a gente teve a proposta do
editor de texto, eu achei bastante interessante e disse: “Nossa, vamos poder
compor um texto juntos”. [...] Eu fiquei muito motivada, talvez, não sei se
é essa bem a palavra. Entusiasmada, eu acho, com a proposta do editor de
texto, da gente poder criar, compor um texto realmente juntos, né? E em-
bora eu não tivesse participação dos colegas, né? Mas quando tu interagiu
comigo ali achei bastante produtivo também.

18 “Escrever para interagir com outra pessoa ou para nos comunicarmos” (BUSTOS SÁNCHEZ,
2009, p. 35).
19 “Escrever para expressar conhecimentos, ideias, sentimentos, representarmos ou criarmos os
objetos de nosso pensamento” (BUSTOS SÁNCHEZ, 2009, p. 35).
20 O primeiro extrato corresponde a uma mensagem enviada para a tutora. O segundo extrato é
uma transcrição de trecho da entrevista realizada no último dia de aula.
21 O grupo de Élav era formado por três pessoas. Como um participante trocou de grupo e outro
evadiu, ela teve que realizar a edição de texto individualmente.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 341 22/10/2018 14:27:55


342 Ferramentas dialógicas em uma perspectiva freireana

Segundo Freire (2008), o homem é um ser de relações e não apenas de con-


tatos. Assim, não causa surpresa Élav expressar que teria apreciado ter com quem
realizar trocas (“Eu fiquei muito motivada, talvez, não sei se é essa bem a palavra.
Entusiasmada, eu acho, com a proposta do editor de texto, da gente poder criar,
compor um texto realmente juntos, né?”).
Acrescenta-se que, devido à ausência dos colegas, o processo social propor-
cionado pela edição de texto coletivo (TINAJERO; ROJAS-DRUMMOND, 2012)
possivelmente não tenha tido a mesma intensidade do que ocorre em um grupo.
No entanto, por ter realizado trocas com a tutora/professora, ele ocorreu. O mesmo
não aconteceu com Ytan:

Ytan: [...] porque também eu escrevi muito sozinha o coletivo, né? Talvez
se as gurias tivessem escrito e inserido as ideias, enfim, de cada uma, teria
dado mais esse momento de reflexão e tal.

Ytan não buscou interagir com a tutora/professora ou criar outras situações


de diálogo com os colegas. Nesse sentido, seu processo de edição não foi um pro-
cesso social nem pôde cumprir as funções interpessoal e interacional (BUSTOS
SÁNCHEZ, 2009).
A afirmação da professora de que possivelmente teria tido mais oportunida-
des de reflexão com a participação dos colegas encontra embasamento em Bustos
Sánchez (2009). Para a autora (2009), o processo de escrita, quando os participantes
defendem e explicam seus pontos de vista, favorece o pensamento reflexivo. Da
mesma forma, vai ao encontro da concepção freireana de diálogo problematizador.
Ou seja, faltou à Ytan, durante a edição de texto, a experiência “do diálogo que,
problematizando, critica e, criticando, insere o homem em sua realidade como
verdadeiro sujeito da transformação”. (FREIRE, 2006, p. 51)
Os extratos de Onai e os extratos de sua colega de dupla, Assu, evidenciam
que o trabalho de edição de texto coletivo lhes proporcionou não só um diálogo
interpessoal (BUSTOS SÁNCHEZ, 2009; TINAJERO; ROJAS-DRUMMOND,
2012), como também, e principalmente, o diálogo que se dá através do encontro
entre sujeitos em uma relação de respeito, humildade e contribuição (FREIRE,
2006; 2014):

Onai: Mas a participação da Assu, embora ela ache que não, mas os tex-
tos que ela colocou foram muito bons, muito bem escritos. Eu fui sincero
quando falei para ela que ela escreve bem, né? Então, assim, não pela
quantidade, mas porque o que ela escreve teve muita qualidade.

Assu: Eu acho que o Onai foi muito bondoso comigo, porque ele lia as
coisas que eu escrevia, ele arrumava. Eu acho que eu não conseguia dizer
exatamente o que eu queria falar, né? E ele era muito bondoso, né? Então

Livro Coordenação Pedagógica.indb 342 22/10/2018 14:27:55


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 343

ele foi muito generoso comigo, então por isso que eu me sentia muito a
vontade de escrever com ele.

Conjectura-se que a convivência com Onai pode ter sido fundamental para a
participação de Assu na edição, pois, como mostra o próximo extrato, inicialmente
ela estava insegura quanto às suas contribuições:

Assu: Às vezes a gente pensa, mas a gente não verbaliza porque, assim, se
pensa que não vai se contribuir muito. [...]

Eu lia, olhava, fazia no caderno. “Não, eu tenho que botar, eu tenho que
botar”, mas eu tinha medo de entrar e detonar com as coisas que já ti-
nham.

De acordo com Broch (2008, p. 46), a insegurança de Assu é normal: “pode


levar algum tempo para que o aluno se acostume com a ideia de deixar a sua marca
de autoria no texto e assumir aquilo que escreveu ou ainda assumir um possível
erro [...]”. E é possível que, por sentir-se à vontade em sua relação com Onai, é que
Assu tenha conseguido superar suas inseguranças iniciais e realizado a coautoria.
A edição de texto coletivo, conforme mencionado anteriormente, pressupõe
outros leitores. Nesse sentido, implica tornar a escrita pública para os colegas de
grupo e o tutor/professor, o que pode ser uma decisão difícil para algumas pessoas
(BROCH, 2008). Para a professora Élav, esta pode ter sido a razão pela qual os
colegas de grupo abandonaram a produção coletiva:

Élav: Talvez, não sei, né? Talvez o motivo deles não terem continuado te-
nha sido ficado inibido também, porque no momento que tu tem que pro-
duzir, tu tem que mostrar se sabe, se tu não sabe, tem que ir atrás.

Não é possível afirmar por que estes professores evadiram; afinal para além de
possíveis razões pessoais, há diversos enfrentamentos com os quais os participantes
da edição coletiva devem lidar: dificuldade em tornar a escrita pública, alteração
do texto pelos colegas, conflitos inerentes aos grupos, interpretações errôneas de
sua escrita, etc (MACEDO, 2010; BROCH, 2008).
Acrescenta-se a esses estranhamentos aqueles decorrentes das diferentes ex-
periências de vida e laborais, dos diferentes níveis de escolaridade, pontos de vista,
prioridades, objetivos, formas de se expressar, etc (BROCH, 2008):

Ait: Tu começa a escrever, daí tu tem teu estilo, aí eu tenho que te acompa-
nhar e ir produzindo, né? E não é fácil, né? Bem, assim, te instiga a buscar
coisa que tu até nem sabe. Então eu achei assim, bem legal, porque eu e as
gurias são de área bem diferente.

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344 Ferramentas dialógicas em uma perspectiva freireana

Iram: Porque, como a gente falou, assim, cada uma tem seu estilo, a gente
é muito diferente, né? E poder escutar mais a outra e a gente colaborar e
construir mais o texto. A gente ceder e concordar, né? Vê que há outros
pontos de vista. Então, eu acho assim, pra mim, foi o texto final assim, a
seis mãos, foi o que eu eu...

Os extratos de Ait e Iram mostram como as individualidades estiveram presen-


tes durante todo o processo de escrita, através dos diferentes estilos de escrita, áreas
de atuação, conhecimentos e pontos de vista. Assim, a socialização entre indivíduos
tão diferentes permite e até pode contribuir para que se dê a construção coletiva:
“foi o texto final assim, a seis mãos”. Essa afirmativa de Iram ilustra o apontado por
Tinajero e Rojas-Dummond (2012) de que os significados que os autores imprimem
em seus textos interagem e afetam sentidos iniciais, caracterizando a dialogicidade
do processo de edição coletiva. Do ponto de vista freireano, pode-se dizer que os
diálogos oportunizados pela produção coletiva se deram através de relações de
respeito, em que se reconhecem os diferentes saberes e esses contribuem para que
ocorram questionamentos e reflexões (FREIRE, 2008).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É preciso refletir sobre as questões de acesso aos recursos digitais bem como
sobre o uso que estão fazendo deles nos espaços escolares. O entendimento é que
eles tanto podem servir para a manutenção de interesses de uma minoria como de
instrumento para obtenção da liberdade.
A utilização dos recursos digitais a partir de uma perspectiva freireana ca-
racteriza uma educação humanista e libertadora, que possibilita a autonomia, a
participação e, portanto, a gestão democrática dos espaços escolares.
A presente pesquisa confirma o fórum como espaço adequado às atividades
sociais, através das quais são criados e fortalecidos os vínculos/relações entre os
participantes. Nessa perspectiva, o fórum também é entendido como ferramenta
dialógica, no sentido de que possibilita comunicação/interação. Acrescenta-se que
o estudo encontrou indícios de que a criação de vínculos entre os sujeitos pode
ser fundamental ao seu engajamento e participação ativa nas discussões, o que
pode contribuir para os processos de ensino e aprendizagem. Destaca-se, nesta
perspectiva, que os sujeitos participantes evidenciaram experiências de aprendi-
zagem e possibilidades de modificar seu modo de pensar a partir das trocas que
realizaram no fórum.
Quanto às discussões na ferramenta, encontraram-se indícios de que debates
extensos, que geram um número grande de postagens, podem desmotivar a par-
ticipação. No entanto, também foram identificadas questões como falta de tempo

Livro Coordenação Pedagógica.indb 344 22/10/2018 14:27:55


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 345

e a priorização de outras atividades como razões para a pouca participação nas


discussões. Estas razões podem estar relacionadas à falta de comprometimento
e responsabilidade por parte dos sujeitos participantes. Nesse sentido, a pesquisa
salienta que o diálogo crítico exige seriedade, respeito e responsabilidade.
Quanto ao editor de texto coletivo, destaca-se que a edição coletiva exige socia-
lização. Assim, quando um participante tem que realizar o trabalho individualmen-
te, ele perde a oportunidade de participar de um diálogo problematizador, no qual
há ocorrência de questionamento, conflito de ideias, reflexões. Nesta perspectiva,
os sujeitos participantes da edição de texto coletivo apreciaram e buscaram trocas
com os colegas, sentindo-se prejudicados quando, por alguma razão, tiveram que
escrever individualmente.
A análise dos dados referentes aos grupos que mantiveram a edição coletiva
até o fim mostrou que, nestes grupos, ocorreu o diálogo entendido como encontro
de sujeitos em uma relação de respeito, humildade e contribuição. Nesses casos, os
participantes se sentiram acolhidos e estimulados pelo outro, realizando o trabalho
com mais segurança, pois os diferentes saberes foram reconhecidos e valorizados,
contribuindo para questionamentos e reflexões.
Diante do exposto, tanto no que tange aos aspectos computacionais quanto
aos educacionais e, principalmente, quanto às possibilidades de que se estabeleça
o diálogo em uma perspectiva freireana, esta pesquisa compreende o fórum e o
editor de texto coletivo como ferramentas dialógicas.
No entanto, é preciso salientar que as ferramentas somente tornam-se verda-
deiramente apropriadas para uma educação dialógica se houver o envolvimento
tanto dos alunos quanto dos professores. Em outras palavras, professores e alunos
têm papel fundamental nos processos dialógicos com utilização dessas ferramentas.
O professor deve estar atento à promoção do diálogo e, durante as práticas pedagó-
gicas, realizar as intervenções necessárias, sempre com foco nos objetivos educacio-
nais. O aluno como participante do processo dialógico de ensino e aprendizagem
precisa ser responsável por suas ações, participando ativamente e com seriedade.

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Livro Coordenação Pedagógica.indb 348 22/10/2018 14:27:55
Direito à educação infantil: 2 5
perspectivas para consolidação no
contexto dos 20 anos da LDBEN

Maria Luiza Flores

APRESENTAÇÃO

Tendo como referência o fato de que, a partir da Lei de Diretrizes e Bases da


Educação Nacional – Lei n.º 9.394/1996 (LDBEN), o direito à educação infantil foi
incorporado como a primeira etapa da educação básica, o artigo propõe reflexões
em relação aos principais avanços da área ocorridos desde então e aponta alguns
desafios na direção da efetivação do acesso com qualidade. Visando alcançar esse
fim, o texto encontra-se organizado a partir de dois objetivos principais. O primeiro
deles é resgatar alguns marcos fundamentais da trajetória dessa etapa referentes
à sua garantia como direito social, desde um conjunto de dispositivos legais e de
documentos orientadores de caráter indutor produzidos pelo Ministério da Edu-
cação (MEC). O segundo objetivo colocado se refere à sistematização de algumas
ideias no sentido de contribuir para a organização dessa oferta, em processo de
expansão no âmbito dos sistemas de ensino, de maneira que a necessária ampliação
do atendimento atenda aos critérios e parâmetros de qualidade vigentes, sem des-
considerar aspectos de equidade, tendo em vista a realidade brasileira. No escopo
desse artigo, para desenvolver o segundo objetivo, abordaremos apenas critérios
vinculados: (a) ao estabelecimento de metas e objetivos de acesso/ampliação do
atendimento; e (b) à elaboração, por parte dos órgãos responsáveis, de documentos
orientadores que ofereçam diretrizes para a oferta de educação infantil no âmbito
dos sistemas em consonância com os documentos vigentes em nível nacional.1 Em
nosso entendimento, estes dois aspectos se articulam, como critérios básicos para
a formulação e implementação de uma política municipal de educação.

1 Um levantamento completo de itens neste sentido se encontra sistematizado no documento


“Educação Infantil: subsídios para construção de uma sistemática de avaliação” (BRASIL, COE-
DI/SEB/MEC, 2012).

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350 Direito à educação infantil: perspectivas para consolidação no contexto dos 20 anos ...

Para desenvolver os aspectos inerentes aos dois objetivos indicados, o presente


estudo se encontra organizado a partir de duas seções centrais; uma primeira com
ênfase em aspectos teóricos e legais acerca da consolidação da educação infantil
no ordenamento jurídico do país e a seguinte sistematizando, a partir de diversos
documentos, aspectos inerentes à responsabilidade local do poder público para
com a garantia da oferta de educação de qualidade. Assim, o artigo propõe um
diálogo entre o campo da educação infantil e a área das políticas educacionais,
entendendo essas como o Estado em ação para atender à demanda social pelo di-
reito à educação para as crianças de até seis anos. Para a efetivação de seu papel, o
Estado materializa uma política em programas, projetos ou ações, sendo que, nas
sociedades modernas e, principalmente, desiguais como a brasileira, essa agenda é
sempre resultante de conflitos de várias ordens, sendo constituída a partir de uma
correlação de forças e de interesses (SOUZA, 2006; RUA, 1998).
No caso da educação infantil, Campos (2011) apresenta algumas tensões
presentes na área em relação às políticas e à identidade da educação infantil, con-
siderando uma disputa de concepção entre diferentes tendências, que fragiliza a
institucionalização do acesso ao direito educacional com qualidade para todas as
crianças brasileiras de até seis anos. A despeito da importância reconhecida a essa
etapa educacional por estudos e pesquisas e à luta dos movimentos sociais e de
mulheres, há uma tendência em países da América Latina no sentido de inclusão
das crianças de quatro a seis anos nos sistemas educacionais, enquanto se desen-
volvem iniciativas voltadas ao atendimento às crianças de até três anos vinculadas
a projetos de “combate à pobreza” embasados em aportes que defendem os efeitos
positivos de uma “educação inicial” (CAMPOS, 2011).
Nesse sentido e entendendo os riscos à unidade da educação infantil face à
gravidade do momento atual vivido pelo país, no qual vêm acontecendo cortes
sistemáticos em áreas sociais, dentre elas a educação2, este artigo encontra-se apoia-
do em uma compreensão da indissociabilidade entre as dimensões de cuidado e
educação, considerando a creche e a pré-escola como subetapas em continuidade,
cujas especificidades devem ser desdobradas no âmbito das instituições de educação
coletiva das crianças, sem prejuízo a sua articulação.

2 No momento em que escrevemos esse artigo, outubro de 2017, as matérias jornalísticas em dife-
rentes suportes abordam a partir de diferentes posições um momento de crise econômica vivida
pela União, estados e municípios, tendo ocorrido, em período recente, pelo menos, duas inicia-
tivas do Governo Federal com impacto em termos de destinação de recursos para a Educação:
uma delas, a Emenda Constitucional 95/2016, que impõe um teto de gastos ao orçamento por
20 anos; a outra, a abertura da exploração da camada pré-sal do Petróleo ao capital estrangeiro,
com leilões já ocorridos neste mês, a partir de marco regulatório que desobrigou a Petrobrás de
ser a operadora única desta reserva com repercussão na destinação de recursos desta exploração
para a área da educação.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 351

MARCADORES DA TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Uma breve contextualização da trajetória da educação infantil em direção ao


lugar de primeira etapa da educação básica e responsabilidade prioritária dos siste-
mas municipais de ensino é importante, sem desconsiderar o caso dos municípios
que não possuem sistema próprio de educação e se encontram subordinados às
normativas dos respectivos sistemas estaduais. O resgate das principais leis federais
evidencia avanços sistemáticos nas últimas décadas, garantindo lugar destaque à
educação das crianças bem pequenas. É na Constituição Federal de 1988 (CF/88)
que encontramos a determinação de que a educação infantil, além de ser direito
de todas as crianças de até seis anos, é também direito das famílias trabalhadoras
urbanas e rurais.3 Esse direito foi ratificado no Estatuto da Criança e do Adoles-
cente (ECA), instituído pela Lei 8069/90, que dispõe sobre o caráter prioritário no
atendimento às crianças e adolescentes, cujos direitos sociais devem ser atendidos
com primazia.
A LDBEN instituiu dois níveis na educação brasileira, sendo o primeiro o da
educação básica, e reconheceu a educação infantil como a primeira etapa desta,
definindo e vinculando a expressão creche ao grupo etário entre zero até três anos
e pré-escola aos agrupamentos com crianças entre os quatro e seis anos (BRASIL,
Lei 9394/96, Art. 30). Ao determinar a formação em nível superior, curso de li-
cenciatura plena como requisito para atuar tanto na educação infantil quanto nos
anos iniciais do ensino fundamental, a Lei Maior da Educação iguala em exigência
ambas as etapas, ratificando a dimensão educativa da educação infantil.
Ainda que esta Lei admita, como formação mínima, aquela de Ensino Médio
na modalidade Normal para o exercício do Magistério junto a estas duas primeiras
etapas da educação básica, dez anos depois, a Resolução CNE/CP Nº 01/06, que esta-
belece as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de pedagogia, apresentou
este curso como o espaço legítimo para a formação de profissionais que irão atuar
junto à faixa etária que incorpora a educação infantil e os anos iniciais do ensino
fundamental, explicitando conteúdos formativos indispensáveis a essa atuação na
perspectiva contemporânea de uma pedagogia da infância (OLIVEIRA, 2014).
Como outro momento importante para a consolidação desta etapa, destacamos
a Emenda Constitucional nº 53/2006 (EC 53/06) que alterou a CF/88, incluindo a
educação básica como um todo no financiamento público. A seguir, a Lei 11.494/07
regulamentou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e
de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), com vigência até 31 de

3 No texto original da CF/88, a faixa etária abrangida considerava até a idade de seis anos. Com
a implantação do ensino fundamental de nove anos de duração, as crianças de seis anos de
idade deixaram de ser público-alvo para ingresso na educação infantil (conforme Leis Federais
11.114/05 e 11.274/06). Cabe ressaltar, porém, que muitas crianças que ingressam na educação
infantil completam seis anos ao longo do ano, permanecendo com direito a essa etapa até o final
do ano.

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352 Direito à educação infantil: perspectivas para consolidação no contexto dos 20 anos ...

dezembro de 2020, revogando dispositivos da Lei 9.424/96 que regulamentava o


Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização
do Magistério (Fundef). Ainda que de maneira gradual, no início da vigência deste
Fundo, as matrículas na educação infantil passaram a ser remuneradas de acordo
com os coeficientes determinados na portaria anual do Fundeb, contribuindo
para a expansão desta oferta pelos sistemas de ensino municipais, uma vez que
essa Lei, em seu Artigo 9º, determina, conforme a CF/88, que “os recursos serão
distribuídos entre o Distrito Federal, os estados e seus municípios, considerando-se
exclusivamente as matrículas nos respectivos âmbitos de atuação prioritária [...]”
(BRASIL, Lei 11.494/07, Art. 9º, § 1º).
Mesmo considerando que a inclusão da educação infantil no Fundeb repre-
sente avanços, é importante destacar que os valores praticados por matrícula no
âmbito deste Fundo, são avaliados como insuficientes desde sua criação, uma vez
que não alcançam o investimento necessário a uma oferta dentro dos padrões de
qualidade vigentes (SANCHEZ, 2010; BASSI, 2011). O próprio Conselho Nacional
de Educação emitiu, há mais de seis anos, o Parecer 08/10, que trata dos padrões
mínimos de qualidade de ensino para a Educação Básica Pública, reconhecendo a
necessidade da aplicação do Custo/aluno/qualidade/inicial (CAQi) como indica-
dor para o cálculo do investimento indispensável a uma educação de qualidade.4
A Emenda Constitucional 59/09 (EC 59/09), além de outras mudanças, am-
pliou a faixa etária da educação escolar obrigatória no Brasil para aquela entre os
quatro e os dezessete anos, determinando a obrigatoriedade de matrícula na pré-
-escola, que, a partir de então passa a ser direito público subjetivo, com o paralelo
dever do Estado em relação à oferta gratuita e, pela faixa etária envolvida, com a
responsabilização das famílias ou responsáveis em relação ao compromisso com a
matrícula e com a frequência (CURY, 2008).
Quatro anos depois, a Lei 12.796/13 atualizou a LDBEN em relação às
alterações provocadas pela EC 59/09, definindo a idade da pré-escola como aquela
correspondente aos quatro e cinco anos e alterando, especialmente para o caso da
educação infantil, os artigos 29, 30 e 31 que tratam especificamente desta etapa.
A Nota Técnica nº 207/13 da Coordenação da Educação Infantil da Secretaria de
Educação Básica do MEC (COEDI/SEB/MEC) esclarece as alterações produzidas
nesses três artigos, sendo material indispensável à correta interpretação do conteúdo
da Lei 12.796/13.
No que se refere aos planos decenais de educação, a educação infantil foi in-
cluída com meta própria na Lei 10.172/01, que criou o Plano Nacional de Educação
2001-2010 (PNE), pelo qual foi determinado como meta para a década o percentual
mínimo de atendimento a 50% da população de até três anos e de 80% daquelas em

4 Para saber mais sobre o CAQi, recomendamos o documento “Educação pública de qualidade:
quanto custa esse direito?”, publicado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação (2011),
Disponível em: http://campanha.org.br/

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 353

idade de pré-escola. Expirada a vigência deste PNE, o balanço da década indicou que
o país havia alcançado parcialmente as metas previstas, obtendo um desempenho
insuficiente em relação à oferta de vagas para o grupo etário de até três anos. Os
microdados do Censo Educacional 2010 (INEP, 2014) apontavam o atendimento
a apenas 18,4% das crianças nessa faixa etária; já em relação à faixa entre quatro e
seis anos, os dados indicaram o alcance do percentual de 80,1% como média/país,
existindo ainda à época um milhão cento e cinquenta e quatro mil e quinhentos e
setenta e duas (1.154.572) crianças de quatro e cinco anos fora da escola, conforme
relatório publicado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e
pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação (2014).
Os dados deste relatório apontam também a desigualdade no acesso educa-
cional no país, evidenciando que esse dado positivo de alcance da meta para a pré-
-escola considera o país como um todo, enquanto dados censitários desagregados
por região, dentre outras características específicas populacionais, apontam que
no grupo ainda sem acesso a esse direito encontram-se, predominantemente, as
crianças não brancas, de famílias com renda de até ½ salário mínimo e cujos pais
não possuíam instrução formal ou possuíam ensino fundamental incompleto, o que
indica a importância de políticas públicas que visem à equidade no acesso a esse
direito (UNICEF, Campanha Nacional pelo Direito à Educação, 2014). Para além
dessa questão que implica políticas de equidade, estudos sobre a oferta de educação
infantil no país apontam ainda a falta de qualidade do atendimento ofertado, o
que também vem a prejudicar o aproveitamento desta oportunidade para aquelas
crianças com acesso a uma vaga (KAGAN, 2011).
Para fechar esse resgate dos instrumentos legais nacionais, ressaltamos que
o atual PNE, aprovado pela Lei 13.005/14, manteve a meta de atendimento a 50%
da população de até três anos, projetando-a para o final da sua vigência, sem pre-
visão de metas intermediárias, alargando o tempo para efetivação do percentual já
previsto no PNE anterior, e somando um total de 24 anos para que o país alcance o
atendimento a, no mínimo, 50% desta faixa etária, o que evidencia um baixo nível de
reconhecimento de nossos legisladores para uma demanda social dessa relevância.
No que se refere à idade pré-escolar, em adequação ao ordenamento legal
vigente, este Plano apresenta como meta para o ano de 2016 a universalização do
atendimento. Com os imperativos legais em relação à universalização da pré-escola
e considerando-se a determinação constitucional de que a oferta de educação
infantil é responsabilidade prioritária dos municípios (BRASIL, CF/88, art. 211, §
2º), ressalvadas as necessárias formas de colaboração entre a União, os estados e
os municípios, cabe aos últimos a maior parcela de responsabilização no sentido
de expansão e efetivação desse direito educacional.
Os documentos legais aqui trazidos, considerada a sua importância no ordena-
mento legal brasileiro, constituem a base para a organização das políticas públicas
educacionais em todas as suas etapas e modalidades, definindo aspectos centrais

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354 Direito à educação infantil: perspectivas para consolidação no contexto dos 20 anos ...

que são objetivo de normativas específicas por parte do Conselho Nacional de


Educação (CNE).5 As normativas específicas da educação infantil que devem ser
seguidas para a efetivação dessa oferta e desdobramentos em termos de produção de
documentos orientadores por parte dos sistemas de ensino, exaradas pela Câmara
de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (CEB) do CNE foram o
Parecer CEB/CNE 20/09 e a Resolução CEB/CNE 05/09, que fixa as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI). Essas Diretrizes e o
respectivo Parecer, que avançam significativamente em termos de conteúdo norma-
tivo e aprofundamento conceitual em relação à norma anterior, são destacados por
Oliveira (2014), quando enfatiza a importância dos ambientes de aprendizagem e
desenvolvimento oferecidos, que precisam considerar as interações e a brincadeira
como eixos organizadores do currículo para as crianças bem pequenas. Apoiada
na Res. CEB/CNE 05/09, Flores (2017) apresenta aspectos importantes colocados
pelas atuais DCNEI em relação à conceituação desta etapa:
O documento vigente sustenta a articulação das funções social, política e pedagógica
da educação infantil, qualificando as instituições que oferecem este atendimento
como espaços educacionais diurnos, públicos ou privados, sujeitos à regulação e
supervisão dos órgãos competentes de cada sistema educacional. Trata-se, assim,
de um direito educacional com características próprias, que exige instituições e
currículo específicos, bem como profissionais com a formação definida em lei
própria (FLORES, 2017, p. 210).

Para os objetivos deste texto, além do resgate das legislações e dos documen-
tos normativos pertinentes, cabe destacar a atuação da COEDI/SEB/MEC, que,
nas últimas décadas, vem efetivando o papel deste Ministério como indutor para
a efetivação das políticas. Nas últimas décadas, foram produzidos e distribuídos
às redes, escolas e docentes, documentos orientadores desta oferta, pautados em
padrões de qualidade consensuados na área, apoiados em pesquisas de abrangência
nacional ou ainda resultantes de consultas públicas. Para destacar apenas alguns
destes materiais, hoje disponíveis on line no Portal do MEC, citamos: Critérios
para um atendimento em creche que respeite os direitos das crianças (1995; 2009);
Política Nacional de Educação Infantil: pelo direito das crianças de zero a seis anos
à Educação (2005); Parâmetros Nacionais de Qualidade para Educação Infantil
(2006); Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil
(2006); Indicadores da Qualidade na Educação Infantil (2009).6

5 Esta seção resume ideias já apresentadas em outro artigo da autora (FLORES, 2017), em que a
revisão e a análise do ordenamento jurídico que consolida a educação infantil como primeira
etapa da educação básica brasileira se encontram mais detalhadas.
6 Estes são apenas alguns dos documentos existentes e disponíveis no Portal do MEC:<http://
portal.mec.gov.br/secretaria-de-educacao-basica/index.php?option=com_content&view=articl
e&id=12579:educacao-infantil>Acesso em: 27 de julho de 2017.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 355

Além de documentos acima citados, neste Portal é possível encontrar relató-


rios de pesquisas sobre diversas temáticas vinculadas à educação infantil, além de
materiais produzidos a partir de termos de cooperação ou parcerias do MEC com
diferentes instituições ou ainda de consultorias de especialistas de diversas áreas,
abordando temas como as relações étnico-raciais, a brincadeira, a organização
dos espaços, a oferta educacional em áreas rurais, a implementação do Programa
Nacional de Reestruturação e Aquisição de Equipamentos para Rede Escolar Pú-
blica de Educação Infantil (Proinfância), a leitura e a escrita na educação infantil,
perfazendo um acervo importante para apoio aos municípios e às escolas.
Visando subsidiar as secretarias e os conselhos de educação nos processos
de integração das creches aos sistemas municipais de ensino foi publicado pelo
MEC o documento Integração das Instituições de Educação Infantil aos Sistemas
de Ensino (BRASIL, MEC, 2002). Relata estudos de caso de cinco municípios de
diferentes regiões do Brasil com destaque a práticas que reconheceram o direito
educacional ao acesso a uma vaga com qualidade, com exemplos de adequação de
espaços físicos, efetivação do princípio da gestão democrática, exigência quanto à
formação inicial para profissionais da educação, dentre outros.
Ainda que este processo de integração das instituições aos sistemas de ensino
tenha sido uma demanda cujo prazo estipulado na LDBEN estava previsto para
acontecer até 1999, em até três anos após a promulgação desta Lei (BRASIL, Lei
9394/96, art. 89), até poucos anos atrás ainda havia casos em desacordo com tal
determinação, com a manutenção do atendimento vinculado à área da saúde e/ou
a da assistência. A partir desta integração, outras iniciativas precisam ser tomadas
pelos sistemas de ensino para que tal processo seja efetivo; discorreremos sobre isso
na seção seguinte, realizando um desdobramento de alguns aspectos que podem
colaborar com tal organização.

ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DA OFERTA DE EDUCAÇÃO INFANTIL

Podemos afirmar que na atualidade a educação infantil vem ocupando espaço


de relevância na agenda das políticas de educação em nível nacional e, conse-
quentemente, no conjunto das demandas dos gestores municipais. A trajetória de
consolidação dessa etapa no plano legal, apresentada no item anterior, impulsionou
diferentes iniciativas implementadas pelos municípios na última década para a
expansão da oferta de educação infantil. Contudo, por se tratar de um direito re-
lativamente novo, é necessário que as equipes gestoras se cerquem de informações,
documentos, materiais, dados e, principalmente, de pessoas tecnicamente habili-
tadas, o que implica atualização jurídica e conceitual sobre a matéria, de maneira
a que possam contribuir para uma expansão devidamente planejada.

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356 Direito à educação infantil: perspectivas para consolidação no contexto dos 20 anos ...

Segundo Cury (2007), “gestão é um termo que provém do latim e significa:


levar sobre si, carregar, chamar a si, executar, exercer, gerar” (CURY, 2007, p. 493).
Analisando o surgimento do conceito de gestão democrática no contexto da rea-
lidade brasileira, a partir do resgate de movimentos do Magistério na década de
80, que levaram à organização sindical e a definições quanto a planos de cargos e
carreira, Medeiros e Luce (2006) destacam: “É, portanto, no bojo da ampla luta por
democracia que se formula, entre nós, a noção de gestão democrática da educação,
compreendendo a gestão democrática na educação.” Avançando em análise, prosse-
guem as autoras, afirmando que a democratização da educação poderia ser associada
à “[...] democratização do acesso e a estratégias que garantam a continuidade dos
estudos, tendo como horizonte a universalização do ensino para toda a população
bem como o debate sobre a qualidade social dessa educação universalizada” (ME-
DEIROS E LUCE, 2006, p. 15) (grifos das autoras).
Nessa linha, tendo como referência teórica o princípio constitucional da gestão
democrática do ensino público (BRASIL, CF/88, Art. 206, Inc.VI), abordaremos
um dos aspectos fundamentais para a organização da oferta de educação infantil
no âmbito de um município, o estabelecimento de metas e estratégias para acesso e
ampliação do atendimento em sua rede, considerando outro princípio constitucio-
nal, aquele referente à garantia de padrão de qualidade (BRASIL, CF/88, Art. 206,
Inc.VII). Na seção anterior, discorrendo sobre os institutos legais que embasam a
oferta educacional no Brasil, abordamos o PNE, que segundo a legislação deve se
desdobrar em planos estaduais e municipais correlatos.
Os planos municipais deveriam ser embasados em um diagnóstico da reali-
dade que subsidiasse o Fórum Municipal de Educação7 na discussão e proposição
de metas e estratégias para os planos decenais, envolvendo dados demográficos e
populacionais por idade/faixa etária, em articulação com sistemas de informação
geográficas, permitindo, por exemplo, identificar a curva da natalidade e os índi-
ces de ocupação do território, o que planejar a expansão da oferta em um dado
município, de acordo com a demanda da população a ser atendida considerando
dados do decênio sobre o qual se debruça o planejamento. Na década passada, o
Brasil viveu acentuado processo de queda da natalidade, impactando na demanda
educacional, conforme estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), analisado por Borges, Campos e Silva (2015), sendo o Rio Grande do Sul
um dos estados mais afetados.8

7 Como desdobramento da Lei 13.0005/14, os Fóruns Municipais de Educação assim como o


Fórum Nacional de Educação em relação ao PNE (nível nacional) teriam a atribuição de acom-
panhar a execução do PME e o cumprimento de suas metas, de maneira integrada a outras
instâncias indicadas no Art. 6º desta Lei. (BRASIL, Lei 13.005/14, 5º).
8 No caso do Rio Grande do Sul, estado onde foi desenvolvido o projeto formativo que origina
esse livro, a Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul (FEE) disponibiliza em
seu site diversos dados, documentos e publicações sobre os municípios gaúchos, que podem ser-
vir como apoio aos municípios, incluindo-se uma estimativa populacional por idade, em série

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 357

Logo, para um planejamento estrategicamente situado, torna-se necessário


que os/as responsáveis pela gestão de um sistema de ensino conheçam a realidade
concreta do município, utilizando dados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílio (PNAD), dos Censos Educacionais do INEP e do Censo Demográfico do
IBGE, além de outros sistemas de informação disponíveis, inclusive aqueles gera-
dos no âmbito do próprio município. A identificação de população em situação de
vulnerabilidade, a demanda educacional junto a famílias residentes em área rural9,
grupos oriundos de migração populacional ou assentados, dentre outros grupos
específicos, são informações que também precisam ser consideradas de maneira
especial e alvos de planejamento de ações no âmbito do município como um todo,
fazendo parte do compromisso da gestão municipal para com políticas de equidade
no acesso educacional. Rosemberg (2011 e 2014) desenvolveu estudos que com-
provam as diferenças existentes entre as crianças brasileiras no que se refere a esse
acesso, envolvendo diferenças quanto à renda familiar, à origem étnico-racial, ao
local de moradia e à idade, em certos casos, somando-se esses aspectos e deixando
alguns grupos de crianças sem acesso à creche ou à pré-escola, potencializando
situações de vulnerabilidade social. Tal realidade pode levar, em contextos espe-
cíficos, à necessidade de articulação em nível intersetorial, de maneira a garantir
outros direitos sociais fundamentais de cidadania às crianças e às suas famílias.10
Devido ao contexto de demanda de expansão da oferta de educação infantil no
Rio Grande do Sul, conjugado à obrigatoriedade de matrícula escolar para a faixa
etária da pré-escola, o Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul (TCE-RS) passou
a produzir Radiografias da Educação Infantil, contribuindo com os municípios gaú-
chos a partir da disponibilização de dados sobre a população em idade de educação
infantil, as matrículas existentes, de acordo com o Censo Educacional do Instituto
Nacional de Pesquisas Anísio Teixeira (INEP) e ainda percentuais de atendimento
e número de vagas a serem criadas.11 Esse conjunto de estudos, produzido ano a
ano desde 2009, é uma ferramenta importante para que os municípios conheçam
dados sobre sua própria realidade, especialmente em momentos de troca de gestão,

histórica, que pode servir de suporte ao planejamento desta oferta educacional. Para acesso ao
site da FEE: https://www.fee.rs.gov.br/
9 No site do MEC, encontram-se disponíveis relatórios da “Pesquisa Nacional Caracte-
rização das práticas educativas com crianças de 0 a 6 anos de idade residentes em área ru-
ral (MEC, 2012) com dados de demanda e oferta de educação infantil no campo para to-
das as regiões do país. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_
docman&view=download&alias=13620-relato-sintese-eb&category_slug=julho-2013-
pdf&Itemid=30192>
10 O anexo 3 do documento “Educação Infantil: subsídios para construção de uma sistemática de
avaliação” (BRASIL, MEC, 2012) apresenta um conjunto de questões que podem auxiliar aos
municípios no planejamento de sua oferta, contemplando aspectos aqui citados brevemente.
11 Os estudos do TCE-RS voltados à educação infantil encontram-se disponíveis no endereço:
<http://www1.tce.rs.gov.br/portal/page/portal/tcers/publicacoes/estudos/estudos_pesquisas/
educacao_infantil>

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358 Direito à educação infantil: perspectivas para consolidação no contexto dos 20 anos ...

quando os quadros das secretarias de educação costumam ser alterados, levando


a uma interrupção em determinadas ações e à necessidade de apropriação pelos
novos gestores e gestoras de um conjunto de dados cuja produção poderia demandar
certo tempo, além de know how de especialistas em estatística e em outras áreas.12
Logo após a aprovação do PNE 2014-2024, o MEC desencadeou um processo
de assessoria aos estados e municípios para a elaboração de seus respectivos planos
estaduais ou municipais de educação. Esse documento criado por lei constitui-se
em outra ferramenta importante para a gestão municipal, por apresentar princípios,
objetivos, metas e estratégias para um determinado município com caráter dece-
nal, que precisam ser objeto de programas e ações de, no mínimo, três governos
distintos, que precisam se comprometer com a programação prevista, de maneira a
que as metas sejam atendidas até o final da década de vigência desta lei municipal.
Existem diversos portais que oferecem materiais e dados para esse monitoramento,
agregando informações de todo o Brasil, que também podem ser utilizadas para
um melhor planejamento em termos de objetivos educacionais.13
Além da organização da oferta e expansão do atendimento, existem alguns
documentos orientadores para a oferta educacional que precisam ser elaborados
por parte dos órgãos responsáveis, visando fornecer diretrizes para a oferta de
educação infantil no âmbito de cada sistema, incluindo-se as instituições públicas
e privadas, em consonância com os documentos vigentes em nível nacional.14
Julgando importante retomar algumas orientações a respeito da distinção entre
documentos normativos, documentos referenciais, responsabilidades das mante-
nedoras junto às escolas públicas municipais que integram suas redes de ensino e
responsabilidades específicas das próprias escolas, retomamos figura proposta por
Flores e Silva (2015, p. 240):

12 Mais detalhes sobre as ações deste Tribunal podem ser obtidas no estudo de Flores (2015).
13 Dentre estes, citamos o site PNE em Movimento. Disponível em: http://pne.mec.gov.br/monito-
rando-e-avaliando/monitoramento-das-metas-do-pne-2014-2024 Acesso em: 15 de outubro de
2017.
14 No trecho a seguir desta seção, com a autorização das autoras, retomamos e atualizamos algu-
mas ideias apresentados por Flores e Silva (2015a) em material didático produzido no âmbito de
projeto desenvolvido pela Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul para assessoramento técnico-pedagógico a municípios gaúchos que aderiram ao Proinfân-
cia.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 359

FIGURA 1 – NÍVEIS DE PLANEJAMENTO E DOCUMENTOS


EDUCACIONAIS DE REFERÊNCIA

Fonte: Flores e Silva, 2015, p. 240.

A figura acima busca evidenciar níveis de responsabilidade para com a constru-


ção de documentos referenciais em termos de política e gestão educacional, visando
responder a questões comuns nesta matéria, tais como: em quais documentos os
sistemas de ensino e as escolas devem expressar seus compromissos para com a
oferta educacional? A quem cabe liderar o processo de construção dos documentos
referentes ao diferentes níveis de planejamento educacional? Quem deve participar
do processo de construção desses documentos nos sistemas de ensino e nas escolas?
Que referenciais legais devem ser observados na elaboração desses documentos?
No primeiro nível da figura apresentada, destacamos o PNE, lei que estabelece
diretrizes, metas e estratégias para toda a educação nacional com vigência decenal
a contar de sua publicação. Logo, além das leis maiores indicadas na seção anterior,
este é um documento de referência que deve ser considerado para fins de planeja-
mento educacional nos níveis estadual e municipal. Flores e Silva (2015a) chamam
a atenção para os níveis seguintes:

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360 Direito à educação infantil: perspectivas para consolidação no contexto dos 20 anos ...

Na sequência, o Plano Estadual de Educação (PEE), que, a partir do que se encon-


tra estabelecido no PNE vigente, ajusta as metas e estratégias à realidade local. A
seguir, a partir dos Planos acima citados, temos o Plano Municipal de Educação
(PME), atualizando as metas e estratégias nacionais e estaduais em consonância
com o diagnóstico específico da realidade de cada município. Esses três documentos
constituem bases legais a serem observadas no planejamento educacional pelo gestor
municipal de educação, cujo papel é o de liderar esse processo de construção ou
revisão de diretrizes da Secretaria Municipal de Educação para sua rede de ensino,
consideradas as etapas e modalidades oferecidas. (FLORES E SILVA, 2015a, p. 240).

A partir do PME, voltados ao planejamento da educação de um município,


considerando as redes públicas e as escolas vinculadas à dependência administrativa
privada, desdobra-se no âmbito municipal a responsabilidade pelo planejamento
educacional de sua própria rede de ensino, o que implica formular diretrizes coe-
rentes e articuladas com os planos macroestruturais e, ao mesmo tempo, garantir
a gestão democrática e a autonomia das escolas na elaboração de seus próprios
documentos de referência. O quadro a seguir (Figura 2), produzido por Flores e
Silva (2015a) apresenta os níveis de abrangência dos documentos, quem se encontra
envolvido nesta elaboração e a legislação e documentos orientadores que precisam
ser considerados e utilizados como apoio:

Figura 2 – DOCUMENTOS REFERENCIAIS PARA A OFERTA DE EDUCAÇÃO INFANTIL

DIRETRIZES DA SECRETARIA MUNICIPAL DE PROPOSTA POLÍTICO-PEDAGÓGICA


ESPECIFICIDADES
EDUCAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL DE ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL
Estabelece princípios e diretrizes para a oferta Ratifica concepções acerca da(s)
de Educação Infantil em todos os espaços onde infância(s), da(s) criança(s) e da
ocorra essa oferta sob a responsabilidade da Educação Infantil, em consonância
Secretaria Municipal de Educação: escolas ou com os princípios e diretrizes da
centros municipais de Educação Infantil, creches ou mantenedora.
pré-escolas mantidas pela prefeitura, turmas de pré-
escola em escolas que ofertam Ensino Fundamental. Apresenta e buscar atender
as especificidades da unidade
Documento indispensável no âmbito da secretaria, educacional em relação a esses
podendo constituir-se de documento próprio ou de aspectos, considerando a comunidade
Abrangência do uma seção/capítulo das Diretrizes para a educação em que a escola está inserida.
documento municipal no seu todo.
Detalha aspectos da organização
A exigência desse documento pode estar e do funcionamento dessa oferta
estabelecida na Lei Orgânica do município ou educacional.
em alguma Resolução do Conselho Municipal de
Educação (CME). Este documento é peça indispensável
no processo de credenciamento e
Entendemos que tais princípios e diretrizes se autorização de funcionamento junto
estendem também à oferta de Educação Infantil aos conselhos estadual ou municipal
em instituições conveniadas, a partir de vagas de educação, conforme o caso,
financiadas com recursos públicos. juntamente com o Regimento Escolar.*
* Ainda que se constitua em um documento indispensável para a organização da oferta educacional de uma escola, não
abordaremos, neste texto, a constituição de um Regimento Escolar. (nota das autoras)

Livro Coordenação Pedagógica.indb 360 22/10/2018 14:27:56


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 361

Equipe da Secretaria de Educação; outros atores


da comunidade educacional que possam ser
incluídos em processos democráticos de discussão
Representantes da equipe pedagógica
e elaboração, tais como encontros e conferências
da Secretaria de Educação; equipe
municipais.
profissional da escola (gestores,
coordenadores, docentes e demais
O ideal é que haja a participação das escolas já
profissionais), comunidade escolar de
em funcionamento, pois, na medida em que pelo
Elaboração cada escola, da forma mais ampliada
menos a equipe gestora de cada uma participar, a
possível, incluindo as crianças.
própria unidade de ensino já poderá ir elaborando/
Quando possível, recomenda-se a
atualizando seus documentos internos (PPP,
realização de alguns movimentos que
Regimento, Planos de Atividades e de Estudos) e,
incluam entidades e lideranças do
sobretudo, instituindo novas práticas e avançando
bairro em que a escola está localizada.
nas que estiverem em andamento. A participação,
nesse caso, funcionará como uma formação em
serviço.
Legislação educacional nacional,
estadual e municipal.

Também devem ser consultadas as


publicações oficiais do Ministério
Legislação educacional nacional, estadual e
da Educação (MEC), da Secretaria
municipal.
Estadual de Educação (para municípios
Legislação e
sem sistema próprio) e as do próprio
documentos Também devem ser consultadas as publicações
município.
orientadores oficiais do Ministério da Educação (MEC), da
Secretaria Estadual de Educação (para municípios
Documentos orientadores da
sem sistema próprio) e as do próprio município.
mantenedora, tais como as diretrizes
da secretaria municipal de educação
para sua rede e para a Educação
Infantil, quando existirem esses
documentos.

Fonte: Flores e Silva, 2015a, p. 241-242.

Cabe destacar a importância da elaboração de diretrizes educacionais pelas


mantenedoras, envolvendo todas as etapas e modalidades educacionais ofertadas,
para que este documento subsidie o planejamento em seus diferentes níveis no
âmbito das unidades educacionais de uma rede de ensino. Para isso, reproduzimos
alguns esclarecimentos trazidos por Flores e Silva (2015a):
Diretrizes são orientações, recomendações ou instruções subordinadas à política
do ente federativo, neste caso, municipal. Assim, o município deve traçar e orga-
nizar, em documentos orientadores específicos, diretrizes para a segurança, para a
saúde, para o transporte, para a educação, para a habitação, etc., abrangendo todos
os setores de governo que são de sua competência. Não existe uma regra ou norma
técnica para a elaboração de diretrizes, mas, certamente, elas estarão ligadas: (i) ao
que se encontra definido no ordenamento constitucional e legal do país, do estado
e do próprio município; e (ii) aos valores e às crenças do partido político que estiver
no governo. (FLORES E SILVA, 2015a, p. 243).

Livro Coordenação Pedagógica.indb 361 22/10/2018 14:27:56


362 Direito à educação infantil: perspectivas para consolidação no contexto dos 20 anos ...

Fortalecendo a importância deste tópico, trazemos a conceituação de diretrizes


educacionais apresentada pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), apoiada
na Resolução CNE/CEB n.º 02/98: “[...] conjunto de definições doutrinárias sobre
princípios, fundamentos e procedimentos na Educação Básica [...] que orientarão
as escolas brasileiras dos sistemas de ensino, na organização, na articulação, no
desenvolvimento e na avaliação de suas propostas pedagógicas. (BRASIL, PARE-
CER CNE/CEB n.º 7/2010).”
Retomando o princípio constitucional da gestão democrática na escola pública
(CF/88, Art. 206, Inc. VI) já citado, cabe ressaltar que no caso da elaboração de di-
retrizes para uma rede municipal na qual já existem escolas em funcionamento com
uma proposta político-pedagógica, torna-se necessário que a equipe da secretaria
municipal de educação desencadeie um processo de participação ampliada, envol-
vendo escolas e comunidade, de maneira a considerar o conteúdo dos documentos
já existentes como ponto de partida para o estabelecimento das diretrizes para toda
a rede, sem desconsiderar a necessária atualização dessas ideias e materiais iniciais
em termos de legislação vigente e concepções teóricas envolvidas. Flores e Silva
(2015a) reforçam que, devido aos movimentos de escuta e diálogo decorrentes desse
processo, “[...] essa forma de participação poderá gerar maior comprometimento
por parte das equipes escolares com a política a ser implementada localmente”
(FLORES E SILVA, 2015a, p. 244).
Consideramos as conferências municipais de educação como outro espaço
deliberativo importante para o estabelecimento de diretrizes para a política edu-
cacional local.15 Quando realizadas regularmente no âmbito de cada rede, com
ampla participação, essas instâncias podem se constituir em espaços democráticos,
de diálogo, de busca de consensos e também de explicitação de disputas tanto em
relação à concepção de política educacional a ser implementada quanto em termos
de programas, ações e estratégias, que virão a ser implementadas no futuro. Em
qualquer uma destas perspectivas, sai fortalecido o princípio da gestão democrática.
(FLORES E SILVA, 2015a).
No que se refere especificamente à construção de uma proposta político-
-pedagógica ou de um Projeto Político-Pedagógico, cabe ressaltar que a LDBEN
direciona essa incumbência para os estabelecimentos de ensino (Inciso I do Art.
12) e para os docentes (Inciso I do Art. 13). No que se refere aos sistemas de ensino
estaduais ou municipais, a indicação da LDBEN se dá no sentido de que os sistemas
de ensino públicos deverão definir suas normas de gestão democrática na educação
básica “[...], de acordo com as suas peculiaridades [...], tendo como princípios: I –
participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da

15 Como desdobramento da Lei 13.0005/14, o Fórum Nacional de Educação, em nível nacional,


tem a responsabilidade para com a realização das conferências nacionais de educação. Em re-
lação aos municípios este papel se encontraria vinculado ao Fórum Municipal de Educação, de
maneira conjunta com outras instâncias indicadas em lei. (BRASIL, Lei 13.005/14, Art. 6º, § 1º).

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 363

escola; II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou


equivalente.” (BRASIL, Lei n.º 9.394, Art. 14). Essa determinação nos faz resgatar
Cury, quando ele, inclusive, extrapola o princípio da gestão democrática do ensino
público para as demais instituições de um sistema, uma vez que,
A gestão do projeto pedagógico é tarefa coletiva do corpo docente, liderado pelo
gestor responsável, e se volta para a obtenção de um outro princípio constitucional
da educação nacional que é a garantia do padrão de qualidade. Aqui se pode trans-
ladar a noção de gestão democrática também para o conjunto dos estabelecimentos
e não só para as instituições públicas pelo artigo 14 da LDB. A gestão democrática
como princípio da educação nacional, presença obrigatória em instituições escolares
públicas, é a forma dialogal, participativa com que a comunidade educacional se
capacita para levar a termo um projeto pedagógico de qualidade e da qual nasçam
“cidadãos ativos” participantes da sociedade como profissionais compromissados.
(CURY, 2007, p. 489)

Tanto para a elaboração de uma proposta político-pedagógica municipal,


quanto de uma proposta político-pedagógica de uma unidade escolar, constituem-
-se como referência os documentos legais abordados neste artigo em cujas seções
específicas são encontradas orientações fundamentais. Para o caso específico da
educação infantil, retomamos que o Parecer CNE/CEB n.º 20/09 e a Resolução CNE/
CEB n.º 05/09, que estabelecem as DCNEI são as principais fontes, complementa-
das pelos documentos orientadores do MEC. A Resolução CNE/CEB n.º 04/2010,
que estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica,
também deve ser considerada, haja vista a articulação entre essas duas primeiras
etapas educacionais e considerando-se que em certos contextos a oferta de educação
infantil ocorre também em escolas com oferta de ensino fundamental.
Para além dessa realidade, não podemos desconsiderar a necessária articu-
lação entre as diferentes redes, órgãos e instituições de um sistema de ensino, pois
as crianças podem circular por diferentes unidades educacionais ao longo de sua
trajetória escolar, sendo necessário prever a adequada articulação entre a educação
infantil e o ensino fundamental, para que essa formação se dê em um continuum
que garanta sucesso à aprendizagem das crianças.16
Como afirmam Flores e Silva (2015b): “As especificidades de cada uma dessas
etapas, bem como aqueles aspectos compartilhados por ambas, algumas vezes, são
desconsiderados tanto nos processos de formulação de legislações quanto na pro-
posição de programas e projetos educacionais” (FLORES E SILVA, 2015b, p. 194).

16 No ano de 2017, no estado do Rio Grande do Sul, a rede pública estadual mantém oferta própria
em algumas escolas, além da existência de convênios de ajuste de vagas, a partir dos quais salas
disponíveis da rede estadual são cedidas para oferta de turmas de pré-escola pelos municípios.
Essa alternativa também está prevista na CF/88, como forma de colaboração entre estados e
municípios, visando assegurar a universalização da educação escolar obrigatória (CF/88, Art.
211, § 4º).

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364 Direito à educação infantil: perspectivas para consolidação no contexto dos 20 anos ...

Em nosso entendimento, os departamentos pedagógicos das secretarias de educação


e a coordenação pedagógica das unidades escolares possuem papel fundamental
quando se trata da implementação e desdobramento das políticas educacionais
no espaço das instituições, no sentido de garantir um diálogo permanente com o
coletivo de docentes e demais profissionais da educação, na busca do atendimento
às demandas da comunidade escolar.
Ao refletir sobre a função do Coordenador/a Pedagógico no que tange à imple-
mentação de ações visando efetivar as políticas públicas voltadas à educação básica,
em uma pesquisa que abarcou dez anos, Placco, Souza e Almeida (2012) enfatizam
a importância de um rol de atribuições que costumam ser desenvolvidas por esses/
essas profissionais, todas fundamentais no alcance da qualidade educacional:
As atribuições desses profissionais, definidas nas legislações estaduais e/ou muni-
cipais, são muitas, envolvendo desde a liderança do projeto político pedagógico até
funções administrativas de assessoramento da direção, mas, sobretudo, atividades
relativas ao funcionamento pedagógico da escola e de apoio aos professores [...]
(PLACCO, SOUZA E ALMEIDA, 2012, p. 761)

Assim, neste momento histórico de pensar a ampliação da oferta de pré-escola


obrigatória no âmbito das diversas unidades educativas, também será tarefa des-
ses/as profissionais buscar condições e estratégias para que a instituição que antes
oferecia exclusivamente ensino fundamental e/ou ensino médio, atenda, em igual
medida, a tudo aquilo que se encontra disposto como norma para uma escola de
educação infantil, pois as crianças entre quatro e seis anos constituem o público-
-alvo de uma subetapa desta etapa e, sendo assim, estas instituições precisam
considerar as especificidades dos modos de ser, de agir e de pensar das crianças
no seu planejamento curricular. Uma questão central para a educação escolar é a
organização dos espaços e tempos voltados às oportunidades de aprendizagem, o
que inclui pensar tanto no currículo formal, quanto naquele não explícito, bem
como prever a organização de atividades dentro das salas de cada turma, fora destas
e ainda fora dos muros da escola, concebendo o currículo em uma visão ampliada,
como o conjunto das experiências oferecidas, reconhecendo que diferentes espaços
podem promover diferentes aprendizagens. Em consequência das características
físicas, emocionais e cognitivas das crianças, as oportunidades de interação a serem
oferecidas devem contemplar as diferentes linguagens: plástica, musical, dramática,
literária, gestual, verbal, escrita, dentre outras, sendo o currículo concebido de
acordo com as atuais Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
(DCNEI) como,
[...] um conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os saberes das
crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico,
ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o desenvolvimento integral
das crianças de 0 a 5 anos. (BRASIL, CNE/CEB, Res. 05/09, Art. 3º).

Livro Coordenação Pedagógica.indb 364 22/10/2018 14:27:56


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 365

Finalizando essa seção, queremos enfatizar a importância dos conselhos


municipais de educação (CME), órgãos integrantes dos sistemas de ensino, pelo
papel que assumem em relação à criação de normas educacionais, além das demais
responsabilidades para com o credenciamento das mantenedoras, autorização de
funcionamento, supervisão e fiscalização dos estabelecimentos escolares, além
de funções consultivas, conforme determinado na lei específica de criação destes
órgãos. Dada a relevância do papel deste conselho na integração de instituições
educacionais aos sistemas, Cury (2006) afirma que: “o zelo pela qualidade do en-
sino a ser ofertado por instituições públicas e privadas evidencia que tal serviço
público deve ser avaliado desde seu processo de autorização”. (CURY, 2006, p. 50).
Nesse sentido, concordamos com Batista (2013), quando ela resgata estudos
sobre a criação e o papel dos CMEs, ao afirmar que um conselheiro/a, ao atuar em
nome do “bem comum”, pode ser visto como um agente do Estado e não de governo,
pois que sua atuação deve-se pautar por princípios que vão além dos interesses de
governos, entidades ou grupos. Santos, resgatando a origem e o papel social desses
órgãos, se apoia em material formador do Pró-Conselho (2007)17, ao afirmar que
os CMEs devem se pautar nos direitos sociais assegurados na Constituição Federal
de 1988, dentre os quais, o direito a um ensino de qualidade para todos, sendo sua
criação, em 1971, considerada um marco relevante no que se refere à autonomia
da gestão pública, abrindo, assim, “[...] espaço para a participação e mobilização da
sociedade na construção de contextos do ensino municipal”. (SANTOS, 2016, p. 45)
Apesar de não ser objeto específico deste texto, trouxemos aqui brevemente
algumas questões sobre a atuação dos conselhos de educação, indicando referências
para aprofundamento, por entender que a gestão das políticas educacionais deve se
efetivar dentro de uma abordagem dialógica entre as diferentes instâncias envolvi-
das, dada à complexidade inerente à mesma. Desta forma, finalizando esta seção
e a partir daquilo que foi possível desenvolver no escopo deste artigo, buscamos
afirmar a importância de diferentes instâncias, órgãos e sujeitos, bem como a ne-
cessária interdependência entre todos os envolvidos para que possamos consolidar
no plano da prática o direito à educação infantil já reconhecido no plano legal.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Com o resgate dos documentos legais aqui apresentados, visamos colaborar


para ações de planejamento e gestão da oferta de educação infantil no âmbito,
especialmente, dos sistemas municipais de ensino. Tivemos como suposto para
desenvolver essa escrita que as crianças são cidadãs desde o seu nascimento na

17 Trata-se do Guia de Consulta do Programa Nacional de Capacitação de Conselheiros Munici-


pais de Educação - Pró-Conselho (BRASIL, SEB/MEC, 2004), Disponível em: http://portal.mec.
gov.br/seb/arquivos/pdf/Pro_cons/guia_consulta.pdf Acesso em: 31/10/17.

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366 Direito à educação infantil: perspectivas para consolidação no contexto dos 20 anos ...

medida em que lhes é dado acesso a direitos sociais fundamentais; dentre esses,
a educação. A trajetória de consolidação desta etapa que aqui sintetizamos nos
apresenta hoje uma ideia de criança potente, produtora de cultura e sujeito de
processos de apropriação de conhecimentos, desde que a ela sejam dadas as devidas
oportunidades para tal. Em nosso entendimento, a oferta de educação infantil de
qualidade é um dos elementos fundamentais nessa construção, havendo ainda um
longo caminho a seguir em prol deste objetivo e sendo essa uma tarefa de todos:
Pensamos que é importante o comprometimento da sociedade brasileira na garantia
dos direitos das crianças de serem cuidadas e educadas com padrões de qualidade
garantidos em leis, normas e pareceres para a creche e a pré-escola. Foram anos de
militância de diversas frentes da sociedade que colocaram a infância e as crianças no
centro de uma política de garantia de direitos. (SANTOS E FLORES, 2017, p. 268)

Com certeza, parte significativa da tarefa está realizada, pois devidamente


afirmada em institutos legais, ainda que seja preciso, hoje e sempre, reafirmar com
convicção o espaço conquistado. Contudo, Bordignon (2014) nos alerta para o risco
de planos que não saem do papel; portanto, buscamos nesse texto destacar o papel
dos responsáveis pela administração dos sistemas de ensino, aos quais cabem a pro-
posição e a implementação de políticas condizentes com as leis e normas vigentes;
a incumbência dos conselhos de educação, aos quais cabe a normatização da oferta
no âmbito de seus sistemas, o reconhecimento das instituições educacionais e a
devida supervisão e fiscalização. Para além dessas instâncias, dada a importância
da educação infantil em um projeto educacional de nação, cabe, sim, a toda a so-
ciedade a responsabilidade para com o controle social da sua oferta com o objetivo
de monitorar a efetivação do direito.

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volvimento do ensino de que trata o art. 212 da Constituição Federal, dá nova redação aos incisos I
e VII do art. 208, de forma a prever a obrigatoriedade do ensino de quatro a dezessete anos e ampliar
a abrangência dos programas suplementares para todas as etapas da educação básica, e dá nova re-
dação ao § 4º do art. 211 e ao § 3º do art. 212 e ao caput do art. 214, com a inserção neste dispositivo
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Livro Coordenação Pedagógica.indb 370 22/10/2018 14:27:56
Políticas de inclusão escolar 2 6
das pessoas com deficiência
e a gestão escolar: desafios
da escola contemporânea

Adriana da Silva Thoma


Graciele Marjana Kraemer

INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, o direito de todos à educação tem sido um dos pontos
mais debatidos na agenda das políticas educacionais de nosso país. O Brasil, desde
meados da década de 1990, mas com um acento muito forte na primeira década do
século XXI, vivencia um movimento gradual de importantes reconfigurações para
que todos os sujeitos tenham garantido e efetivado o seu direito à escolarização.
Nesse processo, além de um movimento que objetiva efetivar condições que aten-
dam a todos no espaço da escola comum, passamos de uma ênfase na administração
para a gestão educacional (KLAUS, 2011). Essa mudança de ênfase situa-se em um
modelo de gestão democrática que convoca todos à participação e está alinhada a
uma racionalidade de mercado, buscando promover um espaço educacional que
constitua formas de vida adequadas a uma lógica empreendedora.
Diante dos deslocamentos políticos que o país tem vivido para colocar em
funcionamento a educação inclusiva, como questão norteadora da discussão que
aqui apresentamos temos a gestão escolar e os desafios para a efetivação da política
de inclusão escolar das pessoas com deficiência. Para desenvolver essa discussão,
elegemos como corpus de análise os seguintes documentos: Política Nacional de
Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (2008), que trata da in-
clusão de alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação na escola regular; Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de
2009, que promulga a Convenção Internacional sobre os direitos das pessoas com
deficiência e seu protocolo facultativo, assinados em Nova York em 30 de março de
2007; Resolução CNE/CEB nº 4, de 2 de outubro de 2009, que institui as diretrizes
operacionais para o atendimento educacional especializado (AEE) na Educação
Básica, modalidade Educação Especial; Decreto nº 7.611, de 17 de novembro de

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372 Políticas de inclusão escolar das pessoas com deficiência e a gestão escolar

2011, que dispõe sobre a educação especial e o atendimento educacional especia-


lizado e dá outras providências; e Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, que institui
a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com
Deficiência). Esses, entre outros documentos, orientam a operacionalização de prá-
ticas e ações específicas voltadas para a inclusão desses alunos no espaço da escola
comum brasileira, fundamentando estrategicamente o enfoque da gestão escolar.
Para a análise proposta, utilizamos as noções de discurso e de governamen-
to, desenvolvidas por Michel Foucault (2008), e a de discriminação negativa, de
Robert Castel (2011). Destacamos que, indo além de uma posição favorável ou
contrária à inclusão escolar das pessoas com deficiência, optamos por uma postura
problematizadora. Com Lopes e Fabris, entendemos que, nessa postura, a inclusão
é considerada “como uma invenção de um tempo moderno e que ganha o maior
destaque na contemporaneidade devido, entre outros aspectos, às desigualdades
acentuadas entre os sujeitos, suas formas de vida e condições econômicas, culturais,
sociais, religiosas, individuais, etc.” (2013, p. 14). Sob o viés da problematização,
encontramos uma possibilidade produtiva de tensionamento e de reflexão crítica
acerca da forma pela qual as políticas educacionais vêm instituindo modos de
vida e regulando formas de participação das pessoas com deficiência no contexto
educacional, social e econômico da sociedade brasileira.
A partir dos investimentos e das ações empreendidas pelo Estado brasileiro,
a inclusão escolar das pessoas com deficiência no agenciamento de determinadas
práticas que objetivam atingir a todos tem desenvolvido estratégias de seguridade
social e de condução das condutas de acordo com uma racionalidade que estabe-
lece a necessidade de potencialização da vida. Assim, a inclusão escolar pode ser
compreendida como “um dispositivo de segurança que age sobre a população, a fim
de alimentar a economia do país, aumentar os índices educacionais e, consequen-
temente, diminuir o risco social” (RECH, 2013, p. 40). Em um contexto global em
que se desenvolve uma forma de governo da vida da população de forma menos
reguladora, mas mais eficiente, principalmente em termos econômicos e políticos,
a racionalidade em que se inscrevem as políticas educacionais contemporâneas
enfatiza a constituição de subjetividades que se organizem a partir de “valores
como a autonomia, a flexibilização, a iniciativa e a motivação, a superação e a res-
ponsabilidade individuais; em síntese, certa ‘ética empreendedora.’” (SIBILIA, 2012,
p. 126). Com isso, tanto a organização do espaço, dos tempos e da estruturação
didático-metodológica da escola quanto as questões que imprimem uma adequada
gestão educacional passam a ser repensadas e reconfiguradas.
Demarcadas as balizas que sustentam nossa análise, organizamos o texto em
duas seções. Na primeira, abordaremos e discutiremos a política de inclusão es-
colar por meio das políticas e ações que buscam efetivar um processo educacional
inclusivo. Na segunda, nosso direcionamento analítico voltar-se-á à articulação

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 373

entre a inclusão escolar e a gestão escolar, buscando enfatizar os desafios para a


educação de todos.

A INCLUSÃO ESCOLAR DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NAS


POLÍTICAS EDUCACIONAIS BRASILEIRAS DAS ÚLTIMAS DÉCADAS

No contexto educacional brasileiro, desde a primeira década do século XXI,


vivenciamos uma importante inflexão política e educacional em prol da inclusão
escolar das pessoas com deficiência. O movimento de inclusão escolar resulta de
uma série de condições, dentre elas, em âmbito internacional, a Conferência Mun-
dial sobre Educação para Todos em 1990, que aprovou a Declaração Mundial de
Educação para Todos; a Conferência Mundial sobre Educação Especial em 1994, que
aprovou a Declaração de Salamanca; e a promulgação, em 30 de março de 2007, da
Convenção sobre os Direitos das pessoas com Deficiência em Nova York. Entretanto, a
presente Convenção apenas foi promulgada no território brasileiro em 25 de agosto
de 2009, pelo Decreto nº 6.949. Como um dos reflexos políticos da Convenção, o
país instituiu a Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da educação
inclusiva (2008), que objetiva “assegurar a inclusão escolar de alunos com defici-
ência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação”
(BRASIL, 2008, p, 14). Essa Política demarca que a educação inclusiva constitui
um “paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos”
(BRASIL, 2008, p. 5). Nesse sentido, a educação inclusiva adotada no contexto
educacional brasileiro “conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis,
e avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias
históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola”. (BRASIL, 2008, p. 5)
No documento que institui a Política de educação inclusiva (2008), os sujeitos
previstos como público da educação especial são assim categorizados: alunos com
deficiência são “aqueles que têm impedimentos de longo prazo de natureza física,
intelectual, mental ou sensorial” (BRASIL, 2009, p. 1), dentre os quais se incluem
deficientes intelectuais, deficientes visuais/cegos, deficientes auditivos/surdos, de-
ficientes físicos e surdo cegos; alunos com transtornos globais do desenvolvimento:
aqueles que apresentam um quadro de alterações no desenvolvimento neuropsico-
motor, comprometimento nas relações sociais e na comunicação ou estereotipias
motoras. Incluem-se nessa definição “alunos com autismo clássico, síndrome de
Asperger, síndrome de Rett, transtorno desintegrativo da infância (psicoses) e
transtornos invasivos sem outra especificação” (BRASIL, 2009, p. 1); alunos com
altas habilidades/superdotação: “aqueles que apresentam um potencial elevado e
grande envolvimento com as áreas do conhecimento humano, isoladas ou combi-
nadas: intelectual, liderança, psicomotora, artes e criatividade” (BRASIL, 2009, p. 1).

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374 Políticas de inclusão escolar das pessoas com deficiência e a gestão escolar

Em vista das peculiaridades que caracterizam os sujeitos previstos como


público da educação especial a partir de um viés político de educação inclusiva,
para que a potencialidade de cada sujeito possa ser desenvolvida, o Estado tem
operacionalizado ações que objetivam organizar adequações arquitetônicas e de
comunicação, entre outras, para efetivar a todos o “acesso ao ensino regular, com
participação, aprendizagem e continuidade nos níveis mais elevados do ensino”
(BRASIL, 2008, p. 14). Nessa inflexão política, a educação especial deixa de ser
compreendida como uma modalidade paralela à educação básica e passa a per-
passar todo o processo educacional, que se estende desde a educação infantil até a
educação superior, constituindo, assim, a proposta pedagógica da escola. Portanto,
fica estabelecido que “a educação especial atua de forma articulada com o ensino
comum, orientando para o atendimento às necessidades educacionais especiais
desses alunos”. (BRASIL, 2008, p. 15)
Ao ser instituído o direito das pessoas com deficiência à educação no espaço
da escola regular, demanda-se ao Estado brasileiro a efetivação da promoção de
um “sistema educacional inclusivo em todos os níveis, bem como o aprendizado ao
longo de toda a vida” (ONU, 2007, Art. 24). Para isso, determina-se que o espaço
educacional deve estar organizado com vistas a promover “o pleno desenvolvimento
do potencial humano e do senso de dignidade e autoestima, além do fortalecimento
do respeito pelos direitos humanos, pelas liberdades fundamentais e pela diversi-
dade humana”. (ONU, 2007, Art. 24, Inciso I)
Em sintonia com a racionalidade neoliberal em curso no Brasil desde os anos
de 1990, em que todos devem ter alargadas as condições para desenvolver e ampliar
suas capacidades individuais, salienta-se que devem ser garantidas condições de
acesso, participação, desenvolvimento e aprendizagem aos sujeitos com deficiência
por meio de práticas que invistam no desenvolvimento de suas habilidades e com-
petências. Com isso, demanda-se que a escola inclusiva promova possibilidades
para “o máximo desenvolvimento possível da personalidade e dos talentos e da
criatividade das pessoas com deficiência, assim como de suas habilidades físicas e
intelectuais” (ONU, 2007, Art. 24, Inciso I). Desse modo, o movimento de inclu-
são escolar das pessoas com deficiência tem se constituído como uma importante
estratégia biopolítica que fomenta ações além do acesso e da participação de todos.
Na base da política de inclusão, a ordem discursiva que rege os investimentos
educacionais tem centralizado seu enfoque em uma política de potencialização da
vida a partir da promoção de condições produtivas para a aprendizagem de todos
e, principalmente, para o desenvolvimento das habilidades e competências indivi-
duais. O foco das práticas educacionais inclusivas desloca o olhar da deficiência e/
ou incapacidade para as potencialidades de cada sujeito, e os investimentos passam
a fortalecer a necessidade de espaços adequados, metodologias específicas e profis-
sionais capacitados a desenvolver um ensino pautado nas demandas e necessidades

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 375

de cada aluno. No quadro a seguir, apresentamos alguns documentos legais voltados


à inclusão escolar das pessoas com deficiência no Brasil:

Quadro 1: Legislação Nacional que assegura a inclusão


das pessoas com deficiência na escola regular

DOCUMENTO SOBRE O QUE DISPÕE


Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e
Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990
dá outras providências.
Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras
Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001
providências.
Institui Diretrizes Nacionais para a Educação Especial
Resolução CNE/CEB nº 2, de 11 de setembro de 2001
na Educação Básica.
Trata da inclusão de alunos com deficiência,
Política Nacional de Educação Especial na perspectiva
transtornos globais do desenvolvimento e altas
da educação inclusiva (2008)
habilidades/superdotação na escola regular.
Dispõe sobre a educação especial e o atendimento
Decreto nº 7.611, de 17 de novembro de 2011
educacional especializado e dá outras providências.
Aprova o Plano Nacional de Educação (PNE) e dá
Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014
outras providências.
Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com
Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015
Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência).

Fonte: elaborado pelas autoras a partir da legislação educacional brasileira.

Ao compreendermos que, na lógica de um processo educacional inclusivo, a


educação especial se constitui em uma modalidade de ensino que “realiza o aten-
dimento educacional especializado, disponibiliza os serviços e recursos próprios
desse atendimento e orienta os alunos e seus professores quanto a sua utilização nas
turmas comuns do ensino regular” (2008, p. 16), posicionamos o AEE como um
serviço voltado ao desenvolvimento de habilidades e competências do estudante
com deficiência, Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD) e altas habili-
dades/superdotação. O atendimento educacional especializado “identifica, elabora
e organiza recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras
para a plena participação dos alunos, considerando as suas necessidades especí-
ficas” (BRASIL, 2008, p. 16). Assim, a Sala de Recursos Multifuncionais, espaço
de desenvolvimento do AEE, constitui-se em um local onde são disponibilizados
recursos, serviços e orientações quanto à utilização dos recursos no processo de
ensino-aprendizagem nas turmas comuns do ensino regular.
Para que a inclusão escolar das pessoas com deficiência se constitua em uma
prática que possa promover gradativamente o desenvolvimento do aluno, é condição
preliminar a articulação entre o professor da sala de aula e o professor responsável
pela Sala de Recursos Multifuncionais, onde se desenvolve o atendimento educa-

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376 Políticas de inclusão escolar das pessoas com deficiência e a gestão escolar

cional especializado. Essa articulação possibilita que os objetivos previstos para o


AEE sejam desenvolvidos tanto no espaço da sala de aula regular, quanto na Sala
de Recursos Multifuncionais. Dentre os objetivos previstos na política de educação
inclusiva para o AEE estão:
I – prover condições de acesso, participação e aprendizagem no ensino regular e
garantir serviços de apoio especializados de acordo com as necessidades individuais
dos estudantes; II – garantir a transversalidade das ações da educação especial no
ensino regular; III – fomentar o desenvolvimento de recursos didáticos e pedagógicos
que eliminem as barreiras no processo de ensino e aprendizagem; e IV – assegurar
condições para a continuidade de estudos nos demais níveis, etapas e modalidades
de ensino. (BRASIL, 2011, Art. 3º)

A partir desses objetivos, os profissionais da educação – o professor da sala


de aula regular e o professor do atendimento educacional especializado – devem
estabelecer estratégias pedagógicas, compreendendo que as atividades desenvolvi-
das no AEE são diferentes “daquelas realizadas na sala de aula comum, não sendo
substitutivas à escolarização. Esse atendimento complementa e/ou suplementa a
formação dos alunos com vistas à autonomia e independência na escola e fora dela”
(2008, p. 16). Portanto, no espaço da sala de aula, as ações desenvolvidas pelo pro-
fessor centram-se em promover o desenvolvimento do aluno a partir de estratégias
e materiais específicos, com o objetivo de garantir que ele possa compreender os
conhecimentos desenvolvidos. Já no AEE, prevê-se que o profissional desenvolva
sua atuação com vistas a disponibilizar “programas de enriquecimento curricular,
o ensino de linguagens e códigos específicos de comunicação e sinalização, ajudas
técnicas e tecnologia assistiva, dentre outros. Ao longo de todo processo de esco-
larização, esse atendimento deve estar articulado com a proposta pedagógica do
ensino comum” (2008, p. 16).
Nas práticas que objetivam a inclusão escolar das pessoas com deficiência,
o planejamento e sua devida efetivação são realizados em parceria entre a gestão
da escola, o professor de sala de aula comum e o professor especialista do AEE.
Nessa parceria, compreende-se que o profissional de atendimento educacional
especializado é aquele que articulará estratégias para complementar e/ou suple-
mentar a aprendizagem dos estudantes a partir de recursos, metodologias e práticas
que potencializem a participação de todos com autonomia e independência. São,
portanto, as intervenções específicas que condicionam formas de participação.
Pode-se inferir que, além de promover condições de desenvolvimento individual,
o atendimento educacional especializado se configura em uma temporalidade e
uma espacialidade voltada para o gerenciamento do risco da não-aprendizagem,
da não-participação e da incapacidade de autonomia.
O Estado prevê que, em todas as etapas e modalidades da educação básica, o
atendimento educacional especializado deve ser “organizado para apoiar o desen-

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 377

volvimento dos alunos, constituindo oferta obrigatória dos sistemas de ensino, e


deve ser realizado no turno inverso ao da classe comum, na própria escola ou centro
especializado que realize esse serviço educacional” (BRASIL, 2008, p. 16). Cabe
destacar que o profissional que atua na educação especial “deve ter como base da
sua formação, inicial e continuada, conhecimentos gerais para o exercício da do-
cência e conhecimentos específicos da área” (BRASIL, 2008, p. 18). Compreende-se
que, em sua formação, o profissional do AEE “deve aprofundar o caráter interati-
vo e interdisciplinar da atuação nas salas comuns do ensino regular, nas salas de
recursos, nos centros de atendimento educacional especializado, nos núcleos de
acessibilidade das instituições de educação superior, nas classes hospitalares e nos
ambientes domiciliares, para a oferta dos serviços e recursos de educação especial”
(BRASIL, 2008, p. 18-19).
Na esteira de uma política educacional que prevê a inclusão escolar de todas
as crianças em idade escolar obrigatória – hoje dos quatro aos 17 anos –, cabe aos
sistemas de ensino, ao organizarem a educação especial na perspectiva da educação
inclusiva, “disponibilizar as funções de instrutor, tradutor/intérprete de Libras e
guia intérprete, bem como de monitor ou cuidador aos alunos com necessidade de
apoio nas atividades de higiene, alimentação, locomoção, entre outras que exijam
auxílio constante no cotidiano escolar” (BRASIL, 2008, p. 18).
Em 2013, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/
PR) e a Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência
(SNPD) lançaram o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência: Viver
sem Limite, que objetiva o acesso à educação, inclusão social, atenção à saúde e
acessibilidade por meio da articulação de políticas governamentais. Conforme es-
tabelecido pela Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, a acessibilidade compreende a:
possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de
espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação
e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços
e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto
na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade
reduzida. (BRASIL, 2015, Art.3º, Inciso I).

No que diz respeito à acessibilidade para todos, o Decreto nº 5.296, de 2 de


dezembro de 2004, fixa normas de acessibilidade a serem observadas pelas escolas,
inclusive privadas:
Os estabelecimentos de ensino de qualquer nível, etapa ou modalidade, públicos ou
privados, proporcionarão condições de acesso e utilização de todos os seus ambien-
tes ou compartimentos para pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade
reduzida, inclusive salas de aula, bibliotecas, auditórios, ginásios e instalações des-
portivas, laboratórios, áreas de lazer e sanitários. (BRASIL, 2004, Art. 24)

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378 Políticas de inclusão escolar das pessoas com deficiência e a gestão escolar

A partir da política de inclusão escolar, diferentes Programas passaram a ser


desenvolvidos com vistas à inclusão das pessoas com deficiência no espaço da escola
regular. Dentre esses Programas e ações, destacamos os seguintes:

Quadro 2: Programas e Projetos para a efetivação da inclusão escolar

PROGRAMA ESCOLA ACESSÍVEL

Promover a acessibilidade e inclusão de alunos com deficiência, transtornos


globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação matriculados em
Objetivo Geral: classes comuns do ensino regular, assegurando-lhes o direito de compartilharem
os espaços comuns de aprendizagem, por meio da acessibilidade ao ambiente
físico, aos recursos didáticos e pedagógicos e às comunicações e informações.

Adequar arquitetônica ou estruturalmente os espaços físicos reservados à


instalação e funcionamento de salas de recursos multifuncionais, a fim de
atender aos requisitos de acessibilidade;
Objetivos Específicos: Adequar sanitários, alargar portas e vias de acesso, construir rampas, instalar
corrimão e colocar sinalização tátil e visual;
Adquirir mobiliário acessível, cadeiras de rodas, material desportivo acessível e
outros recursos de tecnologia assistiva.

TRANSPORTE ESCOLAR ACESSÍVEL

A fim de promover a inclusão escolar por meio da garantia das condições de


acesso e permanência na escola, a partir de 2012, a SECADI implementará
ações de apoio à disponibilização de transporte escolar acessível, com base na
Objetivo Geral:
Pesquisa Domiciliar para identificação das barreiras que impedem o acesso e
permanência na escola dos beneficiários do BPC, realizada no período de 2009
a 2010.

PROGRAMA DE IMPLANTAÇÃO DE SALAS DE RECURSOS MULTIFUNCIONAIS


Apoiar a organização e a oferta do Atendimento Educacional Especializado
– AEE, prestado de forma complementar ou suplementar aos estudantes
Objetivo Geral: com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento, altas habilidades/
superdotação matriculados em classes comuns do ensino regular, assegurando-
lhes condições de acesso, participação e aprendizagem.

Apoiar a organização da educação especial na perspectiva da educação inclusiva;


Assegurar o pleno acesso dos alunos público alvo da educação especial no
ensino regular em igualdade de condições com os demais alunos;
Objetivos Específicos: Disponibilizar recursos pedagógicos e de acessibilidade às escolas regulares da
rede pública de ensino;
Promover o desenvolvimento profissional e a participação da comunidade
escolar.

PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES EM EDUCAÇÃO ESPECIAL

Órgão: Secretaria de Educação Especial – SEESP

Apoiar a formação continuada de professores para atuar nas salas de recursos


Objetivo Geral: multifuncionais e em classes comuns do ensino regular, em parceria com
Instituições Públicas de Educação Superior – IPES.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 379

PROGRAMA DE ACOMPANHAMENTO E MONITORAMENTO DO ACESSO E PERMANÊNCIA NA ESCOLA DAS


PESSOAS COM DEFICIÊNCIA BENEFICIÁRIAS DO BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA DA ASSISTÊNCIA
SOCIAL – PROGRAMA BPC NA ESCOLA

Monitorar o acesso e permanência na escola dos Beneficiários do Benefício da


Prestação Continuada – BPC com deficiência, na faixa etária de 0 a 18 anos, por
Objetivo Geral:
meio de ações articuladas entre as áreas da educação, assistência social, direitos
humanos e saúde.

O Programa BPC NA ESCOLA tem quatro eixos principais:


identificar entre os beneficiários do BPC até 18 anos aqueles que estão na Escola
e aqueles que estão fora da Escola;
identificar as principais barreiras para o acesso e permanência na Escola das
Objetivos Específicos: pessoas com deficiência beneficiárias do BPC;
realizar estudos e desenvolver estratégias conjuntas para superação destas
barreiras;
realizar acompanhamento sistemático das ações e programas dos entes
federados que aderirem ao Programa.

PROGRAMA INCLUIR – ACESSIBILIDADE À EDUCAÇÃO SUPERIOR

 Promover a inclusão de estudantes com deficiência na educação superior,


Objetivo Geral: garantindo condições de acessibilidade nas Instituições Federais de Educação
Superior.

PROGRAMA EDUCAÇÃO INCLUSIVA – DIREITO À DIVERSIDADE

Disseminar a política de construção de sistemas educacionais inclusivos e apoiar


Objetivo Geral: o processo de implementação e consolidação do Programa Educação Inclusiva:
Direito à Diversidade nos municípios brasileiros.

Sensibilizar e envolver a sociedade e a comunidade escolar em particular na


efetivação da política de educação inclusiva;
Objetivos Específicos:
Formar gestores e educadores para atuar na transformação dos sistemas
educacionais em sistemas educacionais inclusivos.

Fonte: Elaborado pelas autoras a partir dos materiais de análise.

Analisando a legislação que fundamenta a política de inclusão escolar,


observamos a instituição de práticas que objetivam fomentar a participação, a
aprendizagem, o desenvolvimento das competências e a autonomia, ou seja, o
desenvolvimento de um modo de vida autogovernável. Nesse viés, é relevante
que as condutas das pessoas com deficiência sejam conduzidas na esteira de uma
sociedade de aprendizagem, pois, “através da aprendizagem, a humanidade pode
ser considerada como hábil para enfrentar os desafios dentro de um ambiente”
(SIMONS; MASSCHELEIN, 2015, p. 342).
Em uma racionalidade inclusiva, a organização do espaço e do tempo da
aprendizagem preconiza o deslocamento de uma temporalidade que se organi-
za a partir da lógica da escola moderna, na qual todos aprendem determinados
conteúdos em determinados níveis, para a organização de práticas que investem
na potencialização dos talentos individuais. Nesses moldes, cada aluno é conside-

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380 Políticas de inclusão escolar das pessoas com deficiência e a gestão escolar

rado diferente e tem suas especificidades, seu tempo e espaço de aprendizagem.


Isso está de acordo com a configuração espaço-temporal de uma sociedade que se
encaminha para processos de individualização das questões sociais, pelos quais as
experiências de cada um requerem mecanismos e estratégias que vão além da lógica
do aluno médio. Frente a isso, as estratégias pedagógicas mobilizadas pela escola
inclusiva voltada às diferenças dos alunos instituem-se pela necessidade de efetivar
um processo educativo que esteja atento à participação e ao desenvolvimento das
habilidades e competências de todos, considerando as condições e necessidades
individuais.
Como possibilidade de investimento nas condições de participação do aluno
com deficiência, a acessibilidade constitui-se como uma estratégia potente não
apenas para que o aluno possa participar, mas também para que ocorra seu desen-
volvimento individual. Com vistas a efetivar a acessibilidade em todo o processo
de formação do sujeito, torna-se necessário que seja observado o “planejamento
de estudo de caso, de elaboração de plano de atendimento educacional especiali-
zado, de organização de recursos e serviços de acessibilidade e de disponibilização
e usabilidade pedagógica de recursos de tecnologia assistiva” (BRASIL, 2015, Art.
28, Inciso VII).
A inclusão tem, assim, nestes últimos anos, contribuído para a capilarização
de práticas pedagógicas voltadas ao desenvolvimento da singularidade dos sujeitos,
pois é mundialmente reconhecido que:
A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados sistema edu-
cacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a vida, de
forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades
físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses e
necessidades de aprendizagem. (BRASIL, 2015, Art. 27)

Para que o sujeito possa desenvolver-se e ampliar seu escopo de participação,


desenvolvimento e aprendizagem, o Estado, mediante políticas educacionais com
foco na inclusão de todos, tem atuado no desenvolvimento de ações que fomentem
e promovam a potencialização das competências individuais. Para isso, é importante
que sejam feitos investimentos que abarquem, dentre outros aspectos:
Aprimoramento dos sistemas educacionais, visando a garantir condições de acesso,
permanência, participação e aprendizagem, por meio da oferta de serviços e de
recursos de acessibilidade que eliminem as barreiras e promovam a inclusão plena;
Adoção de medidas individualizadas e coletivas em ambientes que maximizem o
desenvolvimento acadêmico e social dos estudantes com deficiência, favorecendo o
acesso, a permanência, a participação e a aprendizagem em instituições de ensino.
(BRASIL, 2015, Art. 28)

É por meio da articulação entre serviços de apoio, recursos e tecnologias – via


atendimento educacional especializado – e de promoção da acessibilidade que a

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 381

inclusão escolar de pessoas com deficiência tem se potencializado nas últimas três
décadas. Nessa articulação, a inclusão deixa de ter um enfoque exclusivo no acesso
e passa a investir amplamente em condições de permanência, de participação e de
aprendizagem, considerando que esse é o sentido global de uma educação de qua-
lidade voltada para todos. Ao serem efetivadas muitas das necessidades de acesso,
o processo educacional inclusivo passa a enfatizar a relevância de investimentos
no desenvolvimento das singularidades. Para tal, a aprendizagem edifica-se como
pilar marcante nesta segunda década de nosso século.
Na seção que segue, voltaremos nossa análise e discussão para as questões
que tangem à gestão educacional e à inclusão escolar de alunos com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, en-
fatizando alguns desafios implicados em uma educação para todos.

INCLUSÃO ESCOLAR E A GESTÃO: DESAFIOS


PARA A EDUCAÇÃO DE TODOS

No marco referencial da educação inclusiva, para que todos possam ter ga-
rantidas as condições necessárias à educação de qualidade, a equipe gestora dos
espaços escolares tem sido convocada a articular todos os segmentos da escola no
desenvolvimento de práticas que possibilitem adequar metodologias, planejamentos
estratégicos e organização arquitetônica, dentre outras. Dentre as diversificadas
práticas, a gestão compartilhada de responsabilidades apresenta-se como um dos
caminhos promissores para a inclusão escolar. Na lógica da gestão compartilhada,
todos – professores, alunos, famílias, funcionários e comunidade escolar – têm sido
convocados a colaborar no processo educacional, mantendo-se a referência de uma
equipe aberta e descentralizadora de decisões. Conforme a pesquisa desenvolvida
por Klaus, “na atualidade, acredita-se que o desenvolvimento, a inovação e as mu-
danças sociais poderão ser alcançadas através de uma gestão que envolve um alto
grau de flexibilidade: autogestão, gestão compartilhada, gestão de pessoas, gestão
de negócios” (2011, p. 108).
Nessa racionalidade, para que cada sujeito possa desenvolver seus talentos e
habilidades o máximo possível a partir de suas características e necessidades, são
feitos investimentos em processos que englobam o aprendizado ao longo de toda
a vida, a partir da oferta de um sistema educacional inclusivo em todos os níveis e
modalidades (BRASIL, 2015). Nesse sentido, as atuais políticas educacionais vêm
orientando a “articulação intersetorial na implementação de políticas públicas”
(BRASIL, 2015, Art. 28, Inciso XVIII). Na lógica de uma proposta educacional
que abarque o desenvolvimento de todos os sujeitos matriculados na escola, a
mobilização e a organização de um grupo de trabalho disposto de forma coopera-
tiva e eficiente preconizam uma direção “dinâmica, comprometida e motivadora

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382 Políticas de inclusão escolar das pessoas com deficiência e a gestão escolar

para a participação de todos os atores sociais” (BRASIL, 2004, p. 13). Frente a essa
dinâmica, recomenda-se que a gestão escolar consiga “saber delegar poderes e
estimular a autonomia, valorizando a atuação e a produção de cada um” (BRASIL,
2004, p. 13). Para que sejam estruturadas e desenvolvidas práticas que contemplem
a singularidade do aluno, a agenda política em prol da inclusão escolar respalda-se
na ideia de que:
A concepção de educação inclusiva que orienta as políticas educacionais e os atuais
marcos normativos e legais rompe com uma trajetória de exclusão e segregação das
pessoas com deficiência, alterando as práticas educacionais para garantir a igualdade
de acesso e permanência na escola, por meio da matrícula dos alunos público alvo
da educação especial nas classes comuns do ensino regular. (BRASIL, 2010, p. 7)

Os investimentos operacionalizados para a promoção da educação de todos


requerem a participação coletiva; para isso, “a gestão flexível é fundamental para
alcançar o desenvolvimento” (KLAUS, 2011, p. 138). A partir de uma ordem
discursiva que objetiva a constituição de sujeitos autônomos e capazes de amplo
desenvolvimento pessoal, a organização dos tempos, dos espaços e das práticas neles
desenvolvidas requer que a gestão seja ativa, presente, que promova a unidade da
equipe por meio de articulações didático-pedagógicas, a mediação das diferentes
áreas do conhecimento, a articulação de instituições da comunidade e a possibili-
dade de parcerias e convênios de cooperação (BRASIL, 2004).
Na organização de espaços escolares inclusivos, faz-se necessária uma mudan-
ça cultural tanto no contexto de formação docente, quanto no contexto de atuação
escolar. Nessa reconfiguração, a condução das condutas docentes encontra-se
capturada pela necessidade de formação permanente. Essa formação está em con-
sonância com a lógica que tem reiteradamente convocado os docentes a “transpor
os obstáculos do preconceito e a superação do mito dos saberes especializados,
que reforçam a educação especial como modalidade de ensino que substitui a
escolarização” (BRASIL, 2006, p. 213).
O “Documento Orientador do Programa Educação Inclusiva: direito à diver-
sidade” demarca que:
O objetivo é a formação de gestores e educadores para efetivar a transformação dos
sistemas educacionais em sistemas educacionais inclusivos, tendo como princípio a
garantia do direito dos alunos com necessidades educacionais especiais de acesso e
permanência, com qualidade nas escolas regulares. (BRASIL, 2005, p. 09)

Ao convocar gestores e educadores a estruturarem ações que possam modificar


os sistemas educacionais para a promoção da inclusão das pessoas com deficiên-
cia, o Estado investe em práticas que focam no cuidado com a vida. Esse cuidado
estrutura-se com a garantia de condições equânimes a acesso, permanência, par-
ticipação, desenvolvimento e aprendizagem para cada sujeito. Segundo Lopes et

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 383

al., a inclusão apresenta-se como um imperativo categórico que, “por ser assumido
como evidente por si mesmo, é imposto de formas diferenciadas e de acordo com
hierarquias de participação, a todas as formas de vida, sem exceção” (2010, p. 7).
No intuito de garantir para cada indivíduo “uma condição econômica, escolar e
de saúde, compatível com seu nível e sua rede de relações, [a política de inclusão]
pressupõe fazer investimentos para que a situação presente de pobreza absoluta, de
falta de educação básica e de saúde, talvez se modifique em curto e médio prazos”
(LOPES et al., 2010, p. 7).
Na via dos investimentos para a inclusão, efetivar e ampliar condições para
que todos possam participar de forma produtiva constitui-se estratégia política que
implica ações para alterar a situação de discriminação negativa. Segundo Castel,
estar em uma condição de discriminação negativa “significa ser associado a um
destino embasado numa característica que não se escolhe, mas que os outros no-la
devolvem como uma espécie de estigma” (CASTEL, 2011, p. 14). Ao inserir todos
os sujeitos na escola, a inclusão opera a partir de determinados saberes e coloca em
funcionamento práticas que, entre outros aspectos, agem “em prol da manutenção
da ordem social no âmbito coletivo. Dessa forma, a inclusão se torna uma estratégia
de governamento que pretende conduzir as condutas dos sujeitos, gerenciando os
riscos que a vida coletiva pode causar”. (LOCKMANN, 2013, p. 43)
Para alterar a situação de discriminação negativa em que se encontra um per-
centual significativo da população brasileira em uma racionalidade neoliberal, Klaus
entende a educação como investimento e fator de desenvolvimento econômico. Para
ela, “a diferença, a inclusão, a gestão democrática, a participação e a democratização
são alardeadas em discursos políticos, econômicos, sociais e educacionais” (2011,
p. 195), colocando desafios para a inclusão escolar que devem ser gerenciados por
meio da participação de toda a comunidade escolar.
A partir das reconfigurações contemporâneas, em que a inclusão se apresenta
como importante dispositivo de governo da vida dos sujeitos dentro de um projeto
de sociedade, cabe compreender também que “a gestão e a descentralização, o
empreendedorismo no nível individual e no nível institucional emergem como a
grande solução para os problemas da sociedade contemporânea” (KLAUS, 2016, p.
77). Como uma produtiva estratégia de condução das condutas docentes, objetiva-
-se descentralizar a gestão para a educação inclusiva, porém, se “intensifica a cen-
tralidade no gestor, que, sob o discurso democrático, a participação e a liderança,
precisa produzir modos de estar na escola contemporânea” (NOYA, 2016, p. 5).
Ainda segundo Noya, “se a escola regular é produzida como lócus que permite a
eliminação de práticas excludentes, a gestão educacional é também produzida como
a salvação dessa escola” (2016, p. 71), pois se compreende que “ações bem sucedidas
de gestores inclusivos solucionarão os problemas escolares”. (NOYA, 2016, p. 95)
Pelo princípio norteador de uma política educacional que possa abarcar os
sujeitos em suas diferenças, “os gestores e gestoras da escola são preparados para

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384 Políticas de inclusão escolar das pessoas com deficiência e a gestão escolar

consolidar um Projeto Político-Pedagógico que seja comprometido com a educa-


ção de qualidade para todos” (BRASIL, 2006, s/n). Um dos enfoques previstos na
política de educação inclusiva direciona-se a preparar “o docente para entender,
desenvolver e usar metodologias de ensino a partir das quais os conteúdos curri-
culares são abordados de forma diferenciada com a finalidade de responder aos
diversos estilos e ritmos de aprendizagem dos estudantes e preparar o gestor(a)
para apoiar o desenvolvimento docente na promoção do sucesso escolar de todo(a)
s na escola” (BRASIL, 2006, s/n).
Com isso, as escolas vêm sendo convocadas a desenvolver práticas que
abarquem as necessidades de aprendizagem e desenvolvimento da singularidade,
minimizando processos de discriminação negativa que posicionam os sujeitos com
deficiência no espaço da incapacidade e da ineficiência. Para tal, requer-se uma
gestão que acompanhe o cotidiano da sala de aula, que esteja atenta às demandas
dos alunos e às relações entre os docentes e a comunidade escolar. É condição
para a inclusão escolar que a gestão crie uma sistemática formal de suporte para os
docentes do ensino regular (BRASIL, 2005a; 2005b). Esse suporte requer o engaja-
mento amplo e sistemático da coordenação pedagógica (ou equipe técnica quando
se conta com uma), a qual deve ter conhecimento dos conteúdos curriculares, dos
métodos de ensino e dos recursos didático-pedagógicos.
O professor da sala de aula regular também precisa contar com apoio e orien-
tação de uma equipe interdisciplinar que possa contribuir com seus conhecimentos
sobre recursos e métodos para o ensino de alunos com deficiência. É importante que
se construa uma política de acessibilidade em cada espaço escolar de acordo com
as demandas que cada instituição apresenta e que essa política seja regulamentada
nos documentos escolares (Projeto Político-Pedagógico e Regimento Escolar).
Quando o professor da classe regular não conta com uma política institucional e
com serviços de apoio, acaba desenvolvendo suas práticas por meio de ações isola-
das e pautadas em sua iniciativa pessoal. Porém, a iniciativa pessoal sobrecarrega o
professor e deixa sem suporte aqueles que não têm essa iniciativa. No primeiro caso,
se fortalece a cultura de que a busca de soluções para problemas no ensino não é
responsabilidade da gestão da escola, enquanto que, no segundo, são penalizados
o processo de aprendizagem e o alcance dos objetivos reais da educação. Enfim,
entendemos que o desenvolvimento de uma educação inclusiva requer o planeja-
mento compartilhado entre a gestão, o professor da sala regular e o profissional do
AEE para implementação das adequações necessárias que possam garantir a todos
os alunos o acesso, a participação, o desenvolvimento e a aprendizagem.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 385

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A inclusão pode ser vista como um permanente movimento que desloca prá-
ticas, metodologias, didáticas, políticas e as próprias formas de vida dos sujeitos
contemporâneos. Nesse sentido, a partir da análise desenvolvida, destacamos que a
política de inclusão escolar posta em funcionamento no Brasil nas últimas décadas
tem sido efetivada mediante legislações e políticas que promovem ações para efeti-
var um processo educacional que garanta acesso, participação, desenvolvimento e
aprendizagem a todos os alunos. A gestão escolar, segundo os princípios da gestão
democrática, para efetivar a política de inclusão, tem como um de seus maiores
desafios envolver todos nesse processo. A ênfase atual desse modo de fazer gestão
escolar está na promoção do atendimento de todos os alunos.
Ao tratarmos da articulação entre a inclusão e a gestão escolar, buscamos
mostrar que a educação de todos requer que cada espaço escolar construa e regu-
lamente sua política de inclusão e acessibilidade e que essa seja desenvolvida com
a participação coletiva. Por fim, destacamos a importância da articulação entre a
atuação da gestão escolar, do serviço disponibilizado na sala de recurso multifun-
cional pelo profissional do AEE e do professor da sala de aula regular para que se
potencializem o desenvolvimento e a aprendizagem de todos.

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___. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica: diversidade e inclusão. Organizado
por Clélia Brandão Alvarenga Craveiro e Simone Medeiros. – Brasília: Conselho Nacional de Edu-

Livro Coordenação Pedagógica.indb 385 22/10/2018 14:27:57


386 Políticas de inclusão escolar das pessoas com deficiência e a gestão escolar

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As implicações da parceria 2 7
público-privada para a gestão
democrática da escola pública

Alexandre José Rossi


Daniela de Oliveira Pires
Juliana Selau Lumertz

INTRODUÇÃO

Neste artigo, analisaremos as implicações da relação público-privada na ges-


tão democrática da escola pública e suas consequências para a democratização da
educação, a partir do estudo da parceria firmada entre o Instituto Ayrton Senna e
os municípios brasileiros. A premissa que orienta essa reflexão é a de que a confi-
guração das parcerias público-privadas serve aos interesses dos setores privados,
os quais atuam regulamentando o espaço público e primando pelos seus interesses.
Tais setores estimulam a ‘privatização’ do ensino público – ora vendendo serviços
e tecnologias educacionais às redes públicas de ensino, ora orientando o conteúdo
da proposta das políticas educacionais – e promovem ações e posicionamentos
que não correspondem ao princípio constitucional da gestão democrática, que, a
priori, deveria orientar a escola pública.
A gestão educacional foi permeada e influenciada por diferentes enfoques e
teorias ao longo das últimas décadas. No Brasil, historicamente, ela foi permeada
por modelos de gestão baseados no autoritarismo, patrimonialismo e do clien-
telismo1. Neste sentido, a gestão democrática da escola e da educação surgiu em
oposição a esses modelos e foi conquistada por meio da luta dos profissionais da
educação, precisamente no período em que o país passava pela redemocratização
e pela abertura política. No processo de redemocratização ocorrido na década de
1980, a pauta de reivindicação girava em torno de uma educação pública de qua-
lidade para todos, com garantia de acesso e universalização do ensino; autonomia
financeira, pedagógica e administrativa; participação da comunidade escolar por
meio do Conselho Escolar e eleição direta para diretores.
1 Para mais informações, ver Lumertz, 2008.

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388 As implicações da parceria público-privada para a gestão democrática da escola pública

Durante a década de 1990, o Brasil passou por uma reforma e por uma onda
de privatizações que almejaram tornar o Estado mais eficiente. A nova gestão
pública acaba por influenciar a gestão escolar, principalmente com as parcerias
público-privadas na educação, as quais, por meio do “público não estatal” e do
“quase-mercado”, introduzem mecanismos da iniciativa privada no interior da escola
pública. A metodologia utilizada para o desenvolvimento desse estudo parte da
análise bibliográfica, especialmente legislativa, com destaque para a Constituição
Federal de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96).
Também serão analisados os programas do Instituto Ayrton Senna, notadamente
o chamado Gestão Nota 10. Este texto está estruturado em três sessões, além da
introdução e das considerações finais. Na primeira, será apresentado o contexto
dos anos 1980 no Brasil, caracterizado pelo processo de redemocratização e de lutas
pelo reconhecimento do direito à educação enquanto prerrogativa estatal e pelo
fortalecimento da gestão democrática da escola. Na segunda sessão, será analisado o
processo que se inicia nos anos 1990 e que perdura até os dois atuais, caracterizado
pela proliferação das parcerias público-privadas na consecução do direito à educa-
ção, com o predomínio da lógica privatista, tanto nos sistemas de ensino como no
“chão da escola”. Por fim, na última sessão, demonstraremos as consequências do
processo de privatização da escola pública para a gestão democrática.

A GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO E DA


ESCOLA: CONQUISTAS HISTÓRICAS

A década de 1980 foi um período de grandes mudanças para o Brasil. Depois


de 21 anos de ditadura civil-militar (1964-1985) a sociedade brasileira clamava por
um novo regime político, por meio da campanha das Diretas Já, que restabelecesse
a democracia e as garantias fundamentais. Diversos movimentos sociais, sindicatos
e associações surgiram nessa época, fazendo oposição ao Estado centralizador do
período militar, defendendo a descentralização político-administrativa e a autono-
mia na gestão de unidades prestadoras de serviços diretos, a fim de democratizar
o Estado.
Esses movimentos organizados promoveram debates e encontros com o
objetivo de discutir a questão política do Brasil na época, produzindo documen-
tos que em certa medida expressavam essa correlação de forças. Destacam-se as
discussões ocorridas durante a IV Conferência Brasileira de Educação (CBE), em
1986, quando foram debatidas propostas a serem incorporadas à Constituição
Nacional. O documento resultante foi a “Carta de Goiânia”, que previa mecanismos
de democratização da gestão da educação e entendia a educação como direito de
todos, sendo gratuita e laica nos estabelecimentos públicos. Outras definições desse
documento foram o ensino fundamental obrigatório, com duração de oito anos; a

Livro Coordenação Pedagógica.indb 388 22/10/2018 14:27:57


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 389

garantia do Estado à sociedade civil de que o controle e a execução da política edu-


cacional seriam feitos por colegiados constituídos democraticamente; e a existência
de mecanismos efetivos de controle e participação social assegurados pelo Estado.
Outro movimento importante foi o Fórum de Educação na Constituinte em
Defesa do Ensino Público e Gratuito (mais tarde passou a chamar-se de Fórum
Nacional em Defesa da Escola Pública – FNDEP2), que atuou na Constituinte e na
elaboração da Lei de Diretrizes e Bases – LDB. Seu lançamento ocorreu por meio da
“Campanha Nacional pela Escola Pública e Gratuita”, da qual resultou o “Manifesto
em Defesa da Escola Pública e Gratuita”. O Fórum surgiu como um espaço para
debater a construção de um projeto para a educação como um todo, não somente
para a escola, lutando pela redemocratização da educação e objetivando a elaboração
de uma Carta Magna para o país. A educação pública e gratuita como direito de
todos e dever do Estado e da família foi conquistada no Brasil com a Constituição
Federal de 1988. A garantia desses direitos resultou da luta dos profissionais da
educação, que reivindicavam uma escola mais democrática, pautada na gestão e
na universalização do acesso, focando na formação do cidadão.
A consolidação de direitos, como o ensino fundamental obrigatório e gratuito,
ofertado inclusive àqueles que não tiveram acesso na idade própria3 e entendido
como direito público subjetivo4, foi uma conquista importante para que se bus-
casse uma educação de maior qualidade. Outra reinvindicação dos profissionais
da educação foi atendida: o princípio da gestão democrática do ensino público5,
que aparece pela primeira vez em forma de lei na Constituição Federal de 1988 e,
mais tarde, é incluída na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional6. A gestão
democrática era uma das bandeiras dos movimentos sociais que compunham a
Constituinte, em especial dos que faziam parte do Fórum Nacional em Defesa da
Escola Pública. A proposta do Fórum girava em torno da gestão democrática do
ensino com a participação de docentes, alunos, funcionários e representantes da

2 O Fórum contava inicialmente com 15 entidades: Associação Nacional dos Docentes do Ensino
Superior – Andes; Associação Nacional de Pós-Graduação em Educação – Anped; Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação – Ande; Associação Nacional de Profissio-
nais de Administração da Educação – Anpae; Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
– SBPC; Confederação dos Professores do Brasil – CPB; Centro de Estudos de Educação e Socie-
dade – Cedes; Confederação Geral dos Trabalhadores – CGT; Central Única dos Trabalhadores
– CUT; Federação Nacional de Orientadores Educacionais – FNOE; Federação das Associações
dos Servidores das Universidades Brasileiras – FASUBRA; Ordem dos Advogados do Brasil –
OAB; Sociedade de Estudos e Atividades Filosóficas – SEAF; União Brasileira de Estudantes
Secundaristas – UBES; União Nacional dos Estudantes – UNE. Este número foi ampliado no
processo de elaboração da nova LDB nacional (GOHN, 1992, p. 79-80).
3 Constituição Federal de 1988, art. 208, inciso I. (BRASIL, 1988).
4 Constituição Federal de 1988, art. 208, § 1º. (BRASIL, 1988).
5 Constituição Federal de 1988, art. 206, § VI. (BRASIL, 1988).
6 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, art. 2º, § VIII (BRASIL, 1988).

Livro Coordenação Pedagógica.indb 389 22/10/2018 14:27:57


390 As implicações da parceria público-privada para a gestão democrática da escola pública

comunidade. Entretanto, um grupo suprapartidário autodenominado “Centrão”


apresentou um projeto mais conservador:
A emenda do Centrão conseguiu livrar as escolas privadas de ter que se submeter
a alguns avanços reclamados pelas entidades de educação, tais como planos de
carreira e piso salarial para o magistério e a própria gestão democrática. O Centrão
minimizou o princípio de gestão democrática reconhecendo-o apenas para o ensino
público e substituindo-a pela expressão “função participativa dos mestres, pais e
comunidade”. (TAVARES 1990 apud MENDONÇA, 2000, p. 104).

Mesmo com a retirada da expressão “gestão democrática do ensino”, esse


conceito foi incorporado ao texto final aprovado, embora tenha restringido seu
campo de atuação ao ensino público. A luta pela gestão democrática no Brasil,
portanto, surge dentro do contexto de redemocratização, quando a sociedade civil
reivindicava uma maior participação nos processos decisórios:
[...] esta luta está também e particularmente vinculada a uma crítica ao excessivo
grau de centralismo administrativo, à rigidez hierárquica de papéis nos sistemas de
ensino, ao superdimensionamento de estruturas centrais e intermediárias, como o
consequente enfraquecimento da autonomia da escola como unidade de ponta do
sistema, à separação entre planejamento e execução das atividades educacionais
e a exclusão dos agentes educacionais dos processos decisórios. (MENDONÇA,
2000, p. 92)

A gestão democrática veio para contrapor-se ao enfoque tecnicista que influen-


ciou também a administração escolar, tendo como base as teorias administrativas
clássicas, destacando-se a administração científica (Taylor) e a gerencial (Fayol).
A eficiência e o resultado eram os principais elementos na educação até então,
e, no que se refere à gestão, o processo de participação dos diferentes segmentos
que compõem a escola era desconsiderado. Para que isso fosse contornado, ocor-
reram reivindicações pela criação dos conselhos escolares, pela eleição de diretores
e por autonomia financeira, pedagógica e administrativa das escolas (pilares que
embasam a gestão democrática).
[...] durante a década de 1980, as propostas de alterações na gestão da escola pública
apoiavam-se na defesa, principalmente, da implantação de uma administração co-
letiva da escola, da eleição dos dirigentes escolares, da participação da comunidade
usuária na definição das metas e objetivos das unidades escolares, da constituição
de instâncias coletivas de trabalho docente e da exclusividade do financiamento da
escola pública pelo poder público. (ADRIÃO, 2006, p. 57)

Para que isso ocorresse, buscaram-se instalar mecanismos de gestão que fos-
sem baseados na organização democrática e que alcançassem os diferentes setores
da comunidade escolar. Entre esses instrumentos, estavam o Conselho Escolar, a

Livro Coordenação Pedagógica.indb 390 22/10/2018 14:27:57


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 391

eleição para diretores, a construção coletiva do Projeto Político-Pedagógico e o


fortalecimento da autonomia escolar.
É importante salientar que a consolidação desses mecanismos, passados
quase trinta anos da promulgação da Constituição Federal de 1988, ainda não
é uma realidade, devido, em parte, às correlações das forças sociais do período,
principalmente a partir da propagação das políticas neoliberais. Também é pre-
ciso destacar a disseminação, na década de 1990, dos ideários da Terceira Via,
modelo que insere a educação no campo das atividades não exclusivas do Estado,
propondo a sua transferência para o setor público não estatal7, por meio das par-
cerias público-privadas, ocasionando um distanciamento do ideário democrático,
conforme veremos a seguir.

A PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA ENTRE O INSTITUTO


AYRTON SENNA E OS ENTES DA FEDERAÇÃO: ESTÍMULO À
PRIVATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA E DA ESCOLA

As tensões geradas pela relação entre o público e o privado na educação


brasileira fizeram parte do debate educacional ao longo da trajetória histórica da
política brasileira. Para tentarmos entender melhor essa questão, faremos um re-
corte histórico que abrange desde a década de 1990 – quando o Estado brasileiro
é reformado e a administração pública estatal passa por grandes mudanças – até
os dias atuais, visando não apenas demonstrar o movimento histórico da relação
público-privada, mas também dar ênfase a essa relação na atualidade.
A partir dos anos 1990, as políticas neoliberais8 no Brasil redefiniram o papel
do Estado, inclusive na educação, desenhando uma nova caminhada no embate
entre o público e o privado na escola. A reforma pela qual passou o Estado brasileiro
implicou diretamente a mudança do papel estatal, o qual, em certa medida, deixou
de ter um caráter provedor, passando a ser um Estado regulador da economia e
das políticas sociais.

7 Abrange as organizações privadas, que têm por objetivo interesses públicos, porém não corres-
pondentes aos do Estado, auxiliando na gestão e no controle das políticas implantadas.
8 O neoliberalismo teve suas primeiras ideias difundidas ainda no início do século XX; entretan-
to, foi apenas ao final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), período em que o Estado de
bem-estar social se consolidava, que o pensamento neoliberal começou a destacar-se. Ainda
assim, foi somente na década de 1970, com a crise do modelo de bem-estar social, que o mesmo
prosperou significativamente. Enquanto corrente de pensamento, o neoliberalismo possui três
escolas: a Escola Austríaca, a Escola de Chicago e a Escola da Virgínia ou Public Choice; todas
essas correntes possuem, em comum, a necessidade de passar para o mercado, com sua lógica
de competitividade, as regulações do Estado, sendo que as suas decisões devem ser guiadas
visando, de acordo com Reginaldo Moraes, ao “sistema de preços do mercado livre; é assim
que ajustam a todo o momento seus planos de produção e de consumo” (MORAES, 2001, apud
PIRES, 2009, p. 36-37).

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392 As implicações da parceria público-privada para a gestão democrática da escola pública

O novo modelo de administração pública apresentado pelo Plano Diretor da


Reforma do Estado (PDRAE) buscava implementar um padrão de Gestão Geren-
cial. No novo modelo proposto, as empresas estatais deveriam ser privatizadas e o
Estado não necessitaria mais produzir bens para o mercado.
Quanto à eficiência das organizações públicas, a proposta é mudar o modelo
de gestão aparentemente burocrático e patrimonialista, para um modelo de gestão
gerencial. Neste modelo, o cidadão não é mais visto como um sujeito de direito, mas
sim como um cliente que consome serviços públicos. A lógica da gestão é agora
a lógica do mercado. “O Estado passa a ser um grande supermercado, divido em
seções, onde o ‘cliente’ vai em busca das suas necessidades, supridas por programas
de governo pontuais” (ROSSI, 2010, p. 53).
Neste contexto, a educação passa a ser entendida como um serviço não ex-
clusivo por parte do Estado, e este, por sua vez, atua simultaneamente com outras
organizações públicas não estatais e privadas. O financiamento, geralmente a um
custo mais baixo, fica a cargo do Estado, diferentemente da execução dos serviços,
que pode ser realizada mediante a constituição do quase-mercado (BRASIL, 1995,
p. 66). Vale destacar que o “quase-mercado” é entendido como a inserção da lógica
do setor privado no setor público, por meio de perspectivas como o “‘choque de
mercado’, ‘qualidade total’, tendo [...] menos burocracia estatal [...] e mais flexibili-
dade local, realizando um acompanhamento direto dos seus usuários, ou de seus
clientes”. (LAUGLO, 1997, p. 23) 
Nesse processo ocorre a proliferação das Organizações Não Governamentais
(ONG’s), das Organizações Sociais (OS) e das Parcerias Público-Privadas9. Como
forma de materializar essa conjuntura, da relação público-privada, focaremos
a análise no Instituto Ayrton Senna (IAS), que realiza parcerias com Estados e
municípios, mediante termo de colaboração, e presta assessoria às secretarias de
educação e às escolas.
O Instituto Ayrton Senna é uma Organização Não Governamental sem fins
lucrativos, fundada em 1994, definida juridicamente como pessoa jurídica de di-
reito privado sem fins lucrativos do tipo associativo. Criado pela família do piloto
de Fórmula 1, Ayrton Senna, após sua morte naquele mesmo ano, a entidade é
presidida até os dias atuais por sua irmã, Viviane Senna.
Conforme dados coletados no site do Instituto Ayrton Senna, o IAS tem
como objetivo
estabelecer parcerias com secretarias estaduais e municipais de ensino para produzir
conhecimentos, formar educadores e pilotar soluções educacionais escaláveis que
pudessem inspirar práticas e políticas de educação em qualquer região do País.
Funcionando como uma espécie de ‘laboratório’ para desenvolvimento e disse-

9 No ano de 2004, foi aprovada a Lei nº 11.079 que autoriza a parceria público-privada no âmbito
da administração pública. Em 2014 foi aprovado o Marco Regulatório do Terceiro Setor, por
meio da Lei nº 13.019/14.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 393

minação de inovações educacionais, nossas soluções passaram a beneficiar até 2


milhões de crianças e jovens anualmente, em praticamente todos os estados do
Brasil (ATUAÇÃO, 2017).

No início da parceria, eles firmaram convênio com 15 municípios brasileiros.


Atualmente, com base nos dados retirados do site do instituto, são 660 municípios,
em 17 Estados e um total de 1,5 milhão de alunos atendidos. O Programa Gestão
Nota 10, especificamente, está presente em 546 municípios e 3.069 escolas, atingindo
até 1 milhão de estudantes10.
O IAS trabalha, essencialmente, com indicadores e metas gerenciais e com
a capacitação dos profissionais em serviço. Para que o analfabetismo, a distorção
idade-série, a reprovação, a repetência e o abandono fossem superados, o Instituto
sugeria investir no fortalecimento das lideranças e equipes de trabalho, tanto nas
unidades escolares como nas secretarias de educação. A organização declara que
sua posição frente à promoção dos direitos sociais e ao Estado é a da subsidiarie-
dade; mas a realidade mostra-se diferente disso, pois, como demonstra a parceria
analisada neste artigo, o IAS assume uma posição de destaque na condução da
educação pública, influenciando, inclusive, a própria legislação educacional.
Entendemos que não se pode buscar resolver os problemas da educação
brasileira apenas com a aplicação de uma “tecnologia”, como se a educação fosse
uma máquina industrial que apresenta problemas na execução das suas funções e
necessita de um técnico para retomar a produção. As “tecnologias educacionais”
utilizadas pelo IAS estão presentes em quase todos os Estados brasileiros e, cabe
salientar, sem considerar as peculiaridades de cada local ou as particularidades
dos alunos.
Nesse sentido, a educação passa a ser vista como a linha de montagem de uma
grande empresa, ou seja, precisamos atingir as nossas metas, seja de alfabetização
ou de correção de fluxo escolar, sem levar em consideração o processo, apenas o re-
sultado final. O programa voltado para a gestão escolar, o “Gestão Nota 10”, abrange
o ensino fundamental e possui uma sistemática de acompanhamento por meio do
preenchimento de planilhas para verificação de itens como o perfil do atendimento,
da gestão financeira e da turma, além de um relatório de acompanhamento mensal.
A partir deste levantamento, são elaborados relatórios que traduzem os índices
da escola, verificando se as metas foram alcançadas ou não. Para auxiliar na gestão
educacional, todos os dados são inseridos no Sistema Instituto Ayrton Senna de
Informações (SIASI). A análise das informações tem como base as metas do Pro-
grama, com o objetivo de “identificar os pontos frágeis que possam comprometer
os resultados para então, a partir deles, proceder à elaboração dos planos de inter-
venção” (SISTEMÁTICA DE ACOMPANHAMENTO GESTÃO NOTA 10, 2006,

10 http://www.institutoayrtonsenna.org.br/pt-br/instituto.html#numeros. Acesso em: 17 de se-


tembro de 2017.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 393 22/10/2018 14:27:57


394 As implicações da parceria público-privada para a gestão democrática da escola pública

p. 55). A análise feita mensalmente pelo Programa demonstra o desempenho dos


professores, a fim de que possam ser tomadas medidas de apoio. São verificados
também os chamados “indicadores de sucesso”: número de dias letivos, número
de faltas dos professores e dos alunos, licenças, transferências e movimentações.
Ao final dessa seção, é possível constatar que, no que se refere à política educa-
cional, uma das influências das parcerias público-privadas é a ideia de reformulação
do ensino público, com a retórica de modernização do sistema educativo. A ótica
do IAS não apenas reforça a percepção de que a educação pública vem passando
por uma crise e possui vários problemas de gestão, ensino e aprendizagem; mas
também afirma, por meio de sua atuação, a máxima de que o sistema privado é
e funciona melhor que o sistema público; assim, eles teriam as soluções para os
problemas que a escola pública enfrenta.
Dessa forma, a autonomia, uma das principais marcas da gestão democrática, é
ressignificada a partir de influências de políticas excludentes, nas quais a autonomia
escolar é entendida como a sociedade civil responsabilizando-se pela educação no
lugar e na função do Estado.
Na próxima sessão, apresentaremos a lógica de funcionamento do Programa
Gestão Nota 10 e suas implicações para a democratização do ensino público e para
a gestão democrática da escola.

A PRIVATIZAÇÃO DA ESCOLA PÚBLICA:


IMPLICAÇÕES PARA GESTÃO DEMOCRÁTICA

Nos municípios que firmaram parceria com o Instituto Ayrton Senna, são
fornecidos dois manuais à direção de cada escola: um que discrimina toda a rotina
que a escola deve adotar, chamado “Manual de Procedimentos e Rotinas”; e outro
que é mais específico da área de gestão, chamado “Gerenciando a Escola Eficaz –
Conceitos e Instrumentos”. Nesta sessão, analisaremos o segundo manual, a fim
de identificar os elementos de gestão empregados pelo Instituto Ayrton Senna.
O manual “Gerenciando a Escola Eficaz – Conceitos e Instrumentos” é um
material que foi desenvolvido pela Fundação Luis Eduardo Magalhães, para o
programa “Educar para Vencer”, do governo do Estado da Bahia11.
Analisando o documento verificamos que a “Escola Eficaz” é a escola “onde os
alunos aprendem” (BAHIA, 2000, p. 13). Esse conceito resulta de estudos e pesquisas
desenvolvidos em muitos países e que apontam caminhos para a criação de uma

11 Projeto desenvolvido pela Secretaria da Educação, no âmbito do Programa Educar para Vencer,
com apoio técnico e operacional da Fundação Luís Eduardo Magalhães. Visa ordenar, estruturar
e instrumentalizar escolas públicas estaduais e municipais, bem como capacitar seus dirigentes,
para operarem com maior autonomia e eficiência. O Projeto atendeu 45 municípios em 2000 e a
130 municípios em 2001. A partir de janeiro de 2002, sua área de abrangência foi ampliada, com
incorporação de mais 150 municípios, totalizando 280 municípios assistidos (BAHIA, 2000).

Livro Coordenação Pedagógica.indb 394 22/10/2018 14:27:57


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 395

Escola Eficaz. Entre as medidas citadas, destaca-se a importância de reconhecer


e admitir que a eficácia da escola depende do que ocorre dentro dela, não do que
acontece ou deixa de acontecer nas secretarias de educação. O problema e a solu-
ção para a aprendizagem dos alunos estão na própria escola (BAHIA, 2000, p. 13).
Segundo essa concepção, o sucesso da educação é algo exclusivo da escola e
dos membros que a constituem, ou seja, direção, professores, funcionários e alunos.
Trabalhando nesta lógica, a Escola Eficaz vai gradativamente retirando do poder
público a responsabilidade pela manutenção das escolas públicas, na medida em
que atribui aos sujeitos que a constituem a responsabilidade pelo sucesso e ou
fracasso da educação. Portanto, ela propõe que a escola deve buscar a solução para
seus problemas – sejam eles de ordem pedagógica, administrativa e/ou financeira
– resolvendo em âmbito local – sem interferência do poder público – dentro de
uma lógica gerencialista e com métodos administrativos nos moldes das empresas
privadas.
Pode-se constatar que a Escola Eficaz é aquela que caminha sozinha para
garantir que seus alunos aprendam e para que a própria escola possa manter-se,
inclusive arrecadando recursos próprios. A Escola Eficaz está preocupada com os
resultados finais, transformando seus gestores em gerentes de empresas, preocupados
apenas com o produto final.
Quanto à autonomia nos âmbitos financeiro, pedagógico e administrativo, o
IAS utiliza-se de discursos presentes há muito tempo na educação, incorporando-
-os, ressignificando-os e dando-lhes outra perspectiva que não aquela defendida
pelas lutas históricas12 de democratização da educação pública.
O Instituto enfatiza que uma escola, para ser autônoma, precisa definir seu
currículo e calendário, gerir seus próprios recursos, decidir o que é mais importante
para cada escola conforme sua localidade e necessidade. Isso é, no mínimo, contra-
ditório, pois percebemos que todas as escolas integrantes do programa possuíam
a mesma forma de trabalho e organização. O IAS aponta também que a Secretaria
de Educação deve propiciar os insumos mínimos necessários ao funcionamento
das escolas. Se antes a escola podia resolver tudo sozinha, agora ela é provida de
um órgão fiscalizador, porém com uma margem para que ela procure em outras
instâncias – na iniciativa privada, por exemplo – uma forma de angariar recursos.
O manual apresenta um questionário que foi realizado com cerca de 2000
diretores de escolas públicas da rede estadual da Bahia. Neste questionário, são
definidos graus de autonomia: autonomia plena, autonomia parcial e autonomia
mínima. Os itens que definem o grau de autonomia de determinada escola variam
conforme o tamanho da escola, admissão e demissão de professores, filosofia edu-
cacional, avaliação, captação e alocação de recursos, entre outros. Na autonomia

12 Garantia do direito à educação com oferta do poder pública, educação pública gratuita e de
qualidade, ensino democrático e laico, dentre outras.

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396 As implicações da parceria público-privada para a gestão democrática da escola pública

plena13, a escola tem total e exclusivo poder de decidir sobre as suas prioridades
e necessidades; já na autonomia parcial, ocorre uma coexistência entre Estado e
escola; enquanto na autonomia mínima, há a influência total por parte do Estado.
Conforme Paro (2001, p, 10.), “a questão da autonomia da escola deixou de
estar presente apenas na fala dos educadores progressistas para fazer parte tam-
bém do discurso conservador e privatista da educação”. Esse discurso conservador
distancia-se de uma concepção de autonomia no âmbito da gestão democrática,
uma vez que, nessa, a comunidade escolar elabora, planeja e executa seus projetos
pedagógicos.
Outro fator de destaque na Escola Eficaz é a liderança. O manual traça um
paralelo entre a gestão empresarial e a gestão escolar, a partir do relato de um
empresário. Esse utiliza termos comuns do mercado, como otimização e redução
de custos, e expressa que o sucesso da escola pode ser medido através de alunos
e alunas que estão formando-se, ou seja, que este aluno, ao sair da escola, deveria
estar apto a atender as necessidades do mercado. Para isso, as demandas educacio-
nais precisariam estar adaptadas às diferentes regiões e a seus nichos econômicos.
Salientamos que a educação pública não pode ser subserviente ao mercado,
pois sua função social vai além de formar o jovem para o mercado de trabalho.
Estamos falando de sujeitos históricos que necessitam vivenciar, dentro da escola
pública, a cidadania e a democracia; entrelaçando-se, assim, diferentes práticas
pedagógicas e contribuindo para as relações sociais entre estes sujeitos.
Para a Escola Eficaz, o voluntariado é uma necessidade. O trabalho voluntário
vem tornando-se essencial para complementar os recursos públicos de que as escolas
dispõem. Para o IAS, por maiores que sejam esses recursos, há sempre tarefas adi-
cionais que precisam ser feitas para que a escola atinja seu objetivo maior: o sucesso
do aluno (BAHIA, 2000, p. 248). Neste sentido, o voluntariado é incentivado em
diversas esferas escolares, por exemplo, no reforço escolar, na gestão escolar, em
atividades extracurriculares como artes e esportes, entre outras. O manual cita ainda
o Programa “Amigos da Escola”, de maneira que, mais uma vez, o poder público
transfere suas obrigações ao setor voluntariado, precarizando ainda mais os seus
serviços e ressignificando a participação cidadã na escola pública.
Por fim, o manual apresenta os elementos da gestão escolar e ensina passo a
passo como administrar uma escola. Traz um resumo das principais leis educa-
cionais vigentes no país e também uma agenda para o diretor, contendo a rotina a
ser desempenhada por ele. Mais uma vez, parece-nos contraditório, pois o que foi
verificado é que o material disponibilizado pelo IAS era o mesmo para todos os
municípios brasileiros que possuíam parceria com ele, não importando se a escola
é de uma comunidade urbana, rural ou até mesmo de comunidades indígenas.

13 Para saber mais sobre os conceitos de autonomia propostos pelo IAS, ver Lumertz, 2008.

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 397

O último item trata dos recursos financeiros, faz um apanhado das verbas
destinadas às escolas, ensina a criar a unidade executora e a administrar recursos
públicos, bem como a realizar sua prestação de contas.
Este manual traz propostas que estão de acordo com os pressupostos da Es-
cola Eficaz, que tem uma clara concepção de gestão escolar distanciada da gestão
democrática. Ainda que a gestão democrática seja mencionada, ela fica restrita ao
papel, não acontecendo na prática. A gestão proposta é aquela centrada nos resul-
tados e na produtividade da escola e dos alunos, e, caso a escola não corresponda
aos objetivos, é responsabilizada pelo seu fracasso.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao final desta análise, é imperioso afirmar que o direito à educação enseja


a correlata obrigação do Estado em prestá-lo. É, portanto, um dever que implica
a necessária observância dos princípios constitucionais que orientam a atividade
estatal, sejam eles expressos, como a legalidade e a impessoalidade, sejam implícitos,
como a continuidade dos serviços públicos.
Neste sentido, a sociedade civil, ao assumir a responsabilidade pela promoção
da educação, como propõe o IAS em seus documentos, acaba por naturalizar a
postura do Estado, partindo da premissa de que, com o estabelecimento da relação
público-privada, a sociedade passa a configurar-se como um parceiro do Estado,
demonstrando uma postura pseudodemocrática.
O IAS insere mecanismos gerenciais nas secretarias de educação municipais e
estaduais e também nas escolas. Tais mecanismos buscam alcançar melhores resul-
tados no desempenho escolar dos alunos, desconsiderando o processo pedagógico.
Nesse cenário, cabe ao poder público o papel de fiscalizador das secretarias, das
escolas e dos próprios educadores, com o intuito de verificar se o que foi estabe-
lecido pela instituição privada está sendo implementado. Aqui observamos que o
poder público continua sendo o executor e financiador da política, mas a direção
e o controle passam a ser de instituições privadas.
A gestão educacional brasileira, historicamente, foi atravessada pelo clientelis-
mo e pelo patrimonialismo, o que significa afirmar que a gestão baseada na lógica
do mercado na escola não é algo novo. A gestão democrática em nosso país, por
outro lado, é uma conquista recente, mas que vem sendo interrompida, notadamente
quando passa a ser implementada nas escolas de todo o país a concepção da nova
gestão pública. Exemplo dessa reversão é o que o IAS vem realizando há mais de
20 anos, introduzindo elementos da lógica de mercado na gestão escolar, com a
retórica de que a gestão privada é mais eficiente que a gestão pública.
A importância da autonomia está no fundamento da concepção democrático-
-participativa da gestão escolar. Essa perspectiva entende a autonomia escolar como

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398 As implicações da parceria público-privada para a gestão democrática da escola pública

a possibilidade de que a escola decida seu próprio rumo, juntamente com professo-
res, pais, alunos, funcionários e comunidade em geral, numa corresponsabilidade
para o êxito daquela instituição, sem desconsiderar o papel fundamental do poder
público. Assim, conforme demonstramos neste artigo, a parceria público-privado
interfere na gestão democrática – um processo que tem disputas entre os sujeitos
envolvidos –, desconsiderando a realidade de cada localidade, e modifica a ideia
de autonomia escolar, ao afastar cada vez mais a noção de corresponsabilidade
entre poder público e sociedade civil, classificando a escola e seus pares como os
únicos responsáveis pelo sucesso e ou fracasso, excluindo a comunidade escolar dos
processos decisórios, desconsiderando um processo emancipador e distanciando
cada vez mais a escola pública da sua função social.
O que se pode constatar é que o discurso da melhoria da qualidade da educação
e da gestão escolar por meio das parcerias público-privadas é parte constitutiva do
movimento do real, de correlação de forças sociais, e é por meio dele que o setor
privado tenta imprimir a lógica de mercado na gestão escolar pública. Nós, educa-
dores, precisamos nos manter alertas e resistir à privatização da educação básica e
da escola, tendência que faz da esfera pública um lócus privilegiado de proliferação
dos interesses privados. É esse nosso papel enquanto educadores: não deixar que
nos tomem o que tanto lutamos para conquistar.

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Livro Coordenação Pedagógica.indb 400 22/10/2018 14:27:57
Sobre autoras e autores
ORGANIZADORAS

Mariângela Bairros– Professora Adjunta na Faculdade de Educação FACED/UFRGS.


Doutora em Educação e Mestre em Ciência Política (UFRGS). Núcleo de Estudos de Política e
Gestão da Educação. Linha de pesquisa: Políticas públicas de educação, gestão e planejamento
da educação; avaliação de políticas educacionais.
Contato: mmbairros@gmail.com
Patrícia Marchand – Professora Adjunta Faculdade de Educação FACED/UFRGS.
Doutora e Mestre em Educação (UFRGS). Núcleo de Estudos de Política e Gestão da Educa-
ção. Linha de pesquisa: Políticas públicas de educação, gestão e planejamento da educação;
avaliação de políticas educacionais.
Contato:patymarchand@gmail.com

AUTORAS E AUTORES DOS CAPÍTULOS

Adriana da Silva Thoma– Professora Associada II da Universidade Federal do Rio


Grande do Sul, atuando no Departamento de Estudos Especializados da Faculdade de Educa-
ção (DEE/FACED) e no Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEDU). Graduada em
Educação Especial pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, 1994), mestrado (1997),
doutorado em Educação (2002) pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e pós-
-doutorado pela Universidade de Santa Cruz do Sul (2017-2018). Líder do Grupo de Pesquisas
SINAIS: Sujeitos, Inclusão, Narrativas, Identidades, Alteridades e Subjetividades. Desenvolve
e orienta pesquisas no campo dos Estudos Culturais, Estudos Foucaultianos e Estudos Surdos
em Educação, principalmente nos seguintes temas: biopolíticas, políticas de inclusão, educação
de surdos, identidades e diferenças.
Contato: asthoma@terra.com.br
Alexandre José Rossi– Professor substituto da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul, atuando no Departamento de Estudos Especializados da Faculdade de Educação (DEE/
FACED). Doutor e Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFR-
GS). Especialista em Fundamentos da Educação e Licenciado em Filosofia pela Universidade
Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). Membro do Grupo de Pesquisa Relações entre o
Público e o Privado na Educação (GPRPPE). Tem pesquisado as seguintes temáticas: Sociedade
civil, Estado, Políticas Públicas, Política de combate à homofobia, Políticas de Diversidade na
Educação Brasileira, Relação público-privada na educação.
Contato: ajrossi.rossi@gmail.com
Amanda Cabette– Doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na área de Análise Territorial. Cursando
também a modalidade de Licenciatura em Geografia (UFRGS) e graduou-se em Bacharel em
Geografia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2013). Obteve em junho de 2015 o
título de Mestre em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, na área de Análise Territorial. Com ênfase em pesquisas na área
da Geografia Urbana.
Contato: amandacabette@yahoo.com.br

Livro Coordenação Pedagógica.indb 401 22/10/2018 14:27:57


402 Sobre autoras e autores

Andréa Lauermann Tassinari– Possui graduação em Letras e Terapia Ocupacional,


pós-graduação em Gestão, Supervisão e Orientação Educacional. Especialista em Coordena-
ção Pedagógica pela UFRGS e mestranda em Políticas Públicas e Administração Escolar pela
UNTREF. Professora da Rede Municipal de Porto Alegre, atua como supervisora escolar no
Centro Municipal de Educação de Trabalhadores Paulo Freire (CMET), na modalidade Educação
de Jovens e Adultos (EJA).
Contato: andrealtassinari@yahoo.com.br
Andréia da Silva Mafassioli– Possui graduação em Pedagogia, habilitação em su-
pervisão escolar, com especialização em educação psicomotora e especialização em educação
Especial e Processos Inclusivos. Mestre e Doutora em Educação pela linha de pesquisa Políticas
e Gestão de Processos Educacionais da UFRGS. Atualmente, exerce a função de coordenadora
pedagógica em escola de educação básica. Atua em grupo de pesquisa no campo de políticas
públicas em educação na FACED/UFRGS.
Contato: andreiamafassioli@gmail.com
Angela de Fátima Linck de Jesus– Professora de Inglês (Rede Municipal e Estadual),
Assessora Pedagógica da Área das Linguagens e Rede de Proteção à Criança e ao Adolescente
da 36ª Coordenadoria Regional de Educação do Município de Ijuí/RS. Licenciada em Inglês
e Especialista em Ensino/Aprendizagem de Línguas – UNIJUÍ. Especialista em Coordenação
Pedagógica – Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Contato: fatima.linck@gmail.com
Arthur da Silva Poziomyck– Advogado. Possui graduação em Direito pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2012) e pós-graduação em nível de especialização
nas áreas de Direito Internacional Público, Direito Internacional Privado e Direito da Integração
Regional na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Mestre em Educação pelo Programa
de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Contato: arthuropoz@hotmail.com
Carla Ferreira Aguirre– Professora e Coordenadora pedagógica da Rede Estadual de
Ensino do Rio Grande do Sul, 19ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE). Licenciada em
Letras Português/Espanhol (URCAMP). Tecnóloga em Gestão Pública (UNIPAMPA). Especialista
em Coordenação Pedagógica (UFRGS).
Contato: karlynha.aguirre@gmail.com
Caterine Vila Fagundes– Coordenadora de inovação pedagógica na Universidade
Veiga de Almeida, atuando junto à Pró-reitora de graduação. Doutora em Educação pela Uni-
versidade de Barcelona; realizou estágio de Pós-Doutorado na Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS).
Contato: caterine.fagundes@gmail.com
Cíntia Inês Boll– Professora permanente no Pós-Graduação em Educação em Ciên-
cias: Química da Vida e Saúde e no Departamento de Estudos Especializados na Faculdade de
Educação da UFRGS. Pedagoga, Mestre e Doutora em Educação pela Faculdade de Educação
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul-UFRGS, na linha de Pesquisa de Educação, Arte,
Linguagem e Tecnologia. Desde 2003 tem como foco estudos em Formação de Professores
na Cultura Digital.
Contato: cintiaboll@gmail.com
Cláudia Zank– Coordenadora de Projetos Estratégicos no Núcleo de Educação Pro-
fissional (NEP) do SENAC RS (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial do Rio Grande
do Sul). Doutora e Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS). Pesquisadora do NUTED (Núcleo de Tecnologias Digitais Aplicadas à Educação)

Livro Coordenação Pedagógica.indb 402 22/10/2018 14:27:57


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 403

e do TRAMSE (Trabalho, Movimentos Sociais e Educação), ambos vinculados à Faculdade de


Educação (FACED) da UFRGS.
Contato: claudiazank@gmail.com
Daiana Gisele Rosário da Rocha– Professora Coordenadora do LIE (Laboratório de
Informática Educativa) da Escola Municipal de Ensino Fundamental Marcos Moog, da cidade de
Novo Hamburgo, RS. Especialização no curso de Pós-Graduação Latu Sensu em Coordenação
Pedagógica na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Contato: daianarocha@novohamburgo.rs.gov.br
Daiane Scopel Boff– Professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
do Rio Grande do Sul – Campus Caxias do Sul. Doutoranda em Educação na Universidade
do Vale do Rio dos Sinos. Mestre em Ensino de Matemática pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul.
Contato: daiane.boff@caxias.ifrs.edu.br
Daniela de Oliveira Pires– Professora Adjunta da Universidade Federal do Paraná
(UFPR), no Setor de Educação, com atuação no Departamento de Administração e Planejamento
Escolar (DEPLAE/NUPE). Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS). Integrante do Grupo de Pesquisa, GPRPPE (Grupo de Pesquisa: Relações entre
o Público e o Privado na Educação), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGEDU/UFRGS). Tem experiência nas áreas
da Educação, com ênfase na Gestão de Processos Educacionais, Política Pública Educacional e
Administração Escolar, atuando principalmente nos seguintes temas: estado e política educa-
cional, gestão educacional brasileira, relação público-privada na educação.
Contato: danielaopires77@gmail.com
Delci Heinle Klein– Professora no Instituto Superior de Educação Ivoti e no Comple-
xo de Ensino Superior de Cachoeirinha (CESUCA). Coordenadora da Extensão do Instituto
Superior de Educação Ivoti. Graduada em Matemática e Doutora em Educação (UFRGS).
Contato: delcihk@bol.com.br
Denise Maria Comerlato– Professora Associada da Faculdade de Educação na Uni-
versidade Federal do Rio Grande do Sul. Doutora em Educação pela Faculdade de Educação
da UFRGS.
Contato: denise.comerlato@gmail.com
Eliane Helena Menegotti– Mestra na Linha de Pesquisa de Políticas e Gestão de
Processos Educacionais PPGEdu/UFRGS 2016-2018. Especialização em Coordenação Peda-
gógica pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2017). Especialização em Educação
Integral Integrada na Escola Contemporânea pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(2013). Especialização em Educação Especial e Processos Inclusivos pela Universidade Federal
do Rio Grande do Sul (2010). Especialização em Gestão Escolar pela Universidade Federal
do Rio Grande do Sul (2009). Especialização em Metodologia do Ensino de Matemática para
a Educação Básica pela Faculdade Porto-Alegrense de Educação, Ciências e Letras (2002) e
graduação em Matemática pela Faculdade Porto-Alegrense de Educação, Ciências e Letras
(2001). Orientadora de Estudos do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa. Gestora
no município de Viamão/RS (2013). Formadora no PNAIC/UFPel (2014). Formadora Regional
no PNAIC/UFRGS (2018).
Contato: elimenegotti@gmail.com
Fabiane Flores Penteado Galafassi– Professora assistente na Universidade Federal
do Pampa (UNIPAMPA) no Campus de Itaqui. Faz parte do grupo de pesquisa em Sistemas
Inteligentes e Modelagem (LABSIM). Licenciada em Computação pela Universidade FEEVALE,

Livro Coordenação Pedagógica.indb 403 22/10/2018 14:27:57


404 Sobre autoras e autores

Mestre em Computação Aplicada pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos e doutoranda
em Informática na Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul no Programa de
Pós-Graduação em Informática na Educação (PPGIE).
Contato: fabiane.penteado@gmail.com
Fátima Anise Rodrigues Ehlert– Doutoranda em Políticas e Gestão de Processos
Educacionais, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Mestre em Educação, pela Uni-
versidade Federal do Pampa – Campus Jaguarão. Pós-Graduada em Psicopedagogia. Graduada
em Letras pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Dom Bosco. Atualmente desempenha
a função de Professora na Rede Estadual de Ensino do estado do Rio Grande do Sul.
Contato: faehlert68@gmail.com
Gabriela Maria Barbosa Brabo– Professora Adjunta da Faculdade de Educação (FA-
CED) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Doutora em Educação – UFRGS.
Contato: gabrielabrabo@gmail.com
Graciele Marjana Kraemer – Professora de Libras na Faculdade Porto-Alegrense
(FAPA, 2010-2012); Professora do Instituto Superior de Educação de Ivoti (ISEI, 2011-2013).
Graduada em Educação Especial – Deficientes da Audiocomunicação, pela Universidade Federal
de Santa Maria (UFSM, 2007). Mestre em Educação (2011) e Doutora em Educação (UFRGS/
2013-2017). Em Estágio de Pós-Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Educação
Unisinos (2017-2018). Atuou como professora nas séries iniciais da Escola Especial para Surdos
Frei Pacífico no período de 2007-2009; participa de dois grupos de pesquisa: GEPI/Unisinos
(Grupo de Estudo e Pesquisa em Inclusão) e SINAIS/UFRGS (Surdez, Inclusão, Narrativas,
Identidades e Subjetividades). Parecerista da Revista Educação Especial (UFSM). Trabalha com
os seguintes temas: Inclusão Escolar; Políticas Educacionais Inclusivas; Políticas e Práticas na
Educação de Surdos.
Contato: graciele.kraemer@gmail.com
Graziela de Lourdes Demétrio Nunes– Graduada em Química pela PUCRS. Es-
pecialista em Toxicologia pela PUCRS. Especialista em Coordenação pedagógica pela UFRGS
Professora de Química na Rede Pública de Ensino Dom. Supervisora da Rede Pública de Ensino
do estado do Rio Grande do Sul.
Contato: gdemetrio@yahoo.com.br
Graziella Souza dos Santos– Professora da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI).
Doutora em Educação pela UFRGS/FACED. Mestra em Educação. Especialista em Supervisão
Escolar. Licenciada em pedagogia.
Contato: s.grazi20@gmail.com
Gustavo Andrada Bandeira– Técnico em Assuntos Educacionais na Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Doutor em Educação pelo Programa de Pós-Graduação
em Educação/UFRGS. Integrante do Grupo de Estudos de Educação e Relações de Gênero
(Geerge).
Contato:  gustavoabandeira@yahoo.com.br
Iana Gomes de Lima– Professora Adjunta na Faculdade de Educação da Universidade
Federal de Pelotas e professora colaboradora no Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade da Região de Joinville. Mestre e Doutora em Educação pela Universidade Federal
do Rio Grande do Sul, tendo pós-doutorado em Educação pela Universidade Federal de Pelotas.
Contato: iana_glima@yahoo.com.br
Igor Ghelman Sordi Zibenberg– Doutorando e Mestre em Educação da Linha de
Pesquisa de Políticas e Gestão de Processos Educacionais no Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGEDU/UFRGS), Especialista em

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Coordenação pedagógica: concepções e práticas 405

Gestão de Instituições de Ensino pela Faculdade Porto-Alegrense e Licenciado em Educação


Física pela UFRGS. Técnico em Assuntos Educacionais no Instituto Federal de Educação, Ciência
e Tecnologia do Rio Grande do Sul.
Contato: igorgsz@yahoo.com.br
Jaime José Zitkoski– Professor Associado 1 atuando junto ao Departamento de Estudos
Básicos na Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul nos cursos
de Licenciaturas na área de Filosofia da Educação e na Pós-Graduação em Educação (Mestrado
e Doutorado) com ênfase em Educação Popular e estudos sobre Universidade. Doutor em
Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Contato: jaime.jose@ufrgs.br
Joseane Leonardi Craveiro EL Hawat– Professora do Curso de Especialização em
Coordenação Pedagógica (2ª edição: 2015-2016), do Programa Nacional Escola de Gestores
da Educação Básica do Ministério da Educação. Orientadora Educacional no SENAC Viamão.
Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Contato: joseaneh@yahoo.com.br
Julliana Cunha Alves– Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS).
Contato: julliana.ufrgs@gmail.com
Juliana Selau Lumertz– Professora da rede municipal de Cachoeirinha. Membro do
Grupo de Pesquisa Relações Público-privado na Educação (GPRPPE). Graduada em Pedagogia e
Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, junto à linha de pesquisa
Políticas e Processos de Gestão Educacional.
Contato: juliana.lumertz@gmail.com
Juliana Veiga de Freitas– Orientadora Educacional/Pedagoga da Faculdade de Edu-
cação da UFRGS. Doutoranda em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação
(UFRGS), junto à linha de pesquisa Estudos Culturais em Educação. Mestre em Educação
e Licenciada em Pedagogia pela mesma Universidade. Servidora técnico-administrativa, no
cargo de Pedagoga/Orientadora Educacional, atuante no Núcleo Acadêmico da Faculdade de
Educação da UFRGS.
Contato: julianavfreitas@gmail.com
Karen Elisabete Rosa Nodari– Professora titular do Departamento de Humanidades
do Colégio de Aplicação da UFRGS. Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul. Realiza pesquisas junto à linha Filosofias da diferença e educação. Atualmente faz
estágio pós-doutoral no Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação
da UFRGS sob a supervisão da professora Dra. Sandra Corazza.
Contato: kernodari@gmail.com
Leonardo Cardozo Vieira – Professor de Ciências e Orientador Educacional da
Escola de Ensino Fundamental Castro Alves, Pelotas/RS. Foi coordenador pedagógico, diretor
de Escola e Secretário Municipal de Educação de Arroio Grande/RS. É Graduado em Biologia
pela UFPEL. Especialista em Coordenação Pedagógica pela UFRGS e Mestre em Ciências e
Tecnologias na Educação pelo IFSUL.
Contato: bio.leo.mat@gmail.com
Lúcia Fernanda Ramires Félix– Graduada em Letras pela Universidade Federal do
Rio Grande do Sul e Mestranda em Educação no Programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul na linha de Políticas e Gestão de Processos
Educacionais.
Contato: lucia.r.felix@gmail.com

Livro Coordenação Pedagógica.indb 405 22/10/2018 14:27:57


406 Sobre autoras e autores

Luciano Bedin da Costa– Professor na Faculdade de Educação e Programa de Pós-


-Graduação em Psicologia Social e Institucional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS). Doutor em Educação.
Contato: bedin.costa@gmail.com
Luís Armando Gandin– Professor da Faculdade de Educação e do Programa de Pós-
-Graduação em Educação da UFRGS. Doutor (Ph.D.) em Curriculum and Instruction pela
University of Wisconsin – Madison (2002).
Contato: luis.Gandin@ufrgs.br
Maria Goreti Farias Machado– Professora adjunta da Faculdade de Educação da
UFRGS. Docente nos cursos de licenciaturas da UFRGS e especialização no campo da gestão
escolar. Pesquisadora nas temáticas de financiamento da educação básica e no controle e
accountability na gestão pública. Doutora e Mestre em Educação pela Faculdade de Educação
da UFRGS na linha de pesquisa Políticas e Gestão de Processos Educacionais. Integrante do
Núcleo de Política e Gestão da Educação da Faculdade de Educação da UFRGS.
Contato: mgoretimachado@gmail.com
Maria Luiza Rodrigues Flores– Professora Adjunta da Área de Administração Es-
colar e integrante do Núcleo de Política e Gestão da Educação da Faculdade de Educação da
UFRGS. Graduada em Letras, Mestre e Doutora em Educação pela Universidade Federal do
Rio Grande do Sul (UFRGS). Atuou como docente e na gestão em várias edições dos cursos
de especialização vinculados ao Programa Nacional Escola de Gestores (convênio MEC/UFR-
GS). Desenvolve pesquisas sobre organização e gestão da educação básica, especialmente da
educação infantil e de sua articulação com o ensino fundamental.
Contato: malurflores@gmail.com
Maria Otília Kroeff Susin – Doutora em Educação pela Faculdade de Educação
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul/UFRGS. Pesquisadora da UFRGS em projetos
coordenados pela Profª Drª Vera Maria Vidal Peroni. Professora aposentada da Secretaria
Municipal de Educação de Porto Alegre
Contato: otiliasusin@gmail.com
Miriam Mallmann Prates– Professora da Rede Municipal de Novo Hamburgo, onde
atua atualmente como Diretora da Escola Municipal de Educação Infantil A Bela Adormecida.
Licenciada em Pedagogia pela Universidade FEEVALE, Especialização em Gestão Escolar pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Especialização em Coordenação Pe-
dagógica pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Contato: miriam.mallmann@hotmail.com
Natália de Lacerda Gil– Professora e pesquisadora da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS). Coordenadora do projeto de pesquisa interinstitucional (UFRGS, UNI-
CAMP, USP) intitulado A escola obrigatória e seus alunos: acesso, permanência e desempenhos
(1870-1970). Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP).
Contato: natalia.gil@uol.com.br
Neusa Chaves Batista – Pós-Doutora em Políticas Educacionais Comparadas pela
Universidade de Granada (Espanha). Doutora em Educação e Mestre em Sociologia pela Uni-
versidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), graduação em Ciências Sociais pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Professora associada da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Contato: neuchaves@gmail.com
Patricia Alejandra Behar – Professora Titular da Faculdade de Educação e dos
cursos de Pós-Graduação em Educação (PPGEDU) e em Informática na Educação (PPGIE)

Livro Coordenação Pedagógica.indb 406 22/10/2018 14:27:57


Coordenação pedagógica: concepções e práticas 407

da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestre e Doutora em Ciência da


Computação pela UFRGS. Coordena desde 2000 o NUTED (Núcleo de Tecnologias Digitais
Aplicadas à Educação), vinculado à Faculdade de Educação (FACED) e ao Centro Interdisciplinar
de Novas Tecnologias da UFRGS.
Contato: pbehar@terra.com.br
Paulo Peixoto de Albuquerque– Professor Adjunto da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, na Faculdade de Educação. Doutor em Sociologia pela Université Catholique
de Louvain-la-Neuve.
Contato: albuquerque.paulo@gmail.com
Ricardo Boklis Golbspan– Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul. Doutorando em Educação no Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Contato: ricardo.golbspan@ufrgs.br
Silvana Corbellini– Pesquisadora e Professora Adjunta na Faculdade de Educação na
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atua também como professora do curso
de especialização em Psicopedagogia e Tecnologias da Informação e Comunicação. Doutora em
Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFR-
GS), Mestre em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(PUC/RS) e graduada em Psicologia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS).
Contato: silvanacorbellini@gmail.com
Tatiane Mattiazzi– Assessora Pedagógica na 17ª Coordenadoria Regional de Educa-
ção, no município de Santa Rosa/RS. Pós-Graduada em Coordenação Pedagógica pela UFRGS.
Contato: tatianemattiazzi@hotmail.com
Vera Maria Vidal Peroni– Professora Titular da Faculdade de Educação na Univer-
sidade Federal do Rio Grande do Sul. Doutora em Educação pela PUC/SP. Coordena grupo de
pesquisa sobre a relação entre o público e o privado na educação. Sua pesquisa mais recente
trata das Implicações da relação público-privada para a democratização da educação na América
Latina: Uruguai, Argentina, Venezuela, Chile, Bolívia e Brasil Implicações da relação público-
-privada para a democratização da educação.
Contato: veraperoni@gmail.com

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Livro Coordenação Pedagógica.indb 409 22/10/2018 14:27:57
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OUTRAS PUBLICAÇÕES
DA TOMO EDITORIAL

A Coleção Filosofinhos, coordenada pela filósofa Maria de Nazareth Agra Hassen convida
o leitor a conhecer um pouco da filosofia acompanhando historinhas cujos personagens
são grandes filósofos quando ainda eram pequenos... Nessas histórias, os pensadores são
crianças, mas já apresentam algumas de suas ideias revolucionárias. Todas as crianças
são naturalmente curiosas, característica fundamental para buscar o saber, e a filosofia
introduzida de forma lúdica favorece a exploração do mundo do conhecimento. Essa
coleção também ajuda os adultos a pensarem o mundo e a compreenderem as crianças,
mas principalmente mostra como é bom ser curioso e perguntador. Para os adultos
(pais, cuidadores e professores) cada volume inclui uma pequena biografia do pensador
retratado, além da sugestão de outras leituras para aprofundar o conhecimento. As his-
tórias são bilíngues (português/francês), pois a coleção tem como propósito alargar as
fronteiras da criança, mostrando-lhe que a mesma história pode ser lida em outra língua.
Também visando estimular o pensamento crítico e uma relação ser humano/natureza
mais sadia, a Coleção Filosofinhos/Les Petits Philosophes é impressa em papel reciclado.

Coleção Filosofinhos
autores: Cauê Borges, Celso Gutfreind, Maria de Nazareth Agra Hassen,
Pascal Reuillard e Francisco Juska Filho (ilustrações)
32 páginas Bilíngue (português/francês)
ISBNs: René Descartes 978-85-86225-64-2, Sigmund Freud 978-85-86225-63-5,
Sócrates 978-85-86225-68-0, Sartre & Simone 978-85-86225-40-1,
Platão 978-85-86225-91-8, Karl Marx 978-85-86225-98-7,
Immanuel Kant 978-85-86225-76-5, Jean-Jacques Rousseau 978-85-86225-83-3.

Livro Coordenação Pedagógica.indb 411 22/10/2018 14:27:58


412

O atual regime de propriedade intelectual incide,


direta e radicalmente, sobre tudo aquilo que cha-
mamos cultura, o objeto clássico do fazer antro-
pológico. A investigação da efervescência cultural
e política em torno dos direitos de propriedade
intelectual representa um dos desafios mais ins-
tigantes das ciências sociais contemporâneas, a
despeito de o debate nessa área ainda ser incipiente
no Brasil. Este livro é organizado a partir de quatro
eixos que partem do inverso de regulamentação de
um regime restritivo de propriedade intelectual,
focando no direito de acesso à saúde, ao conheci-
mento, à informação, à alimentação, enfim, a viver
neste mundo.

Do regime de propriedade intelectual:


estudos antropológicos
organizadoras: Ondina Fachel Leal e Rebeca Hennemann Vergara de Souza
288 páginas  ISBN 978-85-86225-65-9

Analisar uma realidade requer a utilização de


determinadas ferramentas. Da mesma forma,
quem elabora projetos, planeja, reflete e avalia
ações necessita de algum tipo de instrumental.
Escolher os instrumentos para a finalização mais
adequada de cada um destes desafios é um dos pri-
meiros passos para a sua resolução. Para dar uma
visão geral do conjunto de instrumentos e, assim,
auxiliar na sua escolha consciente é que surgiu este
livro. Mas ele vai além, ao partir do pressuposto de
que os métodos devem perder a aura mítica que
muitos lhes atribuem. Aqui se defende a ideia de
que os instrumentos são meros meios para que se
discuta o que é central na questão da participação:
as disputas pelo poder.

Metodologia participativa:
uma introdução a 29 instrumentos - 3º edição
organizador: Markus Brose
2ª edição  328 páginas  ISBN: 978-85-86225-66-6

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413

As condições sociais na América Latina estão mu-


dando significativamente. A redemocratização, a
eleição de governos progressistas e as novas dinâ-
micas econômicas permitiram reduzir a pobreza
extrema, ampliar a democracia participativa e
redefinir o foco das políticas públicas. Mas, ao
mesmo tempo, novos problemas se acrescentam ao
quadro social, como é o caso do peso do envelheci-
mento da população, das formas de acesso à Justiça
ou da eficiência e eficácia das políticas públicas
depois do desmantelamento do aparelho de Estado
pelas minorias neoliberais. O pensamento social
crítico latino-americano apresenta indispensáveis
contribuições para a correta identificação desses
problemas e para a busca de soluções.

A construção da justiça social na América Latina


organizadores: Antonio David Cattani, Laura Mota Díaz e Néstor Cohen
336 páginas ISBN 978-85-86225-81-9

Vivemos em uma era de estagnação, empobreci-


mento rápido, aumento das desigualdades e de-
sastres socioecológicos. No discurso dominante,
esses são efeitos da crise econômica, da falta de
crescimento ou do subdesenvolvimento. Este livro
argumenta que o crescimento é a causa desses pro-
blemas e que ele se tornou antieconômico, ecolo-
gicamente insustentável e intrinsecamente injusto.
Quando a linguagem em uso é inadequada para
dizer o que precisa ser dito, é hora de um novo
vocabulário. O livro é a referência para se pensar
a viabilidade do ser humano, viabilidade para si,
para o futuro da economia e para o planeta.

Decrescimento: vocabulário para um novo mundo


organizadores: Giacomo D’Alisa, Federico Demaria, Giorgos Kallis
312 páginas ISBN 978-85-86225-99-4

Livro Coordenação Pedagógica.indb 413 22/10/2018 14:27:58


414

As manifestações de rua que sacudiram o Brasil


careciam de análises mais profundas. Com o dis-
tanciamento temporal, trabalhos sérios surgem
em diferentes campos do conhecimento, dos
quais se espera o discernimento e a consciên­cia
capazes de interpretar adequadamente as dinâ-
micas sociais e políticas. É sobre o arsenal de
possibilidades trazido pelas manifestações e suas
interpretações que os articulistas presentes nesta
coletânea se debruçam, oferecendo suas análises
fundamentadas nas ciências sociais. Não é uma
visão finalizada, tampouco uníssona, que enseja
mesmo aqui visões distintas que permitem ao
leitor formar sua própria opinião a respeito desse
recente período de nossa história.

#protestos:
análises das ciências sociais
organizador: Antonio David Cattan
120 páginas ISBN 978-85-86225-85-7

Como são governados os mais de cinco mil muni-


cípios brasileiros ainda constitui uma caixa-preta.
Boa parte das controvérsias pode ser creditada a
interpretações sobre a política local e suas conexões
com governos estaduais e federal formuladas na
primeira metade do século passado. Uma clara
identificação de padrões de governo municipal,
as conexões e influências recíprocas entre insti-
tuições políticas e políticas públicas municipais
e as diferenças existentes entre as administrações
municipais, assim como as mudanças decorrentes
da Constituição de 1988 ainda não haviam sido
tratadas com a agudeza como o foram neste livro.

A política, as políticas e os controles:


como são governadas as cidades brasileiras
organizadores: André Marenco, Maria Izabel Noll
216 páginas ISBN 978-85-9516-009-5

Livro Coordenação Pedagógica.indb 414 22/10/2018 14:27:58


415

Ricos se apropriando dos bens comuns como nunca


na história da humanidade. Milhões de pessoas tra-
balhando para enriquecer uns poucos; milhões de
trabalhadores desperdiçando parte importante de suas
vidas para que privilegiados possam gozar do bom e
do melhor de forma irresponsável e sem merecimento.
Tradições, religiões e ideologias contribuem para es-
conder as bases da exploração e as origens de fortunas
desmedidas. Esta obra analisa como isso acontece na
atualidade respondendo algumas perguntas essenciais:
Por que raramente se estudam os multimilionários?
Riqueza e pobreza são fenômenos separados ou existe
uma dimensão relacional entre eles? Por que a posse da
riqueza extrema é mitificada e mistificada? As grandes
fortunas provêm da competência exercida em merca-
dos livres ou do poder obtido graças ao capital concentrado? Elas contribuem para o bem
comum ou corrompem as normas morais da sociedade, fragilizam a economia e deturpam
a democracia? É possível promover uma repartição mais justa da renda?

Ricos, podres de ricos - 2º edição


autor: Antonio David Cattani Ilustrações de Edgar Vasques
80 páginas ISBN 978-85-9516-006-4

Retire a máscara dos principais inimigos da socie-


dade justa e descubra seus diversos mecanismos de
proteção e ocultamento. Conheça a “Bolsa Rico”,
que transfere recursos públicos para milionários
rentistas, saiba por que o sistema tributário, al-
tamente regressivo, é moldado para privilegiar o
capital e facilitar a apropriação privada da riqueza,
faça um tour pelos paraísos fiscais e examine legis-
lações que favorecem práticas criminosas. Explore
essas e outras artimanhas pouco conhecidas da
realidade brasileira que nos permitem compre-
ender as contradições que marcam o país, sexta
potência econômica do planeta, mas ocupando
uma vexatória posição entre os dez países com
maior desigualdade social.

A sociedade justa e seus inimigos - 3º edição


organizadores: Antonio David Cattani e Marcelo Ramos Oliveira
184 páginas  ISBN 978-85-9516-014-9

Livro Coordenação Pedagógica.indb 415 22/10/2018 14:27:58


416

Os direitos humanos vêm assumindo cada vez


mais importância no cenário mundial, lamen-
tavelmente não pela sua promoção e proteção,
mas pelas violações constantes a que são subme-
tidos no mundo inteiro. A publicação que aqui
apresentamos enfrenta algumas das questões
contemporâneas mais relevantes no campo dos
direitos humanos passada a comemoração do
sexagésimo aniversário da Declaração Universal
de 1948. A melhor maneira para homenagear o
evento é o exercício da crítica construtiva que
aponta as falhas, mas também os caminhos
alternativos e não perde a esperança e o hori-
zonte da utopia.

Direitos humanos em uma época de insegurança


organizadores: Emilio Santoro, Gustavo Barbosa de Mesquita Batista, Maria de
Nazaré Tavares Zenaide e Raffaella Greco Tonegutti
440 páginas ISBN 978-85-86225-57-4

O bem-estar sexual e reprodutivo ganhou


reconhecimento como direito básico, consa-
grado no direito internacional. Mesmo assim,
a realidade é diferente, dado que a sociedade,
os programas de saúde e as agências interna-
cionais estão entrincheirados em velhos mo-
delos. Para que se concretizem esses direitos
e se mudem essas realidades, são necessárias
transformações fundamentais no pensamento e
na prática. O livro retrata uma ampla gama de
exemplos inovadores espalhados pelo mundo.
Tudo começa pela necessidade de envolver
mais diretamente mulheres, homens e jovens na
determinação dos caminhos para a mudança,
complexa, mas não impossível.

Direitos sexuais e reprodutivos: experiências com abordagens participativas


organizadoras: Andrea Cornwall e Alice Welbourn
336 páginas ISBN: 85-86225-29-0

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