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Direitos autorais © 2022 INDIANA MASSARDO Todos os direitos

reservados

Os personagens e eventos retratados neste livro são fictícios.


Qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou falecidas, é coincidência
e não é intencional por parte da autora.

Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou armazenada em


um sistema de recuperação, ou transmitida de qualquer forma ou por
qualquer meio, eletrônico, mecânico, fotocópia, gravação ou outro, sem a
permissão expressa por escrito da autora/editora.

Design da capa por Indiana Massardo

Revisado e preparado por Elen Arcangelo

Betado por Mayara Machado

 
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
SINOPSE
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
Í
CAPÍTULO 36
CAPÍTULO 37
CAPÍTULO 38
CAPÍTULO 39
CAPÍTULO 40
EPÍLOGO
AGRADECIMENTOS
APRESENTAÇÃO

Malícia é meu sexto livro publicado, é um volume único.


Esta obra faz parte de uma máfia separada dos livros da série
Caminhos de um Capo, mas está no mesmo universo, portanto alguns
personagens que já apareceram nos outros livros podem ser mencionados
ou até surgirem aqui, porém não precisa ter lido a outra série para
compreender esta história.
Malícia se passa na cidade de Boston, no ano de 2024, dentro da
máfia comandada pela Família de Angelis.
Espero que goste da leitura e, se quiser, pode compartilhar sua
experiência comigo nas redes sociais, meu Instagram é
@autoraindymassardo e fico muito feliz em receber mensagens dos leitores.
Convido-te a conhecer meus outros livros publicados na Amazon, que
são Romances Dark de máfia. A série Caminhos de um Capo já está
completa e conta com três livros: NASCIDA PARA PROTEGER,
NASCIDO PARA LIDERAR e NASCIDO PARA AMAR, assim como o
spin off A PSICÓLOGA DA MÁFIA.
Nesta máfia os cargos de poder são:
Don: O chefe que comanda a Família e maior autoridade na
hierarquia.
Consigliere: é o conselheiro do Don e o segundo em comando, no
caso da ausência do Don.
Underbosses ou capitães: são os homens de confiança que têm
controle de uma região específica dominada pela Família, reportam
diretamente ao Don.
Chefes: são responsáveis por controlar os soldados e reportam
diretamente ao Underbosses da sua região.
Soldados: homens feitos que fazem os trabalhos menores, a
segurança e a limpeza, entre outros, e se reportam diretamente aos Chefes
da sua região.
Executor: é a pessoa responsável por cobrar dívidas e tirar
informações dos inimigos ou traidores. Não é um cargo, mas sim uma
medalha de honra que indica frieza e poder dentro da máfia.
AVISO: Este é um Romance Dark com temática de máfia e contém
assuntos polêmicos que podem ser sensíveis para alguns leitores. Esta é
uma obra de ficção destinada a maiores de 18 anos. A autora não apoia e
nem tolera esse tipo de comportamento. Não leia se não se sente confortável
com isso.
Gatilhos: violência extrema, tortura, morte, processo de luto,
tentativa de suicídio, cenas de sexo explícito, uso de drogas, violência
contra a mulher não descritiva.
SINOPSE

O Executor, a Princesinha da máfia e o Outsider virgem irão se


envolver e formar um trisal inesperado.
Gabriel Esposito é o executor na Família de Angelis, que encontrou o amor
da sua vida na irmã mais nova do Don, Alícia de Angelis, uma patricinha
mimada que sabe usar uma arma tão bem quanto um cartão de crédito.
Dona da boate Malícia e também executora, forma uma unidade
indestrutível com o homem mais velho e traumatizado que mudou sua vida
inteira.
Ela exigiu seu amor, ele entregou o seu mundo todo. Ele a treinou e ensinou
tudo o que ela precisava saber para andar ao seu lado. Nada é capaz de
abalá-los, até que um garoto atrai a atenção do casal.
Chace King é tímido, inocente e virgem e, para cuidar da mãe doente,
pegou dinheiro com a máfia. Como pagamento da sua dívida, aceitou
trabalhar como garçom e stripper na Malícia, sem saber onde estava se
metendo quando atraiu a atenção de pessoas de quem deveria manter
distância.
O que poderia ter terminado em tragédia resultou em um acordo inusitado
com uma mulher perigosa e o seu namorado. E, por mais que eles tentem
negar, a atração inicial vai se tornar algo mais complexo, e os três
precisarão lidar com os novos sentimentos.
Atenção: Este é um livro sobre trisal com uma mulher e dois homens,
todos os personagens são bissexuais e se envolvem romanticamente.
Não é uma história sobre casais, triângulos amorosos ou mocinhas que
precisam escolher entre um ou outro.

NÃO TEM ESCOLHA!


Dedico esse livro a todos que, assim como eu, já tiveram fantasias com
relacionamentos um pouco fora do convencional.
(A autora bissexual aqui baseou muita coisa desta obra nos próprios
sonhos...)
CAPÍTULO 1

Alícia
 
— Não! Por favor, não faça isso, ela é só uma criança. — Escuto a
voz da mamãe e ela parece estar chorando, mas não consigo ver nada
através da venda que cobre meus olhos. — Ela não tem culpa de nada...
Um barulho alto de algo caindo me assusta e quero gritar, mas eles
colocaram uma fita na minha boca. Sinto meu coração acelerar e as
lágrimas ensoparem o tecido, tento me mover e não consigo, eu estou com
muito medo.
— Fique longe dela, seu verme imundo — agora é o papai quem
ordena, ele não está chorando como a mamãe, sua voz é firme e poderosa, o
papai é poderoso. — Se colocar as mãos na minha filha...
— Vai fazer o quê? — outra voz debocha. Diferente das que ouvi
antes, essa é mais calma e grossa, como a do meu irmão mais velho, então
ele começa a rir e o som me faz arrepiar — Está com medo de que a sua
menininha descubra o lixo humano que é o pai dela?
— Ali, fica calma, minha filha, não escute nada do que estão falando
— mamãe suplica e quero fechar meus ouvidos, como ela sempre me pede
para fazer quando tem discussão lá em casa, ou quando o papai e meu irmão
começam a falar de trabalho e eu não devo ouvir.
— Ela não sabe? — o homem questiona e então sinto mãos grandes e
calejadas apertando meus braços até doer e me fazendo ficar de pé. Eles
amarraram minhas mãos nas costas, mas não minhas pernas. — Está na
hora de ver quem o papai e a mamãe realmente são, e o que acontece com
gente assim.
— TIRA AS MÃOS DELA! — papai grita com raiva, muita raiva.
— Vem, menina, vou te ensinar uma lição que você jamais irá
esquecer — o homem sussurra em meu ouvido. Sinto seu rosto próximo,
algo pinica minha bochecha antes do tecido afrouxar e a luz branca do
ambiente atingir meus olhos.
Por um momento não consigo ver nada, fiquei tanto tempo no escuro
que pisco várias vezes até me acostumar à claridade, e então eu os vejo.
Papai está amarrado com os braços acima da cabeça, pendurado em
um gancho na parede, seu terno, antes limpo e perfeitamente alinhado,
agora está rasgado e imundo.
Nunca vi o papai sujo assim.
E ele está sem sapatos, onde o papai deixou os sapatos? Ele vai pegar
um resfriado, a mamãe sempre me manda pôr calçado para não ficar doente.
— Alícia, vai ficar tudo bem — papai tenta falar com calma, mas ele
continua bravo. — Deixe-a ir, farei o que quiser, mas deixei minha esposa e
minha filha saírem daqui.
— Don Vitório de Angelis, o grande líder da família mais poderosa de
Boston, tem a cara de pau de implorar por misericórdia. — Viro meu rosto
para encontrar o dono da voz, é um homem de cabelos brancos, parece mais
velho que o papai, ele tem mais rugas no rosto. — Olá, criança, não se
preocupe, sou um antigo amigo do seu pai.
Ele aperta ainda mais meu braço e suspiro de dor, tento sair da sua
mão, mas não consigo, as cordas em meus pulsos estão ajustadas demais e,
não sei, minhas pernas parecem não querer responder.
— Suas mãos estão doendo? — questiona e concordo com a cabeça.
— Muito bem, eu te solto se prometer ser uma boa menina e ficar quietinha,
você promete?
Olho para o papai, seus olhos verdes encaram os meus e parece que
ele está assustado agora, se o papai está com medo é porque esse homem é
mal, então devo fazer o que ele fala.
Balanço a cabeça para cima e para baixo, as lágrimas escorrem ainda
mais pelo meu rosto e eu não consigo parar de chorar. Sinto o alívio nos
meus pulsos quando ele me solta, mas dura pouco porque logo suas mãos
apertam meu braço e ele me empurra contra a parede. O movimento brusco
me faz perder o equilíbrio e caio no chão com força.
Escuto a mamãe gritar.
Viro-me para encontrar seus olhos azuis assustados, ela está com o
rosto inchado e sujo, o cabelo preto, sempre bem arrumado e penteado,
agora parece um ninho de passarinho, como ela fala que o meu fica de
manhã, ao acordar.
Mamãe ainda está com o vestido rosa escuro que ela escolheu para o
casamento do meu irmão, mas assim como as roupas do papai, seu vestido
está manchado, mamãe nunca usou uma roupa que não estivesse impecável.
Ela grita ainda mais quando o homem chega próximo de mim, isso
parece enfurecê-lo, vejo seus olhos revirarem e ele tira uma arma de dentro
do casaco.
Já vi muitas assim, o papai e meus irmãos vivem armados, mas eu sou
proibida de encostar em uma. “É perigoso”, eles dizem. Se é perigoso por
que eles têm?
— NÃO, ALEJANDRO, NÃO! — papai grita.
Só tenho tempo para olhar para a mamãe, então escuto um barulho
muito alto.
Um tiro.
E a voz da mamãe se cala.
Meu pai berra com ainda mais raiva, porém não consigo desviar
minha atenção da mamãe.
Ela caiu para o lado, seus olhos azuis, da mesma cor dos de Matteo,
meu irmão do meio, ainda estão abertos, mas tem uma marca vermelha logo
acima, na sua testa.
Ela não se move.
Sua boca está um pouco aberta.
Vejo um líquido bem escuro se acumular ao lado do rosto da mamãe.
O chão é cinza claro e o líquido é ainda mais escuro que o rosa do seu
vestido, e está manchando o tecido.
— Filha — papai chama, mas não consigo parar de olhar para a
mamãe. — Olha aqui, Ali. — O apelido me faz virar o rosto e encarar meu
pai, ele nunca me chama de Ali, só a mamãe e meus irmãos. — Fecha os
olhos, filha, vai ficar tudo bem.
Encaro o papai e ele está com o rosto vermelho, como se fosse chorar,
mas o papai não chora.
— A mamãe está dormindo? — Vejo o papai respirar fundo, será que
ele ficou bravo com a pergunta?
— Sim, amor — papai responde.
— Não criança, sua mamãe está morta — o homem anuncia e começa
a rir, mas não é uma risada de alegria, o som me deixa com medo. — Acha
mesmo que vou poupar sua filha?
Ele disse que a mamãe morreu? Não, o papai disse que ela está
dormindo e ele não mente, esse senhor deve estar se confundindo.
O velho caminha até o papai e fica muito perto dele, seu corpo magro
bloqueia minha visão, só vejo suas costas subindo e descendo, a mão direita
ainda segura a arma enquanto a esquerda está fechada.
— Deixe-a ir, ela não tem nada a ver com a nossa guerra. — Papai é
corajoso e o enfrenta.
— Ela é o motivo da guerra.
Então tudo acontece bem rápido, acho que o papai bateu com a
cabeça no velho, porque ele perde o equilíbrio e consigo ver o papai dando
um chute na mão dele.
A arma que segurava cai no chão, bem nos meus pés e faço o que vi
em um filme que assisti com meus irmãos. Pego a arma, é um pouco
pesada, então preciso usar as duas mãos, ergo em direção ao velho que se
virou de frente para mim, não penso em nada quando fecho os olhos, levo o
dedo ao gatilho e aperto.
Não consigo manter minha mão firme quando o som do primeiro tiro
irrompe pela sala, a arma lança meus braços para trás, mas volto a segurar
com força e atiro de novo.
Abro os olhos com calma, olho para frente e vejo o homem velho
caído no chão, o rosto para baixo, aquele mesmo líquido que sai da mamãe
escorre dele também.
— Alícia. — Ergo o olhar e encontro o do papai, ele parece mais
calmo agora. — Filha, você precisa fazer o que o papai vai te falar agora,
tudo bem? — Ele me espera responder, mas não sei o que quer que eu faça.
— Ali, levanta... Agora!
Com dificuldade consigo me levantar, minhas mãos começam a
tremer, então jogo a arma para longe e vou até o papai. Desvio do velho
caído no chão, com medo dele acordar e me machucar de novo.
— No bolso do casado dele... tem um celular... — papai aponta com a
cabeça para o velho — pega o aparelho, filha.
Com relutância me abaixo e faço o que pede e ergo para entregar ao
papai, mas ele move a cabeça de um lado para o outro.
— Não consigo digitar agora, preciso que ligue para o seu irmão… —
a voz do papai vai ficando mais fraca enquanto ele me dita os números,
digito no aparelho e faço a chamada. — Aperta no símbolo do alto-falante,
querida.
Aperto no símbolo e logo a voz do meu irmão mais velho irrompe
pelo aparelho, ele parece confuso e tem muito barulho na chamada.
— Ali, o que... — meu irmão fala, mas aponto o telefone para o
papai, como ele ordenou.
— Lorenzo, Alejandro... — Papai começa a tossir e gotas vermelhas
saem da sua boca.
— Nós estamos chegando, pai, Gabriel já está no prédio — meu
irmão mais velho fala alto e a notícia de que ele está vindo me deixa mais
calma, logo Lorenzo vai tirar a gente daqui.
— Alícia... Cuide dela... — A cabeça do papai pende para frente e ele
fecha os olhos.
— Papai? — chamo baixinho, mas ele não responde. — Papai, o que
eu faço agora? — pergunto, mas ele não abre os olhos. — Acho que ele
dormiu. Você vem buscar a gente, Lo?
Meu irmão não responde, talvez a ligação tenha caído, mas ainda
escuto vozes, só não consigo identificar o que falam. Acho que uma delas é
do Matteo, meu outro irmão.
Olho para o papai de novo, não quero acordá-lo, ele fica muito bravo
se alguém o acorda. “Papai trabalha muito e precisa dormir.” É o que a
mamãe sempre fala.
— Ali — meu irmão chama e volto minha atenção ao telefone. —
Gabriel está chegando, fica com ele, tudo bem? Não desliga o telefone,
senta no chão longe do papai, e não olha para ele. Pode fazer isso por mim?
— Sim, só vem logo, eu estou com frio — peço e me sento do outro
lado da sala, virada para a parede, como se estivesse de castigo. Aliso meu
vestido branco de dama de honra e vejo que também está sujo.
Droga, mamãe me pediu para cuidar dele, pelo menos até a
cerimônia. A noiva do meu irmão vai ficar zangada se eu entrar com o
vestido sujo para entregar as alianças.
Eu espero que ela não brigue comigo, ela parece ser legal. Pelo
menos, nas vezes em que a vi quando fomos provar os vestidos para o
casamento, ela sorriu para mim.
Penso no meu irmão e em como a mamãe e o papai estavam nervosos
para o casamento dele, eu não entendi bem o porquê, mas de uma hora para
a outra eles começaram a preparar tudo. Andrea foi lá em casa com a sua
família só duas vezes e depois eu a vi na loja de vestidos.
Ela é bem bonita e educada, e a mamãe disse que meninas precisam
ser assim. Eu tento, mas fica difícil às vezes, ainda mais quando as irmãs de
Andrea me olharam torto na loja de vestidos. Só porque elas são alguns
anos mais velhas que eu, não quiseram brincar comigo enquanto a mamãe
provava a roupa.
Lembrar do casamento faz minha barriga roncar, eu só tomei café da
manhã. Não sei quanto tempo faz que estamos aqui, mas parece uma
eternidade. Penso na Alice do meu livro e no que ela faria no meu lugar, ela
teria sorte e encontraria uma forma de chegar até o País das Maravilhas,
Alice sempre consegue fugir da vida real.
Um tempo depois escuto uma fechadura abrir, olho para uma porta
em que não havia reparado até agora, porque é da mesma cor da sala, e
assim que ela é aberta Gabriel entra correndo.
Primeiro ele não me vê, seus olhos passam onde a mamãe está, depois
para o papai, então para o velho no chão, e só depois seu olhar encontra o
meu. Sinto as lágrimas brotarem novamente, dessa vez de alívio.
Gabriel veio nos salvar.
Ele é forte e agora tudo vai ficar bem.
 
***
 
Abro os olhos rápido demais e pisco várias vezes até que se
acostumem com a claridade do sol que entra pela janela. Por que nunca
lembramos de fechar as malditas cortinas à noite?
Sinto o tecido do travesseiro gelado e úmido e sei que são minhas
lágrimas. As imagens, que agora são meras lembranças e já começam a se
dissipar da minha mente, fazem meu coração apertar em uma sensação de
dor já familiar.
É o mesmo pesadelo de sempre.
São as mesmas memórias.
Assombrações do passado marcadas a ferro em minha mente.
Tateio a cama até encontrar o que procuro, meus dedos repousam no
peito quente e firme do homem ao meu lado. Sua pele, antes clara, agora
está quase toda coberta por desenhos em preto e branco, tatuagens feitas por
mim para disfarçar as marcas do seu passado.
As figuras cobrem cicatrizes antigas de queimaduras que ainda podem
ser vistas entre as linhas, passo o dedo por seu abdômen, o local onde fiz a
última tatuagem, a pele ainda está em processo de cicatrização,
desprendendo partes de tecido morto que são substituídos por uma camada
nova e mais bonita.
Meu olhar percorre seus braços fortes, um está dobrado acima da
cabeça e reparo nos fios mais claros que se misturam com os pretos dos
seus cabelos curtos e bagunçados, o outro braço está tão próximo ao meu
corpo que sinto seu calor. Em algum momento durante a noite devo ter me
virado e saído do seu abraço.
O lençol branco de cetim que cobre o meu corpo faz um péssimo
serviço em esconder o dele, que está deitado de barriga para cima com a
ereção coberta, mas as pernas fortes e musculosas ainda à vista.
Devo ter roubado o lençol novamente, mas ele não se importa,
enquanto quase congelo durante a noite, seu corpo sempre está quente,
mesmo completamente pelado.
Assisto seu peito subindo e descendo, a respiração tranquila e
harmoniosa me faz querer me aconchegar ali e voltar a dormir. Travo uma
batalha interna entre continuar admirando seu sono ou deitar sobre ele e
correr o risco de acordá-lo.
— Precisa parar de me olhar assim logo de manhã, Ali. — A voz
grossa de Gabriel é como música para os meus ouvidos, ele limpa a
garganta e se vira de frente para mim. — Bom dia, amor.
Ergo a cabeça para que seu braço se encaixe no vão do meu pescoço e
deixo que me puxe para seu peito, aninhando-me em meu lugar favorito.
Sinto sua boca no topo da minha cabeça e o beijo delicado me faz sorrir.
— Gosto de te ver dormir — confesso e fecho os olhos, inspiro
profundamente o aroma do seu perfume amadeirado e forte, misturado com
o cheiro de Gabriel. — Parece tão calmo e inofensivo, como um coelhinho.
Sua risada faz o peito vibrar e meus lábios se abrem ainda mais, passo
a mão pelo seu braço e acaricio os músculos fortes, vejo o lençol descer
ainda mais da sua cintura, revelando a deliciosa ereção matinal.
— Gostaria de dizer o mesmo, mas você passa a noite toda se
debatendo — Gabriel acaricia a curva do meu corpo e desliza o lençol para
baixo, revelando meus seios desnudos e os mamilos eriçados —, é uma
guerreira até dormindo.
Ele não precisa falar nada, sinto sua respiração mais pesada quando
seus lábios beijam meu rosto, levanto mais a cabeça, dando-lhe acesso à
minha boca, que ele toma em um beijo calmo e carinhoso. A barba, que ele
mantém aparada e eu adoro, raspa em minha pele, fazendo-me arrepiar.
Desço minha mão pelo abdômen definido até seu membro e acaricio a
pontinha, sentindo a umidade do pré-gozo, que espalho antes de acariciar a
base. Gabriel contém um gemido e morde meu lábio inferior, empurrando
levemente o quadril contra minha mão.
Sinto a sua mão deslizar até o meio das minhas pernas e erguer uma
para dar-lhe acesso à minha boceta. Sei que estou molhada, desde o
momento em que acordei ao lado do meu homem senti o familiar
formigamento em minha boceta.
Deixo que seus dedos me provoquem por um tempo, deslizando do
clitóris para minha entrada em sintonia com a forma que masturbo seu pau,
mas quando sinto que quero mais, coloco a mão em seu peito e o forço a
deitar de costas, então me levanto e monto nele, com uma perna de cada
lado do seu corpo. Posiciono seu membro duro em minha boceta, e me
abaixo de uma vez só.
— Caralho, amor — Gabriel solta em um rosnado sedento e leva as
mãos para a minha cintura, ajudando-me a controlar os movimentos dos
meus quadris. Seus olhos azuis ficam mais claros pela manhã e consigo ver
as pequenas manchas mais escuras que pintam uma tela que só ele tem. —
Rebola gostoso — ordena, prendendo o lábio inferior com os dentes para
conter um gemido. — Isso, porra... assim...
Mantenho meu olhar firme em seu rosto, analiso cada uma das rugas
de expressão que se intensificam enquanto ele morde o lábio inferior para
conter um gemido. Eu amo assistir esse homem sentindo prazer, e é por isso
que rebolo com mais intensidade. Segurando-me em seu peito, cravo
minhas unhas na pele tatuada e me inclino para tomar a sua boca.
Amo estar por cima, no controle, ainda mais com Gabriel.
Nossas línguas se encontram em um beijo mais forte e desesperado, já
começo a sentir o orgasmo se formando, não controlo mais os gemidos
quando ele leva a mão entre nós e estimula meu clitóris inchado e sensível.
— Assim, amor, goza no meu pau — pede e já não consigo mais
manter o ritmo, então ele assume o controle, socando fundo dentro de mim,
me fazendo pular. Gabriel atinge aquele ponto que me faz gritar feito uma
vadia.
E é delicioso.
Entrego-me ao prazer em um orgasmo poderoso que faz minhas
pernas tremerem ao redor do seu corpo, ele sente meu canal apertar e
aumenta ainda mais a velocidade das estocadas, o olhar selvagem e
descontrolado ainda em mim quando goza chamando meu nome.
Sinto seu membro pulsar na minha boceta e me encher com a sua
porra quente enquanto ele desfruta do orgasmo, abraçando-me ainda mais
forte. Beija meu rosto carinhosamente até que nossas respirações voltem ao
normal.
— Melhor café da manhã do mundo — brinco e sou agraciada com
sua risada. — Vamos tomar um banho, meu irmão vai te matar se
descermos só quando escurecer de novo.
— Droga. — Gabriel pega o celular na mesa ao lado da cama. — São
3h da tarde, ele vai me matar de qualquer forma.
— Pelo menos vai morrer bem fodido — digo e me desvencilho do
seu abraço com um sorriso no rosto, que ele imita ao me assistir andar até o
banheiro. Faço questão de rebolar minha bunda, já que sei que ele está me
olhando.
Eu tenho uma certeza na vida e é a de que quando estamos juntos,
Gabriel está sempre com os olhos em mim.
CAPÍTULO 2

Alícia
 
Depois de mais uma rapidinha no chuveiro, Gabriel e eu descemos
para comer alguma coisa. Como sempre acordamos tarde, as cozinheiras já
deixam nosso almoço separado. Não demora muito para que meu irmão nos
encontre.
Lorenzo, ou Don Lorenzo de Angelis, como é conhecido por todos,
caminha até a mesa de jantar com o semblante fechado, tenho certeza de
que está se controlando para não gritar.
— Finalmente os pombinhos resolveram dar o ar da graça — meu
irmão fala calmamente e se apoia na mesa com os braços cruzados em
frente ao corpo, usando um terno de três peças completamente preto e
impecável, sem um único amassado.
— Não vem com essa, irmão, já deveria ter se acostumado. Sabe que
chegamos quase de manhã, não tem como acordar cedo se fomos dormir
com o dia já claro — retruco e sorrio para ele, sou a única que meu irmão
aceita que fale assim, sem controlar cada palavra. — Diz logo o que você
tem para a gente hoje.
Gabriel passa a mão na minha coxa e aperta levemente, em uma falha
tentativa de controlar minha língua, mas eu sei que lá no fundo ele gostaria
de poder responder ao meu irmão da mesma forma que eu faço.
— Fui informado de um empréstimo com o pagamento atrasado,
preciso que cobre o indivíduo hoje à noite — Lorenzo ordena e Gabriel
concorda com um balançar de cabeça. — Alícia, um dos nossos soldados
informou ter apreendido droga do Cartel na tua boate, descubra quem
estava vendendo isso em nosso território.
A informação me pega de surpresa.
— Quando foi que isso aconteceu? — questiono seriamente, não
acredito que alguém teve a coragem de contrabandear droga na minha
boate, ainda mais do Cartel.
— Ontem, e é melhor deixar o Gabriel resolver com o devedor
sozinho enquanto você avalia as câmeras de segurança.
— Não me diga como fazer meu trabalho — provoco, mas ele não
responde. Lorenzo sabe quando vale a pena me repreender, e este não é o
momento.
— E Gabriel, eu quero a dívida paga hoje, se não for em dinheiro use-
o de exemplo para que as pessoas entendam o que acontece quando não
cumprem a sua palavra.
— Sim, Don Lorenzo — Gabriel responde ao meu lado e meu irmão
sai, deixando-nos sozinhos novamente.
— Sim, Don Lorenzo — repito suas palavras com a voz mais fina e
debochada para fazê-lo sorrir. — Você pode ser menos cachorrinho dele?
— É meu trabalho. — Dá de ombros, mas seu lábio se contorce em
um sorriso e me jogo sentada de lado em seu colo, passo as mãos por seus
ombros e ele me segura pela cintura. — Vai ficar bem sem mim hoje? Vou
reforçar a segurança até que eu chegue.
Respondo com um “sim” e beijo seus lábios levemente. Desde o
momento em que ficamos juntos, depois que voltei da Inglaterra, nunca
mais nos separamos por muito tempo. E digo isso de forma literal, Gabriel
me leva com ele em todos os trabalhos e está sempre comigo na boate.
Nós só funcionamos juntos, nossa relação é uma simbiose com
benefícios mútuos.
Ele me treinou para ser sua mão direita, me ensinou a dirigir, lutar,
atirar e torturar. Assim, quando seus serviços de executor são solicitados,
ele não precisa se preocupar comigo, porque estarei ao seu lado.
Vivemos com meus dois irmãos, as esposas deles e os dois pivetes
que saíram de uma delas, todos juntos na mansão da minha família. Depois
que meus pais foram assassinados, meus irmãos ficaram responsáveis por
mim.
Lorenzo, com 22 anos, se casou logo depois do enterro para assumir o
lugar do nosso pai. Com o peso de ser o herdeiro em suas costas, não teve
como lidar comigo e com meu outro irmão, Matteo, que tinha acabado de
completar 18 anos.
Eles não faziam ideia de como educar ou controlar uma menina de 8
anos de que havia acabado de perder os pais. Por pena ou dó, ninguém
ousava me contradizer em nada, fui mimada de todas as formas possíveis e
protegida com a mesma intensidade, até que não aguentaram mais e me
enviaram para a Inglaterra, em uma vã tentativa de que a Família Esposito
— os pais de Gabriel — conseguisse me educar.
Depois de alguns anos fugi de lá e retornei a Boston, com dezenove
anos eu já sabia quais eram as tradições em nossa família e imaginei que
meus irmãos teriam um casamento arranjado esperando por mim, porém
não foi o que aconteceu.
Eles me deixaram livre para escolher meu futuro.
Assim, pedi duas coisas a Don Lorenzo de Angelis: uma boate
construída como eu queria e gerenciada somente por mim, local que nomeei
MALÍCIA em minha própria homenagem, é claro. Meu irmão aceitou sem
lutar, afinal eu poderia ter pedido coisas muito piores, mas só queria um
lugar para chamar de meu. Sua única exigência foi que a Família fornecesse
proteção a mim e ao local.
O segundo pedido foi Gabriel Esposito, seu melhor amigo e executor
da máfia.
Este foi um pouco mais difícil de conseguir, mas como tudo em
minha vida, eu sempre tenho o que quero, e nunca me esforcei tanto para
conquistar alguém como fiz com ele. Obviamente funcionou, já que
estamos juntos desde então.
Ele é meu em um sentido bem possessivo da palavra, Gabriel é o
único que realmente me entende, já que ambos temos traumas do passado
que só ficam mais leves quando estamos juntos.
Chego à Malícia antes dos primeiros funcionários, como o sol ainda
está alto lá fora, constato que terei provavelmente duas horas sozinha aqui
até que o pessoal comece a bater o ponto. Como não é dia de ensaio dos
dançarinos, eles também chegarão mais tarde.
Essa boate é meu reino e, como uma boa rainha, conheço cada canto
desse local, fiz parte do projeto e elaborei todos os espaços, até os
corredores de serviço e as passagens mais estreitas. Tudo aqui dentro foi
pensado e planejado por mim para ser minha “toca do coelho”, que dá
acesso ao País das Maravilhas.
Os funcionários mais novos e que trabalham aqui há menos tempo
acham que sou uma garota de 24 anos mimada e imatura, que acha que sabe
algo da vida.
Já quem está aqui há mais tempo tem a certeza de que os boatos estão
certos, mas que tem muito mais por trás, e realmente sei o que faço.
Sou cria da máfia, nasci nessa vida e fui criada por mafiosos. Em
nosso meio as mulheres são protegidas e normalmente não se envolvem nos
negócios, a diversão fica para os homens. Com todo o poder em suas mãos,
eles vendem as mulheres das suas famílias em acordos comerciais de
casamento, fortalecendo a instituição familiar ao custo do sacrifício
feminino.
Com muita luta as coisas vêm mudando, especialmente depois que a
Família Genovese decretou que a herdeira do Capo Alphonse Corleone
seria introduzida na máfia. Nós temos a mesma idade e venho
acompanhando a vida de Daniele Corleone de longe.
A mulher é minha inspiração de força e luta, mas não almejo o poder,
meus irmãos precisaram aceitar que Gabriel me treinasse porque não dei
alternativa a eles, e com isso fiz o juramento, mas não quero um cargo na
máfia. Meu objetivo é estar ao lado de Gabriel, não atrás nem à frente dele.
Ele é o executor e, assim como Daniele, carrega o apelido com
orgulho. Para poder acompanhá-lo e aguentar o peso do seu trabalho,
abracei meus desejos mais obscuros e com muito treinamento me tornei
uma executora.
Também aprendi como detectar traidores, e sou muito, muito
detalhista, e é assim que, uma hora e meia depois de começar a analisar as
imagens das câmeras de segurança da noite passada, já tenho o culpado.
— Me avise assim que o Victor chegar, preciso ter uma conversinha
com ele — ordeno aos soldados que me acompanham hoje e faço sinal para
que me deixem sozinha no escritório.
Desde o sequestro que culminou na morte dos meus pais, meus
irmãos levaram a minha proteção a outro nível. Ando geralmente com cinco
soldados armados, homens da família, mas quando estou sem Gabriel esse
número dobra.
Mesmo que eu saiba me defender e tenha mais armas pelo corpo do
que peças de roupa, esse é o único ponto que nunca consegui contestar.
Minha proteção é a maior preocupação de Lorenzo e Matteo.
Ocupo-me dos relatórios da boate da última semana, confirmo os
números fornecidos pelo contador e avalio o desempenho dos DJs, sempre
procuro melhorar, mas parece que o público anda diminuindo.
Não me importo com dinheiro, nem vejo os lucros da Malícia. Minha
conta bancária é a mesma da Família e o cartão praticamente não tem
limites, mas gosto de saber que o que faço está dando certo e, no momento,
isso não está acontecendo.
Navego pela internet pelas próximas horas, um pouco por diversão,
um pouco para procurar inspiração e novos nomes da música, quem sabe
uma DJ desconhecida seja o que esse local precisa.
Na rolagem do feed encontro alguns vídeos interessantes de uma
garota que faz até o meu coração acelerar com seu remix, a galera em sua
frente parece estar em êxtase, então o vídeo é recortado e organizado de
uma maneira que você consiga ver da perspectiva da DJ e da pista.
Vários emoticons e memes transformam os 45 segundos em uma
experiência diferente, que me prende do começo ao fim e, o mais
surpreendente, é que a pessoa que editou conseguiu formar um looping,
onde o vídeo começa e termina praticamente na mesma parte, portando o
expectador não percebe que acabou e assiste várias e várias vezes.
Clico para seguir a DJ GIBI, como ela se declara, e logo abro a caixa
de mensagens.
“Gata, que vídeo foda foi esse que você postou? Topa trocar uma
ideia e quem sabe se apresentar na minha casa?”
Como ela já me seguia, não demora muito até que responda. Todo
mundo da indústria da música me conhece, tenho milhões de fãs nas redes e
a Malícia é uma das casas de show mais badaladas de Boston, fora que já
me apresentei em grandes festivais por todo o país.
“Caralho, patroa, nem acredito nisso! @DJMalícia.real.oficial me
chamando para a pista, topo com certeza, só mandar hora e local.”
Converso um tempo com ela então envio o contato para minha
assessora por e-mail, para que lide com as questões burocráticas. Liz é a
melhor pessoa para lidar com essa parte, ela trabalha comigo desde que abri
a Malícia e a única que realmente bate de frente quando o assunto é a boate.
Hoje não vou me apresentar, então decido vasculhar entre as sacolas
de lojas para encontrar uma roupa e usar à noite. Vejo uma menor e com um
bilhetinho escrito à mão colado do lado de fora e percebo que é um dos
presentes que recebi de uma fã, e esse detalhe que me faz escolher esta loja.
Leio as palavras carinhosas da menina que enviou e encontro um vestido
preto, com muito brilho no tecido e um M estampado na frente, a cor rosa
da letra se destaca bastante no tecido escuro e faz bem o meu estilo.
Eu amo rosa, é com certeza minha cor favorita, por isso fiz toda a
decoração da Malícia em tons de rosa, preto e dourado, dos copos usados no
bar até aos sabonetes dos banheiros.
Tomo um banho rápido, escolho uma lingerie rosa pink bem
provocativa, que Gabriel vai amar. Só de imaginar a cena um sorriso se
forma em meus lábios, jogo o vestido por cima, ele é bem curto e de
alcinhas.
Deixo os cachos dos meus cabelos soltos, desde que descolori mais as
pontas, venho me achando ainda mais gostosa, a cor combina comigo. Faço
uma maquiagem marcante nos olhos e uso um batom rosa escuro.
— Victor chegou — Renan anuncia assim que saio do escritório. —
Quer que eu o traga aqui?
— Não, essa conversinha precisa ser no subsolo.
— Vou preparar tudo, vamos esperar o Gabriel?
— Posso lidar com um traficantezinho de merda sozinha — respondo
ríspida e assisto ele abaixar a cabeça em confirmação. — Agora vai, prepara
a sala e me espera lá.
Saio sem esperar uma confirmação, Renan é um soldado do meu
irmão e não costuma fazer minha segurança, só por este motivo vou relevar
a afronta.
Chego na área VIP da balada e encontro Sharon, a gerente e minha
mão direita aqui dentro. Ela é uma mulher transexual que estava em uma
situação complicada quando veio pedir emprego quatro anos atrás, começou
na equipe de limpeza e foi subindo de cargo, agora não vivo mais sem a
loira com os peitos mais bonitos que o dinheiro pode pagar.
— Vai tocar hoje, gata? — questiona assim que me sento ao seu lado
no balcão do bar.
— Hoje não, tenho problemas para resolver e vamos ficar com um
dançarino a menos — aviso e recebo seu olhar de repreensão. — Não é
culpa minha, o filho da puta estava traficando coca do Cartel.
— Quem?
— Victor. — Dou o nome do nosso dançarino mais antigo e ela passa
a mão nos cabelos.
— Com esse serão 3 em menos de 1 mês, Mali. Não vou conseguir
repor mais um em tão pouco tempo.
— Eu sei, vou falar com a Liz, talvez ela consiga alguém novo pelas
redes sociais — sugiro, mesmo sabendo a resposta.
— Sabe que não é a mesma coisa — ela fica de pé e se equilibra nos
saltos de mais de 15 centímetros —, já tentamos isso, lembra? Eles chegam
aqui achando que é moleza, dinheiro fácil, só fazer uma dancinha como no
TikTok e pronto, mas quando chega na hora do vamo vê não aguentam meia
hora com os meninos.
Sim, já aconteceu, mais de uma vez, inclusive.
Precisamos de homens que entendam o comprometimento. O dinheiro
é bom, mas precisa de empenho e muita resistência.
— Vou dar um jeito, tá legal? — Levanto-me e me afasto, já cansada
dessa merda de dia.
Odeio quando os problemas acabam com a sensação boa que tenho
toda vez que entro na Malícia, por isso desço até o subsolo já sentindo meu
sangue ferver de ódio.
Minha noite foi arruinada, por sorte eu tenho o culpado amarrado e
me aguardando bonitinho na sala especial que gosto de chamar de “Quarto
da Malícia”.
Aqui embaixo temos várias salas exclusivas, algumas são quartos
normais, outras, um pouco maiores, são reservadas para orgias ou festinhas
particulares. Temos umas preparadas para a prática de BDSM, mas lá no
fim do corredor fica a minha sala especial.
Coloco a senha no painel ao lado da porta, que destrava
automaticamente, dando-me passagem para encontrar o culpado por acabar
com a minha noite de sexta-feira.
— Olá, Victor — cumprimento de forma debochada o homem de
quase dois metros de altura, cabelo loiro comprido, músculos bem
trabalhados e pele bronzeada. — Confortável aí?
Caminho até ficar de pé bem de frente para ele, suas mãos foram
amarradas com correntes e fixadas em um gancho no teto, deixando seu
corpo pendido de uma forma muito desconfortável.
Meus soldados sabem como eu gosto que minhas presas sejam
colocadas, se for um homem, pendido no teto com as pernas amarradas, já
se for uma mulher, quero-a ajoelhada, com as mãos amarradas às costas.
Gabriel é o único que sabe o motivo.
— Então, você já deve imaginar o porquê de estar aqui — falo
quando Renan entra com a minha caixa de ferramentas e começa a preparar
a mesa de metal.
— Eu não fiz nada, Mali, não sei do que está falando. — O marmanjo
tenta se fazer de desentendido. — Trabalho aqui há mais de dois anos,
nunca dei motivos para...
— É bem isso que não entendo — interrompo suas mentiras. — Você
ficou esse tempo todo aqui, sabendo muito bem o que rola dentro da minha
casa, e mesmo assim resolveu vender merda do Cartel bem debaixo do meu
nariz.
— Eu não...
— Tenho duas teorias — continuo a falar com calma e pronunciando
cada palavra de forma pontual, e olho bem no fundo dos seus olhos. — Ou
eles te compraram e você achou que conseguiria me fazer de idiota, ou eles
têm alguém da sua família. — Vejo seus olhos arregalarem, a boca abrir e já
tenho minha resposta. — Quem?
— Meu tio, ele se meteu com quem não devia e eles vieram atrás de
mim e da minha mãe — responde derrotado. — Desculpa, eu não queria,
mas...
— Por que não me procurou? — questiono tranquilamente.
— Te procurar? — Ele ergue as sobrancelhas, confuso com as minhas
palavras.
Levanto e respiro fundo. Como um homem consegue ser tão burro e
orgulhoso ao ponto de preferir morrer a pedir ajuda?
— Sabe, Victor, se tivesse me contado isso ontem, eu teria resolvido
seu probleminha, afinal é meu funcionário e sei que conseguiria me pagar
de volta um dia — vou até a mesa que Renan preparou, vejo que o soldado
acompanha meus movimentos com o olhar, mas é bem treinado o suficiente
para não intervir —, mas preferiu trair a minha confiança dentro da Malícia,
ao invés de pedir ajuda.
— Mali, eu juro, nunca mais farei nada, por favor — ele implora com
medo na voz, e um sorriso se forma em meu rosto, finalmente minha noite
começa a melhorar.
Eu amo lágrimas de macho desesperado.
— Vai ficar tudo bem. — Eu me aproximo dele e vejo o desespero se
formar em seu olhar. — Com o seguro de vida que pagamos para vocês, sua
mãe vai ter dinheiro suficiente para quitar a dívida que o imprestável do seu
tio fez.
— Com o seguro...
Não deixo que fale mais nada. Quando enfio a faca na sua barriga, ele
grita de dor. No momento em que dou um passo para o lado e faço força no
cabo da adaga, abrindo um corte profundo que logo explode com vísceras
por todo lado, preciso me afastar para não me sujar.
— É assim que traidores são tratados — declaro olhando fixamente
em seu rosto, me delicio com o desespero de seus gritos, ele se debate e
tenta lutar contra o inevitável, mas não demora muito e a vida deixa seus
olhos. Com alguns espasmos e um último suspiro o corpo de Victor
finalmente relaxa. — Como porcos no abate.
CAPÍTULO 3

Chace
 
Eu vou morrer...
Eu vou morrer!
Este é o único pensamento que passa pela minha cabeça enquanto
corro o mais rápido que consigo pelas ruas escuras e desertas. A iluminação
incerta dos postes não passa segurança, ainda mais aqui, na parte pobre da
cidade.
Poderia gritar? Talvez, mas não sei se meus pulmões aguentariam
correr e ainda fazer o esforço de produzir um som alto o suficiente.
Adiantaria de algo? Absolutamente não.
Ninguém se importa com um moleque de tênis desgastado, bermuda
rasgada e camiseta de segunda mão correndo com uma mochila nas costas e
pedindo socorro.
Nenhuma pessoa, em sã consciência, abriria a porta e viria me ajudar.
Sei disso porque se fosse o contrário eu também não sairia da
segurança da minha casa por um estranho.
Com muito esforço consigo chegar em uma rua mais iluminada,
porém o carro continua me acompanhando lentamente, como se não
estivesse me perseguindo. Eles têm tempo, sabem que não conseguirei fugir
e, se não for hoje, será logo.
Ergo a cabeça para encontrar a lua cheia brilhando intensamente no
céu, a iluminação ruim dos postes tem somente uma vantagem: não
ofuscam o brilho do astro.
As estrelas são difíceis de enxergar, mas a lua está sempre ali,
orbitando nosso planeta como o carro que me persegue, a Terra não tem
escapatória da Lua.
E com a consciência deste fato, diminuo a velocidade dos meus
passos e paro, no meio da rua, agachando-me para recuperar o fôlego. Sinto
como se meus pulmões fossem explodir no peito, mesmo assim, uma
sensação de calma me acomete.
Aceitação.
O som do carro cessa quando ele para logo atrás de mim, as luzes dos
faróis iluminam o caminho à minha frente, deixando escura somente a
sombra que meu próprio corpo produz ao bloqueá-las.
Uma porta se abre, dando vazão ao rock pesado que toca no interior
do veículo, outra porta é aberta e sons de passos acompanham a música
quando levanto a cabeça.
Lá está a lua.
— Finalmente cansou de correr? — alguém questiona entre risos.
Não respondo, acho que nem se eu quisesse encontraria minha voz
neste momento.
— Vamos — uma outra voz, mais grossa e baixa, ordena.
Alguém se aproxima e espero pelo fim, sinto meu coração bater
rápido no peito e respiro fundo, é assim que eles lidam com quem não paga
suas dívidas.
A máfia não poupa ninguém.
 
***
 
A primeira coisa que sinto ao acordar é uma dor pulsante na parte de
trás da minha cabeça. Abro os olhos lentamente e percebo que estou em
uma sala escura e suja. De onde estou sentado consigo ver somente uma
porta do lado direito, mas não demoro a perceber que não é uma saída.
Tento mover meu corpo, o suficiente apenas para constatar que
minhas mãos e pés estão amarrados na cadeira de metal, faço um pouco
mais de força para me desvencilhar das cordas, mas todo meu esforço é em
vão.
Um celular tocando atrás de mim me faz pular de susto, meu coração
dispara no peito ao perceber que tem alguém aqui comigo. A pessoa atende,
mas não fala nada, com o silêncio da sala consigo ouvir a voz do outro lado
da linha, mas não entendo o que fala.
— Tudo bem, amor. — Reconheço aquela voz muito grossa e firme
de antes, é o mesmo homem que deu a ordem, ele escuta mais um pouco e
então volta a falar, e puta que pariu, o timbre da sua voz é o suficiente para
fazer todo o meu corpo arrepiar. — Estarei aí em uma hora.
Com isso o barulho de metal arrastando no piso de concreto irrompe
pelo ambiente e logo ele aparece em meu campo de visão. Não é um
homem qualquer, não, esse é daqueles que só a presença impacta quem está
no local.
Preciso erguer a cabeça para conseguir enxergar seu rosto, ele é muito
alto, a luz fraca não me deixa ver bem, mas ele tem o cabelo escuro, assim
como a barba, ambos bem penteados e cuidados, ombros largos e cobertos
por uma jaqueta de couro preta que não consegue esconder o tamanho dos
braços grandes e fortes. — Vou perguntar somente uma vez — fala e todos
os pelos do meu corpo se arrepiam. Ele se senta em minha frente, as pernas
grossas abertas, o corpo inclinando levemente em minha direção. — Você
tem o dinheiro?
Seu olhar encontra o meu e paro de respirar, com a sua proximidade
consigo enxergar mais detalhes do seu rosto, como os fios brancos que
pintam a barba e o cabelo, algumas marcas de expressão na testa e no canto
dos olhos, e nas íris um azul-claro tão bonito e intenso como a cor do mar.
Ele limpa a garganta e coloca uma mão no bolso interno do casaco,
tirando dali uma arma que aponta em minha direção. Assustado, lembro-me
do motivo de estar aqui e paro de reparar no quanto ele é gostoso para focar
no fato de que está aqui para me matar.
— Eu... eu... — tento falar, minha voz sai mais fina que o normal,
respiro fundo reunindo a maior quantidade de coragem que ainda possuo, o
que é basicamente nada a este ponto. — Não tenho...
Vejo quando fecha os olhos lentamente e se escora na cadeira
respirando fundo, o tempo todo sua arma continua apontada para mim.
— Mas... — volto a falar em um ímpeto de coragem. — Vou ter,
consegui um contrato novo, só que... — estava aguardando o pagamento da
campanha que fechei com uma influencer cair na minha conta para poder
pagar uma parte da dívida com a máfia, mas a maldita filhinha de papai está
me enrolando há três semanas.
— Pare de gaguejar, é irritante — ordena.
— De-desculpa. — Falho miseravelmente em cumprir sua ordem.
— Está se desculpando por que, garoto? — Ele abre os olhos e um
vinco de irritação aparece entre as sobrancelhas grossas.
O tom impaciente me faz retrair na cadeira, se não fosse pelas
amarras, com certeza estaria embolado no canto chorando de medo. Meu
coração bate tão rápido no peito que, se ficar calado, o homem conseguirá
ouvir o som do meu desespero.
— Eu vou pagar, eu juro, mas... — desvio o olhar dele antes de
continuar — fiz um serviço e ainda não recebi, eu juro que vou pagar, eu
juro.
— Quanto? — questiona, seco.
— Cinco mil, mas está 3 semanas atrasada e...
— Sua dívida conosco é de 152 mil dólares no momento, com o
atraso não aceitaremos menos que o valor total.
Eu sei o número exato, tenho noção de quanto vale a minha vida e
gostaria muito de ter a coragem de responder isso agora. Pegar dinheiro
com a máfia foi um ato de desespero, simples assim. O banco estava para
tirar a nossa casa por causa da hipoteca que minha mãe já não conseguia
pagar, seu benefício foi cortado, e o que eu ganho não é o suficiente para
pagar tudo. O marido da minha tia foi quem arranjou o contato e, bem, aqui
estou.
— Por quê? — a pergunta é feita com mais curiosidade do que raiva,
o que chama minha atenção e volto a olhar para o homem.
— Por que, o quê?
— Pegou dinheiro com a máfia. Você não se encaixa no perfil das
pessoas que chegam até mim — explica com mais palavras do que já usou
até agora.
Então crio coragem e despejo meus problemas nele, afinal, esta será a
última vez que poderei falar mesmo, se vai me matar, que saiba da minha
história primeiro, talvez assim tenha um pouco de remorso depois.
A quem estou querendo enganar? Pessoas como ele não sentem
remorso por tirar vidas, não podem sentir ou não estariam fazendo isso,
para começo de conversa.
— Minha mãe tem Alzheimer precoce, durante anos ela precisou
hipotecar nossa casa para pagar seu tratamento. Tentei ajudar, mas as contas
hospitalares são altas demais, por algum motivo o benefício dela foi cortado
há cinco meses e eu não consigo mais pagar as prestações. Trabalho em
casa para cuidar dela, mas não ganho o suficiente para bancar a cuidadora, a
casa e ainda pagar a hipoteca, quando o banco notificou que tirariam nossa
casa se não quitássemos a dívida toda... bem, não tive outra opção.
Solto a merda da minha história sem pausas, em uma respiração só,
como um último adeus à essa vida desgraçada.
— O que você faz?
— Trabalho com marketing digital, edição de vídeos para campanhas
publicitárias de empresas pequenas, mas também lido com alguns
influencers e fotógrafos — explico e vejo sua sobrancelha subir.
O homem se levanta novamente, guarda a arma e pega o celular,
assustando-me com a súbita mudança em sua postura. Assisto seus dedos
trabalharem na tela por um longo tempo enquanto ele me ignora, a
apreensão está me matando, ironicamente.
Que diabos ele está fazendo?
Trocando mensagens com a namoradinha antes de tirar a vida de
alguém?
Que tipo de pessoa faz uma coisa dessas?
Minha vida realmente não vale nada, e é com essa constatação que
um sentimento diferente começa a surgir, substituindo aos poucos o medo
pelo ódio.
— Hey, para de enrolar — falo mais alto que antes. — Se vai me
matar, faça logo, e não fique aí, trocando mensagens com a sua
namoradinha. — Isso chama sua atenção.
— Você quer morrer?
— Não, mas tenho certeza de que não sairei daqui vivo, então qual o
motivo de ficar atrasando o inevitável? — respondo com uma confiança que
não lembro de ter tido em algum outro momento. — Só acerta o tiro logo.
— Acha mesmo que serei rápido? Um tiro e acabou? — As perguntas
não esperam respostas. — Quando sou chamado, é para dar um recado à
comunidade, qualquer um pode disparar uma arma, mas poucos têm
estômago para fazer o que eu faço.
Engulo em seco, o medo retornando, ele acabou de falar que irá me
torturar até a morte?
Então ele me surpreende quando um sorriso se forma em seus lábios,
um maldito sorriso que acho mais lindo do que deveria e faz a droga do
meu corpo vibrar. Pode ser por medo, já que até agora o homem não havia
demonstrado sentimento algum a não ser tédio, mas também pode ser tesão,
porque o desgraçado é gostoso demais para não ser notado.
— E se eu te oferecer uma saída?
— O quê? — questiono surpreso.
— Aceitaria um acordo com alguém ainda pior do que eu em troca da
sua vida miserável? — provoca, escorando-se na parede, o celular ainda em
mãos com a tela brilhando. — Responde! — ordena de forma firme.
— Sim — falo com menos coragem do que antes. — E minha vida
não é miserável — complemento baixinho, o que o faz sorrir.
Sem mais uma palavra ele sai da sala e logo depois dois homens
retornam, colocando um tecido em meu rosto, bloqueando minha visão
enquanto me desamarram. Sou arrastado e jogado no porta-malas de algum
veículo, que logo entra em movimento.
Para onde estão me levando?
O que diabos ele quis dizer com acordo?
A uma altura dessas, é óbvio que aceitarei qualquer coisa para
continuar vivo, porque minha mãe precisa de mim. Fora minha tia, sou sua
única família.
Depois que ela teve o diagnóstico de Alzheimer confirmado pelos
médicos, meu pai nos abandonou, ele nunca esteve realmente presente e as
poucas lembranças que tenho do homem são pesadelos em que ele grita
comigo e agride minha mãe.
Ela nunca mais falou dele, eu tinha seis anos quando ele foi embora e
nunca mais voltou e, a partir daquele momento, ficamos só nós dois.
Estudei em casa a maior parte do tempo, minha tia é professora particular e
cuidava de mim quando minha mãe ainda podia trabalhar.
Quando cresci um pouco mais e o estado de saúde da minha mãe
piorou, comecei a procurar formas de ajudar na renda de casa. Sempre
gostei de computadores, ganhei um em um sorteio da igreja e minha tia
cedia a sua internet, foi assim que comecei a aprender sobre edição de
vídeos e imagens.
Aos 14 anos já conseguia manter uma renda e mentia que era maior
de idade para pegar trampos, minha mãe não trabalhava mais e contratamos
uma cuidadora, dona Rosa, que fica com ela durante o dia. Depois que fiz
21, consegui um extra em um bar próximo de casa.
A viagem parece não acabar nunca, e durante todo o tempo fico
pensando em minha vida e em como cheguei até este ponto. Tento encontrar
alguma coisa que poderia ter feito algo diferente, mas não existe. Se a
maldita patricinha tivesse pagado os 5 mil, eu teria deixado em dia a dívida,
já que o combinado era 3 mil por mês. O restante era para pagar dona Rosa.
Não tenho economias ou dinheiro guardado porque nunca sobrou, na
maioria das vezes falta, e precisamos aceitar cesta básica da igreja ou de
pessoas da comunidade que nos ajudam. Tudo o que fiz até agora foi para
manter as contas em dia.
Quando o veículo finalmente para, sou retirado com brutalidade e
arrastado pelos braços. Eu preciso andar muito rápido para acompanhar os
dois homens que me seguram e, como não vejo nada com a venda nos meus
olhos, tento mover minhas pernas e rezar para não cair.
Assim que escuto uma porta abrir, a música eletrônica toma conta do
som no ambiente, mas é abafada, e isso me faz imaginar que não estamos
dentro de uma balada, mas sim em algum lugar próximo.
Eles tiram o tecido dos meus olhos assim que chegamos em uma sala
onde não escuto mais a música, sou empurrado para dentro e tropeço em
meus próprios pés, caindo de joelhos. Sem conseguir usar as mãos para
amortecer a queda, já que elas continuam amarradas às minhas costas, dou
de cara com o piso de carpete preto.
Rapidamente a mudança de ambiente me assusta, não é mais uma sala
escura e sem cor, fui trazido para o que parece ser um escritório com as
paredes rosa claro, uma mesa branca cheia de papéis, um computador e uma
cadeira de couro rosa logo atrás. Do outro lado, algo parecido com um
motel, daqueles que encontro nos filmes pornô: tem um sofá de couro da
mesma cor da cadeira, bem grande, escorado na parede preta com um
letreiro iluminado escrito “Malícia”, e bem na frente, uma pequena
passarela com uma barra de ferro redonda firmada no teto.
Com muito esforço consigo ficar de joelhos assim que a porta é aberta
novamente atrás de mim, e sinto um frio na barriga com a expectativa.
— Own, Bunny, você me trouxe um gatinho acuado de presente? —
A voz brincalhona é forte e feminina, então uma mulher passa por mim e se
coloca em minha frente. A primeira coisa que vejo são as botas de couro
pretas que sobem até a metade das suas coxas, ergo meu olhar pelas pernas
musculosas e encontro um vestido preto com muito brilho que abraça seus
quadris e acaba um pouco acima dos peitos. Um M estampado em rosa é a
única cor em suas roupas.
O homem de antes caminha até ela, mas fica atrás da mulher. Ele me
encara com o olhar firme e ameaçador, coloca uma mão na cintura dela,
marcando seu território, enquanto a outra está na arma em sua cintura. É um
aviso.
— Olá, gatinho, não precisa ter medo. — Ela inclina a cabeça,
jogando seus cabelos loiros para o lado quando solta uma gargalhada alta.
— Eu ia dizer que ninguém iria te machucar, mas pode ser uma mentira,
ainda não sei o que está fazendo aqui. — Ela se abaixa com uma mão na
cintura e a outra vem até mim e segura meu queixo, forçando-me a encarar
os olhos de um verde-claro maravilhoso, só então vejo o sorriso ameaçador
que estampa seu rosto.
— Disse que precisa de um novo dançarino — o homem explica, sem
tirar os olhos de mim.
— E você me trouxe... isso aqui? — ela debocha e me larga, então se
joga nos braços do homem e toma a sua boca em um beijo tão intenso e
íntimo, que sou obrigado a desviar o olhar da cena. — Obrigada, meu amor.
CAPÍTULO 4

Gabriel
 
Desço a mão até a bunda firme de Alícia, aperto de forma possessiva,
marcando território, e ela sorri ao morder meu lábio. Eu vi a forma que esse
garoto olhou para ela, e é melhor que aprenda logo qual é o seu lugar.
— Qual é a jogada aqui, amor? — ela questiona com o olhar travesso
que quase me faz sorrir. Ali está me provocando e agindo como se fosse
uma mulher inocente.
— Você pode usá-lo.
— Como? — A pergunta vem acompanhada de um sorriso safado,
mas nego com a cabeça, o garoto não faz parte dos nossos joguinhos. —
Tudo bem, então melhor falar logo no que esse gatinho pode me servir, não
tenho a noite toda.
— Para o que você precisar.
— No momento estou com vaga para garçom e stripper.
— Stripper? — o garoto nos interrompe e Ali se vira para encará-lo,
ele continua tremendo de medo, mas agora parece confuso.
— Sabe dançar, gatinho? — Ali pergunta.
— Não — responde com tremor na voz, ele está realmente assustado.
— Nem uma reboladinha? — Ali provoca e, para demonstrar, inclina
a parte de cima do corpo para frente, empinando a bunda gostosa se esfrega
bem no meu pau, então a maldita diabinha joga a cabeça para o lado e
começa a rebolar. — É fácil, viu?
— Eu... quer dizer... não sei... — o garoto gagueja e fica vermelho ao
olhar para o local onde ela está se esfregando, o volume na minha calça não
mente que estou duro desde o momento em que Ali me beijou, e é bem nele
que o garoto está fixando os olhos.
Percebi a forma como reagiu à minha presença na sala de
interrogatórios, também vi como me avaliou dos pés à cabeça e ficou
vermelho quando sorri. Outro fato que não passou despercebido foi a forma
com que se referiu a Ali como minha “namoradinha”.
Sei reconhecer quando outro homem demonstra atração por mim, sou
bissexual e precisei me manter atento a vida toda para não cometer deslizes
e acabar dando em cima de quem não podia. Com mulheres, é mais fácil de
saber quando estão atraídas por mim, mas os homens tendem a esconder um
pouco mais, porém o garoto é novo e parece tão inexperiente que nem tenta
ocultar os sinais.
Tenho certeza de que está atraído por mim, mas também não tira os
olhos da Alícia. Pode ser bissexual ou só está confuso e assustado com a
situação, mas isso também não muda nada, ele não serve para nós dessa
forma.
— Está tudo bem, gatinho. — Ali sorri para ele e acaricia seu rosto,
tentando acalmá-lo. — Qualquer um pode aprender a dançar, nenhum dos
meus meninos chegou aqui sabendo tudo, mas leva tempo e disciplina para
aprender, por isso precisa de algo que o motive a não desistir.
— Ele tem — respondo.
— Deixa ele responder, Bunny. — Ela me lança um de seus olhares
repreensivos e me calo. — Então, gatinho, qual é a sua motivação para
continuar vivo?
O garoto olha assustado para ela e não responde, talvez tenha sido
uma péssima ideia trazê-lo aqui, Ali não é uma pessoa paciente e posso ver
que seu sorriso se alarga quanto mais ela espera pela resposta. Este não é
um bom sinal.
A cada segundo que passa, quero gritar para que acorde e fale logo,
mas deixo que ela comande o show, e Alícia nunca decepciona. Em um
movimento rápido, ela tira a arma da minha cintura e aponta diretamente
para a cabeça do garoto, que agora sim tem um motivo para ficar assustado.
A brincadeira acabou.
— Vamos lá, gatinho, não tenho a noite toda. — Agora a voz dela já
não é mais leve e brincalhona e o sorriso desapareceu, Ali assumiu o
controle e pronuncia cada palavra como um comando. — Você tem exatos
sessenta segundos para me convencer a te deixar vivo, e só estou fazendo
isso porque foi o Bunny quem te trouxe aqui, use o tempo com sabedoria.
Ele arregala os olhos e começa a tremer ainda mais de medo, a
respiração ofegante fica mais rápida e gotas de suor escorrem pela sua testa,
sua atenção toda está na arma, provavelmente não está acostumado com
elas. Respira fundo e tenta falar, mas a voz não sai, vejo Ali tirar a trava de
segurança e colocar a outra mão na cintura.
Ela vai atirar, tenho certeza de que está contando os segundos
mentalmente.
— Eu... minha mãe — ele finalmente fala, tropeçando nas palavras,
mas deixando sair. — Ela... ela tem Alzheimer, depende de mim e sou filho
único, preciso cuidar dela.
Vejo seus olhos castanhos se encherem de lágrimas até transbordarem
e ele realmente começar a chorar.
Desespero.
Este é o motivo que o trouxe até nós, mas diferente de muitos outros
que pegam dinheiro para alimentar seus vícios, ele fez por alguém. Acho
que foi esse o motivo que me levou a oferecer esse acordo.
— Essa sim é uma motivação forte o suficiente, gatinho. — Ali
abaixa a arma e acaricia os cabelos escuros do garoto, como se ele fosse
realmente um animal de estimação. — Agora eu vou te soltar e você vai
tirar essa roupinha ridícula e fazer um showzinho bem ali — ela aponta para
a plataforma com a barra de pole dance —, não precisa subir na barra, mas
tem que convencer a nós dois de que está realmente motivado a aprender.
O garoto olha de Alícia para mim, completamente apavorado, vejo
seu peito subir e descer ainda mais rápido. Ele se assusta quando ela ergue a
barra do vestido, que já é bem curto, e mostra o coldre de couro preso na
coxa, que guarda três facas curtas.
Tenho um vislumbre da renda rosa da sua calcinha e, se eu consigo
ver, o maldito garoto deve ter se deliciado. Confirmo minhas suspeitas
quando vejo seu olhar focado no meio das pernas da diabinha.
Ela reparou, claro que o desejo do garoto não passaria despercebido
por Alícia, por isso, enquanto se coloca atrás dele, ela passa a mão pelas
suas costas. Seu toque o assusta, mas também o faz morder o lábio inferior.
Ali aproxima o rosto perigosamente da orelha dele, inspirando
enquanto ergue o olhar e encontra o meu. A diabinha está fazendo um show
para mim, seu sorriso travesso confirma meus pensamentos e decido
aproveitar, viro-me e caminho até o sofá de couro rosa.
— Olha, gatinho, até o Bunny se animou — Alícia comenta animada
e corta as cordas que prendem a mão dele, ela o ajuda a se levantar e seca as
lágrimas do rosto do garoto, que finalmente controlou o choro, então faz
sinal para que suba na passarela. — Vai lá, quero que dê o seu melhor.
Depois de alguns segundos ele finalmente começa a andar, Ali pega o
celular e uma música da nossa playlist de sexo começa a tocar. As luzes
brancas se apagam, deixando somente o letreiro na parede e alguns pontos
de luz na passarela iluminando o ambiente, e assisto enquanto ela caminha
como uma leoa até mim.
Abro os braços e ela se senta no meu colo, de costas para mim, ainda
segurando a minha arma de forma firme e perigosa. Aperto sua cintura e
trago seu corpo mais próximo ao meu, ela exala profundamente quando
roça a bunda gostosa no meu pau, acaricio a curva do seu pescoço com a
minha barba só para assisti-la arrepiar-se e falo bem próximo do seu
ouvido.
— Você quer brincar, amor?
Ela responde empinando a bunda e assente com a cabeça, então olho
para o garoto que nos observa atentamente.
— Começa logo — ordeno alto e firme e vejo ele se contrair.
— Gatinho, tira logo essa roupa, preciso fazer o controle de qualidade
antes de te aceitar.
Com isso ele fecha os olhos e segura a barra da camiseta cinza e sem
graça que está usando, muito lentamente o garoto respira fundo, criando
coragem para subir o tecido e deixar o abdômen à mostra.
Ele não é nada atlético, os músculos do abdômen não são definidos,
assim como seus braços, vai dar trabalho para deixá-lo em forma, mas ainda
tem algo que prende meu olhar e me faz vibrar com a expectativa. Do canto
do olho vejo Ali com um sorriso sexy no rosto.
— Muito bem, gatinho, vai precisar malhar muito para subir no palco,
mas tem potencial — ela comenta divertida e larga minha arma no sofá. —
Agora, a parte de baixo.
O garoto deixa a camiseta cair no chão e leva as mãos até o botão da
bermuda jeans escura, ele não olha para nós, seu olhar está no chão e tenho
certeza de que, se ligássemos as luzes agora, o veríamos vermelho de
vergonha.
— Espero que não seja uma cueca velha — Ali fala baixinho e rio do
seu comentário, mas temos a sorte de apreciar a visão de uma cueca boxer
branca que faz pouco para esconder o contorno do seu pau.
E, para nossa surpresa, o garoto está duro. Assim que colocamos o
olhar no membro, que não é nada pequeno, sinto Ali rebolar ainda mais e
respondo sua investida: desço a mão que estava em sua cintura e acaricio a
parte interna das suas coxas, até chegar no meio das suas pernas e encontrar
a calcinha de renda. Roço o dedo pelo tecido quente e úmido.
— Deliciosa — murmuro baixo no ouvido de Alícia e mordo o lóbulo
da sua orelha, sentindo-a estremecer no meu colo.
Mantenho o olhar firme no garoto enquanto coloco a calcinha para o
lado e acaricio a boceta levemente, passo meu dedo por toda a sua abertura
e ela abre ainda mais as pernas, dando-me acesso e uma visão privilegiada a
ele.
— Gosta do que vê, gatinho? — Ali provoca e leva a mão para o meu
pau, apertando levemente, me faz conter um gemido. — Eu e o Bunny
estamos adorando o show, mas falta movimento.
A música muda e uma batida mais animada começa, movo meu dedo
até o clitóris inchado dela e faço movimentos circulares no ritmo do som,
do jeito que ela gosta. Sinto sua mão me apertar.
— Que tal tirar esse vestido? — sussurro em seu ouvido e ela sorri
ainda mais quando ergue o tecido preto e fica só de calcinha e sutiã. —
Porra, que delícia, amor. — Olho para o conjunto rosa com detalhes em
preto que contrasta lindamente com as tatuagens escuras em sua pele clara.
— Pode olhar, gatinho, mas fique sabendo que nós sentimos tanto
tesão assistindo você rebolar quanto abrindo um sorriso na sua garganta. —
Ela passa o dedo pelo próprio pescoço enquanto se esfrega na minha mão.
— De qualquer forma Bunny e eu teremos um orgasmo, você decide como
quer participar.
Isso faz o garoto acordar e, claramente sem saber o que fazer, ele
começa a movimentar os ombros tentando acompanhar a música.
— Ele não tem experiência — comento baixinho e beijo a pele
delicada da volta do pescoço de Alícia. Seu cheiro doce entra pelas minhas
narinas e faz meu corpo estremecer.
— Primeira regra de como seduzir sua plateia, sempre olhe
diretamente para eles — Ali ensina com a voz engasgada de tesão. — Crie
uma ilusão de conexão.
Com isso ele ergue o rosto e olha em nossa direção, o semblante
assustado me deixa ainda mais duro, introduzo um dedo nela e sinto seu
canal me receber e contrair, porra, queria que fosse meu pau.
Alícia parece ler a minha mente quando abre minha calça e libera
meu membro, que salta duro e pingando. Ela não olha para mim, assim
como minha visão não está nela, ambos acompanhamos o garoto que não
tira os olhos de nós.
— Qual é o nome do gatinho? — Ali faz a pergunta com a voz baixa
para que somente eu a escute.
— Chace King — respondo.
— Que idade ele tem?
— Vinte e dois.
— Ele está assustado demais para alguém de 22 anos — ela comenta
avaliando as reações do garoto enquanto sua mão aperta meu pau e faz
movimentos de sobe e desce, coordenados em velocidade com o entra e sai
do meu dedo em sua boceta.
Logo estamos ofegantes e sentindo o orgasmo se aproximar, conheço
tão bem as reações do seu corpo que posso dizer exatamente quanto tempo
falta para que goze na minha mão se continuar assim, então diminuo a
velocidade e volto a acariciar seu clitóris.
— Senta no meu pau, amor — imploro ofegante e vejo o garoto levar
uma mão ao próprio membro sem nem perceber, seus lábios grossos estão
entreabertos enquanto ele caminha até a barra de pole dance, sem tirar os
olhos de nós.
Alícia assiste o momento ousado dele e se levanta, tirando a calcinha
e o sutiã lentamente e de forma bem sexy, a diabinha fica só com as botas
pretas, a visão da bunda firme bem na frente dos meus olhos faz minha boca
salivar, mas logo ela volta a se abaixar, dessa vez Alícia me monta com uma
perna de cada lado do meu corpo, ela se abre e desce lentamente, sua boceta
apertadinha engole meu pau no caminho, me fazendo gemer.
— Não fecha os olhos, gatinho. — Ela chama a atenção de Chace,
que agora está escorado na barra com uma mão segurando em cima da
cabeça e a outra acariciando o próprio pau enquanto esfrega a bunda no
metal. — Quer se tocar também?
Ele morde o lábio inferior para conter uma resposta, mas contrariando
o que eu imaginava, ele não nega, escuto o riso divertido de Alícia enquanto
sobe e desce no meu pau, seguro firme sua cintura para ajudá-la.
— Não precisa ter vergonha, Bunny e eu adoramos assistir a um
homem se dando prazer — ela provoca e isso parece encorajá-lo, sua mão
aperta o próprio pau por cima do tecido e começa a movimentá-lo. —
Mostra pra gente, gatinho.
E ele faz. Porra, Chace coloca a mão por dentro da cueca e libera sua
deliciosa ereção, ele está tão duro que vejo a umidade brilhando na
pontinha, a visão me dá água na boca e me faz respirar fundo.
Sinto Ali se contraindo ao redor do meu pau, ela rebola um pouco
mais rápido enquanto assiste o show do garoto e isso me faz delirar: foder o
meu amor enquanto olho para o garoto se masturbando cada vez mais
rápido. Seus movimentos aumentam conforme Alícia quica no meu pau e
não demora para estarmos os três em sintonia.
A batida alta da música parece sincronizar com nosso ritmo e Ali
começa a se entregar, seus movimentos ficam descompassados, então tomo
o controle e meto nela, rápido, fundo, fazendo o barulho dos nossos corpos
se chocando ecoar pelo ambiente, mas sem tirar os olhos dele.
— Mais rápido, Bunny — Ali implora gemendo alto e leva as mãos
para o clitóris inchado, esfregando com vontade enquanto meto ainda mais
fundo nela.
— Ela é gostosa, não é? — questiono olhando para o garoto, que já
não se segura mais e assiste nosso show de boca aberta e a respiração
ofegante, ele solta pequenos gemidos enquanto se contorce de prazer.
— Goza com a gente, gatinho — a diabinha ordena em um fio de voz
e sinto sua boceta estrangular meu pau no momento em que ela alcança o
orgasmo, se entregando ao prazer enquanto suas pernas tremem ao meu
redor. Substituo a mão no seu clitóris pela minha e massageio o local ainda
sensível enquanto sinto que também irei gozar.
Ali tenta contestar, mas a seguro firme e logo ela está gritando ainda
mais enquanto atinge um segundo orgasmo, ainda mais forte que o
primeiro, e isso me faz explodir dentro dela.
Não fecho os olhos enquanto gozo e tenho a visão privilegiada do
garoto se derramando na própria mão, um gemido escapa pela sua boca
entreaberta e ele não tira os olhos de nós, seu corpo contorcido de prazer
provoca espasmos em mim.
Caralho, mesmo gozando eu continuo duro dentro da Alícia e esse é o
tamanho da porra do meu tesão com essa brincadeira toda.
Ela amolece nos meus braços e seguro seu corpo colado no meu,
sentindo a respiração ofegante combinada com a minha. Afasto o
amontoado de fios loiros e beijo seu pescoço carinhosamente.
— Ahhhh, que delícia, gatinho — Alícia grita feliz e meu peito se
aquece com o som, amo ver essa diabinha assim. — Vem cá — ela chama o
garoto com o dedo estendido e ele vem como uma abelha indefesa atraída
pela flor. — Agora ajoelha.
O garoto olha para mim, como se pedisse ajuda, mas só ergo a
sobrancelha e beijo o ombro de Alícia, confirmando que é ela quem manda
aqui, então lentamente ele fica de joelhos em nossa frente, as mãos
protegendo o pau que agora está dentro da cueca.
— O acordo é o seguinte, você vai trabalhar por um tempo como
garçom durante a noite enquanto treina com os meus meninos à tarde,
abrimos de quarta a domingo, quero você aqui as 14 horas em ponto — ela
explica seriamente, sem brincadeiras dessa vez — Você tem que se esforçar,
o treinamento não é leve, e faça tudo o que os meninos mandarem, eles
saberão o que te ensinar. À noite você vai servir no bar enquanto não está
apto para dançar, o salário não é nem ¼ do que os dançarinos recebem,
portanto, se quiser pagar sua dívida comigo logo, sugiro se empenhar.
— Não se envolva com clientes — complemento uma parte
importante.
— Somente pessoas autorizadas podem usar os quartos no subsolo,
trabalhe com vontade e não faça com que me arrependa de te dar essa
chance, não é todo dia que alguém escapa das mãos do executor. — Ela
pega a arma que estava jogada no sofá e se inclina para a frente, seu rosto a
centímetros do dele quando coloca o cano encostado na têmpora do garoto.
— E lembre-se, agora sua vida me pertence e posso acabar com ela no
momento que eu quiser.
A ameaça faz efeito e Chace arregala os olhos. apavorado novamente.
— Vista-se, garoto, vou mandar alguém te levar para casa — ordeno
firme e alto enquanto abraço minha diabinha, que se aconchega contra mim
e acaricia meus braços.
— Tchau, gatinho, nos vemos amanhã — Alícia se despede enquanto
ele se levanta rapidamente e coloca as roupas apressado. — Pode sair sem
medo.
Com isso ele corre e abre a porta, só para dar de cara com dois dos
meus homens que bloqueiam sua passagem.
— Levem-no para casa — ordeno e Carlos confirma com a cabeça,
dando passagem para o garoto sair antes de fechar a porta e nos deixar
sozinhos.
Ali suspira em meus braços e se acomoda melhor no meu colo, ainda
estou dentro dela, meu pau meia bomba já começa a se animar com a
movimentação.
— Amei o presente, Bunny — ela provoca e se levanta o suficiente
para se virar de frente e voltar a montar no meu pau, agora olhando
diretamente para mim.
— Odeio que me chame assim — confesso.
— Eu sei, mas você é meu coelhinho mágico que chegou a tempo
para me levar até o País das Maravilhas e transformar todos os meus sonhos
e fantasias em realidade. — Ela dá a mesma resposta de sempre,
arrancando-me um sorriso antes de colar a sua boca na minha. — Obrigada
pelo presente, amor.
— Faço tudo por você — respondo contra sua boca e mordo o lábio
inferior, acabando com a conversa. Ali volta a rebolar no meu pau, pronta
para continuar de onde paramos.
CAPÍTULO 5

Chace
 
Sabe quando você acorda de um pesadelo ainda com o coração
acelerado e suor escorrendo pelo rosto? É assim que me encontro ao
despertar em minha cama com as cobertas jogadas no chão, lençol
embolado nos pés e travesseiro úmido.
Porém dessa vez o pesadelo não é algo absurdo inventado pelo meu
cérebro esgotado, não, essas foram lembranças de um dos momentos mais
aterrorizantes da minha vida.
O pior é que juntamente com o pavor que senti, teve algo a mais, uma
adrenalina diferente que me fez ficar com tesão por estar sentindo tanto
medo. Que depravação é essa? Vou culpar a quantidade e a qualidade
duvidosa dos pornôs que assisto pela ereção de ontem — e a de hoje
também.
Analiso meu pau duro dentro da cueca que vesti depois de tomar um
banho gelado tentando tirar a sujeira do meu corpo. Não adiantou, ainda me
sinto como um monte de merda.
Quem em sã consciência ficaria excitado ao assistir um assassino e
uma louca transando enquanto te ameaçam de morte?
Quando olho no relógio, vejo que já são 11 horas da manhã e decido
tomar um banho rápido antes de sair para liberar minha tia, que passou a
manhã aqui.
Passo pela sala e dou um beijo em minha mãe, que está sentada no
sofá assistindo TV com a tia Camila. Ela me cumprimenta com um bom dia
antes de se levantar e ir para a sua casa.
— Vou trabalhar hoje à tarde — aviso e me sirvo de uma xícara de
café da térmica que a tia Camila deixou pronto.
Desde que a doença progrediu, minha mãe não pode mais ficar
sozinha, ela precisa ser vigiada constantemente para não sair e se perder.
Meu celular vibra no bolso e assim que ligo a tela vejo a notificação
do banco, a desgraçada da influencer acabou de me pagar.
— Eu não acredito nisso, por que não pagou ontem? Mandei 500
mensagens e essa patricinha abusada não respondeu — esbravejo na
cozinha, brigando com a garota que nem está aqui. Minha mãe me olha,
assustada — Desculpa, mãe, é só um problema com uma cliente, mas já
está tudo resolvido.
Aproveito que finalmente tenho dinheiro na conta e reúno as faturas
atrasadas da casa para pagar, mas quando abro o aplicativo para conferir o
saldo, levo um susto. Tenho 10 mil dólares, ela transferiu o dobro.
Deve ter cometido algum erro, já fiz outros trabalhos para ela e nunca
recebi um centavo a mais e, por isso, mando mensagem.
“Kerol, acho que você fez confusão com o pagamento, eram 5 mil
dólares e recebi 10.”
Não tenho tempo de desligar a tela do celular e já recebo a resposta.
“Está tudo certo, considere um pedido de desculpas pelo atraso, não
vai acontecer de novo, prometo. XOXO KEROL.”
Estranho a mensagem pelo tom simpático que ela nunca usou antes e
mais ainda pelo pedido de desculpas. Kerol é uma patricinha mimada que
nunca pede perdão pelas merdas que faz.
Mas se ela confirmou que mandou o dinheiro mesmo, nem vou
responder à mensagem, só eu sei o quanto preciso dessa grana e, com a
quantidade a mais vou poder deixar as contas da casa em dia e ainda pagar
uma parte da dívida com a farmácia. Quem sabe consigo até comprar algo
diferente para minha mãe comer, tem meses que estamos sobrevivendo só
com as cestas básicas de doação.
Quando dá meio-dia esquento o prato de comida que minha tia deixou
e obrigo minha mãe a comer enquanto converso um pouco com ela e conto
sobre os últimos vídeos que editei. Ela gosta de me ouvir falar enquanto
come, mesmo que na maioria das vezes não entenda sobre o que estou
divagando em sua frente, ou até quem sou eu.
Não demora muito e dona Rosa entra usando a sua chave, ela é uma
boa mulher e cuida muito bem da minha mãe, por isso, quando vejo seu
olhar preocupado sei que está precisando do dinheiro e agradeço por poder
finalmente pagar o que devo.
Ela vai direto para a cozinha e a sigo, fechando a porta para que
minha mãe não nos escute, não preciso preocupá-la com esses problemas,
levando em consideração seu estado de saúde.
— Chace, querido, não queria te cobrar, só que... — ela começa a
falar calmamente, mas a interrompo.
— Consegui um novo emprego e já recebi da moça que me devia,
inclusive vou te pagar o mês adiantado — digo rapidamente e ela me olha
desconfiada. — Ela me pagou com juros — explico e faço uma
transferência diretamente para a conta da cuidadora. — Mas preciso
conversar sobre seus horários.
Por sorte dona Rosa aceitou o novo cronograma de trabalho e até me
agradeceu, pois a outra pessoa que ela cuidava faleceu há um tempo e ela
ainda não preencheu sua agenda. Prometi não atrasar mais os pagamentos,
torcendo para que realmente não aconteça.
Ainda não faço a menor ideia do quanto vou receber naquela boate,
mas seja o que for, continuarei com as edições e isso deve complementar a
minha renda. O vídeo que editei para uma DJ fez sucesso nas redes e recebi
alguns e-mails com propostas que ainda preciso analisar, embora agora não
tenha tempo.
Quando olho no relógio percebo que tenho menos de uma hora para
chegar até a boate e não posso me atrasar justamente no primeiro dia, senão
ela vai me matar, literalmente. Droga.
Coloco uma troca de roupa na mochila, um chocolate para a viagem,
pego o carregador, os fones de ouvido e alguns itens de higiene também.
Aquela garota, ou mulher — não faço a menor ideia de qual é a idade dela,
apesar de não parecer ser muito mais velha que eu, seu olhar traduzia
experiência —, não me falou exatamente o que farei, então é melhor
garantir.
Dou um beijo de despedida na minha mãe e aviso dona Rosa que
qualquer coisa é só me ligar enquanto saio correndo para pegar o ônibus.
Depois de quase 1 hora, chego na boate com 2 minutos de
antecedência, completamente suado por correr 3 quadras, já que o ônibus
não para aqui na frente. O segurança me olha dos pés à cabeça com
desconfiança e depois me faz abrir a mochila, tirando tudo de dentro para
revistar.
Sinto-me, como se estivesse fazendo algo de errado mesmo que não
esteja carregando nada de estranho, e é só depois de confirmar isso que ele
me dá passagem. Lá dentro sou praticamente atacado por uma mulher loira,
muito alta e com os peitos mais firmes e redondos que já vi, cobertos
somente por um top branco. Ela está usando uma calça de cintura alta preta
e um salto enorme nos pés, que a deixam ainda maior, e me sinto
intimidado em sua frente.
— Finalmente, garoto, está atrasado! — repreende com impaciência e
começa a andar em direção ao bar.
— Eu cheguei dois minutos antes, o seu segurança que me parou ali
e... — tento justificar, porém ela não parece estar ouvindo.
— Vamos lá, meu nome é Sharon, sou a gerente e responsável por
tudo aqui, inclusive você. Hoje vamos nos encontrar com o restante dos
meninos, Rick é o mais velho e experiente e é ele quem vai te ensinar as
coreografias e tudo o que precisa saber para fazer o seu trabalho, então faça
o que ele mandar. Depois de ensaiar, vocês terão um tempo para um lanche
e se trocar, o bar abre às 20 h, seu uniforme já está no armário e é bom que
saiba servir bebidas.
— Já trabalhei em um bar.
— Você faz tudo o que eu mandar, sem reclamar — ela continua
falando sem dar sinais de que me ouviu. — Às quartas e domingos não
temos apresentações privadas, só DJ e o bar. Nesses dias você atende no
balcão e ajuda a limpar depois.
Faço uma anotação mental do que ela está falando para depois marcar
no meu celular.
— Às quintas, sextas e sábados os meninos se apresentam no show
privado, nesses dias você trabalha como garçom nas mesas e atende as
clientes. — Ela se vira abruptamente para mim e quase me choco em seu
corpo. — Use seu melhor sorriso e quem sabe pode tirar algumas gorjetas
boas, já que... — seu olhar desce pelo meu corpo e as sobrancelhas erguem
em espanto — digamos que vai precisar se esforçar bastante na academia
para melhorar isso aí.
Com o que me pareceu um insulto, ela passa por uma porta e sobe a
escada que dá no segundo piso, onde encontramos uma sala ampla e cheia
de aparelhos de academia, mais ao fundo vejo uma parede de espelhos onde
cinco homens se alongam em uma barra horizontal, que parece ser daquelas
de balé.
Reconheço o cenário de filmes que assisti, também porque nunca
entrei em uma sala de dança e muito menos em uma academia.
— Meninos — A mulher bate palmas, atraindo a atenção para nós. —
Este é Chace, o novo mascote do grupo, ensinem os truques necessários
para ele e não abusem do garoto, ele pertence a Mali.
Fico vermelho com a apresentação e penso ter ouvido errado, ontem o
homem a chamava de Ali e não Mali. Parece que sou um animal de
estimação e não uma pessoa pela forma com que ela me apresentou, mas
não tenho tempo para falar nada antes que ela se vire e saia rebolando,
deixando-me sozinho com cinco dos homens mais bonitos e diferentes que
já vi.
— Bem-vindo, garoto. — O que parece ser o mais velho, por causa da
barba e dos cabelos brancos, é o primeiro a andar até mim e estender a mão.
Ele está vestido só com uma calça de moletom cinza e tênis, o peito
musculoso à mostra me deixa sem jeito. — Eu sou o Rick e serei o
responsável pelo seu treinamento.
— Chace — apresento-me, desviando os olhos do seu corpo malhado
para não parecer interessado demais.
— Mali arrumou outro desses Tik-Tokers? Quando ela vai aprender
que essa merda não funciona aqui? — quem reclama é o loiro baixinho e
musculoso.
— Cala a boca, Giovani, se bem me lembro você também tem uma
conta lá, só está reclamando porque ninguém quer seguir você — outro
homem, de pele bem escura e o cabelo trançado e amarrado no topo da
cabeça sorri para o loiro, provocando-o. — Bem-vindo, garoto.
— Não precisa ter medo, a gente não morde — o mais alto e com um
sorriso simpático fala e solta uma gargalhada.
— Chega, chega — Rick corta seus colegas. — O loiro marrento é
Giovani, o das tranças é o Brody, este é o Kevin e o que está fingindo não
ouvir é o Drew. — Aponta para o único do grupo virado de costas para nós
enquanto alonga os braços. — Então, como veio parar aqui?
Pondero se conto toda a minha história aos cinco estranhos, mas
levaria muito tempo, então decido resumir.
— Preciso pagar uma dívida.
— Para a Mali ou para o Gabriel? — Rick questiona, interessado, e
novamente se refere àquela mulher como Mali. Será que entendi errado
ontem?
— Ambos. — Desvio o olhar deles.
— Você tá fodido mesmo — Kevin é quem solta o comentário e sinto
meu rosto queimar de vergonha.
— E o que você sabe fazer? — Rick pergunta, mudando de assunto.
— Trabalhei como garçom em um bar próximo de casa, mas é isso.
— Quis dizer na parte da dança, todo mundo sabe servir mesas e
preparar uns drinks.
— Bem... Nada — respondo envergonhado.
— Então teremos muito trabalho pela frente. — Rick sorri
encorajador e me mostra o lugar.
Ele já tem um armário separado para mim e me entrega um cadeado
ainda na embalagem, mostra onde fica o banheiro e a estante de
suprimentos, lotada de potes com o que Rick apresentou como
“suplementos para treino”.
Não entendo nada de academia, muito menos de musculação, mas ele
disse que vai me ensinar como usar aquelas coisas para ganhar massa
muscular enquanto treino.
Depois Rick me passou alguns exercícios para alongar o corpo e
soltar o quadril, já que sou todo travado, de acordo com ele. Enquanto isso
eles trabalhavam em adaptar as coreografias, pelo que entendi um dos
dançarinos saiu sem aviso prévio e agora eles precisam reformular as
apresentações.
Só de assistir a forma com que eles executam cada um dos
movimentos, sincronizados um com o outro, movendo o corpo no ritmo da
música, rebolando de uma forma tão confiante e sensual, eu tenho certeza
de que vou demorar meses para chegar a 10% disso.
— Vamos preencher a lacuna da dança individual que vai faltar com
um dos nossos números antigos, não temos tempo para ensaiar algo novo —
Rick comanda.
— Que merda, uma apresentação a mais vai ser cansativo — Giovani
reclama, ele está sentado no chão, o corpo musculoso todo suado do ensaio
e a calça de moletom pendida perigosamente baixa na cintura. — É melhor
aprender algo logo, garoto.
— É só essa semana, Mali avisou ontem que está em negociação com
dois dançarinos, Chace é só um deles e ainda vai demorar para se apresentar
— Rick comenta e senta-se ao meu lado. — Como foram os exercícios?
— Acho que sou mais travado do que imaginava — respondo
tentando brincar.
— Amanhã você estará todo doído, mas é assim mesmo. — Kevin
sorri, encorajador.
— Não sei o que deu na Mali para mandar você aqui, ou qual foi o
acordo de vocês, mas se você se esforçar, em algumas semanas preparo um
número simples para se apresentar.
— Bem simples — respondo e eles começam a rir.
— Ficou com alguma dúvida até agora? — Rick questiona e me
entrega a garrafa de água.
— O nome daquela mulher é Mali? Ontem me pareceu que o homem
a chamou de Ali e...
— Nunca se dirija a ela assim se quiser continuar respirando,
especialmente na frente do Gabriel, chame-a simplesmente de Mali — Rick
responde sério e o clima muda completamente. — Olha, garoto, eu não sei
como você se meteu nessa, mas se está devendo para eles, sabe muito bem
quem são e o que eles fazem da vida, por isso vou te explicar como as
coisas funcionam por aqui.
— Rick, tem certeza? — Kevin é quem tenta pará-lo, mas o homem
mais velho acena, confiante.
— É melhor que ele saiba ou corremos o risco de perder mais um e
precisar treinar alguém do zero — Rick responde seriamente. — Mali é a
irmã de Don Lorenzo, chefe da máfia italiana em Boston. O nome dela é
Alícia, mas somente pessoas de seu círculo interno de confiança podem
chamá-la assim, todos os outros a conhecem como Mali, o mesmo nome da
boate.
— Entendo...
— Ela e o Gabriel são inseparáveis em tudo, eles são executores da
Família de Angelis e têm uma relação diferente, digamos assim.
— São um casal — coloco em palavras o que ele não falou, mas isso
eu já sabia. Será que ele acha estranha a relação deles por causa da
diferença de idade?
— Sim, mas também gostam de usar outras pessoas em suas
brincadeiras — Rick diminui o tom de voz ao explicar esta parte. —
Ninguém aqui é santo, todos temos nossa cota de putaria nas costas, mas
aqueles dois... eles estão em outro nível.
— Como assim?
Rick troca um olhar tenso com os outros homens, deixando-me ainda
mais curioso para saber o que realmente acontece com aquele casal.
— Só não se envolva sexualmente com eles, garoto. Não sei quais as
tuas preferências e não me importo, mas você não tem cara de alguém
muito experiente — Kevin alerta.
— Mali pode parecer uma garotinha mimada e brincalhona, mas essa
mulher tem toda a máfia italiana em suas mãos e o executor na sua cama.
Não faça nada para aborrecê-la e, por último, em hipótese alguma chegue
perto do Gabriel ou encoste nele. Mantenha o mínimo de um metro de
distância, a única pessoa que pode tocá-lo é a Mali, qualquer outra... Bem,
você deve imaginar o fim.
Olho para eles seriamente e vejo medo genuíno em suas faces, então
concluo que não é uma brincadeira, é um aviso sério. Meu coração bate
ainda mais rápido no peito, onde diabos fui me meter?
— Se fizer o que falamos não terá problemas — Rick corta o silêncio
e se levanta. — Agora vamos comer algo e descansar um pouco antes do
trabalho realmente começar. — Ele estende sua mão para mim e me ajuda a
levantar.
— Tem algum lugar para comprar comida aqui perto? Sai apressado
de casa e não trouxe nada.
— Fica tranquilo, tudo o que tem na cozinha é oferecido pela casa, se
tiver alguma restrição alimentar é só me falar e repasso para Sharon. Os
produtos de higiene do banheiro também estão liberados, isso me lembra
que preciso das tuas medidas para mandar fazer o uniforme, o que irá usar
hoje é meu, mas vai ficar bem grande em você.
Depois disso fizemos um lanche e Drew me propôs um plano
alimentar para seguir que vai me ajudar a ganhar massa muscular. Segundo
ele, ingerindo uma quantidade alta de calorias e treinando pesado, verei
resultados com o tempo. Ele também me passou um endereço de uma
clínica médica onde terei que fazer uma bateria de exames antes de
realmente começar a treinar, e mais alguns de sangue, para garantir que
estou limpo.
Em seguida tomamos banho e nos trocamos. Eles colocaram a roupa
do primeiro show e eu o uniforme de garçom que estava no meu armário,
realmente ficou bem frouxo no meu corpo, preciso apertar muito o cinto na
calça social.
— A mulherada vai à loucura hoje à noite — Kevin comenta e me
ajuda a fazer o nó na gravata borboleta. — Elas adoram um novinho.
— Bando de Maria Mucilon, isso sim — Giovani complementa e eles
soltam gargalhadas.
— Falando nisso, que idade você tem, garoto? — Rick pergunta.
— Fiz 22 mês passado.
— Tem namorada ou namorado te esperando em algum lugar? —
Giovani provoca.
— Não.
— Mas tu curte o quê? — Kevin pergunta diretamente e dá um
tapinha no meu peito quando termina com a gravata. Preciso desviar o olhar
dele porque não sei o que responder.
— Ele quer saber a tua sexualidade, garoto — Giovani se intromete
novamente e se senta do meu lado. — Não precisa ter vergonha, ninguém
aqui vai te julgar, não. Rick, Drew e Kevin são gays, eu sou bissexual e o
Brody é o nosso hetero de estimação.
— Bem, eu não sei — falo baixo, sentindo meu rosto esquentar
quando todos os olhares estão em mim. — Quer dizer, se for pensar por
atração...
Não termino a frase porque o barulho de saltos batendo no piso do
lado de fora da cozinha faz com que todos aqui dentro se retraiam e olhem
para a porta. Giovani levanta rapidamente e se afasta de mim, conferindo a
própria roupa, assim como os outros, que parecem estar esperando uma
inspeção do exército.
— Boooooa noite, meus meninos. — A voz doce e brincalhona da
Mali faz meus pelos do corpo arrepiarem antes mesmo dela passar pela
porta. — Receberam bem o meu gatinho?
A mulher caminha tranquilamente em cima dos saltos e entra na sala,
vestida em uma saia de couro preta e um top pink. A loira está ainda mais
estonteante do que eu me lembrava, logo atrás dela Gabriel bloqueia a saída
com seu corpo, mas não entra.
— Boa noite, Mali — Rick é o primeiro a criar coragem e responder,
mas vejo que até ele está apreensivo e olha para o chão. — Ele teve as
primeiras aulas hoje.
— E você foi um bom professor, Rick querido? — Ela anda em
direção ao dançarino e passa a mão pela barba branca dele, Rick confirma
com um movimento da cabeça e ela sorri. — Muito bem, é assim que eu
gosto, meus meninos receptivos e ajudando uns aos outros.
Vejo que Rick desvia o olhar da mulher para a porta e seu rosto perde
a cor, viro-me na direção em que ele está olhando e vejo Gabriel fuzilar o
dançarino com um olhar matador, mas o que realmente me faz tremer é que
ele está com uma mão em cima da arma na cintura.
— Agora temos um assunto mais... como posso dizer? — Ela finge
confusão enquanto caminha pelo centro da sala. — Acho que delicado é
uma boa palavra — Ela caminha até ficar de frente para Gabriel, consigo
ver a interação dos dois porque estou na parede oposta e Mali sorri para ele,
de costa para o restante dos dançarinos. — Como vocês já estão sabendo,
Victor subitamente parou de respirar ontem à noite — anuncia e levo um
tempo para entender sua frase. — Vocês também já devem saber o motivo
disso, portanto vou ser bem direta.
Ela respira fundo por alguns segundos, aumentando ainda mais a
tensão no ambiente, então se vira para encarar os dançarinos, dessa vez seus
olhos estão fervendo de raiva.
— Se eu pegar mais alguém vendendo droga não autorizada na minha
casa, vou garantir pessoalmente que o tal tenha uma morte ainda mais lenta
e dolorosa que a dele. — Prendo a respiração, sem coragem para
movimentar um músculo ao absorver a ameaça. — Entendido?
— Sim, Mali — o bando de homens responde em conjunto.
— Muito bem, agora vão lá e façam um show, teremos outro
dançarino em breve. — Ela volta a sorrir enquanto fala, mudando a
expressão de raiva para euforia em um piscar de olhos.
Solto a respiração que não percebi estar segurando e sinto o olhar de
alguém em mim, mas quando crio coragem para averiguar, os dançarinos
estão se preparando para sair. Olho para a porta com mais esperança do que
deveria, mas eles não estão mais lá.
CAPÍTULO 6

Alícia
 
Adoro ver o rosto apavorado desses homens que, por mais que
tenham os corpos fortes, são umas cadelinhas assustadas em minha
presença. Era exatamente isso que eu queria.
O medo pode não significar respeito, mas funciona que é uma beleza
para controlar os ratos.
Caminho pela área restrita da minha boate, nos bastidores de tudo
consigo assistir ao show e à reação do público. Aqui em cima, em uma
marquise especialmente construída para isso, tenho a visão do meu reino.
Escoro os braços na grade de proteção e logo sinto o corpo de Gabriel
cobrindo as minhas costas, seu calor me aquece e passa a sensação familiar
de pertencimento e proteção.
— Onde você está, amor? — questiona com a boca muito próxima do
meu rosto, enquanto sua mão acaricia meu braço e a outra afasta meu
cabelo.
— No meu mundinho — respondo e fecho os olhos ao sentir um beijo
carinhoso na pele sensível da curva do meu pescoço. — Preciso contratar
mais um dançarino, pelo que assisti nas câmeras de segurança, Chace vai
demorar até poder subir em algum palco.
Gabriel trilha um caminho de beijos pelo meu rosto e logo sua mão
viaja até o meio das minhas pernas, só o calor do seu corpo misturado ao
cheiro do perfume dele já me deixa quente, então afasto as pernas, abrindo
caminho para que me dê prazer.
— Você precisa relaxar, amor — ele sussurra e morde o lóbulo da
minha orelha com carinho.
— Me faz relaxar — ordeno e sinto seu sorriso contra meu pescoço.
Como estamos acima das luzes da balada, ninguém consegue nos ver,
este lugar foi construído exatamente para servir de observatório.
— Como ordenar, diabinha — Sorrio com o apelido e me delicio com
o prazer que seus dedos me proporcionam.
Gabriel tem quatro formas de me chamar: Ali quando não estamos a
sós, Amor é reservado para os momentos especiais, já Alícia ele usa se está
irritado ou nos raros momentos em que consigo tirá-lo do sério, e Diabinha
quando quer me animar.
Não demoro muito para estar rebolando contra seus dedos, sentindo o
volume da ereção de Gabriel na minha bunda, e me seguro mais firme na
grade. A música alta da DJ que abre o show e esquenta a galera dita o ritmo
das batidas do meu coração e me entrego a essa experiência.
Perco-me no prazer quando ele coloca minha calcinha para o lado e
introduz dois dedos em meu canal, entrando e saindo, e acaricia meu clitóris
no caminho de uma forma deliciosa.
Gabriel sabe do que eu gosto, estamos juntos há cinco anos, fodendo
quase diariamente. Ele reconhece cada um dos meus sinais, assim como sei
os dele, e quando o escuto gemer em meu ouvido, deixo que o orgasmo me
leve, substituindo todos os meus problemas por uma doce sensação de
prazer.
Assim que recupero um pouco os sentidos, Gabriel tira os dedos
melados da minha boceta e leva até a sua boca, viro-me para assistir a
expressão de prazer em seu rosto quando prova meu orgasmo.
— Gostoso? — questiono e jogo meus braços em seu pescoço.
— Delicioso — responde e me puxa para um beijo, fazendo-me
provar do meu próprio gosto em sua boca.
Não leva muito tempo para o beijo se tornar mais profundo e sexual,
porém uma ideia vem à minha mente.
— Como não pensei nisso antes — repreendo-me e saio dos braços de
Gabriel, já indo em direção às escadas. — Vem, amor, já sei como resolver
meu problema.
Minha família controla as casas de jogos e prostituição clandestinas
na cidade de Boston, também possuímos diversas casas noturnas, algumas
legalizadas, outras nem tanto. Como diz meu irmão Matteo: oferecemos
entretenimento para todos os bolsos.
As casas de jogos mais procuradas pela nata da cidade são nossas,
mansões ostensivas que abrigam festinhas privadas com prostitutas de luxo
à disposição de quem carrega um nome poderoso o bastante para entrar, e é
exatamente para uma delas que estamos indo.
Abraço a cintura de Gabriel ainda mais forte enquanto ele acelera sua
Kawasaki H2R de 1000cc com Supercharger, que chega a 326CV. A
motocicleta é seu meio de transporte preferido e foi um presentinho de
aniversário que escolhi para ele há dois anos.
Atrás de nós o carro com os guarda-costas tenta nos acompanhar, o
que é quase impossível. Ergo a viseira do capacete preto e grito para
Gabriel acelerar, o que ele faz, animado.
Eu amo velocidade e ele também, a adrenalina de correr em meio ao
tráfego e passar todos os limites de velocidade faz meu coração bater ainda
mais rápido e sorrio olhando para as luzes que passam como um borrão ao
nosso lado.
Infelizmente chegamos ao nosso destino rápido demais, o segurança
no portão da mansão reconhece a motocicleta preta que tem as letras AG
em rosa pink pintadas na lataria. Assim que os portões de ferro de abrem,
temos a visão dos incontáveis carros de luxo estacionados na garagem.
— Faz tempo que não apostamos uma corrida — comento animada
quando Gabriel me tira de cima da moto e cola sua boca na minha. — Estou
com saudade de ganhar dos meus irmãos.
— Podemos preparar uma corrida no final de semana — sugere e
pega minha mão.
— Boa ideia — concordo com pulinhos de alegria, já imaginando um
evento entre a família de Angelis, onde eu sou a vitoriosa em todas as
corridas. — Domingo. Prepara tudo, amor, e lembre-se que eu amo
comemorar a minha vitória com você.
Gabriel sorri de forma leve e feliz — coisa que só faz quando estamos
sozinhos —, mas assim que o elevador chega sua mão aperta a minha e ele
fica tenso ao meu lado.
Ainda não falei o que viemos fazer aqui, sei que quer perguntar e
deve estar se remoendo de curiosidade, mas deixo que formule suas teorias.
Não gosto de ser óbvia para não cair em uma rotina chata com ele.
A porta se abre para a cobertura da casa, onde uma sala toda branca e
luxuosa é palco de negociações entre os homens engravatados da alta
sociedade. As mulheres aqui são só para diverti-los, prostitutas de luxo,
vestidas com roupas minúsculas e caríssimas pagas com o dinheiro sujo de
homens corruptos.
Entre estes homens avisto meu irmão do meio, Matteo de Angelis.
Aos 34 anos, cabelos loiros e olhos azuis que puxou da parte da nossa mãe,
o desgraçado é um homem muito bonito e tem carisma e lábia para ser
presidente, se quisesse, mas meu irmão é o Consigliere da nossa Família.
Foi treinado desde muito pequeno para ser o braço direito do Don.
Assim que seus olhos caem sobre mim, Matteo muda a expressão leve
e o sorriso aberto que usava com o grupo para uma mais séria e apreensiva.
Ele pede licença e vem nos receber.
— Boa noite, irmãzinha, não sabia que viria me visitar ou teria feito
uma festa para comemorar sua ilustre presença. — O tom debochado quase
consegue esconder a preocupação em sua voz, quase…  — A que devo a
honra?
— Preciso de um dançarino e pensei: onde eu poderia encontrar um
homem bonito e que saiba usar o corpo? — explico e finjo pensar na
resposta. — Então me lembrei de você.
Matteo solta uma gargalhada contagiante e olha de mim para Gabriel
antes de responder.
— Eu te amo, mas nada no mundo vai me fazer dançar na sua boate
— debocha, então faz sinal para o seguirmos até o lado de fora, onde
algumas mulheres de biquíni aproveitam a piscina e são assistidas de longe
por olhares desejosos.
— Agora você me deu uma ideia para nossa próxima aposta — pisco
para ele e pego um copo de whisky que o garçom trazia para meu irmão. O
homem olha assustado para o copo em minha mão.
— Está esperando o quê? — Matteo esbraveja firmemente para o
garçom, que se encolhe de medo. — Vai lá pegar outro para mim.
— Si... sim, senhor de Angelis — ele responde e sai o mais rápido
que consegue sem correr.
O movimento me faz olhá-lo com mais atenção enquanto se afasta,
suas costas são largas e os músculos preenchem bem a camisa social
branca, assim como a calça preta que fica coladinha na bunda e nas pernas
dele.
— Então foi para isso que veio até aqui? Roubar mais um dos meus
funcionários? — Matteo finalmente entende o motivo da minha visita e
sorrio, levando o copo à boca e engolindo todo o conteúdo de uma vez.
Sinto o líquido descer queimando pela minha garganta e se alojar no
estômago vazio.
— Eu sei que teus garçons são bons, preciso de algum que tenha algo
a mais... um gingado, quem sabe um latino?
— Por que não anuncia na internet? Tua boate é quente, Ali, pagamos
muito dinheiro para que ninguém descubra o que acontece no subsolo, mas
o bar e a balada estão dentro da lei — Matteo sugere.
— Eu sei, mas demora muito e preciso de alguém para semana que
vem, meus meninos já estão desfalcados e o que contratei vai demorar até
estar pronto para os palcos. — Começo a diminuir o tom da minha voz,
ergo as sobrancelhas e olho com carinha de cão se dono para meu irmão. —
Vamos, maninho, só um desses garçons gostosos que você tem aí, é bem
mais fácil para você conseguir outro, servir bebidas qualquer um serve.
Matteo me encara pensativo, ele já sabe do meu joguinho, mas não
adianta de nada, porque tudo o que peço para meus irmãos, eles me dão. A
mão de Gabriel em minha cintura é uma marca disso.
— Tudo bem, mas só um deles — concorda e me jogo em seu
pescoço, abraçando meu irmão como uma garotinha, que ele recebe com
carinho por já estar acostumado. — Só vê se não usa esse nos joguinhos de
vocês — Matteo fala para Gabriel. — Lembram da última vez, não
lembram?
— Não se meta nisso — repreendo e dou um beijo em seu rosto. —
Agora aponta para o melhor dançarino do local.
Assim que começo a avaliar as pessoas, o garçom de antes volta com
dois copos de whisky e olho detidamente para seu rosto: ele tem o cabelo
preto bem curto, a barba aparada cobrindo o maxilar quadrado, os olhos
escuros e um sorriso bonito, mesmo que esteja se tremendo de medo ao
entregar a bebida para meu irmão.
— Qual é o seu nome? — questiono antes que ele se vire para sair.
Ao perceber o olhar confuso em seu rosto, complemento: — Sim, você
mesmo.
— Nathan — responde baixinho.
— Você é uma delícia, Nathan — elogio e o assisto ficar vermelho,
então me aproximo, atraindo sua atenção para mim e logo seu olhar cai para
os meus peitos, que espremo um pouco com os braços, — Tem certeza de
que quer olhar aí mesmo, quando meu irmão e meu namorado estão logo
atrás de mim? — provoco e Matteo solta uma gargalhada, divertindo-se
com o desespero do garçom.
— Como se você não fosse muito pior que nós dois juntos — Matteo
comenta e se escora na sacada de vidro, de costas para a paisagem. Seu
olhar brincalhão avalia o garçom.
— Então, por que trabalha aqui? — indago e passo a mão pelo seu
peito, sentindo os músculos firmes embaixo do tecido. — Responde logo —
exijo com impaciência.
— Preciso de dinheiro para pagar a faculdade.
— Um estudante — anuncio com diversão e caminho para ficar atrás
dele. — Que curso você faz, Nathan?
— Enfermagem.
Isso me dá uma ideia maravilhosa e, assim que olho para Gabriel e o
vejo conter um sorriso, sei que pensou a mesma coisa.
— Ahhhh, isso será perfeito! A partir de agora você é um dançarino
da Malícia e, assim que Rick te treinar, vamos fazer um show solo com
você vestido em uma fantasia muito sexy de enfermeiro. — Estou tão
animada com a ideia de que dou um tapa forte na bunda durinha do meu
novo dançarino. — Pegue suas coisas, você vem com a gente para a
Malícia.
— Eu não posso... quer dizer... eu... — gagueja com os olhos
arregalados de medo à procura do meu irmão — Senhor de Angelis...
— Ali, irmãzinha, sabe que não pode forçá-lo a nada. Terá que fazer
uma proposta melhor do que a minha para que ele vá por livre e espontânea
vontade — Matteo provoca com um sorriso travesso no rosto.
— Quanto você cobra para dar o cu? — questiono seriamente e me
coloco de pé em frente à Nathan. Cruzo os braços abaixo dos meus peitos,
fazendo-os saltar e atraindo sua atenção para eles novamente, mesmo que
só por um momento, porque logo se lembra que não deve olhar e foca no
meu irmão. — Não precisa ter vergonha, querido, mas julgando pela sua
reação, você está se prostituindo sem nem gostar da coisa, então minha
oferta é te levar para uma boate onde todas as minhas clientes são mulheres
e você escolhe se quer ou não vender o seu corpinho.
— Assim você quebra meus negócios, maninha — Matteo reclama e
ergo um dedo, fazendo-o calar.
— Na Malícia meus meninos são quem escolhem as clientes, eles
fazem o preço e tem as suas regras e preferências individuais. Também não
é obrigação, o que quero mesmo é um bom dançarino, o cachê já é maior do
que você ganha fodendo com estes homens nojentos e abusivos. — Isso
atrai a sua atenção para o meu rosto e Nathan parece finalmente interessado.
— E estará sob a minha proteção.
— Ele também está protegido aqui — Matteo me interrompe.
— É por isso que tem marcas de queimadura no pescoço? — Olho
séria para meu irmão e as acusações são certeiras. — Deveria cuidar melhor
da nossa mercadoria, irmão.
Pontuo a palavra “nossa” para ele lembrar que também sou uma de
Angelis e tenho parte nesses negócios. Matteo olha preocupado para o
garçom.
— Vou checar sua cartela de clientes para saber quem fez isso e terei
uma conversa com os outros homens, temos uma política séria contra
agressões e, se caso acontecer, devem relatar o abuso para que a casa tome
as medidas cabíveis — Matteo anuncia, mas depois que aconteceu, não
adianta fazer esse escândalo todo.
— Então, querido, vamos? — Indico a saída para Nathan e espero que
tome sua decisão, ele olha de mim para Matteo, mas logo se vira e começa a
andar. — Bye, bye, maninho — eu me despeço, debochada, e tiro a bebida
das mãos do meu irmão, virando todo o conteúdo de uma só vez em minha
boca. Jogo o copo pela varanda sem me importar onde ele vai cair. — Ah,
domingo teremos uma corrida em casa, está convidado a participar da
minha vitória.
— Vou te fazer comer poeira, isso sim — Matteo responde
brincalhão. — Ela está em suas mãos, Gabriel.
Meu amor assente positivamente com a cabeça e anda até mim,
entrelaçando nossas mãos antes de caminharmos até o elevador. Mando os
seguranças levarem Nathan até a Malícia e Gabriel e eu partimos para curtir
um pouco a noite de moto.
Quando o álcool começa a fazer efeito, meu estômago reclama de
fome e paramos em um drive-thru do McDonald´s. Pedimos vários lanches
e os seguranças ficam encarregados de levar para a Malícia. 
Assim que chegamos na boate, pegamos a comida e subimos as
escadas da saída de emergência até o telhado. Gabriel coloca um calço na
pedra para a porta não fechar e tira a jaqueta de couro, estendendo-a no
chão.
Pesco um baseado do vão dos meus peitos e vejo seu rosto sério, mas
ele acende com o isqueiro cromado com que o presenteei no Natal e
fumamos até ficarmos chapados o suficiente para rir de tudo. Sentados no
chão, com um banquete de porcarias aos nossos pés, me deixo relaxar nos
braços do meu amor.
CAPÍTULO 7

Gabriel
 
Acordo mais cedo e vou até o escritório do Don para encontrá-lo
concentrado em uma pilha de papéis, ele normalmente está em casa pela
manhã e aproveito, porque preciso falar com ele a sós.
— Gabriel, que milagre vê-lo acordado a essa hora. — Don Lorenzo
me recebe com sarcasmo, mas autoriza minha entrada e faz sinal para que
me sente na cadeira à sua frente. — A que devo a honra?
— Alícia não está bem. — Vou direto ao assunto e isso o faz parar
tudo o que estava fazendo e me olhar preocupado.
Só tem uma coisa que faz o Don descer da pose de chefão da máfia
para voltar a ser meu amigo: sua família.
— Estou ouvindo. — Ele guarda os papéis em uma pasta e se escora
na cadeira de couro, dando-me sua total atenção.
— Os pesadelos voltaram com mais frequência, ela está bebendo
novamente e tem fumado maconha para relaxar — relato.
— Ela falou sobre algum problema em específico que possa estar
atrapalhando sua rotina?
— Não, mas você sabe como ela fica quando está entediada.
— Sim, eu sei. Matteo comentou que vocês foram na mansão 12 e
algo sobre uma corrida este final de semana.
— Ali pediu para organizar uma corrida de motos, talvez seja bom
para extravasar e passar um tempo em família — sugiro.
Lorenzo pensa por um tempo, ele sabe como os períodos ansiosos da
irmã afetam a família, precisamos intervir antes que ela realmente perca o
controle e acabe se machucando.
— Vou limpar minha agenda no domingo, só mantenha ela longe de
qualquer bebida ou drogas antes da corrida. Se eu souber que ela tomou
algo, cancelo o evento — anuncia seriamente.
— Pode ter certeza de que se ela usar alguma coisa eu mesmo não a
deixarei pilotar.
Lorenzo é meu melhor amigo desde que éramos pequenos, meu pai
foi o Consigliere do pai dele antes do sequestro e ficou no cargo até que
Matteo estivesse pronto para assumir.
Fomos criados juntos e nunca brigamos seriamente, até que Alícia
retornou da Inglaterra e virou meu mundo de cabeça para baixo. Depois
disso nossa amizade mudou e acabamos nos afastando um pouco.
— Gabriel, à tarde preciso de vocês comigo na negociação com os
Russos, o Brigadier estará presente e tenho a sensação de que podemos ter
problemas — Lorenzo explica seriamente. — Eu a deixaria de fora depois
do que me falou, mas sei que será impossível, então Alícia ficará sobre a
sua responsabilidade.
— Que horas?
— Às 19h, no local de descarga de mercadoria.
— Estaremos lá — confirmo e volto para o nosso quarto.
Abro a porta com cuidado para não fazer nenhum barulho, as cortinas
que ela sempre quer abrir durante a noite para ver a lua dão passagem à luz
do dia que ilumina o corpo da mulher mais linda desse mundo.
Deitada de lado, o lençol embolado no meio das pernas, Alícia está
abraçada em seu bicho de pelúcia preferido, um coelho de 50 centímetros
que comprei de presente no seu aniversário de vinte anos.
Quando não estou do seu lado é o coelho de pelúcia quem toma meu
lugar e preciso sorrir com isso, afinal este é o apelido que ela usa comigo.
Alícia é fascinada pela história de Alice no País das Maravilhas desde
que era pequena. Antes de tudo acontecer ela vivia brigando por seu nome
não ser o certo, queria ser chamada de Alice, mas com o tempo se
contentou com o apelido de Ali. Quando a encontrei no esconderijo do
maldito Alejandro Vasquez, a primeira coisa que vi foi a mãe e o pai dela
mortos, e Alícia correndo para meus braços e me chamando de Bunny.
Em sua cabeça eu era o coelho que leva a Alice para o País das
Maravilhas, um lugar secreto e que simboliza todos os sonhos da menina,
onde ela pode se esconder do mundo real e viver em uma realidade
alternativa.
No momento nem pensei em nada, só me abaixei e a peguei no colo,
suas mãozinhas pequenas apertaram meu pescoço quando ela escondeu o
rosto no meu peito. Alícia foi a primeira pessoa a me tocar sem que eu
quisesse afastá-la, muito pelo contrário, naquele momento eu só queria
trazê-la mais para perto e proteger a menina de todo o mal ao seu redor.
Queria tirar as lembranças dela, carregar comigo o peso de tudo o que
aconteceu, mas infelizmente cheguei tarde demais e a menininha que
conheci desde que era um bebê, que muitas vezes enchia o saco dos irmãos
pedindo para brincarem com ela ou assistir mais uma vez ao filme da garota
que caia no buraco, estava marcada para sempre com os terrores do nosso
mundo.
Como esperado, Alícia mudou depois daquilo. Seus irmãos fizeram o
possível para criá-la da melhor forma, mas eram jovens e já tinham o fardo
de herdar os negócios da Família.
Ver a mulher de cabelos loiros espalhados pelo travesseiro branco em
um sono tranquilo faz meu coração disparar, porque sei quais as marcas que
ela carrega. Assim como eu, seus traumas são demônios que muitas vezes
ficam pesados demais para suportar.
Antes de ser enviada para passar um tempo com meus pais na
Inglaterra, eu nunca pensei nela como uma mulher, afinal era uma
adolescente de 14 anos, problemática e muito mimada, que estava fora de
controle.
As coisas só pioraram quando ela usou drogas pela primeira vez e
sentiu o torpor da substância escondendo seus traumas, pouco tempo depois
estava viciada. Depois de um episódio em que ela quase morreu, seus
irmãos decidiram enviá-la para a Europa, longe daqui, e entregaram a
menina para os meus pais criarem.
Ela até ficou um tempo lá, acho que até ela se assustou depois daquele
episódio traumático. Só que no momento em que Alícia retornou, já com 19
anos e decidida que eu seria seu, tudo mudou.
— Para de me olhar e vem aqui deitar comigo — Ali reclama
baixinho, ainda com os olhos fechados e joga a pelúcia no chão. — Esse
Bunny não é quentinho como o meu Bunny. — Ela faz um biquinho fofo
com a boca, toda manhosa, enquanto abre os braços, convidando-me para
deitar.
Sorrio e tiro a roupa antes de voltar para o meu lugar na cama, logo
Ali se enrosca no meu peito, gemendo de satisfação.
— Estou aqui, amor. — Beijo o topo da sua cabeça e inspiro o cheiro
delicioso dela. — Volte a dormir, ainda é cedo.
— Não me solta — pede com a voz baixa e triste. — Tive pesadelos
quando você saiu.
Seu pedido quebra meu coração, a voz frágil que ela só deixa escapar
quando está muito triste me faz puxá-la para mais perto, acaricio seus
cabelos e espero ela se acalmar. Minutos depois sua respiração fica mais
lenta e ela relaxa, voltando a dormir. Contudo, não consigo me desligar, Ali
é tudo para mim. Vivo para protegê-la e fazê-la feliz, só que tem coisas que
jamais poderei carregar por ela ou, até mesmo afastar dela, como seus
traumas.
 
***
 
Os russos vieram em peso para uma simples entrega. Geralmente
quem lida com isso é Matteo, mas como Don Lorenzo foi chamado por
Zion Sidorov — o Brigadier da Bratva em Boston —, a elite dos soldados
da nossa Família está de prontidão.
Alícia confere o pente da sua arma, garantindo que tudo esteja
funcionando caso tenhamos algum confronto. Ao contrário de Matteo, que
anda de um lado para o outro esbravejando ordens, ela está calma do meu
lado.
Cada um dos irmãos de Angelis tem um temperamento diferente. Don
Lorenzo é mais frio e calculista, um estrategista nato e mantém as emoções
contidas. Quando algo, ou alguém, consegue tirá-lo do sério é que as coisas
ficam perigosas.
Matteo é o irmão mais brincalhão e extrovertido, não consegue ficar
parado por muito tempo sem fazer algo e está a todo momento à procura de
desafios.
Alícia é uma mistura dos irmãos. Quando está muito animada com
algo, ela fica extrovertida e brincalhona, porém, quando precisa agir com
calma, essa mulher é aterrorizante.
Exatamente às 19h a Mercedes prata de Don Lorenzo estaciona
dentro do galpão, seus seguranças saem primeiro, conferindo o local, e logo
depois Matteo vai até o irmão.
Nem cinco minutos se passam e escutamos os carros dos russos
chegando em um comboio feito especialmente para a proteção da carga.
Eles entram no espaço aberto, dois carros batedores param na frente, logo
atrás o caminhão com a câmara fria estaciona no local de descarga e, só
então, a BMW azul entra.
Zion Sidrov é o último a sair do carro, Don Lorenzo só se aproxima
depois que nos certificamos da identidade do russo, essas trocas e
negociações são momentos de tensão.
Como executor, fico um pouco afastado do grupo principal, formado
pelo Don, o Consigliere e o meu primo Bryan Esposito, o Underboss da
região. Ali e eu garantimos cobertura do lado direito e nossos soldados
tomam a frente e a retaguarda, também temos a área cercada por snipers
escondidos no segundo piso.
— Don Lorenzo, como sempre sua presença é uma honra — Zion é o
primeiro a falar. Em um sobretudo preto, grosso demais para o calor do
verão, o loiro magro e coberto por tatuagens é meu alvo, assim como seu
irmão mais novo, que anda logo atrás.
— Você me chamou aqui, vamos logo ao que interessa. — Lorenzo
cruza os braços na frente do peito, mantendo uma fachada fria e
desinteressada.
— Direto ao ponto, é assim que eu gosto — o russo responde
animado. — Sua carga está completa dentro do caminhão, como sempre,
seus soldados podem conferir.
— Não esperava menos.
— Mas antes… — Zion coloca as mãos na cintura e ergue uma
sobrancelha de forma teatral, a pausa faz Alícia ficar tensa ao meu lado. —
O Pakhan exigiu alguns esclarecimentos.
— Não tenho nada a esclarecer, nosso acordo não mudou e minha
Família continua cumprindo todos os pontos, Mikhail não tem com o que se
preocupar.
— Tem certeza disso? — questiona e, sem esperar uma resposta, tira
um pacote com cocaína de dentro do bolso e joga no chão, bem em frente
aos pés do Don. — Essa merda do Cartel foi encontrada sendo
comercializada livremente dentro de uma das boates da sua Família.
— Não temos negócios com o Cartel — Matteo interrompe, mas logo
recebe um olhar de aviso de Lorenzo e se cala.
— Tenho duas teorias, uma pode estar correta — o russo ergue um
dedo e fala de forma acusatória —, ou vocês estão fazendo acordos por
baixo dos panos com o nosso concorrente pensando que não vamos
perceber — então ele ergue um segundo dedo — ou não têm controle dos
próprios estabelecimentos a ponto de ter droga de outros traficantes sendo
comercializada lá dentro. Pensando bem, é isso o que acontece quando
entregam assuntos importantes nas mãos de uma mulher.
— O que você disse? — Matteo explode perdendo o controle, mas
quando vai apontar a arma para o russo, Lorenzo contém o irmão e, em uma
troca de olhares silenciosa, Matteo recua.
— Só a verdade, a droga foi encontrada na boate da sua irmãzinha.
Quero acertar um tiro no meio da testa do desgraçado pelo
desrespeito, mas não me movo, se Alícia se sentir ofendida ela mesma sabe
se defender. Só que, assim como os irmãos, ela tem noção da importância
desta reunião e não vai agir sem pensar só porque foi provocada.
— O traficante foi encontrado e morto no outro dia, este assunto já foi
resolvido — Alícia responde calmamente.
— Sério, querida? E eu deveria acreditar na sua palavra?
— Se quiser pode mergulhar até o fundo do Rio Charles e resgatar o
corpo do traidor você mesmo — Ali responde com um pouco de deboche.
— Ou posso te mostrar a gravação do momento que abri a barriga do
desgraçado, mas como disse, já lidei com ele.
Zion parece querer contestar, mas abre um sorriso e volta a sua
atenção ao Don.
— Parece que vocês têm a sua própria monstrinha de estimação, já
não bastavam os Corleone em New York.
— Se o assunto está resolvido, gostaria de conferir minha mercadoria
agora — Don Lorenzo finaliza a conversa. — E Zion, lembre Mikhail que
estarei na Rússia na semana que vem, se ele tiver mais alguma... questão a
tratar sobre nosso acordo, faremos isso pessoalmente.
O russo parece surpreso com as palavras do Don e perde a pose por
um momento, mas logo se recupera e faz sinal para seus soldados abrirem o
caminhão. Envio nossos homens até lá e eles descarregam tudo, conferindo
cada pacote. Nas caixas com armas, é Matteo quem faz a vistoria e, assim
que tudo está certo, eles partem sem mais perguntas.
— Alícia — Don Lorenzo chama e faço sinal para os homens se
afastarem enquanto nos aproximamos. — Quero que faça uma avaliação
das câmeras externas da Malícia no último mês, se os russos sabiam da
droga eles têm alguém lá dentro ou isso estava rolando há mais tempo do
que sabemos.
— Farei isso — ela confirma, pensativa. — Porém é suspeito eles
terem apreendido essa quantidade de droga.
— Sim, veja se consegue descobrir alguma coisa, de qualquer forma
isso está cheirando a armação e não posso desmarcar a viagem para a
Rússia. Mikhail pretende expandir a rota de doadores nos Estados Unidos e,
como os Corleone não se envolvem com a Bratva, acredito que queira
entrar por Boston.
— Droga, irmão, eu também não sou a favor de entrar nessa. Já
bastam as drogas e as armas, agora tráfico de órgãos é demais — Matteo
fala baixo, certificando-se de que ninguém nos escute.
— Sim, mas não temos como recusar. Ou aceitamos o pacote
completo ou entramos em guerra com a Bratva, e você sabe muito bem que
não temos poder para isso. — Lorenzo parece cansado. — Só vamos
garantir que não temos mais ratos entre nós.
Alícia e eu seguimos direto para a boate, ela ficou mais animada
depois que os russos foram embora e o sorriso travesso em seu rosto
denunciava que estava aprontando alguma.
Foi sabendo disso que não me surpreendi ao ser escoltado pela minha
diabinha saltitante até um dos quartos especiais no subsolo. Fiz sinal para os
soldados ficarem de guarda, mas os homens que andam comigo já estão
treinados.
— Tenho um presentinho para o meu Bunny — Alícia provoca,
recostando-se na porta e me olhando com expectativa e um sorriso safado
no rosto. — Faz tempo que a gente não apimenta as coisas.
— Você sabe o porquê de não fazermos isso mais vezes — alerto ao
lembrar da última vez em que usamos uma terceira pessoa nas nossas
brincadeiras e Alícia quase matou o rapaz.
— Prometo me controlar. — Ela joga os braços em meu pescoço e
transpasso os meus pela sua cintura. — Você é tudo pra mim, amor, por isso
essa noite será tudo pra você.
Com essa promessa e a antecipação do que a diabinha está
aprontando, observo ela abrir a porta do quarto que geralmente alugamos
para os praticantes de BDSM.
Lá dentro vejo Kevin, um dos dançarinos do clube e o único que
ainda aceita participar de uma sessão comigo. Claro que o preço cobrado é
alto. O homem já está debruçado na poltrona erótica, as mãos amarradas
nas costas com cordas de algodão que deixam marcas deliciosas na pele
clara do dançarino.
— Pedi para o Rick caprichar para você. — Ali caminha desfilando o
traseiro empinado em minha frente, ela está com uma calça de couro preta e
um top azul marinho. — Gostou?
Faço que sim com a cabeça e assisto ela sorrir, satisfeita.
— Está tudo bem aí, querido? — Ali dirige a pergunta a Kevin.
— Sim, Mali — ele responde, submisso.
— Tenho o seu consentimento para que Gabriel foda seu traseiro
bonito hoje?
— Sim, Mali.
— Promete ficar calado durante a sessão ou prefere usar uma
mordaça? — Ela se agacha em frente a ele para obter contato visual
enquanto assisto à interação de longe.
— Ficarei calado.
— Bom garoto. Qual é a sua palavra de segurança?
— Sorvete.
— Muito bem, agora vou vendar seus olhos e terminar de prender
suas pernas — ela avisa e coloca a máscara de cetim preta cobrindo os
olhos de Kevin.
Alícia sabe do que gosto e, principalmente, do que preciso em nossas
brincadeiras. Ela é a única que pode me tocar, por isso precisamos conter a
outra pessoa. Como Kevin é homossexual, ele não terá contato com Alícia,
então essa noite será minha, como ela prometeu.
— Fones de ouvido — faço sinal para a parede e ela corre até lá, pega
os fones e coloca em Kevin. Isso vai garantir que ele não nos escute e curta
seu momento.
— Aproveite a playlist, querido — Alícia fala e liga o som para ele.
— Agora somos só nós dois, amor.
— E o que pretende fazer comigo, diabinha? — provoco caminhando
até ela.
— Precisamos de um banho primeiro, depois podemos começar a
brincadeira. — Vira-se e segue em direção ao banheiro. Enquanto caminha,
tira os saltos, um de cada vez, depois o top e, por último, desliza a calça e a
calcinha pelas pernas longas e musculosas, abaixando-se com a bunda
empinada em minha direção, olhando-me sobre os ombros.
— Gostosa — elogio já sentindo meu pau crescer na calça.
Tiro minhas roupas e a acompanho no chuveiro, deixando que passe
sabonete pelo meu corpo. Suas mãos trabalham em uma carícia deliciosa
enquanto seus olhos estão fixos nos meus.
— Essa sou eu, dizendo que te amo e jamais vou deixar que fuja de
mim.
— Não vou a lugar algum, amor, não sem você.
Ali me beija intensamente enquanto entramos debaixo do chuveiro e
deixo que a água caia sobre nós. Faço o mesmo que ela fez comigo,
ensaboando seu corpo e sentindo sua pele. Contorno as tatuagens escuras,
desenhos da Alice no País das Maravilhas em uma temática mais pesada e
dark.
Quando termino ela se afasta e enrola a toalha no corpo.
— Muito bem, agora vou te deixar a sós para aprontar essa bunda
gostosa enquanto preparo nosso brinquedinho lá fora.
Faço a ducha higiênica e me preparo para o que quer que Alícia tenha
em mente. Depois de cinco anos juntos, experimentamos um pouco de tudo.
Dentro dos meus limites em ser tocado por qualquer outra pessoa e os dela
em perder o controle, tomamos cuidado ao trazer uma terceira pessoa para a
nossa confusão.
Victor foi o último que participou, como ele era bissexual, tivemos
realmente um envolvimento a três, mas Ali acabou deixando-o desmaiado
depois de enforcá-lo com muita força e precisei contê-la para que não o
matasse. Em sua defesa, Victor tentou várias vezes me tocar, ela estava
contendo o homem e, bem, acabou passando do ponto.
Por fim, não adiantou muito, já que ele nos traiu e ela teve seu
momento com o desgraçado.
Encontro Alícia no quarto, usando somente o salto alto, uma calcinha
preta minúscula e terminando de prender a cinta de couro em sua cintura, só
a visão já me deixa animado, ainda mais quando ela se vira e vejo o
vibrador rosa em formato de pênis fixado na frente da peça.
— Está pronto, amor? — provoca e passa a mão no brinquedo.
— Porra, sempre estou pronto para você.
CAPÍTULO 8

Chace
 
A rotina na boate é bem corrida e estou sofrendo para acompanhar o
treino que Rick preparou de levantamento de peso. Ainda tem as aulas de
dança, que preciso confessar, são divertidas, porém estou longe de
realmente aprender alguma coisa.
Depois dos treinos trabalho na boate, e hoje fiquei encarregado do bar
da balada. O local está lotado em plena quinta-feira, quase não tenho tempo
para beber uma água enquanto atendo todos os pedidos.
Por azar ainda dois dos garçons faltaram e Sharon está bufando de
raiva por ter que ajudar no bar. O clima fica ainda pior quando uma briga
estoura na área VIP e os seguranças precisam intervir, mas um dos caras tira
uma arma da cintura e dá alguns tiros para cima, que mesmo com a música
alta ainda podem ser ouvidos, criando um clima de pânico dentro da balada.
A DJ que estava tocando parou a música e todas as luzes foram acessas.
As pessoas mais próximas se assustam e correm para saída. Na área
VIP os seguranças tentam se aproximar do homem descontrolado com a
arma, mas ele não deixa e se diz filho de um político.
— Chace, corre no subsolo e chama a Mali, diz que é uma
emergência. — Sharon me entrega um cartão e indica a porta atrás do bar.
— Subsolo? — questiono perdido.
— Sim, só desce as escadas aqui e entra pela porta número 4, você
vai entrar pela parte de serviço do quarto — explica com o olhar assustado.
— Vai logo, diz para a Mali que não achei os outros meninos.
Giovani e Rick estão no bar da área VIP, que fica no segundo andar e
Brody e Drew desapareceram tem mais de uma hora, portanto imagino que
eu realmente seja a sua última opção, já que Kevin saiu logo depois dos
ensaios e não voltou para trabalhar.
Faço o que ela manda, apesar de ter sido proibido de descer para o
subsolo. Rick disse que o local é destinado a quem for fazer programa ou
para as pessoas que querem aproveitar a balada e alugam um quarto.
Corro pelo corredor vazio, essa é a parte de serviço que dá acesso aos
quartos e também é a saída de emergência. Encontro a porta com o número
4 e passo o cartão, assim que ela abre, escuto uma música não muito alta e,
logo depois, um som que me faz ficar em alerta enquanto caminho
sorrateiramente.
— Me fode logo, amor — a voz grossa e impaciente de Gabriel ecoa
pelo cômodo como um rosnado, seguida de um riso feminino.
— Está com pressa?
Ando até a cortina que separa a sala que estou do quarto e não perco
tempo olhando em volta porque minha atenção recai imediatamente para a
cena inusitada.
Kevin está amarrado em uma daquelas poltronas de motel, que só
reconheço por causa dos filmes pornô que assisto. Ele está com as pernas
abertas e presas por cordas, o corpo inclinado com o peito na poltrona e os
braços amarrados às costas. Atrás dele Gabriel segura em sua cintura
enquanto o penetra lentamente.
O que diabos está acontecendo aqui? Eu estou realmente assistindo o
executor da máfia comendo um dos dançarinos da sua namorada?
Vejo o rosto de Gabriel contorcido de prazer, a cada estocada dele,
Kevin solta um gemido e reparo que está com um fone de ouvido grande na
cabeça, nas não consigo ver seu rosto de onde estou.
Será que ele está sentindo dor? Não é possível que isso seja algo bom,
é? Será que o mafioso o forçou a fazer essas coisas?
A visão do corpo forte e musculoso de Gabriel, todo coberto por
tatuagens escuras, em uma pose dominante e feroz, perdido no momento,
me faz parar de respirar. Então ela aparece em meu campo de visão, com
um salto alto e uma cinta estranha presa na frente do corpo, os peitos nus
adornados com pequenas joias nos mamilos e o sorriso radiante no rosto.
Mali se coloca atrás de Gabriel e começa a acariciar os braços fortes do
homem, beijando suas costas musculosas e tensas, sussurrando alguma
coisa que não consigo ouvir por causa da música.
Ela desce as mãos pelas costas do executor, que não para de foder a
bunda de Kevin lentamente, enquanto Mali pega um tubo do chão que
imagino ser de lubrificante e lambuza seus dedos para depois colocá-los no
meio das nádegas de Gabriel, abrindo-o devagar, acariciando aquela parte
sensível que o faz gemer. Só com a visão quase sinto sua mão em mim, as
sensações me fazem arregalar os olhos, surpreso.
Ele realmente vai deixar que ela o toque ali? O que diabos está
acontecendo? E por que meu corpo parece reagir à essa situação como se eu
gostasse disso? Eu não gosto, não posso gostar, não devo gostar.
— É isso que você quer, amor? — escuto ela provocar enquanto sua
mão trabalha na bunda dele, subindo e descendo, os dedos provocantes,
lambuzando a região enquanto a outra mão arranha as costas.
— Sim — Gabriel responde em um gemido rouco, olhos fechados e
respiração rápida. — Sim, porra.
Puta que pariu, ele está quase implorando para a mulher tocá-lo lá.
Minha boca fica seca e sinto todo o sangue se esvair do meu rosto, o
ar já não parece mais entrar em meus pulmões e estou fora deste plano,
flutuando, deslumbrado com o que vejo.
De onde estou tenho uma visão privilegiada deles e sinto meu coração
bater mais rápido com a adrenalina, a respiração pesada e meu pau pulsar
na calça. O maldito está duro só de ver os três nesta situação. Será que é
normal?
Então ela entra com um dedo na bunda de Gabriel, arrancando dele
um gemido descontrolado enquanto se afunda mais em Kevin, vejo o aperto
dos dedos do executor ainda mais marcados na pele do homem amarrado e,
a cada movimento deles, os sons ecoam diretamente pelo meu corpo.
Cada gemido dos três me faz ofegar.
O que está acontecendo comigo?
Por que estou ficando duro com essa cena grotesca?
— Vou te foder agora — Mali anuncia e tira os dedos de Gabriel, ela
sobe em cima de um “degrau”, ficando na altura certa para que o vibrador
em sua cinta encaixe na bunda do executor. — Se abre pra mim, amor —
ordena e Gabriel obedece, afastando mais as pernas.
Ela lambuza o vibrador rosa com lubrificante, abre as nádegas de
Gabriel, que para de foder Kevin por um momento, então Mali o penetra
lentamente, arrancando um gemido grosso do mafioso, que joga a cabeça
para trás. Quando está com o vibrador inteiro dentro dele, ela o segura pela
cintura e começa a entrar e sair.
— Caralho, que delícia. — Gabriel se contorce de prazer. — Assim,
porra, bem assim...
O homem, que é sempre tão calado, está entregue nas mãos dela, que
o olha com carinho. Mali aumenta a velocidade dos movimentos e Gabriel
volta a entrar e sair de Kevin quando ela segura um controle em sua mão.
— Agora sim, quero que se entregue. — A mulher encosta os peitos
nas costas de Gabriel e o segura mais próximo, coordenando os
movimentos dos dois e de onde estou tenho a sensação de que ela os tem
sob o seu domínio.
A visão é inebriante.
Como qualquer homem, eu assisto pornô e bato uma punheta para os
casais, mas isso aqui, ao vivo, é melhor do que qualquer vídeo que eu já
tenha visto. Por isso nem percebo que estou com uma mão no meu pau,
segurando-o por cima da calça enquanto não consigo desviar o olhar da
cena em minha frente.
Kevin geme cada vez mais alto, vejo todos os seus músculos tensos e
os pés se contorcendo de prazer. Ele está gostando disso, mas não parece
que os dois estão conectados com ele. Gabriel percebe o descontrole do
homem e solta as cordas das pernas dele, puxando seu corpo para trás. No
vão entre a poltrona e as pernas do dançarino, o executor alcança o pau de
Kevin e começa a masturbá-lo intensamente.
Puta que pariu, posso sentir como se fosse comigo, é como se a mão
grande e firme de Gabriel estivesse em volta do meu pau. Mas eu quero que
ele segure meu pau assim e me dê o mesmo prazer que está dando a Kevin?
Porra, eu quero sim!
— Isso, amor, faz ele gozar junto com você — Ali comanda e investe
mais rápido, suas unhas descem no peito do executor, marcando de
vermelho a pele tatuada e sua voz me deixa com ainda mais tesão. Estou a
ponto de gozar nas calças, porque é como se o seu comando, de alguma
forma, fosse direcionado para mim também.
E isso me faz querer ser marcado por ela também, sentir suas unhas
descendo pela minha pele enquanto Gabriel me fode, da mesma forma que
faz com Kevin. Posso até imaginar quão gostoso é ter o seu pau grosso me
abrindo, ele não é pequeno, mas foda-se, eu bem que o queria senti-lo entrar
em mim.
Não consigo decidir entre eles porque desde o momento em que os vi,
juntos, fodendo enquanto me assistiam, não consigo tirar as imagens da
minha cabeça. Só posso estar ficando louco.
— Depois eu vou te foder tanto que amanhã nenhum de nós
conseguirá caminhar direito — Gabriel promete entre gemidos e Mali solta
uma gargalhada.
— Vou cobrar essa promessa.
O entrosamento deles é viciante, a forma com que ela olha para
Gabriel, com admiração e carinho, mas também com um tesão desgraçado
no rosto, como suas mãos viajam pelo corpo dele. A admiração e a entrega
na voz do executor, tudo misturado com os gemidos dos três, me faz
esfregar ainda mais meu pau, sem controle de nada, só em busca de algum
alívio.
Por um momento sinto inveja do outro dançarino porque queria ser eu
em seu lugar, porém não queria estar amarrado, como Kevin, mas entregue,
como Gabriel, ou com ele. Queria sentir a boca dela em meu corpo, as mãos
grandes dele no meu pau, ouvir os gemidos dos dois direcionados a mim.
— Porra, amor, eu vou gozar... — Gabriel praticamente rosna em
aviso e neste momento Kevin goza na mão do executor. Ele tira o pau do
dançarino, arranca a camisinha e começa a se masturbar intensamente,
enquanto Mali continua investindo em sua bunda.
— Goza gostoso, amor — ela ordena. — Quero ouvir você gritar,
quero ter certeza de que te levei aos céus.
E é isso que ele faz, com um gemido estrangulado de prazer o
executor se derrama nas costas de Kevin em jatos contínuos de porra.
Caralho.
Sinto minhas bolas apertarem na calça enquanto esfrego meu pau e
fecho os olhos. Já pronto para gozar, me perco em meu próprio tesão, até
que...
— O gatinho gostou do show? — A voz alta e firme da mulher faz
todo o meu corpo travar e o medo me invade, cortando o tesão no mesmo
instante que o substitui por medo.
Fui descoberto, ela sabe que estou aqui, sabe o que vi e estou
completamente fodido.
Abro os olhos para encontrar Mali olhando diretamente para mim.
Ainda dentro de Gabriel ela passa as mãos nas costas do executor em uma
carícia tranquila enquanto ele respira ofegante, mas seu rosto é ameaçador.
— Eu te fiz uma pergunta, gatinho. Gostou do que viu? — ela repete
com a voz mais firme e ameaçadora, então sai de Gabriel lentamente, tira o
consolo da cinta e o coloca em uma mesa, para depois caminhar em minha
direção. — O que está fazendo aqui?
Pensa, Chace, por que você veio até aqui mesmo? Pensa, tinha um
motivo, não tinha? Tinha sim, agora, qual era mesmo?
— Sharon... — balbucio com a voz fraca e tremida lembrando do que
vim fazer aqui, limpo a garganta antes de continuar. — Ela me mandou te
chamar.
— O que aconteceu? — A voz rouca de Gabriel me faz olhá-lo e me
arrependo no momento em que vejo seu rosto contorcido de raiva. — Fala
logo, garoto.
— Tem alguém com uma arma na área VIP e falou que é filho de
algum político, Sharon me mandou te chamar — explico acuado.
Mali troca um olhar com Gabriel enquanto tira a cinta e veste uma
camiseta preta que a cobre até a metade das coxas, depois ela pega uma
arma do bolso da jaqueta de couro pendurada ao lado da porta e sai sem
olhar para trás.
— Você. — Gabriel chama minha atenção. — Desamarre-o e o ajude
a chegar até o banheiro, fique com ele, vou providenciar um carro para levá-
lo para casa — ordena e se fecha no que suponho ser um dos banheiros.
Reúno toda a minha coragem, mesmo sentindo minhas pernas moles
com tudo o que aconteceu aqui, caminho até o centro do quarto e tiro o fone
e a venda de Kevin.
Ele está todo suado e ofegante, quando me vê abre um sorriso e fica
vermelho.
— Eles mandaram o novato fazer o aftercare? — questiona cansado.
— O que quer que eu faça? — pergunto confuso, não sei nem por
onde começar a desamarrar os nós das cordas.
— Tem um canivete no balcão, corte as cordas dos meus braços e o
restante eu consigo fazer sozinho — instrui com a voz cansada e ofegante.
É o que faço e assim que suas mãos estão livres vejo as marcas em
sua pele. Kevin está tremendo quando se levanta, flexionando os músculos
do corpo.
— Pode perguntar — fala ao perceber que estou observando seu
corpo com mais atenção do que deveria, então desvio o rosto e olho para o
chão.
— Eles... eles te forçaram a… — Não tenho coragem de terminar a
frase.
— Não — responde rapidamente, deixando-me ainda mais curioso,
mas assim que vou perguntar Gabriel sai do banheiro, totalmente vestido e
no peito um coldre com duas armas penduradas. Ele nos encara com o rosto
inexpressivo, como se nada tivesse acontecido.
— Kevin, você está bem? — o executor questiona.
— Sim, senhor — Kevin responde olhando para baixo e com as mãos
em frente ao corpo ele se ajoelha, completamente entregue e submisso. A
cena me faz lembrar daquele filme famoso do CEO que gosta de dar umas
chicotadas na morena, esqueci completamente do nome, qual é mesmo?
Pensa, Chace, pensa... Já sei, 50 tons de cinza! Isso, é bem esse que a
mocinha fica de joelhos para esperar ser punida no quarto vermelho.
— Muito bem, o pagamento estará na sua conta ainda hoje. — O
executor passa por nós e pega a jaqueta de couro pendurada ao lado da
porta. Sem mais uma palavra, sai pelo mesmo lugar que Mali passou,
deixando-nos sozinhos.
— Eles te pagam para isso? — Não escondo o julgamento em minhas
palavras e me arrependo assim que Kevin se levanta.
— É melhor controlar a forma que fala aqui dentro, todos temos
segredos, Chace, e não sou uma criança. Sou livre e não tenho vergonha de
explorar meus desejos sexuais — repreende firme enquanto caminha até o
banheiro, deixando-me arrependido por ter falado merda. — Eu faço
programa, não tenho vergonha alguma disso, pratico BDSM há um bom
tempo e sou submisso, entre minhas preferências estão o shibari e privação
de sentidos.
Não entendo do que ele está falando, sei o que é BDSM por causa
daquele filme, mas não pesquisei muito a fundo, essa coisa de ser amarrado
é estranha demais para mim.
— Eu achei que você fosse homossexual.
— Eu sou — Kevin me olha confuso então parece ter entendido
minha dúvida. — Mali não me toca, só Gabriel, não sei quanto disso tudo
você viu e, para falar a verdade, eu nem imagino o que eles fizeram aqui
porque não ouvi nada, mas não é a primeira vez que participo de uma
sessão com os dois e nunca senti as mãos dela em mim.
— Mas porque ficar vendado? — Não controlo mais a curiosidade e
aproveito sua abertura para encher o homem de perguntas. Tenho certeza de
que já deve estar me achando ingênuo e até um pouco burro, então não
tenho nada a perder.
— A privação de sentidos me faz ficar ainda mais sensível — explica,
dando de ombros.
— Se não conseguia ver nem ouvir, como sabe que só ele te tocou?
— Bem, eu não sei com certeza, mas só senti mãos grossas e
calejadas. — Sorri de canto. — Agora que você já viu tudo, acho que não
faz mal te contar. — Kevin entra na banheira que já está cheia e eu me sento
na privada. — Nós te avisamos para não encostar ou chegar perto dele. —
Confirmo com a cabeça. — Então, como só a Mali pode tocá-lo, sempre
que eles vão transar com alguma outra pessoa, como foi o meu caso, eles
amarram os braços para não terem surpresas.
— E isso acontece muito?
— Mais ou menos, eles gostam de experimentar. Ambos são
bissexuais e costumam usar tanto homens como mulheres em suas
aventuras, mas quando a Mali participa... bem, as coisas são mais intensas.
— A preocupação em suas palavras me deixa curioso.
— Como assim?
— Não sei detalhes, Giovani foi o único que já participou de uma
noite com os dois e ele usou a palavra de segurança, mas até hoje não
consegui descobrir o porquê. Victor era o preferido do casal até... bem, você
sabe, mas ele sempre precisava tirar duas semanas de folga depois de
participar e nunca revelou o que eles faziam.
— Por quê? — A curiosidade só aumenta quanto mais ele fala.
— Pelas marcas que ficavam no corpo dele a foda deveria ser bem
intensa. — Kevin me olha de canto. — Você está curioso demais e ainda
não sei do que gosta.
Droga, ele percebeu minha curiosidade, mas eu não faço a menor
ideia do que responder. Do que eu gosto? Eu lá vou saber? Nunca transei
com ninguém, cheguei perto uma vez, com uma mulher, e troquei uns beijos
com um homem, mas nada mais que isso.
— Eu não sei — confesso.
— Do que você mais gostou sobre o que viu hoje?
— Como assim?
— O que te fez pensar “queria ser essa pessoa” ou “estar com essa
pessoa”?
— Cara, eu realmente não sei. Com todo o respeito, não queria estar
no teu lugar, mas a forma que eles estavam conectados era uma coisa de
outro mundo. — Passo as mãos pelos cabelos e abaixo o rosto, sem
coragem de encará-lo enquanto lembro o que senti ao assistir aqueles dois
conectados.
— Não queria estar amarrado e submisso ou com o Gabriel comendo
seu rabo?
A forma crua e direta com que fala me faz ficar ainda mais
envergonhado, nunca tive uma conversa assim com ninguém. Não tenho
amigos, nem homens ou mulheres, e quem teve a conversa sobre sexo
comigo foi meu tio, mas aprendi mais pesquisando na internet.
— Olha, se não quer falar sobre isso, tudo bem. Eu só queria ajudar,
já estive no seu lugar, confuso com minha sexualidade, sem saber do que
realmente gostava ou quais são meus limites e me fodi muito até aprender
na base da tentativa e erro.
— Queria os dois — confesso baixinho. — O que eu realmente
desejei naquele momento foi estar com os dois, mas não amarrado, estar
junto deles... sei lá, eu nunca senti isso antes, é tão confuso, sabe. Mali é...
gostosa, dominante, maravilhosa. Ela parece uma feiticeira quando toca no
Gabriel, porque ele reage instantaneamente e se entrega a ela, só que ele
também é um puta de um gostoso, sabe… — Começo a divagar e pensar no
que vi, perco toda a noção de vergonha na cara neste momento. — Eles são
incríveis, cara.
Viro-me para encontrar Kevin com o olhar receoso, ele não fala nada
por um tempo e me arrependo de ter aberto minha boca enorme dessa
forma. Deveria ter mantido para mim, sério, eu não tenho senso de
autopreservação.
— Então é melhor não se envolver nisso, porque o que você está
procurando é a conexão que eles têm, e apesar de gostarem de brincar com
outras pessoas, é só isso: sexo por algumas horas e depois tchau. O
relacionamento deles é fechado.
— Não estava pensando em me envolver em nada — tento me
defender, mas ele já entendeu a merda que se passa na minha cabeça.
— Se quer um conselho, encontra alguém fora daqui. Homem,
mulher, tanto faz, alguém legal e que te trate bem. Você é gostoso, se não
sentisse uma vibe tão submissa vindo daí eu até tentaria a sorte. — Solta
uma gargalhada.
— Eu não sou submisso — defendo-me.
— Aham, senhor dominador — debocha, mas sorri e o clima fica
mais alegre. — Pode ir, Chace, eu já estou bem.
— Tá maluco? Ele me mandou ficar aqui.
— Gabriel só quer garantir que estou bem, ele não faz o aftercare,
mas sempre manda alguém para fazer por ele.
— O que é aftercare? — questiono curioso.
— É um termo que usamos depois de uma sessão de BDSM,
basicamente é cuidar para que o submisso esteja bem. Algumas sessões
ficam muito intensas e no fim é preciso um tempo para se recuperar, mas
hoje foi tranquilo.
Como ele pode dizer que o que eu assisti foi tranquilo? Aquilo foi
uma das coisas mais insanas que já presenciei na vida.
— E você gosta disso?
— Pra caralho, a sessão me leva às alturas e, bem, você viu o homem
em ação, ele é um gostoso e sabe como foder. — Dá de ombros, referindo-
se a Gabriel, e tenho que concordar, aquele homem me faz tremer as pernas
e não é só de medo. — Ela tem sorte.
Realmente Mali tem sorte em ter Gabriel ao seu lado, mas o contrário
também se aplica, afinal o que presenciei foi devoção, tanto por parte dela
quanto dele.
CAPÍTULO 9

Alícia
 
Assim que cheguei à área VIP vi que os seguranças da boate haviam
tirado a arma do maldito playboy que ameaçava meus clientes, só que a
merda já estava feita e a festa acabou.
Estou me preparando para a enxurrada de publicidade negativa que
isso vai gerar nas redes, e a dor de cabeça que terei para mudar essa
situação e atrair público novamente, quando vejo uma mulher agachada
atrás de uma mesa, no escuro ela passa despercebida até pelos seguranças.
— O que está acontecendo aqui? — questiono Sharon, que está
soltando o verbo no mauricinho por atrapalhar a noite.
— Esse desgraçado começou uma briga aqui em cima, sabe-se lá por
que, e puxou uma arma para ameaçar nossos seguranças, ele deu alguns
tiros para o alto — ela explica, bufando de raiva. — Ravi conseguiu
desarmá-lo, mas ele não se acalma e está falando que vai ligar para o papai,
um tal de Senador Harry-Sei-lá-o-quê.
Tinha que ser ele mesmo e seu filho descontrolado, mas isso não
importa agora. Passo pelo desgraçado que está com a camisa toda amassada
enquanto Ravi o segura em uma chave de braço perfeita.
— Quem você pensa que é para me tratar assim? Eu sou filho do
Senador Harry de Biasi, quando ele ficar sabendo vai fechar essa espelunca
e acabar com todos vocês — o playboy ameaça aos berros, mas eu o ignoro
e vou até a parte mais escura.
— Olá, você está bem? — Abaixo-me para conseguir ver melhor a
menina, mas ela olha diretamente para a arma na minha mão e se encolhe
ainda mais, de medo. — Desculpa por isso. — Faço sinal para um dos
seguranças pegar a arma e ergo as mãos, a camiseta que encontrei no quarto
sobe um pouco mais do que deveria. — Pode sair daí, você estará protegida,
eu prometo.
Ela me encara muito assustada e, no momento em que finalmente se
levanta, vejo o motivo. Seu rosto tem marcas vermelhas, o cabelo preto, que
antes deveria estar amarrado em um rabo de cavalo, parece que foi puxado
e está todo bagunçado. A maquiagem completamente borrada pelas
lágrimas me aperta o coração, mas então vejo o sangue escorrer do seu
lábio e meu corpo ferve de raiva, porém nada é pior do que vejo em seu
corpo, que ela tenta esconder com as mãos, protegendo-se do mundo. As
marcas escuras em seus braços não mentem, assim como o vestido rasgado
na frente e um sinal de mordida em seu ombro.
— Qual é o seu nome, querida? — pergunto com a voz mais calma
que consigo, escondendo a raiva que flui dentro de mim. Ela olha para o
desgraçado, que agora tem a boca coberta pelo segurança para ficar calado.
— Não precisa ter medo, ele não fará mais nada com você.
— Tati, meu nome é Tatiana — responde baixinho com a voz tremida.
— Pode me falar o que aconteceu?
— Ele... eu provoquei, eu... estava dançando longe demais e... outro
homem... foi minha culpa. — Tatiana começa a chorar e seu corpo todo
treme.
— Tudo bem, não precisa falar, só me confirma se entendi direito. —
Eu me aproximo com cuidado e ajudo-a a se levantar. — Ele te trouxe aqui?
— Ela confirma com a cabeça. — Vocês têm algum envolvimento? Ele é
seu namorado?
— Sim...
— E você estava dançando sozinha quando outro homem se
aproximou? — Ela novamente assente. — Quem fez isso com você, seu
namorado ou o outro homem?
Ela me encara com os olhos arregalados, depois olha para o
desgraçado com pavor no rosto, então a viro de costas para ele e faço com
que concentre sua atenção em mim.
— Eu posso olhar nas câmeras de segurança — aponto para as quatro
câmeras que estão na área VIP —, mas prefiro que você me fale, por favor.
— Ele... ele me puxou e disse... disse que era culpa minha, e que ia
matar o outro homem por minha causa... que... — Ela desanda em um choro
convulsivo, mas não preciso que diga mais nada, já tenho a confirmação.
— Sharon, vem aqui um pouco. — Minha gerente se aproxima e
encara a mulher com preocupação. — Pode levá-la até o meu escritório, por
favor? Chame o médico da Família se ela precisar, ajude-a a trocar de roupa
e fique com ela até eu resolver isso.
— Claro, Mali — Sharon passa um braço pelos ombros de Tatiana e a
leva para o meu escritório.
Assim que as duas estão fora de vista, respiro fundo, de olhos
fechados, sentindo toda a raiva explodir dentro de mim enquanto imagino
tudo o que farei com o desgraçado.
— Ravi, leve-o até o subsolo — ordeno calmamente e o soldado
arrasta o filho do senador, que se debate e grita na vã tentativa de se libertar.
Nessa hora Gabriel chega, o semblante preocupado me encara. Assim
que me vê ele entende e me abraça, contendo minha raiva, mantendo-me
calma em seus braços.
— O que você precisa? — questiona baixinho, os outros seguranças
já se afastaram e estamos a sós.
— Eu quero matá-lo, mas antes preciso fazer esse desgraçado sofrer,
ele bateu na namorada, ele a espancou dentro da minha casa! Esse lixo
humano vai pagar por isso — prometo.
— Vou ligar para o Lorenzo, quem é o político envolvido?
— Senador Harry de Biasi.
— Droga — reclama e me afasto para ver a confusão em seu rosto. —
Não podemos matá-lo, teu irmão ainda está em negociação com o
desgraçado.
— Foda-se, não vou deixá-lo sair daqui depois do que ele fez.
Bem neste momento olho para baixo e vejo Matteo entrando com seu
grupo de soldados, claro que ele já foi informado, algo assim já deve estar
na mídia.
— Onde ele está? — meu irmão pergunta em tom exigente.
— Você não vai tirá-lo daqui, não depois do que ele fez — respondo
firme.
— Ali, é o filho do Senador, o cara me ligou de Washington, vamos
usá-lo como peça para finalizar essa merda de acordo.
— Para os infernos com acordos políticos, ele bateu na namorada
dentro da porra do meu clube, debaixo dos nossos olhos, e ainda puxou uma
arma para nossos homens. Esse desgraçado só sai daqui inteiro por cima do
meu cadáver.
— Alícia, eu vou perguntar só mais uma vez e é melhor me falar
logo, porque sou seu irmão e te amo, mas a Família vem em primeiro lugar.
Ou você me entrega esse maldito, ou terei que usar a força para contê-la.
Desgraça de momento para estar praticamente nua e sem as minhas
armas, por melhor que eu seja em jiu-jitsu e luta corporal, Matteo é um filho
da puta forte e treina há muito mais tempo do que eu. Sem uma arma ou
uma faca como vantagem, não tenho como pará-lo.
— Subsolo — minha voz sai baixa e amarga quando reconheço minha
derrota.
— Vem comigo — meu irmão exige e bufo em resposta, quem ele
pensa que é para me dar ordens? — Alícia de Angelis, venha comigo agora.
Caminho logo atrás dele, sinto Gabriel na minha cola e nem preciso
olhar para trás para ver que está preocupado, reconheço meu homem e só
pela forma com que sua mão descansa na parte baixa das minhas costas eu
sei o que está sentindo.
Assim que entramos na sala o playboy já está amarrado, com o corpo
pendurado pelas mãos no gancho do teto. Ravi fez um bom trabalho e até
passou uma fita na boca dele e nas suas pernas.
Se eu tivesse uma faca agora, abriria sua barriga sem pensar duas
vezes, como fiz com o traidor do Victor. Mesmo que esse mereça sofrer
mais, eu só quero assistir a vida desaparecer dos seus olhos.
— Solte-o — Matteo ordena e Ravi me olha, confuso. — Faça o que
eu mando, agora, soldado.
Faço sinal positivo com a cabeça e me escoro na parede com os
braços cruzados em frente ao corpo, assisto meu soldado soltar o
desgraçado, que, apesar do medo estampado em seu rosto, abre um sorriso
debochado em minha direção no momento em que a fita sai da sua boca.
— Eu falei que você vai se arrepender, vagabunda. — Aponta o dedo
para mim e preciso respirar fundo para me manter no lugar.
— Enzo de Biasi — Matteo dá nome ao porco, tinha que ser um Enzo
mesmo. — Você está bem? — Matteo oferece a mão para que o playboy se
apoie e isso infla ainda mais o ego do desgraçado.
— Bem? Só pode estar brincando comigo! Meu pai vai saber disso e
vocês vão pagar pela forma com que fui recebido nesse lixo que chamam de
boate — esbraveja cuspindo no chão. — Agora, onde está minha
namorada? Quero ir para casa logo.
Assim que ele passa pelo meu irmão, caminhando em direção à porta,
Matteo acerta um chute no joelho do miserável, pelo som do impacto e o
grito que o playboy solta, tenho certeza de que quebrou.
Enzo cai no chão com um baque forte, contorcendo-se de dor, e
Matteo continua chutando o desgraçado, com força e raiva, como eu faria
em seu lugar. Meu irmão o acerta nas costelas, no estômago, nos braços,
deixando somente a cabeça do maldito de fora.
— Seu papai querido salvou a sua vida, mas não especificou as
condições em que seria devolvido — Matteo grita e continua deferindo
chutes fortes. — Agora escuta bem o que eu vou te falar, se voltar a pisar
nesta boate será um homem morto. — Então ele para e se abaixa, cuspindo
no rosto do maldito que encara meu irmão com terror. — E se pensar em
procurar a sua ex-namorada vou deixar que a minha irmã faça o que ela
estava planejando com você, e saiba que não será só uma surra, Alícia te
fará implorar pela morte.
Só então Matteo se afasta, os cabelos desalinhados e o terno fora do
lugar não são nada comparados a raiva que vejo brilhando em seu olhar.
Ele também está se controlando para não enviar o desgraçado em
pedaços.
— Ravi, arraste esse saco de lixo até o carro dele e garanta que seja
entregue inteiro em sua casa — ordeno.
Quando os gritos de dor do Enzo já não são mais ouvidos, respiro
fundo e encaro meu irmão.
— Não me olha assim, porra — Matteo esbraveja e Gabriel
instantaneamente dá um passo à frente.
— Se era para dar uma surra no desgraçado, podia ter me deixado
participar — reclamo um pouco mais calma.
— Você sabe que não conseguiria parar até que ele estivesse morto —
rebate e é verdade, enfiaria o salto da minha sandália no olho do maldito, se
tivesse a chance. — E por que diabos você está praticamente pelada?
— Isso não te interessa, agora sai da minha casa, que preciso pensar
em uma forma de contornar essa situação de merda.
— É melhor manter a Malícia fechada esse final de semana — sugere.
— Se precisar de conselhos eu peço — rebato e saio da sala para não
bater boca com meu irmão. Eu o amo e respeito, mas este é um dos motivos
que me fazem não querer participar diretamente dos negócios da máfia,
porque a Família de Angelis vem acima dos seus integrantes.
Chego em meu escritório e Sharon está conversando com Tatiana, a
mulher agora parece mais calma. Minha gerente está com as roupas nas
mãos, mas Tatiana parece confusa e não quer aceitar.
— Vai se sentir um pouco melhor trocando de roupa, querida. —
Indico o banheiro e ela me olha por um tempo até aceitar e caminhar até lá,
vacilante. Quando fecha a porta viro-me para Sharon: — Ela te contou
alguma coisa?
— Não muito, estão namorando há pouco mais de um ano, ele sempre
foi controlador, mas pelo que ela falou essa foi a primeira vez que
realmente a agrediu, não sei se é verdade ou se ela está com medo —
Sharon relata.
— Obrigada, pode ir para casa, vou garantir que ela fique bem —
prometo e minha gerente sai. Quando Tatiana retorna do banheiro, seu olhar
passa pela sala e ela trava ao ver Gabriel. — Está tudo bem, querida,
Gabriel é meu namorado, não faremos nada com você.
— Eu... eu quero ir para casa — pede com a voz vacilante.
— Vou te levar, mas antes, pegue aqui. — Entrego meu cartão com o
número do meu telefone pessoal. — Acredito que seu ex-namorado não
será estúpido o suficiente para te incomodar, mas se ele for, pode me ligar, a
qualquer hora e de qualquer lugar, tudo bem?
— Obrigada — agradece e pega o cartão.
— Estou falando sério, se ele te mandar uma mensagem ou tentar se
aproximar de você, me ligue, entendido? — Encaro a mulher com
confiança, ela precisa saber que estou falando sério.
— Eu agradeço, mesmo, mas não tem muito o que possa fazer, o pai
dele é...
— Senador Harry, eu sei, e ele está em nossas mãos, seu filhinho só
saiu vivo daqui hoje por sorte. — Isso chama sua atenção e tenho certeza de
que agora ela está entendendo. — Eu não passo meu número pessoal para
todo mundo, então tenha certeza de que estou falando sério e use se
precisar, tudo bem?
Tatiana confirma com a cabeça e relaxa um pouco os ombros.
— Vou buscar o carro — Gabriel anuncia antes de sair.
— Só vou me trocar e te levamos para casa — aviso-a e indico o sofá,
para que fique confortável.
Coloco a primeira roupa que encontro, uma calça jeans e um top
preto. Tiro o salto e pego um dos tênis que recebi de alguma marca e nunca
usei, prendo meu cabelo em um rabo de cavalo e jogo uma jaqueta de couro
nos ombros.
Ao retornar para meu escritório, Tatiana está chorando novamente, ela
parece desolada, sento-me ao seu lado e tento confortá-la, passando um
braço pelos seus ombros.
— Você deve estar me achando uma idiota, não é mesmo? — supõe
sem me olhar.
— Claro que não.
— Eu não sou burra e ingênua, droga, sou uma psicóloga, e mesmo
assim cai em um relacionamento abusivo — confessa pegando-me de
surpresa, ela parece ler a confusão em meu rosto e sorri. — Sim, me formei
ano passado, um pouco depois de conhecê-lo. Achei que tinha uma vida dos
sonhos pela frente, um namorado bonito, meus pais me ajudaram a abrir
meu consultório, não tenho problemas financeiros nem nada, tudo estava
indo tão bem…
— Um relacionamento abusivo não começa assim, ele evolui para
esse extremo, mas lembre-se, nada disso é culpa sua, nada — ressalto a
importância destas palavras. — Quando se acalmar e estiver melhor, vai ver
que estou certa. Você tem alguém para ficar contigo? Uma amiga, ou quem
sabe, seus pais?
— Não posso ir assim para a casa dos meus pais, mas pode ficar
tranquila, eu vou ficar bem. Já mandei mensagem para minha amiga e ela
está indo lá pra casa, só vou chamar um carro de aplicativo.
— Sem chance, a essa hora é perigoso, e quero garantir que chegue
bem. — Levanto e estendo a mão para ela. — Peço desculpas por ter
acontecido isso dentro da minha boate, meus seguranças deveriam ter
interferido antes.
— Eles tentaram. Isso aqui — ela aponta para as marcas em seus
braços e pernas — não é de hoje, essa semana foi difícil.
Só de olhar para Tatiana e imaginar o que aquele desgraçado fez com
ela, me arrependo mais uma vez de tê-lo deixado ir embora.
— Promete que vai me ligar caso ele se aproxime de você
novamente? Mesmo que só chegue perto de você, por favor.
— Sim, obrigada... Não sei seu nome.
— Alícia, mas todos me chamam de Mali. — Sorrio para ela, que
parece relaxar um pouco.
Confirmo com os seguranças se todos já saíram antes de fechar tudo,
Gabriel já está com a BMW SUV preta parada em frente à boate. Abro a
porta para que Tatiana entre atrás e, quando vou contornar o carro, vejo
Chace mais à frente, caminhando em direção ao ponto de ônibus.
— Tati, você se importa se dermos carona para um funcionário? —
questiono assim que me sento no banco do carona e Gabriel assume o
volante.
CAPÍTULO 10

Gabriel
 
Paro com o carro ao lado de Chace, mas por estar usando fones de
ouvido o garoto leva um susto quando percebe o SUV preto, então abaixo o
vidro e, assim que me vê, tira os fones e olha para o veículo, sem entender o
que está acontecendo.
— Oi, gatinho, entra aqui que a gente vai te dar uma carona — Ali
grita de dentro do carro e destranco a porta de trás.
— Não precisa, tem um ônibus daqui a 30 minutos. — Ele se esquiva,
olhando para os dois lados da rua.
— Entra logo, garoto — ordeno sem paciência para ficar debatendo
com um maldito moleque no meio da rua. Por mim passávamos reto e ele
que se virasse, mas para a Ali ter oferecido carona, ela tem algo em mente.
O garoto abre a porta e entra no banco atrás do meu, seu olhar para na
mulher ao seu lado, mas assim que percebe que ela está machucada, encara
o chão.
Tatiana passa seu endereço e sigo naquela direção, não é muito longe
e Ali mantém a garota entretida conversando sobre roupas e acessórios só
para tirar a mente dela do que aconteceu. Assim que chegamos no prédio e
Tatiana desce, o porteiro avisa que tem uma mulher esperando por ela.
— É a sua amiga? — Ali pergunta.
— Sim — Tatiana confirma, nos deixando mais tranquilos. —
Obrigada por tudo, Mali, e me desculpa pela confusão.
— Garota, vou falar novamente: nada disso é culpa sua — Ali
repreende e desce do carro para abraçar a mulher. — Quando estiver melhor
e quiser curtir uma noitada, convida suas amigas e garantirei o melhor show
de strippers masculinos que vocês vão ver na vida.
— Pode deixar — Tatiana responde com um meio sorriso.
— E lembre-se, qualquer coisa, pode me ligar, a qualquer hora. — Ali
espera que a mulher confirme com a cabeça, então volta a entrar no carro.
Aguardo até que Tatiana entre e encontre sua amiga, só quando o
porteiro tranca o portão, dou a partida e sigo para a casa do garoto. Depois
de meia hora de estrada, quando estamos quase chegando, sinto a mão de
Ali no meu joelho e viro-me para olhá-la.
— Pare o carro — ela pede e pisca um olho, pelo retrovisor assisto
Chace arregalar os olhos em uma expressão assustada. — Então, gatinho,
agora vamos ter uma conversinha sobre o que você presenciou mais cedo.
— Eu não...
— Não adianta contestar, você gostou do que viu. — Não é uma
pergunta, ela não espera resposta. — Nós não nos importamos com plateia,
Bunny e eu adoramos foder sendo assistidos por alguém, é bom pra caralho,
mas não gostamos de ser vigiados.
Entendo o que ela está fazendo ao falar tão diretamente com ele. Ali
está medindo cada reação do garoto, assim como eu, mas não vejo nada
demais. Ele só está assustado e acuado por causa do medo de ficar trancado
no carro com dois mafiosos.
— Desculpa, eu não quis atrapalhar. Sharon me mandou entrar pela
porta de serviço, eu não sabia... — defende-se, tremendo feito um covarde.
— Tudo bem, gatinho. — Ali abre um sorriso para reconfortá-lo. —
A boate não abrirá este final de semana, mas continue treinando em casa,
semana que vem vou avaliar sua performance, acho que já está na hora de
ver se meu investimento valeu a pena mesmo.
— Não sei se estou pronto.
— Então precisa se esforçar mais — Ela solta uma gargalhada, mas
neste momento seu celular começa apitar com uma mensagem e Ali desvia
a atenção para o aparelho. — Droga, Lorenzo está puto, saiu em todos os
sites de notícia, já.
— Vamos contornar isso. — Acaricio seu braço para demonstrar que
estou aqui por ela. — Você pode montar uma apresentação — sugiro.
Sempre que Alícia toca em um evento a casa fica lotada.
— Boa ideia, Bunny — ela se anima um pouco —, mas ainda preciso
encontrar alguém para montar a campanha, eu odeio mexer com essas
coisas e a Liz avisou que ainda não conseguiu falar com a pessoa que editou
o vídeo da DJ GIBI.
Uma ideia passa em minha mente bem na hora que olho pelo
retrovisor e vejo Chace ficar vermelho.
— O garoto ali trabalha com edição de vídeos, não é mesmo?
— Bem, sim, faço alguns serviços assim.
Alícia se anima na hora e seu rosto se ilumina com a notícia, só a
visão dela assim já me faz querer sorrir. Porra, eu faço qualquer coisa para
ver essa mulher feliz.
— Porque não falou logo, gatinho? — Ela tira o cinto de segurança e
passa pelos bancos para sentar-se ao lado do garoto. — Me conta o que
você sabe fazer, se vamos montar um evento em que eu serei a DJ principal,
preciso de alguém foda para a campanha, que trabalhe com vídeos, fotos, o
marketing todo.
Alícia está animada, deveria ter comentado sobre isso antes, mas
acabei esquecendo que o garoto trabalhava com marketing também, e para
falar a verdade, ainda quero ver ele dançar. Quando ele comentou que
estava esperando a tal da influencer pagá-lo, pedi para Max, nosso hacker,
descobrir quem era ela e mandar um aviso para que fizesse o pagamento
com juros e sem enrolar.
— Eu faço algumas campanhas para pequenas empresas e influencers,
é mais edição de imagens e vídeos para redes sociais.
— Me mostra. — Ela entrega o próprio celular desbloqueado para ele,
animada. — Quero ver algum trabalho seu.
Chace parece ficar ainda mais nervoso enquanto digita alguma coisa e
uma música começa a tocar. Não reconheço os modismos de redes sociais,
para falar a verdade só tenho porque Alícia criou para mim e me faz assistir
aos seus vídeos. Agora ela pula no banco, ainda mais animada.
— Não acredito! Foi você quem editou o vídeo da DJ GIBI? — ela
pergunta e ele confirma com a cabeça. — Caralho, Liz está te mandando e-
mail tem tempo, já. Por que não responde?
— Estive um pouco ocupado. — Ele fica ainda mais vermelho e com
cara de culpado, já que não deve ter respondido por estar trabalhando na
boate a maior parte do tempo.
— Ahhhhhh, gatinho, agora não tem saída, topa trabalhar comigo
nesse evento?
— Eu tenho escolha? — ele olha para mim ao perguntar.
— Não, mas gostaria que fizesse por querer e não por obrigação. — A
diabinha usa aquele tom de voz mais fraco, faz o olhar de coitada e ainda
espreme os peitos com os braços para atrair a atenção do garoto, e a minha
também, é claro. Alícia sabe muito bem como conseguir o que quer. — Por
favor.
— Tudo bem, mas podemos manter os mesmos horários? — Sua
solicitação me deixa curioso.
— Sim, sim, sim, simmmmm. — Ela se joga nos braços do garoto e o
beija no rosto várias vezes, mas ele só trava e me olha com medo, será que
pensa que eu terei ciúmes? Alícia é extrovertida e gosta de demonstrar
carinho com contato físico, desde que não haja desrespeito eu não me
importo com isso. — Vamos nos divertir muito juntos, gatinho — Ali
provoca e volta a passar pelos bancos, não me passa despercebido a forma
com que ela empina a bunda e muito menos o olhar de desejo que Chace
não consegue disfarçar.
Espero ela afivelar o cinto para voltar a dirigir, entramos cada vez
mais em uma área pobre da cidade, as casas pequenas e malcuidadas se
empilham em terrenos minúsculos, é uma região dominada por gangues
locais, mas também temos alguns negócios por aqui.
A casa de Chace é uma das últimas de uma rua sem saída, a tinta
amarela, agora desbotada e com partes descascadas, não difere das outras,
porém o muro com grade e cadeado chama atenção.
— Pode parar aqui — ele pede antes que eu chegue em frente à sua
casa. — É mais fácil de fazer a volta — inventa uma desculpa, mas não me
importo com o que fala e só paro em frente ao portão da casa dele.
As janelas estão abertas e as luzes dentro da residência desligadas,
algo me diz que tem alguma coisa errada acontecendo aqui. Minhas
suspeitas se confirmam quando Chace abre a porta e escuto o grito de uma
mulher.
— O que está acontecendo? — Alícia desce logo atrás do garoto, a
arma já em mãos e o olhar preocupado varrendo as ruas. — Chace, fica
atrás de mim. — Ela tenta passar por ele, mas não consegue.
Em alguns passos estou atrás deles, protegendo a retaguarda e
procurando pelo motivo dos gritos.
— Está tudo bem, podem voltar. — Ele tenta nos afastar, mas seu
rosto demonstra preocupação. — É minha mãe, provavelmente está tendo
alguma crise.
— Socorro, alguém me ajuda, eu quero ir para casa — uma mulher
aparece na frente da casa, gritando desesperada por socorro, ela não é tão
velha quanto eu esperava e está vestindo somente uma camisola branca,
enquanto tenta desesperadamente abrir o portão. — Alguém liga para a
polícia, por favor.
Chace corre até ela, leva um tempo para conseguir destrancar o portão
e entrar, mas assim que se aproxima e tenta abraçá-la, a mulher o empurra
com força para longe.
— Mãe, está tudo bem, sou eu, o Chace, seu filho. — Ele tenta fazê-la
reconhecer seu rosto, mas ela está descontrolada. — Está tudo bem, olha, é
a nossa casa, lembra? — Chace aponta para a porta de entrada. — Você que
pintou de amarelo, disse que era uma cor feliz e quente porque lembra o sol,
lembra disso, mãe?
Ele tenta atrair a atenção dela, mas é em vão.
— Não se aproxime, por favor, eu não sei quem é você. Onde eu
estou? — Ela chora e se joga nas grades.
Tento me aproximar, mas ela me olha assustada e se joga novamente
nas grades de ferro, como se só com o corpo pudesse quebrá-las e escapar.
Alícia já está próxima do portão e guardou a arma ao perceber a situação.
— Senhora King? — Alícia fala com a voz calma em direção à
mulher. — Estamos aqui para ajudá-la. — Caminha calmamente com as
mãos para o alto. — A senhora pode me dizer onde mora?
— Eu...eu não sei... Cami sabe, ela... ela sabe... — A mulher olha ao
redor, então uma senhora sai da casa ao lado, vestida em um roupão e com o
olhar preocupado encara a situação. — Camiii, me ajuda, eu quero ir para
casa, quem são essas pessoas?
— Estou aqui, irmã. — A mulher corre para dentro e abraça a mãe de
Chace, reconfortando-a em seus braços. — Vou te levar para a sua casa,
você sabe me dizer qual é?
— É a de paredes amarelas — responde assertiva entre as lágrimas
que escorrem pelo seu rosto. — Quem são eles, Cami?
— Amigos meus, não se preocupe, vamos para casa e vou deitar
contigo até você dormir. — Ela ajuda a irmã a se levantar e caminha com
ela para dentro de casa.
— Onde você foi? Sabe que a mãe não gosta quando a gente se separa
— A mãe de Chace parece reviver outra época e fala como se fosse uma
criança sobre a própria mãe.
Chace encara a cena toda preocupado, suas mãos puxam os próprios
cabelos como se quisesse arrancá-los, o corpo todo treme por precisar se
segurar. Eu entendo a frustração, dói não conseguir ajudar quem a gente
ama.
— Você está bem? — pergunto e Ali vai até ele, por um momento
gostaria de me aproximar, mas deixo que ela faça isso.
— Eu... ela tem crises, ela... tem dias ruins, só isso. Desculpa por isso,
eu preciso ver se ela está bem. — Ele se vira, mas Ali pega em seu braço e
o faz encará-la, só então vejo as lágrimas escorrendo pelo rosto do garoto.
— Ela não me reconhece mais, ela... nem sabe que sou seu filho.
— Hey, vem cá. — Ela o puxa para um abraço e isso o desarma,
assisto seu corpo tremer enquanto chora com o rosto escondido no pescoço
dela. As mãos apertam as costas do casaco de Alícia como se ele precisasse
se segurar em algo para não despencar de um penhasco. — Ela é sua mãe, e
o que importa é que você sabe disso. A doença pode tirar as memórias dela,
mas nunca vai extinguir as suas.
Alícia o conforta por um tempo, suas mãos afagam as costas de Chace
até que ele se acalma. Meu peito dói ao presenciar a cena, o garoto não é
uma má pessoa e não merece estar passando por algo assim.
Por um instante gostaria de confortá-lo também. Presenciei minha avó
perder a memória lentamente em seus últimos anos de vida, mesmo que ela
já tivesse uma idade bem avançada e tenha vivido uma vida completa, foi
difícil assistir enquanto esquecia de todos que um dia amou.
O que faz uma pessoa são suas lembranças, os momentos que passou
com quem ama, as vivências e as histórias. Quando isso é tirado de alguém,
o que resta é uma confusão. E para quem precisa assistir, este processo é
destruidor.
— Ela não deveria estar sozinha, preciso procurar a cuidadora. — Ele
ergue a cabeça depois de um tempo e se afasta para conferir o celular. —
Droga, acabou a bateria.
— Pode usar o meu. — Ali entrega o celular para ele.
Chace digita o número, mas ninguém atende e isso o deixa mais
nervoso, ele tenta mais uma vez, depois troca o número e finalmente
consegue falar com alguém.
— Carla, o que está acontecendo? Cheguei agora em casa e sua mãe
não está aqui — explode angustiado, ele caminha de um lado para o outro
enquanto a outra pessoa fala. — Meu telefone está sem bateria, mas porque
ela não chamou minha tia?... Nossa, ele está bem? OK, eu já cheguei em
casa... Não aconteceu nada grave, me manda notícias quando puder, não
precisa mais vir, cuide dos seus pais, conversamos amanhã.
— O que aconteceu? — pergunto.
— O marido da cuidadora foi atropelado e ela correu para o hospital,
Carla disse que já estava vindo para cá cobrir o turno da mãe, não faz cinco
minutos que ela saiu e deixou minha mãe dormindo. Ela deve ter acordado
em crise ou só estava fingindo dormir — Chace explica, respirando fundo.
— Por que a mulher não chamou sua tia antes de sair? Não se deixa
uma pessoa com Alzheimer sozinha assim, nem por cinco minutos —
Alícia comenta preocupada.
— Eu não sei, Carla disse que a mãe está em choque ainda, é
complicado. — Chace respira fundo, tentando se acalmar, vejo a confusão
que provavelmente se passa em sua mente. — Acho que não poderei ir
amanhã, minha tia não tem como ficar o tempo todo com a minha mãe, e
sem a dona Rosa terei que ficar em casa.
Ele até esqueceu que Alícia comentou que a boate não abrirá esta
semana, mas não julgo sua confusão depois de presenciar a crise da sua
mãe.
— Não se preocupe com isso, fique com a sua mãe e garanta que ela
esteja bem — Ali responde e entrega um cartão para ele, que parece
confuso. — Nós já vamos, se precisar de alguma coisa é só me ligar.
Alícia abre um sorriso sincero antes de voltar para o carro, eu olho
mais uma vez as ruas, garantindo que não deixamos nada passar, entro no
banco do motorista e saímos dali.
— Você ainda tem o contato daquela clínica que cuidava da sua avó?
— Alícia questiona olhando para frente, posso ver em seu rosto o quanto a
cena a abalou, então só confirmo com a cabeça, já sabendo o que ela fará a
seguir.
CAPÍTULO 11

Chace
 
Dona Rosa me ligou no início da manhã para explicar o que
aconteceu. Ela me pediu mil desculpas, disse que quando recebeu a ligação
do hospital entrou em pânico e só lembrou de ligar para Carol, que estava a
caminho para substituí-la enquanto eu não chegava.
Seu marido se machucou bastante no acidente de carro e precisou de
cirurgia, ele terá um longo tempo de recuperação pela frente e ela não
poderá mais cumprir os mesmos horários.
A mulher estava em prantos enquanto falava comigo, até me passou
uma lista de nomes de colegas cuidadoras que são de sua confiança e se
comprometeu a me devolver o salário.
— Como ela dormiu? — pergunto assim que minha tia Camila sai do
quarto da minha mãe.
— Depois que se acalmou, dormiu bem — responde cansada e
ofereço uma xícara com café que acabei de passar. — Como você está,
querido? Fazia muito tempo que não tínhamos uma crise dessas.
— Estou bem — minto porque nem eu sei o que estou sentindo
depois do turbilhão de emoções de ontem. — Se dona Rosa tivesse te
chamado, ou eu tivesse vindo mais cedo para casa...
— Não é culpa sua, nem de dona Rosa. Encontrei o comprimido
embaixo do travesseiro da sua mãe, ela provavelmente cuspiu fora e fingiu
estar dormindo para poder correr na primeira oportunidade.
— O que eu vou fazer, tia? Não posso ficar de olho nela o dia todo,
mesmo trabalhando no computador, preciso me concentrar e tenho medo de
que ela fuja e eu não perceba.
— Eu sei, querido, mas vamos encontrar uma nova cuidadora logo e
vou dormir aqui essa semana. Acho que sua memória retrocedeu um pouco
mais, ela falou bastante da nossa mãe ontem e relembrou muito a infância,
seria bom a levarmos novamente até o médico para ser avaliada.
— Sim, vou ligar para o hospital e tentar marcar uma consulta com o
doutor Charles. Sobre as cuidadoras, se puder me ajudar a escolher, eu não
sei como fazer isso, tia — desabafo sentindo meus olhos arderem, tanto
pelo cansaço da noite passada, já que não consegui dormir depois que
entrei, mas também por tristeza.
Eu me sinto um fraco, não tenho força para ser o que minha mãe
precisa, não sei cuidar dela como deveria, droga, não consigo nem sustentar
a casa sozinho. Sou um fracassado. Tenho 22 anos e acho que já deveria ser
alguém na vida.
— Hey, querido, não vá por esse caminho. — Minha tia me abraça,
ela praticamente me criou junto com a minha mãe, Camila me conhece
melhor do que ninguém. — Você não está sozinho e vamos resolver tudo
juntos, ela é minha irmã e jamais a deixarei sozinha. E você é como um
filho para mim, sabe disso, não sabe?
Deixo que me conforte, mas o sentimento de fracasso continua aqui.
Sei que posso contar com a minha tia, ela esteve ao meu lado, me apoiou e
deu carinho quando precisei, só que ainda me sinto responsável por tudo.
O som da campainha alta nos assusta.
— Você está esperando alguém? — questiono, é difícil termos visita
de pessoas que não avisam.
— Não, pode ir ver quem é? Vou preparar o café da sua mãe.
Assim que abro a porta vejo um carro branco estacionado. Parece ser
luxuoso demais para pertencer a alguma pessoa que eu conheço ou aos
nossos vizinhos, mas o que me deixa curioso são as três pessoas de jaleco
esperando no portão. Será que está rolando alguma doença por aí e eu não
sei? Faz tempo que não assisto TV, talvez tenha uma nova pandemia... Não,
minha tia saberia.
— Senhor Chace King? — o homem indaga quando me aproximo.
— Quem gostaria de saber? — pergunto desconfiado.
— Sou o doutor Bruce Rigoni, estas são minhas colegas, doutora
Maira e doutora Janice — ele apresenta as mulheres e quando me aproximo
vejo que os nomes batem com os gavados nos jalecos. — Sou o chefe da
clínica Rigoni, sou neurologista e fui contatado para uma consulta
domiciliar. Poderíamos conversar por um momento?
— Olha, eu não chamei ninguém e não faço ideia de como chegaram
até nós, também não conheço essa clínica que o senhor falou, deve estar me
confundindo com alguém...
Ele me entrega o próprio telefone pelas grades do portão e, assim que
coloco no ouvido, reconheço a voz grave e firme de Gabriel.
“Chace, você está bem?”
— Gabriel? — peço por confirmação, sem acreditar que seja
realmente ele.
“Sim, a Família de Angelis ficará responsável pelo tratamento da sua
mãe de agora em diante. O Doutor Rigoni é especialista no assunto e um
amigo pessoal da minha família, pode confiar nele.”
— Eu não preciso de caridade…
“Garoto, guarda teu orgulho e aceita, não estamos fazendo isso por
você, sua mãe precisa de cuidados e Alícia quer você amanhã na mansão.”
— Não posso deixar minha mãe sozinha.
“A clínica vai cuidar de tudo.”
Com esse último aviso ele desliga, deixando-me sem reação.
— Senhor King? — uma das mulheres, a loira e mais baixa que está
com uma prancheta em mãos, chama pela minha atenção. — Podemos
entrar?
Droga, como vou recusar? Pelo tom de voz de Gabriel eu tenho a
sensação de não ter escolha, mas é a minha mãe, será que eles iriam brincar
com algo sério assim? Não sei, então abro o portão e os deixo entrar.
A casa está organizada, porque passei a noite em claro, então
aproveitei para limpar a sala e a cozinha. Ao ver as pessoas entrando, tia
Camila parece assustada.
— Esta é a irmã da minha mãe, Camila Crest — apresento-a ao
médico, que estende a mão. Todos estão tranquilos e sorriem para nós.
Durante a próxima hora o doutor Rigoni faz muitas perguntas sobre
minha mãe, sobre a rotina dela, quais os medicamentos que toma e o
histórico médico. Entrego a pasta onde guardamos todos os documentos e
exames que foram feitos durante os anos, ele agradece e avalia os mais
recentes.
Eles são muito cordiais e não estão com pressa, como outros médicos
que já nos atenderam. Claro que devem estar recebendo uma pequena
fortuna para que o dono da clínica venha pessoalmente, e nem quero saber
como diabos vou assumir mais esta dívida, porque no momento em que
minha mãe acorda e as duas médicas conversam com ela, com carinho,
calma e acolhimento, não me importo com mais nada.
É este o tratamento que minha mãe merece, é assim que um ser
humano deveria ser recebido pelos profissionais da saúde, e nunca tivemos
isso. É tão estranho que minha tia pede licença e me chama para conversar
lá fora.
— Querido, como você conseguiu o contato dessa clínica?
— Não consegui, tia — respondo culpado. — A senhora sabe que
estou trabalhando em uma boate para pagar a dívida com o agiota, certo? —
Baixo a voz para que ninguém escute.
— Sim, querido. — Ela parece culpada, afinal foi seu marido quem
fez o contato para que eu conseguisse o dinheiro, claro que ela só ficou
sabendo depois, quando eu precisei contar sobre meu novo emprego. — O
que aquelas pessoas têm a ver com isso?
— Bem, eram eles que estavam comigo ontem quando cheguei, me
deram uma carona até aqui. Alícia precisa da minha ajuda com uma
campanha para a boate, acho que Gabriel foi quem fez a ponte com a clínica
para que eu consiga ajudá-la sem me preocupar com minha mãe.
— Não sei se é uma boa ideia, querido, assim você nunca vai
conseguir pagar tudo o que deve para essa gente.
— Eu sei, tia, mas que outra opção eu tenho? Sabe que demoram
semanas para conseguir uma consulta para a mãe no hospital universitário e
olha para ela — viro-me para ver minha mãe tranquila, conversando com os
médicos. — Ninguém a tratou tão bem assim antes.
— Isso é porque essa clínica é uma das mais caras da cidade. Quando
sua mãe teve o diagnóstico, nós pesquisamos muitos lugares, mas naquela
época já era impossível de pagar, imagina hoje — minha tia conta,
preocupada. — A decisão é sua, querido, só quero que pense bem ao aceitar
algo assim de gente como eles.
— Quero o melhor para ela, e se precisar trabalhar a vida toda para
aquela gente até pagar tudo, é isso que farei — respondo decidido.
Não faço a menor ideia do motivo pelo qual eles resolveram me
ajudar, se é realmente para que eu possa trabalhar na campanha, ou se é só
para aumentar ainda mais a quantia que estou devendo. Pouco me importa
agora, só quero que minha mãe fique bem.
Tudo que eu faço é por ela.
Depois da avaliação o Dr. Rigoni me chamou para conversar e pediu
para nos levar até a clínica para uma bateria de exames atualizada. Como
minha mãe está lúcida hoje e muito mais calma, precisamos aproveitar.
Tia Camila a ajudou a tomar um banho e se preparar para sair.
Passamos o restante da manhã na clínica, que não parece em nada com o
hospital universitário com o qual estamos acostumados, fomos levados até
um quarto particular, para que minha mãe ficasse confortável.
O ambiente é calmo e as pessoas sorriem para nós, parece que estou
em outro mundo. A doutora Maira é quem nos acompanha, ela é psiquiatra
e conversa o tempo todo com a minha mãe, mantendo-a calma enquanto
explica os procedimentos que serão feitos. É atenciosa e usa palavras
compreensíveis.
Eles fizeram todos os exames que já estávamos acostumados
enquanto minha mãe ainda estava lúcida e complacente, mas conforme o
tempo foi passando e ela ficava mais cansada, sua memória começou a
falhar. Quando isso acontece eu preciso me afastar.
Tia Camila ficou com ela no quarto enquanto conversei com o doutor,
só para ouvir a mesma coisa de sempre: não tem nada que possam fazer
para curá-la, mas ele mudou os medicamentos e a abordagem da terapia.
Dr. Rigoni também perguntou se eu fazia acompanhamento
psicológico para lidar com essa situação, afinal, segundo ele, a doença tem
um peso enorme para o paciente, mas é complicado para a família, ainda
mais quando é um caso tão precoce como da minha mãe.
— Não temos dinheiro nem para pagar o tratamento dela, o senhor
acha mesmo que eu teria condições para fazer terapia? — desabafo. —
Olha, eu sei que está acostumado com outro tipo de gente — aponto para a
sua sala toda branca e luxuosa, o computador em cima da mesa custa mais
do que todos os aparelhos eletrônicos que temos dentro de casa —, mas nós
não temos esse luxo.
— Entendo sua situação, só gostaria que soubesse que a clínica está a
sua disposição. Nós trabalhamos com uma abordagem humanizada e
entendemos que os familiares precisam de cuidado tanto quanto os
pacientes, por este motivo você e sua tia estão inclusos no plano médico
feito pela família de Angelis — explica de forma paciente, pegando-me de
surpresa. — Não precisa decidir nada agora, só estou informando suas
opções, logo sua mãe será liberada e você pode pensar no assunto com
calma.
Prometo estudar o assunto, mais para tirá-lo do meu pé. Vou falar
com tia Camila para que ela aceite, talvez possa vir com a minha mãe e
assim as duas terão os cuidados que precisam. Eu não tenho como me
preocupar com isso agora, preciso pensar em uma forma de pagar essa
dívida com aquela mulher.
Se antes já teria que trabalhar por quase dois anos naquela boate até
conseguir quitar o que estou devendo, agora ficarei preso a eles a vida toda.
A clínica me passou o cronograma para os próximos exames, assim
como os horários e nomes das cuidadoras que ficarão responsáveis pela
minha mãe. Serão quatro pessoas diferentes, quando questionei a
necessidade, o dr. Rigoni explicou que foi uma ordem da Família de
Angelis. Normalmente as cuidadoras ficariam somente quando não tivesse
familiares, já que minha mãe não tem outros problemas de saúde.
— Não precisa de tudo isso, só de alguém que atenda os horários em
que eu estarei trabalhando — contesto, sabendo que não sairá barato ter um
time de cuidadoras.
— Podemos conversar melhor sobre isso em outra hora, querido —
Tia Camila chama minha atenção e, ao olhar para o lado, percebo que
minha mãe está um pouco alterada. — Ela está esgotada, melhor irmos logo
para casa.
Chegamos com o sol baixo no horizonte, mas mesmo com toda a
agitação e surpresas, não estou cansado. Minha tia foi direto para casa, seu
marido já estava ligando para saber onde estávamos.
Tio Osvaldo é um homem fechado e quase nunca está em casa. Ele
trabalha como motorista de caminhão e passa mais tempo na estrada,
quando volta, gosta de manter seu vício em casas de apostas.
Não entendo como minha tia continua casada, para mim eles
convivem como dois estranhos, mas ela nunca reclamou.
Foi meu tio Osvaldo quem sugeriu o contato com o agiota e fez a
ponte para que eu conseguisse o dinheiro, afinal ele já é cliente de anos da
máfia, mas de alguma forma, sempre consegue pagar o que deve.
Não estou com vontade de cozinhar, portanto peço uma pizza de
quatro queijos, que é a preferida da minha mãe, e coloco uma novela que
ela gosta na TV. A lembrança mais alegre que tenho da minha infância é de
um momento como esse, eu e minha mãe, sentados no sofá assistindo
alguma novela mexicana.
Ela passava o tempo todo comentando as ações dos personagens,
sorrindo ou chorando com eles, e dava conselhos como se pudessem ouvi-la
pela tela da televisão. Sinto muita falta destes momentos, e principalmente
da sua risada.
Hoje em dia Clarissa King já não faz mais comentários engraçados,
dificilmente minha mãe sorri ou fica feliz. Na maior parte do tempo ela
revive momentos difíceis que passou nas mãos do seu pai, que bebia e batia
nas filhas.
Quando cresceu, a sorte não mudou e ela conheceu meu pai, um
homem terrível que a usou como uma prostituta e, quando minha mãe
descobriu a doença, o desgraçado nos abandonou e nunca mais deu as caras.
Eu não tenho o nome dele na certidão, não existem fotos pela casa ou
qualquer resquício de que algum dia um homem passou por nossas vidas.
Eu tinha seis anos quando ele foi embora, não lembro do seu rosto com
clareza, só da voz grossa e alta, mas essas memórias estão trancadas a sete
chaves na minha mente, juntamente com os gritos de desespero da minha
mãe quando o desgraçado batia nela.
O toque do celular desvia o foco dos meus pensamentos, pego o
aparelho e vejo um número desconhecido. Quem será que está me ligando a
essa hora?
— Alô. — Atendo desconfiado e vou até a cozinha, dou uma última
olhada para minha mãe, que continua sentada no sofá, as portas e janelas
estão todas fechadas, portanto me afasto para ela não escutar. — Quem está
falando?
“Porque não aceitou o grupo de cuidadoras?” A voz grossa de
Gabriel me pega de surpresa, assim como sua pergunta curta e direta.
— Gabriel? — questiono para confirmar.
“Não deixe seu orgulho interferir no tratamento da sua mãe, aceite a
ajuda.”
— Não precisamos de tudo isso — contesto.
“No momento talvez não, mas o quadro dela não irá melhorar, com o
tempo ficará mais difícil e é bom prevenir qualquer acidente antes que
aconteça.”
— Eu não tenho como pagar por isso, e já tenho uma dívida alta o
suficiente com vocês.
“Alguém te cobrou algo na clínica?”
— Não, mas...
“Então não tem por que estar preocupado.”
— Como não? Sei muito bem que nada vem de graça — desabafo,
controlando minha voz para não gritar. — Eu agradeço o gesto e vou aceitar
os cuidados médicos e a equipe mínima de cuidadoras, mas só nos períodos
em que eu ou minha tia não estamos em casa, fora isso, podemos cuidar da
minha mãe.
“Para de ser chato, gatinho.” A voz alta e brincalhona de Alícia me
faz arregalar os olhos. “Amanhã um carro vai passar e te buscar para
começarmos a planejar a campanha de marketing, esteja pronto ao meio-
dia.”
Com esse aviso eles desligam, deixando-me de pé, sem reação, na
cozinha da minha casa. Claro que ela quer algo em troca e ainda não sei o
que essa mulher está planejando para a campanha, mas tenho certeza de que
pode contratar uma empresa grande para isso. Por que pedir justo para
mim?
A campainha avisa a chegada da pizza, mas não consigo parar de
pensar sobre onde me meti, essa gente é perigosa, me envolver com eles só
vai trazer problemas.
CAPÍTULO 12

Alícia
 
O plano é bem simples, vamos gravar vários clipes para lançar nas
redes sociais e anunciar o próximo evento em que eu serei o show principal,
com uma apresentação dos meus meninos enquanto toco. Também teremos
a participação especial de DJs convidadas.
Depois da merda que o maldito do Enzo aprontou na minha boate, a
imagem da Malícia foi arrastada para a lama nos sites de fofoca
independentes. Os jornais maiores não têm coragem de postar algo porque
sabem quem é a Família de Angelis.
Só que hoje em dia tudo é internet e não tem como controlar, ainda
mais quando saíram vídeos de pessoas que estavam lá no dia e filmaram o
desgraçado apontando uma arma para os seguranças.
Liz, minha assessora, publicou uma nota nos nossos perfis oficiais
esclarecendo o fato sem dar nome ao desgraçado. Essa parte foi um pedido
— ou melhor, uma ordem — do meu irmão, porque se fosse por mim
jogava as imagens das câmeras de segurança na rede e eles que se
fodessem.
Só que Matteo previu minha reação e levou todas as gravações
daquela noite, até mesmo das câmeras privadas que tenho em uma rede
separada de monitoramento.
Ele me conhece bem demais.
Mandei Ravi ficar de olho na Tati por algumas semanas, só para
garantir que o Enzo não se atreva a fazer algo contra ela. Se existe uma
coisa que não tolero é homem batendo em mulher, ainda mais um playboy
desses, que se acha o centro do mundo e tem a certeza de que pode fazer o
que quiser, com quem ele quiser, que não será responsabilizado.
E sabe de uma coisa? Eu odeio gente assim porque me reconheço
nele. Tenho esse mesmo privilégio, já que sou a irmã do Don e protegida
pela máfia, só que não uso esse fato para abusar de pessoas inocentes. Pode
ter certeza de que quem atravessa meu caminho merece o que recebe de
mim.
Chace chegou na mansão e parecia um gatinho assustado quando o
apresentei a toda a equipe de filmagem. Obviamente ele não ficará
responsável pela campanha, as decisões de tudo serão da Liz, mas ele fará a
edição dos vídeos para postar nas redes sociais.
— Você já tem os figurinos e um conceito principal? — Liz chama
minha atenção para a tela do seu computador, onde ela tem várias ideias
anotadas. — Mali, acorda, mulher.
— Sabe que sempre uso a mesma coisa, nesse evento quero tudo rosa,
azul e roxo, eu amo essa combinação de cores — discorro sobre minhas
ideias e Liz anota tudo. — Podemos gravar os clipes aqui na mansão
mesmo, inclusive domingo teremos uma corrida, acho que renderia umas
imagens legais.
— Tem certeza? — confirma. Liz sabe que meu irmão não gosta que
usemos nossa casa para gravações.
— Eu mesma vou falar com ele, relaxa.
— Só mais uma coisa — sussurra e aponta para Chace, que está de
pé, escorado na parede e longe do restante da equipe. — Tem certeza sobre
ele? Posso conseguir uma equipe mais profissional para este trabalho, como
temos pouco tempo, seria melhor usar empresas com quem já trabalhamos
antes.
— Ele vai dar conta, temos tempo até o evento.
Durante o restante do dia observo Chace de longe, enquanto Liz e a
equipe organizam as ideias e criam um plano para começar a gravação. Eu
realmente não me importo com isso, já tenho uma playlist formada para o
dia e só preciso trabalhar no remix.
A mansão de Angelis não é uma casa normal, e é por isso que meus
irmãos e eu não saímos daqui. Todos os negócios ilegítimos são tratados na
parte do grande Don Lorenzo, reuniões, negociações e até algumas torturas
acontecem na ala norte da mansão.
Meu irmão mais velho também domina a ala leste, mas esse local é
exclusivo da sua esposa e dos dois diabinhos que nasceram desta união:
meus sobrinhos Gustavo, de 10 anos e futuro Don da Família de Angelis e
seu irmão Antônio, que com 7 anos só quer saber de jogos e estudar.
Eles ficam na parte familiar da mansão e não têm permissão para
correr pelo restante da casa. Minha cunhada Andrea garante que isso não
aconteça para que os filhos não presenciem cenas perturbadoras cedo
demais.
A ala sul é a parte do Matteo e sua mulher, Sophia. Eles não ficam
muito lá, já que ela é médica e trabalha no hospital e meu irmão está sempre
na rua. Eles não querem ter filhos e fizeram até festa quando Antônio
nasceu, afinal, a continuidade da Família de Angelis está garantida.
A ala oeste é minha, e obviamente é a maior e mais legal de todas.
Gabriel e eu temos nossa suíte, que ocupa praticamente todo o terceiro piso.
Logo abaixo, decidi deixar uma área de jogos, que pode ser usada para
vídeo games, cinema, festinhas privadas e, mais aos fundos, temos uma área
especial para pequenas orgias ou brincadeiras mais pesadas.
No primeiro piso é onde construí o estúdio criativo, neste andar
guardo todos os equipamentos necessários para fazer os remix das músicas
e gravar áudios originais, temos uma sala de sonoplastia completa e todos
os equipamentos musicais possíveis.
Amo esse local, posso ficar horas, até dias, aqui embaixo, só curtindo
o meu momento de criação. É aqui que Chace irá trabalhar e posso ver seu
olhar surpreso quando entra e se depara com todos os aparelhos,
especialmente os computadores de última geração.
— Gostou, gatinho? — questiono ao me jogar no sofá e assistir
enquanto ele fica todo sem jeito. Também lanço um olhar para Liz, que nos
deixa sozinhos e fecha a porta.
— É demais, você tem um estúdio completo — elogia e coloca as
mãos no bolso, como se precisasse se controlar para não encostar em nada.
Seu olhar não encontra o meu, mas os ombros caídos e a forma com que
fica próximo à porta indicam que está com medo.
— Relaxa, é melhor se acostumar com a minha presença — provoco e
aponto para a mesa com o computador. — Você pode trabalhar ali, se
precisar de algo que não tenha aqui, ou se não conseguir encontrar alguma
coisa, pode perguntar para a Liz.
— Obrigado — agradece mas não se move, e isso me deixa
angustiada, eu não me importo que as pessoas fiquem aterrorizadas comigo,
mas só quando esse é o objetivo e não é o caso aqui. Não quero que Chace
sinta medo de mim, tudo bem que posso ter passado um pouco do ponto em
nosso primeiro encontro, e lembrar daquele dia, por algum motivo estranho,
me deixa mal, como se estivesse arrependida.
Eu não me arrependo do que faço, por que isso agora?
— Está com medo de mim? — A pergunta o faz me olhar, mas não
recebo uma resposta. Chace só move a cabeça de um lado para o outro e
olha novamente para a porta, como se esperasse que alguém fosse entrar.
Levanto e caminho até ele, ficando em sua frente, e preciso inclinar minha
cabeça para cima para encontrar seus olhos, afinal ele é mais alto que eu.
— Do que você tem medo? — questiono, dessa vez de forma mais
séria. — Responda.
— Eu não... alguém pode entrar... não quero que pensem...
— Quem pode entrar?
— Ele... eu não quero arrumar confusão. — Seus olhos tremem em
desespero e só então entendo, o gatinho está com medo de que Gabriel o
encontre aqui, sozinho comigo.
— Realmente, Gabriel é um homem a se temer — murmuro e ergo
uma mão para segurar seu maxilar delicadamente. — Ele é alto, forte, tem
uma pontaria perfeita e sabe muito bem como usar uma faca — assisto seu
rosto perder a cor, seu corpo começar a tremer e a respiração ficar mais
rápida —, mas posso te contar um segredinho?
Como sei que ele não vai responder, forço o aperto da minha mão em
seu queixo, seu medo me faz querer dominá-lo até que pare de tremer feito
um ratinho acuado.
— Gabriel não fará nada contra você porque ele confia em mim,
assim como confio nele, nossa relação é sólida e não abre espaço para
ciúmes — explico de forma clara. — Nós nos amamos e confiamos um no
outro, isso significa que ele sabe que eu jamais iria te beijar ou deixaria
você chegar perto de mim dessa forma, sem que ele aceitasse antes,
entende?
— Sim — responde com a voz fraca.
— Portanto não precisa ter medo dele. — Solto seu rosto. — E é
melhor começar a se enturmar com a equipe, ninguém aqui tem tempo para
perder com uma criança que não sabe trabalhar com outras pessoas.
Saio da sala e o deixo sozinho, não gosto de pessoas medrosas, ainda
mais os que trabalham para mim. Quero ser respeitada, sim, e um pouco de
medo é algo lógico, visto quem eu sou e o que a minha família representa,
mas Chace parece ter um pavor irracional de tudo.
Só que a cada coisa que descubro sobre ele, fico um pouco mais
curiosa. Gabriel me entregou o dossiê sobre a vida do rapaz e sei tudo o que
ele fez desde que nasceu até cair nas mãos da máfia. Sei tudo o que tem
registrado sobre ele, menos o nome do seu pai.
Essa informação não está em lugar algum, nosso detetive particular
continua trabalhando nisso, mas pelo que conseguiu até agora, somente a
mãe do Chace realmente sabe quem ele é, e a mulher não está em condições
de falar.
Vejo os meninos se alongando próximos da piscina, eles vão
participar do meu show e farão alguns números de dança na plataforma que
será instalada em frente ao palco reservado para a DJ.
Cada um destes homens veio até mim de uma forma diferente, alguns
por dinheiro, drogas, fama. Eles têm seus motivos para trabalhar para mim e
eu tenho os meus para aceitá-los.
Repasso as músicas que vou usar para que o Rick planeje as danças,
ele é o mais velho e o mais sensato, por isso é o que deixo no comando do
grupo. Gosto de trabalhar com ele e respeito sua história.
Enquanto conversamos vejo que Kevin me olha o tempo todo, sua
linguagem corporal denuncia que está aflito com alguma coisa, por isso
assim que termino de falar com Rick, faço sinal para Kevin me acompanhar
até o bar.
— Desembucha logo, o que está te incomodando? — questiono e
abro duas cervejas, entrego uma para ele e tomo um gole da outra.
— Não queria falar na frente dos outros porque é sobre nosso último
encontro — fala baixo se referindo à noite em que Gabriel o teve como
submisso. — Eu fui de carona aquela noite e ia voltar com o Rick, mas
como Gabriel mandou que seus homens me levassem, fiquei um pouco mais
na banheira e saí mais tarde.
— Sim, sim, vamos logo ao assunto — apresso, sem paciência para
escutar uma narração prolongada de uma simples carona.
— Ofereci a carona para o Chace também, mas ele disse que iria de
ônibus, já que moramos em locais opostos demoraria muito para que os
homens me levassem e depois fizessem todo o caminho de volta para a casa
dele, então ele saiu antes. — Estou quase mandando-o se apressar
novamente quando vejo que Kevin olha para os lados e cobre a boca com a
mão antes de continuar: — Quando saímos do estacionamento da Malícia,
passamos por dois homens à paisana do outro lado da rua.
— Podiam ser jornalistas ou alguém esperando por mais fofoca do
que aconteceu — retruco.
— Tinha mais gente lá fora, sim, mas esses dois eram diferentes. —
Kevin tira o celular do bolso e me mostra o vídeo que gravou. — Só tive
tempo de abrir a câmera e gravar, ficou meio tremida a imagem, mas olha
aqui. — Ele para o vídeo em um momento específico, bem quando o carro
passou em frente aos dois indivíduos e eles viraram o rosto, neste momento
vejo a tatuagem no pescoço de um deles.
— São do Cartel — anuncio e avalio melhor o desenho de um X em
vermelho bem grande e específico no pescoço de um deles.
— Não quis comentar nada para os seus homens, porque não sei se
eles sabem sobre o meu passado, mas reconheci um deles como Jair
Hernanes.
Avalio melhor o vídeo e envio para um endereço de e-mail do meu
detetive particular antes de deletar o arquivo do telefone de Kevin.
— Obrigada pela informação — agradeço e devolvo seu aparelho,
mas ele não se vira e sai como imaginei que faria. — Tem mais alguma
coisa?
— Então, eu não conheço o garoto, Mali, e não gosto de levantar
suspeitas sobre ninguém sem provas, mas vi que Chace estava saindo da
balada naquele momento e assim que passou pelos homens, eles andaram
atrás dele — relata assustado. — Não vi mais nada depois disso porque
viramos a esquina e os perdi de vista, mas eles estavam atentos ao cara.
Devemos ter saído logo depois, porque Chace não tinha ido muito
longe quando oferecemos carona e não reparei nas pessoas que estavam na
rua, mas vou puxar as imagens de segurança da frente da boate assim que
acabar aqui.
— Enfim, o garoto parece legal, talvez tenha sido coisa da minha
imaginação, só achei que precisava te contar. — Kevin passa as mãos pelo
cabelo, ajeitando os fios loiros que estavam caídos em seu rosto.
— Fez o certo, mas é melhor não comentar nada com ninguém —
advirto e tenho uma ideia. — E se puder, tente introduzi-lo ao grupo, acho
que ele não tem muitos amigos. Agora volta lá, quero essa bundinha sexy
bem treinada para o meu show.
— Já te decepcionei alguma vez? — comenta e sorri mais confiante,
então o assisto retornar ao local onde os meninos estão planejando as
danças. Kevin é um homem muito bonito, sei por que Gabriel gosta tanto de
brincar com ele, ainda mais vendo a bunda firme e redonda na calça jeans.
Se ele não fosse homossexual, adoraria dar uns pegas nesse gostoso,
mas infelizmente somente Gabriel tem o privilégio. Eu fico assistindo e me
deliciando com o prazer do meu homem, e esse é realmente o ponto das
nossas brincadeiras sexuais: prazer, tesão, orgasmos.
Retornei da Inglaterra decidida a ter tudo o que meus irmãos tinham:
dinheiro, poder e liberdade. Não que algum dia me faltou alguma coisa, o
cartão preto sempre esteve comigo, só que nunca tive a oportunidade de
provar meu valor para nossa Família, ou a liberdade de descobrir quem eu
era.
Os pais de Gabriel me receberam com os braços abertos, mas eu
estava quebrada. Havia acabado de descobrir o poder que as drogas têm em
amortecer momentaneamente a dor e, naquele momento, qualquer coisa que
me fizesse esquecer era melhor do que a realidade.
Eu não conseguia carregar meus monstros sozinha, estava ficando
pesado demais, cansativo demais. Meus irmãos faziam de tudo para ajudar,
só que nada poderia arrancar as lembranças da menina de oito anos.
Senti-me só por muito tempo, rodeada de pessoas que se
preocupavam comigo, porém sozinha. Sem saber quem eu era ou qual seria
meu lugar no mundo e dentro da minha família, me perdi para a escuridão
por um tempo. Até que ele me encontrou.
Gabriel me salvou novamente ao me levar para o hospital quando
estava quase tendo uma overdose, nem lembro tudo o que usei naquela
noite. Só sei que consegui fugir da mansão, encontrei um traficante de
merda na rua e comprei tudo o que ele tinha, depois me tranquei no telhado
da mansão com uma barra de chocolate, uma garrafa de whisky roubada da
adega e uma sacola de comprimidos.
Ele me encontrou, não sei quanto tempo passou, mas tive a mesma
sensação de quando me joguei em seus braços depois de matar o monstro e
meu próprio pai, estava a salvo.
Assim como o coelho encontrou a Alice e a levou até o País das
Maravilhas, dando-lhe acesso a um mundo novo, cheio de aventuras e
magia, salvando-a de uma vida chata e monótona, Gabriel me salvou de
mim mesma para, anos depois, apresentar-me ao amor.
Droga, preciso parar de pensar nessa época.
Foco no presente, já passou!
Envio uma mensagem para Gabriel, ele saiu com Matteo para resolver
alguns assuntos na delegacia. Como preciso estar aqui e coordenar esse
show, nos separamos e já sinto sua falta.
“Estou com saudades, vai demorar aí?”
Não gosto de ficar longe dele, fico aflita e ansiosa toda vez que não o
tenho sob meu olhar. É como se uma parte de mim estivesse faltando, e sei
que ele sente o mesmo, ainda mais quando responde à mensagem segundos
depois de receber.
“Mais umas duas horas. Quer que eu leve algo?”
Um sorriso travesso se forma em meu rosto.
“Somente esse corpinho delicioso.”
“Estarei ao seu lado o mais rápido possível, amor.”
Amor.
Sempre que essa palavra vem dele, meu coração acelera e me sinto
mais leve, segura e feliz.
CAPÍTULO 13

Gabriel
 
As gravações do evento da Alícia estão melhores do que ela esperava
e isso a deixou com um bom humor contagiante nos últimos dias, como há
muito tempo eu não via. A boate ficará fechada até a próxima semana,
portanto ela está trabalhando na mansão.
Matteo aproveitou esse tempo para me fazer resolver seus assuntos
pendentes, coisas em que prefere não envolver a irmã, como ele mesmo
pontuou. Existem segredos na família tão bem guardados que ninguém — a
não ser os irmãos de Angelis — tem conhecimento.
O sequestro de Alícia e seus pais ainda é um mistério. Coisas sobre
aquele dia, detalhes, nomes, pessoas, peças do quebra-cabeça que não se
encaixam, ainda me deixam acordado à noite.
— Gabriel — Don Lorenzo cumprimenta ao entrar em seu escritório.
Aproveitei enquanto Alícia está no estúdio gravando um novo remix com
sua equipe para falar com seu irmão a sós. — Está com cara de quem
precisa de uma bebida.
Lorenzo serve dois copos de whisky deixando um em minha frente e
rodeia a mesa até sua cadeira.
— Obrigado — agradeço virando toda a bebida de uma vez, sinto o
álcool queimar minha garganta ao descer, mas o alívio não vem. — Tenho
novas informações.
—Visto que está aqui sozinho, presumo que sejam sobre minha irmã
— comenta e me lança seu olhar apreensivo, aquele que ele sempre faz
quando fala de Alícia. — Ela piorou?
— Não é sobre isso, o evento está deixando-a calma e focada em sua
música — explico. — Os mexicanos estavam rondando a boate na noite que
o filho do senador perdeu o controle.
— Isso não é novidade, os malditos são como moscas, sempre
cheirando quando alguma merda acontece — expressa com ódio no olhar.
— Qual é a diferença desta vez?
— Aparentemente estavam de olho em um dos dançarinos, puxei as
câmeras de segurança daquela noite, e, assim que Chace saiu, os dois o
seguiram. — Tiro o celular e mostro as imagens para Lorenzo.
— Eles o pegaram?
— Não, Alícia resolveu oferecer uma carona para o garoto e o
interceptamos antes que algo pudesse acontecer — explico.
— Por que não deixou que o seguissem? Achei que fosse mais
esperto que isso.
— Não os notei na hora — anuncio com raiva de mim mesmo por não
ter percebido. — Quem comentou foi Kevin, o dançarino que salvamos do
Cartel no passado, ele reconheceu a tatuagem de um deles e disse que o
outro é Jair Hernanes.
O nome atrai a atenção de Lorenzo, ele volta o vídeo e olha mais
atentamente para as imagens, parando em um momento específico em que
um dos homens olha para o lado e seu rosto fica mais nítido.
— É ele — confirma jogando o celular de volta para mim. Lorenzo
respira fundo e cruza os braços, as olheiras embaixo de seus olhos indicam
o cansaço do Don. — O que eu não entendo é como o meu executor não
percebeu a presença do braço direito do chefe do Cartel, bem em frente à
boate da minha irmã, caminhando livremente enquanto vocês saiam para
dar uma voltinha de carro.
— Não tenho desculpas para meu erro, deveria ter averiguado melhor
a área antes de sair.
— Só tem uma coisa que me faz aceitar que meu melhor amigo esteja
fodendo a minha irmãzinha dentro da minha própria casa — afirma com
raiva. — Sabe o que é, Gabriel?
— Protegê-la acima de tudo — respondo sem hesitar.
— Sim, e se você não conseguir protegê-la, não importa que sejamos
amigos a vida toda, ou que você seja a merda do executor, estou pouco me
fodendo — desabafa com a voz firme e poderosa. — Se algo acontecer à
minha irmã enquanto ela estiver sob sua proteção, eu te mato com minhas
próprias mãos, e nada neste mundo conseguirá me parar.
A ameaça é séria e essa não é a primeira vez que Lorenzo fala assim
comigo, especialmente quando o assunto é Alícia. Somos amigos desde
pequenos, crescemos juntos, treinamos com os mesmos professores e estive
ao seu lado quando assumiu seus deveres.
Foi Lorenzo quem me salvou do cativeiro quando fui preso e
torturado por uma gangue inimiga, devo minha vida a ele e à família de
Angelis. Nossa única desavença em todos esses anos aconteceu quando
correspondi aos sentimentos de Alícia.
— Ela é minha vida, não deixarei que nada aconteça — juro confiante
— Ficarei ainda mais atento daqui para frente.
— É bom mesmo, e investigue melhor a vida do garoto, pelo relatório
que recebi não lembro de constar qualquer ligação com o Cartel — ordena.
— Deveria ter seguido minhas ordens e acabado com a vida do infeliz, mas
deixou seu pau falar mais alto.
Respiro fundo e engulo sua provocação, ele sabe que não irei me
defender, fui treinado a vida toda para ser seu executor.  Meu pai sempre
soube que Matteo seria o Consigliere, com isso eu não teria um lugar na
elite da Família de Angelis.
— Como ela está com tudo o que aconteceu na boate? — Lorenzo
questiona, preocupado, mas com a voz mais calma.
— Com raiva por Matteo interromper o que ela planejava fazer com o
tal do Enzo, Alícia vai se vingar na corrida — aviso e Lorenzo relaxa na
cadeira. — Mas ela está mais calma, não usou nada nestes dias em que está
trabalhando no evento.
— Queria que fosse sempre assim, se eu pudesse, tomaria os
demônios da minha irmã para mim — confessa cansado.
— Ela é forte e a música e sua arte ajudam no processo — comento
—, mas ambos sabemos que logo ela enjoa e vai precisar de algo novo para
atrair sua atenção.
— Isso soa como uma reclamação — provoca. — Está arrependido
por se envolver com uma menina 15 anos mais nova?
Um meio sorriso aparece no rosto do meu amigo e nego com a
cabeça. Ele sabe que nada que Alícia faça será forte o suficiente para que eu
me arrependa da nossa relação.
— Sabe que não — respondo confiante.
Depois disso Matteo chega e falamos sobre a viagem do Don para a
Rússia, seu irmão ficará no comando durante o período em que Lorenzo
estará fora, e assim que decidimos quais homens farão a segurança dele e de
sua esposa sou liberado e vou à procura de Alícia.
Encontro-a sozinha no estúdio, já está escurecendo lá fora e o pessoal
acabou de ir embora. Ela está concentrada no computador, os grandes fones
de ouvido abafam os sons da sala. Alícia está linda com uma calça
confortável de moletom branca, camiseta larga e meias coloridas nos pés.
Ela gosta de trabalhar com o ar-condicionado ligado, tornando o
ambiente mais frio do que do lado de fora. Paro por um momento para
admirá-la, de costas seus cabelos loiros e cacheados tentam escapar de um
coque bagunçado preso por uma caneta, deixando parte do pescoço à vista.
Suas mãos trabalham lentamente na mesa de mixagem, controlando
cada um dos botões que alteram alguma faixa na música. Eu me aproximo
aos poucos e pego a garrafa de cerveja que descansa em cima da mesa,
ainda gelada e pela metade, para chamar sua atenção.
Alícia não gosta de ser surpreendida, é perigoso assustar esta mulher
ou tentar pregar peças nela. Por um instante seus ombros ficam tensos e ela
leva a mão à arma que esconde em sua cintura, mas assim que seus olhos
encontram os meus, relaxa e sorri.
— Bunny, você voltou! — ela levanta e se joga em meus braços, sua
boca logo encontra a minha e sinto os lábios macios acariciarem os meus
em um beijo cheio de saudade e carinho. — Como foi com meu irmão?
— Tudo certo, iremos investigar melhor o passado do garoto —
explico.
— Que horas são? — ela parece surpresa ao olhar em volta e perceber
que não tem mais ninguém na sala.
— Tarde — respondo e recebo um sorriso cansado. — Você ficou
aqui o dia todo?
— Sim, falta só mais uma faixa para o show, só que não consigo
deixar como quero, parece que falta alguma coisa no Drop e não sei o que é
— reclama frustrada.
— Você está cansada. — Traço um caminho de beijos pelo seu rosto.
— É sábado à noite, o que você acha de sairmos para jantar?
— Você quer sair? — questiona, suspeita. — Hoje? Mesmo sabendo
que amanhã é a corrida? Está tentando me deixar mais cansada para ter uma
chance de vitória?
Solto uma gargalhada com sua linha de raciocínio, Alícia é uma
pessoa competitiva, muito. Vencer é tudo para ela, por isso não me
surpreende a desconfiança.
— É só jantar, prometo te trazer para casa cedo. — Beijo seu pescoço
e inspiro o perfume delicioso que só ela tem. — Podemos até dormir sem
transar, guardar as forças para amanhã.
— Só se você me trancar no quarto do pânico — debocha e passa as
duas mãos pelo meu pescoço, segurando-se em mim para abraçar minha
cintura com as pernas. — Ou podemos transar aqui e agora, quem sabe um
orgasmo é tudo o que preciso para terminar a música.
— Será mesmo? — provoco e a coloco sentada em cima da mesa,
minhas mãos acariciam sua bunda.
— Dizem que ao ter um orgasmo liberamos oxitocina e endorfina,
que reduzem os efeitos do stress no corpo, quem sabe é isso que está
bloqueando minha criatividade? — Seus olhos brilham de desejo, vejo os
mamilos duros embaixo da camiseta, já que a diabinha está sem sutiã.
— E você quer testar essa teoria agora? — digo enquanto esfrego
minha ereção nela e sou recompensado com um gemido baixinho. — Aqui,
em cima da mesa?
— Sim, me fode aqui, Bunny — implora com a voz embargada e a
respiração ofegante. Eu me esfrego um pouco mais, meu pau duro na calça
pede por atenção e sei que ela está com tanto tesão quanto eu.
— Não — interrompo o contato e recebo um olhar confuso que logo
se transforma em raiva. — Precisamos nos trocar, quero te levar para jantar.
— Beijo seu rosto carinhosamente e me afasto, deixando-a sentada na mesa.
— Vem.
— Gabriel — chama meu nome com raiva. — Vai mesmo me
provocar assim e me deixar na mão?
— Prometo te foder até que você desmaie depois, mas antes teremos
um encontro.
Alícia inclina a cabeça para o lado e franze as sobrancelhas em uma
careta confusa, ela passa a mão no queixo e posso ouvir as engrenagens
trabalhando na sua cabeça.
— Esqueci alguma data especial? — Ela pula da mesa e passa por
mim rapidamente, saindo da sala enquanto a acompanho alguns passos
atrás, o que me dá a visão privilegiada da sua bunda deliciosa. — Para de
olhar para a minha bunda.
— Sim e não — respondo a sua pergunta e recebo outro olhar
confuso. — Confia em mim amor, você vai gostar — abraço-a por trás
assim que chegamos ao quarto e arranco uma gargalhada deliciosa quando
ela se solta e começa a tirar a roupa — e não, eu não vou parar de admirar
essa bunda gostosa.
— É bom que tenha comida, e bastante, estou morrendo de fome —
reclama ao mesmo tempo em que me provoca. Alícia tira cada peça de
roupa sem desviar o olhar do meu, o sorriso brincalhão não sai do seu rosto.
— Não vai tomar banho comigo?
— Eu já tomei — Sento-me na poltrona e cruzo as pernas. — Só vou
trocar de roupa.
— Sacanagem, isso. Você troca de roupa e está pronto, eu preciso
tomar banho, lavar os cabelos, secar, passar maquiagem e escolher um
vestido, isso tudo sem saber para onde vamos — fala com a voz dengosa.
— Vá até o closet — aconselho e a assisto caminhar nua até as portas
do cômodo, então escuto um grito animado e sei que encontrou o presente.
— Bunny safado, você pensou em tudo mesmo. — Alícia sai com o
vestido longo na cor verde-escuro em uma mão e os sapatos dourados na
outra. — Pelo visto vamos em algum lugar chique, droga. — Faz uma
expressão triste que me deixa apreensivo.
— Não gostou?
— É lindo, amor, mas esses lugares pomposos não têm comida, e eu
estou morrendo de fome. — Faz birra como uma criança.
— Vai ter comida, confia em mim. Agora vai tomar um banho, senão
ao invés de jantar vamos tomar café da manhã no restaurante. — Levanto-
me e vou até o closet, pego o pacote que ela não viu e tiro a lingerie branca
que comprei para esta noite. — Não esqueça o mais importante. — Entrego
as peças e beijo sua boca carinhosamente.
Alícia não demora muito para se aprontar, no fim resolveu não lavar o
cabelo e só prendeu em um rabo de cavalo, o que deixou seu pescoço e
busto livres no vestido sem alça. A maquiagem mais escura nos olhos
ressalta o verde das íris perfeitas, o batom quase da cor dos seus lábios me
atrai como abelha ao mel, mas me controlo.
Nossos soldados estão aguardando com o SUV pronto em frente à
mansão, outro carro com seguranças fará nossa escolta, o que é
procedimento padrão quando saímos.
Alícia não para de perguntar para onde vamos e tenta com todas as
suas forças arrancar a informação no caminho. Ela só não monta em mim
porque o vestido não deixa, mas sua mão acaricia a parte interna da minha
coxa o tempo todo, provocando-me, ainda não lembra que dia é hoje,
portanto deixo que forme suas teorias.
Sei que odeia surpresas, mas ao mesmo tempo ela ama tentar decifrar
algum mistério, por isso planejo noites assim, diferentes, e hoje tenho um
bom motivo para trazê-la ao restaurante mais exclusivo da cidade.
O Picasso fica no último andar do prédio mais alto de Boston e tem
uma fila de espera de meses para uma reserva. Claro que isso não se aplica
a nós, especialmente porque o dono é o irmão do meu pai. Tio George se
aposentou das suas funções como Underboss e investiu em restaurantes
exclusivos por toda a cidade, meu primo Bryan Esposito assumiu o seu
lugar.
Semana passada liguei avisando que precisava de uma das suas mesas
no terraço e ele ficou feliz em limpar a área para que Alícia e eu tenhamos
um momento especial e exclusivo.
— Ainda não estou surpresa — Alícia provoca quando o garçom nos
leva até nossa mesa, mas vejo em seus olhos que está curiosa, ela avalia o
local antes de sentar e aceitar o vinho enviado pelo chef. — Agora que
estamos aqui, no restaurante do seu tio, me conta: o que diabos estamos
comemorando?
— Paciência. — Espero o garçom se afastar, não vamos fazer os
pedidos, o chef sabe do que gostamos e trará o melhor que tem a oferecer.
— Gabriel, eu te amo pra caralho, mas se não falar logo o que está
aprontando, juro que levanto daqui agora e vou até o McDonald´s que fica a
duas quadras e te deixo sozinho com esse mistério todo — ameaça, mas
agora já não tem mais humor em sua voz, ela está falando sério.
— Cinco anos atrás uma menina apontou uma arma para a minha
cabeça — falo tranquilo e tomo um gole do vinho, deixando que absorva
que dia é hoje. — Naquele mesmo dia, essa garota petulante, porém muito
decidida, declarou que eu seria seu, como se fosse um brinquedo ou um
carro que ela ganhou dos irmãos.
Alícia arregala os olhos, surpresa, e pega o celular, conferindo a data,
só então cobre a boca com as duas mãos.
— Eu esqueci! — confessa baixinho com o olhar triste. — Amor...
— Nesse mesmo dia essa diabinha roubou meu carro, me drogou, me
amarrou e me prendeu no porta-malas, dirigiu por mais de dez horas até
uma maldita cabana no meio do nada e jogou o carro, meu celular e
qualquer forma de comunicação dentro do lago — relembro com um sorriso
no rosto a Alícia de dezenove anos, dançando travessa enquanto o veículo
andava sozinho ladeira abaixo até chegar no lago e afundar lentamente.
Assisti tudo aquilo enquanto ela me deixou amarrado, jogado em
frente à cabana, sem conseguir fazer nada. Ainda não sei como ela
conseguiu amarrar aquelas cordas tão bem, ou onde aprendeu a dar aquele
tipo de nó.
— Não é como se você não tivesse dinheiro para comprar outro —
brinca com a voz doce. — E precisei fazer aquilo — ela se explica sem
remorso algum. — Você não quis ir comigo quando eu convidei.
— Então você deu um jeitinho.
— Sim, e faria tudo de novo.
— Que bom, porque ser reivindicado por você foi a melhor coisa que
aconteceu na minha vida — confesso e ela sorri. — Sempre foi você, a
única a conseguir me tocar sem que eu sentisse medo, a primeira a me fazer
duvidar da minha lealdade. Você me deu um propósito muito maior do que
somente servir à máfia, e uma recompensa infinitamente mais valiosa.
— Nosso amor foi especial desde o começo, foi meu salvador, amigo,
confidente, protetor. Sempre foi você, Gabriel — anuncia e estende a mão,
pegando a minha sobre a mesa pequena. — Você só precisava de um
tempinho para me ver como uma mulher, não mais como uma criança ou a
irmã mais nova do seu melhor amigo.
— Obrigado por persistir. — Aperto sua mão e tiro o presente do
bolso interno do meu terno. — Meu coração já é seu há muito tempo, essa é
só uma lembrança do quanto te amo e sou grato por ter você em minha
vida.
Alícia pega a caixa de veludo e seu olhar se abre de espanto ao tirar o
colar de dentro. A esmeralda quase da cor dos seus olhos brilha em suas
mãos e seu sorriso feliz faz meu coração bater mais forte no peito.
Porra, como eu amo essa mulher!
— Coloca pra mim? — pede e levanto pegando o colar da sua mão,
acaricio o dorso delicado e coberto por tatuagens escuras, fecho a corrente
em seu pescoço e, antes de me afastar, Alícia segura minha mão e me puxa
para baixo. Sua boca encontra a minha em um beijo carinhoso. — Obrigada
por ser o romântico da relação.
— Farei qualquer coisa para ter esse sorriso. — Abro seus lábios
macios com os meus e nossas línguas se encontram, familiaridade e amor, é
assim que descrevo nossos beijos. — Te amo, diabinha.
— Também te amo, Bunny — responde sincera. — Mas podemos
comer agora? Não estava brincando sobre o McDonald´s, estou morrendo
de fome.
Como se precisasse confirmar, escuto seu estômago roncar alto. Vejo
Alícia fazer uma careta e faço sinal para o garçom que logo traz nossas
entradas, em porções mais generosas que o normal. Meu tio conhece minha
acompanhante e sabe que ela quer comida de qualidade, mas também exige
quantidade.
Aproveitamos o jantar para conversar e relembrar nossos primeiros
encontros, Alícia se diverte com tudo o que me fez passar até que eu admiti
meus sentimentos por ela. Eu amo nossa história e a forma como
fortalecemos nosso laço até agora.
CAPÍTULO 14

Alícia
 
Eu nunca lembro de datas especiais, isso é trabalho do Gabriel. Ele é
um romântico à moda antiga, pode-se dizer, e sua linguagem do amor é me
dar presentes e me fazer feliz, mesmo que o melhor presente que possa me
dar é seu amor.
Meu homem é um cara de poucas palavras, mas muita atitude.
Depois do jantar, passamos um tempo conversando até que a garrafa
de vinho terminou e resolvemos voltar para casa. Retribuí seu presente com
muito sexo, de todas as formas que sei que ele gosta, afinal, conheço esse
homem e tudo o que o enlouquece.
Acordei cedo e saí da cama antes mesmo do sol nascer, deixei Gabriel
descansando e desci para a garagem, a fim de encontrar com a minha
Kawasaki Ninja H2R modificada já pronta para a competição. Os
mecânicos fizeram uma geral nela esta semana e deram o OK final.
Corrida de motos é o esporte da nossa família, meus irmãos
aprenderam a pilotar bem pequenos, Matteo conta que meu pai organizava
corridas infantis só para se vangloriar quando um dos filhos vencia.
Obviamente que comigo não foi assim, afinal, por ser mulher não era
aceita nas brincadeiras ditas “de meninos”. Só que eu sou a Alícia, depois
do sequestro e da morte dos meus pais, tive carta branca para fazer o que
queria.
Lorenzo foi quem tentou ter um pulso mais firme comigo no começo,
ele não queria que eu presenciasse o que eles faziam, portanto me deixava
aos cuidados das babás que tentavam me trancar na minha parte da mansão.
Coitadas, nunca funcionava. Por mais que as portas estivessem
chaveadas, sempre havia as janelas. Em uma dessas fugas encontrei as
motos antigas dos meus irmãos, aquelas feitas especialmente para crianças,
para minha sorte uma ainda estava funcionando e foi com ela que invadi a
corrida dos adultos e quase matei Lorenzo de susto.
Eu sabia dirigir? Não. Mas eu sabia andar de bicicleta, e com 10 anos
já havia visto alguns filmes que me ensinaram a ligar a chave e acelerar.
Depois disso foi só me equilibrar e correr na direção certa.
Era um evento em que alguns Underbosses e meus irmãos estavam
correndo, me dei bem ao entrar na parte reta da pista e os competidores
conseguiram desviar da minha moto antes de provocar algum acidente.
Lembro até hoje do Matteo rolando de rir enquanto o Lorenzo tentava
me parar. Consegui dar uma volta completa na pista e só parei porque
Gabriel pegou a bandeira quadriculada e comemorou minha vitória. Ele
estava sorrindo, como Matteo, e naquela época isso era um evento raro.
— Veio sabotar nossas motos, irmã? — A voz de Matteo me faz
sorrir. — Eu sabia que tinha que ter posto alguns soldados de guarda.
— Não preciso roubar para ganhar de vocês — provoco e aliso minha
moto. — Essa belezinha aqui será a campeã da vez.
— Você não é mais criança, agora não preciso te deixar ganhar. —
Ele se escora na sua moto, do mesmo modelo da minha, porém na cor
verde. — Como você está?
— Estaria melhor se tivesse me deixado dar uma lição no Enzo —
confesso, ainda aborrecida pelo que aconteceu. — Mas vou me vingar hoje,
é melhor não ficar na minha frente, irmãozinho.
— Não vou sair de lá — retruca com um meio sorriso no rosto, o
olhar é um desafio.
— Está confiante hoje.
— Só sei que sou melhor que você.
“E mais arrogante” é o que quero falar, mas então tenho uma ideia
maravilhosa.
— Então vamos apostar? — provoco e sei que tenho sua atenção,
afinal minha competitividade vem de família.
— Faça sua jogada.
— Se eu atravessar a chegada em sua frente, vai dançar no meu show,
junto com os meus meninos. — Jogo minhas cartas e vejo seu sorriso
vacilar.
— Nem fodendo — responde espantado. — Escolhe qualquer outra
coisa.
— Por quê? Achei que você confiasse no teu taco, ou vai dar para trás
antes mesmo da corrida começar?
— Corta essa, diabinha, eu não vou dançar pelado na sua boate, pode
escolher qualquer outra coisa.
— Não, se não for isso não tem aposta nenhuma. — Bato o pé, não
darei o braço a torcer. — Francamente, achei que você fosse aceitar, afinal
chegou na minha frente na última corrida.
— E vou chegar nesta também, só não pretendo me rebaixar ao ponto
de aceitar um absurdo assim. — Matteo respira fundo, passa as mãos pelo
cabelo, deixo que se acalme e pense por um tempo, quando volta a me
olhar, vejo uma faísca em seus olhos. — E o que eu ganho em troca?
— O que você quiser, contanto que ganhe de mim hoje.
Ele pensa por um tempo, claramente nervoso pelo alto risco da
aposta, posso não ter tanta experiência na corria quanto ele ou Lorenzo, mas
sou mais jovem e muito mais leve, isso me dá um pouco de vantagem. Ele
sabe disso, mas provavelmente tem algo em mente para jogar na mesa.
— Se eu ganhar, vai deixar o Enzo de Biasi em paz.
— Já falei que não farei nada a ele.
— Ah, irmã, você me tem para trouxa mesmo. Acha que não sei que
mandou um dos seus seguranças segui-lo e coletar informações? — Ele
joga na minha cara e sorri ao perceber que me pegou. — Eu te conheço.
— Falei que eu não farei nada contra o desgraçado — respondo,
ácida. — Não é minha culpa se você não deixou claro que não poderia
mandar alguém fazer o trabalho por mim.
— Faltou clareza, então? — Matteo se aproxima e usa de sua altura
para demonstrar algum poder sobre mim, forçando-me a olhar para cima
quando fica a centímetros de distância. — Aqui vai: se eu chegar na sua
frente na corrida de hoje, você deixará o infeliz em paz, não fará ou
mandará alguém fazer qualquer coisa contra ele, vai cancelar essa busca por
vingança para sempre.
— Não posso aceitar, dei minha palavra a Tatiana que se ele for atrás
dela, o farei pagar — anuncio com firmeza. — Mas, se ele não for estúpido
de ir atrás dela, prometo cumprir a minha palavra e chamar meu cachorro
de volta.
— Ele sabe que se chegar perto da ex-namorada nem seu pai ou a
droga do presidente dos Estados Unidos poderá salvá-lo.
— Tudo bem, então. — Sorrio e confio em sua palavra, afinal, se
existe algo que os homens da minha família não admitem é qualquer tipo de
violência contra mulheres ou crianças. — E você, aceita seu lado na aposta?
— Uma música, dois minutos e meio, no canto e com as luzes baixas,
e eu escolho a roupa — estendemos as mãos em um aperto firme, quase
machucando —, mas tenho certeza de que não vou perder.
— Confiante, eu gosto de homens assim — instigo. — A vitória tem
um sabor diferente quando vem temperada com orgulho e ego masculino.
De domingo temos uma pequena tradição de tomar o café da manhã
com toda a família reunida, meus irmãos são velhos que acordam cedo,
assim como suas esposas, e claro, os pestinhas dos meus sobrinhos. De vez
em quando Gabriel e eu chegamos a essa hora em casa e tomamos o café
com eles antes de subirmos para dormir, o que importa é estar aqui com
todo mundo.
E é sempre uma algazarra.
Gustavo está em uma fase terrível, em que não para de falar sobre seu
treinamento que começou aos poucos. Lorenzo está explicando para o filho
mais velho coisas que ele pode saber, com dez anos o menino é bem
inteligente e já consegue absorver o significado do que nossa Família
realmente faz, mas meu irmão é cuidadoso e não quer traumatizá-lo.
— Tia Ali, você sabia que eu ganhei duas facas novas do meu pai? —
Gustavo conta animado, ele está sentado do outro lado da mesa, junto do
irmão mais novo e da sua mãe, que sorri feliz enquanto prepara o alimento
dos filhos. — Você quer ver? Eu vou lá pegar e...
— Agora é hora de comer, Gustavo, depois você pode mostrar suas
facas para a Alícia — Lorenzo repreende o filho.
— Mas pai, a tia gosta de facas, ela me disse isso uma vez, e as
minhas são únicas, você mesmo me falou que elas foram feitas só pra mim
— resmunga fazendo cara de coitado. — Por favor, papai — pede fazendo
birra e recebe um olhar de canto do meu irmão, olhar esse que conheço
muito bem.
— Gustavo, seu pai não vai falar de novo, agora é hora de comer e
depois vamos nos preparar para o evento — Andrea adverte o filho e coloca
um prato com panquecas e frutas em sua frente.
— Eu vou poder correr com os adultos esse ano? — Gustavo
questiona enquanto enche a boca com comida. — Já sou um homem, pai,
posso correr com você?
— Um homem, é? — Matteo implica com o menino. — Me mostra os
pelos no saco, então? — provoca e leva um tapa forte da sua esposa, que o
faz soltar uma risada alta e agarrar a mão pequena de Sophia antes que ela
bata novamente.
— Não dê ouvidos ao seu tio, ele bateu a cabeça quando criança e
agora não controla a língua — Lorenzo repreende, fazendo o papel de pai
de todos. — E já conversamos sobre isso, só poderá correr conosco quando
fizer dezoito anos.
— Mas a tia Ali disse que correu com você quando tinha dez anos,
não foi, tia? — pede pela minha ajuda, e eu faço que sim com a cabeça,
enfurecendo meu irmão. — Viu só? Por que ela pode e eu não?
— Ela não correu com a gente, ela invadiu a...
— Eu cheguei em primeiro lugar e fiz o seu pai ali tentar me parar por
uma volta toda, ele não conseguiu, e passei na bandeirada da vitória sozinha
— explico animada e meu sobrinho arregala os olhos, atento. ele ama ouvir
minhas histórias. — Foi o Gabriel quem deu a bandeirada, pode confirmar
com ele.
Aponto para Gabriel, que está do meu lado, mas ele não se atreve a
falar alguma coisa com o olhar recriminatório do meu irmão.
— Pare de dar ideias aos meus filhos, já criei uma criança rebelde e
não quero que os influencie de forma negativa — Lorenzo me repreende
com a voz baixa para que seus filhos não escutem. Como estou sentada do
seu lado, levo um beliscão na perna. — Vocês vão participar da primeira
volta de reconhecimento da pista, com toda a família, e depois irão correr
com as crianças da mesma idade que vocês.
— Eu não quero correr — Antônio resmunga com a voz tão baixa que
quase não escuto. — Posso só assistir hoje, mamãe?
— Seu pai comprou uma moto nova especialmente para hoje, não
quer testá-la? — Matteo questiona, tentando animar o menino.
— Não, quero terminar meu Lego — responde sem levantar a voz.
— Tudo bem, querido, não precisa correr, mas vamos assistir a nossa
família e torcer por eles, tudo bem? — Andrea faz carinho no menino, que
concorda e volta a focar em sua comida.
Lorenzo troca um olhar preocupado com a mulher, mas não interfere.
Antônio é muito mais ligado à mãe, um garoto pequeno, de olhos azuis e
que prefere brincar quieto. O completo oposto do irmão, que se deixar passa
o dia correndo de um lado para o outro.
Eles são diferentes, mas se completam, o que o mais velho tem de
energia para atividades ao ar livre, o mais novo tem em inteligência.
Antônio tem um Q.I. acima da média para a sua idade e no próximo ano
começará a estudar matérias mais avançadas que o irmão, mesmo sendo três
anos mais novo.
Quando assumirem, um será o cérebro e o outro os músculos, e estou
feliz por nossa família ter uma boa perspectiva para o futuro. Pelo menos a
próxima geração já está garantida e eu não preciso fazer mais nada, olho
para Matteo e Sophia e sei que pensam o mesmo.
Lorenzo e Andrea cumpriram com o dever de garantir a continuidade
dos de Angelis, o restante de nós pode viver sem essa responsabilidade.
— Senhorita de Angelis, sua equipe chegou — Maria, nossa
governanta, avisa.
— Alícia, eu falei que não queria convidados — Lorenzo adverte.
— Relaxa, irmão, vou gravar uma volta solo, você sabe que as
pessoas vão à loucura com uma mulher gostosa andando de moto. — Pisco
para ele, que não tira o olhar severo do rosto. — Eles vão embora antes da
corrida, não preciso de vocês aparecendo nas minhas redes, já basta o
Matteo, que vai dançar na minha festa.
— Você o quê? — Lorenzo questiona, surpreso.
— Uma pequena aposta, só entre nós dois. — Levanto e saio.
Encontro a equipe de filmagem reduzida, só o menino que controla o
drone, um câmera, a Liz e o Chace. Já que é ele quem vai editar, precisa
coordenar como quer as imagens, e percebi que ele ficou bem interessado
quando comentei sobre a corrida.
Deixo que Gabriel os leve até a pista, enquanto isso encontro minha
moto pronta no box, com a equipe de mecânicos, eles me repassam as
últimas atualizações e os dispenso. Pego o figurino que escolhi para este
momento, um corpete rosa com tiras pretas, a calça e a bota de couro pretas
com detalhes em rosa, e luvas.
Obviamente não será a mesma roupa com que irei correr depois, esta
é só para as gravações, já que não tem as proteções necessárias para
aguentar as altas temperaturas durante a corrida, ou me proteger, caso
aconteça algum acidente.
Deixo meu cabelo solto, fiz uma maquiagem pesada nos olhos e
abusei do batom preto, isso dará destaque para os primeiros takes, antes de
colocar o capacete.
— Nossa, você está… — Escuto uma voz masculina assim que subo
na moto e me preparo para ir até a pista, vejo Chace paralisado na saída do
box, o rosto vermelho por ter falado sem pensar me faz sorrir. — Desculpa,
Gabriel mandou avisar que está tudo pronto.
— Já estou saindo — respondo, mas decido provocá-lo. — Estou
gostosa, gatinho?
Chace arregala os olhos e fica ainda mais vermelho, mas não
responde, parece estar em um conflito interno entre falar o que pensa ou
segurar a língua.
— Pode falar, não tem ninguém aqui e eu amo um elogio, vai me
deixar confiante para vencer a corrida. — Pisco para ele.
— Você está linda.
— Linda — repito a palavra tão simples que parece delicada demais
para me descrever. — Vou aceitar esta, por enquanto, mas é melhor pensar
em outras mais fortes, não sou nenhuma mocinha linda e delicada.
— Não, não é — responde sem querer e desvia o olhar do meu, mas o
seu atrevimento me faz sorrir, finalmente uma reação genuína dele. —
Desculpa, não queria dizer isso.
— Queria sim, e não se desculpe. A não ser que me ofenda, eu gosto
de ouvir o que as pessoas realmente pensam e não o que acham que vou
gostar.
— Por quê?
— Não respeito falsidade — respondo sinceramente. — Uma verdade
ácida é muito melhor do que uma mentira doce.
— Mas pode machucar — murmura mais para si mesmo.
— Tem medo da dor?
— Você não?
— Não. — Sou sincera. — As melhores coisas que aconteceram na
minha vida vieram depois da dor. E por ter passado pelo pior, sei apreciar os
momentos felizes, por mais simples que sejam.
Vejo o drone sobrevoando a saída, então entrego o capacete para
Chace. Já que as primeiras imagens serão comigo em cima da moto, não
posso colocar sem estragar o penteado, ele irá me entregar na hora de sair
para a primeira volta.
— Gostou? — questiono ao perceber a forma que avalia minha moto.
— É incrível, nunca vi uma moto assim — responde como uma
criança no parque de diversões.
— Você sabe pilotar?
— Não, não. — Ele gesticula com as mãos e se afasta, como se fosse
uma ideia absurda. — Nunca nem subi em uma.
— Nunca andou de moto?
— Não temos isso de onde eu vim.
Penso por um momento e a ideia de colocá-lo na minha garupa surge
em minha mente, mas com a mesma rapidez que penso nisso, descarto. É
ridículo, somente Gabriel ou meus sobrinhos andam comigo.
— Pode pular a contenção da pista, é mais rápido — aconselho
apontando para o local onde irei esperá-lo. — Não vai me desejar boa
sorte? — provoco antes de ligar a moto.
— Você precisa?
— É sempre bom.
— Então boa sorte. — Ele sorri, sincero e inocente, e faz meu coração
acelerar e meu estômago ficar estranho.
Ligo a moto e saio logo dali, só tem uma pessoa capaz de me deixar
assim e não é esse garoto.
Se existe algo que me deixa animada é a adrenalina antes da corrida, a
forma com que o motor da minha moto explode embaixo de mim, o vento
que corta meu rosto. Não posso realmente acelerar até estar com o capacete
e as roupas apropriadas, mas é bom me sentir livre em cima de algo tão
potente e perigoso.
É como montar em Gabriel. Ter o controle de um homem daqueles
me fascina e faz com que me sinta incrível, forte, poderosa, assim como ele,
afinal somente uma mulher foda pra caralho tem um homem assim em suas
mãos.
Tenho completa certeza disso quando olho para minhas cunhadas.
Andrea teve um casamento arranjado, foi oferecida em um acordo por sua
família, mas não se engane, ela tem Lorenzo preso em suas mãos.
Não admito isso na frente dele, porque o maldito já é um homem com
um ego maior do que o normal, mas ele é forte e respeitado por um bom
motivo. Lorenzo é inteligente e sabe como controlar as pessoas, ele
consegue descobrir a maior fraqueza de seus inimigos e as usa a seu favor.
Para uma mulher ter o respeito de um homem assim, ela precisa ser
tão foda quanto ele, por isso gosto da minha cunhada, ela não abaixa a
cabeça para ninguém, nem para meu irmão. Eles se respeitam e disso
nasceu um amor baseado na admiração e aceitação.
Lorenzo não é cadelinho, mas ele mataria um exército para proteger
sua mulher e seus filhos.
Já Matteo está aos pés de Sophia desde sempre. A relação deles foi
construída de uma amizade de infância que se tornou uma linda história de
amor. Ela ri das piadas ridículas que meu irmão faz, e ele se derrete com
isso. Eles são aquele casal meloso que, mesmo separados, procuram um ao
outro na multidão.
Sophia é doce e alegre, sempre gostei da loira, fora que ela tem um
estilo delicado e adora tatuagens. Todas que tem no corpo fui eu que fiz, ela
e Gabriel são minhas cobaias, mas o que mais admiro nela é como cuida das
pessoas, por isso escolheu a medicina como profissão. Ela nasceu para isso.
Dirijo por um tempo até chegar à linha de saída, faço pose, sorrio e
faço caretas, tudo para o drone captar o máximo de imagens. Não temos
muito tempo, quando termino faço sinal para Chace me trazer o capacete,
ele corre até mim com um sorriso no rosto e novamente meu coração
acelera.
Não… deve ser a expectativa da corrida. É isso, estou nervosa por
causa da aposta com Matteo, e porque faz tempo que não corro assim.
Ao colocar o capacete, acelero o máximo que consigo e sinto o ronco
do motor limpar qualquer pensamento que não seja o agora, o asfalto em
minha frente, as curvas inclinadas e a velocidade.
CAPÍTULO 15

Chace
 
Ela é como um anjo rosa voando no asfalto, deixando-me hipnotizado
com a visão. Nunca vi algo tão lindo, é… intenso. Nem percebo que estou
parado no meio da pista até escutar um grito de aviso.
— Sai daí, menino — Liz me chama do acostamento onde ela e Jason
avaliam as imagens do drone. — Quer morrer atropelado? Essa coisa —
aponta para a moto de Alícia na tela do Ipad — é muito veloz, ela não
conseguiria parar ou desviar de você.
— Desculpa, só fiquei admirado.
— Limpa a baba, é hora de trabalhar — Jason repreende. — Ela dará
três voltas, as imagens estão ficando incríveis.
— Sim, é melhor que esse vídeo seja o melhor que já fez — Liz
pontua, animada. — Mali não aceita nada menos que excelência.
O dia está magnífico, o azul do céu contrasta lindamente com o verde
das árvores ao longe, o sol queima na pele e mesmo assim não consigo me
mover. Sinto meus pés plantados no lugar e o olhar firme nela.
Estamos em uma pequena estrutura, mais elevada, de onde temos a
visão de toda a pista. Ao longe vejo outra construção, como uma
arquibancada, mas fechada com vidro e coberta.
Faço uma varredura pelo local, atrás de nós há quatro homens
armados, não parecem seguranças, porque não estão vestidos com o
costumeiro terno formal. Devem ser os soldados da família de Angelis.
Também vejo Gabriel próximo da linha de chegada, a postura tesa e o olhar
atento na Mali.
Quando ela está quase terminando a terceira volta, ele pega uma
bandeira quadriculada — dessas usadas nas corridas oficiais — e balança
antes dela cruzar a linha de chegada e conseguir parar. Ele corre na pista e a
beija assim que ela tira o capacete.
Assisto a forma como os dois se olham e sorriem um para o outro,
eles parecem pertencer àquele abraço, como se nada mais no mundo
importasse.
Deve ser algo bom ter alguém assim na sua vida, uma pessoa que te
ama e compartilha momentos incríveis com você.
— Vamos, já temos tudo o que precisamos. — Liz me puxa pelo
braço. — E para de olhar. Sério, você não tem amor à vida, não?
— Senhor King, a senhorita de Angelis pediu que esperasse. — Um
soldado me para quando tento passar por ele, e Liz olha desconfiada por
cima do ombro. — O restante pode ir.
— Vou descarregar as imagens no estúdio — Jason avisa antes de
sair.
Espero de pé junto com o soldado, penso em perguntar se ele sabe o
que ela quer comigo, mas descarto a ideia só de olhar para a expressão
fechada do homem, ele me dá medo.
Alguns minutos depois Gabriel aparece e faz sinal para que eu o siga.
Sem falar nada, o acompanho até o box onde Alícia está esperando,
escorada em sua moto, com a cabeça inclinada para o lado e um sorriso
estranho no rosto.
Daria tudo para saber o que se passa na cabeça dela.
— Gostou de me ver correr, gatinho? — pergunta de modo travesso.
Gabriel dá a volta na moto e fica atrás dela, os ombros tensos, mas o olhar
focado em mim.
— Foi legal — confesso, sentindo-me uma criança que não consegue
tirar o sorriso do rosto.
— Se gostou dessas voltinhas, vai amar a corrida. Gabriel sugeriu que
ficasse para assistir, você quer?
— Eu deveria voltar para o estúdio e editar os vídeos — murmuro
uma desculpa, mesmo que o que eu mais queira agora é vê-la correr
novamente. Será que ele também vai participar? Só o pensamento de
Gabriel em cima de uma moto dessas já me deixa mais animado do que
deveria.
— Ela não perguntou o que deveria fazer e sim o que você quer fazer
— Gabriel repreende com a voz firme e os olhos cravados em mim, como
se estivesse contando as gotas de suor que escorrem pelo meu rosto devido
ao nervosismo.
Respiro fundo e minha primeira reação é sair correndo, mas me
controlo. Aperto a barra da camiseta para me acalmar antes de voltar a
encarar o casal e responder com a maior confiança que consigo reunir no
momento:
— Quero assistir à corrida — confesso. Minha voz treme e sinto o
rosto esquentar.
— Perfeito. Ryan vai te levar até o observatório e depois da minha
vitória, te deixo dar uma voltinha com a minha moto. — Alícia comemora
dando pulinhos e pega na mão de Gabriel, arrastando-o para uma porta aos
fundos do box. — Ah, acho melhor te instruir a não falar com ninguém,
muito menos com as mulheres. Homens da máfia tendem a ser bem
ciumentos.
— Ryan, acompanhe o garoto e não o deixe sozinho — Gabriel
ordena ao soldado ao meu lado, que só confirma com a cabeça e me olha de
canto.
Sou escoltado até o outro lado da pista, Ryan anda atrás de mim, sem
falar nada. No caminho reparo em alguns carros de luxo estacionados
próximo à estrutura que presumo ser o local de onde vamos assistir à
corrida.
Subimos três lances de escada até chegar em uma porta corta-fogo,
mas antes que eu consiga empurrar, sinto uma mão apertar meu ombro e
Ryan me segura.
— Não fale com ninguém, não olhe para as mulheres ou interaja de
qualquer forma. Não beba nem aceite comida — avisa, sério. Posso até
jurar que está com medo, pela forma com que olha para os lados e abaixa a
voz. — A não ser que te perguntem algo, não abra a boca, e lembre-se, este
não é seu lugar. — Ele me solta. — Nem eu deveria estar aqui, droga —
confessa mais para si mesmo antes de abrir a porta.
O local mais parece uma sala luxuosa de algum hotel. Do lado
esquerdo vejo um bar com tudo o que você pode querer em questão de
bebidas, logo ao lado uma mesa com o que imagino ser comida, mas não
identifico de que tipo. Só quando Ryan coloca a mão no meu ombro que
percebo estar parado na entrada.
— Soldado, o que está fazendo aqui? — um homem mais velho,
cabelo e barba branca, vestido em um terno azul marinho completo e com
uma mulher que mais parece uma modelo muito jovem ao seu lado é quem
questiona, o olhar afiado e a voz estridente me fazem tremer.
— Senhor Esposito — Ryan abaixa a cabeça ao falar. — Este é Chace
King, convidado da senhorita de Angelis.
— Não sabia que teríamos convidados. — O homem me olha da
cabeça aos pés, claramente avaliando minhas roupas e tenho a certeza de
que não deveria estar aqui. — Meu sobrinho sabe sobre isso?
— Sim, senhor.
— Tudo bem, então. O bar está aberto, sinta-se… à vontade — fala
como uma provocação e ergue o copo, a mulher ao seu lado solta uma
risada falsa.
Ryan me leva para o canto mais distante do lugar e tento não olhar
para as outras pessoas, mas me sinto mal, deslocado. Não olho diretamente
para ninguém, há umas dez pessoas aqui, dentre elas somente dois homens,
as outras são mulheres, e acho que vi uma criança, também.
— Não se importe com tio George — uma voz feminina chama
minha atenção e sou surpreendido por uma mulher loira de olhos muito
azuis e um vestido rosa-claro que abraça suas curvas, ela é linda. —
Menino, você realmente não pertence a esse lugar — comenta brincalhona,
mas não vejo julgamento em sua voz.
— Chace, esta é Sophia de Angelis, esposa de Matteo, irmão da
senhorita de Angelis — Ryan nos apresenta formalmente e a mulher estende
a mão.
— Só Sophia. É um prazer, Chace. Alícia nunca convida ninguém e
nem preciso falar nada sobre Gabriel — ela diz animada e aperto sua mão,
mas meu olhar desce para o colar brilhante em seu pescoço, que deve custar
uma fortuna. — É melhor manter os olhos aqui em cima ou na pista. —
Sophia pisca com a brincadeira.
— Desculpe. — Sinto meu rosto ficar vermelho e desvio o olhar.
— Tudo bem. Matteo não está aqui, você está a salvo e Ryan não vai
falar nada, não é mesmo, querido? — A última palavra mais pareceu uma
ameaça velada do que um carinho, e vejo o soldado confirmar. — Quer
beber alguma coisa?
— Estou bem, obrigado.
— Já assistiu a alguma corrida? — Sophia questiona.
— Só na TV, meu tio gostava de ver o Moto GP.
— Bem, é quase isso, mas particular e, pelo que Matteo tentou me
explicar, essas motos deles não são as mesmas usadas nos campeonatos
oficiais. — Ela aponta para a pista, onde vejo os competidores entrarem. —
A verde é do meu marido, a vermelha é de Bryan Esposito, filho do tio
George, que você já conheceu.
Como se soubesse que estávamos falando do seu filho, o velho ergue
o copo e sorri.
— A roxa é do Dylan Cavalaro, a amarela do Colin Gallo, Don
Lorenzo pilota a preta, a rosa você já deve imaginar que é da Alícia e a azul
pertence a Gabriel. — Ela apresenta cada uma das motos. — As pequenas
são das crianças, elas vão correr algumas voltas antes da competição
principal.
— Vocês deixam crianças pilotar assim?
— É uma tradição da família de Angelis, todos ali aprenderam a
correr desde que se conhecem por gente. As motos são feitas especialmente
para eles e não pegam tanta velocidade quanto a dos adultos — explica.
— Elas são rápidas sim, tia Sophi. — Uma voz fraca e fina me faz
olhar para baixo e encontro uma criança, mais especificamente um menino
de olhos azuis muito grandes e brilhantes, que estende a mão pequena em
minha direção. — Sou Antônio, quem é você?
Olho em volta e vejo Ryan e Sophia sorrirem, a forma direta com que
o garoto falou comigo parece mais como a de um adulto em miniatura.
— Sou Chace King.
— Antônio, falei para ficar aqui — uma mulher caminha rápido até
nós. Ela é mais alta que Sophia, morena, e está com um vestido azul, mas
não me atrevo a olhar muito.
— Esta é Andrea de Angelis, esposa de Don Lorenzo — Sophia
apresenta e a mulher me olha curiosa, mas não vejo julgamento em sua
expressão. — Convidado da Alícia e do Gabriel.
— Essa é nova — comenta e sorri. — A corrida vai começar, vamos
nos sentar, querido?
— Quero ficar com a tia Sophi — o menino responde, o olhar na
pista.
— Tudo bem, se comporte.
— Não vou falar nada que não devo — ele concorda, calmo, e Sophia
solta uma gargalhada. — Está tudo bem, tia Sophi?
— Sim, querido, vamos assistir à corrida e torcer para a tia Alícia.
— Você deveria torcer para o tio Matteo, ele vai ficar triste se
ninguém torcer por ele.
— Deveria, mas hoje eu quero que sua tia ganhe — Sophia responde
animada.
Eles dão uma volta completa na pista, devagar e com todos os
competidores juntos, como uma apresentação para a torcida, então as motos
maiores se retiram e os pequenos são colocados na posição de saída. O
grupo de 11 crianças é dividido em 3, provavelmente por idade.
Os menores vão primeiro e vejo algumas mulheres olharem para a
pista preocupadas, provavelmente são as mães. Uma ambulância com
equipe médica está parada na lateral e começo a reparar que tem mais
pessoas ao redor da pista.
— Não queria estar lá com eles? — Sophia pergunta para Antônio,
mas o menino nega com a cabeça.
— Prefiro assistir daqui — responde confiante.
— Você gosta de ouvir a conversa dos adultos — ela provoca.
— Eu gosto — ele assente e sorri pela primeira vez.
As crianças correm cinco voltas e na chegada são recebidas com
bandeiradas e comemoração dos adultos, todos seguem o mesmo padrão e
todos eles ganham medalhas. A última é dos mais velhos e vejo Antônio
ficar mais próximo do vidro, atento ao que está acontecendo.
— Meu irmão vai ganhar — aponta para a moto que agora abre
vantagem do segundo lugar. — Ele é o melhor, olha, Chace.
Vejo o final da corrida e Antônio pula de felicidade. Todos aplaudem,
mesmo que os competidores não consigam ouvir, e isso só anima ainda
mais o garoto, que comemora, orgulhoso do irmão.
— Ele ganhou, tia Sophi, ele ganhou — o menino festeja e Sophia o
pega no colo, pulando com ele. — Meu irmão é incrível.
— É sim, assim como você — Sophia responde e por um momento
vejo o olhar dele mudar, a expressão fica triste — Agora vamos assistir os
adultos.
Depois que as crianças comemoram e são levadas para fora da pista,
as motos maiores entram em uma volta de reconhecimento, depois ficam
em fila dupla para a largada, a moto preta do Don e a azul de Gabriel estão
na frente, seguidas por Alícia e Matteo, depois a vermelha e a roxa e por
último a amarela, e já não lembro o nome de todos eles.
— A ordem da largada é por classificação nas outras corridas, Don
Lorenzo chegou em primeiro, seguido por Gabriel, Matteo e Alícia —
Sophia explica.
— A tia ficou muito braba aquele dia — Antônio comenta um pouco
assustado.
— Ela não gosta de perder — Sophia afirma e o menino concorda —,
mas hoje está mais motivada.
— Só porque o tio Matteo vai ter que dançar no show dela? — o
menino pergunta, inocente, e Ryan arregala os olhos com a surpresa, assim
como eu.
— Sim, querido, só por isso. — Sophia segura o riso e aperta mais o
sobrinho, antes de colocá-lo no chão. — Hoje serão 36 voltas, é tradição da
Família que a corrida seja o número de voltas da idade do vencedor da
última etapa.
Então o Don tem 36 anos. Fico curioso para saber quais as idades de
Gabriel e Alícia, ele parece ser bem mais velho que ela, mas talvez seja só
impressão minha. Um homem entra na pista segurando uma placa preta,
avisando que falta um minuto e cada um dos competidores liga sua moto,
eles se preparam para iniciar e parecem se fundir com as máquinas.
As roupas são completamente fechadas e da mesma cor da moto,
assim como os capacetes. Quando se abaixam e a adrenalina aumenta, sinto
meu coração acelerar em antecipação, espero que ninguém se machuque, já
vi acidentes graves nas corridas que assisti com meu tio, e também sei que
uma moto não protege o piloto.
Então o homem da placa se afasta, pega uma bandeira verde e anuncia
a largada. O Don e Gabriel saem primeiro, seguidos de perto pelos outros
competidores, logo Gabriel abre uma pequena vantagem antes da primeira
curva, onde o Don o ultrapassa e segue em primeiro. Matteo e Alícia se
aproximam mais de Gabriel e brigam pela terceira colocação.
A cada curva meu coração aperta ao vê-los se abaixar, algumas vezes
vejo um joelho chegar a encostar no asfalto e prendo a respiração, torcendo
para que não aconteça nenhum acidente. É perceptível que a família de
Angelis lidera a corrida, o Don continua em primeiro, Gabriel, Alícia e
Matteo se revezam no segundo, terceiro e quarto lugar.
É emocionante, a cada volta um deles parece que vai abrir vantagem,
mas logo os outros se aproximam e a disputa fica apertada. Estou vidrado
no asfalto, tão concentrado em tudo o que acontece lá embaixo que não
escuto nada ao meu redor, nem percebo estar muito próximo do vidro até
sentir uma mão pequena na minha perna.
— É legal, né? — Antonio pergunta, os olhinhos brilhando. — Meu
papai é o melhor, mas o tio e a tia também são bons, olha lá. — Ele aponta
para a moto rosa de Alícia, que ultrapassa a azul de Gabriel em uma curva
arriscada, logo depois ela acelera ainda mais e praticamente encosta na
moto do Don. — Ela vai tentar passar o papai por dentro, mas ele não vai
deixar.
Como se tivesse previsto o futuro, o garoto acerta a estratégia e sorri
com isso, acompanho mais atentamente e deixo que Antônio narre a
corrida, nas últimas voltas ele bate palmas, animado.
— Está acabando, mas acho que a tia vai ganhar, olha lá, a moto do
papai tá estranha.
Vejo uma fumaça anormal sair da moto preta do Don e, quando fica
mais forte, ele começa a desacelerar e para no acostamento, desistindo da
corrida. Com isso Alícia está em primeiro, seguida de perto por Matteo e
Gabriel, um pouco mais atrás.
O placar de contagem regressiva que está perto da linha de chegada
avisa que faltam três voltas. Alícia inicia a penúltima em primeiro, mas ao
entrar na curva fechada muito rápido, ela quase perde o controle e a moto
balança na pista, levo a mão ao coração e paro de respirar, os segundos
parecem horas até que ela estabiliza novamente e não cai.
Só então exalo o ar, mas não controlo a preocupação. Matteo
aproveitou o deslize dela para pegar o primeiro lugar e Gabriel o seguiu, em
segundo, deixando Alícia em terceiro na última volta, mas ela não desiste.
Na primeira curva ultrapassa Gabriel, quase deitando na pista e, sem
perder tempo, alcança Matteo. Ambos ficam lado a lado, é impossível dizer
quem está na frente de onde estou, na reta final eles aceleram o máximo que
suas motos suportam e passam juntos na linha de chegada.
— Quem ganhou? Foi empate? — questiono com curiosidade.
— Vamos ver nas câmeras, porque dessa vez foi acirrado. — Sophia
aponta para a TV enorme do outro lado da sala, todos estão de olho na tela,
esperando o resultado oficial.
As imagens da linha de chegada começam a passar, cada vez mais
lentamente e mais próximo, até que na última consigo ver claramente que a
moto rosa de Alícia passou alguns centímetros na frente da verde, de
Matteo.
— Ela ganhou, tia Ali ganhou! — Antônio comemora batendo palmas
e as pessoas na sala não parecem surpresas.
George tira um maço de notas do bolso do casaco e entrega para o
outro homem, que junta com mais dinheiro e traz para Sophia.
— Sempre bom apostar em uma mulher — Sophia brinca, feliz, e
solta uma gargalhada — Essa festa vai ser melhor do que meu casamento.
— Posso ver o tio dançar também? — Antônio pergunta. — O papai
nunca me deixa ir junto no show da tia Ali.
— Só quando você for maior de idade — sua mãe responde, se
aproximando de nós. — O que achou da corrida?
— Foi… emocionante — É a única palavra em que consigo pensar
para definir o que aconteceu.
— Ela vai estar insuportável agora — Andrea fala para Sophia, que
concorda com a cabeça, mas não tira o sorriso do rosto. — Você não
consegue nem disfarçar que estava torcendo por ela, Matteo vai ficar
magoado.
— Ninguém mandou ele aceitar a aposta.
— Sabe que aqueles dois não recusam nada quando o assunto é
Alícia.
— Sim, mas mesmo assim foi ele quem aceitou, e agora vou fazer
com que cumpra a sua palavra — Sophia responde animada e acena para o
marido.
— É melhor irmos — Ryan me chama e concordo.
— Foi um prazer conhecê-lo, Chace — Sophia aperta minha mão.
— O prazer foi meu, obrigado pela companhia — agradeço
sinceramente.
— Ele é legal. — Escuto a voz baixa de Antônio comentar quando
sigo Ryan para a saída.
Ele me leva de volta para o box e escutamos de longe as
comemorações dos pilotos, a voz distinta de Alícia é a mais alta e
debochada de todas.
— Eu falei que ia ganhar, irmão — Alícia grita, quando nos
aproximamos e vejo que ela está com um champanhe em uma das mãos e
faz dancinhas próxima de Matteo. A expressão no rosto do homem é
mortal. — Gatinhoooooooooo, gostou da corrida?
Todos os olhares se voltam para mim e sinto meu rosto esquentar, por
que ela tinha que me ver? Será que ainda consigo me esconder? Não tenho
tempo para pensar sobre isso quando ela faz sinal para me aproximar.
Os outros homens me avaliam dos pés à cabeça, a postura de
comemoração muda rapidamente conforme me aproximo e tenho a certeza
de não ser bem-vindo aqui.
— Você me deu sorte, gatinho — Alícia parece não se importar com
as outras pessoas e logo Gabriel está ao seu lado, com uma taça na mão e
um champanhe na outra. Relutantemente ele me entrega a taça e chacoalha
a garrafa, Alícia faz o mesmo, até que os dois estouram e fazem uma guerra
com a bebida.
Tento me afastar, mas sou lento e Alícia mira a sua garrafa em mim,
molhando-me enquanto solta gargalhadas doces e felizes. Tenho um
vislumbre de Gabriel, que parece rir da situação, e é tão bonito que sinto
meu coração acelerar novamente e sorrio em resposta.
— Aqui. — Ele aponta a garrafa para mim e enche minha taça. —
Um brinde a Alícia, a VENCEDORA da corrida — Gabriel anuncia e ergue
sua garrafa, olhando diretamente para Matteo em uma provocação explícita.
— Merda. — Matteo joga o capacete para longe e recusa a garrafa
que um garçom lhe entrega. — Ela trapaceou, tenho certeza disso.
— Não seja um mal perdedor, irmão, dessa vez Alícia ganhou de
forma limpa — Don Lorenzo aparece do meu lado, todo de preto. Ele é
mais alto que eu e sua voz fez os pelos da minha nuca arrepiarem, preciso
me controlar para não me dobrar de medo. — Quem é este aqui? —
questiona ao me avaliar de cima a baixo.
— Nosso convidado especial — Alícia responde vindo até mim. — E
meu mais novo amuleto da sorte. — Ela pega minha mão e me leva até a
sua moto, sem se importar com o olhar duro do irmão.
— Você sabe que precisa avisar quando tivermos visitas,
especialmente nas corridas — Don Lorenzo repreende.
— Não deu tempo, desculpa, irmãozinho — ela retruca e faz
beicinho, provocando o Don como se ele não fosse o cara mais poderoso de
Boston. — Vem, Chace, eu prometi que te deixaria dar uma volta na minha
moto.
CAPÍTULO 16

Gabriel
 
Alícia está olhando estranho para o garoto enquanto o leva até a pista,
eu os acompanho, já que ela não conseguirá segurá-lo na moto até que ele
tenha estabilidade para não cair. E como são edições especiais, essas
máquinas são muito pesadas.
Definitivamente não é a mesma coisa, pilotar uma moto de corrida e
um modelo normal, espero que ele não dê uma de louco e decida acelerar
demais, porém Chace não me parece alguém aventureiro assim. Ele é bem
tímido e medroso, se bem que tem seus momentos de coragem, só espero
que esse não seja um deles.
— Apenas se equilibra e não acelera muito, vamos só dar uma
voltinha, nada muito emocionante — Alícia explica e aponta para a moto.
— Não precisa, fiquei feliz só em assistir, não preciso andar em uma
dessas, não — o garoto tenta recusar, mas eu sei que quando Alícia coloca
algo na cabeça nada a faz mudar de ideia, e pela expressão no rosto da
diabinha, ele vai andar na moto, nem que ela precise apontar uma arma para
a cabeça dele.
— Vai ser legal, gatinho, olha — ela sobe na moto e mostra todos os
controles, explica como ligar, onde está o acelerador e o freio. — Não
precisa trocar de marcha e nem acelerar muito, só andar, você não vai
conseguir se equilibrar bem indo devagar, mas o Gabriel vai te segurar,
qualquer coisa coloca o pé no chão e pula de cima.
— Não quero estragar a sua moto — ele confessa, preocupado.
— Relaxa, eu já cai várias vezes, ela é feita para isso — ela tenta
animá-lo.
Alícia desce da moto e ajuda Chace a subir, eu fico mais longe,
segurando na parte de trás para que ele não caia. O garoto fica ainda mais
assustado quando coloca as mãos no guidão curto e respira fundo.
— Relaxa, vou te ajudar, olha. — Alícia cobre a mão dele com a dela
e mostra como acelerar e como frear. — Vou ligar agora, não precisa fazer
nada, pode erguer os pés, o Gabriel te segura.
É o que ela faz e o ronco da moto o assusta, preciso fazer força para
manter a estabilidade e Alícia me ajuda pela frente, como se levássemos
uma criança para uma voltinha. Ela acelera um pouco a moto,
minimamente, só para fazê-la começar a andar e caminhamos com ele.
Chace está tenso e não se mexe, não consigo ver seu rosto de onde
estou, mas as mãos seguram firme no guidão. Do seu lado Alícia sorri, feliz,
ela conseguiu o que queria, afinal.
— Não solta — Chace pede, com medo. — Por favor, Ali, não solta.
Ele a chamou de Ali, mesmo sem perceber. Preparo-me para um
desastre, mas ela não reage, só continua sorrindo e conduzindo a moto. Seu
olhar encontra o meu e sei que ela ouviu, que percebeu a forma com que ele
a chamou, mas talvez tenha decidido deixar passar. O garoto está com
medo, não está pensando direito.
— Não vou — ela responde e acelera um pouco mais. — Agora é a
sua vez, gatinho.
Chace assume o controle e Alícia só mantém a moto estável, com a
velocidade fica mais fácil de controlar e não preciso segurar com tanta
força, ele começa a relaxar assim que a moto estabiliza e preciso correr para
acompanhá-lo.
Alícia solta a moto e Chace continua, quase sozinho. Escuto seu riso
mais alto e sinto algo no meu peito, uma sensação boa que somente uma
pessoa consegue provocar. Que porra é essa que está acontecendo comigo?
— Quando chegar naquela linha aperta o freio com calma, para de
acelerar e coloca o pé no chão para parar — instruo mais alto e ele confirma
com a cabeça, então largo a moto e deixo que vá sozinho. Alícia corre do
meu lado, acompanhando o garoto andar pela primeira vez.
E ela está leve e feliz, espelhando a mesma sensação que sinto e uma
breve troca de olhares entre nós confirma que ela também está confusa com
isso. Caralho, ele é só um garoto que não faz parte da nossa vida.
Chace para a moto antes de chegar na linha e coloca os pés no chão,
mas não desliga, ele fica lá, na mesma posição, até erguer o rosto e olhar
para o céu, como se esperasse um sinal divino de que foi real. O sol ilumina
seus cabelos escuros, a pele clara e a camiseta branca lhe dão um ar de
pureza.
— Foi incrível — ele fala admirado quando nos aproximamos e
Alícia desliga a moto. — Só posso imaginar como é quando vocês andam.
— É bem assim, só que com mais adrenalina — Ali responde
animada. — Você está bem?
— Sim, acho que nunca senti essa… liberdade, não sei explicar —
confessa e então seu olhar encontra o meu, os grandes orbes castanhos
brilham de felicidade, seu sorriso leve me faz relaxar por um segundo.
— Vamos voltar caminhando. — Depois de um tempo encontro as
palavras e Alícia o ajuda a descer da moto.
— Vou levar a moto de volta, nos encontramos no box — Ela pisca
para mim e acelera. Sei quais são os planos de Alícia, ela está interessada
nele e vai convidá-lo para participar da nossa comemoração, mas será que
ele vai aceitar? Depois de presenciar o que fizemos com Kevin, Chace
pareceu estar com muito medo, mas não deixei de perceber que o garoto
estava duro pra caralho quando nos assistiu.
Ele ainda é uma incógnita para mim, as vezes é tímido e acuado,
outras tem surtos de coragem e fala mais do que deveria. Não consigo
entender o que ele quer, mas tenho certeza de que está atraído por nós, ou
talvez seja pelo perigo que simbolizamos. Muitas pessoas aceitam participar
das nossas orgias e ménages por causa disso.
— Por que ela não faz a volta? — Chace questiona confuso enquanto
anda do meu lado e assiste Alícia completar a volta na pista. Ele está
próximo demais e todo o meu corpo está ciente disso, sua mão descansa a
uma distância menor do que habitualmente estou acostumado, mas por
algum motivo não me afasto.
— É mais fácil completar a volta, o guidão não gira muito e acaba
demorando para fazer a curva — explico e me controlo para não olhar para
ele, mesmo sentindo que seus olhos estão em mim, atentos.
— E como vocês fazem as curvas mais fechadas?
— Inclinando o corpo, por isso usamos estas roupas e as joelheiras,
muitas vezes é preciso praticamente deitar no asfalto e encostar o joelho no
chão para manter a estabilidade.
— Caralho, é muita coragem — expressa, admirado.
— É treino e velocidade. — Dou de ombros. — Dirijo desde os cinco
anos.
— Quantos anos você tem? — A pergunta rápida e tão pessoal me faz
olhar para ele, e sou agraciado com a sua carinha vermelha de vergonha —
Desculpa, não pensei antes de falar.
— Tudo bem, tenho 39 anos — respondo calmamente e ele arregala
os olhos, eu sei o que ele quer perguntar, consigo ler a dúvida em seu rosto,
mas tenho certeza de que não terá coragem. — Alícia tem 24.
— Eu não… não quis me intrometer — sussurra com a voz trêmula.
— Acha que é o primeiro a ficar curioso? — solto uma gargalhada.
Ele não responde, mas tenho certeza de que se tivesse coragem faria
milhares de perguntas. Caminhamos em silêncio até chegar no box, Alícia
já está lá com os mecânicos, o restante dos convidados já foi para o almoço.
Ela entrega a moto e olha para nós.
— Então, o que vocês acham de comemorar o meu primeiro lugar? —
ela provoca com um sorriso safado no rosto. Confirmo com a cabeça e vou
até ela, seguro sua cintura com as duas mãos e tomo sua boca em um beijo
apaixonado.
— Parabéns — sussurro contra seus lábios, ela sorri e mordo seu
lábio inferior quando ela ergue as mãos e me segura pelo pescoço,
aumentando a intensidade do beijo, sua língua encontra a minha e eu a
devoro, chupando e sentindo o gosto delicioso dela. — O que você quer de
presente?
— Você — responde baixinho e se afasta o suficiente para olhar para
Chace. — E você. — Ela aponta para ele, que parece ainda mais assustado
do que quando subiu na moto.
— Eu… o que… eu não — ele gagueja, erguendo as mãos, olha para
os lados, como se para confirmar que ela está realmente falando com ele.
— Você gostou de assistir — Alícia provoca e se coloca em minha
frente, sua mão pequena segura a minha quando a abraço por trás e beijo a
curva do seu pescoço. — O que acha de participar?
Olho para Chace, ele está paralisado, mas seu olhar não sai de nós,
por isso decido ajudar minha diabinha na missão de convencê-lo e abro o
zíper do macacão de Alícia, calmamente, expondo primeiro seu torso. Vou
descendo e abrindo mais, sabendo que ela não usa nada por baixo.
— Do que você gosta, gatinho? — Alícia provoca e abaixa o macacão
até a cintura, seus peitos firmes e adornados com as joias de metal já estão
eriçados de tesão, apontando deliciosos para ele, subo minha mão até senti-
los, aperto e provoco os mamilos macios — Você quer me tocar assim
também?
— Eu… — ele morde o lábio para não responder, controlando as
palavras, mas vejo o volume em sua calça e sei que está excitado. Chace
percebe para onde estou olhando e tenta esconder sua ereção com a mão.
— Ou prefere sentir as mãos dele em você? — É um teste, ela quer
saber sobre suas preferências. Eu também quero, ele a olha com desejo, mas
também faz o mesmo comigo. — Responde, gatinho, tenho certeza de que
Kevin te explicou algumas coisas sobre nós.
Ele leva um tempo para se recuperar, seu olhar ainda acompanha
minha mão, admirado e fascinado com a visão de Alícia parcialmente nua
em sua frente. Será que ele vai ter coragem para admitir o que quer ou vai
se acovardar?
— Os dois — confessa em um sussurro, seu rosto fica ainda mais
vermelho e suas mãos apertam a barra da camiseta branca em frente ao
corpo, como se quisesse se esconder de nós.
— Gatinho, olha para nós — Ali exige sua atenção quando ele desvia
o olhar. — Não tem nada de errado nisso e não precisa ter vergonha do que
gosta, me fala, você já teve relações com um homem e uma mulher ao
mesmo tempo?
Ele pensa por um tempo antes de negar com a cabeça.
— E só com um homem? — ela questiona e abaixa o restante do
macacão, mostrando a calcinha rosa e minúscula que está usando por baixo.
Chace passa a língua pelos lábios entreabertos, vejo seu peito subir e descer
mais rápido enquanto ele encara o corpo de Alícia.
Desejo e tesão, é isso que ele está sentindo, mas alguma coisa o
impede de se soltar, de aceitar, e me pergunto se ainda não assumiu sua
sexualidade ou se está confuso, afinal ele é jovem.
Então ele nega com a cabeça e fico decepcionado, agora tenho quase
certeza que não vai aceitar a proposta dela. Porra, eu estava ficando
animado.
— E com uma mulher? — Alícia pergunta, mais séria e impositiva e,
só agora, percebo o que ela está realmente querendo saber e, caralho, faz
todo sentido — Você é virgem, gatinho?
É tão óbvio, por que não pensei nisso antes? Chace é virgem, por isso
é tão retraído assim e todo envergonhado, pensei que talvez tivesse algum
trauma ou só não estivesse acostumado com demonstrações públicas. Até
cogitei que fosse religioso, mas virgem? Não, isso nunca passou pela minha
cabeça.
Chace absorve as palavras e dá um passo para trás, assustado, os
olhos abertos e brilhantes de antes, agora estão vermelhos. Merda, ele vai
chorar. Alícia também percebe e relaxa em meus braços, a provocação
acabou.
— Eu… eu não sou… — ele não consegue nem terminar a frase, o
garoto é um péssimo mentiroso.
— Tudo bem, gatinho, não tem nada de errado nisso. — Ela levanta o
macacão e volta a se cobrir, encerrando o que poderia ter sido uma boa
foda.
— Mas eu quero — Chace confessa em uma explosão de coragem.
Alícia deixa meus braços e se aproxima dele, ela passa uma mão pelo
rosto de Chace em uma carícia delicada, então fica na ponta dos pés e beija
o rosto do garoto.
— Você merece mais, gatinho. Encontre alguém legal, que te faça se
sentir bem, seguro e confiante — ela aconselha gentilmente. — Nós não
somos a melhor opção para uma primeira vez.
Com isso Alícia se afasta e vai em direção ao vestiário enquanto
Chace assiste, como se não acreditasse no que acabou de acontecer.
— Ryan vai te levar para casa — aviso. — Leve o que precisar do
estúdio para finalizar os vídeos. — Indico a saída, ele demora um tempo
para se mover, então respira fundo e, de ombros caídos e olhar triste, se
afasta.
Espero um tempo até encontrar Alícia no vestiário, escuto o barulho
da água do chuveiro e o ambiente começa a ficar ofuscado pelo vapor. Um
banho quente e a diabinha em meus braços, é isso que preciso. Tiro minhas
roupas e fico atrás dela, que não se assusta com minha presença e continua
massageando os cabelos cobertos de espuma.
— Terá que se contentar em comemorar só comigo. — Passo a mão
por suas costas nuas, a água escorre com o shampoo de seus cabelos e
perfuma o ambiente. — Decepcionada?
— Um pouco — responde sincera. — Mas você também está —
complementa virando-se de frente para mim, o meio sorriso em seu rosto
me faz relaxar. — Imaginou algo assim?
— Não, achei que só estivesse confuso — respondo e entro na água
quente, sentindo o alívio assim que meu corpo começa a relaxar. — É
normal, na idade dele.
— Confusão sim, mas virgem não. — Alícia pega o sabonete e
começa a passar pelo meu corpo, lavando-me carinhosamente, seu olhar
amoroso recai sobre cada cicatriz em minha pele, marcas do passado que só
ela consegue tocar. — Só que, se for pensar bem, faz sentido.
— Como assim?
— Nos relatórios consta que ele foi educado em casa, abandonado
pelo pai aos seis anos, com a mãe doente e cuidado pela tia, cresceu
assumindo responsabilidades muito jovem — discorre sobre alguns pontos,
como se o tivesse estudado por um tempo. — Fora que ele tem um
comportamento recluso, demora para socializar e se enturmar, não
encontramos amigos nas nossas buscas, e nem o colega de trabalho com
quem o detetive conversou tinha muito o que falar sobre ele. Chace não
parece ter ninguém além da mãe e da tia.
— Mesmo assim, ele não é alguém que passe despercebido —
comento e ela sorri.
— Pode falar que ele é gostoso, Bunny — avisa e suas pequenas mãos
descem pelo meu peito, até chegar no meu pau. — Eu senti o quanto você
estava duro só de olhar para o garoto nos observando. — Seus dedos
envolvem meu membro e não controlo um gemido quando ela o aperta. —
Você o quer.
A diabinha está me provocando, só que, se eu estava com tesão no
garoto, Alícia também estava. Eu a conheço muito bem e é exatamente por
isso que nosso relacionamento funciona, não escondemos que sentimos
atração por outras pessoas.
— Quero — confesso e a empurro contra a parede, cobrindo seu
corpo pequeno com o meu, me firmo com uma mão ao lado do seu rosto e a
outra levo para o meio das suas pernas. — Eu o quero tanto quanto você, ou
acha que não senti o quanto estava molhada por ele? — Abro seus lábios e
deslizo dois dedos dentro dela sem encontrar resistência, abro suas pernas
com a minha e a provoco ainda mais, entrando e saindo da sua boceta. Roço
o clitóris inchado e sou agraciado com um gemido alto.
— Você me conhece tão bem, amor — confessa com um murmúrio,
toda entregue ao prazer.
— Fecha os olhos — ordeno e ela faz. — Imagina que ele está aqui,
ao nosso lado, os olhos castanhos nos observando, com tesão por nós.
Lembra da forma com que ele morde o lábio inferior para controlar aquela
boquinha esperta, de como sua respiração fica mais rápida e o rosto assume
aquela cor avermelhada quando ele fica com vergonha. — Masturbo mais
rápido, já sentindo seu canal me apertar e Alícia responde tirando a mão do
meu pau, ela se firma em meu pescoço.
— Me fode, amor — implora, ainda de olhos fechados. Seguro sua
bunda com as duas mãos e a ergo, Alícia abraça minha cintura com as
pernas e me puxa, fazendo meu pau entrar em sua boceta apertada de uma
vez só, até o talo.
— Caralho — protesto ao sentir seu canal se contrair ao redor do meu
membro.
— Vem amor, fecha os olhos e entra na fantasia comigo, se não
podemos ter o garoto na vida real, pelo menos podemos sonhar com isso —
convida provocante entrando na brincadeira, ela morde meu queixo e puxa
meus cabelos — O garoto está assistindo, com uma mão no próprio pau, ele
se dá prazer enquanto você me fode, forte e sem parar.
É o que faço, afundo meu pau nela cada vez mais rápido, a água
escorre em minhas costas e Alícia geme mais alto, entregue, sedenta por
mais, sua língua invade minha boca, ansiosa e provocativa.
— Ele vai gozar depois de nós — provoco contra seus lábios —
Primeiro você vai gozar no meu pau e, depois, vou foder esse cuzinho
apertado que eu tanto amo e sei que você o preparou para me receber hoje.
Por último, vamos sentir como se o garoto estivesse aqui, batendo uma para
o nosso showzinho e gozando, chamando por nós.
— Sim, sim. Vem, amor — ela grita e se derrete em meus braços,
suas pernas tremem quando seu primeiro orgasmo chega, então ela desce do
meu colo e vira de costas, as pernas bem abertas e o corpo inclinado, pronta
para mim.
Encontro uma camisinha no armário de Matteo, por sorte o
desgraçado está sempre preparado, desenrolo no meu pau rapidamente e
volto para ela. Alícia respira ofegante, a água do chuveiro agora cai em sua
bunda e a afasto um pouco antes de provocar seu anel com o dedo.
— Ensina para ele como se faz — ela pede, ainda de olhos fechados.
A diabinha joga a cabeça para trás e solta gemidos estrangulados de prazer
enquanto preparo seu anel para me receber.
Primeiro abro bem a sua bunda redonda e firme, então tenho uma
visão privilegiada, passo o dedo e coloco a pontinha, sentindo-a contrair,
espero que relaxe antes de a penetrar e adicionar mais um dedo, alargando-
a. Sinto Alícia rebolar em minha mão.
— Me fode logo, Bunny — implora e não aguento mais. Troco os
dedos pelo meu pau e entro nela, devagar, sentindo cada centímetro ser
engolido por sua bunda gostosa. — Até o fundo.
— Porra, que delícia.
Alícia é minha perdição. Seguro sua cintura com as duas mãos no
momento em que estou todo dentro dela, preciso respirar fundo para não
gozar logo, me concentro na água caindo em minhas costas e imagino
aqueles malditos olhos castanhos cravados em nós.
Por que ele tem que ser virgem, porra? Tímido eu consigo trabalhar,
assustado também, até religioso posso suportar, mas virgem é demais.
— Não vou durar muito — confesso ao sair um pouco e voltar a
penetrá-la, levo uma mão para o meio das suas pernas e sinto seu clitóris
sensível e inchado em meus dedos. — Você vai gozar mais uma vez.
— Sim, me faz gozar, bem assim — ela implora entregue, gemendo
palavras desconexas enquanto aumento a velocidade, entrando mais fundo,
mais rápido. Posso sentir que estou perto e Alícia também, quando ela goza
mais uma vez e aperta ainda mais o meu pau, me liberto e sou jogado no
paraíso.
Ainda de olhos fechados, só escuto os gemidos da diabinha chamando
pelo meu nome, enquanto eu praticamente urro de prazer ao lembrar da
forma com que o garoto nos observava enquanto eu fodia Kevin e era
fodido por Alícia.
É com essa imagem que gozo forte, a respiração ofegante e
descompassada me faz abrir os olhos. Vejo Alícia na mesma situação, sua
pele vermelha da força com que a segurei, e ainda seguro. Ela está cansada
e apoia as costas em meu peito.
— Isso foi… intenso — comenta com a voz doce e ofegante.
— Sim — confirmo e saio dela, tiro a camisinha e descarto na lixeira.
— Agora vamos tomar um banho apropriado.
— Lorenzo deve estar puto, achando que estamos fazendo um
ménage no evento de família. — Ela solta uma gargalhada gostosa.
— Era o que você queria.
Seu olhar diz tudo e ela só confirma com a cabeça.
— Nós somos quebrados demais para ele — expressa com uma pitada
de tristeza na voz. — Agora vamos, preciso jogar na cara dos meus
queridos irmãos a minha vitória.
CAPÍTULO 17

Chace
 
O soldado me levou para casa depois que passei no estúdio e peguei
as imagens que foram gravadas hoje, mas eu estava no automático, minha
mente flutuando entre o que acabou de acontecer e o que poderia ter
acontecido.
Eu disse sim, falei que queria os dois, mas por que fui aceitar isso?
Será que só estavam me testando? Brincando comigo como um maldito
gato, como ela mesma gosta de me chamar?
Não consigo chegar a uma conclusão, é frustrante demais.
Quando entro em casa encontro minha mãe cozinhando, com a
supervisão da cuidadora da clínica, é claro, mas ela parece feliz, e por isso
sei que está em um bom dia. Ela ama cozinhar.
— Bom dia, mãe — cumprimento e ela abre um sorriso gostoso ao
me ver. O vestido amarelo contrasta lindamente com a sua pele clara e os
cabelos castanhos — O que teremos para o almoço?
Largo minhas coisas no sofá da sala e me junto a ela na cozinha, pego
uma faca e começo a picar as cebolas que estavam separadas.
— Estou fazendo o seu preferido, hambúrguer com bacon — ela
explica e mostra os pães abertos e a frigideira pronta para receber a carne.
— Essa moça não come carne, e ela disse para esperar você chegar.
— Sou vegetariana, Senhora King — a cuidadora, cujo nome não
lembro agora, responde calmamente.
— Me chame de Clarissa, por favor. Senhora King era minha mãe.
— Tudo bem, Clarissa. — A mulher levanta e me chama para a sala.
— À tarde virá outra cuidadora, ela já tomou os medicamentos indicados.
— Tudo bem, obrigado — Levo a mulher até a porta, mesmo que ela
tenha a chave de casa fornecida pela clínica.
Volto para a cozinha e encontro minha mãe cantarolando alguma
música em sua cabeça, fazia muito tempo que eu não a via cantar. Desde
que o doutor Rigoni mudou seus medicamentos ela parece mais animada,
hoje é um dia bom, que é como chamamos os períodos em que ela está mais
atenta ao presente.
Ligo o rádio antigo que mantemos em cima da geladeira e recebo o
melhor sorriso do mundo quando uma música latina começa a tocar. Minha
mãe sempre gostou de dançar, tenho algumas lembranças de quando ela
tentava me animar fazendo festa na sala.
Não entendo a letra da música, mas minha mãe sabe cantar. Ela nunca
me falou como aprendeu espanhol, nem a tia Camila sabe, mas acho linda a
forma com que as palavras se formam em sua boca.
Minha mãe é maravilhosa.
— Você precisa cortar esse cabelo — ela me olha enquanto tempera a
carne moída —, vou pedir para sua tia te levar amanhã.
— Não gosta do meu cabelo comprido assim? — provoco, sabendo
que ela odeia, seu olhar de reprovação aquece meu peito. — Vou deixar
crescer para fazer um coque bem grande.
— As meninas não gostam de meninos com cabelo comprido.
— Então é por isso que não pego ninguém.
— Você ainda é novo demais para se preocupar com isso — responde
e entendo que ela não está realmente no presente. — E lembre-se de
encapar o meninão aí, não quero ser avó tão nova quanto fui mãe.
— Eu sei.
— Sabe que não me arrependo de ter tido você, mas eu era jovem
demais e não tive escolhas, minha mãe não falava comigo sobre camisinha,
sexo, proteção, nada disso.
— Então você resolveu que iria falar sobre essas coisas comigo justo
hoje? — reclamo, ficando vermelho.
— É preciso. Filho meu não vai sair por aí sendo irresponsável, já
basta o restante dos homens ser assim. Eu estou criando um homem bom,
educado e que sabe se proteger e proteger sua parceira — fala com a voz
autoritária enquanto forma os hamburgueres com a mão.
— Eu sei, mãe — ligo a frigideira e começo a fritar a carne — Mas
não precisa se preocupar com isso, seu filho não é o terror da mulherada.
— Mas vai ser, seu pai era muito charmoso — expressa com um meio
sorriso, ela nunca fala dele, e quando fala não é com carinho ou admiração
como agora, por isso fico mais atento. — Foi assim que ele me conquistou.
Um frio na espinha me faz congelar, mas continuo fritando os
hambúrgueres para ela não perceber meu nervosismo. Quem sabe hoje
consigo tirar um nome dela.
— Como ele era? — pergunto, tentando tirar alguma informação
nova.
— Ele era um homem alto, com cabelo branco, porque era mais
velho, mas quando jovem tinha o cabelo bem escuro, como os seus. Os
olhos castanhos também, quando nos conhecemos foram o que me chamou
atenção — conta relembrando o passado. — Você parece muito com ele, se
pegasse mais sol teria a pele escura como a do seu pai.
— Não quero ser como ele — expresso com tristeza.
— Acho que não corremos esse risco, sua tia está fazendo um bom
trabalho com a sua educação. Pelo menos eu espero que sim, como andam
as aulas?
— Eu já me formei, mãe, tenho 22 anos agora.
Ela para o que está fazendo por um tempo, com os olhos fechados e a
expressão triste no rosto. Não gosto de corrigi-la, mas quando está em um
bom dia, as vezes ela gosta de saber do presente.
— Desculpa, amor, eu… eu acho que me confundi, na minha cabeça
você é meu pequeno menino.
— Está tudo bem, não importa. — Tampo a panela para não respingar
óleo por tudo que é lado e a abraço com carinho. — Serei sempre teu
menino, um pouco mais alto, só isso.
— A moça que estava aqui, ela é sua namorada? — pergunta sobre a
cuidadora.
— Não, ela é contratada para te fazer companhia — explico com
calma. — Você lembra do seu diagnóstico?
Ela pensa por um tempo, absorvendo o que falei, então concorda com
a cabeça.
— Agora vamos terminar esses hambúrgueres que estou morrendo de
fome. — Volto para a frigideira e viro a carne.
— Você está fazendo hambúrgueres? — pergunta, confusa. — Meu
menino adora hambúrgueres, especialmente com bacon e queijo cheddar.
E assim percebo que ela já não me reconhece como seu filho e sim
como alguém estranho, e está tudo bem, só sorrio para ela e aceno com a
cabeça, entrando neste novo personagem.
Esses episódios são confusos, em um momento ela está presente,
conversando e me olhando como se nada estivesse errado, e em um piscar
de olhos tudo muda e minha mãe parece outra pessoa. Isso me dilacera por
dentro, mas o pior é imaginar como ela se sente, especialmente quando me
olha e enxerga meu pai.
As suas reações nesses momentos são confusas, às vezes ela se
encolhe de medo, outras me olha com carinho. Quando percebo que ela está
com medo, me afasto para não piorar seu estado.
— Pode ligar a TV, eu termino aqui e logo vamos almoçar — falo
com carinho e ela vai até a sala. É perigoso deixá-la próxima do fogão ou
de facas afiadas quando as crises acontecem.
Depois de terminar o almoço, sento-me para assistir à novela com ela,
é um momento nosso e me sinto triste por minha mãe não estar realmente
presente, mas por algum motivo lembro do que a Mali falou naquela noite:
que não importa se ela não sabe que sou seu filho, eu sei que é minha mãe e
esse é um momento nosso que ficará guardado em minhas lembranças.
Eu me surpreendi com a forma carinhosa com que ela disse essas
palavras. Mesmo depois de tudo o que aconteceu na boate, ela estava
tranquila e me ajudou, sem ter a obrigação de fazer isso, me abraçou e em
seus braços me senti aliviado.
Ainda não sei por que ela em específico me atrai tanto, claro que é
bonita — Alícia tem um corpo bem definido, as tatuagens são maravilhosas,
os seios não tão grandes me deixaram curioso, seus lábios carnudos são
atrativos —, mas o que me faz tremer realmente é o seu olhar.
Alícia exala poder e alguma coisa a mais, uma sensação de domínio,
como se tivesse tudo e todos aos seus pés. Quando fala, cada palavra é
como uma ordem, as pessoas reagem com respeito e um pouco de medo.
Mesmo ela sendo uma mulher pequena, não parece nada frágil.
Seus gestos, comportamento, a entonação da sua voz, a intensidade do
seu olhar, tudo emana uma potência absurda de autoridade incontestável.
Alícia é incrível.
E se ela sozinha é uma mulher imponente, com Gabriel ao seu lado
forma um casal perfeito. Porque é isso, o executor não está à frente dela, ou
atrás, eles andam juntos. Ao vê-la sozinha parece que falta algo, ou neste
caso, alguém.
Quando penso neles o arrependimento bate forte. Tive minha chance,
eu aceitei participar do que quer que estivessem planejando, ou será que só
fui levado pelas provocações?
A lembrança de Kevin amarrado vem à minha mente, será que era
algo assim que eles iam propor? E eu aceitaria se fosse?
Para falar bem a verdade, eu diria sim para qualquer coisa que aqueles
dois me pedissem, mesmo não querendo ser amarrado. Quando me imagino
com eles, penso em tudo o que fazem um com o outro, a forma como
Gabriel toca nela e ela reage, como seus beijos são quentes e me deixam
pegando fogo só de assistir.
Eu quero a boca dele na minha também, sentir a barba grossa
raspando na minha pele deve ser maravilhoso. Quero a minha boca na dela
também, Alícia deve ter os lábios macios e não consigo nem imaginar o
sabor dos seus beijos.
Caralho, eu quero as quatro mãos em mim, mas também ter a
liberdade de tocá-los, traçar as linhas das tatuagens de seus corpos com
meus dedos e senti-los arrepiarem-se com o meu toque. Eu quero fazer
parte do que eles têm, e não só servir de brinquedinho sexual.
Sei que estou me iludindo, Gabriel não pode ser tocado a não ser por
Alícia. Até quando andamos lado a lado na pista de corrida, que foi o mais
próximo que já cheguei dele, e mesmo quando tinha uma arma apontada
para mim, ele estava a uma distância física maior.
E eu estava muito consciente de sua proximidade. Pude sentir o
cheiro almiscarado do seu perfume, e mesmo estando sob aquele macacão
de corrida que ele usava pendido na cintura, com a camiseta cinza grudada
no corpo grande e forte, encharcada de suor, ele me atraia.
Um homem atlético e poderoso só poderia estar ao lado de uma
mulher bonita e imponente como Alícia. Eles combinam demais.
Se controla, Chace! E é Mali, se ficar pensando nela como Alícia, sou
capaz de falar o nome em voz alta e levar um tiro por ser distraído.
A cuidadora da tarde chega perto das 2h e fico livre para trabalhar nas
edições, o que será outra tortura, já que terei que assistir continuamente
Alícia — não, Mali — em cima de sua moto, correndo como se não tivesse
medo de nada nem de ninguém. A forma com que ela fez as curvas, quase
deitando no asfalto, acelerou meu coração.
Ela é uma mulher incrivelmente forte, Gabriel é um homem poderoso,
quem sou eu para querer estar com eles? Um garoto, como ele mesmo me
chama, medroso e que não perdeu nem a virgindade ainda.
Uma utopia, é essa a palavra que descreve este sonho, o desejo que
tenho por eles. Talvez seja um fetiche, muitas pessoas têm desejos sexuais
estranhos, quem sabe o meu seja transar com pessoas perigosas, nesse caso,
mafiosos.
Passo o restante do dia organizando os arquivos e criando vídeos
curtos para as redes sociais, a boate é muito conceituada e esse evento será
gigante. Até alguém como eu, que não entendo muito sobre festas e baladas,
percebo a magnitude do que estão planejando.
A única vez que pisei em uma casa noturna foi quando Chad, meu
colega de trabalho no bar, me convenceu a ir com ele depois de um turno
servindo bebidas. Acho que ele foi minha primeira paixão platônica, o loiro
de olhos verdes e sorriso leve fazia meu coração emocionado acelerar toda
vez que falava comigo.
Claro que nunca aconteceu nada, Chad tinha uma namorada e vivia
traindo a garota com clientes do bar que se encantavam com seu sorriso,
seus braços musculosos, e o peitoral malhado ajudava nesse processo. Era
difícil um final de semana em que ele não levasse alguma garota diferente
para o banco de trás do seu carro.
Assisti aquele Sedan com os vidros escuros e embaçados balançar no
estacionamento mais de uma vez, e confesso que sentia uma mistura de
inveja da mulher que estava com ele e pena da namorada, que vinha pouco
ao bar, mas sempre me pareceu uma pessoa legal.
Naquela época achei que fosse homossexual por sentir atração por
ele, então quando Chad me levou para a casa noturna que ficava em nosso
bairro, decidi experimentar. Pouco tempo depois que entramos, Chad sumiu
e me deixou sozinho lá. Como me senti deslocado e sem saber o que fazer,
comprei uma água só para ter algo para segurar.
O primeiro homem que chegou em mim era alto, usava óculos, tinha
cabelos bem escuros e a pele preta. Eu senti algo no momento em que ele se
aproximou e decidi dar corda, durante uma conversa que não lembro, juro,
esse cara tocou meu braço e me convidou para ir ao banheiro.
Achei que só garotas faziam isso, então disse que ele podia ir e eu
esperaria no bar, porque não estava com vontade, mas ele sorriu de canto e
falou que queria me beijar. Perdi tudo quando pegou minha mão e me levou
para fora, lembro de ficar com medo, mas também excitado, era uma
mistura confusa de sentimentos.
Meu primeiro beijo foi com um homem estranho, em um beco escuro
ao lado de uma lixeira fedida, e por incrível que pareça, foi bom. Sua boca
era macia e ele sabia o que estava fazendo, mas quando suas mãos foram
abrir a minha calça, eu o parei. Não estava pronto e também não queria
fazer aquilo justo naquele lugar.
O homem entendeu minha recusa, mas não me beijou mais, eu queria
continuar, só não estava preparado para ir adiante. Lembro dele sorrindo de
canto e agradecendo antes de voltar para a boate. Eu não tive coragem de
entrar, só virei as costas e fui embora.
Passei semanas pensando sobre aquela noite e pesquisando sobre
sexualidade, tia Camila teve essa conversa comigo há muito tempo, ela me
explicou que o assunto é algo amplo e pessoal de cada um e que, quando eu
estivesse pronto, iria descobrir do que eu gosto.
As clientes do bar que não se jogavam para Chad, volta e meia
lançavam olhares para mim, talvez por sermos opostos: enquanto ele era
forte e musculoso, eu não tinha nada definido em meu corpo, usava roupas
surradas e era tímido demais para falar com elas.
Meu colega era extrovertido e conversava com todo mundo, sobre
qualquer assunto, em qualquer momento. Eu achava isso fascinante, porque
eu não conseguia olhar diretamente para as pessoas, fazia meu trabalho de
cabeça baixa e com eficiência, contando as horas para terminar logo e voltar
para casa.
Uma noite uma mulher deu seu número para Chad me entregar, ele
disse que ela vinha toda sexta e sempre ficava me olhando com interesse.
Na outra semana reparei nisso também, ela usava calça jeans preta e
rasgada, botinas, uma camiseta de alguma banda de rock, que meu colega
disse ser maneira. Ela tinha o cabelo pintado de azul e um piercing nos
lábios.
Eu não tive coragem de ligar para o telefone, mas a mulher chegou
em mim da mesma forma, sentou-se no balcão e tentou puxar assunto a
noite toda. Juro que fiz o melhor para responder, mas ela era intimidante, no
final da noite ela foi a última a sair e me chamou para ir até seu carro.
Depois de ver Chad fazendo aquilo tantas vezes eu sabia o que ela
queria, e pensei que talvez estivesse na hora de testar minha teoria, por isso
aceitei. A garota montou em mim assim que entramos em seu carro que
estava estacionado mais afastado dos outros.
Era uma noite gelada e os vidros ficaram embaçados rapidamente,
ainda mais com o que estávamos fazendo lá. Ela me beijou sem pudor
algum, tomou a minha boca, mordendo meu lábio inferior e exigindo
passagem com a língua. Era diferente do homem, que foi mais gentil e
delicado.
Suas pernas na lateral do meu corpo a deixavam aberta no meu colo e
ela rebolava descaradamente no meu pau, obviamente eu estava duro e
sentindo um tesão da porra com os estímulos, era gostoso pra caralho, ela
sabia o que fazia e eu só precisava segui-la. Só que quando ela começou a
se esfregar mais, e mais, e mais, eu não aguentei e gozei na calça.
Como um maldito virgem descontrolado.
Fiquei vermelho na hora e travei, acho que foi o momento em que
senti mais vergonha na vida. Pedi para que ela se afastasse e falei que
precisava ir embora, por sorte minha calça era preta e não dava para ver o
estrago, mas ela deve ter percebido.
Caralho, só de lembrar daquela noite fico puto comigo mesmo, quem
sabe se tivesse me segurado e perdido a virgindade naquele carro não
estaria decepcionado agora, ou talvez não devesse ter parado o homem na
balada. Eu tive duas oportunidades e não quis, aí quando finalmente estou
pronto, sou dispensado.
CAPÍTULO 18

Gabriel
 
Matteo estava puto por ter perdido a aposta e Alícia aproveitou cada
oportunidade para irritá-lo, porque ele nunca desconta nela, mas comigo é
outra história.
E é por este motivo que as juntas dos meus dedos estão vermelhas e
doloridas neste momento, o sangue da boca do infeliz que serviu de escape
para a minha fúria escorre pela minha mão quando jogo água para limpar.
O Consigliere me encheu o saco a semana toda com serviços que
estavam abaixo da minha função, só para afrontar Alícia, e eu já estou
cansado disso. Dar aviso para os maus pagadores é coisa de soldado, o
executor só deveria ser chamado para finalizar a cobrança.
Deixei o desgraçado sangrando na sarjeta, ele devia menos de 5 mil
dólares, essas merdas de jogatinas me irritam. Alícia veio comigo e
gargalhou o tempo todo em que meus punhos acertavam a cara do
desgraçado que estava com as mãos amarradas às costas.
Odeio esses ratos menores, no primeiro soco já estão mijados, esse
aqui desmaiou de medo antes que eu pudesse fazer um estrago maior.
— Você está estressado demais, Bunny — Alícia provoca quando
solto o homem e me viro para ela. — Não fica assim, Matteo só quer me
atingir.
— E está me usando para isso, eu tenho coisas melhores a fazer,
Alícia — reclamo rude e recebo um olhar contrariado. — Só pare de
atormentá-lo.
— Não — contesta contrariada. — Se não quer fazer essas tarefas, é
só falar para ele, pronto.
— Sabe que não é assim que funciona, com Lorenzo viajando, Matteo
está no comando, não posso contrariar uma ordem direta do meu superior.
Ela bufa irritada, já tivemos discussões assim, que na verdade são
diferenças de opinião. Alícia não aceita ser rebaixada por seus irmãos, ela
bate de frente e a culpa é deles, mimam a garota até hoje pelo que ela
passou.
Já eu, sou fiel à Família e ao Don, jamais contestaria uma ordem
direta e sei o meu lugar.
— Vamos, preciso passar na empresa da minha família. — Subo na
moto e estendo a mão para ajudá-la, mas ela recusa e monta na minha
garupa, ainda irritada e isso me acalma. — Eu te foderia até desfazer esse
bico, mas realmente preciso ir até a empresa.
— Me deixa na Malícia, o novo dançarino começa essa semana e
quero conferir com Rick se ele é bom para tentar usá-lo no evento.
Alícia está estressada com a repercussão do que o filho do senador fez
na boate, os canais de comunicação não param de falar sobre os tiros, dizem
que o local não é seguro, alguns chegaram até a afirmar que as pessoas não
são revistadas ao entrar, o que é mentira. O desgraçado só estava armado
porque usou o nome do pai na entrada.
Paro no estacionamento privado, que fica no subsolo e é destinado aos
funcionários e clientes VIP. Alícia quase pula da moto, mas a seguro antes
que saia correndo.
— Vem cá — Tiro o capacete e faço com que me olhe, ela está brava
e me desafia com o olhar. — Não vai me dar um beijo de despedida?
— Não — responde birrenta e tenta se desvencilhar dos meus braços.
— Tem certeza?
— Você não merece, agora me deixa ir, tenho muita coisa para fazer.
— Não até me dar um beijo. — Aproximo minha boca da dela, mas
Alícia vira o rosto, ainda lutando contra mim. — Diabinha, só vou te soltar
depois que me beijar, então se quer sair daqui logo, sabe o que precisa fazer.
Alícia respira fundo e agarra meu pescoço, zerando a distância entre
nós. Sua boca se apossa da minha em um beijo forte e raivoso, ela me
provoca ao morder meu lábio inferior até doer, mas não deixo que brinque
sozinha, agarro seu cabelo com firmeza, arrancando um rosnado dela que
faz meu pau contrair na calça.
— Eu te amo, diabinha — confesso em sua boca e ela sorri de canto,
contrariada. Sua língua me invade e exige atenção, eu a chupo e sinto o
gosto delicioso que só ela tem. Em uma luta pelo domínio ela se afasta
primeiro, ofegante e descabelada. — Agora sim, posso ir tranquilo.
— Desgraçado — reclama ao se afastar, tentando arrumar os cabelos.
— Gostosa — falo mais alto e ela rebola aquela bunda deliciosa. —
Quando eu voltar, vou te foder até parar de me provocar.
— Isso é uma ameaça ou uma promessa? — pergunta olhando por
cima do ombro.
— Os dois — respondo e ouço sua gargalhada ecoar pelo ambiente,
espero até que esteja no elevador e aviso aos seguranças designados à boate
para não tirarem os olhos dela.
***
Minha família controla várias empresas em diversos setores de
transporte, importação e exportação. Trabalhamos principalmente com
mercadorias vindas de países europeus. Eu não lido ativamente com estes
negócios, a Família de Angelis possui uma parte das ações e Lorenzo foi o
escolhido pelo meu pai para ficar à frente das empresas.
Mesmo assim ainda preciso vir para a sede de vez em quando, afinal
essas empresas são minha responsabilidade e gosto de me manter atualizado
dos relatórios semanais.
Liam Steiner é o CEO do Centro de Distribuições e é ele quem
comanda as operações diárias. É também encarregado dos relatórios
reportados ao Don e a mim. Encontro-o em sua sala no último andar do
prédio onde temos os escritórios e a área administrativa, ele já me
aguardava, por isso não fico surpreso quando sua secretária me entrega o
café com leite do jeito que gosto.
Se tem uma coisa boa sobre esses empresários é que eles sabem quem
precisam bajular para continuar em seu cargo, e Liam é um cachorrinho
bem treinado. O homem de pele preta e olhar desafiador tem um sorriso
amigável e uma fala mansa, sua lábia foi o que o fez subir na carreira
rapidamente e chegar onde está hoje.
— Liam, o que tem para mim? — Inquiro sem rodeios e me sento na
sua cadeira, não mantenho um escritório aqui porque só faço visitas
semanais. Como só preciso falar com ele, gosto de mostrar quem manda ao
me apossar da sua sala.
— Senhor Esposito — cumprimenta, fechando o terno azul marinho e
sentando-se na cadeira de frente para mim. — Aqui estão os últimos
relatórios, já enviei cópias ao senhor de Angelis. Tivemos um aumento no
percentual de lucro com as empresas de transporte interestaduais, porém a
importação sofreu um baque significativo com as novas taxações impostas
pelo governo.
Leio com calma os relatórios e presto atenção no que ele diz, as partes
mais importantes estão marcadas e Liam me entrega cópias das mudanças
nas taxas que foram prejudiciais para nós.
— Ainda tivemos um fechamento positivo, porém a longo prazo esses
encargos nos deixarão no vermelho. Como pode ver, as projeções para os
próximos 36 meses demostram o quão prejudicial será se continuarmos com
os mesmos preços.
— E o que você sugere para contornar este problema? — questiono
sem demonstrar preocupação, afinal eu sei o que fazer para acabar com o
problema, mas gosto de saber o que uma pessoa normal faria nesta situação.
— A opção mais fácil é repassar o aumento para nossos clientes, o
produto final ficará mais caro, mas ainda estaremos abaixo do valor de
mercado — explica, apontando para a pasta vermelha onde encontro um
plano de negócios já traçado e bem estruturado.
— Não faça nada por enquanto, discutirei sua proposta com Lorenzo
e teremos outra reunião na próxima semana.
— Tudo bem, vou pedir para Rita organizar a agenda. — Liam
levanta-se e me entrega um maço de documentos. — Aqui estão os
contratos mais recentes, já foram revisados pelos advogados do senhor de
Angelis e só faltam ser assinados, vou deixá-lo a sós.
Antes que ele saia me lembro que tinha mais um assunto para tratar
com ele.
— Liam, você se mudou recentemente, não foi?
— Sim, minha corretora conseguiu um apartamento mais amplo, já
que minha mulher está grávida — explica com um sorriso orgulhoso.
— Poderia me passar o número da sua corretora?
— Claro — ele procura no celular e logo me envia o contato —,
Jenna é bem eficiente e tem um bom olho para imóveis únicos.
Assim espero, preciso de alguém de fora para a surpresa que estou
planejando.
Termino de revisar e assinar os contratos e percebo que o sol já está
se ponto no horizonte, Liam não me interrompeu e sua secretária só veio
trazer café e o lanche que pedi, geralmente não fico tanto tempo aqui, mas
resolvi avaliar com mais cuidado a proposta do CEO.
Meu celular toca na mesa e vejo o nome de Matteo na tela.
“Gabriel, ainda está na empresa?” dispara sem rodeios.
— Sim, revisando os últimos relatórios.
“Bom, preciso de um favor” fala em códigos, já que telefones não são
confiáveis. Nunca tratamos de assuntos incriminadores de forma remota, só
pessoalmente. “Nossos investimentos estão dando prejuízo, verifique o que
está acontecendo no setor AM.”
— Estou indo para lá agora — confirmo e ele desliga.
Merda, AM é código para Alícia.
Deixo os contratos assinados na mesa de Liam e volto para a boate o
mais rápido possível, a essa hora o trânsito é um inferno, por isso agradeço
estar de moto. Quando estou sozinho não ando com soldados, a não ser que
seja um local perigoso ou que precise de reforços.
O primeiro sinal de que algo está errado é que Renan me aguarda na
entrada do estacionamento, o soldado leal a Alícia está com o semblante
preocupado.
— O que aconteceu? — questiono ao entrar no elevador.
— O Cartel pegou Kevin — explica, tentando controlar a emoção em
sua voz. — Ele está no hospital.
— Como?
— Ainda não sabemos, quem o encontrou foi o dançarino mais velho,
Rick.
O elevador chega no segundo andar e quando as portas abrem consigo
escutar os gritos de Alícia, algo se choca contra a parede, fazendo-me correr
até a sua sala.
— Ela soube há pouco, o senhor Matteo está a caminho — Renan
aponta como se estivesse se desculpando.
— Maldito Cartel de merda — Alícia grita com raiva e joga tudo o
que está em cima da sua mesa no chão, em um rompante desesperador. —
Eu vou matar cada um desses filhos da puta imundos que ousaram atacar
meu menino.
— Saiam — ordeno antes mesmo que ela me veja entrar. — AGORA!
Renan segura a porta aberta para que Sharon e os outros dançarinos
que estão no escritório saiam, todos estão abalados com o que aconteceu,
mas preciso ficar sozinho com ela para acalmá-la, eles sabem disso.
— Essa afronta não passará em branco, esses mexicanos de merda
mexeram com a pessoa errada, eu vou atrás de cada um que ousou encostar
os dedos nele. — Alícia solta um urro raivoso. — NINGUÉM ENCOSTA
NO QUE É MEU E SAI IMPUNE!
Posso sentir sua ira, ela está perdendo o controle, e isso nunca é bom.
— O que aconteceu? — questiono com calma, tentando chamar sua
atenção para mim.
— Eles atacaram o Kevin, entraram na casa dele e o espancaram. —
Alícia joga as mãos para o alto ao falar, seus olhos vermelhos de raiva, ela
está bufando e anda de um lado para o outro. — Gabriel, eu vou matar esses
desgraçados, juro pela minha vida que os farei pagar.
— Respira e me conta o que aconteceu — peço novamente, tentando
fazê-la se acalmar.
— Rick foi buscar Kevin para os ensaios, eles combinaram de vir
juntos. — A cada palavra Alícia precisa respirar e vai se acalmando para
conseguir entender e me explicar o que aconteceu. — Kevin não estava
atendendo o telefone, então Rick subiu até o seu apartamento. Quando
chegou lá a porta estava arrombada, o local foi todo revirado e Kevin,
espancado.
— Como ele está?
— No hospital, Rick chamou a ambulância na hora e foi com ele. —
Ela coloca as duas mãos na cabeça e olha para o chão. — Kevin está em
cirurgia, ainda não sabemos o quadro geral, mas eu juro que quando
descobrir o nome do desgraçado que encostou nele, vou fazê-lo sofrer,
Gabriel, marque minhas palavras.
— Estarei ao seu lado neste momento — confirmo e ela respira fundo.
— Como você sabe que foi o Cartel?
— Os malditos picharam seu símbolo na parede da sala de Kevin, isso
foi um aviso, eles sabem que foi ele quem nos contou sobre Jair Hernanes,
foi retaliação.
— Mas como eles podem saber? — instigo mesmo já tendo a teoria
formada. Preciso que Alícia se acalme e isso só vai acontecer quando ela
parar para pensar.
— Eu não sei, tá legal? Que merda, só quero matar quem fez isso
com um dos meus meninos. Eles estão sob a minha proteção, isso significa
que falhei com ele, Gabriel, eu falhei!
— Não foi sua culpa.
— Kevin é minha responsabilidade, ele foi atacado porque trabalha
para mim, eu deveria protegê-lo, eu preciso cuidar de todos eles… — A dor
em sua voz me faz querer abraçá-la, mas não me movo, ela precisa
desabafar e estou aqui para ouvi-la e não a silenciar. — Eu preciso que ele
fique bem, Kevin não merece isso, ele é um bom homem.
— Amor, olha para mim, se concentra no presente. — Aproximo-me
com cautela, Alícia não gosta de ser contida quando está descontrolada
assim, sua raiva só aumenta, mas ela não recua. — Kevin vai sair dessa,
eles o deixaram vivo como um aviso, se o quisessem morto, estaríamos
preparando um funeral agora.
— Eu sei, mas não consigo entender, não faz sentido, nada faz sentido
— murmura com a voz trêmula e encosta a cabeça em meu peito, dando-me
permissão para abraçá-la. — Não é como se eles estivessem escondidos
aquele dia, qualquer um poderia ter visto Jair Hernanes lá, até nós, se não
estivéssemos preocupados com a Tatiana.
— Talvez tenha algo que ainda não sabemos, vamos esperar a cirurgia
acabar e quando ele acordar teremos sua versão do que aconteceu.
— Max está recuperando as imagens das câmeras que ficam na rua do
prédio do Kevin, ele não tem porteiro e nem vigilância no corredor. — Ela
passa os braços pela minha cintura, por dentro do casaco de couro que estou
usando, e me abraça apertado, procurando conforto. — Quero matar
alguém, eu preciso me vingar, Gabriel.
— Eu sei amor, você fará isso, eu garanto. — É uma promessa, irei
até o inferno buscar os desgraçados que fizeram isso com Kevin e os
entregarei a Alícia, e nesse dia eles desejarão nunca ter encostado no que é
dela.
A porta se abre com brusquidão e Matteo entra com Dylan Cavalaro e
Colin Gallo, que são os Underbosses responsáveis por Allston e North End,
respectivamente, áreas importantes da cidade.
— O que diabos aconteceu, Alícia? — Matteo esbraveja
acusadoramente e Alícia se solta dos meus braços para confrontar o irmão.
— Eu te falei para não os provocar, você não tinha permissão para atacar o
Cartel.
— Eu não fiz nada, ainda — ela se defende furiosa —, mas assim que
descobrir quem atacou um dos meus meninos, pode ter certeza de que vou
me vingar.
— Como não fez? Esse ataque foi retaliação pelos dois homens que o
seu soldado decapitou ontem à noite — Dylan entra na discussão. Ele é um
homem branco na faixa dos quarenta anos, baixinho e está acima do peso, e
tem o controle da área de Allstone — Jair Hernanes está puto e em busca de
vingança.
— Eu não mandei ninguém fazer nada — Alícia se defende com raiva
e olha séria para o irmão.
— Ravi é seu homem, Alícia, ele já confessou ter matado os dois
mexicanos que estavam rondando a boate, disse que as ordens vieram
diretamente de você — Matteo explica passando as mãos pelo cabelo, ele
está suado e nervoso.
— Ele está mentindo, eu estava com vocês ontem o dia inteiro,
lembram? Não ordenei nada — ela contrapõe, confusa.
— Ele recebeu mensagens do seu número para eliminar os batedores
do cartel que aparecessem aqui — Matteo afirma e Alícia pega seu telefone
de cima da mesa, abre as mensagens até encontrar o número de Ravi.
— Merda, eu não mandei isso, irmão, alguém deve ter usado o meu
celular.
— Você usou alguma coisa ontem? Quem sabe bebeu demais? —
Matteo pergunta desconfiado, mas percebe ter sido um erro assim que sua
irmã tira a arma e aponta diretamente para a cabeça dele.
— Eu sou sua irmã, somos família. Se estou dizendo que não mandei
essa mensagem, a primeira coisa que você deveria pensar é que alguém está
armando para cima de mim, e não desconfiar que eu tenha me drogado e
surtado — repreende com a voz firme, mas o olhar transparece a mágoa. —
Olha a hora da mensagem — ela ergue o celular para o irmão —, às 21h32
estávamos todos no aeroporto particular com Lorenzo, ficamos das 21h22
até às 22h43 discutindo a viagem dele. Eu sei disso porque mandei
mensagem para Gabriel com uma foto minha sem roupa assim que
começamos a reunião, e ele me respondeu com uma foto da mão dele
segurando o pau só no final.
Coloco a mão em seu ombro como um pedido para que abaixe a
arma. Mesmo sabendo que ela não irá atirar e que isso é só para provar o
quanto está magoada, é melhor não contar com a sorte.
Matteo nem piscou, mas entendeu que falou merda, os outros
Underbosses estão com as mãos nos coldres, mas não ousariam apontar
uma arma para ela.
— Desculpa, irmã — Matteo fala cansado e Alícia recua. — Mas se
não foi você, alguém teve acesso ao seu aparelho durante a reunião.
— Nós sempre deixamos na caixa de metal antes de falar sobre
negócios — confirmo e todos se olham, sabendo o que isso quer dizer. —
Temos um rato na Família.
— E alguém muito próximo, que teve acesso aos nossos aparelhos
durante esse tempo — Dylan complementa.
— O que eu quero saber é, por quê? Tenho um homem no hospital e
preciso de segurança para o restante da minha equipe, não os deixarei
desprotegidos até resolver essa merda toda — Alícia avisa e se escora em
sua mesa.
— Vou providenciar isso, até lá é melhor levar seu celular para o Max
fazer alguns testes, a pessoa pode ter implantado algum programa espião —
Matteo aconselha. — O que não entendo é, por que este dançarino em
específico?
— Kevin tem um passado com o Cartel, eu o salvei de uma dívida de
morte com Leandro Vasques e o tirei de uma casa de prostituição
comandada por eles — Alícia explica. — Lorenzo sabia do passado dele,
mas achou melhor deixar entre nós.
— Eu sou o maldito Consigliere, supõe-se que eu saiba dessas merdas
todas. O que mais estão escondendo de mim?
— Foi relatado para Don Lorenzo — explico com calma. — Agora
precisamos resolver essa situação, Alícia está certa, não podemos deixar o
restante da equipe desprotegida e, se eles têm alguém dentro da nossa
Família, isso não pode sair daqui.
— Reúna a lista de todos que trabalharam no evento, quero saber o
nome de cada soldado, funcionário e até das faxineiras — Matteo ordena.
— Use quantos homens forem necessários para a proteção dos seus
funcionários, irmã, temos novos soldados da cerimônia de iniciação,
coloque-os para trabalhar.
CAPÍTULO 19

Alícia
 
Ver Kevin naquela cama de hospital, cheio de fios e máquinas ao seu
redor, só fez meu ódio crescer. Ele ainda ficará internado por um tempo,
mas não corre risco de morte.
Ele teve três costelas quebradas, um pé torcido, muitas marcas de
pancadas. Seu rosto bonito está todo inchado, o nariz e a mandíbula foram
deslocados, teve sangramento interno e por isso precisou fazer uma cirurgia
de emergência quando chegou e vai ficar com uma cicatriz no peito.
Dei ordens para que ele tenha o melhor tratamento que o dinheiro
pode pagar, nosso nome tem poder e vou usá-lo para garantir que meu
menino se recupere e não tenha sequelas.
Rick também está muito abalado, e olha que é um homem que já viu
muito nessa vida. Ele fazia parte de um moto clube que foi incendiado em
New York, todos os seus colegas morreram, só ele teve sorte de estar na
estrada naquele dia. Quando percebeu que o ataque foi retaliação da Família
Corleone, saiu da cidade e deixou aquela vida para trás.
Chegou em Boston com uma mão na frente e outra atrás, sem poder
usar seu nome para conseguir trabalho. Ele se sujeitou a serviços
clandestinos, foi garçom em uma das nossas casas noturnas e foi assim que
eu o conheci e o convidei para trabalhar comigo.
Ele se tornou um pai para todos na Malícia, claro que não foi tão fácil
convencer um homem bruto que fazia parte de um maldito MC a começar a
rebolar nos palcos, mas todos têm seu preço, e pago muito bem para meus
meninos. Com o tempo ele me deixou até cobrir a tatuagem da cobra que
simbolizava seu passado.
— Eu achei que… achei que ele… — Rick sussurra no corredor do
hospital, seus olhos estão vermelhos e inchados de tanto chorar e a voz
transborda a dor que está sentindo. — Achei que ele estava morto.
— Ele não está — corrijo e coloco a mão em seu ombro, fazendo-o
olhar para mim. — Kevin é forte e vai sair dessa, eu garanto.
— Tinha muito sangue, eles… — O homem não consegue terminar o
que ia falar antes das lágrimas voltarem a escorrer pelo seu rosto e sua voz
tremer com a tristeza. — Já vi muita coisa ruim nessa vida, já bati em muita
gente, mas nunca assim.
— Eu sei, querido, vem aqui. — Levo Rick para uma sala mais
reservada e nos sentamos no sofá, deixo dois soldados na porta do quarto de
Kevin para fazer a segurança. — Preciso que me conte o que você viu
quando chegou, cada detalhe importa.
— Estava tudo revirado, mas não reparei em nada, só vi ele jogado no
chão, o pé virado em um ângulo estranho — relembra e as lágrimas
escorrem, constantes —, ele tem vários cortes pelo corpo, sua camiseta
branca estava encharcada de sangue.
— Algum padrão?
— Formaram a letra “X” em seu peito, os desgraçados o marcaram
para morrer. — Rick começa a soluçar, debruçado em suas mãos, o corpo
todo tremendo com o choro descontrolado. — Ele não merece, Mali, estava
limpo, Kevin saiu dessa vida, ele estava sóbrio e não usava nada há meses.
— Ele vai ficar bem, vou garantir o melhor tratamento e os melhores
cirurgiões plásticos, nosso menino não terá sequelas, eu garanto. — Tento
consolá-lo, mas ele não para de chorar, é mais do que só preocupação, e só
então percebo algo. — Rick, vocês estão envolvidos?
Isso o faz erguer a cabeça e me encarar, a dor misturada com a culpa
transbordam dos seus olhos quando ele confirma com um aceno de cabeça.
— Ele não falou nada, eu não sabia, Rick.
— É recente, e não somos exclusivos, se é com isso que está
preocupada.
Rick se refere ao fato de Gabriel e eu usarmos Kevin em nossas
brincadeiras.
— Estou preocupada com você. — Afago suas costas e me ajoelho
em sua frente. — Me perdoa, Kevin foi atacado por se envolver comigo,
com a minha Família, é minha culpa ele estar aqui agora.
— Não, querida — Rick responde com carinho e seca uma lágrima
que nem percebi estar escorrendo pelo meu rosto. — Todos que trabalham
na Malícia sabem com o que estão envolvidos, você e seus irmãos deixam
isso bem claro, estamos lá por escolha. Bem, alguns não, mas isso não é da
minha conta.
Ele está se referindo a Chace e ao acordo que fez comigo para
trabalhar na minha boate.
— Me perdoa, Rick, eu prometo reforçar a segurança de todos e juro
pela minha vida que os responsáveis por isso irão pagar, vou fazê-los sofrer
mil vezes o que nosso menino sofreu.
— Você é uma mulher forte, Alícia — Rick abre um sorriso triste e
carinhoso ao usar meu nome e não o apelido —, mas não carregue essa
culpa, eu prometo cuidar dele e sei que você irá resolver essa situação, só
não se culpe.
Escuto o que ele fala, mas não consigo tirar esse aperto do meu peito
e calar a voz em minha cabeça que grita comigo, culpando-me por todo o
mal causado às pessoas ao meu redor. Só quero garantir que fiquem a salvo,
não suporto a ideia de ver as pessoas importantes para mim sofrerem.
Posso aguentar a culpa e o peso da vingança se quem eu amo estará a
salvo, afinal é por este motivo que passei a vida treinando: acabar com
todos que tentam fazer mal à minha família e aos meus amigos.
— Vou vingá-lo, Rick, eu te dou a minha palavra. — Levanto-me e
seco as lágrimas, forçando-me a engolir a tristeza. Não é o momento para
chorar, agora é hora de engolir tudo e transformar a dor em ódio, porque
quando o momento da vingança chegar, eu os farei pagar.
— Eu vou ficar com ele, acho que consigo ir para a boate na quinta-
feira, mas os ensaios…
— Não se preocupe com isso, as apresentações ficarão suspensas por
um tempo — anuncio decidida, sem Rick e Kevin não tem como continuar
com as danças. — Tire o tempo que precisar para cuidar dele, quero meus
meninos bem, nada mais importa.
— Mas e o evento? Eu ainda posso dançar, só não sei se consigo ir
aos ensaios.
— Rick, olhe para mim. — Coloco a mão em seu rosto e acaricio a
barba com fios brancos. — Esquece o show, a balada, o trabalho, nada disso
importa, está ouvindo? — Espero que confirme com a cabeça. — Vocês
importam, é por isso que preciso de você aqui, cuide do nosso menino.
— Tudo bem — suspira aliviado.
— Assim que sair da UTI ele será transferido para uma ala particular
e isolada, deixarei homens de confiança 24 horas por dia, e o hotel em
frente ao hospital tem um quarto reservado para você por tempo
indeterminado, fique lá e não saia sem segurança — ordeno seriamente,
preciso que ele entenda a gravidade da situação. — Se precisar de qualquer
coisa me ligue, não importa a hora e nem o motivo.
— Preciso ir para casa pegar umas roupas e… — ele hesita antes de
continuar —, não posso ficar no hotel, tenho meus gatos.
— Eles também estão convidados, o hotel é da minha família. Não se
preocupe com nada, Rick.
Saio do hospital com o coração na mão, mas um pouco mais tranquila
por saber que Kevin vai sair dessa e tem alguém ao seu lado. Foi uma
surpresa saber sobre eles, visto que sou bem perceptiva para essas coisas e
não havia reparado nos dois.
Kevin também não falou nada em nossa última sessão, Gabriel e eu
nos precavemos de não compelir ninguém a foder com a gente, só participa
quem quer. Seja por dinheiro ou prazer, garantimos que a pessoa não está lá
sendo forçada.
Gabriel vai me encontrar na boate, ele está correndo atrás dos nomes
de todos que trabalharam no evento de domingo. Como não mantemos
câmeras dentro da mansão, precisamos averiguar pessoalmente os registros
de funcionários das empresas que contratamos.
Normalmente não trabalhamos com serviços terceirizados, mas a
corrida foi em cima da hora e o buffet veio de um restaurante da família,
assim como os garçons, a equipe de mecânicos também teve acesso à
mansão naquele dia.
Liz e Sharon me aguardam em meu escritório, a expressão
preocupada das duas é a mesma de todos os outros funcionários, por isso
convoco uma reunião geral para esclarecer algumas coisas.
Assim que todos entram encontro o olhar de cada um deles: Giovani,
Brody e Drew me encaram com os olhos vermelhos, alguns garçons estão
assustados, o novo dançarino que deveria começar hoje, Nathan é o nome
dele, esse parece não entender o que está acontecendo, já Chace me olha
com apreensão e adiciono uma nota mental para conversar com ele depois.
— Para quem ainda não sabe, Kevin sofreu um ataque do Cartel
mexicano, ele está no hospital em estado grave — anuncio sem rodeios. —
Rick ficará com ele neste período.
— Ele vai ficar bem? — Drew questiona preocupado.
— Sim, Kevin é forte e vai sair dessa, ele ainda está na UTI, mas
assim que puder receber visitar tenho certeza de que vai adorar receber um
carinho de todos.
— Assinem o cartão que está no balcão do bar antes de saírem —
Sharon pede com calma e todos concordam.
— Vou ser o mais transparente possível com vocês, porque preciso
que entendam a gravidade da situação. — Faço uma pausa para que
absorvam o que vou falar. — Estamos em guerra com o Cartel, o que
aconteceu com Kevin foi retaliação, portanto ninguém está seguro.
— Como assim? — Um dos garçons que começou há pouco tempo é
quem tem a coragem de questionar.
— Vocês sabem o que minha família faz, ninguém aqui entrou
desavisado, mas por ser uma situação extrema não vou julgar quem quiser
pedir as contas agora. Vocês são livres para escolherem continuar
trabalhando na Malícia ou não — digo confiante e olho para cada um dos
meus funcionários. — Para quem ficar, a segurança será reforçada, aqui e
nos bairros onde vocês e suas famílias moram.
— E o evento? — Liz pergunta.
— O show ainda está de pé, mesmo que façamos sem os dançarinos.
A boate também voltará a funcionar esta semana, porém as apresentações
estão suspensas até segunda ordem — anuncio com dor no coração. — Não
se preocupem, vocês continuarão recebendo o salário fixo e um bônus para
cobrir a falta de gorjetas.
Depois dos avisos mais graves, dou a chance para quem quiser sair,
mas para a minha surpresa, ninguém aceita, e até Nathan continua na sala.
Repasso a programação da semana, serão somente DJs locais que farão seus
shows normais na boate, como de costume.
Depois de uma semana fechados e sob pressão da imprensa, nosso
público provavelmente ficará reduzido até que o burburinho termine.
Dispenso meus funcionários, mas faço sinal para Chace ficar. Quando todos
saem fecho a porta e ele se senta na cadeira em frente à minha mesa.
— Gabriel deve chegar a qualquer minuto, temos assuntos a tratar
com você e gostaria que ele estivesse presente — começo com calma e vou
até o frigobar. — Quer beber alguma coisa?
— Estou bem, obrigado — Chace responde sem olhar para mim.
— Como está sua mãe? — Pego uma cerveja gelada, depois do dia
que tive, preciso beber alguma coisa.
— Ela está bem.
— Olha, não quero que fique um clima estranho entre nós, eu não
sabia que você era virgem, não teria provocado daquela forma se soubesse,
por isso peço desculpas. — Sento-me em minha cadeira e espero um tempo,
mas ele se recusa a me olhar diretamente. — Gatinho, eu não peço
desculpas mais do que uma vez, é melhor aceitar logo e podemos continuar
como se nada tivesse acontecido.
— Não consigo fingir que não aconteceu — fala tão baixo que preciso
me inclinar para frente para conseguir escutar.
— Olha, eu achei que tinha pego uma vibe sua, sei lá, a forma com
que me olhava, e para Gabriel também — explico o porquê o provoquei
depois da corrida. — Mas garanto que não vai mais acontecer.
— Por quê? — questiona, dessa vez com a voz firme. Chace ergue a
cabeça e me encara com o olhar magoado — Por que você parou?
A porta abre bem nessa hora, mas ele não desvia o olhar do meu, nem
quando Gabriel entra e fica do meu lado. Esse garoto me confunde quando
demonstra coragem dessa forma.
— Chace quer saber por que paramos — explico ainda firmando o
olhar no garoto em minha frente.
— Você não quer ter sua primeira vez da nossa forma, rapaz —
Gabriel responde rude e coloca a mão em meu ombro.
— Você não sabe o que eu quero — Chace retruca com firmeza. —
Eu disse sim, eu…
— Você quer ser amarrado como Kevin? Quer ter um homem atrás de
você sem poder tocá-lo? Quer ser usado somente para uma foda bruta com
duas pessoas que, depois que tudo acabar, te darão dinheiro e irão para casa
juntos, enquanto você fica sozinho? É isso que você quer? — provoco de
forma dura e certeira e a cada palavra sei que atingi meu objetivo quando
Chace arregala os olhos com pavor e fica vermelho.
— Você não quer isso, garoto, e nós não temos nada a mais para
oferecer — Gabriel complementa.
— Teremos uma relação profissional daqui para frente, só isso —
Levanto-me e termino minha cerveja, vou até a geladeira e trago duas, uma
para Gabriel, que também parece precisar beber algo. — Mas não te chamei
por causa disso, precisamos conversar sobre o que aconteceu com Kevin.
— Na noite do ataque, quando você foi para o ponto de ônibus e nós
te levamos para casa, você estava sendo seguido por dois homens do Cartel
— Gabriel explica e Chace parece confuso. — Sabe nos dizer por quê?
— Como assim? — ele indaga olhando de mim para Gabriel.
— Qual é a sua ligação com o Cartel Mexicano, ou com a Família
Vasquez? — Faço a pergunta e observo sua reação, mas ele continua
confuso.
— Não conheço ninguém com este sobrenome.
— Tem certeza? Talvez seu tio tenha contato com eles ou tenha
alguma dívida quem não estamos sabendo —insisto.
— Não que eu saiba, ele é caminhoneiro e frequenta os
estabelecimentos da sua Família — explica confuso. — Eu nunca tive
contato com ninguém do Cartel, não que eu saiba, pelo menos.
— Seu bairro fica no limite do território deles — Gabriel comenta. —
Viu algum movimento estranho por lá nos últimos dias?
— Não fico observando a rua, é um bairro perigoso e vocês viram,
nossa casa é cercada, por causa da minha mãe.
— Se importaria se instalássemos um sistema de monitoramento? —
Gabriel pede e Chace faz que não com a cabeça. — Ainda essa semana uma
empresa fará a instalação.
— Por que eles estariam atrás de mim?
— Não sabemos ainda e até termos respostas não use o transporte
público, enviaremos um carro para te buscar em segurança quando vier
trabalhar. A Clínica já foi avisada para que as cuidadoras da sua mãe
estejam em alerta, enviaremos soldados que farão a segurança da região —
aviso.
— Mantenha o olhar atento e qualquer coisa corra e chame ajuda. —
Gabriel pega um cartão da minha mesa e anota o seu número particular. —
Aqui, salve no seu telefone e não hesite em usar, se precisar.
— Pode trabalhar em casa essa semana, o movimento vai ser baixo
aqui e quero que termine o material de marketing o quanto antes — ordeno
terminando essa reunião. — Ryan vai levá-lo para casa em segurança.
O soldado já está esperando do outro lado da porta e acompanha
Chace. Depois que ele sai Gabriel e eu nos entreolhamos, ele está tão
preocupado quanto eu com essa situação toda.
— Acha que ele falou a verdade? — pergunto desconfiada.
— Ele não consegue mentir sem ruborizar — Gabriel pontua e um
sorriso se forma em meus lábios só de pensar no gatinho todo corado de
vergonha — Não vá lá, amor.
— Eu sei, mas ele é fofo quando fica com vergonha — comento e
tomo um gole da cerveja que esqueci em cima da mesa. Gabriel faz o
mesmo, sentando-se na cadeira em que antes Chace estava, aproveito para
me jogar em seu colo e ele abraça minha cintura com a mão livre. —
Descobriu algo?
— As empresas saíram de lá logo depois do meio-dia, assim como os
mecânicos, ninguém de fora teve acesso ao aeroporto.
— Isso significa que foi um serviço interno.
— Sim.
— Droga. — Viro minha cerveja em frustração, na esperança do
álcool acalmar minha mente.
— Vai com calma, amor.
— Era só o que me faltava, você querer controlar o que eu bebo,
Gabriel — advirto e tento me levantar, mas ele me segura com força em seu
colo. — Me solta, se está aqui para me monitorar, é melhor pegar a merda
da sua moto e voltar a lamber os pés do meu irmão.
— Não estou tentando te controlar, só preciso da minha companheira
com a cabeça limpa hoje.
— Duas cervejas não fazem nem cócegas, sabe disso — respondo
contrariada e viro o rosto quando ele tenta me beijar. — Está preocupado
que eu ficarei bêbada demais para a gente foder, é isso? — provoco ácida e
certeira.
— Mulher endiabrada, me deixa falar.
— Justo você, o homem que odeia falar, agora está todo cheio de
discursinho…
— Caralho, cala a boca, mulher — Gabriel explode, finalmente
fazendo-me segurar um sorriso. — Max conseguiu imagens da câmera que
fica em frente ao prédio do Kevin, temos dois nomes para executar hoje.
Viro o restante da cerveja de uma vez só e mantenho contato visual
com ele, só para contrariá-lo e mostrar quem manda nessa merda. Apenas
quando a última gosta desce pela minha garganta jogo a garrafa vazia para
trás e passo os dois braços pelo seu pescoço.
— Deveria ter falado antes, Bunny — murmuro doce contra seus
lábios.
— Eu tentei. — Ele devora minha boca em um beijo duro, seus dentes
fecham em meu lábio inferior, provocando-me antes da língua entrar em
minha boca e me fazer gemer. Gabriel segura meu pescoço com sua mão
grande e para o beijo de forma abrupta. — Quero que solte os teus
monstros, diabinha, faça o pior que pode imaginar, hoje teremos vingança
contra quem machucou um dos nossos.
— Sabe que farei tudo o que me ensinou e muito mais — prometo.
— Essa é a minha companheira.
— Sempre.
CAPÍTULO 20

Gabriel
 
Saímos da boate com três carros de apoio, Alícia veio comigo na
moto e a sede de sangue e vingança gritava em seus olhos, o verde das íris
perdido no vermelho injetado de fúria pelo que os malditos fizeram.
Max nos deu a localização aproximada dos dois homens que foram
identificados no vídeo da câmera de segurança, ele é um hacker habilidoso
e em poucas horas conseguiu acesso aos celulares deles e encontrou as
provas que precisávamos.
Aparentemente o Cartel não é tão esperto para encobrir suas merdas,
por isso não conseguem se manter no anonimato e seus líderes precisam se
esconder para não serem presos. Embora hoje os cabeças não importem, a
hora deles vai chegar. No momento o que queremos são as mãos que
machucaram um dos nossos protegidos.
Encontramos os dois em um beco mais afastado, vendendo drogas
como se nada tivesse acontecido. Alícia desce da moto antes mesmo que eu
possa parar e atira no joelho do homem mais baixo, que nos viu primeiro e
tentou correr. O outro puxa a arma e aponta, mas ela é mais rápida e se joga
atrás de uma lixeira.
A troca de tiros começa e um dos nossos soldados acerta o ombro do
desgraçado, isso o faz perder o controle da arma e dá tempo para que Alícia
chegue até ele, prendendo-o em uma chave de braço firme que logo o faz
perder a consciência.
— Amarrem o outro e levem os dois para o galpão, quero todas as
minhas ferramentas prontas e ambos preparados — ordeno impaciente.
— Saiam já daqui. — Jean dispersa os curiosos e dá um tapa na cara
do homem que estava comprando droga e continuava parado, em choque.
— Esse vai largar o vício depois do que viu — debocha quando o homem
começa a chorar e sai correndo.
— Pegue as câmeras. — Aponto para o outro lado da rua e meu
soldado tira fotos, anotando a localização. — Envie para Max.
Nosso hacker saberá como invadir o sistema e apagar as provas de
que estivemos aqui, afinal foi um movimento arriscado, uma troca de tiros
em plena luz do dia, mas nós não vamos esperar.
— Precisamos ir, a delegacia já recebeu ligações — Alícia anuncia,
olhando para a tela do celular.
Subo na moto com ela atrás, seu corpo pequeno cobre as minhas
costas e suas mãos seguram firme em meu peito. Quando pegamos
velocidade, Alícia se solta e grita em uma mistura de raiva e frustração, ela
abre os braços e eu acelero, a velocidade gera ainda mais adrenalina,
instigando-nos para o que virá a seguir.
Meia hora depois nossos soldados já prepararam nossas vítimas, a
tortura neste caso não tem o objetivo específico de conseguir informações,
nós sabemos o que aconteceu. Eles já foram julgados e condenados, porém
ainda precisamos saber algumas coisas, e como o rato pode ser alguém de
confiança, Alícia manda os homens se retirarem.
Eles ficarão de guarda do lado de fora do galpão, o local que usamos
quando queremos fazer uma carnificina e precisamos de espaço. A sala da
Malícia também está preparada, mas durante o dia é arriscado demais levar
vítimas para lá.
Molho um pano no álcool e acordo os dois homens que estão
suspensos pelos pulsos, presos com correntes grossas em ganchos fixados
na viga de concreto, o local é aberto e a luz do sol entra pelas janelas de
vidro quebradas, o piso de concreto polido é fácil de limpar.
O primeiro a abrir os olhos é Gael Rodrigues, 28 anos, pele marrom
escura, cabelos pretos e seu olhar percorre a sala em um desafio. Ele é alto e
musculoso e foi quem atirou contra Alícia e tentou resistir.
Já o segundo homem demora um pouco mais para perceber onde está,
Marco Gonzales tem 21 anos, é baixinho, está acima do peso e seu olhar
assustado entrega a inexperiência. Ele tenta gritar, mas a mordaça amarrada
em sua boca não permite que as palavras saiam inteligíveis.
— Malditos italianos. — Gael cospe em minha direção quando tiro o
pano que cobria sua boca, ele não vai gritar, é mais experiente nessa vida
para saber que não adianta. — Se encostarem um dedo em nós, a guerra
estará declarada — anuncia com firmeza.
— Essa guerra começou quando vocês colocaram a mão em um dos
meus meninos — Alícia abre a caixa de ferramentas e começa a tirar uma
por uma, pacientemente colocando-as lado a lado em cima da mesa de
ferro. — Kevin Lopez já não deve nada ao Cartel, não tinham motivos para
envolvê-lo nisso, mas vocês quiseram me atingir.
— Ele é um desertor, deveria ter sido morto há muito tempo — Gael
comete o erro de retrucar e Alícia pega a faca mais curta e crava no joelho
direito do desgraçado, o urro de dor do homem ecoa pelo ambiente amplo
enquanto ela gira a lâmina, cortando os ligamentos sem tirar os olhos dele,
saboreando cada momento de dor que produz com suas mãos. — VADIA
DESGRAÇADA.
— Grita mais alto, vamos, como o covarde que é — ela provoca e
Marco começa a chorar assistindo à cena, o garoto parece nunca ter visto
uma tortura antes. — Lembre-se que o próximo será você — Alícia fala
para o mais novo e isso parece enfurecer Gael.
— Deixe o menino em paz. — Gael apela pela vida do companheiro,
tentando controlar a dor. — Sua vingança é só comigo.
— Eu sei. O garotinho está se mijando só com uma faca, ele não
aguentaria assistir o que você fez contra Kevin, não é mesmo? — questiona
impositiva e Gael concorda com a cabeça. — Foi a iniciação dele, não foi?
— Sim, ele é inocente, deixe-o ir.
— Mas ele ganhou a tatuagem. — Alícia se afasta de Gael e segura o
queixo de Marco com força, expondo a tatuagem do “X” vermelho que
marca a pele morena dele. — Foi feita ontem, a tinta ainda está fresca, a
pele ao redor está avermelhada e vejo pus em alguns pontos, deve ter sido
feita em um local impróprio, provavelmente um açougueiro por aí que se
diz tatuador, olha essas linhas grotescas. — Aponta para o desenho bem
malfeito e eu sorrio, assistindo minha diabinha em ação. — Doeu bastante,
não é?
O garoto arregala os olhos, que já estão vermelhos com as lágrimas
incontidas.
— Foi usada uma agulha muito fina para preencher a área, e a pessoa
forçou a mão mais que o necessário. A pele do pescoço é fina e sensível,
precisa ir com calma, usar uma agulha especial para preenchimento. Olha
aqui, tem áreas que não têm tinta e áreas que parecem que te cortaram com
uma lâmina. — Avalia cuidadosamente o trabalho malfeito. — Gabriel,
vem cá.
Aproximo-me e fico ao seu lado, bem em frente ao garoto, que perde
o controle da bexiga e o cheiro de urina inunda o local, mas não importa,
somos treinados para isso e acostumados com coisas piores.
— Mostra seu pescoço. — Alícia indica e me viro para ela, deixando
a área do meu pescoço à mostra. — Não é porque fui que fiz, mas olha a
qualidade deste trabalho aqui. — Ela passa a mão livre delicadamente pela
minha pele, me fazendo sorrir. — Ele quase não sentiu dor, e aguentou
quietinho as doze horas de tatuagem para fechar esse pescoço delicioso.
— Foda-se essa merda, deixe ele ir — Gael implora mais uma vez e
sua interrupção irrita Alícia.
— Sabe, eu ia te matar primeiro e fazer o garoto assistir. Essa seria a
tortura dele, depois colocaria uma bala e explodiria seus miolos, rápido e
quase indolor — explica e larga a cabeça de Marco —, mas só porque me
chamou de vadia e me interrompeu, vou mudar meus planos.
— Não, não faça isso, ele não tem culpa.
— Tem razão, você tem, e é melhor lembrar disso enquanto eu
arranco cada centímetro de pele que consigo tirar do garoto antes dele
morrer. — Pego a faca com a lâmina mais fina e afiada, já sabendo o que
virá a seguir. — Começando por essa tatuagem malfeita.
Alícia me olha e seguro o rosto de Marco, que tenta gritar e se
debater, mas sou mais forte e o mantenho firme, com a pele do pescoço
exposta, enquanto Alícia começa a tirar a camada de pele, desprendendo do
músculo aos poucos, até conseguir segurar uma parte com a mão e passar a
faca no restante. O garoto desmaia de dor antes mesmo dela tirar a primeira
fatia e seu corpo amolece em minhas mãos.
— Pegue o cauterizador, assim ele vai morrer antes que eu consiga
tirar mais algum pedaço. — Ela indica o maçarico enquanto termina de tirar
a fatia de pele, o sangue escorre pelas roupas claras do garoto e começa a
manchar o chão.
Acendo o fogo e cauterizo a ferida o melhor que consigo, é uma área
ampla demais e ainda vai sangrar, a diabinha não se conteve e tirou uma
fatia muito grande de pele.
— E agora, o que faremos até ele acordar? — questiona e joga a pele
com a tatuagem no balde ao lado da mesa. Com uma mão na cintura,
manchando sua roupa rosa de sangue, e a outra ainda segurando a faca, ela
parece pensar em seu próximo passo.
— Pare, por favor, ele não merece isso — Gael implora tentando se
soltar das correntes, mas quanto mais luta contra elas, mais seus pulsos são
apertados, até machucar a pele.
— O que eu quero saber é…— Alícia para na frente dele fingindo
curiosidade. — Por que Kevin? Vocês poderiam ter pegado qualquer
homem da Família, até Ravi, que foi quem decepou os seus homens, por
que ir atrás do meu dançarino e nem terminar o serviço?
— Só cumpro ordens — Gael cospe as palavras. — Recebi um nome
e a missão de levar o garoto comigo, mas ele não fez nada, não aguentou
ver o sangue.
— Sim eu já entendi essa parte, não precisa repetir. — Ela se afasta
dele, dando de ombros. — Bem, acho que não tenho mais perguntas.
— Ele está aliviado — comento apontando para Gael, que está
visivelmente relaxado como se esperasse a morte. — Acha que vamos
matá-lo agora.
Alícia solta uma gargalhada alta e macabra, que faz o homem
arregalar os olhos.
— Eu amo como eles são inocentes, amor — fala para mim —, mal
sabem que nem começamos ainda.
— Eu não sei de mais nada, por favor, Marco tem um filho a
caminho, façam o que quiserem comigo, mas deixem ele ir.
— Não — Alícia responde seca e direta. — Agora vamos continuar,
até que ele acorde, vou me divertir um pouco com você.
E é assim que passamos as próximas seis horas. Marco morreu
primeiro, entre a dor e as fatias de pele que Alícia arrancou e eu queimei, o
garoto não durou muito. Já Gael foi mais resistente, ele tinha mais tatuagens
pelo corpo, todas foram arrancadas por ela e por mim, quando ela cansava
eu assumia. Fizemos um estrago em seu corpo e, assim que enjoamos da
pele, partimos para as orelhas, queimando a cartilagem, depois o nariz, e
quando cansamos dos seus gritos, cortamos sua língua fora e o fizemos
engasgar com o próprio sangue.
Só no final abrimos a pele do seu peito, em um corte profundo até
expor os ossos das costelas, com uma serra cirúrgica cortamos cada um
deles e então chegamos ao coração. Gael já não estava mais consciente
quando arrancamos o órgão do seu peito, que pulsou por um tempo na mão
de Alícia até parar de bater, encerrando assim mais uma vida.
— Ahhh — ela grita, apertando o coração inerte em sua mão,
encerrando a vingança que agora está no passado.
Agora preciso dissipar a névoa em minha mente, já sentindo a
adrenalina formada pela tortura começar a baixar, me preparo para o que
virá a seguir.
— Acabou, amor — falo com calma e me aproximo lentamente de
Alícia, seu olhar parece perdido quando ela respira fundo, toda a sua roupa
está manchada de sangue, seus cabelos loiros foram presos no topo da
cabeça e estão tingidos de vermelho. — Vem, vamos deixar que os soldados
limpem isso.
— Não, eu quero mais, preciso de mais — exige e pega o facão da
mesa, em um golpe rápido e certeiro, ela crava a lâmina grande e pesada no
corpo de Gael. — Eles precisam sofrer mais, quero te ouvir gritar,
desgraçado, quem é a vadia agora, hein?
Droga, ela está perdendo o controle. Consigo me aproximar e seguro
o braço que ela tem o facão, impedindo que golpeie o corpo novamente.
Alícia me olha com raiva, perdida em sua escuridão, a outra mão acerta
meu rosto em um soco forte, mas não me deixo abalar e a seguro.
Ela é muito menor que eu, mas é forte e foi treinada por mim, por isso
preciso usar mais força para contê-la e afastá-la das ferramentas em cima da
mesa, não posso deixar que acabe se machucando.
— Amor, me escuta, acabou — sussurro em seu ouvido, suas costas
presas em meu peito, consigo unir suas mãos em frente ao corpo, mas ela
tenta me acertar com uma cabeçada, por sorte desvio logo e a imobilizo. —
Calma, sou eu, respira, amor, sou eu.
Continuo falando palavras carinhosas até que ela pare de se debater e
comece a relaxar, é assim que Alícia fica depois de dar tudo de si para seus
monstros, eu já a vi perder o controle e se machucar uma vez e prometi que
jamais deixaria que isso acontecesse novamente.
— Gabriel? — exala com dor, voltando ao controle.
— Estou aqui, amor. — Solto seus braços e ela se vira para me
encarar, a dor em seu olhar faz meu peito apertar. Alícia é forte e não tem
piedade na hora de torturar ou matar alguém, mas isso não significa que ela
não sinta as consequências depois. — Estou aqui — confirmo e ela me
abraça com força, procurando proteção.
— Acabou? — questiona depois de um tempo.
— Sim, amor, acabou — garanto e beijo o topo da sua cabeça.
— Eles pagaram pelo que fizeram, eu os fiz pagar, não fiz? —
pergunta confusa.
— Sim, você fez.
— Me beija — ela pede em um sussurro.
— Alícia, vamos tomar um banho, em casa a gente…
— Agora. — Ela passa uma mão em meu pescoço e reivindica minha
boca em busca de algo que a distraia do que sente, e se é disso que ela
precisa para acabar com seus demônios, eu darei a ela.
Logo suas mãos empurram meu casaco e erguem minha camisa
encharcada de sangue, suas mãos habilidosas trabalham em minha calça e
liberam meu pau, que está duro por ela e sua fome atiça a minha.
Jogo tudo o que está em cima da mesa no chão e a coloco deitada, tiro
as suas botas com pressa e abaixo suas calças, deixando-a nua da cintura
para baixo, me encaixo no meio das suas pernas e a penetro de uma vez,
duro e firme até o talo.
— Assim, isso, amor — implora e entrelaça suas pernas em minha
cintura —, me fode mais forte.
Seguro-a contra meu peito e calo sua boca com a minha, ela força sua
língua e a chupo, com gosto, enquanto entro e saio da sua boceta molhada,
que se contrai ao redor do meu pau, sedenta por mais. Alícia arranha
minhas costas fazendo-me urrar de dor e prazer. É uma foda dura e rápida,
como se pudéssemos apagar toda a escuridão da nossa alma com um
orgasmo.
Ela se molda a mim, como uma diaba feita especialmente para
receber a minha escuridão. Nossos gritos ecoam pelo ambiente da mesma
forma que antes os dos malditos faziam, e não me importo que os soldados
escutem, fodam-se, que o mundo todo saiba o quanto somos fodidos.
Consigo sentir o sangue dos nossos inimigos embaixo do corpo de
Alícia, que desliza na mesa. Em suas mãos, nas minhas, o vermelho tinge
nossa pele enquanto fodemos como dois animais em busca de libertação.
— Caralho — rosno contra seus lábios, já sentindo minhas bolas
contraírem. — Goza pra mim — peço e sinto quando ela se contrai ainda
mais, ordenhando meu pau, forçando-me à beira da loucura quando suas
pernas tremem e ela goza ao mesmo tempo que a encho com a minha porra.
Foi sujo e errado, mas percebo que era o que precisava quando sinto
seu coração bater contra o meu peito e Alícia relaxar em meus braços, a
respiração ainda ofegante, mas agora seu olhar não está mais perdido, neste
momento ela retornou ao controle e voltou para mim.
— Obrigada — agradece baixinho e me beija delicadamente. —
Obrigada por ser tão fodido quanto eu.
***
Deixo Alícia dormindo em nossa cama, depois que chegamos na
mansão e tomamos um banho, relaxamos um pouco na banheira e ela
apagou em meus braços.
Já passa das 23h e meu estômago está roncando, por isso desço até a
cozinha à procura de algo rápido para comer e resolvo ligar para a corretora
indicada por Liam.
“Senhor Esposito”. A mulher atende com a voz fraca, provavelmente
estava dormindo. “Liam passou seu contato e disse para aguardar a sua
ligação”, explica. “Em que posso servi-lo?”
— Estou à procura de um apartamento próximo da boate Malícia, um
loft estilo industrial que seja no último andar e de preferência que não tenha
vizinhos. — Vou direto ao assunto.
“Farei minhas buscas, devo ter algumas opções até sexta-feira”
— Ótimo, marque uma reunião com Liam e Jenna, acho que não
preciso dizer que esse assunto é confidencial.
“Eu entendo, farei as buscas e negociações sem envolver seu nome.”
— Ótimo. — Desligo sem falar mais nada, pego pão, queijo, tomate e
um frango desfiado e preparo um sanduiche.
A ideia do loft não é nova, quando Alícia e eu assumimos nosso
relacionamento pensamos que seus irmãos não aceitariam, portanto
estudamos comprar um lugar próximo ao local onde a boate seria
construída, mas depois que tudo se acalmou, acabamos ficando na mansão.
Os de Angelis são uma família unida e gostam de estar sob o mesmo
teto, mesmo que não se vejam todos os dias. Alícia e eu passamos mais
tempo na rua do que aqui, Matteo e Sophia viajam bastante e ficam muito
fora de casa devido ao trabalho dela e as funções do Consigliere, quem mais
fica em casa são Andrea e os meninos.
O loft não será uma moradia, mas um esconderijo, um local que
possamos usar como descanso ou para nos refugiar caso aconteça alguma
coisa. Não colocarei em meu nome, portanto ninguém saberá que é meu e
será um local seguro, em tempos de guerra é sempre bom pensar em rotas
de fuga.
CAPÍTULO 21

Chace
 
Esta semana estou trabalhando em casa e não precisei sair, Liz me
passou vários trabalhos de edição, então acabo ficando a maior parte do
tempo em meu quarto, como era antes de começar a trabalhar na Malícia.
Tenho que confessar que sinto falta de sair de casa, já estava me
acostumando com aquela rotina corrida, mesmo que no fim do dia eu
estivesse morto por causa da quantidade de exercícios que eles me
passavam para fazer. E ainda tinham os trabalhos na boate depois, que não
paravam e esgotavam minhas energias.
E mesmo assim, sinto falta do pessoal, estava começando a me
enturmar um pouco, é impossível passar tantas horas com essas pessoas e
não gostar deles. Os dançarinos são incríveis e divertidos, eles treinam e
praticam seus números com seriedade, mas vivem fazendo piadinhas uns
com os outros.
Já os garçons da boate são descarados mesmo, quando conseguem
uma pausa para pegar o número de algum cliente eles aproveitam, parece
que estão caçando durante o trabalho, fiquei admirado de quantas vezes vi
um dos meus colegas saindo abraçado com alguém.
Claro que eu tive minhas oportunidades, mas honestamente, depois do
que aconteceu com a garota de cabelo azul, morro de medo dessa coisa de
uma noite só no carro. Não consigo admitir que com a mão eu demoro mais
do que levando uma simples sarrada.
Mesmo não querendo, ainda saía de lá com o número de alguém, e
olha que nem sou o mais bonito. Claro que comecei a ganhar um pouco de
músculos e acho que minha barriga está mais definida, Rick disse que eu
finalmente soltei o quadril no último ensaio, então acho que estou
melhorando.
Sinto falta até de dançar, que merda, mesmo morrendo de vergonha
eu tentei e dei o meu melhor. Drew e Brody demoraram para me aceitar lá,
Giovani era um pouco chato e me olhava torto, Kevin e Rick foram os que
mais me ajudaram.
Pensar neles faz meu peito apertar, queria visitar Kevin, mas Sharon
disse que ele não está bem para receber visitas ainda, mesmo assim mandei
flores e um cartão desejando melhoras. Acho que até agora não havia
percebido o quão perigoso é me envolver com essas pessoas.
No final das contas eles são mafiosos fora da lei, é óbvio que têm
inimigos e são perigosos. Às vezes até eu me admiro com o quanto sou
trouxa nesse mundo, ou desligado demais, não sei.
Claro que ter uma arma apontada para você e pensar que ia morrer foi
aterrorizante, mas morrer é rápido, mesmo que Gabriel tenha dito que me
faria sofrer, acho que acaba logo. Kevin terá meses para se recuperar
fisicamente e nem posso imaginar o quão difícil será para superar esse
trauma.
Tive vontade de ligar para Alícia e saber mais sobre ele, ver se posso
ajudar em algo. Eu me sinto meio inútil ficando em casa, mesmo que esteja
trabalhando bastante e já tenha entregado quase todos os vídeos e imagens
da campanha para o evento, parece que não estou fazendo o suficiente.
Sem Kevin e com o Rick cuidando dele, Alícia disse que as danças
foram suspensas, o que me deixou um pouco decepcionado. Por algum
motivo estava ansioso em participar dessa parte, como não é um número
complicado, era só dançar sem camisa na plataforma em frente ao palco,
achei que seria divertido, e talvez, só talvez, ela reparasse em mim.
Sim, eu não tenho amor-próprio, mesmo depois de ser rejeitado ainda
penso nela.
Que droga, Chace, tira isso da cabeça. Ela deixou claro que não vai
acontecer, só estava me provocando para uma noite e, quando viu que eu
era virgem, desistiu sem pensar duas vezes.
Tanto ela quanto Gabriel só querem uma foda fácil, devem ter vários
contatos para isso, eles têm dinheiro para pagar alguém profissional e são
dois gostosos que conseguem conquistar qualquer um, afinal, quem não
gostaria de estar no meio dos dois? Eu queria muito.
Droga, preciso parar de pensar nisso, estou ficando duro e frustrado e
não aguento mais bater punheta, uma hora com raiva deles, outra com
desejo por eles, está difícil continuar assim.
Hoje é sábado e o dia amanheceu bonito e com sol, tia Cami sugeriu
que levássemos minha mãe para um passeio no parque, ela preparou um
piquenique para almoçarmos fora, e por sorte minha mãe acordou mais
lúcida e animada. A cuidadora deu os remédios e ficou feliz quando
comentamos sobre sair.
Estou me acostumando a ter pessoas estranhas em casa, a clínica
mantém várias cuidadoras que se revezam para não deixar horários vagos,
às vezes isso estressa minha mãe, mas logo ela se acalma. No geral Clarissa
só lembra da sua irmã, nos melhores dias ela me olha com carinho e sabe
que sou seu filho, mas acha que sou mais novo. Os piores são quando ela
não lembra de ninguém e fica assustada por não saber onde está. Nessas
horas é preciso ter calma e tato para lidar com a crise e eu não posso ficar à
vista, minha mãe me confunde com meu pai e isso a faz gritar de medo, ou
se encolher em algum canto, temendo que eu faça algo contra ela.
Só posso imaginar a índole do desgraçado, ela quase nunca fala dele,
nem nas crises e muito menos quanto está lúcida, acho que assim é melhor.
Às vezes quero que ela passe dessa fase logo e esqueça que ele existiu, me
dói pensar assim, por que dessa forma ela esquecerá de mim também, mas
se é para tirar seus terrores, eu não me importo.
O parque está tranquilo e o dia não está tão quente, então várias
famílias se reúnem no gramado, nosso bairro é pobre e não tem muita área
verde ou praças para as crianças, este é o único lugar mais ajeitado que não
é perigoso.
Estendo uma toalha xadrez vermelha bem grande na grama e a
cuidadora ajuda minha mãe a sentar, ela parece tranquila, mas seu olhar está
perdido, como se tentasse lembrar onde está e quem somos nós, isso só
muda quando tia Cami pega sua mão e fala com ela.
— Clarissa, o dia está lindo, não é mesmo? — constata, apaziguando
minha mãe.
— Sim, irmã, você fez um piquenique para mim?
— Fiz. Olha só, eu trouxe tudo o que você gosta. — Mostra a cesta e
começa a tirar os sucos e sanduíches de dentro, depois entrega um pirulito
grande e colorido para cada um e minha mãe abre um sorriso encantador. —
Achou que eu iria esquecer?
— Você é a melhor irmã do mundo, Cami — minha mãe agradece e
olha para o doce como se fosse sua coisa preferida no mundo. Ela está linda
em um vestido florido azul-claro, e a cuidadora prendeu seu cabelo em um
rabo de cavalo alto na cabeça.
— Quando éramos crianças nosso pai não tinha dinheiro para doces
ou porcarias, ele era caminhoneiro e vivia na estrada, mas sempre que
voltava trazia pirulitos assim para casa — tia Cami explica e entrega um
doce para a cuidadora, outro para mim e abre um para ela.
— Onde o papai foi? — Minha mãe quer saber e olha para os lados à
procura do pai.
— Ele logo vem. Está gostoso? — Minha tia tenta distrai-la.
— Sim, quem é sua amiga?
— Essa é a Marta, ela queria aproveitar o sol também — tia Cami
apresenta a cuidadora.
— E esse daí? — ela fala mais baixo e aponta para mim. — Papai vai
te matar se souber que estamos com um menino aqui, sabe que ele não
gosta.
— O papai sabe, Chace é da família.
— Você não parece estranho — minha mãe me olha mais atentamente
e sorrio para ela —, você é bonito, seus olhos me lembram alguém. —
Então ela muda sua expressão para tristeza.
— Quem ele te lembra, Clarissa? — a cuidadora questiona.
— Ele parece com o… seus olhos… — murmura, perturbada, como
se tentasse encontrar um nome. — Talvez eu só esteja confusa. — Balança
a cabeça de um lado para o outro dispersando os pensamentos. — Posso ir
na gangorra, irmã? Por favor, eu prometo não me sujar.
— Claro, deixa o doce aqui, a Marta vai com você — tia Cami
responde sorrindo e minha mãe se levanta animada, estende a mão para a
cuidadora como se fosse uma criança convidando a amiguinha para brincar
e assim elas vão até os brinquedos escassos do parque. — Ela está um
pouco perdida hoje.
— Você lembra do meu pai? — faço a mesma pergunta que já fiz
antes e sei a resposta.
— Eu não o conheci, querido, você sabe da história. Sua mãe fugiu de
casa quando o conheceu e fiquei anos sem saber dela, quando ela entrou em
contato novamente você já tinha seis anos e ela havia acabado de ter o
diagnóstico de Alzheimer.
— Mas ela nunca te falou um nome? Nem algum episódio, nada?
— Não, querido, ela só disse que ele sumiu e a deixou sozinha para
cuidar de você. Ela estava assustada, por isso me ligou. Quando cheguei à
cidade sua mãe tinha duas casas em seu nome e uma quantia de dinheiro no
banco, mas não era muito e não faço a menor ideia de como ela conseguiu
isso trabalhando como garçonete.
— Só queria saber o nome do desgraçado que a deixou sozinha e com
um filho para criar, nem o nome dele na minha certidão eu tenho, tia —
desabafo frustrado. — Ela tem medo de mim quando pensa que sou ele, eu
tenho memórias muito antigas de alguém gritando, lembro de um homem
com cabelos brancos, acho que era ele.
— Você era pequeno demais, querido, não tem como se lembrar
disso.
— Mas eu queria saber. Por pior que seja, gostaria de entender o que
aconteceu, é uma parte da minha história.
— Gostaria de poder te ajudar, sabe que te falaria se soubesse, mas
ela nunca me deu um nome, nem quando estava em suas piores crises. Da
última vez ela só me pedia para manter segredo, que ele não queria que
ninguém soubesse.
— Meu pai?
— Acho que sim, eu não sei o que sua mãe passou, mas se eu tenho
uma certeza é a de que seu pai, quem quer que ele seja, não é uma boa
pessoa, e se ele não assumiu o próprio filho é porque tinha um motivo para
isso.
— Será que ele era casado? — teorizo e minha tia dá de ombros. — É
frustrante não saber, só queria que ela me contasse.
— Não é culpa dela, ela fez o melhor que pôde — minha tia
repreende. — Sua mãe é uma mulher incrível, dói muito não poder fazer
nada enquanto ela se perde dentro de si mesma.
— Eu sei, tia — vou até ela e a abraço carinhosamente —, obrigado
por cuidar de nós, você também é uma mulher incrível.
— Não tem que agradecer, você sabe que é como o filho que eu nunca
tive. — Ela acaricia meu cabelo e me dá um beijo no rosto.
— Acho que nunca te perguntei, mas você não quer ter filhos? A
senhora ainda é jovem — provoco, chamando-a de senhora e arranco um
sorriso da minha tia.
— Tenho 47 anos já, por sorte tudo aqui já secou — aponta para a
barriga —, e eu nunca me imaginei com filhos. Tive o prazer de participar
da sua criação, mas mesmo assim não me vejo como mãe, tia Cami já está
ótimo.
— Tio Osvaldo não quer filhos? — questiono pensativo.
— Não, quando casamos ele sabia que eu não pensava em crianças e
ele também não queria esse comprometimento.
— Ainda não sei como consegue ficar com um homem como ele,
você merece alguém melhor, tia. Um homem que esteja em casa e te trate
com carinho, ele nem te abraça.
— Não julgue o relacionamento dos outros, querido. Seu tio é uma
pessoa fechada, mas é meu melhor amigo, ele pode não ficar muito em casa
e tem seus vícios, mas nunca deixou nada faltar para mim.
— E isso é suficiente?
— Chace, quem te levava ao parque quando você era pequeno? —
pergunta, fazendo-me buscar em minhas memórias mais antigas.
— Meu tio, mas ele não brincava comigo, ele só ficava ali sentado. —
Aponto para os bancos próximo ao parque em que minha mãe e a cuidadora
estão brincando na gangorra.
— Sabe por que ele te trazia?
— Porque você mandava.
— Ele não queria que você assistisse sua mãe em crise. Quando o
Alzheimer começou, ela esquecia de coisas básicas e tinha crises quando te
via, eu precisava ficar com ela para acalmá-la, então seu tio te levava para
algum lugar.
— Lembro de andar de caminhão com ele, mas eu tinha que ficar
calado, ele me xingava se eu fizesse perguntas.
— Sim, ele te levava junto para entregas na cidade quando eu não
podia ficar com você. — Tia Cami sorri com a lembrança. — Você adorava
andar de caminhão.
— Mas ele ainda joga e gasta o dinheiro de vocês com esse vício —
comento contrariado. — Foi ele quem me colocou em contato com o agiota.
— Eu sei, como eu disse, ninguém é perfeito. E honestamente,
querido, você parece bem mais feliz trabalhando naquela boate do que
antes, quando ficava em casa o dia todo mexendo no computador —
desabafa com carinho. — Está mais corado, ganhou peso e até sorri mais.
— Falando assim parece que está feliz por eu trabalhar para a máfia
— reclamo baixinho.
— Você matou alguém? — questiona seriamente.
— Claro que não, que pergunta é essa?
— Fez mal para alguma pessoa?
— Óbvio que não, tia, você me conhece.
— Então não tenho do que reclamar, eu ajudei a te criar e gosto de
pensar que fiz um bom trabalho. — Ela me oferece um sanduíche. — Você
está fazendo de tudo para dar o melhor para sua mãe, eu respeito isso. Não
me importo que seja trabalhando em uma boate para pessoas como aquelas,
se eles têm dinheiro para bancar o tratamento da sua mãe, deixe que façam
isso, depois a gente dá um jeito de pagar de volta.
— Eles ainda não me cobraram nada, por enquanto estou trabalhando
para pagar a dívida que já tinha — explico pensativo. — Alícia disse que
não devo me preocupar com isso, como se dinheiro não fosse nada.
— Querido, para pessoas como eles, não é mesmo. O que a gente
trabalha o mês todo para receber, eles gastam em um almoço ou em uma
peça de roupa. Quem nunca contou as moedinhas, como nós, não vai
entender.
— Eu não queria aceitar caridade.
— Aceitar ajuda não é errado, ainda mais quando vem de bom grado,
errado é tirar de quem tem menos que você — explica com sabedoria. —
Eles não te obrigaram a fazer coisas que você não quer, certo? Você não
está… usando seu corpo para pagar?
— Não, tia, não estou me prostituindo para pagar minha dívida. —
Sorrio com sua pergunta envergonhada. — Só preciso aprender a rebolar e a
ser sexy, nada mais.
Tia Cami solta uma gargalhada alta quando coloco o dedo na boca e
finjo sensualizar.
— Ai, menino, você me mata — comenta com lágrimas nos olhos.
— Por que, tia? Não acha que posso ser sexy? Olha esse corpinho
definido aqui. — Aponto para meu corpo magro e sem muito músculo
aparente.
— Tenho certeza de que sim — responde entre risos. — Falando
nisso, agora que está saindo mais de casa, trabalhando em uma boate
movimentada, será que logo terei o prazer de conhecer uma das suas
namoradinhas? — pergunta e desvio o olhar, sentindo meu rosto queimar.
— Ou namoradinho, não me importo.
— São tantas, tia, como vou escolher uma especial para te apresentar?
— brinco tentando fugir do assunto.
— Quando a pessoa certa chegar, você vai saber.
— Foi assim com você quando conheceu tio Osvaldo?
— Não, eu precisava me casar para sair de casa, ele queria alguém
para dividir um lugar e foi assim que entramos em um acordo que
beneficiou os dois. O amor veio depois, com a convivência.
— Talvez eu esteja melhor sozinho — comento com tristeza.
— Primeiro temos que estar bem com a nossa companhia e só então
estaremos abertos para receber o amor de outra pessoa. Você é incrível,
querido, mas não se feche para o amor, quando a pessoa certa aparecer você
vai sentir isso.
— Como?
— Acho que para cada pessoa é diferente, então não tenho como
saber como será para você — fala com a sua voz doce e olhar carinhoso —,
mas espero que seja alguém que te faça sentir seguro e feliz.
Neste momento minha mãe e a cuidadora voltam, felizes depois das
brincadeiras. Marta é experiente e bem treinada para lidar com as mudanças
repentinas da minha mãe, sem julgamentos, ela assume o papel que precisa
para deixá-la tranquila e segura.
Passamos a tarde aproveitando o sol, comemos os sanduíches com o
suco e curtimos um dia bom, em família.
CAPÍTULO 22

Alícia
 
O retorno do meu irmão da Rússia foi conturbado, primeiro porque
ele voltou um dia antes do esperado e não ficou nada feliz quando Matteo o
informou sobre o que aconteceu. Outro fator foi que ele trouxe um russo de
contrabando.
O homem loiro de olhos cinza muito claros e um sorriso debochado
me chamou a atenção assim que Lorenzo entrou em nossa sala de reuniões.
O russo tinha o pescoço e as mãos fechadas de tatuagens, o que indicava
que tinha muito mais naquele corpo que não estava visível devido ao terno
todo preto.
Ele não falou nada, mas ficou na sala enquanto meu irmão ouvia
Matteo fazer o relatório. Somente o alto escalão da Família estava presente:
meus irmãos, os Underbosses, Gabriel e eu, por isso fiquei ainda mais
desconfiada, mas esperei até o final, reunindo toda a paciência que não
tenho.
Quando Matteo terminou de falar e Lorenzo fechou os olhos para
absorver tudo, não me controlei mais e precisei perguntar.
— Agora você vai falar quem diabos é esse russo que você trouxe de
chaveirinho? E por que ele está na reunião que deveria ser só para os
membros da Família?
— Alícia, este é Andrei Petrov, filho de Mikhail Petrov — Lorenzo
apresenta e o loiro dá um passo à frente estendendo a mão para me
cumprimentar. Ele é tão alto quanto Lorenzo, muito musculoso e tem um ar
prepotente.
— Ao seu dispor — Andrei fala com um sorriso debochado, o olhar
desce pelo meu corpo, avaliando-me descaradamente.
— E o que o herdeiro da Bratva está fazendo aqui? — Hesito um
momento antes de pegar a sua mão e apertar bem forte, como um desafio,
espero para ver se vai fazer o mesmo, mas ele só segura firme.
— O herdeiro é meu irmão, Dimitri, eu sou só um soldado e estou
aqui em uma missão especial — explica calmamente antes de soltar minha
mão e voltar sua atenção para o Don. — Já gostei da sua irmã, qual é o
cargo dela?
— Pode perguntar diretamente para mim, eu sei falar — repreendo
antes que meu irmão responda e recebo um olhar contrariado —, e sou uma
executora.
— Uau, por essa eu não esperava. — Ergue as sobrancelhas, surpreso.
— Acho que vamos nos dar muito bem, tenho um tombo por mulheres
perigosas. — Andrei pisca para mim e preciso conter um sorriso.
Nessa hora Gabriel, que estava um pouco atrás de mim, dá um passo à
frente e coloca a mão em minha cintura, claro que o Russo percebeu o gesto
possessivo e se afastou com as mãos para o alto.
— Não está mais aqui quem falou.
— Andrei está aqui por ordens do Pakhan, para investigar o braço da
Bratva em Boston, mas a missão é sigilosa, portanto ninguém pode saber
quem ele é — Lorenzo explica seriamente. — Ele vai te acompanhar na
boate como se fosse só um segurança normal e tem passe livre em todo o
nosso território.
— Impossível — corto meu irmão e ele me fuzila com o olhar. —
Olha para o homem. — Aponto para Andrei que parece confuso. — Ele não
parece em nada um dos nossos, fora que não passará despercebido com
essas tatuagens e o cabelo mais loiro que o meu.
— Eu não vou pintar meu lindo cabelo, se essa for a sua sugestão.
— Não resolveria, mas eu tenho sim uma sugestão. — Eu me animo
com a ideia que se forma em minha mente e quando olho para Matteo, meu
sorriso se alarga ainda mais. — Já sei como te usar na minha boate sem que
ninguém questione de onde você veio.
Todos parecem apreensivos para ouvir a solução, mas só consigo
olhar para Matteo na esperança de que ele entenda o que quero dizer e,
assim que seus olhos arregalam em surpresa, meu irmão solta uma
gargalhada alta e se contorce de rir.
— Fala logo, Alícia — Lorenzo ordena, impaciente.
— Já que Kevin está internado e Rick vai cuidar dele, eu iria cancelar
a participação dos meus meninos no show — comento e Matteo para de rir.
Eu não havia falado isso para ele ainda, queria torturá-lo por mais um
tempo, mas agora tenho uma solução. — Mas com um russo alto, forte,
todo tatuado e musculoso assim…
— Vai com calma, docinho — Andrei interrompe, mas vejo o sorriso
de canto que se forma em seu rosto, ele está todo convencido.
— Se o russo souber tirar a roupa e fingir ser sexy, pode se apresentar
com os meus meninos — anuncio e sou surpreendida com o olhar
desafiador de Andrei. Achei que ele recuaria, escandalizado pela proposta.
— E aí, você é só um corpinho bonito ou sabe ser sexy também?
— Se não fosse pelo olhar mortal que estou recebendo do seu
namorado, casaria contigo agora mesmo, só pela cara de pau — provoca e
sinto a mão de Gabriel mais firme em minha cintura. — Eu topo.
— Andrei, minha irmã só está provocando, ela não precisa de
dançarinos. Podemos colocar você como um garçom. — Lorenzo tenta
intervir.
— Na verdade, sendo um dos dançarinos, você terá acesso aos
ensaios e a todo o backstage do show — explico para forçá-lo a aceitar. —
E eu realmente quero me apresentar com os meninos na plataforma, faz
tempo que não subo no palco, tem que ser algo especial.
— Será um prazer ser o teu menino — provoca com uma piscadinha.
— Um dos teus meninos — ele se corrige antes de estender a mão para
mim. Em um aperto tão firme quanto o meu, fechamos o contrato.
— Para não levantar suspeitas, Andrei ficará em um apartamento
alugado no centro. Alícia e Gabriel, quero que vocês o ajudem com o que
ele precisar enquanto estiver na nossa cidade, prometi ao Pakhan que seu
filho estaria seguro — Lorenzo ordena seriamente.
— Pode deixar que eu cuido dele, irmão — respondo sorrindo. —
Temos duas semanas ainda para você entrar em forma e aprender alguns
movimentos básicos, vou te apresentar ao pessoal na segunda-feira, esteja
na boate às 14h.
— Sim, chefe. — Ele finge bater continência. — Caralho, vai ser
demais trabalhar contigo, e claro, com o seu namorado. É Gabriel, certo?
Andrei estende a mão em direção a Gabriel, quase tocando seu braço,
mas sou mais rápida e seguro seu pulso com firmeza. Agora, sem
brincadeira nenhuma, giro o braço estendido, forçando-o a se virar, seguro
sua mão atrás das suas costas e o empurro contra a parede, ele não luta
contra, talvez por ser pego de surpresa, ou está tentando ver até onde eu
vou, não importa.
— Este será o único aviso: toque no meu homem e eu vou quebrar
cada osso da sua cara, estou pouco me fodendo para quem é o seu papai. —
Forço ainda mais seu pulso para trás, sentindo a junta estender mais do que
deveria e tenho certeza de que ele está com dor, porém não escuto
reclamações. — Você entendeu?
— Entendido.
Espero alguns segundos a mais para confirmar que o recado foi
passado antes de soltá-lo, seu sorriso agora é menor e o olhar demonstra
curiosidade. Meus irmãos soltam a respiração quando me afasto, a tensão na
sala é palpável.
— Se não precisam mais de nós, temos coisas a fazer. — Pego a mão
de Gabriel e o conduzo para fora, sem esperar respostas.
Ao chegarmos em nosso quarto, tranco a porta e coloco nossos
celulares no cofre antes de me jogar na cama e respirar fundo.
— Por que fez isso? — Gabriel questiona e se deita do meu lado, sem
me tocar.
— Porque eu posso — digo confiante. — Não confio no russo, e
assim ele estará embaixo dos nossos olhos o tempo todo.
— Você quer garantir que Matteo cumpra a aposta de vocês.
— Esse é só um complemento. — Viro-me para encarar Gabriel e seu
rosto está pensativo. — Você está bem?
— Sim, você salvou a mão dele — brinca, tentando sorrir, mas não
tem diversão em sua voz.
— Eu protejo você. — Vou até ele e passo a mão em seu peito, abro
dois botões da camisa preta e toco o relevo em sua pele, mas Gabriel não
fica tenso, não comigo. Sou a única que consegue tocá-lo assim, sem que
sinta medo.
— E eu protejo você. — Ele me puxa e beija minha testa
carinhosamente.
 
***
 
Esse maldito russo debochado está me dando nos nervos. Andrei
canalizou o stripper que ele acha que é durante esses três dias em que está
treinando e aprendendo a coreografia com Giovani, Brody e Drew.
Meus meninos não ficaram muito felizes em retomar o show sem
Rick para coordenar, mas quem manda nessa porra sou eu, e se agora eu
digo que terá dança durante a minha apresentação, é isso que vai acontecer.
Na segunda-feira fizemos um teatrinho para a equipe, como se Andrei
tivesse sido indicado para o trabalho. Ele até inventou uma história fajuta de
que já havia dançado em uma boate fora do país, para justificar o sotaque,
que não é tão carregado para um russo.
Ninguém além de mim e Gabriel sabe quem ele é realmente, portanto
o tratamos como qualquer dançarino, só que o desgraçado é debochado e
parece ter mudado sua missão para me atormentar.
Primeiro que ele não abaixa a cabeça quando ordeno alguma coisa,
ele sorri e me responde. Brody até tentou avisá-lo de que não deve mexer
comigo, mas o russo se fez de desentendido e continuou provocando.
Não interferi mais nos treinos, os cinco começaram a se dar bem e
encontraram um número com movimentos fáceis para que Andrei e Nathan
consigam seguir.
O russo não é dos piores dançarinos, ele sabe se mover e tem um bom
requebrado, não é nada duro nos quadris. Claro que deve treinar pesado, seu
corpo é todo forte e musculoso, e, como eu previa, coberto de tatuagens.
Algumas são marcas da Bratva, desenhos especiais que têm mais
significado do que qualquer medalha de honra, mas outras são diferentes,
bem trabalhadas e detalhadas, me peguei observando seu corpo pelas
câmeras de segurança, logo depois do aquecimento dos meninos.
Giovani tomou para si o trabalho de repassar a coreografia com
Andrei e avaliar as habilidades dele para ver quais os movimentos eles
conseguiriam fazer no dia da apresentação. Meus meninos são habilidosos,
Rick ainda é o mais experiente, mas Brody tem o número mais desafiador e
Giovani faz até pole dance. Nathan é o mais inexperiente, porém conseguiu
surpreender até Drew nos poucos ensaios que participou.
Confesso que fiquei presa no corpo do Andrei por um tempo, talvez
eu tenha babado um pouco no meu teclado? Talvez, mas ninguém pode me
culpar. O russo é realmente um gostoso e eu tenho um tombo por homens
tatuados. Consegui até ver algumas partes em que sua pele não tem
desenhos e me imaginei colorindo estes pontos, fechando a pele clara com a
minha máquina, talvez afundando um pouco mais a agulha para um traço
mais grosso e marcado, quem sabe assim ele geme de dor e…
A visão de alguém se aproximando nas imagens da escada chama
minha atenção, então vejo Chace subindo com sua mochila nas costas, uma
calça de moletom cinza e a camiseta branca. Seu cabelo está mais curto,
deve ter sido cortado recentemente e seu rosto fica cada vez mais tenso
assim que encontra os meninos.
Vejo Drew o cumprimentar de longe, Brody sorri e dá um tapinha
alegre nas costas de Chace, Nathan aperta sua mão e o recebe feliz por ter
mais alguém iniciante ali, já Giovanni o olha estranho antes de falar.
— Achei que tinha desistido — comenta com desdém. — Não me
leva a mal, mas temos pouco tempo até o dia do evento e acho que já temos
dançarinos suficientes.
— Desculpa, a Liz me avisou que teria apresentação, eu achei que…
— Chace passa a mão pelo cabelo, claramente desconfortável com a
situação, vejo seu rosto por outra câmera e ele está ficando vermelho, mas
não é bom.
— A gente já tem cinco dançarinos, Mali disse que terá mais um para
o canto mais escuro, não precisamos de você. É melhor focar nos vídeos e
falar com a Sharon para te colocar no bar — Giovanni solta seu veneno e
suas palavras me fazem ferver de ódio.
Estou quase me levantando para interferir quando Andrei passa um
braço pelo ombro de Chace de uma forma que parece protetora, o rosto do
russo expressa uma ilusão de tranquilidade, mas não consigo identificar a
emoção em seu olhar.
— Olá, me chamo Andrei — ele se apresenta calmamente. —
Também sou novo, estávamos começando a repassar a coreografia para o
evento.
— Ele não vai conseguir, nem com Rick trabalhando com o moleque
por dias ele aprendeu alguma coisa. — Giovani não sabe quando calar a
boca.
— Você acabou de falar que será fácil — Andrei rebate com deboche,
calando Giovani. — Vem, eu te ajudo a soltar o quadril antes de começar os
ensaios.
Chace larga sua mochila no canto e segue Andrei até a área onde eles
ensaiam, de frente para o espelho o garoto começa a flexionar os músculos
de forma tímida, tira os tênis e começa os exercícios de aquecimento de
rotina. O que me faz realmente sair da minha sala e praticamente correr até
a academia é o olhar de desejo no rosto do russo.
Filho da puta abusado!
Quando chego, Andrei está parado atrás de Chace, seu quadril muito
próximo da bunda dele. O russo tem as mãos firmes na cintura de Chace e
faz com que se mova de um lado para o outro, quase esfregando seu pau no
meu gatinho.
Não penso duas vezes e acerto meu punho fechado no queixo de
Andrei, com toda a força que consigo. Coloco todo o meu peso em um
direto certeiro que o faz se afastar de Chace.
— Caralho, garota — Andrei reclama, seu olhar frio me encara com
raiva enquanto ele leva a mão ao queixo. — Para que isso?
— Não encosta nele — aviso com a voz baixa e ameaçadora e coloco
Chace atrás de mim.
— Mali, você está bem? — Drew se aproxima com cuidado, sem
coragem para interferir, mas eu não respondo, mantenho contato visual com
o russo deixando-o saber que a ameaça é séria.
— Eu não… — Chace tenta intervir, mas só com um olhar de canto
ele se cala.
— Chace, na minha sala, AGORA!
Saio sem conferir se está me seguindo, então escuto Giovani
murmurar alguma coisa em voz baixa e me aproximo dele.
— É melhor calar essa boca e parar de criar atritos aqui dentro,
Giovani — ameaço seriamente e vejo seu olhar arregalar de medo quando
ele caminha um passo para trás. — Eu estou no comando dessa merda, se
eu mandar ensinar a coreografia para Chace, é isso o que você vai fazer.
Não é porque o Rick não está que eu não sei o que acontece aqui dentro.
— Desculpa, Mali, eu não quis…
— Foda-se o que você quer, e sabe de uma coisa? Se o garoto não
tiver um bom desempenho no dia do show, vou culpar você por não ter se
esforçado para ensiná-lo.
Sigo para a minha sala com rapidez, estou puta com o que vi, minhas
mãos estão tremendo de raiva e quando Chace fecha a porta depois de
entrar, me viro para encará-lo.
— O que você pensa que está fazendo aqui? — questiono autoritária.
— Liz disse que…
— Foda-se, você tem que terminar a campanha antes de qualquer
coisa, ela sabe disso e tinha ordens para não te chamar até que tudo
estivesse finalizado.
— Mas…
— Eu tô cansada de gente incompetente, cansada — desabafo e
começo a caminhar de um lado para o outro, vejo o olhar acuado de Chace,
mas não me controlo. — Eu falo as coisas, mas parece que ninguém escuta.
Aí eu coloco uma arma na cabeça das pessoas e sou taxada de
esquentadinha, mas parece a única forma de fazê-los me obedecer.
— Eu terminei — murmura com a voz baixa e paro no lugar, fitando-
o em dúvida. — Enviei para ela toda a campanha hoje de manhã, foi então
que Liz me contou das mudanças de planos, mas ela não disse que eu
estaria incluso, eu só pensei… — hesita por um momento, respirando fundo
para tomar coragem. — Só queria ajudar, tá legal?
Eu me aproximo dele com calma, avaliando sua reação, vejo seus
olhos castanhos brilhando, sua respiração contida a cada passo que dou, o
rosto começa a tomar aquele tom avermelhado tão lindo que faz meu
coração bater mais rápido.
— Você veio para ajudar?
— S-sim.
— E se esfregar no Andrei fazia parte do plano?
— Eu não estava… Ele só me ajudou…
— Não quero te ver se esfregando com os outros dançarinos, estamos
entendidos? — ordeno e paro em sua frente, meu rosto a centímetro do dele.
Preciso olhar para cima devido à diferença de altura, e seu cheiro domina
todos os meus sentidos assim que inspiro mais profundamente. —
Responde.
— Por quê? — questiona com a voz trêmula em um rompante de
coragem. — Por que não posso me esfregar nele? Andrei parecia estar
gostando, se ele quiser, não vejo nada demais. Afinal, você mesma disse
que eu deveria procurar alguém, uma pessoa que me tratasse bem, quem
sabe Andrei seja essa pessoa.
— NÃO! — rosno em fúria com a sua provocação e sem conseguir
me segurar, uno nossas bocas em um beijo dominante, seus lábios macios se
abrem instintivamente, dando-me permissão para tomá-lo por inteiro.
Com uma necessidade absurda por controle, seguro seu pescoço com
uma mão e levo a outra para a sua cintura, puxando-o para mim. Chace
geme contra meus lábios e não fica parado por muito tempo, logo suas mãos
estão na minha bunda, firmes, fortes, atrevidas, em um aperto tão
possessivo quanto o meu.
Sua língua invade a minha boca primeiro, devorando-me, e eu a
chupo, sentindo o gosto doce de chocolate. O ritmo frenético logo dá
espaço para algo mais profundo, Chace me beija com doçura, moldando
seus lábios aos meus e explora cada centímetro da minha boca, morde meu
lábio inferior fazendo-me soltar um gemido contido, fazendo-o sorrir de
canto. Caralho, não quero me afastar, preciso de mais, sinto meu coração
bater tão rápido que parece que tenho um tambor no peito.
Com mais um toque dos seus lábios nos meus, ele sobe as mãos pelo
meu corpo, roçando os dedos em minha pele antes de me abraçar. Sinto seu
corpo quente me envolver em algo que só havia sentido com Gabriel, uma
mistura de carinho e proteção que me deixa confusa e sedenta por mais.
Solto seu pescoço e me deixo relaxar em seus braços, acaricio seu
cabelo escuro e escondo meu rosto na curva do seu pescoço, deliciando-me
com o cheiro do seu perfume amadeirado.
— Ali, isso foi…
— Eu sei — corto e ele me abraça mais forte, sinto sua respiração
contra meu pescoço, ele planta um beijo delicado bem ali. Tem ternura e
devoção no gesto, o que me faz arrepiar. — Estou confusa — sussurro
baixinho.
Ele não responde, só me acomoda mais em seus braços.
É o sentimento de culpa que me faz acordar para a realidade e me
afasto calmamente. Chace me olha sem entender, mas não consigo encarar
aqueles orbes castanhos agora, não quando parece que acabei de trair o
amor da minha vida.
— Ali — ele me chama, mas ergo a mão, calando-o.
— É melhor você voltar para o ensaio — aconselho desviando do seu
olhar confuso. — Eu preciso pensar.
— Tudo bem — escuto o exalar pesado da sua respiração, então a
porta abre e fecha pouco depois e fico sozinha.
Eu nunca beijei outra pessoa sem que Gabriel estivesse junto, o gosto
amargo de traição invade minha boca como veneno, e o pior é que não
pareceu errado. Caralho, por que eu deixei chegar a este ponto?
CAPÍTULO 23

Chace
 
Alícia me beijou.
Será que estou sonhando ou realmente aconteceu? Não pode ser um
sonho, ainda sinto seu gosto doce em minha boca, misturado com os
resquícios de um chocolate que havia comido antes de chegar.
Não foi um sonho.
Ela realmente me beijou, eu a tive em meus braços, seu corpo
pequeno se moldou ao meu como se ali fosse seu lugar. O cheiro do seu
perfume ainda está impregnado em minha camiseta enquanto ando
desatento de volta à academia.
— Hey, garoto — uma mão grande e tatuada me segura, forçando-me
a parar e encarar os olhos cinza do novo dançarino, acho que ele se chama
Andrei. — Está tudo bem? — questiona com as sobrancelhas erguidas.
— O quê?
— Ela foi muito dura com você? — Ele parece realmente preocupado
e posso jurar que seu olhar recai sobre meu corpo de forma avaliativa.
— Alícia? Não, nada disso — respondo quando entendo o que ele
está pensando e ele me solta.
— Desculpa se criei alguma confusão entre vocês, eu não sabia que
estavam envolvidos.
— O quê? — Fico confuso com as suas palavras — Não estamos…
Nós não temos nada — defendo-me dando um passo para trás.
— Tem certeza? A garota me acertou em cheio só por encostar em
você.
Não tenho resposta, caralho estou confuso mesmo. Alícia realmente
acertou Andrei, que tem o dobro do seu tamanho, com um soco forte que o
fez recuar na hora e tenho certeza de que ainda deve estar doendo.
Por que ela fez isso? Não consigo entender essa mulher, uma hora
está me atiçando com Gabriel, na outra me dispensa como se não tivesse
interessada, depois bate em alguém por simplesmente encostar em mim.
Essa mulher é complicada demais.
— Vamos voltar ao ensaio, acho que Giovanni não vai mais pegar no
seu pé, e qualquer coisa eu te ensino. — Ele pisca e ao ver meu olhar
assustado, ergue as mãos. — Prometo não encostar em você, realmente não
quero levar outro soco daqueles, se não fosse… enfim, manterei minhas
mãos longe.
Depois disso voltamos para o ensaio, mas minha cabeça não estava
ali. Fiz os aquecimentos e tentei aprender os movimentos básicos, Rick já
havia me ensinado alguns, mas ainda sou muito travado, é como se meu
corpo não fosse elástico o suficiente para ser sexy.
Andrei e Nathan, por outro lado, não tinham dificuldade alguma em
seduzir, era incrível como, mesmo errando alguns passos, os dois
conseguiam parecer sensuais.
— Você precisa fingir — Nathan comenta quando me vê encarando os
dois no espelho. — Finja que se sente confiante e ninguém vai se importar
com os movimentos.
— É só abrir esse sorriso fofo, você tem um jeitinho tímido e
introvertido que deixa a gente curioso — Andrei complementa com uma
piscadinha, deixando-me vermelho. — Caralho, fica ainda melhor com
vergonha.
Nathan solta uma gargalhada e concorda.
— Se tem uma coisa que aprendi nessa vida é fingir confiança, até
que chega ao ponto que você esquece que está se enganando e acaba
ficando mais confiante sem perceber — Nathan explica e não entendo nada
do que está falando.
— É o famoso “fake it until you make it”. — Andrei fica do meu lado
de frente para o espelho, ele é mais alto e muito mais musculoso que eu, ao
seu lado me sinto um franguinho desnutrido. — O que você vê?
— Um homem forte e musculoso — respondo e ele sorri, convencido.
— Estou perguntando o que vê quando se olha no espelho?
— Ao lado de alguém como você, prefiro nem comentar — retruco
com vergonha.
— Até que não consiga olhar para o fundo dos seus próprios olhos
com confiança, jamais conseguirá transmitir isso — Andrei adverte de
forma séria. — Precisa aprender a se amar para depois receber isso dos
outros.
Suas palavras, por mais bregas que possam parecer para um homem
como ele, atingem algo bem profundo em mim. Me amar, nunca pensei
nisso, sempre me vi inferior aos outros, insuficiente, é difícil me olhar no
espelho e não reparar em tudo o que não sou.
Não sou forte.
Não tenho músculos definidos.
Não tenho tatuagens.
Olho para os outros dançarinos, cada um deles é único e diferente,
mas todos são incrivelmente atraentes, então reparo que não são só suas
características físicas, mas sim a forma que andam e se portam: com
confiança, imponentes, eles têm aquele ar de quem sabe que é bonito e não
precisa de confirmação externa.
 
***
 
Chego tarde da noite, dois soldados ficaram encarregados de levar os
dançarinos para casa, como sou o que mora mais longe, fui o último e tive
muito tempo para pensar durante o trajeto.
A cuidadora comenta o que minha mãe fez durante o dia, hoje
aparentemente foi tranquilo, ela está mais calma com os medicamentos
novos, dorme a noite toda e sem pesadelos. Claro que ainda é cedo para me
animar com alguma coisa, mas no caso dela, qualquer melhora já é motivo
para comemoração.
Tomo um banho e me jogo na cama, passei dias em frente ao
computador para terminar todo o trabalho da campanha. Liz ficou feliz
quando enviei os arquivos, até me parabenizou pela qualidade e rapidez,
achei que Alícia também ficaria, por isso fui até a boate. Quando soube que
ela havia decidido manter as apresentações, achei que poderia ajudar.
Confesso que fui até lá na esperança de ver Alícia e Gabriel, nem que
fosse de longe. Merda, eu sou muito trouxa mesmo, ela deixou claro que
não se envolveria comigo, assim como Gabriel. Eles não me querem e aqui
estou eu, perdendo o sono pensando neles.
Viro para o lado, abraçando o travesseiro com força e fecho os olhos.
É melhor dormir logo e fingir que esse dia não aconteceu, mesmo que seja
impossível, porque eu ainda consigo sentir seu corpo respondendo ao meu
abraço, seus lábios moldando-se aos meus no melhor beijo que já tive na
vida.
Por que diabos ela me beijou? Por que me dar esse gostinho do
paraíso se não posso realmente tê-la? Isso é uma tortura.
 
***
Decidi dar um tempo para Alícia e prometi a mim mesmo que não
correria atrás dela, o que não foi difícil, já que ela claramente estava
tentando me evitar. Quando nos encontrávamos em algum corredor, ela não
olhava para mim, nem sequer me cumprimentava.
Dois dias se transformaram em três e depois em quatro, e sua atitude
começou a me irritar. Que merda, ela é uma mulher adulta, esse joguinho de
esconde-esconde dentro da boate parece coisa de criança. Não sei se está
assim porque ficou confusa com a forma com que me beijou, ou se sente
culpa.
Não sei qual é seu combinado com Gabriel, eles envolvem outras
pessoas quando vão transar, talvez tenham um desses relacionamentos
abertos, pode ser isso.
Também não vi mais o homem na balada, ele apareceu pouco e
quando o encontrava estava sempre sozinho. Alguma coisa estava estranha,
até os outros funcionários repararam. Claro que ninguém se atrevia a falar
nada, mas escutei burburinhos durante o expediente.
As apresentações estavam em pausa, mas a balada reabriu e a cada dia
que passa, mais forte a campanha para o evento fica. Os ingressos venderam
muito rápido e Sharon comentou que isso não era nada estranho, quando
Alícia anunciava que iria tocar, o lugar lotava.
Fiquei confuso com essa informação, a balada é dela, e sendo uma DJ
tão famosa assim, ela pode tocar quando quiser, mas Sharon disse que
Alícia só toca quando está com vontade de fazer algo grande ou quer
surpreender a galera. Ela acha que se ficar se apresentando muito, vai
perder esse gostinho de novidade.
DJ Malí, como é conhecida nas redes sociais, tem milhões de
seguidores, ela já participou de festivais grandes como a Tomorrowland,
Coachella Fest e o Lollapalooza. Passei horas vendo seus vídeos e
apreciando a forma com que ela dominava a multidão com os remix e drops
perfeitos, confesso que não entendo muito disso, mas me vi preso em todas
as gravações que encontrei dela tocando.
A mulher tem o público em suas mãos, preso nas batidas da música e
é viciante assistir, fico cada vez mais ansioso para ver e ouvir pessoalmente.
Estou empenhado em dar o meu melhor no show, Andrei e Nathan me
pegaram como projeto pessoal e não desistiram até que consegui decorar
toda a coreografia principal.
— Garoto, você está cada vez melhor — Andrei parabeniza depois de
mais um treino, ele está sem camisa, todo suado e com aquele sorriso
provocante no rosto. — Vai sair de lá com uma legião de admiradoras.
— E admiradores — Drew complementa, sorrindo orgulhoso. — Está
indo bem mesmo, Chace, mais um tempo e terá seu número solo para
apresentar.
— Já pensou em algum tema? — Andrei questiona, curioso, mas eu o
encaro amedrontado.
— O entregador de pizza sexy — Drew sugere e eles soltam uma
gargalhada.
— Não, acho que ele tem mais carinha de professor tarado. — Nathan
entra no meio.
— Falou o enfermeiro — Andrei provoca, mas Nathan não se
intimida e me entrega uma garrafa com água.
— Já sei — Andrei anuncia animado. — O nerd tímido, fã de Harry
Potter.
— Caralho, é perfeito — Drew comemora. — Qual a sua casa?
— Corvinal — confesso. Minha parte nerd ama Harry Potter.
— Azul combina com você. — Andrei pisca em minha direção. — Eu
sou da Grifinória.
— Tinha que ser — Drew o provoca e leva uma cotovelada.
— Já sei, você é de Sonserina — Andrei alfineta e Drew confirma,
orgulhoso. — Tinha que ser, e você, Nathan?
— Grifinória, é claro, achou que era o único com coragem aqui?
— Boa, parceiro. — Andrei estende a mão em um cumprimento e
Nathan sorri. — Está decidido, quando Chace estiver pronto para fazer seu
número especial, será na temática de Harry Potter.
A partir dali a conversa se voltou para o mundo da magia e nunca
imaginei que quatro homens adultos, sem camisa, musculosos e suados,
estariam discutindo teorias sobre o jovem bruxo.
Os dias passaram rápido e acabei me acostumando com a rotina,
acordo ao meio-dia e quando minha mãe está em um dia bom eu almoço
com ela e aproveito sua companhia para assistir TV, depois vamos caminhar
um pouco. Em dias difíceis o olhar assustado que me lança me faz sair de
casa cedo, porque já sei que está vendo meu pai e não seu filho.
À tarde os soldados de Alícia vêm me buscar, eles instalaram câmeras
na minha casa para vigiar a entrada e a rua, o que me deixa mais tranquilo
de sair por tanto tempo. Passo a tarde na academia com os dançarinos,
repassando as coreografias e treinando até dar a hora de começar a
organizar tudo para trabalhar na boate.
É cansativo, preciso admitir que chego acabado em casa, mas me
sinto produtivo. Andrei é um cara legal e engraçado, ele vive fazendo piada
com tudo e com todos e não se importa quando fazem com ele. É incrível
como seu humor consegue deixar um clima legal.
Até Giovani parou de implicar, não sei se foi porque Alícia brigou
com ele ou se realmente caiu em si de que estava sendo chato, só sei que as
coisas estão fluindo legal.
Consegui autorização para visitar o Kevin no hospital, Rick me levou
e no começo foi um choque ver o estado em que meu colega estava, mas ele
garantiu que não sentia mais dor e logo estaria curado. Eram só as marcas
roxas na pele que demoravam mais para desaparecer.
Gostei de ver que ele está melhorando e percebi os olhares carinhosos
que Rick lançava para a cama enquanto Kevin perguntava sobre os ensaios
e a boate. Imagino se tem algo rolando entre eles, e se tiver, será que é
recente?
Talvez não seja nada, Rick é como um pai para todos os dançarinos,
entendi isso logo nos primeiros dias. Pode ser só impressão minha mesmo,
eu não entendo dessas coisas.
— Hey, garoto — Andrei me chama quando estou saindo mais cedo,
já que a boate não abre na segunda-feira. — Vamos tomar uma bebida? Te
dou uma carona para casa depois.
Olho para o homem com um sorriso convidativo e aceito seu convite,
aviso aos soldados que não irei com eles hoje e recebo olhares repreensivos,
mas Andrei passa um braço em meu ombro e promete me deixar em
segurança em casa.
— Vamos só nós dois? — questiono quando chegamos à garagem e
ele caminha até um carro todo preto com vidros escuros.
— É só uma bebida. Relaxa, garoto, você parece tenso.
— Eu não bebo — aviso, mas entro no carro quando ele abre a porta
para mim. — Obrigado.
— Sempre às ordens — expressa com a voz brincalhona.
Chegamos em um bar que fica em uma parte bem rica da cidade,
nunca vim aqui e não entendo por que Andrei escolheu este lugar, mas o
acompanho da mesma forma. Ele opta por uma mesa mais reservada e pede
uma vodca pura para ele e um refrigerante para mim.
— Eles têm a melhor vodca da região — comenta, como se isso
justificasse sua escolha de local. — Então, Chace, eu não sou um cara,
digamos assim, fofoqueiro — fala com seriedade, mas sorri de canto. —
Porém eu sou curioso pra caralho, e não consigo parar de pensar no motivo
para aquela garota me dar um soco daqueles só para me afastar de você.
Direto ao ponto, eu sabia que não era só um convite para sair entre
amigos.
— Eu não sei — confesso frustrado e tomo um gole do refrigerante
que a garçonete serve em um copo muito chique, a Coca-Cola parece até ter
outro gosto nele. — Ela é confusa.
— Mulheres têm essa tendência. — Andrei pisca cúmplice e se escora
na cadeira, como se pertencesse a esse lugar. — O que eu não entendo é que
quando eu cheguei nela, o grandão quase me deu um tiro na testa.
— Gabriel? — questiono confuso.
— Esse mesmo — ele confirma sorrindo. — O grande executor quase
me matou por uma simples brincadeira com sua mulher, mas aqui está você,
respirando e com todos os seus membros intactos depois de pegar a mulher
dele.
— Eu não… — Encaro o homem admirado, como ele sabe?
— Garoto, você estava com a boca toda rosa, da mesma cor do batom
dela — anuncia, deixando-me com vergonha. — Relaxa, não estou te
julgando nem nada, só queria entender mesmo. Como disse, sou curioso e
esse quebra-cabeça está me matando.
Penso por um tempo se devo falar algo, Andrei é novo na Malícia,
mas todos que trabalham lá sabem bem quem está pagando seus salários, e
ele mesmo falou que Gabriel é o executor, o que significa que sabe sobre a
máfia e toda essa parte.
— Eu também não entendo — confesso e resolvo me abrir. Não tenho
amigos nem ninguém para falar sobre isso e sinto que vou explodir se não
conversar com alguém. — Eles usam outras pessoas nos seus… momentos
íntimos…
— Fazem ménage — Andrei coloca em palavras o que eu tentei falar
e fico com vergonha, mas confirmo com a cabeça.
— Não sei bem como funciona — comento envergonhado por estar
falando sobre isso com outra pessoa.
— Você já participou?
— Não — sou rápido em responder. — Eles… eu não sou… —
gaguejo e desvio o olhar dele.
— Você não é o quê? Garoto, isso tá confuso demais, preciso de mais
palavras, você não gosta de homens? Ou é de mulheres? — despeja mil
perguntas, uma atrás da outra.
— Eu gosto dos dois, eu acho — confesso. — Só que nunca, bem,
nunca estive com ninguém dessa forma.
— Em um ménage?
— De nenhuma forma — murmuro baixinho e pela primeira vez vejo
Andrei abismado e sem palavras. Ele parou o copo a caminho da boca e me
olha como se não entendesse o que acabei de falar. — Eu sou virgem, tá
legal?
— Você tem mais de 21 anos, certo?
— Vinte e dois, e não sei por que isso importa, você tem quantos
anos, afinal?
— Tenho 34 muito bem vividos — confessa assustando-me, não
pensei que ele fosse mais velho assim, daria 28 ou 29, mas definitivamente
não mais que 30. — Sim esse rostinho lindo aqui é bem cuidado e
preservado. — Acaricia o próprio rosto com orgulho e não seguro um
sorriso. — Agora me fala, continua virgem por quê?
— Não é como se eu não tenha tentado, mas… é complicado —
expresso com tristeza. — Minha mãe descobriu um Alzheimer precoce
quando eu era muito novo, fui criado praticamente pela minha tia, que me
educou em casa porque não tinha como me levar e buscar na escola e ainda
cuidar da minha mãe. Comecei a trabalhar muito cedo com marketing para
ajudar nas contas, enfim, não fui para a escola normal, não conheço muita
gente e quase não saio de casa, a não ser para trabalhar.
— Que barra pesada, cara.
— Pois é, e assim o tempo foi passando e aqui estou eu: com 22 anos,
dançando em uma boate para pagar uma dívida com a máfia — desabafo e
me arrependo assim que encontro seu olhar curioso. Droga, falei demais.
— É por isso que trabalha lá?
— Sim, foi minha última opção, acredite em mim, mas deu tudo
errado e não consegui pagar. Quando Gabriel veio cobrar eu achei que seria
o meu fim.
— Se chegou ao ponto de eles enviarem o executor, você estava
muito fodido mesmo, garoto.
— Pois é, mas se algum deus ou entidade existe, interferiu bem nessa
hora. Aconteceu alguma coisa com um dos dançarinos da Alícia e Gabriel
achou uma boa ideia me levar até ela — relembro o dia que mudou minha
vida —, e foi assim que acabei na boate.
Andrei pensa por um tempo e fica calado enquanto termina sua
bebida.
— Mas isso ainda não explica a forma com que ela agiu.
— Isso eu também não entendo — confesso passando as mãos pelo
meu cabelo, desesperado por respostas. — Eles meio que me chamaram
para… bem, nós quase…
— Fizeram um ménage — Andrei completa as palavras que não
consigo dizer. — Continua.
— Então eu fiz a merda de falar que sou virgem e eles me
dispensaram — desabafo baixinho, sentindo meu rosto queimar de
vergonha. — Eles só queriam foder alguém experiente, não se importam
comigo.
— Longe de mim defender aqueles dois, mas talvez seja melhor para
você. Um ménage não é algo para se fazer na primeira vez e aquele casal
me passa uma vibe bem hardcore.
— Por que as pessoas têm a mania de me dizer o que é melhor pra
mim? E se eu quiser perder a minha virgindade em um ménage? Ninguém
tem nada a ver com isso — explodo em um rompante de coragem e até
consigo falar ménage sem gaguejar, mas mantenho a voz baixa e Andrei
começa a gargalhar na mesa.
— Tem razão, não está mais aqui quem falou. — Ergue as mãos
teatralmente acima da cabeça. — E se quiser, eu me encarrego da sua
situação. — Pisca e levo um tempo para entender, quando o faço arregalo os
olhos e me afasto.
— Você está… — Não consigo completar a pergunta.
— Dando em cima de você? Talvez, por que não?
Caralho, o que eu respondo? Andrei é bonito e muito atraente, seu
sorriso de canto e os olhos cinza me fazem estremecer, mas não é a mesma
coisa, não quando comparo ao beijo de Alícia e ao que sinto quando Gabriel
me olha. Aquele calor que sobe pelo meu corpo é diferente.
— Não precisa entrar em pânico — Andrei interrompe meus
pensamentos. — Podemos ser só amigos e está tudo bem.
— Desculpa.
— Relaxa, meu coração é forte e vou me curar do seu não fodendo
gostoso a garçonete depois — Ele pisca provocativamente em direção ao
bar e sigo seu olhar, vendo a mulher que está nos servindo com um sorriso
contido. — Mas antes eu te deixo em casa em segurança, não quero levar
uma surra dos soldados que estão no carro ali fora.
Olho para a janela e só então percebo que atrás do carro de Andrei
tem um SUV preto estacionado, com dois homens escorados olhando para o
bar.
— Ainda acha que ela não se importa? — Andrei provoca e deixa
uma nota de cem dólares ao se levantar.
CAPÍTULO 24

Gabriel
 
O dia do evento se aproxima rapidamente, por este motivo Alícia tem
ficado mais na boate enquanto eu faço os serviços de executor, venho
trabalhando ao lado de Matteo para descobrir quem é o rato dentro da nossa
Família.
Conseguimos diminuir a lista de suspeitos entre os soldados que
estavam de guarda no dia da corrida e alguns funcionários, são doze nomes,
cada um mais injustificável que o outro.
É preciso ter um motivo muito forte para trair a Família, algo que seja
tão podre e irreparável que não pode ficar em segredo por muito tempo. Um
soldado que entra para a máfia passa por um período de testes onde tem que
provar sua lealdade, mais do que isso, precisa se provar útil.
Os que ocupam cargos mais baixos na Família não ficam ricos
simplesmente trabalhando para a máfia, não se engane, quem quer entrar
precisa provar o seu valor. São homens ambiciosos que trabalham parte do
tempo em algum emprego normal, e na outra parte são nossos “estagiários”.
Eles dirigem nossos carros, limpam nossas casas, vendem nossas
drogas e quando não desistem e temos a certeza de que estão realmente
empenhados em entrar para a Família, começamos a introduzi-los na parte
realmente suja, forçando garotos ao trabalho de limpeza, que consiste em
enterrar os corpos, limpar os locais de abate, dar fim às provas que possam
nos incriminar.
É ali que se diferenciam os fortes e os fracos, os que aguentam esse
período sem reclamar se tornam os soldados mais fiéis, porque eles sabem o
que fazemos com os inimigos e também têm noção do poder que está em
nossas mãos.
Estes são serviços de Outsiders, pessoas que não nasceram na máfia e
decidem entrar e crescer por esforço, o que leva tempo. Somente quando os
Underbosses têm certeza da lealdade daquela pessoa é que o Don autoriza a
participação dela na cerimônia de iniciação.
Nossa tradição é antiga, vem lá da Itália com os primeiros Don a
desembarcarem na América para conquistar território. Homens que tinham
dinheiro e fome de poder, com isso montaram os núcleos familiares e
dominaram suas áreas.
Na cerimônia de iniciação o futuro soldado precisa matar alguém
selecionado pelo Don, em frente a todos os irmãos, e fazer o juramento de
lealdade à Família e ao nosso líder.
Os Outsiders entram na família com mais idade, muitas vezes já são
homens influentes com mais de 30 anos e que levaram um tempo maior
para se provar, outras são moleques de 20 anos afoitos por poder e
aprovação.
Pessoas como eu, que já nasceram dentro de uma Família importante
para a máfia, não têm escolha. Do ventre ao caixão, nossa vida já está nas
mãos do Don assim que nascemos e só saímos disso na morte.
Eu fiz meu juramento com 12 anos, depois de matar um traidor que
planejava assassinar meu pai dentro da nossa casa. Um pouco foi por sorte,
já que eu estava acordado e ouvi passos no corredor. Aprendi a atirar com 8
anos e ganhei minha primeira arma com 10, a mesma que ficava embaixo
do meu travesseiro e que usei para acertar o traidor.
A princípio meu pai achou que tinha sido um erro, que me precipitei,
então ele viu o bilhete do soldado que pretendia assassiná-lo como vingança
pela morte do seu pai, depois mataria minha mãe e acabaria com a própria
vida.
Dois anos depois entrei para a Família de Angelis e comecei a ser
treinado como executor. Eu era uma criança, mas assim como Matteo e
Lorenzo, que também foram iniciados cedo, homens do alto escalão não
têm tempo para brincadeiras. Não existe espaço para a infância quando se
carrega uma herança como a nossa.
Depois do que aconteceu com Alícia e seus pais, Lorenzo tentou
proteger a irmã afastando-a do nosso meio, mas não conseguiu, sua vida já
havia sido manchada para sempre. Lorenzo e Matteo a ensinaram a se
defender com aulas de luta e tiro ao alvo, mas não era para ser nada mais do
que isso, até que ela voltou da Inglaterra e exigiu estar ao meu lado.
Depois de lutar contra e perder a batalha, me reuni com seus irmãos e
resolvemos que seria mais fácil aceitá-la como uma de nós do que correr o
risco de perdê-la de vez.
Fui o encarregado de fazer dela uma executora, afinal só poderia ter
ao meu lado alguém tão habilidosa quanto eu, e Alícia se tornou isso tudo e
muito mais.
É por conhecê-la tão bem que sei que está escondendo alguma coisa
de mim. Desde que Andrei Petrov chegou com o Don, sinto que Alícia está
estranha, alguns dias depois ela começou a ficar tensa ao meu lado, os
pesadelos voltaram a assombrá-la à noite, ela tentou controlá-los sozinha, e
quando perguntei o que estava acontecendo, disse que era só stress por
causa do show.
Faz um tempo que ela não se apresenta, não por falta de
oportunidade, mas por gostar que seus shows sejam eventos grandiosos, e
não só mais uma DJ riquinha que comprou uma boate para ter onde tocar.
Só que eu sinto que não é só isso, seu olhar já não procura pelo meu
quando nos encontramos, ela faz de tudo para passar mais tempo longe de
mim e não me procura na cama como antes, transamos duas vezes nessa
semana, o que é nada comparado aos tempos em que fodíamos loucamente
todas as noites.
Fico imaginando se ela finalmente enjoou de estar ao meu lado, afinal
não sou mais um garotinho. Estou chegando aos 40 anos, não sou nenhum
comediante ou a melhor companhia para uma garota de 24 que gosta de
curtir a vida.
Talvez ela finalmente tenha se dado conta de que nossa diferença de
idade é grande demais e esteja se afastando aos poucos, com medo de me
machucar, ou simplesmente tenha cansado do nosso relacionamento e quer
curtir a vida solteira.
Eu tenho limitações quando o assunto é sexo e isso acaba sendo
imposto a ela também, mesmo quando incluímos outra pessoa. Tudo tem
que ser pensado para que o homem ou a mulher não me encoste, mas Alícia
não é assim, ela é livre e adora ser tocada.
Merda, não deveria pensar dessa forma, eu a amo e sei que ela sente a
mesma coisa, é frustrante não entender o que está acontecendo. Alícia
nunca escondeu nada de mim, nem seus pensamentos mais perversos ela
mantém para si, o que pode ter acontecido para ela ficar assim?
Preciso me concentrar em meu trabalho, seja o que for que esteja
acontecendo com ela, virá à tona. Uma hora ou outra Alícia vai me contar.
Dos 12 nomes da lista, Matteo selecionou 5 soldados para trabalhar
no show como seguranças, o local estará cheio, já que os ingressos
esgotaram em menos de 1 hora.
Quando acordei no sábado de manhã, dia do evento, Alícia já havia
saído. Em seu lugar da cama havia um bilhete.
“Preciso ir mais cedo para a Malícia, nos vemos à noite.”
Sem assinatura ou sequer um beijo, as palavras parecem tão frias
quanto a folha de papel que seguro entre meus dedos.
Desço para o café e encontro Sophia e Matteo na mesa, o Consigliere
está calado enquanto sua mulher o olha com diversão e sorri para mim.
— Este é um lindo dia, não é mesmo, Gabriel? — Sophia pergunta e
olha com um sorriso largo para o marido. — E a noite vai ser ainda melhor.
— Já falei que não vou subir naquela merda de palco — Matteo
resmunga e sua esposa começa a rir.
— Vai dar para trás com a sua palavra, marido? — ela provoca e me
seguro para não rir também. — Eu achei que homens feitos deveriam
honrar suas dívidas.
— Não tenho dívida nenhuma.
— Você aceitou uma aposta e perdeu, se não cumprir com a sua
palavra vai ficar muito feio para o grande Consigliere da Família de Angelis
— Sophia sabe bem onde provocar. — Ou está com medo de passar
vergonha porque não sabe ser sexy?
— Você sabe muito bem que eu sou sexy pra caralho — repreende
confiante, a única coisa maior que o ego de Matteo é o amor pela sua
mulher. — Só não tenho obrigação nenhuma de jogar meu nome na sarjeta
para minha irmã se vangloriar depois.
— Será seu nome ou a sua honra, ninguém respeita um homem sem
palavra. — Ela leva o café à boca e toma um longo gole de forma teatral. —
Ainda mais se for o Consigliere.
— Caralho, mulher, se continuar com isso vou te levar para o nosso
quarto e te fazer calar a boca com o meu pau — ameaça impaciente.
— Aham, ameace o quanto quiser, sua palavra não vale de nada
quando sei que não cumpre o que promete.
— Puta que pariu. — Matteo levanta apressado passando as mãos
pelo cabelo. — Eu vou dançar naquela merda e você vai me assistir da área
VIP, depois vou te foder até que não consiga mais duvidar da minha
palavra.
Ele pega seu terno e veste impaciente, mas antes de sair dá um beijo
carinhoso em Sophia e sussurra algo em seu ouvido, que a faz ficar
vermelha e sorridente.
— Gabriel, garanta que os soldados estejam em pontos estratégicos,
se algum deles estiver armando algo, nós saberemos — ordena e confirmo
com a cabeça.
— Alícia ficará orgulhosa — comento quando Matteo sai.
— Eu e ela temos uma pequena aposta por trás disso tudo —
confidencia baixinho com a voz travessa e pisca para mim.
 
***
 
Dei espaço para Alícia e passei o dia organizando nossos soldados
que estarão à paisana lá dentro, também aproveitei para dar uma dura nos
seguranças, com ênfase para que façam a revista de todos que entrarem, não
podemos correr o risco de ter alguém armado que possa pôr a Família em
perigo.
A entrada foi liberada no começo da noite e a boate encheu
rapidamente, a primeira DJ já está fazendo sua apresentação e esquentando
o público. Eu estou acompanhando tudo da área VIP, onde Sophia e Matteo
recebem os Underbosses e suas esposas, toda a Família confirmou presença
para prestigiar o evento.
Lorenzo e Andrea serão os últimos a chegar, eles são a cara do
império de Angelis e representam toda a riqueza da Família, portanto serão
recebidos como as celebridades que entrarão pelo tapete vermelho e terão
seu momento com os paparazzis.
— Você não deveria estar com a minha irmã? — Matteo fala do meu
lado, seu tom de voz é calmo, porém autoritário. — Acho que nunca vi você
sem ela ao seu lado por tanto tempo, tem alguma coisa acontecendo?
— Não, ela está ocupada com o evento e eu preciso garantir a
segurança do local — respondo uma meia verdade. — Você não deveria
estar nos bastidores com os dançarinos?
— Eu só vou subir no final, esse é o nosso acordo, uma música e eu
escolho a roupa — Dá de ombros um pouco mais calmo. — Até lá estarei
bem bêbado e se Deus quiser não vou lembrar de nada amanhã.
— Pode deixar que eu te lembro, amor. — Sophia envolve Matteo em
um abraço e beija seu rosto. — Prometi a Alícia que iria gravar a sua
apresentação todinha, vamos pôr nos vídeos de final de ano.
— Eu sabia que deveria ter comprado uma casa separada só para nós
dois, ter você junto com a diaba da minha irmã não é uma boa mistura.
— Falando nela — Sophia aponta para a entrada da área VIP e vejo
Alícia se aproximar, já em seu vestido rosa neon, maquiagem forte nos
olhos, cabelo solto em cachos loiros com algumas mechas em apliques
coloridos e botas pretas de salto alto, que sobem até a metade da sua coxa.
Seu olhar encontra o meu por um instante e posso jurar que o sorriso em seu
rosto vacila, mas logo ela se recompõe e caminha até nós.
— Achei que daria para trás, irmão — instiga, parando ao meu lado.
— Sou um homem de palavra.
— Muito bem, esteja no palco quando eu der o sinal e faça o seu
melhor, afinal, não quer passar vergonha ao lado dos meus meninos e do
nosso convidado — fala a última parte mais baixo, para ninguém ouvir.
— Cala a boca, diabinha — Matteo repreende e sai com uma Sophia
bem animada ao seu lado.
O silêncio entre nós é estranho, Alícia mantém uma distância como se
não quisesse encostar em mim, seu olhar também não encontra o meu
quando a procuro, estou cansado dessa merda, por isso pego sua mão e a
conduzo até o seu escritório.
— O que aconteceu? — questiono de forma dura quando ela entra e
fecha a porta.
— Estou organizando um grande evento, não vê? — responde
estridente e se afasta ainda mais de mim, dando-me as costas.
— Não é sobre isso que estou falando, por que está agindo assim
comigo?
— Assim como? — se faz de desentendida, mas sua voz treme ao
mentir.
— Sabe muito bem como, eu te dei um tempo, achando que era stress
por causa do evento, deixei que se afastasse e lidasse com o que quer que
esteja te atormentando, mas agora já chega. — Caminho até ela e a
imprenso contra a sua mesa. — Vai me contar ou terei que arrancar essa
informação de você?
— Isso é uma ameaça?
— Pode ser, depende de você.
— Não tem nada acontecendo, tá legal? Faz tempo que não me
apresento e estou um pouco insegura — ela grita em um rompante.
— Mentira. — Eu me mantenho firme, seu rosto está a centímetros do
meu, consigo sentir a sua respiração acelerada e o cheiro do seu perfume,
mas não encosto nela. — O que está escondendo de mim, Alícia?
A tensão entre nós é grande, eu sei que ela está mentindo, vejo a
forma com que tenta me afastar, a confusão gritante em seu olhar… mas por
algum motivo Alícia prefere se fechar a me deixar ajudá-la.
Uma batida na porta me faz tremer de raiva, mas ela aproveita para
usar a interrupção como desculpa e manda a pessoa entrar.
— Está quase na hora, docinho — Andrei anuncia com um sorriso no
rosto, e seu olhar para a minha mulher me faz ferver de ódio, preciso me
segurar para não pular no maldito.
Alícia percebe e segura meu braço com força.
— Já estou indo, avise os meninos que desejo uma boa apresentação a
todos. — Ela espera o russo sair, só então passa uma mão carinhosamente
pelo meu rosto. — Podemos conversar depois?
— Não.
— Por favor, amor, eu… eu só preciso terminar isso aqui e depois a
gente conversa.
— Tudo bem — aceito seu pedido, mas quando ela tenta se afastar,
seguro sua mão e a beijo carinhosamente nos lábios, pegando-a de surpresa.
— Sei que não precisa de sorte, mas eu só queria te beijar.
Assim que Alícia sobe no palco, todas as luzes se apagam, a música
para e até as pessoas ficam em silêncio. Aos poucos feixes de luzes
coloridas começam a aparecer, cada vez mais fortes, mais rápidos, até que a
fumaça artificial cobre o palco e a primeira batida irrompe pelos alto-
falantes.
Alícia aparece atrás da mesa de controle toda iluminada com o telão
rosa atrás de si.
— É hoje — fala no microfone. — Um agradecimento especial à DJ
GIBI, que fez a abertura do evento. — Ela aumenta a batida da música e a
galera começa a gritar. — Um salve aos meus meninos que se apresentarão
hoje: Giovani, Brody, Drew, Andrei, Nathan e Chace. — Assim que chama
os seus nomes os dançarinos aparecem na plataforma em frente ao palco,
eles estão sem camisa e com uma calça social preta colada ao corpo. —
Aproveitem a noite e sejam bem-vindos à MALÍCIA.
Com isso ela solta a primeira faixa e começa sua apresentação, um
remix especial faz a introdução, lentamente reduzindo o ritmo da batida, as
luzes vão diminuindo até que tudo volta a ficar escuro e Alícia solta o
primeiro Drop e a batida volta a explodir, a iluminação segue o padrão da
música e deixa um ar psicodélico no ambiente. Rosa, roxo e azul são as
cores principais, as preferidas dela.
Meu coração começa a bater no mesmo ritmo, assisto sua
apresentação de longe, vejo que Lorenzo já chegou e está na área VIP.
Outras celebridades também podem ser vistas, mas nada importa, meu olhar
está ligado nela, Alícia se destaca de todos e é o centro das atenções.
No palco os meninos dão o seu melhor, Giovani, Brody e Drew
ficaram mais à frente, já que são os mais experientes e sabem como
conduzir um show mais longo, Nathan, Andrei e Chace estão mais atrás.
O russo parece se divertir mais do que deveria, seu corpo malhado e
suado move-se no ritmo das batidas e ele consegue executar alguns
movimentos de forma convincente, também não precisa muito para chamar
atenção, com as tatuagens — as da Bratva foram cobertas por outras,
temporárias, para ninguém o reconhecer — e a forma confiante com que
sorri, ele é sexy naturalmente.
Então meu olhar recai sobre o último dançarino, de forma tímida
Chace tenta acompanhar os outros, ele dá o seu melhor, mas a inexperiência
é visível. De onde estou e com as luzes inconstantes, não consigo ver seu
rosto, mas posso apostar que está com aquele tom rosado de vergonha.
Ele fica fofo quando está assim. Meu olhar viaja pelo seu corpo, o
garoto ganhou definição, mas o que chama atenção nele é esse estilo
introvertido — só que eu sei que é só dar liberdade que ele mostra sua outra
face.
Suas mãos percorrem o corpo atraindo a atenção para onde ele toca, a
batida torna-se mais alta e insistente, posso sentir meu coração acelerar no
mesmo ritmo enquanto assisto o garoto abrir o botão da calça. Quando
Alícia prepara outro Drop, as luzes baixam, a fumaça cessa, criando aquela
expectativa de que algo incrível irá acontecer. A galera vai à loucura e o
grave explode na mesma hora que os dançarinos arrancam a calça em um
movimento só, jogando para a plateia, que começa a gritar fervorosamente.
Eles estão com tangas minúsculas que cobrem somente o pau, cada
uma de uma cor, mas eu não consigo nem pensar nas outras. Meu olhar está
na bunda firme e branca de Chace em uma tanga azul fio dental.
Caralho, isso é uma tortura.
Um grave fora de ritmo chama minha atenção para o palco, onde
Alícia tem o olhar exatamente onde o meu estava. Ela não está pulando ou
dançando, a diabinha encara a bunda de Chace descaradamente.
Passo pelos bastidores e contorno toda a movimentação até chegar à
entrada atrás do palco principal, Alícia voltou a se concentrar em sua mesa,
para não perder o momento.
Espero até a última música, quando ela faz sinal para Matteo, que
sobe ao lado de Andrei. No canto direito do palco Alícia eleva as batidas e
seu irmão começa a dançar, de forma descoordenada.
— Quero pedir um salve para meu querido irmão, que se dispôs a dar
um showzinho para vocês — Alícia incita no microfone e a galera começa a
gritar quando ela solta a última música do seu show.
Andrei instiga Matteo e os outros dançarinos se animam para o final.
Chace parece cansado, mas continua firme, e no próximo Drop, Matteo tira
a camisa social e fica só de calça, provavelmente é o máximo que teremos
dele, mas já deixa Alícia feliz até o último segundo.
Ela se despede e deixa o palco para a DJ que irá fechar a noite, só
quando se vira para sair que seu olhar encontra o meu, o verde brilhante
começa a nublar com as lágrimas quando ela corre para os meus braços,
surpreendendo-me.
Recebo-a e aperto seu corpo contra o meu de forma protetora, senti
tanta falta de tê-la em meus braços…, mas não chorando.
Puxo Alícia para a escuridão atrás dos palcos e subimos até a
plataforma, de onde temos a visão de toda a balada, mas ninguém pode nos
ver. Só quando paramos de frente um para o outro que ela respira fundo e
me olha.
— Eu o beijei — confessa com a voz trêmula. — Eu beijei o Chace.
CAPÍTULO 25

Alícia
 
Amo a sensação de controle que tenho quando estou em cima do
palco, de frente para uma multidão de pessoas que sentem o que eu quiser
que elas sintam. A música tem esse poder de fazer com que alguém flutue
em um instante e sinta euforia no outro.
É por isso que não me apresento muito, guardo esses momentos para
ocasiões especiais, porque poderia sim tocar todas as noites, mas temo que
perderia o encanto com a repetição.
Sinto tudo tão intensamente quando estou sozinha com minha mesa
de controles. Eu sou o rei e a rainha do lugar, cada beat está em minhas
mãos e meu set foi perfeitamente executado, menos um momento, quando
errei o tempo de soltar o grave.
Isso aconteceu por um motivo bem específico, Chace estava só de
tanga azul bem na minha frente. E foi ali que meu coração voltou à
confusão que estava nos últimos dias.
O gosto amargo da traição retornou à minha boca e precisei me forçar
a olhar para qualquer outro lugar que não fosse para ele. De quem foi a
ideia ridícula de pôr a plataforma deles na minha frente? Ah, claro, foi
minha!
Esses dias foram difíceis. Depois do beijo em meu escritório, fiz de
tudo para não esbarrar no gatinho na boate, usei os corredores de serviço
como uma ladra dentro do meu próprio império, só para não ver aqueles
olhos castanhos cheios de expectativa.
Porque foi assim que ele saiu da minha sala, com uma pergunta
estampada em sua testa, a mesma que agoniava em meu peito e gritava:
“O que significa isso?”
A resposta que tentei enfiar em minha cabeça é a de que não
significou nada, foi só atração física, um beijo como tantos outros que já dei
em homens e mulheres. Nada demais.
Mentira.
Eu sou uma grande mentirosa.
Se não significou nada, por que não conseguia olhar para Gabriel sem
me sentir suja? Seu toque me fazia retrair como uma covarde e inventei mil
desculpas para ficar longe dele, até na cama meu corpo estava em alerta à
sua proximidade.
Pude ver o quão perturbado ele ficou, Gabriel percebeu que eu me
afastei logo no começo, mas me deu tempo para processar minha confusão.
Só que eu precisava conversar com alguém, queria me abrir e descarregar
esse sentimento ruim, mas não podia, porque a pessoa com quem eu mais
queria desabafar era ele, e não podia machucá-lo assim.
Então o show chegou ao fim e me senti tão angustiada, que quando
me virei e encontrei meu homem ali, não aguentei e corri para seus braços.
Precisava da sua proteção, do seu amor, eu precisava dele.
Sou tão fodida, que mesmo sabendo que o machucaria a seguir,
busquei o conforto que sempre tive, antes de confessar:
— Eu o beijei. — As palavras saíram de uma vez, como um tiro. —
Eu beijei o Chace.
Preparei-me para que ele me afastasse, que me empurrasse e brigasse
comigo, mas nada disso aconteceu. Gabriel envolveu meu corpo ainda mais
apertado em seus braços e beijou carinhosamente o topo da minha cabeça.
— Você gosta dele. — É uma afirmação, por isso não respondo, só
balanço a cabeça em confirmação. Sinto meu peito doer e as lágrimas que
segurei até agora escorrem pelo meu rosto. — Está tudo bem, amor.
— Não, não está, eu te traí, eu… me perdoa, por favor — imploro em
um choro incontido e agonizante.
— Amor, olha para mim — Gabriel tenta se afastar para conseguir me
olhar, mas escondo meu rosto ainda mais em sua camiseta preta, inspiro o
cheiro do meu homem o quanto consigo, com medo de que isso acabe, de
nunca mais poder senti-lo assim.
— Não consigo — confesso.
— É por isso que tem fugido de mim nesses dias?
— Não quero te perder.
— Você não vai. — Tenta me consolar, mas pela primeira vez não
confio em suas palavras. — Amor, eu estou aqui, não vou a lugar nenhum.
— Eu beijei outro, Gabriel, te traí. Como pode falar que vai ficar
comigo depois disso? — Joguei contra ele o que eu mais temia ouvir, mas
Gabriel permanece calmo, como se nada o abalasse e isso me enfurece. —
Fala algo, porra. — Afasto-me, tentando entendê-lo.
— Como aconteceu? — questiona calmo. Avalio seu olhar e ele não
demonstra nada.
— Eu não sei — respondo em um rompante, ainda sinto as lágrimas
molharem meu rosto, mas não consigo me conter. — Um minuto eu estava
puta porque aquele maldito russo debochado colocou as mãos no Chace, no
outro eu o beijei.
— Calma, como assim, Andrei encostou no garoto? — Sua voz toma
um tom mais forte e ameaçador.
— Ele estava ensinando Chace a dançar e daí começou a se esfregar
nele — explico, voltando a ficar puta com a lembrança. — Não aguentei e
corri até lá, acertei um soco no desgraçado, em advertência.
— Eu vou matá-lo — anuncia e só então eu vejo, aquele mesmo ódio
que tenho em mim ao pensar em outra pessoa encostando em Chace.
— Você também sente — concluo mais calma e vejo seus olhos
arregalarem. — Também está atraído pelo garoto.
— É só uma atração física, nada mais — mente mais para si mesmo
do que para mim.
— Eu também achei que era só isso no começo, até sentir vontade de
estourar os miolos do russo que encostou nele. — Olho para Gabriel e o
vejo tão confuso quanto eu. — É por isso que não está bravo comigo por ter
beijado ele quando você não estava junto.
— Não direi que não magoa ouvir isso, mas não é ciúmes. Só queria
que tivesse me contado antes — confessa respirando fundo, seus ombros
relaxam e ele acaba com a distância entre nós. — Pensei que fosse me
deixar — desabafa enfiando sua cabeça em meu pescoço. Sinto-o inspirar
profundamente e soltar o ar morno, fazendo-me arrepiar.
— Você é meu, para sempre — declaro com ferocidade e tomo sua
boca em um beijo duro, agarrando-o pela nuca. Sinto sua língua abrindo
passagem e dominando a minha de maneira visceral, Gabriel faz todo o meu
ser vibrar com o seu toque.
Logo nossos corpos reagem e a saudade que senti dele se transforma
em um tesão absurdo, sinto suas mãos grandes agarrarem a minha bunda
quando ele me ergue, enlaço sua cintura com as pernas, pouco me fodendo
para o vestido curto que agora está embolado em minha cintura.
Gabriel se esfrega em mim descontroladamente, meus gemidos se
transformam em um rosnado quando sinto seu membro duro no meio das
minhas pernas, ele me encosta na parede de forma bruta e morde meu lábio,
chupando a carne sensível logo depois.
— Me fode, amor, me fode duro e gostoso — exijo e levo minha mão
para o meio dos nossos corpos, consigo abrir a sua calça e liberto seu pau,
sinto o calor do seu membro que pulsa em minha mão, quente e pingando.
— Preciso do meu homem.
— Caralho, Alícia — rosna contra meus lábios e entra em mim, seu
prazer é a minha perdição, sinto seu pau me preencher daquela forma que
me deixa completa, meu coração bate disparado no peito e ele geme tão alto
quanto eu, enquanto me fode, duro, sem piedade, como um animal
descontrolado. — Não faz mais isso comigo, porra — exige entrando e
saindo de mim, minhas costas batem na parede, mas eu não me importo, só
consigo sentir o prazer que Gabriel me dá. — Não se afasta.
— Não vou — prometo, o suor escorre pelas minhas costas e jogo
minha cabeça para trás, perdida na forma com que ele beija meu pescoço,
em como suas mãos apertam ainda mais a minha bunda enquanto seu pau
atinge aquele ponto fundo e me leva às alturas. Sinto como se estivesse
caindo para o meu paraíso.
— Geme pra mim, grita meu nome — exige enquanto mete sem
parar.
— Gabriel, eu vou… — chamo seu nome e ele me cala com um beijo
duro, seu pau entrando e saindo sem parar, batendo enlouquecidamente,
estocando com força, gemendo como um animal, sinto minhas pernas
tremerem e o orgasmo me atinge na mesma hora em que Gabriel se afunda
uma última vez, seu pau pulsando dentro de mim enquanto me acompanha.
— Eu te amo, diabinha. — Sua voz sai abafada contra meu pescoço, a
respiração ofegante como a minha me faz abraçá-lo mais forte, procurando
conforto. — Você estava sem calcinha — constata quando acaricia minha
bunda, agora de forma calma e carinhosa.
— Sabe que eu gosto de comemorar depois do show — confesso e ele
abre aquele sorriso contido que tanto amo. — Eu ia te contar, só…
precisava de um tempo.
A música abaixo de nós faz a plataforma vibrar, mas a multidão
parece estar longe, ninguém consegue nos ver aqui em cima e estamos
seguros nos braços um do outro.
— Longe de mim interromper o casal. — A voz de Andrei me faz
olhar para a escada atrás de Gabriel e vejo o russo contendo um sorriso ao
nos pegar no flagra. Gabriel ainda está dentro de mim, mas cobre o meu
corpo com o seu para que Andrei não nos veja. — Don Lorenzo me mandou
te chamar, ele disse que é para você olhar seu telefone, Gabriel.
— Merda. — Gabriel tira o aparelho e encontra várias mensagens do
meu irmão. — Ele pegou alguém, vamos para o subsolo.
Sem esperar, corremos para o “Quarto da Malícia”, Matteo nos recebe
com um sorriso perverso no rosto, mas seu hálito fede a bebida.
— Finalmente, irmãzinha. E aí, gostou do show? — questiona e
tropeça nos pés. — Merda, acho que bebi demais.
— Você acha? — Lorenzo repreende, seu paletó está perfeitamente
dobrado em cima da mesa enquanto ele arregaça as mangas da camisa preta
deixando as tatuagens nos braços à mostra. — Volte para as mulheres e
leve-as para casa, Matteo, nós vamos cuidar deste daqui.
— Não, eu quero ajudar. — Ele tenta pegar uma faca da mesa, mas
sou mais rápida e seguro sua mão com força, puxando-o para a porta. —
Me solta, diabinha.
— Nós cuidamos dele, precisa ir até a sua mulher — aconselho com
calma, mas ele ainda tenta se desvencilhar da minha mão e voltar para a
sala, então uso minha cartada final e pego meu celular, fingindo atender
uma ligação. — Sim, ele já está indo — falo e olho para Matteo. — Eu não
acredito, fique calma, cunhada, Matteo vai matar quem tentar encostar em
você.
Isso basta para meu irmão entrar em modo protetor de sua mulher e
correr para fora, faço sinal para os dois soldados o acompanharem e quando
vou fechar a porta vejo que tenho realmente uma chamada perdida. Abro a
ligação e o nome de Tatiana me faz estremecer.
— Vocês lidam com isso? — Aponto para o homem amarrado na
cadeira no meio da sala e Lorenzo confirma com a cabeça, provavelmente
não me deixaria nem encostar nele mesmo. Quando está com esse olhar em
busca de respostas, meu irmão mais velho se torna um monstro.
— Está tudo bem? — Gabriel questiona preocupado.
— Não sei, mas eu te aviso.
— Gabriel, você fica — Lorenzo ordena e com uma troca de olhares
deixo meu homem lidando com o traidor e sigo até meu escritório.
No caminho meu telefone toca, é Tatiana novamente. A música no
corredor não me deixa ouvir nada, só consigo realmente falar quando entro
em minha sala e fecho a porta, o local tem proteção acústica.
— Tatiana, está tudo bem? — questiono preocupada, mas ninguém
responde, ouço um choro feminino distante que me deixa ainda mais
apreensiva. — Tatiana, me responde.
“Eu falei que você pagaria por ter aberto a boca, sua vagabunda”
escuto uma voz masculina abafada. “Achou mesmo que estaria segura
depois da merda que aprontou aquele dia?” Um som alto de tapa seguido
de um grito feminino e a voz chorosa de Tatiana corta meu coração “Não,
Enzo, por favor não faz isso.” Ela implora.
Não preciso ouvir mais nada para pegar a chave do meu carro e sair
correndo do escritório, no caminho trombo com Andrei no corredor, seu
sorriso logo se transforma em preocupação quando me olha, fazendo-me
parar.
— O que aconteceu? — questiona.
— Preciso correr — aviso tentando passar por ele. — Sai da minha
frente.
— Sozinha? — Ele olha atrás de mim como se esperasse mais alguém
sair o meu escritório.
— Não preciso de ninguém para me proteger, agora sai da minha
frente, não vou falar novamente. — Avanço sobre ele, que continua me
segurando.
— Vou com você — afirma decidido.
— Isso não te diz respeito, russo — cuspo as palavras.
— Foda-se, não vai sair nesse estado sozinha. — Em um movimento
rápido ele rouba a chave do meu carro e anda rapidamente na minha frente.
— Então, para onde vamos?
Abismada com a ousadia, não respondo, só corro em sua frente, uso
as escadas de emergência para chegar até a garagem e faço sinal para os
seguranças não me seguirem. Eles vão avisar Gabriel e o meu irmão que
saí, mas eles estão fechados no subsolo e até que a tortura acabe tenho
tempo de pegar o mauricinho filho de um puto.
Andrei destrava a BMW esportiva rosa, entra no banco do motorista e
penso em contestar, mas ele já está com o carro ligado quando entro e fecho
a porta. Digito o endereço de Tatiana no painel e ele entende a deixa.
— Então, vamos matar quem? — questiona com aquele sorrisinho
debochado retornando aos seus lábios.
— Um Enzo maldito que gosta de bater em mulheres — anuncio e
assisto seu sorriso se tornar mais aberto, seus olhos cinza-claros refletem o
ódio que sinto. — Vai mais rápido — ordeno e coloco a chamada no alto-
falante do carro.
“Não, não, por favor não faz isso.” A voz de Tatiana é como
combustível e Andrei acelera.
“É tudo sua culpa, sua vadia.” Sons de tapas e batidas irrompem,
Tatiana chora mais alto, implorando para ele parar, gritando por socorro.
“Ninguém vai te ajudar, agora somos eu e você, a noite toda.”
O caminho da Malícia até o apartamento de Tatiana levaria no
mínimo 30 minutos, mas Andrei faz em menos de 10, passamos o caminho
todo ouvindo o maldito a agredindo, o que só alimentou o ódio e nos deixou
mais afoitos por vingança.
Vesti o coldre duplo que guardo no carro, com o vestido colado que
usei para o show não consigo esconder uma arma, só algumas facas na bota.
Entrego duas armas para o russo e só então percebo que ele está com uma
camisa social branca e calça jeans, deve ter se trocado depois do show.
Andrei para cantando pneu em frente ao prédio e descemos correndo,
na porta dois homens fazem guarda e o porteiro não está na guarita,
provavelmente são os seguranças do Enzo. Seus olhos arregalam assim que
me enxergam, eles tentam puxar suas armas, mas sou mais rápida e acerto
um tiro no ombro de um, logo depois Andrei acerta a cabeça do outro.
— Não matamos civis, eles só estão fazendo seu trabalho — advirto e
tiro a arma do homem que se contorce de dor na entrada.
— Protegendo um homem enquanto ele agride uma mulher indefesa?
— Andrei contesta e atira na fechadura da porta, fazendo-a se abrir.
— Pode ser, mas agora terei dois corpos para esconder, merda —
reclamo correndo escada acima, Tatiana mora no quarto andar, então é mais
rápido assim.
— É para isso que a máfia tem soldados — ele protesta atrás de mim.
— Se eu pudesse trazer soldados comigo, acha que viria com você?
— Eu sabia que tinha mais nisso.
Não respondo, agora preciso salvar Tatiana das mãos daquele maldito,
deveria tê-lo matado aquele dia na boate, droga.
Assim que chego no quarto andar vejo a porta do apartamento dela
entreaberta e escuto os gritos desesperados, corro até lá, sem pensar se têm
mais seguranças ou se ele está sozinho, foda-se.
— Vai se abrir pra mim ou vou ter que te amarrar? — A voz nojenta
do Enzo me faz ferver e chuto a porta do quarto. — O que…
Ele não consegue falar mais nada, atinjo seu rosto com minha arma,
jogando-o para longe de Tatiana, que está encolhida no canto da cama. Enzo
cai, com um baque forte sua cabeça atinge a parede e seu corpo escorre no
chão.
— Merda — reclamo assim que percebo que o maldito perdeu a
consciência, mas então olho para Tatiana, ela está com um pijama todo
rasgado e encolhida de medo. Sem acreditar no que está vendo, luta contra
meus braços — Cheguei, querida, desculpa a demora.
— Alícia? — questiona-se com a voz fraca e trêmula. — Você… você
veio mesmo. — Exala aliviada e ao me reconhecer se joga em meus braços
em um choro exasperado, abraço seu corpo e só então percebo que ela está
quase nua, o tecido rasgado não cobre nada.
— Andrei — chamo e aponto para o roupeiro, ele entende e sem olhar
para nós abre as portas e encontra um roupão preto de cetim, que jogo por
cima de Tatiana, cobrindo-a como consigo. — Ele está respirando?
— Por enquanto… — o russo responde ao avaliar o homem
desacordado no chão.
— Consegue carregá-lo até o carro? Precisamos tirá-lo daqui antes da
polícia chegar — aviso e Andrei assente, fazendo o que pedi. Espero ele
sair para falar com Tatiana: — Está tudo bem agora.
— Ele… ele tinha a chave… ele disse que… que ia me fazer pagar —
relembra com a voz trêmula. — Ele… ele vai me matar.
— A partir de hoje ele não existe mais, querida — afirmo com
convicção. — Você está bem para andar? Ele chegou a fazer algo a mais?
— Não, mas foi quase, ele quase…
Avalio seu corpo, vejo várias marcas vermelhas, a lateral do seu rosto
está toda machucada e o lábio já começa a inchar, mas não encontro
sangramentos.
— Tatiana, preciso que ligue para seu pai e fale que ele invadiu sua
casa, bateu em você e depois saiu — instruo com calma e ela me olha,
perdida na própria dor. — Querida, você consegue fazer isso? Ninguém
pode saber que estive aqui, muito menos que levamos o desgraçado
desacordado.
— S-sim — ela responde respirando fundo. — Eu consigo.
— Vou mandar minha advogada entrar em contato, faça tudo o que
ela pedir e finja que ela é uma conhecida. — Espero ela se recompor um
pouco e confirmar que está entendendo. — Eu preciso ir, a polícia
provavelmente logo estará aqui, tenho certeza de que algum vizinho deve
ter ligado, mas ninguém pode saber que estive aqui.
— Tudo bem. — Ela se levanta, vestindo o robe. — Obrigada,
Alícia… Eu não sei o que teria acontecido se… — agradece emocionada e
eu a abraço uma última vez, sentindo sua dor.
— Nos falamos amanhã — aviso e saio do apartamento, vejo a
câmera no corredor piscar, e mando mensagem para Max, avisando que terá
um novo trabalho.
Passo pela porta de entrada do prédio e vejo que Andrei já finalizou o
serviço no outro segurança e colocou os dois no banco de trás do meu carro
junto com o Enzo, assim que fecho a porta ele acelera, se afastando do local
o mais rápido possível.
— Droga, droga, droga. — Bato com ódio no painel do veículo e olho
para trás, confirmando que o Enzo está desacordado. — Matteo vai me
matar, caralho, Lorenzo vai me matar — reclamo.
— Por quê?
— Esse desgraçado é o maldito filho do Senador Harry de Biasi —
respondo mesmo sabendo que não deveria falar sobre assuntos da Família
com ele. — Ele não pode morrer, mas também não vou deixar que continue
vivo.
— Não precisa se preocupar com isso — fala calmamente, o olhar
frio não sai da estrada.
— Olha, eu sei que você é filhinho do Pakhan todo poderoso e que
está acostumado a resolver suas merdas de forma rápida, mas nós ainda
somos uma Família pequena e dependemos dessas merdas de políticos para
manter o controle do nosso território.
— Docinho, se estou falando que não precisa se preocupar, é porque
sei o que fazer.
Bufo com seu atrevimento e pelo uso do apelido debochado.
— Virou mágico agora? — ironizo, frustrada.
— Não, mas como você mesma disse, sou o filho do Pakhan e não
estou aqui de férias — responde de forma firme. — O braço da Bratva em
Boston está sendo investigado há um tempo, por isso temos pessoas de
confiança que não estão oficialmente ligadas a eles.
— Não estou preocupada em me livrar de um corpo, isso é fácil, mas
essa merda vai feder pra cima da minha Família — tento fazer com que
entenda —, Lorenzo precisa firmar essa ligação política.
— E ele vai — confirma dando de ombros. — Como você mesma
disse, a Bratva é muito maior que uma simples máfia local.
— Vocês controlam o senador — finalmente entendo onde ele quer
chegar.
— Admirada? Sério? Não achei que fosse tão ingênua — provoca,
deixando o clima mais leve. — Farei a ponte com ele assim que descobrir o
que diabos está acontecendo aqui.
— E para onde estamos indo? — questiono, prestando atenção no
caminho desconhecido.
— Achei que queria fazer o Enzo sofrer — expressa animado. — Eu
ouvi sobre a executora, adoraria vê-la em ação.
— É melhor encontrar um local bem afastado então, porque hoje vou
te mostrar como se usa uma faca.
— Vai cozinhar para mim? — debocha.
— Só se você gostar de carne humana — respondo na mesma moeda
e ele sorri, seguindo para a área industrial da cidade. Andrei para em um
galpão que parece estar abandonado, mas vejo um carro preto estacionado
próximo da entrada.
— São homens de confiança — explica sem que eu precise perguntar.
— Relaxa, eles trouxeram o equipamento e vão limpar a bagunça no final.
— Manda limpar meu carro também, se deixar esse sangue secar ali
vou precisar colocar fogo, e eu realmente gosto do meu bebê.
Ele concorda com uma gargalhada e assim seguimos para o galpão, a
antecipação da tortura me deixa animada novamente, quase eufórica, mas
antes ligo para minha advogada e repasso as informações necessárias.
Confirmo se Max apagou as imagens das câmeras e só então aviso Gabriel
que chegarei tarde em casa, mas irei explicar tudo pessoalmente quando nos
vermos.
E assim desligo o celular, respiro fundo e começo a dar ordens para os
homens de Andrei, exigindo que o cenário esteja dentro das minhas
preferências antes de começar com os trabalhos.
CAPÍTULO 26

Gabriel
 
— Fala logo, James, quem te mandou mexer no telefone da minha
irmã? — Don Lorenzo exige respostas enquanto arranca uma unha do
soldado, seu grito de dor faz meu corpo vibrar, mas o soldado não responde.
— Você pode escolher entre confessar logo a merda que fez e morrer mais
rapidamente, ou posso continuar com isso a noite toda.
— Eu não sei de nada — James se defende, mas sua voz falha e ele
não consegue encarar o Don.
— Sei que foi você quem usou o celular da minha irmã — Lorenzo
acusa friamente. — Só preciso saber quem deu a ordem. Foi o Cartel? —
pergunta avaliando a reação do soldado, mas ele não confirma. — Você
sabe que vai me contar, é só uma questão de tempo.
— Não tenho nada para contar, Don Lorenzo — ele geme, mas assim
que as palavras saem da sua boca, Lorenzo faz sinal e seguro a mão do
soldado aberta em cima da mesa. — Por favor, eu não sei de nada —
choraminga. Sabendo o que irá acontecer, tenta fechar a mão em punho,
mas antes que consiga Lorenzo crava a faca no antebraço de James, bem no
meio dos dois ossos, arrancando um grito torturado dele.
— Fala logo, filho da puta — o Don exige respostas, então pego um
machado de cima da mesa e com um movimento rápido, cravo a lâmina no
joelho dobrado de James, enquanto Lorenzo gira sua faca no braço dele.
Meu amigo pega outra faca e enfia na mão do soldado, prendendo-a na
mesa para garantir que não se mova.
James grita, tenta pedir perdão, até que desmaia de dor, deixando
Lorenzo puto.
— Minha mulher vai me matar se eu ficar aqui a noite toda —
reclama limpando o sangue das mãos em um pano.
— Ele vai falar, é um soldado da Família, me surpreenderia se fosse
fácil arrancar informações do desgraçado — comento e consigo ver um
meio sorriso orgulhoso em seu rosto.
— Tem razão.
— Quer que eu termine aqui? — pergunto, mas o conheço bem
demais para saber que quando Lorenzo começa uma tortura, ele é como um
cachorro com uma presa e não larga o osso.
— Sabe a resposta.
Neste momento meu celular acende em cima da mesa, vejo o alerta de
segurança piscar na tela e sei que algo está errado. Lavo as mãos na pia,
tirando o sangue dos braços antes de abrir as imagens e meu mundo para
por um momento.
— Preciso ir — aviso e Lorenzo me olha por um momento, mas
assente quando abro a porta. Faço sinal para Ravi entrar no meu lugar, só
então saio à procura de Chace.
Tento ligar para Alícia, mas seu celular cai direto na caixa de
mensagens, ela me deixou um recado avisando que vai demorar, então
envio um recado rápido para me ligar assim que puder. Onde diabos essa
mulher se enfiou para desligar essa merda?
Encontro Chace na academia, conversando animado com os outros
dançarinos, por sorte já está vestido e se preparando para ir embora.
— Chace, me acompanhe por favor — chamo tentando esconder a
preocupação em minha voz, não dou tempo para ele responder, me viro e
vou direto para a garagem.
— Aconteceu alguma coisa? — pergunta assim que entramos no
carro sozinhos e saio cantando pneu. — Gabriel?
— Recebi um alerta das câmeras de segurança da sua casa — aviso e
na mesma hora seus olhos arregalam em preocupação. Ele pega o celular e
liga para alguém, provavelmente a tia ou a mãe, mas ninguém atende.
— Merda, merda, merda — reclama quando a chamada cai na caixa
postal. — Por favor, me atende, por favor…
Acelero ainda mais, o motor do SUV que os seguranças usam
normalmente reclama, mas não tinha outra opção, já que fui de moto até a
Malícia e o carro da Alícia não estava no estacionamento.
Vejo a fumaça preta e a claridade das chamas que contrasta com o céu
noturno antes mesmo de entrar na rua de Chace e já sei o que vamos
encontrar, mas não estou preparado para o terror que nos aguarda. Dois
carros de bombeiro estão trancando a rua e tentam apagar o fogo. Antes que
eu possa parar o carro, Chace abre a porta e salta para fora, correndo na
direção do perigo.
— Merda. — Em um rompante saio atrás dele, mas o garoto está
desesperado, um bombeiro tenta pará-lo assim que percebe sua intenção,
mas não consegue. — NÃO — grito atrás dele e consigo alcançá-lo a tempo
de impedir uma tragédia maior.
— Mãe — Chace berra desesperado quando me jogo em cima dele,
levando nós dois ao chão, tento protegê-lo para que não se machuque, mas
por sorte caímos na grama. — Me solta desgraçado, me solta, minha mãe…
— Ele esperneia tentando me afastar, seus olhos cheios de lágrima encaram
as duas casas que perdem para as chamas.
Não tenho palavras para acalmá-lo, só seguro seus ombros presos ao
chão e cubro seu corpo com o meu, impedindo que se levante e corra
novamente em direção do perigo.
— Mãe… Por favor, por favor, Gabriel — ele implora por algo que
não posso dar.
— Calma, não adianta correr para lá — Tento acalmá-lo, mas ele
começa a me bater, lutando para se livrar de mim, suas mãos atingem meu
peito com força, porém me mantenho firme.
— Precisam se afastar. — Um bombeiro vem em nossa direção,
tentando nos fazer sair, porque Chace chegou próximo demais do fogo. É
neste momento que algo explode e instintivamente me abaixo, cobrindo
todo o corpo dele com o meu, protejo sua cabeça em meu peito e não escuto
mais nada.
Só quando mãos tocam em minhas costas é que percebo que alguém
encostou em mim e me levanto, assustado. Chace aproveita o momento para
tentar correr em direção à sua casa, desesperado, mas o seguro pela cintura
e o arrasto dali, ele é leve e muito menor que eu, mesmo que se debata em
meus braços, não adianta nada.
O barulho da explosão me deixa surdo por alguns segundos, não
escuto o que falam, nem as sirenes insistentes, muito menos os gritos de
protesto do garoto que luta contra meus braços, só um zumbido incessante
em minha cabeça.
Paro de caminhar quando chego ao carro e encosto Chace na lataria,
mantendo-o contido com o meu corpo até que minha audição retorne. Aos
poucos volto a escutar alguns barulhos, mas é o toque em meu peito que me
faz travar no lugar, as mãos quentes do garoto seguram minha camiseta,
forçando-me a olhar para baixo, vejo seu rosto tomado pelas lágrimas
enquanto ele quebra bem ali, na minha frente.
Sem pensar, envolvo seu corpo em um abraço, tentando protegê-lo do
mundo, da dor, de tudo a nossa volta. Seus gritos desesperados saem
abafados em meu peito, mas consigo ouvi-lo baixinho, minha audição ainda
prejudicada não me permite entender suas palavras.
Do canto do olho vejo dois carros com soldados da Família
encostarem, os homens descem com as armas em punho, prontos para a
ação, mas faço sinal negativo e eles recuam.
Chace se agarra em mim com mais força e me preparo para afastá-lo,
mas percebo que não consigo, não sinto a repulsa com o seu toque, o medo,
a apreensão, só quero mantê-lo ali, onde sei que ele estará seguro.
Merda, o que está acontecendo?
— Vocês são moradores de alguma das residências? — Um bombeiro
questiona e pela sua expressão sei que as notícias não serão boas.
— É a minha casa — Chace consegue falar com a voz trêmula. —
Minha mãe… minha tia…
Seguro-o mais próximo e chamo Gael, um dos meus soldados mais
antigos que está a postos aguardando ordens.
— Quero a área vasculhada o quanto antes. — Ignoro o bombeiro e
dou as ordens. — Chame o chefe de polícia, quero saber como isso foi
acontecer, mande os homens procurarem por câmeras de vigilância pela
vizinhança.
— Gabriel, minha mãe… — Chace me olha com dor, mas não
consegue terminar a pergunta.
— Vocês sabem se houve vítimas? — questiono o bombeiro.
— Até que o fogo seja controlado, não podemos entrar nas
residências — responde evasivo. — Assim que tivermos mais notícias…
— Gael, ficará responsável. Não saia daqui, não tire os olhos do local
e qualquer notícia eu serei o primeiro a saber, entendido? — falo autoritário
e meu soldado confirma. — Se Alícia aparecer, dê a ela este endereço. Não
leia e só entregue a ela.
— Entendido.
— Desculpe, senhor, mas só podemos falar com os proprietários ou
parentes próximos — o bombeiro tenta contestar, mas o calo com um olhar
e Gael ergue a manga da camisa, mostrando a tatuagem no antebraço do
anjo curvado com uma espada cravada nas costas. — Vocês… — O
bombeiro recua um passo, o olhar espantado ao reconhecer o símbolo.
— Vamos. — Abro a porta e empurro Chace para o banco do carona,
vejo os carros de polícia chegando, Gael e os soldados já estão preparados,
temos esses malditos em nossos bolsos por um bom motivo.
— Ela não pode… — O garoto cobre o rosto com as mãos,
desesperado. — Elas… elas não podem estar…
— Não vamos pensar nisso agora. — Puxo o cinto de segurança dele,
prendendo-o ao banco.
— Mas minha mãe estava em casa, olha. — Ele me entrega o telefone
e a última mensagem é da cuidadora da noite avisando que Clarissa já
estava dormindo.
— Ainda não sabemos ao certo. —Fecho sua porta e dou a volta no
carro, sento no banco do motorista, dando partida.
— Para onde está indo? — questiona quando percebe que dou a volta
e me afasto da sua casa. — Gabriel, para, não posso sair daqui sem saber
se…
— Não tem o que fazer aqui e não quero correr o risco de você tentar
se matar de novo — repreendo com a voz firme. — O que estava pensando
quando correu para o fogo?
— É a minha mãe — justifica de forma feroz.
— Ia se matar sem nem saber se ela está lá dentro? — quase grito ao
lembrar do garoto correndo em direção ao incêndio e do que poderia ter
acontecido com ele. — Nunca mais faça isso, porra, nunca mais coloque a
sua vida em risco dessa forma.
Decido levá-lo até o loft que comprei em um prédio próximo à
Malícia, era para ser uma surpresa para Alícia, um lugar só para nós dois,
mas agora só consigo pensar nele como um refúgio para conter o que virá a
seguir.
No caminho tento ligar para ela, mas todas as chamadas caem na
caixa postal. Envio uma mensagem para Don Lorenzo avisando que
tivemos problemas e que Gael tem notícias, ele saberá o que fazer, porque
não vou deixar Chace sozinho nesse momento.
Deixo o carro na rua e abro a porta do prédio antigo, foi fácil comprar
os apartamentos da cobertura, já que estão abandonados há alguns anos. Um
antigo restaurante funcionava no térreo, mas os donos acabaram falindo, foi
alugado algumas vezes, mas ninguém ficou muito tempo.
O loft ocupa toda a cobertura do edifício, foi transformado em um
apartamento de pé-direito duplo, contratei uma empresa para fazer a faxina
e uma arquiteta para a decoração com a maior rapidez possível. Muita coisa
ainda precisa ser feita, mas já está habitável.
O piso de concreto polido é frio e cinza, as paredes são de tijolo à
vista e o ambiente não tem separação, somente o banheiro e o closet são
fechados. A sala e a cozinha são abertas e uma cama foi colocada próxima
das janelas de vidro que vão do piso ao teto e nos dão a visão privilegiada
da orla de Neponset River, logo ao lado temos uma varanda aberta.
Chace entra em minha frente, mas seus olhos estão grudados no
celular à espera de notícias. Ele não parou de tentar ligar para a tia, mesmo
que a ligação caia direto na caixa postal, o que já é um mal sinal. Ele
também ligou para a clínica, mas eles não têm notícias da cuidadora.
— Quer tomar alguma coisa?
— Não — responde seco quando tenta ligar mais uma vez para a tia.
— Que merda, preciso voltar lá. E se elas tiverem saído e estão na casa de
algum vizinho?
— Meus homens estão à procura — respondo evasivo, mas Gael já
havia me mandado mensagem avisando que não havia sinal da família de
Chace. Pego uma garrafa com água e entrego para ele.
Sento-me no sofá e assisto o garoto caminhar de um lado para o
outro, eu entendo, se fosse comigo não descansaria até saber o que
aconteceu, e essa é a pior parte, não saber onde elas estão.
Tento o celular de Alícia mais uma vez e nada, começo a ficar
preocupado com ela. Onde diabos se enfiou e por que desligou a merda do
aparelho? Ela não é assim, não some sem avisar.
Então a primeira notícia ruim chega, um corpo foi encontrado
carbonizado na entrada da casa da tia de Chace e outro no quintal, como se
tivessem tentado correr do fogo.
— Você tem um carregador? — A voz triste de Chace me faz pular,
ele me olha ainda com esperança e isso corta meu coração.
Levanto e pego o cabo reserva que carrego comigo, indico a tomada
que foi recentemente anexada ao lado do sofá, o cabo curto o força a sentar-
se, enquanto continua procurando respostas no pequeno aparelho em sua
mão.
Droga, como vou falar para ele que sua tia não vai atender porque
está morta? E se a sua mãe também estiver, como diabos darei essa notícia
para o garoto? Não sou a pessoa que informa a família, sou a razão pela
qual o mundo deles desmorona.
Eu mato pessoas, geralmente são desgraçados que procuraram por
isso, suas péssimas escolhas os levam até minhas mãos, mesmo assim sou
eu quem põe fim àquelas vidas. É na minha frente que seus olhos perdem o
foco e os desgraçados dão o último suspiro.
Depois disso não é mais minha responsabilidade. Já acompanhei
Matteo e Don Lorenzo em algumas visitas para famílias dos nossos
soldados quando alguma tragédia acontece, mas nunca fui o responsável por
falar, só estava lá.
Não, eu não sou a melhor pessoa para isso. Ninguém olha para mim e
espera um gesto de carinho ou conforto, a não ser Alícia. Só que agora
estou sozinho e, se o pior for confirmado, não tem mais ninguém que pode
dar a notícia a ele.
Talvez eu deva pedir para o chefe de polícia, ou dos bombeiros, eles
estão acostumados com essa parte, devem saber o que falar…
Não, ele merece mais que um discurso mecânico e impessoal de
alguém que não se importa com o impacto que algo assim trará na vida
dele.
A noite passa de forma arrastada, cada volta do ponteiro no relógio é
angustiante, os minutos se transformam em horas até que meu celular toca e
Chace me encara, apreensivo.
“Eles controlaram o fogo, mas não queriam entrar até de manhã.”
Gael relata, sua voz cansada. “Exigi que fizessem isso hoje ainda… O
bombeiro acabou de sair, foram encontrados dois corpos carbonizados no
quarto.” anuncia com tristeza.
— Tem certeza?
“Sim, eles serão levados para identificação, mandarei homens
acompanharem os corpos para garantir que tudo seja feito de forma
correta.”
— Certo, não saia daí, quero que acompanhe os trabalhos dos
bombeiros, entre em contato com Ettore, ele é especialista nisso.
“Considere feito.”
— Acharam elas? — Chace se levanta e vem até mim com aqueles
olhos castanhos intensos, inchados pelas lágrimas, que imploram por
esperança, por uma notícia boa. — Gabriel, me diz que elas estão bem.
— Garoto.
— NÃO ME CHAMA DE GAROTO.
— Chace — Levanto-me e fico de frente para ele, tomando coragem
para dar a notícia que mudará toda a sua vida. — Foram encontrados dois
corpos em frente à casa da sua tia e dois corpos dentro da sua casa —
anuncio sem intervalos, talvez seja melhor falar tudo de uma vez e rápido,
como arrancar um esparadrapo de uma ferida.
— O que… não… não pode ser… — Arregala os olhos em pavor, as
lágrimas voltam a brotar enquanto ele absorve o que falei, o significado que
isso tem em sua vida. — Elas…
Não tenho palavras para confortá-lo, dizer que sinto muito parece
idiotice neste momento, falar que ficará tudo bem é pior ainda, por isso não
falo nada e só puxo Chace para os meus braços, envolvendo-o em meu
peito para que saiba que não está sozinho. Porra, ele não ficará sozinho,
nunca mais.
Eu estou aqui e não vou a lugar algum.
— Não, não, não, não… — repete caindo em si, suas pernas perdem
as forças e preciso segurá-lo para que não caia de joelhos. — Não pode ser
verdade.
Ele repete a negativa como um mantra, como se negando o que acabei
de falar mudasse a verdade. Contudo nada vai mudar, sua mãe, sua tia e seu
tio estão mortos, assim como a mulher que estava trabalhando naquele
momento, nada irá trazê-los de volta.
Logo os soluços transformam-se em gritos e ele briga para sair dos
meus braços, a dor transformando-se em raiva quando, em um rompante,
ele se liberta do meu abraço e joga tudo o que estava na mesa de centro no
chão, descontando a raiva nos objetos pelo apartamento.
Descontrolado, fora de si, é assim que Chace luta contra a dor e eu
deixo. Sigo-o pelo lugar, garantindo que não irá se machucar, mas não faço
nada quando quebra um vaso de planta, ou quando acerta a TV com um
copo, deixo que desconte sua raiva no que quiser até vê-lo correr para a
cozinha e tentar pegar uma faca.
Só então o seguro pela cintura e contenho seus braços, ele grita o
mais alto que consegue, se debate, esperneia, tenta me dar uma cabeçada,
mas nada funciona, sou muito maior e mais forte, nada me fará soltá-lo até
que se acalme e não seja mais um perigo para si mesmo.
Sua luta logo diminui e ele volta a soluçar, me dói ouvir seu
desespero, meu peito aperta por sentir sua dor e só quero arrancar dele,
pegar para mim tudo o que o faz sofrer, eu aguento isso, fui treinado para
suportar técnicas de tortura, fiquei dias nas mãos dos inimigos suportando o
pior que um ser humano consegue fazer, mas é seu choro que me abala.
Assistir meu garoto quebrar em meus braços é pior do que qualquer
dor que eu já tenha presenciado.
Não sei quanto tempo o seguro até que se acalme, mas em algum
momento Chace se entrega e o ergo em meus braços, caminho com ele até a
cama com a intenção de deixá-lo descansar, mas seus braços me seguram
com firmeza. Ele esfrega o rosto molhado de lágrimas em meu peito,
procurando por conforto, e não tenho coragem de afastá-lo.
Deito-me com ele abraçado em mim, escuto seu choro e o aperto com
firmeza, acariciando seus cabelos com uma mão e em um impulso, planto
um beijo em sua testa.
— Acabou — murmura contra meu peito. — Eu não tenho mais
ninguém.
— Estou aqui — digo baixinho. — Você não está sozinho.
“Você vai ficar bem.” Penso, mas não falo em voz alta, é mais uma
promessa para mim mesmo, porque farei o possível e o impossível para que
ele se erga e passe por este momento.
CAPÍTULO 27

Alícia
 
— Wow, docinho, você é selvagem, hein? — Andrei comenta
sorrindo e me entrega uma toalha, que uso para secar os braços. Tentei
limpar ao máximo o sangue do Enzo da minha pele, mas preciso de um
banho completo para isso. — Parece que arruinou o seu lindo vestido, eu
gostava tanto dele. — Ele passa o olhar provocante pelo meu corpo. — Não
que tivesse muito pano para estragar, não é mesmo? Que tal tirar e
comemorar uma tortura bem-feita?
— Só nos teus sonhos — respondo, já sentindo a adrenalina baixar e
começo a ficar cansada. Confiro minhas roupas, droga, estou toda suja de
sangue e outras coisas nojentas. Como não troquei de roupa, o minivestido
que usei no show e as botas não cobrirem muita coisa e, para piorar,
continuo sem calcinha. — O que vai fazer com ele?
Aponto para o corpo do Enzo, agora irreconhecível, já que tomei meu
tempo e tirei toda a pele da sua face. Fiquei admirada com o tanto que ele
aguentou vivo, desmaiou várias vezes de dor, mas o russo é bom em manter
a presa acordada para sofrer.
— Entregar ao senador. — Dá de ombros.
— Você tá maluco? Vai foder com os nossos negócios, eu te falei que
ele tem que sumir.
— Relaxa docinho — responde descontraído enquanto limpa o
sangue das próprias mãos em um balde de água. — Um homem rico assim
não pode deixar que seu filho simplesmente desapareça, ele precisa fazer
uma cena, ter uma história trágica, quem sabe um acidente em uma viagem
tirou a vida do filho mais velho enquanto ele visitava comunidades carentes
na África — fala com aquele tom debochado que consegue me fazer rir. —
Independente de qualquer coisa, ele vai entender o recado e sua Família não
estará envolvida nisso.
— O Senador vai desconfiar.
— Melhor ainda se pensar que vocês têm aliados como nós, seu irmão
fechará esse acordo facilmente. — Ele pisca convencido, mas pensando por
este lado, realmente é uma vantagem.
— Eu odeio como você joga na cara o quanto seu nome é importante.
— Hipocrisia minha? Sim, porque eu uso meu sobrenome como vantagem
para tudo, mas ver outra pessoa fazer isso me irrita, só um pouquinho,
talvez porque a vantagem dele seja muito maior que a minha.
— Ah, docinho, não vem com esse discurso moralista pra cima de
mim, não depois do que eu vi você fazer hoje. — Sorri de forma cúmplice e
aponta para o corpo do Enzo. — Somos farinha do mesmo saco, Alícia.
— Seu saco é muito maior que o meu.
— E eu achando que nunca receberia um elogio para o meu saco. —
Solta uma gargalhada e me deixo relaxar por um momento até que olho
novamente para o corpo do Enzo e a imagem de Gabriel vem em minha
mente.
— Droga, Gabriel deve estar desesperado. — Largo tudo e pego meu
celular, que havia desligado na hora da tortura. O galpão já está bem claro e
vejo os primeiros raios de sol entrarem pela janela quebrada.
— Ele não é seu dono, vai sobreviver algumas horas sem a mulher do
lado — Andrei brinca. — Afinal, essas semanas eu quase não vi o executor
pela boate.
— Ele tinha outras coisas para fazer.
— Isso tem a ver com o Chace?
A menção ao garoto me deixa desconfortável e toda a descontração de
antes se transforma em desconfiança.
— Não é porque acabamos de ter uma sessão de tortura juntos que
não vou te dar outro soco se falar dele novamente — ameaço de forma
séria, esperando meu celular ligar.
— Ele me contou que você o beijou. — comenta como se não fosse
nada, mas Andrei é um homem inteligente e seu jeito descontraído não me
engana.
— E o que você tem a ver com isso?
— Eu só queria melhorar o dia do garoto, ele parecia que ia explodir
nos ensaios então ofereci um ombro amigo — defende-se.
— Corta esse joguinho — repreendo seriamente. — Você não se
importa com ele, estava só coletando informações sobre a minha família,
fez o mesmo quando foi visitar o Kevin no hospital com a desculpinha de
acompanhar o Chace — discorro de forma acusatória. — Você pode fingir
descontração e o que for, Andrei, mas é o filho do Pakhan, um soldado da
mais alta patente da Bratva, você não me engana.
Vejo como seu maxilar trava e ele engole em seco, o olhar
descontraído de antes não existe, os orbes cinza, tão frios como gelo, estão
fixos nos meus em uma batalha silenciosamente travada entre dois
predadores.
Ele sabe que seu jeito descontraído não me engana, o humor e o
deboche que usa para disfarçar sua dor não me enganam, a forma como
sorri para todos e finge não se importar com nada não me engana.
Andrei é tão quebrado e fodido quanto qualquer homem da máfia,
tanto quanto eu.
— Ele é um homem bom, não brinque com os sentimentos do garoto.
— Agora sua voz é fria e autoritária. — Ele não é como nós.
— Fica fora dessa merda. — Lanço um olhar repreensivo para ele,
mas então o aparelho em minhas mãos começa a apitar e vejo a quantidade
de mensagens e ligações perdidas de Gabriel. — Merda, merda, merda,
merda.
— Está tudo bem? — Andrei parece perceber meu desespero.
— Aconteceu alguma coisa na casa do Chace. — Leio a primeira
mensagem correndo para o carro preto, já que o meu foi levado para
limpeza. Os soldados de Andrei nos olham sem entender nada quando exijo
a chave que está com um deles.
— Limpem tudo e enviem o corpo para o Senador Harry de Biasi —
o russo ordena e senta-se  rapidamente no banco do carona. — Coloca isso
daqui.
Ele me entrega uma camiseta masculina preta que jogo por cima do
vestido arruinado antes de ligar o carro e sair em disparada pelas ruas de
Boston. Não demoro muito a chegar na casa de Chace e o que vejo faz meu
coração parar por um momento: as duas residências que pertencem à sua
família foram completamente destruídas pelo fogo.
Um carro de polícia ainda está no local, a área foi isolada e alguns
bombeiros estão avaliando os escombros. Quando paro vejo o soldado do
Gabriel escorado na SUV da Família, ele já está de olho em nossa
aproximação e sua pose muda para defensiva assim que desligo o veículo.
— Gael — chamo o soldado, mas não saio do carro, só abaixo o vidro
escuro. Assim que me reconhece tira a mão da arma e vem em minha
direção. — O que diabos aconteceu aqui?
— Alguém colocou fogo nas duas casas — explica indo direto ao
ponto. — Quatro vítimas, a mãe, a tia e o tio de Chace King e uma
funcionária da clínica que fazia o turno da noite.
— Droga, descobriram mais alguma coisa?
— Os corpos foram levados para perícia, as portas das duas
residências estavam abertas, o tio e a tia foram encontrados em frente à
casa, a mãe e a cuidadora estavam no quarto, só isso que sei até agora.
— Suspeito — Andrei fala ao meu lado e concordo, mas não discorro
sobre isso em frente ao soldado.
— Continue aqui e acompanhe de perto, chame Ettore para ajudar —
ordeno, mas o soldado aponta para os destroços da casa e vejo o homem de
pele preta, alto e com o cabelo raspado que acompanha um policial. —
Gabriel?
— Ele chegou logo depois dos bombeiros — conta e desvia o olhar.
— Não estava sozinho.
— Quem estava com ele?
— Chace King — responde contrariado, como se estivesse
entregando o chefe. — O Senhor Esposito me pediu para te entregar este
endereço.
Pego o papel dobrado das mãos do soldado e vejo o local indicado, é
próximo da Malícia, mas não me recordo de nenhum lugar da nossa Família
por lá. Coloco no mapa a localização e vejo um prédio meio abandonado.
— Quero um relatório a cada hora, envie pessoas ao legista para
garantir e…
— Tudo feito — Gael me interrompe e poderia dar um tiro no
desgraçado pela ousadia, mas não tenho tempo para isso.
Saio rapidamente e corro para o endereço que Gabriel deixou, ele
tentou me ligar por horas, mas só deixou um recado.
Meu coração aperta no peito, Chace deve estar arrasado por perder
toda a sua família assim, em uma noite. Ele não merece, é um bom homem,
que fez tudo pela mãe.
— Ele vai ficar bem, o garoto é forte. — Andrei parece ler meus
pensamentos.
— Você não sabe disso, não faz ideia do que é perder uma mãe assim
— advirto com raiva. — Ele nunca mais será o mesmo.
— Tem razão, eu não sei — aceita, desculpando-se.
Paro no local indicado, é um prédio antigo e com aspecto de
abandonado, a rua não é movimentada e tem pouca luz.
— É melhor você reportar o que fizemos para meu irmão, não sei se
ele ainda está na boate, mas para manter o disfarce vá para a mansão, vou
deixar sua entrada liberada.
— Nem fodendo que você vai entrar aí sozinha. — Andrei prepara
suas armas e desce do carro antes que eu possa contestar. — Olha esse
lugar.
— Eu sei me defender — lembro com a voz baixa.
— E se não foi o Gabriel quem deu o endereço ao soldado? Chegou a
pensar nisso?
Droga, ele tem um ponto.
Estou tão preocupada com Chace e me sentindo uma merda por não
ter atendido o telefone por tanto tempo que nem cogitei a possibilidade de
não ter sido Gabriel.
— Vocês têm um traidor na Família, sempre desconfie — Andrei
aconselha, dessa vez de forma séria. — Vamos pela lateral, não parece ter
ninguém no térreo.
Encontramos uma porta que abre para a escada de acesso aos
pavimentos superiores, sem luz ou qualquer tipo de iluminação, seguimos
tentando fazer o mínimo de barulho possível, preparo minha arma
apontando para a frente, o russo não me deixa passar e segue atento,
portanto dou cobertura.
Chegamos no segundo piso e tudo está trancado, subimos mais um
andar e nada, no quarto e último andar a lâmpada em frente ao que parece
ser o único lugar limpo chama atenção, faço sinal para Andrei ficar de olho
no corredor e colo meu ouvido na porta, à procura de algum som.
Nada.
Tudo está silencioso demais, testo a fechadura e a porta se abre
facilmente, dando-me a visão de um loft industrial que parece ter sido
recentemente limpo e reformado, mas não tenho tempo para avaliar melhor
quando meus olhos caem em uma cama iluminada pela luz do dia.
Identifico os dois homens deitados, Chace está coberto até a cintura
com um lençol branco e parece dormir abraçado em Gabriel. Seu rosto
esconde-se no peito do meu homem enquanto sua mão segura a camiseta
preta do executor, que me encara com o olhar feroz e a arma apontada
diretamente em minha direção.
— O que diabos… — começo a falar, mas ele faz sinal para me calar,
abaixa a arma e lentamente se desvencilha dos braços de Chace, tentando
não o acordar. Gabriel coloca um travesseiro onde antes estava, que o
garoto logo abraça, à procura de conforto.
— Ele acabou de dormir, vamos — Gabriel fala quando passa sem
nem olhar em meu rosto, ele segura a porta aberta e, assim que Andrei e eu
saímos, fecha sem fazer barulho e segue para o andar de baixo. Com uma
chave abre o apartamento que estava trancado.
— Gabriel, eu… — começo a falar na esperança de justificar minha
ausência, mas seu olhar magoado me cala.
— Ele é o motivo de você não atender a porra do telefone a noite
toda? — Gabriel questiona furioso e descontrolado apontando para Andrei,
o olhar acusatório me atinge como um tapa. — Essa camiseta é dele
também?
— Cara, não é nada… — Andrei tenta me defender, mas assim que se
aproxima Gabriel encosta o cano da arma na cabeça do russo, que trava,
mas não se defende.
— Não estou falando contigo — Gabriel avisa sem tirar os olhos dos
meus. — Vou perguntar mais uma vez, Alícia, onde você estava?
— Torturando Enzo de Biasi — respondo diretamente e seus olhos se
abrem em espanto. — Ele atacou a ex-namorada ontem à noite, foi ela
quem me ligou. Andrei me viu saindo sozinha e foi comigo porque eu não
podia levar nossos soldados.
Relato o que aconteceu quando chegamos ao prédio de Tatiana e tudo
o que fizemos depois, durante esse tempo Gabriel não abaixa a arma até que
eu termine, seus olhos não saem de mim, ele sabe que não estou mentindo,
mas continua magoado.
— Você sabia que não podia matá-lo — Gabriel repreende e só então
tira a arma da cabeça do russo e guarda no cós da calça. — A Família vai se
complicar por causa disso.
— Eu já resolvi este assunto. — Andrei entra no meio. — A Bratva
vai assumir a culpa, temos o senador em nosso bolso.
— Mais uma palavra… — Gabriel ameaça, agora olhando
diretamente para o russo que bate de frente com ele.
— Andrei, é melhor você ir — aconselho e seguro o braço de Gabriel.
— Repasse o que aconteceu para os meus irmãos e avise que estarei em
casa assim que possível.
O russo pensa por um momento, como se avaliasse a situação, mas
então concorda com a cabeça e sai, deixando-nos sozinhos.
— Como você está? — pergunto e fico de frente para Gabriel, vejo as
olheiras, a forma com que aperta o maxilar. — Amor…
— Você não estava aqui — acusa com a voz trêmula. — Quando
precisei de você, quando ele precisou de você, por que não estava aqui?
— Eu vim assim que vi a mensagem.
— Ele tentou correr para o fogo — relembra assustado e meu coração
quebra no peito ao vê-lo assim, perdendo o controle. Gabriel nunca perde o
controle. — Eu tive que… precisei segurá-lo.
— Hey, está tudo bem. — Aproximo-me para tocar seu rosto, mas ele
se afasta, recusa meu carinho e passa as mãos pelos cabelos, desolado.
— Ele tentou correr, mas eu o segurei contra meu peito então… ele
me abraçou e… — confessa e agora entendo sua dor, Gabriel está confuso e
com medo, um sentimento que este homem não tem há muito tempo.
— E você não o afastou — complemento o que ele ia falar.
— Eu não podia, precisava protegê-lo, Ali. De tudo aquilo, da dor, do
sofrimento, de tudo. — Ele começa a caminhar de um lado para o outro,
despejando toda a frustração que estava segurando até agora. — Você
deveria estar lá, era você quem deveria ter segurado ele, eu não sou bom
nisso, eu não faço essa parte.
— Eu sei — confirmo calmamente, pela primeira vez nossos papéis
estão invertidos e sei que preciso manter minha merda guardada e deixar
que ele extravase.
— Sou o executor, aquele que tortura e tira vidas, não vou até a
família depois e conforto os familiares, eu não sei como fazer isso.
É sobre isso. A maior insegurança de Gabriel está exposta, como um
nervo sensível sendo cutucado. Ele nunca se achou bom o suficiente para
ser amado, só me aceitou porque eu não dei outra opção.
— Amor, olha para mim — chamo sua atenção, fazendo-o parar de
endoidar e me olhar. — Você esteve lá por mim.
— Era diferente, fui o primeiro a chegar e você era uma criança.
— Você esteve ao lado da minha família a vida toda, protegeu meus
irmãos, cuidou deles depois que meus pais morreram — falo com calma,
para que escute tudo. Gabriel é um homem protetor, mas não admite isso
para si mesmo, ele finge não se importar para não se frustrar. — Quantas
vezes salvou Lorenzo em uma missão? Quantas vezes protegeu Matteo e o
tirou de situações perigosas? Quem me encontrou quando fugi de casa e
quase tive uma overdose?
— Não é a mesma coisa — repete com a voz mais fraca que antes.
— Você cuida e protege quem é importante para você — afirmo e
vejo seus ombros caírem. — Fez isso com a minha família, comigo e agora
com ele.
— Alícia…
— Não tem nada de errado nisso, amor, não é uma fraqueza deixar
que se aproximem, ele não vai te machucar, eu não vou te machucar. —
Aproximo-me e seguro sua mão, dessa vez ele não me afasta e solta uma
respiração longa. — Nós vamos cuidar dele, me perdoa por não chegar
antes, mas estou aqui agora.
Gabriel me abraça e consigo sentir todo o peso que ele estava
carregando sozinho, sua dor e o quanto esta noite foi difícil para ele. Meu
homem é fechado e jamais assumiria que está confuso, mas eu sei, o
conheço melhor do que a mim mesma.
Em pouco tempo Chace King se tornou alguém importante para nós
dois, e já é hora de parar de fingir que não sentimos nada pelo garoto, agora
ele precisa de nós e estaremos ao seu lado.
— Vamos cuidar dele juntos. — A certeza em minhas palavras
também me assusta, mas com Gabriel ao meu lado enfrentaremos esse
desafio, e se ele precisa que eu seja a calma nesse momento, eu prometo
tentar, porque faria de tudo por esse homem. — Ele já sabe?
— Sim, recebi a notícia ainda de madrugada, tentei te esperar, mas ele
estava pirando e não consegui esconder.
— Não foi um acidente, alguém colocou fogo nas duas casas, Ettore
já está lá, logo devemos ter algumas respostas.
— Que merda está acontecendo? Ele não tem envolvimento em nada,
é só um garoto — Gabriel comenta frustrado e me afasto do seu abraço para
pensar um pouco. — Parece que falta algo, que deixamos alguma
informação passar.
— Não tinha nada, Max e o detetive reviraram a vida toda do Chace,
da mãe dele, da tia. O mais suspeito era o tio, que mantinha seu vício em
jogos, mas sempre pagava e não passava dos limites.
— Falta alguma coisa, é como se estivesse bem na minha cara e eu
não consigo ver.
Confirmo com a cabeça, essa é a mesma sensação que tenho quando
penso em tudo isso, como se estivéssemos esquecendo de algo óbvio.
CAPÍTULO 28

Chace
 
Acordo meio confuso ao abrir os olhos e não reconhecer o lugar onde
estou, os lençóis brancos e macios da cama não são meus, a parede de
tijolos à vista não me é familiar. Viro-me e olho a grande janela por onde a
luz do sol ilumina o cômodo, cegando-me por um instante.
Este não é o meu quarto, não é a minha casa…
Então me lembro do fogo e as memórias da noite anterior invadem
minha mente, fazendo-me desejar que tudo tenha sido um sonho ruim, um
maldito pesadelo, daqueles que quando a gente acorda, ainda parecem ser
reais.
A dor invade meu peito e transborda pelos meus olhos, não consigo
acreditar que eles se foram.
— Hey, gatinho. — Uma voz doce e familiar me faz olhar para o pé
da cama e vejo Alícia, vestida com um short e camiseta rosa, o cabelo
embolado em um coque no topo da cabeça. Seu rosto limpo, completamente
sem maquiagem, me atrai para os olhos verdes e carinhosos. — Desculpa a
demora.
Então ela se joga na cama e me abraça forte, confortando um pouco
da minha dor, mas não consigo falar nada, porque isso parece parte do
pesadelo.
— É só um sonho ruim — sussurro baixinho deixando minhas
lágrimas caírem. — Eu logo vou acordar — imploro, como se essas
palavras fossem o suficiente para voltar no tempo.
Alícia levanta a cabeça e me olha como se sentisse minha dor, passa
uma perna de cada lado do meu corpo e sua mão delicada pelo meu rosto
em uma carícia, arrastando o dedo pela minha bochecha na vã tentativa de
conter as lágrimas.
— Infelizmente não é um pesadelo — anuncia e sinto meu coração
quebrar. — Queria que fosse, se eu pudesse viver esses dias por você, eu
faria, trocaria de lugar contigo e aguentaria sua dor, porque vai doer,
gatinho, mais do que qualquer coisa que você já tenha sentido.
— Eu não… Ali, elas estão… — Minha voz sai cortada entre soluços
e não consigo completar a frase, todo o meu corpo treme e me apoio no
toque da sua mão, seguro na cintura de Alícia, procurando por algum
conforto.
— Sim, querido — ela confirma e planta um beijo carinhoso em meu
rosto. — Elas estão mortas.
A confirmação faz tudo se tornar real, e sei que precisava ouvir essas
palavras diretamente, mas não estava preparado para a dor excruciante que
isso me causou, como se alguém tivesse me aberto e arrancado meu coração
sem anestesia nenhuma.
Sinto meu peito comprimir e não consigo respirar, é como se faltasse
ar no ambiente, como se meus pulmões se recusassem a trabalhar entre toda
essa dor. Não vejo mais nada por entre as lágrimas, então um grito faz
minha espinha congelar.
Só quando mãos fortes me chacoalham é que percebo que fui eu
quem gritei, que essa voz é minha.
— Chace, você precisa respirar. — A voz grossa de Gabriel me faz
abrir os olhos novamente. — Respira, garoto. — Seu comando me faz
puxar o ar e tudo dói quando consigo colocar oxigênio em meus pulmões.
— Isso, mais uma vez.
— Deixa sair, gatinho — Alícia fala no meu ouvido e continua
acariciando meu rosto. — Nós estamos aqui por você.
Eles estão comigo, cada um de um lado e é dessa forma que deixo
toda a minha dor sair, porque não consigo parar, não consigo suportar o
pensamento de que eles se foram.
 
***
 
Alícia não saiu do meu lado o dia todo, ela me fez tomar água e
comer alguma coisa que Gabriel preparou, mesmo sem fome não tive
escolha a não ser empurrar a comida. Depois acabei dormindo durante a
tarde e acordei já de noite.
— Sim, caixão fechado — Alícia fala com alguém no telefone, sua
voz prece irritada. — Só faça algo bonito e bem-feito, não quero
imprevistos amanhã.
— Você acordou. — Gabriel se senta do meu lado. — Desculpa, eu te
dei um calmante, você precisava descansar um pouco.
— Obrigado — digo sem realmente computar o que ele falou, olho
para fora e vejo que está bem escuro lá fora. — Que horas são?
— Quase dez da noite — Gabriel responde.
— Droga, eu acho que tenho que começar a organizar o enterro e…
— Fica tranquilo, gatinho, tudo já está sendo preparado, só preciso
que me diga os nomes das pessoas que sua família conhecia para que
possamos avisá-los da hora e local do enterro — Alícia informa com
carinho.
— Eles já foram liberados? Os corpos? — A última palavra treme em
minha boca e sinto meu peito apertar novamente, a vontade de chorar é
demais, porém engulo em seco e decido tomar o controle, preciso ser forte
para passar por isso.
— Sim, tudo já foi encaminhado — Ali me tranquiliza. — Se tiver
algum detalhe especial que você queira para o enterro é só me falar, vocês
são religiosos?
— Minha tia é um pouco — respondo no automático. — Era.
— Gostaria que um padre fosse chamado? — ela pergunta.
— Eu não sei, talvez sim, não sei o que elas queriam, nunca… nunca
falamos sobre isso.
— Tudo bem, gatinho. Você tem alguma crença ou segue uma
religião?
— Não, minha mãe também não era muito religiosa, só minha tia
mesmo, e meu tio. — Pego o celular e confiro a lista de contatos. — Aqui, é
só avisar o padre da paróquia do nosso bairro que ele fará a notícia circular.
— Obrigada, vou fazer isso agora — ela segura meu telefone e sai do
apartamento.
— Preciso de um banho. — Passo a mão pelos meus cabelos e me
sinto sujo, ainda estou usando as mesmas roupas de ontem, e não tive tempo
para tomar banho direito na boate antes de Gabriel chegar.
— O banheiro é naquela porta, tem toalhas limpas no balcão, use o
que precisar. — Gabriel indica o local e levantando-se vai até uma porta e
volta com roupas nas mãos. — Alícia trouxe roupas para você, estão todas
neste closet.
— Não precisava. — As palavras saem de forma automática, mas só
de ver seu olhar triste para mim, lembro que precisava sim, porque todas as
minhas roupas, tudo o que eu tinha, se perdeu no incêndio.
— Você gosta de macarrão? — Gabriel pergunta caminhando até a
bancada da cozinha. — É a única coisa que sei cozinhar e não podemos
pedir comida aqui no loft.
— Por que não?
— Ninguém pode saber sobre este local, por enquanto.
Não pergunto mais nada, nem sei o que pensar sobre isso, porque não
faço a menor ideia de onde estou, então pego as roupas que ele deixou em
cima da cama e vou até o banheiro. Depois de uma ducha quente me sinto
um pouco mais acordado, meus olhos não estão mais pesados, mas meu
corpo todo ainda dói, como se tivesse corrido uma maratona.
Encontro uma escova de dentes na embalagem em cima da pia e faço
minha higiene, antes de sair olho no espelho e a imagem refletida não me é
familiar, nada mudou, só que não reconheço o homem olhando de volta.
— Aqui diz que precisa pôr em uma panela bem grande, com muita
água fervendo, e tem que colocar sal antes de adicionar a massa. — Alícia
lê as instruções em seu celular, ela está sentada em cima da bancada com
uma taça de vinho nas mãos. O pijama curto de cetim rosa-claro atrai minha
atenção para ela, seu cabelo agora cai naquela cascata de cachos dourados
até o meio das suas costas, e ela está de meias brancas nos pés.
— Quer assumir a cozinha? — Gabriel questiona irritado, ele está de
costas para ela, só com uma calça de moletom cinza e uma camiseta azul,
mexendo em alguma panela no fogão.
— Só porque sou mulher deveria cozinhar?
— Não, mas se vai ficar se intrometendo é melhor fazer você mesma,
não acha?
— Não posso, fiz as unhas ontem e não vou estragá-las. — Ela toma
um gole do vinho.
— Então não enche o saco, porra.
— Mas é tão legal! Você nunca cozinhou pra mim — ela faz beicinho
enquanto fala com a voz manhosa. — Se ficar bom você vai fazer isso de
novo.
— Nunca cozinhei porque somos ricos e temos cozinheiras para isso,
e pode tirando essa ideia da sua cabeça, que eu não vou fazer isso para
sempre — ele repreende e se vira com uma colher de pau na mão, então seu
olhar encontra o meu e me sinto um intruso sendo pego em flagrante. —
Está quase pronto.
— Eu sabia que ia servir. — Alícia me olha dos pés à cabeça e abre
um sorriso lindo. — Vem cá, Bunny está cozinhando para nós.
— Não me chama assim.
— Só aceita, amor — ela responde com a voz brincalhona e quando
percebe que não me movo, Alícia desce da bancada com um pulo, caminha
em minha direção e pega minha mão, arrastando-me até a cozinha. —
Agora senta, a bancada está fria demais.
Quando faço o que ela manda e me sento no banco alto próximo da
bancada, Alícia pula no meu colo, assustando-me com o gesto e preciso
segurá-la pela cintura para que não caia para frente.
— Bem melhor, aqui está quentinho — Ela sorri e coloca uma mão
em cima da minha, indicando para deixá-la em sua cintura, a outra volta a
segurar a taça. — Gosta de vinho, gatinho?
— Não muito, eu não bebo.
— Experimenta esse, combina com o macarrão que vamos jantar —
oferece e aceito, o gosto é um pouco forte, mas parece bom, não entendo de
vinhos. — É um Cabernet Sauvignon, gostoso, né?
— Muito bom — respondo, não que eu tenha com o que comparar,
mas a bebida desce leve no meu estômago. Alícia toma mais um gole e me
entrega a taça novamente, depois da segunda vez fica mais fácil aceitar,
parece que o vinho desce suave e me sinto um pouco melhor.
— Vão com calma, vocês precisam por algo no estômago antes —
Gabriel repreende e Alícia solta uma risadinha malandra e se escora mais
em meu peito.
— Eu gosto do seu cabelo mais comprido — comenta enquanto passa
os dedos pelos fios do meu cabelo, seu olhar percorre meu rosto e ela parece
tão confortável assim que aperto mais a sua cintura. — Você é lindo,
gatinho.
O que eu respondo a isso? Sinto meu rosto queimar com as suas
palavras tão soltas, ela nunca ficou tão confortável assim comigo, não sei
nem o que pensar com essa proximidade toda. Na Malícia ela brincava e
provocava, mas sempre tinha uma distância entre nós, uma barreira
invisível, algo que a colocava como minha superior, uma pessoa tão
incrivelmente forte e poderosa que estava em um patamar inalcançável para
alguém como eu.
Até mesmo quando ela e Gabriel me provocaram depois da corrida,
naquele momento eles estavam me dando uma abertura, mas era algo
impessoal, passageiro, só um momento de luxúria.
Isso aqui é diferente, é íntimo e leve, e faz meu coração bater de
novo, tão rápido quanto um tambor e isso me assusta pra caralho.
— Não pensa em nada agora, gatinho — Alícia sussurra em meu
ouvido, a respiração quente contra minha pele me faz arrepiar. — Só deixa
a gente cuidar de você.
— O jantar está pronto — Gabriel anuncia e coloca uma travessa com
o macarrão escorrido em cima da bancada — será que preciso pôr o molho
aí dentro? — questiona confuso enquanto segura a panela com o que
assumo ser o molho.
— Coloca tudo junto e vamos comer, estou morrendo de fome —
Alícia ordena e desce do meu colo, não sem antes segurar meu rosto e me
dar um beijo delicado na bochecha. — Você gosta de queijo?
E é assim, comendo um macarrão que cozinhou um pouco mais do
que deveria, com um molho sem sal e coberto com muito queijo, que
esqueço da minha dor. Por alguns minutos minha cabeça está nas duas
pessoas que conversam e cuidam de mim, como se eu fizesse parte disso
aqui.
 
***
 
O enterro passou como se eu não estivesse lá, parece que assisti a
tudo do alto, como se aquela dor, o choro, as palavras de conforto das
muitas pessoas que compareceram — das quais não lembro nem do rosto —
fosse um filme.
Teve uma celebração religiosa, o padre falou alguma coisa, depois os
três caixões foram levados até o cemitério, mais algumas palavras do padre,
rosas brancas, choro, dor, então acabou.
As pessoas se despediram e foram embora, mas eu fiquei.
O dia está cinza, o céu coberto por nuvens pesadas anuncia que irá
chover, nem um raio de sol se fez presente, porque parece que até o clima
está triste. Não faço ideia em qual cemitério estamos, olho para o lado e
vejo incontáveis lápides de mármore no chão, todas iguais. Sei que logo
minha família terá as suas, vejo os funcionários ao longe, aguardando para
terminar seu trabalho, mas eu não consigo me mover, meus pés parecem
cravados ao chão, porque abaixo de mim está toda a minha família, as
únicas pessoas que eu tinha agora estão mortas.
Não existem mais.
— Precisamos ir, gatinho — Alícia fala do meu lado e aperta minha
mão, só então reparo que ela está ali, seus dedos finos e longos entrelaçados
aos meus, como uma âncora à realidade. — Vai começar a chover.
Viro-me e encontro aqueles olhos verdes me encarando com ternura e
carinho, ela está com um vestido todo preto, botas e o cabelo preso em um
coque elaborado, acho que nunca vi Alícia sem nada colorido em suas
roupas.
— Eu não sei se consigo sair daqui — confesso e minha voz sai fraca,
percebo que não falei nada o dia todo. — Não tenho para onde voltar, eles
se foram, toda a minha família se foi e… estou sozinho.
— Você não está sozinho — ela responde, mas não muda o que sinto.
Sinto o primeiro pingo de chuva cair em meu rosto, logo seguido de
mais um e o céu finalmente começa a desabar, molhando o terno que
Gabriel deixou arrumado para mim de manhã. Nem as roupas no meu corpo
me pertencem.
Eu não sou mais nada, não consigo pensar em um motivo para me
mover e sair daqui, estou completamente perdido.
— Vamos. — A voz grossa de Gabriel me atrai para o outro lado,
então ele abre o guarda-chuva e coloca uma mão nas minhas costas,
conduzindo-me até o carro. Alícia me acompanha do outro lado. — Você
não está sozinho — ele sussurra em meu ouvido antes de me fazer entrar na
limusine e me seguir.
 
CAPÍTULO 29

Gabriel
 
Já vivi muitos processos de luto durante meus 39 anos nesta terra.
Quando perdi minha avó, que era uma das pessoas mais importantes na
minha vida, doeu muito por muito tempo, mas nunca perdi alguém tão
próximo, meus pais estão vivos e bem de saúde, até liguei para eles esta
semana.
Acompanhei de perto o luto da Família de Angelis depois da morte de
Don Vitório e sua esposa, Isabela. A perda dos pais foi um baque para
Lorenzo, e como seu melhor amigo, estive ao seu lado por todo esse
período.
Ele foi muito forte e precisou engolir a própria dor para assumir a
liderança da Família, Matteo ainda teve um período para respirar, porque
ele só assumiu como Consigliere um tempo depois, quando meu pai se
aposentou, mas eles dois ainda precisaram cuidar de uma criança que ficou
sob sua responsabilidade.
Nós crescemos na máfia e estamos rodeados pela morte desde que nos
entendemos por gente, aprendemos a lidar com ela sem quebrarmos, porque
muitas pessoas dependem de nós. Nunca nos acostumamos com isso, e
como executor precisei criar um mecanismo de defesa que me afasta de
cada uma das minhas vítimas, não posso sentir sua dor ou pensar na sua
família quando faço o que tenho que fazer.
Estive ao lado de Lorenzo durante o luto dele, o acompanhei perder a
cabeça, assisti meu amigo quebrar e se afogar na bebida até perder a
consciência, eu estava lá para garantir que estivesse seguro. Mesmo sem
poder tocá-lo ou abraçá-lo, fiquei do seu lado e senti a sua dor.
É por isso que entendo o atual estado do garoto em minha frente. Faz
uma semana desde que enterramos sua família. Alícia achou melhor
ficarmos no loft, mas Lorenzo não aceitou deixar a irmã desprotegida, então
ordenou que tivéssemos soldados à paisana e instalássemos o sistema de
segurança.
Eu já tinha programado fazer isso, não era para usarmos esse lugar tão
cedo, mas já que estamos aqui precisei agilizar as coisas, ainda mais depois
de ter confirmado que o incêndio não foi um acidente.
O legista encontrou balas de tiro nos corpos, que foram queimados
após a morte. Ettore também confirmou que o fogo teve um ponto de início
fora das duas casas e foi usado combustível como catalizador.
Eles foram assassinados, mas por quê?
Chace não falou nada na volta do enterro, ele chorou o caminho todo
nos braços de Alícia, mas quando chegamos ele pegou uma garrafa de
vodca do bar e disse que queria ficar um pouco sozinho. Ela não queria
deixar, mas a segurei e pedi que respeitasse o momento do garoto, ela era
muito nova para realmente entender o que aconteceu com seus pais, claro
que ela sabia que eles haviam morrido, mas é diferente para uma criança.
Só que desde aquele dia Chace não está reagindo bem. Ele dorme
muito tempo e se apossou do sofá da sala. Quando acorda liga a TV — que
substituí por uma nova depois que ele quebrou a outra — em qualquer canal
e fica na frente, seus olhos estáticos nem se movem com as imagens, é
como se ele estivesse presente só de corpo, mas sua mente está dispersa em
algum outro lugar.
Alícia tentou tirá-lo de lá, fez de tudo para convencê-lo a sair um
pouco, disse que o pessoal da Malícia estava preocupado com ele, mas
nada. O garoto ouvia e acenava com a cabeça, e só.
Estou ficando cada dia mais angustiado com seu estado, ele se
alimenta pouco e não se importa com nada. Ali, por outro lado, está puta
por não saber o que fazer para ajudá-lo, e sua forma de demonstrar isso é
fazendo o que ela faz quando está frustrada: gastar dinheiro.
Se antes esse loft estava vazio, com uma decoração bem minimalista,
isso mudou completamente nos últimos dias. Além de decorar o
apartamento e trazer cor e vida ao ambiente — com muito rosa e dourado, é
claro —, Ali comprou um guarda-roupa completo para o Chace, por sorte o
lugar tem espaço, porque a quantidade de roupas e calçados que ela traz
todo dia é assustadora.
E nem isso chamou a atenção dele, que só usa os moletons e pijamas
confortáveis, sem nem olhar direito antes de pegar. E é essa inatividade toda
que tem me deixado mais preocupado, ele não está triste, não chorou mais,
não falou sobre a família, Chace está em um estado depressivo.
Eu e Alícia temos revezado a cama para dormir, mas entre cuidar de
Chace e dar conta das demandas da boate, mais os trabalhos da máfia,
dormir mesmo tem se tornado um luxo.
Os outros dançarinos e funcionários da Malícia quiseram visitá-lo,
mas quando Alícia perguntou ao garoto se ele aceitava receber seus colegas,
ele se negou e disse que não estava com cabeça para isso.
Andrei foi o único que apareceu sem avisar, ele ainda mantém o
disfarce de ser só um dançarino na boate, mas eu não suporto sua presença,
e minha aversão ao russo só piorou quando Chace respondeu às perguntas
dele e pareceu ficar confortável com a sua presença.
Eu não quero o meu garoto com esse maldito russo debochado, só que
precisei me manter calado enquanto assistia os dois na sala, porque por
mais que odeie o cara, ele fez Chace reagir, mesmo que por um tempo, e eu
faria qualquer coisa para vê-lo melhor.
Aproveito que Alícia não está e decido colocar um ponto final nisso,
não aguento mais assistir ele definhar assim e não fazer nada, dei espaço,
deixei que tivesse um tempo para absorver tudo o que aconteceu, mas se
continuar assim ele vai entrar em uma escuridão profunda demais.
— Já chega. — Desligo a TV e sento-me na mesinha de centro, de
frente para Chace, que não reage à minha aproximação. — Eu sei que você
pediu um tempo, mas não pode continuar assim.
— Não tenho nada mais para fazer. — Sua voz baixa e sem vida
provoca um frio na minha espinha, e quando encontro seus olhos meu
coração aperta no peito, o castanho antes tão intenso e cheio de vida, agora
parece nublado e inexpressivo.
— Me ajuda a fazer a janta — falo a primeira coisa em que consigo
pensar.
— Não estou com fome.
— Foda-se, eu estou. — Seguro seu braço e o forço a se levantar
comigo. — Vamos cozinhar e tomar alguma coisa.
— Gabriel, eu não…
— Não, você vai fazer o que estou falando porque estou cansado
dessa merda — anuncio e o puxo até a cozinha, praticamente forço que se
sente na bancada, pego duas cervejas da geladeira, abro uma e entrego para
ele. —Agora toma, talvez isso te anime.
Chace percebe que não tem escapatória, então dá de ombros e aceita a
bebida.
Só que eu fui ingênuo.
Burro.
Estúpido, Gabriel, muito, muito estúpido.
Corta a linha do tempo para duas horas depois, três cervejas e
algumas doses de tequila que ele encontrou em algum lugar, e o garoto
reagiu, mas não de uma forma boa.
Agora ele está puto, e bêbado, muito bêbado. Depois da primeira
cerveja Chace praticamente virou a segunda e a terceira. Como não havia
comido quase nada durante o dia, o álcool fez efeito muito rápido, logo ele
estava me contando histórias sobre sua infância, sobre sua tia, como foi
criado por ela, que também ajudava a cuidar da sua mãe.
Entre soluços ele relembrou momentos bons e também os mais
difíceis, desenterrou memórias de antes da sua mãe descobrir a doença,
claro que ele era muito novo, então não são realmente histórias confiáveis,
mas o que ele me contou deixa marcas.
Seu pai era um abusador nojento que batia na mãe toda vez que os
visitava, pelo que entendi ele não morava com eles. Chace também não
explicou bem, só que depois que ele sumiu sua mãe o proibiu de perguntar
sobre ele, e o garoto também não queria, afinal não tinha uma memória boa
do pai.
E agora está no closet, procurando uma mala para pôr algumas roupas
enquanto jura que vai embora.
— Eu não quero mais ser um fardo para vocês — anuncia com a voz
arrastada por causa da bebida. — Eu vou para algum lugar. — Pega um
banco e puxa até as prateleiras, na intenção de subir e procurar nos lugares
mais altos. — Posso pagar um motel barato por uns dias…
— Nem fodendo. — Interfiro bem na hora que ele se desequilibra e
quase cai de costas, consigo segurá-lo antes que chegue ao chão. — Para
com isso.
— Me solta. — Ele se desvencilha dos meus braços e sai
cambaleando em direção à porta de entrada. — Foda-se também, nada aqui
é meu, não tenho o que levar.
— Chace, volta já aqui.
— Não.
— Garoto…
— EU NÃO SOU A DROGA DE UM GAROTO — repreende aos
berros. — E você não é nada meu, por que está preocupado? Eu vou voltar
a trabalhar e pagar a dívida que tenho com vocês, se é sobre isso, pode ficar
tranquilo.
— Estou pouco me fodendo para dinheiro, quem se importa com essa
merda?
— QUEM NÃO TEM! — Ele se vira e me encara com fogo no olhar.
— Vocês são tão… tão… riquinhos metidos a besta, olha isso aqui. — Abre
os braços indicando o loft. — Ela deve ter gastado dez vezes o que estou
devendo. — Então ele aponta para o closet e depois para as roupas em seu
corpo. — Não consigo nem imaginar quanto custam essas roupas, mas eu
sei que são de marca e também sei que não tenho como pagar.
— Ninguém está te cobrando nada. — Tento acalmá-lo, mas ele solta
uma risada alta e paro de falar.
— Agora não estão me cobrando, quando foi para apontar uma arma
para mim e me forçar a tirar a roupa para vocês, aí sim estavam me
cobrando — aponta de forma acusatória. — É isso que vocês querem?
Querem me foder, me usar como brinquedinho sexual nas suas aventuras
deturpadas, é esse o jogo aqui?
— Caralho, não é nada disso.
— Claro que não, por que nem me foder vocês querem, não é
mesmo? Afinal, o que um garoto virgem e inexperiente teria para dar a duas
pessoas como vocês.
Se ele soubesse que só de estar tão próximo assim meu pau já está
pulsando na calça… ele nem imagina o quanto preciso me controlar para
não o segurar agora mesmo e foder essa boquinha atrevida até que ele se
afogue no meu pau e peça mais, implore por mais.
Chace não imagina como está revirando meu mundo de cabeça para
baixo, porque até agora somente uma pessoa foi capaz de me fazer sentir
esse descontrole, até ele chegar.
— Então o quê, Gabriel? — Ele caminha em minha direção exigindo
uma resposta, parando bem na minha frente, seu rosto a centímetros do
meu. Posso sentir sua respiração quente no meu rosto, o cheiro de álcool é a
única coisa que me faz respirar fundo. — Por que estão me mantendo aqui?
— Já disse, vamos cuidar de você — murmuro uma resposta calma.
— Ah, vai se foder, eu não sou um gato de rua que vocês trazem para
dentro de casa para cuidar. — Ele tenta me empurrar, mas antes que
consiga, seguro seus dois pulsos e em um ímpeto de coragem Chace corta a
distância entre nós e me beija.
O garoto está me beijando.
Sua boca me toma com necessidade, sinto a barba que ele não faz há
alguns dias se arrastar contra a minha, é delicioso e surreal ao mesmo
tempo, mas nada pode ser melhor do que a sensação dos seus lábios se
abrindo contra os meus, dando-me espaço para tomá-lo da forma que eu
quero. Não, porra, da forma que eu preciso.
E é exatamente isso que faço, no momento em que nossas línguas se
encontram e sinto seu gosto, meu coração explode no peito. Largo suas
mãos para segurar seu pescoço, Chace reage e me agarra pela cintura,
colando nossos corpos, deixando-me sentir o quão duro está, e caralho, eu
já estava a ponto de explodir, mas sentir seu pau roçando no meu quase me
faz gozar.
— Meu — rosno contra sua boca antes de morder seu lábio inferior.
— É isso que você provoca em mim. — Pego sua mão e coloco no meu
pau, duro feito pedra para ele, por ele. — É por isso que está aqui.
— Então me fode logo — implora em um gemido desesperado e
aperta meu membro, fazendo-me delirar de prazer, e preciso me lembrar
que ele está bêbado para não fazer o que me pede.
— Não assim. — Tento me afastar, mas ele não deixa, sua boca volta
a me dominar enquanto aprofunda ainda mais o beijo, e caralho, o garoto
sabe beijar. Sinto a inexperiência, porém a bebida o deixou solto. —
Garoto…
— Ou você me fode ou me mata. — Ele se afasta com a respiração
ofegante e no mesmo instante sinto falta do seu toque, da sensação do seu
corpo no meu, da sua boca, do gosto do seu beijo. Só quando baixo o olhar
que vejo a merda que ele fez. — Qual vai ser?
Ele me distraiu e pegou a minha arma sem que eu percebesse, que
merda foi essa? Estava tão perdido na insanidade do seu beijo que não
percebi.
— Chace, devolve minha arma — exijo com a respiração ofegante,
ainda tentando controlar as batidas insistentes do meu coração. — AGORA,
PORRA!
Estendo a mão e tento dar um passo em sua direção, mas ele aponta a
arma para a própria cabeça e sinto todo o sangue do meu corpo se esvair,
meu coração para abruptamente quando o cano toca sua têmpora.
De repente a porta se abre atrás dele e Alícia entra, com o susto Chace
pula no lugar e se vira para ela.
— Você perguntou se eu tinha um motivo para não desistir —
relembra e Alícia me olha assustada. — E acho que não tenho mais, acho
que é melhor simplesmente acabar logo com isso. — Ele se vira para mim
novamente, seus olhos castanhos estão vermelhos e nublados de lágrimas.
— Chace… — Alícia chama com a voz baixa, mas ele não responde,
vejo o momento em que fecha os olhos e respira fundo, então me lanço para
frente, mas não consigo chegar a tempo.
Escuto o click do gatilho que faz meu mundo todo parar, mas o tiro
não sai, por um momento fico confuso, até ver que Chace não tirou a trava
de segurança.
Jogo a arma longe e seguro o garoto em meus braços, mantenho suas
costas em meu peito e seus braços contidos na lateral do corpo. Quando
percebe que não conseguiu o que pretendia, ele desaba em um choro
convulsivo.
— Acaba com isso logo, Gabriel, faz o que deveria ter feito aquele
dia e me mata — implora e cada palavra sua deixa uma marca em meu
coração. — É isso o que pessoas como vocês fazem, vocês matam os
outros, então me mata, porra, acaba logo com isso, por favor.
— Chace, não fala isso. — Alícia se aproxima e tenta secar as
lágrimas que escorrem descontroladamente.
— Dói muito, Ali, meu peito dói tanto — confessa com a voz
trêmula. — Faz essa dor passar, por favor, eu não tenho mais nada a perder.
— Eu sei que dói. — Ela segura seu rosto e olha diretamente para ele.
— Mas nós estamos aqui por você.
— Não… — Ele tenta virar o rosto, mas ela não deixa.
— Sim, você é importante para nós e estaremos ao seu lado, deixa a
gente te apoiar, nos deixe cuidar de você. — Com essas palavras ela planta
um beijo carinhoso nos lábios de Chace, é rápido e parece certo. — Você
faz parte de nós, agora.
— Eu… — ele começa a falar, mas sinto seu corpo ficar tenso, Alícia
deve ter visto também, porque rapidamente se afasta e pouco depois Chace
vomita todo o líquido que estava em seu estômago, despejando tudo no
chão.
Ajudo-o a se manter em pé enquanto ele se livra de tudo e Alícia fica
do lado, dando tapinhas nas costas do garoto, o olhar preocupado é o
mesmo que o meu. Depois disso ele já não está mais consciente o suficiente
para falar e o ajudo a tomar um banho quente e trocar as roupas sujas por
um pijama limpo.
Conseguimos fazer com que tome um pouco de água, mas logo ele
apaga de vez na cama.
CAPÍTULO 30

Alícia
 
A visão do Chace apertando o gatilho da arma em sua cabeça foi o
momento mais desesperador da minha vida. E isso, vindo de alguém que
assistiu a mãe ser morta e matou o próprio pai com oito anos, é algo grande.
Diferente daquela época em que eu não sabia o que estava
acontecendo, dessa vez eu entendi tudo assim que entrei no apartamento e
congelei no lugar. São poucas as coisas capazes de me fazer sentir medo,
geralmente procuro a adrenalina que o perigo traz, mas isso aqui não foi
nada legal.
Vi todo o meu mundo desandar assim que ele apertou o gatilho, e foi
como se eu tivesse morrido um pouco naquele momento. Só respirei
aliviada quando Gabriel o segurou e percebi que ele estava vivo, por sorte o
garoto não faz a menor noção de como usar uma arma.
Ele está vivo, mas Chace apertou o gatilho. Este é o tamanho da sua
dor, porque alguém pode gritar, chorar, sofrer a ponto de querer morrer, mas
realmente para tirar a própria vida é preciso estar um degrau acima. É isso
que me preocupa e é por esse motivo que não consigo fechar os olhos.
Depois de cuidar dele até que adormecesse na cama, Gabriel e eu nos
sentamos no sofá e ficamos olhando para ele, ambos sem palavras para
descrever o desespero que sentimos. Porque eu sei que ele sentiu o mesmo,
seus olhos azuis refletem o mesmo medo que tenho estampado em meu
rosto.
— Ele precisa de ajuda — comento baixinho, mesmo sabendo que no
estado que Chace estava, ele não vai acordar até amanhã. — Talvez seja
bom procurar um profissional.
Na máfia nós não fazemos terapia, são tantos traumas e questões que
um profissional ficaria louco só de ouvir 1% do que passamos durante o dia,
é algo inimaginável para mim, porém há boatos de que Daniele Corleone, a
futura Capo da Família Genovese, tem uma psicóloga.
Eu duvido muito, não podemos acreditar em toda e qualquer fofoca
que sai no submundo, ainda mais quando falam sobre as mulheres. Tenho
certeza de que ela precisa lutar mil vezes mais para provar sua capacidade
do que os homens.
De qualquer forma, fazer terapia em nosso mundo seria expor uma
fraqueza, e mafiosos não podem ter um ponto fraco, isso é um risco alto
demais para assumir. Mesmo que todos sejam uns fodidos da cabeça e
deveriam sim, fazer terapia, ainda é algo utópico.
Só que Chace não faz parte da máfia, ele é um Outsider, um membro
normal da sociedade e seus traumas e vivências não são contra a lei. Ele não
mata e tortura pessoas como trabalho, ou vende drogas, negocia armamento,
gerencia casas de prostituição, cassinos ilegais, e tantas outras coisas com
que minha Família está envolvida.
Ele é inocente, e esse fato me deixa ainda mais culpada por querer
tanto o garoto para mim. Porque eu quero Chace, tanto quanto quero
Gabriel, eles são meus.
De manhã Gabriel preparou o café e saiu bem cedo para resolver
algumas coisas para o Matteo, ele está se tornando um ótimo dono de casa,
nunca imaginei que logo ele, criado em berço de ouro, que nunca precisou
pegar uma vassoura na mão para limpar a casa, estaria mantendo o loft
limpo e organizado, e ainda aprendeu a cozinhar.
Tudo bem que não é a melhor refeição do mundo, e agora que todos
já sabem sobre esse lugar, podemos pedir comida ou mandar buscar de
restaurantes, mas notei que ele gosta de passar um tempo cozinhando, e não
me passou despercebida a forma com que contém um sorriso orgulhoso
quando elogio seus pratos.
Chace acordou de ressaca, mas como é novo e esse deve ter sido
realmente o primeiro porre da vida dele, foi só tomar um café e comer um
sanduiche que ele já parecia melhor, pelo menos fisicamente.
— Você está bem, gatinho? — questiono e me sento do seu lado no
sofá, passo a mão carinhosamente em seu rosto, sentindo a barba comprida
demais, que não combina muito com ele. — Você precisa fazer essa barba
direito, Gabriel tem uma maquininha no banheiro, pode usá-la.
Ele concorda com a cabeça, mas desvia o olhar do meu na vã
tentativa de me afastar. Ah, querido, você já deveria saber que não vou a
lugar nenhum.
— Desculpa por ontem. — Sua voz sai baixa e com muita dor, a
mesma refletida em seu olhar. — Eu… não sei o que deu em mim.
— Você perdeu as pessoas que mais amava nesse mundo e está
sofrendo, o processo de luto é complicado, gatinho. — Seguro seu queixo
de forma firme e o obrigo a me olhar para garantir que saiba o quão séria
estou. — Nunca mais pense em tirar a sua vida, está me ouvindo?
— Eu não queria…
— Sim, você queria, e por um momento eu morri um pouco quando
vi seu dedo apertar o gatilho, nunca, na minha vida toda, senti tanto medo
como naqueles malditos segundos — confesso seriamente e deixo que veja
a dor que me causou, porque ele tem que saber disso, precisa entender que
sua vida importa. — Eu assisti minha mãe ser assassinada com um tido na
testa, bem na minha frente, logo depois matei o homem que atirou nela.
— Você matou alguém? — Seus olhos se abrem em surpresa, mas
sinto a mão quente na minha cintura, como um carinho inconsciente.
— Eu tinha oito anos, era o dia do casamento do Lorenzo e nós
estávamos indo até a cerimônia, eu era daminha de honra, mas insisti em ir
no carro com meus pais, porque as irmãs mais novas da noiva eram chatas
demais e eu lembro de não querer ficar no mesmo carro que elas — conto e
consigo arrancar um meio sorriso dele. — Só que antes de chegar na igreja,
meus pais desmaiaram e o motorista nos levou para longe, ele tinha
colocado alguma coisa na bebida deles e foi pago para sequestrá-los.
Tenho lembranças vagas daquele dia, mas sei exatamente o que
aconteceu, porque quando voltei da Europa obriguei meus irmãos a me
contarem cada detalhe que eles esconderam por anos, achando que iriam me
proteger. Na nossa casa não se falava sobre o sequestro.
— Na época nossa Família estava em guerra por território com o
Cartel mexicano, eles queriam o controle da venda de drogas, meu pai não
queria dar. — Dou de ombros explicando vagamente a situação, porque não
é o ponto principal. — Eles nos levaram para um lugar afastado, amarraram
minha mãe e a deixaram caída no chão, já meu pai foi contido e preso pelos
pulsos em um gancho na parede, eles demoraram para acordar, mas eu
estava lá.
— Você viu tudo isso?
— Mais ou menos, o líder do Cartel era um monstro, ele me vendou
enquanto meus pais não acordavam e só tirou a venda para que eu assistisse
minha mãe morrer, ele estava torturando meu pai, da forma mais dolorosa
possível, provocando dor nas pessoas que ele amava.
— Ali, não sei o que dizer — ele fala enquanto ergue minhas pernas e
me coloca sentada em seu colo, confortando-me e sentindo minha dor.
— Não estou te contando isso para que você sinta pena de mim, só
que acho que está na hora de saber quem eu sou — explico e volto a olhar
em seus olhos castanhos e brilhantes. — Essa parte eu não lembro bem
como aconteceu, tenho pesadelos sobre isso, mas às vezes os detalhes são
confusos. Sei que meu pai fez algo para chutar a arma do homem em minha
direção, eu peguei e atirei uma vez, acertando o monstro, mas depois atirei
de novo e acertei meu pai.
— Você…
— Sim, eu matei meu pai — confesso e sinto aquela sensação
familiar de culpa que me assombra por anos. — Não sei como, porque
estava de olhos fechados e só queria acabar com o homem que estava
provocando meu pai. Quando fui crescendo e percebi o que havia feito, a
culpa me consumiu, meus irmãos não queriam falar sobre aquele assunto,
desconversavam toda vez que eu perguntava, mas eu sabia o que havia
feito.
— Não foi sua culpa, Ali.
— Eu me revoltei com todo mundo, por não terem nos protegido, por
deixarem que meus pais fossem sequestrados, por não me ensinarem a usar
uma arma direito. Pensei que se tivesse tido aulas de tiro, como meus
irmãos tiveram desde muito novos, talvez conseguisse controlar a arma e
não teria acertado meu pai.
— Você era uma criança de oito anos.
— Sim, eu era uma menina de oito anos — corrijo com ênfase no
menina. — Meus irmãos com essa idade já tinham contato com armas de
fogo, pelo menos as menores, mas por ser mulher eu era protegida de tudo
isso.
Chace aperta mais os braços em meu corpo, confortando-me em seu
peito de forma protetora e o gesto consegue me deixar mais leve, não gosto
de contar essa história porque significa reviver mais uma vez aquele dia,
mas ele tem o direito de saber.
— Agora você sabe quem eu sou, sabe quais são os meus monstros e
quero que entenda que eu sei que não deveria te trazer para o meu mundo
— confesso sentindo minha garganta apertar. — Não sou uma boa pessoa,
tenho sangue em minhas mãos e já tirei mais vidas do que posso realmente
contar, você está em perigo só por estar aqui, Chace, e isso me mata por
dentro, porque não tenho forças para fazer o que seria o certo. Eu sou uma
vadia egoísta, sei disso, eu quis Gabriel e não descansei até provar para ele
que fomos feitos um para o outro, e agora eu quero você.
Sinto seu corpo ficar tenso e seus olhos arregalam em surpresa, Chace
abre a boca, mas as palavras não saem.
— Eu não brinco com sentimentos — aviso de forma séria, olhando
no seu olho. — E isso aqui — coloco a mão em seu peito para sentir a
forma com que seu coração acelera no mesmo passo que o meu —, é muito
mais que atração. Quero cuidar de você, te proteger e fazer você feliz, não
me pergunte por que, nem eu sei explicar, mas você é importante para mim
e também é importante para o Gabriel.
— Eu o beijei ontem, eu acho — confessa, soltando o ar. — Eu…
desculpa.
— Por que está pedindo desculpas?
— Porque ele é seu… bem, namorado.
— Ele também tem sentimentos por você, se não tivesse jamais
aceitaria que o tocasse ou que chegasse tão perto a ponto de beijá-lo.
— O que aconteceu com ele? — questiona com um pouco de
curiosidade.
— Não é minha história para contar — aviso e beijo a sua boca
delicadamente, só para sentir os seus lábios macios nos meus. — Quando
estiver pronto, ele mesmo vai falar sobre isso, mas até lá lembre-se do que
eu falei e não tente machucar uma pessoa que amo.
— Eu jamais faria algo contra vocês — ele se defende, assustado.
— Não era sobre nós que eu estava falando — afirmo e deixo que
absorva o que acabei de falar, porque sem querer acabei de me declarar para
o Chace, e caralho, é a mais pura verdade.
 
***
 
A conversa que tive com Chace me deixou tensa por alguns dias, mas
depois disso ele começou a reagir, aceitou receber visitas do pessoal da
boate, conversou com eles e vi em seu semblante que ainda estava triste,
mas já não era mais aquele olhar vazio. A dor continuava ali, porém ele
voltou a querer viver.
Tirei um tempo para visitar Tatiana, porque com a confusão toda não
consegui vê-la depois que o Enzo a atacou, minha advogada resolveu tudo e
o nome do senador acobertou o fato de ter sido seu filho, então nada disso
saiu na mídia.
Ela estava bem melhor quando me recebeu, não precisou perguntar o
que fiz com o desgraçado, Tatiana me agradeceu e foi isso. Passei algumas
horas lá, no fim acabamos conversando enquanto tomamos um café, eu
também precisava esquecer um pouco de tudo e ela foi uma ótima
companhia.
Alguns dias depois decidimos levar Chace até a clínica para uma
consulta com a psicóloga indicada pelo doutor Rigoni. Depois do susto que
ele nos deu não podíamos mais esperar e acho que fez bem a ele. Quando
perguntei se ele aceitava, Chace ficou receoso, mas concordou em ir e
depois da primeira consulta já marcou a próxima.
Eu trouxe alguns objetos pessoais da mansão, fui tirando coisas do
meu quarto aos poucos, ainda não estou pronta para conversar sobre isso
com meus irmãos e não sei o que vamos fazer daqui para frente, nem o que
significa essa nova forma de viver, minha única certeza é que não me vejo
mais sem eles.
Gabriel e eu nos revezamos para garantir que Chace nunca fique
sozinho. Mesmo ele dizendo que está melhor e prometendo não cometer
nenhuma besteira, não conseguimos esquecer aquele momento.
A parte mais desconfortável é a noite, porque estamos dando tempo
para ele lidar com o seu luto, só que eu estou subindo pelas paredes e
Gabriel tem passado mais tempo que o necessário no chuveiro. Como não
nos afastamos de Chace, não ficamos sozinhos e com isso não transamos.
E eu já estou cansada disso.
Chace continua dormindo no sofá, mas hoje nós estamos sozinhos,
Gabriel saiu para acompanhar meu irmão em uma negociação e fiquei em
casa, entediada e com tesão, uma combinação perigosa demais.
Nós trocamos beijos e abraços todos os dias, não consigo ficar sem
tocá-lo, ainda mais quando vejo que está triste, mas tento me manter no
controle e não aprofundar muito as coisas. Pelo menos não até ele estar
pronto para isso, afinal o garoto está de luto, e é virgem.
Ele é virgem, Alícia, virgem!
— O que vamos assistir hoje? — pergunto e me jogo do seu lado no
sofá, ele já está com a bacia de pipoca pronta e a TV ligada.
— Pode escolher, eu assisto qualquer coisa.
— Gatinho, não me pede para escolher, eu sou indecisa pra caralho e
vou demorar a noite toda procurando algo, só dá play ali no aleatório e
vamos ver o que sai.
Com um sorriso fofo Chace dá de ombros e faz o que falei, e só pode
ser uma brincadeira do universo com a minha pessoa, porque o primeiro
filme que aparece é exatamente “50 tons de cinza”. Isso não é justo, eu não
vou conseguir assistir o gostoso do Cristian Grey fodendo a gostosa da
Anastasia e ficar parada.
Olho para o lado e sou recompensada com um Chace todo
envergonhado, suas bochechas estão vermelhas, mas o desgraçado está com
o lábio inferior entre os dentes, contendo um sorriso enquanto olha para a
TV e deixa o filme passar.
— Você já assistiu esse filme? — pergunto sem desviar minha
atenção dele.
— Sim.
— E quer ver de novo?
— Sim.
— Tem certeza?
— Sim. — Dessa vez ele fica mais vermelho e abre um sorriso largo e
travesso. — A não ser que você não queira.
— Ah, eu quero, muito, você não sabe o quanto — respondo e não
estou mais falando sobre a droga do filme.
— Eu também quero. — Ele desvia a atenção da TV e me fita com o
olhar em chamas, o sorriso desapareceu e agora Chace me encara sério.
Estou muito próxima dele, tão próxima que o cheiro do seu perfume
me deixa acesa, o local onde meu braço está encostado ao dele chega a
queimar, porque quero mais, e não sou forte o suficiente para esperar.
— Foda-se. — Ataco sua boca enquanto me jogo no seu colo. Com
uma perna de cada lado do seu corpo, fico montada nele, e Chace não perde
tempo, logo suas mãos estão na minha bunda, o pijama curto fornece acesso
fácil e ele aproveita para me segurar mais firme. Mordo seu lábio inferior
com ferocidade quando sinto seu pau duro no meio das minhas pernas e
Chace solta um gemido estrangulado de prazer. — Me faz parar.
— Não — responde e sua língua passa pelos meus lábios até invadir a
minha boca e encontrar a minha língua, sinto o gosto deliciosamente doce
que ele tem, porque vive comendo chocolate, e é tão ele que me faz perder a
cabeça. — Eu quero isso, quero você.
— Gatinho — repreendo, mas me esfrego mais nele, sinto seu corpo
quente contra o meu, agarro seus cabelos com força e tomo o controle, só
com a fricção do seu pau contra a minha boceta eu já estou pingando. —
Você tem certeza?
— Sim — responde rapidamente entre gemidos e sua confirmação me
faz perder toda a sanidade.
Agarro a camiseta que ele está vestindo e o ajudo a tirar, ele faz o
mesmo com a blusa do meu pijama e seus olhos recaem sobre meu peito,
não estou de sutiã, fato que o faz sorrir e morder o lábio antes de se inclinar
e passar a língua pelo meu mamilo de forma tímida. Chace olha para cima,
como se pedisse permissão, com aqueles olhos inocentes.
— Pode chupar, gatinho.
É o que ele faz, primeiro sua língua quente prova a joia do meu
mamilo direito, então ele tira uma mão da minha bunda e leva para o outro
seio, deliciando-se com eles, levando-me ao paraíso com cada toque até que
sua boca se fecha e ele começa a chupar e lamber com mais vontade,
arrancando-me gemidos.
— Que delícia, Ali — ele fala com adoração e traça um caminho de
beijos pelo meu corpo, subindo pela clavícula até o meu pescoço. Sua barba
rala arranha minha pele, provocando arrepios gostosos. — Eu amo suas
tatuagens — elogia e beija os desenhos que tenho pelo corpo. — São todas
da Alice no País das Maravilhas?
— Sim — respondo sem conseguir realmente pensar e começo a
explorar seu corpo com as mãos. — Vem cá. — Seguro seu queixo e o beijo
novamente, precisando sentir o seu gosto, chupar a sua língua, enquanto ele
explora meu corpo com as mãos.
Não demora para estarmos perdidos um no outro, seus toques ficam
mais abusados quando sua mão desce pelo meu corpo e entra no cós do meu
short, mas então ele para e sinto seu corpo ficar tenso embaixo do meu, abro
os olhos para encontrar Gabriel nos olhando da porta de entrada.
 
CAPÍTULO 31

Chace
 
O barulho da porta fechando me faz congelar no lugar, então vejo
Gabriel entrar, seu olhar firme em Alícia fazendo meu coração disparar
ainda mais no peito com a apreensão. Tento afastá-la, mas ao invés de sair
de cima de mim, Alícia volta a me beijar.
— Você está pronto para nós? — Ali pergunta contra meus lábios.
Meu olhar encontra o de Gabriel, que ainda está parado nos olhando,
como se esperasse um convite para se aproximar, por isso respondo mais
alto e com firmeza.
— Sim, eu quero isso, quero vocês dois.
E é como se o clima mudasse, Alícia sai do meu colo e pega minha
mão, chamando-me para acompanhá-la até a cama. Meu coração bate
descontroladamente no peito, a adrenalina me enlouquece, mas sigo-a
sentindo Gabriel vindo logo atrás de mim, sua presença é forte e dominante,
assim como a dela.
Então lembro do que Kevin falou quando invadi a sessão deles, que
Alícia e Gabriel juntos são brutais, as imagens das marcas das cordas em
Kevin me acordam para a realidade.
Será que eles vão fazer isso comigo?
Eu não sei se quero ser amarrado, só o pensamento me faz retrair e
parar antes de chegar na cama.
— Você está bem? — A voz grossa de Gabriel vem cheia de
preocupação quando ele passa por mim, a visão do homem grande e
musculoso me faz lembrar dele atrás de Kevin. — Chace, se não estiver
pronto, está tudo bem.
— Eu só… não sei se gosto de ser amarrado — confesso e preciso
desviar o olhar, há pouco estava quase implorando por eles, estou com uma
maldita ereção e quero isso, sinto que estou pronto, mas não daquela forma.
— Não vamos te amarrar — Alícia me tranquiliza. — Você está
lembrando daquele dia?
Faço que sim com a cabeça, envergonhado por ser um covarde. E se
eles só transam assim? E se essa for a única forma que eles fazem essas
coisas? Será que eu vou aceitar? Porra, eu vou, mas eu não sei se é assim
que eu quero. Estou tão confuso.
— Kevin estava contido porque não podia tocar em Gabriel e porque
ele gosta de ser amarrado daquela forma — Ali explica e, como se para
provar um ponto, Gabriel se aproxima de mim, pega minha mão e coloca
em seu peito.
Nestes dias ele se manteve mais afastado. Mesmo que ficasse por
perto e se sentasse ao meu lado no sofá, Gabriel não me tocou mais depois
do nosso beijo, pensei que tinha estragado tudo com ele, me precipitado ao
invadir seu espaço, mas o fogo em seu olhar fala o contrário.
Então eu me aproximo e decido jogar tudo para o alto ao tomar os
lábios do homem nos meus, sua barba macia raspa na minha e posso jurar
que ouvi um rosnado contido pouco antes dele tomar o controle e me
devorar. Sua língua me invade e batalha com a minha, deixando-me rendido
em seus braços.
É deliciosamente carnal e violento, mas caralho, é gostoso demais. A
forma com que Gabriel me toma com necessidade me faz ter certeza de que
é isso que eu quero. Então sinto a mão de Alícia passar pelo meu cabelo e
Gabriel se afasta o suficiente para beijá-la da mesma forma que fez comigo.
— Gostosa — Gabriel elogia e Alícia o ajuda a tirar a jaqueta de
couro, descartando-a no chão, então ele se afasta e tira a camiseta,
revelando as tatuagens em seu peito, mas ao me aproximar vejo as marcas
que elas escondem, cicatrizes fundas em sua pele.
— Você é… lindo — falo e admiro seu corpo, ele é forte, os músculos
definidos do homem me fazem salivar, quero passar a língua por todo o seu
corpo, sentir seu gosto.
— Tira a roupa — Alícia instrui e faço o que ela pede, abaixo minha
calça e me desfaço da cueca, liberando meu pau que já está pingando de
tesão. — Caralho, eu quero tanto te chupar, gatinho.
Puta que pariu, se controla, Chace, não posso deixar que aconteça
como aquela vez no carro.
O pensamento de Alícia com a boca no meu pau me faz contrair de
tesão, não tenho nem tempo para respirar quando ela se ajoelha em minha
frente, suas unhas compridas arranham minha pele até chegar em meu
membro, ela o segura firme com uma mão, passando o dedo pela pontinha
brilhante. Não contenho um gemido alto com a sensação e ela sorri para
mim, os olhos verdes brilhando de tesão.
O toque da língua quente e macia quase me faz gozar, caralho, é
muito bom, ela lambe da ponta à base, com vontade, deliciando-se com o
meu pau. Enquanto sua mão segura firme, sua língua me explora, levando-
me às alturas.
— Bunny, meu cabelo — ela pede e Gabriel se aproxima, reunindo os
fios dourados de Alícia em suas mãos grandes, ele a segura com firmeza e
ela sorri, safada, antes de finalmente engolir meu pau de uma vez só.
— Caralho — solto e me seguro no braço de Gabriel quando Alícia
começa a me chupar de verdade, levando meu membro mais fundo na sua
boca até recuar e me provocar com a língua em um ritmo lento e torturante.
A imagem dos seus lábios envolvendo meu membro é maravilhosa demais,
eu nunca senti algo assim.
— Para de brincar e chupa com vontade — Gabriel ordena e Alicia
aumenta o ritmo, levando-me mais fundo na sua garganta, consigo sentir
meu pau pulsando em sua boca, ela me engole até o talo. — Essa é a minha
garota.
A voz dele me faz arrepiar, mas não consigo tirar os olhos de Alícia
me tomando, deixando-me foder a sua boca, é insano e viciante. Levanto o
olhar para encontrar Gabriel me encarando, sua expressão reflete o tesão
que estou sentindo e logo ele volta a me beijar, devorando minha boca, me
provocando enquanto Alícia me chupa.
Eu não vou aguentar muito, ainda mais quando ela leva uma mão para
as minhas bolas e começa a massagear, é demais, posso sentir que estou
quase.
— Eu vou gozar — aviso contra a boca de Gabriel, ele planta um
beijo em meus lábios e olha para Alícia, mas ela não para e com uma mão
segura a base do meu pau, masturbando-me enquanto sua boca me toma
com mais rapidez, até que explodo e gozo na sua garganta. Assisto-a me
lamber até a última gota e se deliciar com a minha porra.
Quando levanta Gabriel toma a boca de Alícia em um beijo profundo,
ele lambe seus lábios e a provoca com adoração, segurando-a pela cintura
com uma mão e a outra está nas minhas costas, mantendo-me colado a eles.
— Porra, que delícia — Gabriel comenta e Alícia sorri. Virando-se
para mim ela me beija com carinho enquanto recupero o fôlego, meu
coração acelera no peito e preciso me segurar em Gabriel para me manter
de pé.
— Você está muito vestido, Bunny. — Ela começa a abrir a calça de
Gabriel, que não a contém e ajuda a tirar o restante das suas roupas, então
Alícia faz o mesmo e ele a joga de costas na cama.
— Já chupou uma mulher? — Gabriel pergunta me olhando e faço
que não com a cabeça.
— Ensina ele, Bunny — Alícia provoca e desliza o corpo até ficar na
beirada da cama.
— Ela é tão gostosa, não é mesmo? — Ele passa uma mão pelo corpo
de Alícia, em uma carícia provocante enquanto ela suspira com o seu toque,
deslizando os dedos pelos peitos firmes dela, descendo pela barriga, até
chegar no meio das suas pernas. — Se abre para nós, amor.
Com isso ele desliza um dedo pela boceta dela de forma lenta e
provocante, fazendo-a gemer e se contrair contra sua mão. Gabriel se
ajoelha no meio das pernas de Alícia, o rosto a centímetros de distância
dela, então ele estende a mão para mim, chamando-me.
— Beija ela enquanto eu a faço gritar — indica, tirando-me de
espectador e me instruindo a participar, é o que faço, deito-me ao lado de
Alícia na cama e a beijo carinhosamente nos lábios, aproveito para acariciar
seu corpo e senti-la em minhas mãos.
Sinto o momento que Gabriel se afunda no meio das pernas de Alícia,
porque ela começa a gemer contra meus lábios, sua respiração se torna
irregular e ela intensifica ainda mais nosso beijo, segurando-se em meu
cabelo. Sua boca me devora com vontade.
— Precisa começar devagar — Gabriel fala e olho para baixo,
assistindo o homem passar a língua por toda a boceta de Alícia. — Até que
você sentir que ela está se contorcendo.
— Bunny, cala a boca e me chupa — Alícia reclama, impaciente e
Gabriel sorri.
— Estou ensinando o nosso garoto.
— Ele vai aprender na prática depois. — Ela se contorce e Gabriel
volta a lambê-la com um sorriso provocante. — Eu preciso gozar, amor.
— Você vai — Gabriel responde. — Viu como ela é apressada? —
Ele me olha e sorri. — É assim que você sabe quando aumentar a
velocidade.
Então ele volta a chupá-la, mas agora não para até que Alícia está
gritando, implorando por mais, então Gabriel a segura pela cintura, olho
para a mulher, seu rosto contorcido de prazer, os olhos fechados e a boca
aberta, não me aguento com a visão dos seios provocantes e os tomo para
mim, chupando seu mamilo delicioso enquanto acaricio o outro com a mão.
É assim que Alícia começa a tremer, segurando-se no lençol ela goza
com um gemido alto, mas Gabriel não para, chupando até que ela se
entregue, a respiração ofegante e um sorriso no rosto, fodidamente linda.
Olho para Gabriel e o vejo subir para me beijar, o gosto salgado em
sua boca é delicioso, é dela, ele está compartilhando o orgasmo de Alícia
comigo. Meu pau já está duro novamente, pronto para mais uma, quando
Gabriel o segura em sua mão, masturbando-me delicadamente ao mesmo
tempo que me beija.
Alícia acaricia meu peito e beija meu pescoço, a atenção dos dois em
mim me deixa confuso, mas é tão bom! Gabriel me empurra, fazendo-me
deitar de costas na cama, então ele para de me beijar e caminha até a
cabeceira da cama, assisto quando pega um preservativo e entrega a Alícia.
— Está pronto, gatinho? — E por um momento não entendo o que ela
quer dizer, mas quando ela desenrola a camisinha no meu pau sem quebrar
o contato visual comigo, eu relaxo e concordo com a cabeça, deixo que
tome o controle. — Vou cavalgar em você — avisa quando sobe em mim,
sinto o calor da sua boceta quando meu pau paira bem na sua entrada, e
seguro a respiração.
Alícia me toma de uma só vez, sua boceta quente e apertada me
engole e estou novamente no paraíso, puta que pariu isso é bom demais, por
que demorei tanto assim para transar?
Ela cavalga no meu pau como uma maldita rainha e a visão é
delirante, seus peitos balançam no mesmo ritmo que ela me toma, subindo e
descendo no meu membro enquanto a seguro pela cintura. Foi bom que eu
tenha gozado uma vez, porque não aguentaria meio minuto assim.
— Bunny, eu quero você — Alícia chama Gabriel e só então vejo que
ele está do lado da cama, assistindo tudo enquanto se masturba. Seu
membro me faz salivar, ele é grande e parece delicioso.
— Eu gosto de assistir enquanto você fode o nosso garoto, amor —
Gabriel provoca, vejo quando passa a língua pelo lábio inferior, seu olhar se
enche de desejo enquanto veste uma camisinha e pega um tubo do que
imagino ser lubrificante antes de ficar atrás de Alícia, ela diminui o ritmo
por um tempo e se inclina para frente.
— Quero sentir meus dois homens, juntos, dentro de mim — Alícia
pede e me beija quando Gabriel sobe na cama, ficando atrás dela. Não
consigo ver o que está fazendo, mas sinto Alícia se contrair ao redor do meu
pau. — Ele está me preparando para recebê-lo — ela explica, percebendo
minha confusão.
— Porra, que mulher gostosa — Gabriel elogia e Alícia se contorce
em meus braços, praticamente ronronando com as carícias dele. — Assim,
amor, relaxa pra mim, isso, nossa.
— Caralho, Bunny — ela solta um gemido alto e joga a cabeça para
trás enquanto recebe Gabriel, e puta que pariu, posso senti-lo entrando nela.
Estamos os três conectados como um, e em uma troca de olhares sinto a
conexão com ele, as mãos fortes do homem viajam para os peitos de Alícia
e as minhas estão na cintura dela, mantendo-a firme em cima de mim, só
então ela volta a se mover, lentamente, acostumando-se conosco. — Puta
que pariu, que gostoso.
— É delirante — complemento quando ela volta a subir e descer no
meu pau, agora tomando a nós dois ao mesmo tempo, e caralho, essa
mulher é uma deusa! Logo estamos os três perdidos, suados, gemendo,
gritando, fodendo, entregues ao momento.
— Vai, amor, rebola para nós — Gabriel instrui e beija o pescoço
dela. — Mostra para ele como você fode gostoso.
Alícia é uma perdição, sua boceta me aperta cada vez mais,
enlouquecendo-me, os sons dos nossos corpos se chocando, a voz grossa de
Gabriel gemendo — eu amo ouvi-lo gemer —, amo olhar para os dois e
sentir que estão tão perdidos quanto eu, porque é isso que está acontecendo.
Nossos olhares se encontram, nossas respirações estão ofegantes e quando
Alícia começa a se contorcer, Gabriel a segura e toma o controle, fodendo
seu cu com brutalidade, movendo-a contra o meu pau na mesma velocidade
e já não me controlo mais.
— Goza comigo — Gabriel trava o olhar no meu, levando a mão para
esfregar o clitóris de Alícia, que está gritando descontroladamente,
implorando por mais e me levando ao céu quando sua boceta me aperta e
não consigo mais segurar: gozo pela segunda vez, despejando jatos de porra
na camisinha. Sinto meu coração saltar no peito e assisto Gabriel beijar o
pescoço de Alícia e soltar um gemido estrangulado de prazer quando ele
também goza e ela relaxa em cima de mim.
Gabriel é o primeiro a se recompor e ajuda a Ali a deitar-se do meu
lado, depois disso ele tira a minha camisinha, dá um nó e vai até o banheiro.
Já não tenho forças para nada, meu coração é como um tambor no peito,
sinto o corpo da mulher ao meu lado se aninhar no meu e Alícia descansa a
cabeça em meu peito, estamos ofegantes e suados, mas foda-se.
Assim que Gabriel volta do banheiro e se deita atrás de Alícia, ela
sorri e beijo sua testa ao mesmo tempo que ele acaricia a mulher em meus
braços.
— Você está bem? — pergunto e ela só concorda com a cabeça.
— E você, como está se sentindo? — Gabriel questiona com o olhar
preocupado em mim.
— Não sei — confesso e respiro fundo. — Acho que a palavra certa
seria completo, mas não sei explicar.
— Foi bom, gatinho?
— Bom não chega nem perto, foi perfeito. — A mão de Gabriel cobre
a minha, entrelaçando seus dedos nos meus, ele parece calmo e tranquilo.
Depois de um bom banho, dormimos juntos pela primeira vez. Alícia
pegou no sono primeiro, abraçada em um travesseiro e de costas para mim,
então envolvi seu corpo em uma conchinha e Gabriel se deitou atrás de
mim, o corpo colado às minhas costas me manteve quente e protegido.
Sou despertado pela voz chorosa de Alícia, ela se virou durante a
noite e me empurrou para os braços de Gabriel, tomando quase toda a cama
para si, mas agora parece estar tendo um pesadelo.
— Não, papai, acorda… — ela choraminga e vejo as lágrimas
escorrendo pelo seu rosto. — Papai, acorda por favor…
Quando vou acordá-la, Gabriel se adianta e troca de lugar comigo,
envolvendo Alícia em seus braços. Ele a beija no rosto com carinho e
sussurra alguma coisa em seu ouvido até ela se acalmar, aos poucos Ali vai
abrindo os olhos e se agarra ainda mais firme nele.
— Foi só um pesadelo, amor — Gabriel murmura acariciando os
cabelos loiros e selvagens dela.
— Eu sei… Bunny. — Alícia pisca várias vezes e se esfrega no peito
dele, limpando suas lágrimas, porém os olhos verdes estão tão vermelhos
que posso sentir sua tristeza. — Bom dia. — Ela me olha e força um sorriso
sonolento.
— Bom dia — digo e Gabriel se deita de costas para me receber em
seus braços. É tão bom e confortável estar aqui. Dou um selinho em Alícia
e descanso o rosto no peito musculoso dele, me sentindo bem. — Posso
perguntar uma coisa?
— Acordou animado, gatinho? — ela brinca e o peito de Gabriel
vibra quando ele ri. — Pode perguntar o que quiser.
— Porque você o chama de Bunny?
— Porque ela gosta de me irritar — Gabriel responde e Alícia dá um
tapa fraco em seu peito.
— Você já assistiu Alice no País das Maravilhas? — ela pergunta e
confirmo com a cabeça. — O coelho é quem encontra a Alice e a leva para
o buraco, ele a salva de uma vida chata e sem graça quando mostra o
caminho até o País das Maravilhas, um lugar onde tudo é possível e onde
ela pode viver as aventuras que sempre sonhou.
— Gabriel é o coelho para você? — pergunto confuso, não sei se
entendi a analogia dela.
— Sim. — Ela se vira e ergue a cabeça, olhando para Gabriel. —
Bunny foi o primeiro a me encontrar depois do sequestro, me salvou em
uma época difícil quando eu era adolescente e abraçou minha loucura
quando aceitou meu amor. Ele é meu Bunny porque me mostrou que está
tudo bem sonhar e viver uma vida de aventuras ao seu lado.
Gabriel sorri com a declaração de Alícia e eles trocam um beijo
íntimo e apaixonado, por um momento sinto que não faço parte disso e
aquela sensação de que não deveria estar aqui surge no fundo da minha
mente.
— E você é meu gatinho — Alícia fala para mim. — Uma parte que
eu não sabia que amava, até você aparecer. Simboliza o gatinho da Alice,
seu companheiro e a parte que liga a menina ao mundo real. Você me
completa, Chace.
Com isso ela sorri e me beija, da mesma forma carinhosa e íntima que
fez com Gabriel, e só com um toque dos seus lábios, volto a sentir que
pertenço a este momento, que sou parte disso aqui, sou parte deles.
— Eu preciso de café — Gabriel anuncia e Alícia me olha com um
sorriso travesso.
— Eu quero um orgasmo — ela anuncia e Gabriel solta uma
gargalhada gostosa.
— Senta na minha cara então, amor — ele pede e Alícia não demora a
fazer exatamente isso, ela passa uma perna de cada lado da cabeça de
Gabriel e começa a se esfregar nele.
A visão dos dois me faz ficar ainda mais duro, minha ereção matinal
só piora quando olho para baixo e vejo que Gabriel está tão duro quanto eu,
então lembro do que pensei ontem e afasto o lençol para encontrar seu pau
pedindo por atenção.
Em um rompante de coragem, seguro seu membro e passo a língua
pela pontinha, sinto o gosto salgado do pré-gozo e é delicioso, Gabriel solta
um gemido, fazendo-me olhar para eles e Alícia tem um sorriso safado no
rosto.
— Chupa ele como eu fiz com você ontem — Alícia instrui e faço o
que ela fala, passo a língua por todo o comprimento, chupando com gosto,
depois o levo para dentro da minha boca, tomo o máximo que consigo do
seu comprimento antes de recuar e voltar a engoli-lo. — Chupa com
vontade, gatinho… isso, bem assim.
Ouvir os gemidos de Gabriel misturados aos gritos de prazer da Alícia
me deixa ainda mais animado, com a mão começo a masturbá-lo e minha
boca vai de encontro ao movimento, aumento cada vez mais a velocidade,
sentindo o homem estremecer com o meu toque e gemer cada vez mais,
descontroladamente. Lambo e chupo seu pau, ele é gostoso demais, puta
que pariu.
Gabriel segura meu cabelo por um momento e sei que é um aviso para
recuar, mas eu não quero, preciso sentir seu gosto, tomar tudo desse homem
que me deixa louco. Meu próprio pau está tão duro e pingando que sinto
que posso gozar só com isso, então concentro minha atenção na ponta e
chupo com mais intensidade, Alícia geme descontroladamente, se
esfregando na boca de Gabriel quando atinge seu próprio orgasmo e cai
para o lado.
— Caralho, garoto. — A voz grossa de tesão dele é a última coisa que
escuto antes de sentir o gosto da sua porra na minha boca, continuo
chupando e engulo tudo o que ele me dá, com vontade de tomar para mim o
prazer desse homem maravilhoso.
Quando termino Gabriel está com um sorriso enorme no rosto e
Alícia solta risadinhas safadas e se levanta da cama, pega um preservativo
da gaveta e me entrega.
— Agora é sua vez — Ela me beija e se coloca de quatro, a bunda
gostosa e redonda apontada para mim, sua boceta vermelha das chupadas de
Gabriel é uma tentação.
— Vou preparar o café — Gabriel avisa, levantando-se e isso me faz
parar, será que devo continuar?
— Vamos, gatinho, eu quero gozar mais uma vez antes de começar o
dia — Ali implora e me encara por cima do ombro. — O que tem de
errado?
— Ele não vai ficar… sei lá, bravo ou algo assim? — Aponto para o
banheiro onde Gabriel entrou e Alícia solta uma gargalhada alta com a
minha confusão.
— Amor, Chace está perguntando se pode me foder sem você estar
junto — ela grita e Gabriel sai do banheiro.
— Não vejo por que não — responde tranquilo e vai até a cozinha. —
Alícia gosta de começar o dia bem fodida, dê isso à nossa garota.
Nossa garota.
Puta que pariu, Gabriel acabou de me incluir no que quer que isso
aqui seja.
Então coloco a camisinha e me enterro na boceta quente e molhada de
Alícia, meu pau pulsando dentro dela. Estou com tanto tesão que sei que
não vou durar muito, então faço o que vi Gabriel fazer ontem e levo uma
mão ao seu centro para acariciar o clitóris inchado. Alicia geme mais alto,
sensível com o toque e a fodo com vontade até que ambos gozamos e nos
jogamos na cama, exaustos.
— Você aprende rápido, gatinho — ela elogia e me beija, sua
respiração tão ofegante quanto a minha e o sorriso relaxado que faz meu
coração explodir no peito.
Essa mulher é uma maldita deusa e eu estou me apaixonando por ela,
na verdade, por eles.
CAPÍTULO 32

Gabriel
 
A forma confusa com que Chace perguntou se podia foder Alícia sem
mim só confirma que chegou a hora de termos uma conversa, os três, e
tomar algumas decisões. Portanto, depois que eles saem do banheiro e se
sentam na bancada da cozinha para tomar o café, respiro fundo e resolvo
começar.
— Precisamos conversar — falo escorado na pia com a caneca de
café em mãos.
— DR a essa hora amor? — Alícia reclama, mas vejo o sorriso de
canto em seu rosto e pela forma que trocamos um olhar sei que ela só está
brincando.
— DR? — Chace pergunta confuso.
— Discutir a relação — ela responde de forma carinhosa. — Bunny
adora sentar e conversar, ele é o centrado e pé no chão da relação, eu sou a
doidinha e você é o envergonhado. Pronto, tudo decidido, o que tem para
comer?
Alícia pega a xícara rosa e se serve de café e algumas frutas que
deixei picadas na bancada, Chace sorri para ela, mas me olha confuso à
procura de mais respostas.
— Primeiro, seu irmão está me pressionando para decidirmos se
vamos ficar aqui ou voltar para a mansão, ele quer uma resposta ainda hoje
— aviso e ela bufa daquela forma fofa que Alícia faz quando quer fazer
birra. — Precisamos decidir logo, amor.
— Eu não quero voltar para a mansão — Ali confirma o que eu já
imaginava. — Gosto desse lugar, claro que ainda precisa de uma boa
reforma. Você comprou o prédio todo?
— Ainda não, só os dois últimos andares, mas minha corretora já está
negociando o restante — explico.
— Perfeito — ela responde e começa a divagar animada sobre seus
planos — podemos transformar o primeiro andar em uma garagem, o
segundo em academia, os apartamentos de baixo no meu estúdio e
escritório.
— Vocês vão morar aqui? — Chace pergunta baixinho e confuso,
olhando de Alícia para mim.
— É claro, gatinho. — Ela o conforta com um sorriso caloroso no
rosto.
— Eu… bem, acho que consigo pagar um quarto em algum lugar,
Andrei disse que mora sozinho, talvez possamos dividir e…
— Nem fodendo! Você não vai a lugar algum — anuncio de forma
séria, cortando seu momento de confusão e fico puto por pensar no maldito
russo debochado. — Muito menos com aquele…
— Gatinho, quando falamos nós, estamos incluindo você também. —
Alícia se levanta e vai até ele, percebendo a confusão no rosto do garoto ela
segura as mãos dele e olha bem no fundo dos seus olhos. — Ainda não
entendeu?
— Vocês… querem que eu fique? — Seus olhos castanhos estão
brilhando com lágrimas contidas, mas ele não deixa que caiam.
— Claro que sim. — Ela se joga nos braços dele e planta vários beijos
no rosto confuso do garoto. — Você é tão fofo, gatinho.
— Esse é outro ponto que precisamos definir — expresso de forma
séria para que os dois saibam que a conversa ainda não acabou. — Chace,
você quer ficar aqui?
Vou direto ao ponto, mesmo que meu coração aperte no peito só com
a possibilidade de ele responder de forma negativa. Preciso que ele fique
porque quer e não porque acha que não tem outra opção.
— É claro que ele quer. — Ali me olha com um vinco contrariado no
meio das sobrancelhas perfeitas.
— Deixa ele decidir, amor, isso tudo é novo e se Chace está confuso,
ou não tem certeza se quer realmente fazer parte da nossa vida, ele precisa
se sentir confortável e seguro para nos falar. — Olho para Alícia e vejo o
medo de receber uma resposta negativa, ela não é uma pessoa que pede, ela
exige e sempre consegue o que quer. — Nós queremos você aqui.
— Eu também quero ficar — ele murmura a resposta com a voz baixa
e seu rosto assume aquele tom avermelhado. — Eu só estou confuso, não
sei o que é isso, o que sou para vocês — confessa com tristeza. — Vocês já
são um casal, eu… eu não tenho lugar aqui.
— Sabe por que nós não somos casados? — Alícia pergunta para
Chace, que nega com a cabeça. — Porque essa concepção nunca foi para
nós, meus irmãos já até desistiram de tentar fazer com que entremos em
uma caixinha. Nós somos livres, nos amamos e respeitamos um ao outro,
mas não fingimos que não sentimos atração por outras pessoas.
— É por isso que vocês fazem…
— Quando temos relações em três pessoas que não envolvem
exclusividade, chamamos ménage — ela pisca com um olho de forma
safada enquanto explica —, mas isso aqui não é a mesma coisa, nos outros
casos é só sexo, tesão, fantasia, um momento de putaria e só.
— Nós três seremos exclusivos — continuo de onde ela parou. — A
não ser que aconteça alguma exceção, que precisa ser discutida entre os
três, este relacionamento se torna um trisal.
— Sim, porque queremos você só para nós — ela volta a brincar e
arranca um sorriso de Chace, vejo seus ombros relaxar e finalmente ele
parece entender o que estamos falando. — Você aceita ser nosso?
— Eu… vocês… é sério? — Agora ele olha diretamente para mim,
precisando de uma confirmação minha.
— Sim, se você quiser — respondo e não contenho a felicidade em
meu peito quando ele abre aquele sorriso largo e tão bonito e abraça Alícia
com força.
— Sim — Chace responde ainda tímido, mas sua voz não treme dessa
vez, ela sai firme e feliz.
Alícia comemora com pulinhos de alegria nos braços dele, então eles
se beijam com carinho e sinto uma leveza no ar. É como se tudo finalmente
estivesse se encaixando, como se fosse para ser assim.
Quando eles se afastam, Alícia parece tão aliviada quanto eu, mas
continuo com a conversa.
— Agora vamos falar sobre sexo — aviso e Chace abre os olhos em
surpresa. — Sei que você era virgem e fez exames quando entrou para a
Malícia, portanto sabemos que está limpo. — Ele confirma com a cabeça.
— Alícia e eu fazemos exames periodicamente e também estamos limpos,
nós transamos sem camisinha somente quando estamos sozinhos, porque eu
fiz vasectomia e ela usa DIU, mas você precisa usar preservativo toda vez.
— Tudo bem — ele concorda.
— Você algum dia pensou sobre filhos? — Alícia pergunta
seriamente. — É seu sonho ser pai, ou você se imagina sendo pai de uma
criança?
— Nunca pensei sobre isso — Chace responde, cauteloso —, mas não
sei, não me vejo sendo pai, não sei se quero ter filhos e assumir essa
responsabilidade.
— Você ainda é novo e acabou de perder a virgindade, então entendo
a confusão, mas Gabriel e eu não queremos ser pais, é por isso que
precisamos que entenda a importância da camisinha quando formos transar.
— Alícia morre de medo de engravidar, por isso essa conversa é muito
importante.
— Outra coisa, precisamos que seja aberto sobre o que você quer no
sexo, nunca aceite fazer algo se não está pronto — aconselho e ele concorda
com a cabeça. — Não precisa ter vergonha de pedir quando quiser
experimentar alguma coisa, nós somos abertos e gostamos de foder, muito e
de várias formas. Com o tempo você vai se soltar e experimentar muitas
maneiras de sentir prazer.
— Bunny e eu vamos garantir isso — Alícia complementa —, mas se
não gostar de algo sempre nos deixe saber, eu não aceito levar tapas e nem
palavras degradantes, se me bater vai levar um soco, e se me chamar de
puta em qualquer situação eu corto teu pau fora — ela avisa com um de
seus sorrisos frios e macabros que deixam Chace sem jeito, coitado.
— O ponto principal é que tudo seja consensual para ser prazeroso —
explico e Chace concorda. — Sobre hoje de manhã, você não precisa ficar
confuso ou pedir permissão para transar, entre nós três tudo está liberado.
— O que significa que você pode me foder sem o Gabriel estar junto,
também pode fazer isso com ele sem que eu esteja presente e o mesmo se
aplica para o Bunny e eu — ela provoca ainda mais só para assistir o garoto
ficar vermelho de vergonha novamente. — E claro, quando estivermos
juntos e os três quiserem, aí é só alegria.
— Mesmo assim, se não estiver a fim é só falar, entendido?
— Acho que sim — ele confirma baixinho e já posso ver a ereção na
calça de moletom, ele vê para onde estou olhando e faz o mesmo comigo,
confirmando que sim, estou duro só falando sobre isso, mesmo tendo
gozado na boca gostosa dele há pouco menos de uma hora, meu pau quer
mais.
Como se pressentisse isso, meu celular toca na bancada e vejo a
mensagem de Don Lorenzo, ele está há dias me pressionando por uma
decisão.
— O que meu irmão quer a uma hora dessas? — Alícia pergunta já
sabendo de quem é a mensagem.
— Exigir nossa presença na mansão domingo de manhã — digo e ela
dá de ombros. — Agora que estamos entendidos, vou conversar com ele e
resolver tudo.
— Ele vai cortar as tuas bolas fora — Alícia avisa soltando uma
gargalhada.
— Don Lorenzo? — Chace questiona assustado e posso ver as
engrenagens funcionando em sua cabeça, tenho certeza de que está
imaginando o que o irmão mais velho de Alícia fará com ele se descobrir
sobre nós.
— Relaxa, gatinho, ninguém vai colocar um dedo em você — ela
intervém, tranquilizando-o. — Eu te prometo. Gabriel e meu irmão são
melhores amigos, mas quando ficamos juntos ele teve medo de contar para
o Lorenzo, aí quando ele descobriu… digamos que ameaças foram feitas.
— Não fiquei com medo, só estava esperando a hora certa.
— Ele ia pedir minha mão em casamento para meu irmão, acredita?
— Alícia debocha e aponta para o dedo sem anel. — Joguei a aliança no
vaso quando encontrei.
— Você jogou a aliança fora? — Chace olha para ela admirado.
— Eu falei que não quero me casar, foda-se o que a sociedade espera,
casamento é só um contrato de pertencimento e não precisamos disso.
Bunny é meu, você é meu, e eu sou minha! — Ela dá uma piscadinha
sapeca e não seguro o sorriso.
Depois disso aproveitamos o café da manhã nesse clima mais
descontraído, ele fez algumas perguntas sobre nossa relação, mas Chace
ainda está tímido. Tudo aconteceu um pouco rápido para ele, então é normal
sua reação retraída, com o tempo ele vai se abrir e aprender a confiar em
nós.
 
***
 
Ainda não sabemos quem orquestrou aquela merda toda, Don
Lorenzo conseguiu tirar dois nomes de James quando o torturou, mas um
deles foi encontrado morto antes que conseguíssemos pegá-lo e o outro
ainda está desaparecido, mas nada tira da minha cabeça que está tudo
conectado.
Encontro Don Lorenzo e Matteo na mansão, eles me chamaram aqui e
me pediram para vir sozinho. Assim que entro no escritório, Matteo fecha a
porta e me entrega o copo com whisky, se ele já está me fazendo beber
antes mesmo de começar a falar, a porra vai ser séria.
— Gabriel, vou direto ao assunto — Don Lorenzo avisa com a voz
firme, sentado atrás da sua grande mesa de madeira. Com o copo de bebida
em mãos e o olhar ameaçador, ele está tentando me intimidar. — O que
você e minha irmã pretendem com o Outsider?
— Olha, os soldados andam comentando — Matteo interfere e recebe
um olhar feroz do irmão. — Eu particularmente não me importo com o que
vocês fazem entre quatro paredes, mas você sabe que precisamos manter as
aparências.
— É uma coisa vocês usarem a boate para… fazer o que fazem, mas
isso é diferente, ele está praticamente morando com vocês. — Lorenzo tenta
conter o julgamento na voz, mas falha e preciso me segurar para não
responder como quero.
— Vou poupá-los dos detalhes da minha vida sexual com a irmã de
vocês, porque nada disso é da sua conta. — Levanto-me e viro a bebida em
um gole só. — Só estou aqui em respeito à Família de Angelis e como sinal
de lealdade ao meu melhor amigo. Nós estamos em uma relação com Chace
King, definimos os parâmetros esta manhã e conversamos sobre o assunto
entre nós três, decidimos nos mudar para o loft e reformar o prédio, que é
próximo da boate e fácil de ser protegido.
Meu rompante os pega de surpresa, provavelmente foi a maior frase
que já falei de uma vez só, por isso Lorenzo e Matteo estão me olhando
espantados. Quando Lorenzo abre a boca para falar, ergo a mão e o calo.
— Nada disso está aberto a debate, eu garanto que Alícia estará
protegida e não deixarei que nada de mal aconteça a ela, e isso também se
aplica a Chace — aviso de forma séria. — Estaremos aqui amanhã de
manhã e espero, de verdade, que tirem esse olhar cheio de julgamento e
preconceito do rosto antes que Alícia os veja, porque vocês a conhecem e
sabem o que ela fará se perceber que Chace será maltratado dentro desta
casa.
— Cara, não é normal… — Matteo começa a falar, mas antes que eu
possa calá-lo Lorenzo se levanta, a expressão séria no rosto me avalia por
um tempo.
— Se alguma coisa acontecer a ele por estar envolvido com vocês, a
Família não assumirá as consequências novamente, estamos entendidos?
— Entendido, Don Lorenzo. — As últimas palavras saem amargas da
minha boca, pela primeira vez não sinto orgulho por ser um de seus
soldados. Se ele não está disposto a receber alguém que sua irmã ama,
porra, alguém que importa muito para seu melhor amigo, ele está nos
rejeitando também, e isso dói pra caralho.
CAPÍTULO 33

Alícia
 
Estou muito feliz e animada com o retorno de Kevin à boate, ainda
mais porque foi ele mesmo quem me pediu para voltar. Claro que ainda não
está completamente recuperado e vai demorar um tempo para poder dançar,
mas o médico o liberou para o trabalho, então ele ficará no caixa por um
tempo.
Ele e Rick estão morando juntos agora e é muito fofo poder ver os
dois cuidando um do outro. Não sei como não percebi esse amor antes,
porque a forma com que trocam olhares, cheios de carinho e adoração, é
linda demais.
Para comemorar o retorno dele, pedi que Sharon organizasse uma
festinha surpresa na Malícia, e como ela não decepciona nunca, o local está
todo enfeitado com balões e uma faixa enorme com os dizeres “BEM-
VINDO DE VOLTA AO LAR, KEVIN”.
Quando Chace e eu chegamos, quase todos já estavam na boate
ajudando a organizar a festa, foi a primeira vez que alguns deles nos viram
juntos e senti os olhares nas nossas mãos unidas. Eu odeio ser alvo de
olhares julgadores e ao perceber que Chace ficou desconfortável, resolvi
tomar uma atitude.
Assim que confirmo que todos estão próximos o suficiente, envolvo o
pescoço do meu gatinho e o atraio para um beijo, mas não qualquer beijo.
Tomo a sua boca com paixão e Chace logo se entrega, correspondendo ao
meu avanço, agarrando minha bunda com as duas mãos ele me puxa contra
seu corpo e logo estamos os dois ofegantes.
Preciso de muita força para afastá-lo ou iria acabar levando-o para um
quarto e perder uma horinha, mas como não temos tempo — já que logo o
Rick vai chegar com o Kevin — termino a sessão de amasso com uma
mordida naquele lábio gostoso e sou recompensada com um sorriso safado.
— Pronto, não precisa mais ficar com medo de ser visto comigo,
agora todos sabem que estamos juntos — falo contra seus lábios e ele fica
ainda mais vermelho, é uma gracinha.
É claro que ninguém tem coragem de falar uma palavra sequer, vejo
alguns olhares espantados, outros surpresos e Sharon que parece muito
animada, mas logo voltam a se concentrar na comemoração. Assim que
recebo a mensagem do Rick avisando que estão na garagem, Brody desliga
as luzes e esperamos eles entrarem.
— Que estranho, está tudo escuro. Será que a Sharon não chegou? —
Escutamos a voz confusa de Kevin se aproximar, então eles entram na
balada e todos gritam “surpresa” assim que as luzes são acesas.
Giovani e Drew estouram as bombas de confete colorido e assisto
Rick abraçar seu agora namorado quando ele se assusta com a
comemoração.
— Bem-vindo de volta, querido. — Aproximo-me e o abraço com
carinho, tomando cuidado para não o machucar. — Esse lugar não é o
mesmo sem você.
— Você fez tudo isso por mim? — pergunta confuso e espantado.
— Claro que sim, todos aqui gostam muito de você. — Beijo seu
rosto com carinho antes de me afastar.
Todos comemoram e o abraçam, querendo ou não, somos como uma
família e nos importamos uns com os outros, vejo os olhos de Kevin
brilharem com as lágrimas de felicidade e meu coração aperta no peito, se
algo pior tivesse acontecido com ele, não me perdoaria.
— Então quer dizer que o garoto está fora do mercado? — A voz
debochada de Andrei ao meu lado me faz sorrir e acerto uma cotovelada
fraca nas suas costelas. — Vou tomar isso como um sim.
— Sim, ele é nosso — respondo.
— Recado recebido, docinho — Andrei ergue as mãos teatralmente.
— Não está mais aqui quem falou.
— Quem falou o quê? — Chace pergunta caminhando em minha
direção, ele está com um sorriso largo, lindo demais, e me olha com
admiração.
— Sua namorada estava marcando território, só isso — Andrei brinca
e eu confirmo com a cabeça só para ver o garoto ficar vermelho de
vergonha.
— Namorada? — Rick e Kevin se aproximam com um pedaço de
bolo e me entregam.
— Sim, ela é minha… namorada. — Em um rompante de coragem
fofo Chace passa um braço pela minha cintura e beija meu rosto, ele não
deixa de me surpreender, então pego uma garfada de bolo e ofereço para
ele, como recompensa pela coragem.
— Ownnn — Andrei brinca e faz um coração com a mão, os outros
riem e não consigo manter a pose de durona quando sinto meu rosto
esquentar. — Docinho, você está com vergonha?
— Cala a boca — respondo e Chace me aperta mais em seus braços.
Aproveitamos a tarde para comemorar, até que chega o horário de
realmente começar a organizar a noite, a DJ GIBI chega para arrumar suas
coisas e deixo tudo nas mãos de Sharon.
— Posso falar com você a sós? — Chace pergunta em um tom sério,
que dificilmente usa, então o levo para meu escritório.
— Está tudo bem, gatinho?
— Melhor impossível. — Ele não me dá tempo de fechar a porta e me
envolve em seus braços, tomando minha boca em um beijo firme e
dominante como ainda não havia experimentado dele, por isso levo um
tempo para responder às suas investidas, segurando-me em seu pescoço,
envolvo sua cintura com as pernas quando ele me ergue e me joga contra a
parede.
— Caralho, gatinho — gemo ofegante contra seus lábios e sou
recompensada com um sorriso seu. — De onde veio tudo isso?
— Eu não sei — confessa enquanto beija meu pescoço e abre o zíper
da calça. — Só sei que preciso te foder agora.
O que diabos foi isso? Esse é realmente o mesmo Chace
envergonhado de antes, que ficava vermelho só com um olhar?
— Então vem, que estou amando essa coragem toda. — Ele segura
minha bunda e me ergue, fazendo-me entrelaçar sua cintura com as pernas,
meu vestido curto sobe, dando-lhe acesso à minha calcinha, que já está
encharcada. Sinto sua ereção roçar minha boceta em uma provocação
deliciosa.
— Quando me beijou na frente de todos, eu me senti incrível, sabia?
— confessa e me beija com ainda mais necessidade enquanto se esfrega em
mim, sua cueca e minha calcinha são as únicas barreiras entre nós. — Eu
nunca imaginei que me sentiria assim com alguém.
— Assim como? — provoco e mordo o lóbulo da sua orelha para
depois beijar aquela parte sensível do seu pescoço, o que o faz se arrepiar.
— Como se meu lugar fosse ali, nos teus braços — responde e pesca
uma camisinha do bolso de trás da sua calça, arrancando-me um sorriso ao
ver que ele estava preparado. — Isso parece tão certo, Ali — declara e se
afasta para liberar seu pau e desenrolar o preservativo. — E tão bom —
complementa quando coloca minha calcinha para o lado e entra de uma só
vez.
— Sim, gatinho — confirmo em um gemido e me seguro nele,
sentindo seu pau entrando e saindo até que estamos perdidos um no outro.
Entre beijos e gemidos Chace me fode com vontade, e para quem acabou de
perder a virgindade, o garoto não desaponta em nada.
Nossos corpos se chocam um contra o outro e os sons são inebriantes,
a boca dele me provoca com beijos e elogios até que estou quase lá,
sentindo o orgasmo se formar e ele percebe, então leva uma mão para o
meio de nós e estimula meu clitóris até que sinto minhas pernas tremerem e
gozo descontroladamente, só então ele se liberta e me segura firme.
Sua respiração ofegante contra o meu pescoço é a mesma que a minha
e posso ouvir as batidas dos nossos corações acelerados.
— É sempre assim? — sussurra e me olha com paixão e admiração.
— Eu não consigo controlar a vontade que tenho de te beijar, te abraçar,
estar com você, é tão… tão intenso.
— Com a pessoa certa é assim mesmo — respondo e ele sorri
satisfeito.
Ficamos na boate até tarde, mas deixei que Sharon fechasse o lugar
porque percebi que Chace estava esgotado demais. Foi seu primeiro dia de
volta também, mas quando quis adicionar isso à comemoração ele disse que
não queria relembrar o motivo de ter saído e preferia só comemorar a volta
de Kevin.
Depois de um banho delicioso na banheira e mais uma boa rodada de
sexo, Chace pegou no sono assim que se deitou na cama, já eu demorei um
pouco mais para fechar os olhos.
Acordo ao escutar a porta abrir, confiro se Chace não acordou, mas
ele dorme feito um anjo, de barriga para cima, enquanto eu me aconcheguei
em seu peito e ele me abraçou. Meu coelho de pelúcia foi trocado pelo seu
corpo quentinho.
Espero que Gabriel venha para a cama, mas ele pega uma bebida no
bar e caminha até a varanda, os ombros caídos são a única coisa que
consigo ver sem a luz ligada, por isso resolvo me levantar e ir até ele.
— Você está bem, amor? — questiono e me escondo em seus braços,
protegendo-me do frio da madrugada, já que estou só com uma camiseta
grande que peguei dele e meias nos pés — Estava preocupada, já.
Gabriel me aperta e beija o topo da minha cabeça, inspirando
profundamente e procurando conforto em mim da mesma forma que
procuro nele.
— Só estou frustrado — responde e toma um gole da garrafa de
whisky da sua mão, Gabriel não é um homem que procura conforto na
bebida, ele quase não toma nada, muito menos direto da garrafa, por isso sei
que ele não está bem.
— Vai me contar ou vou ter que pegar uma dessas para mim também?
— Eu me afasto um pouco para ver seu rosto e passo a mão na barba
comprida e desalinhada, que parece não ter sido feita há alguns dias, ele
realmente não está bem.
— Ainda não descobri quem fez isso tudo, os nomes não batem,
muito menos os motivos — Exala com raiva. — James disse que mexeu no
seu celular por dinheiro, os outros dois nomes que soltou não nos levaram a
nada, e para completar não tenho porra nenhuma sobre o incêndio.
— Nós vamos descobrir quem é o culpado, amor. — Tento
tranquilizá-lo, mas entendo muito bem a sua frustração.
— Estou preocupado, Alícia — confessa e vejo a dor em seus olhos
azuis iluminados pela luz da lua. — Eu morreria antes de deixar que algo
aconteça a você. — Gabriel planta um beijo carinhoso nos meus lábios,
então se vira e olha para dentro do loft onde Chace continua dormindo
tranquilamente em nossa cama. — Ou com ele.
— Não vai acontecer nada, vamos protegê-lo até que tudo isso se
resolva. — Descanso minha cabeça em seu peito e o abraço com uma mão,
com a outra roubo a garrafa e tomo um gole da bebida. — E eu posso me
defender, Bunny, lembre-se quem me treinou.
— Sei que pode, mas não quero que precise, entende?
Sim, eu entendo, mas existem coisas na vida que são impossíveis de
prever ou evitar.
 
***
 
Pela primeira vez em minha vida estou apreensiva para o café da
manhã com a minha família, demorei muito mais do que o normal para
escolher entre dois vestidos, mas acabei pegando uma bermuda jeans e um
top.
Eu nunca me senti dessa forma com meus irmãos, como se tivesse um
segredo a revelar, porque não tenho. Chace não é nosso segredinho sujo, um
brinquedinho sexual. Ele faz parte do nosso relacionamento.
Talvez seja o fato de que nunca apresentei um namorado para meus
irmãos, eu exigi ter Gabriel e Lorenzo, mesmo não gostando, acabou tendo
que aceitar. Quando tive o que queria esfreguei na cara deles o meu amor e
eles precisaram engolir, mas isso parece diferente.
— Você falou com eles? — pergunto para Gabriel quando Chace já
está dentro do carro e não consegue mais nos ouvir.
— Sim — responde simplesmente, mas seus olhos azuis também
estão apreensivos.
— Se eles o tratarem mal…
— Eles não vão — ele garante, porém sinto uma pontinha de dúvida
na sua voz.
Meus irmãos e cunhadas compareceram ao enterro da Família de
Chace, mas eu acho que ele nem lembra disso, estava tão triste e fora da
realidade aquele dia que não deve nem saber quem esteve lá.
Assim que os grandes portões de ferro se abrem, liberando nossa
entrada, vejo a imagem do lugar que chamei de casa a vida toda, mas que
agora parece tão grande e impessoal.
Chace olha para a mansão com admiração, mas seus ombros
contraídos e as mãos apertando as pernas são sinais de nervosismo, ele
vestiu a bermuda jeans escura e camiseta azul, que separei para hoje e não
falou nada no caminho até aqui. Gabriel segue o mesmo estilo de sempre
com uma camiseta preta e calça jeans, como o dia está quente, deixou o
casaco de couro de lado.
— Gatinho, se em algum momento você não se sentir bem, pode falar
e a gente vai para casa, OK? — Tento tranquilizá-lo com um sorriso, mas
ele só acena com a cabeça, nervoso demais para falar.
Somos recebidos primeiro por Matteo e Sophia, que estavam
descendo dos quartos de mãos dadas, minha cunhada está usando um
vestido de verão, na cor azul e todo florido, muito lindo. Já meu irmão
deixou o terno de lado e está de bermuda e camiseta. Ele cumprimenta
Gabriel normalmente e estende a mão para se apresentar para Chace, que
aceita e tenta manter o aperto do meu irmão.
Já Sophia dá um abraço apertado em Chace, como se já o conhecesse,
e vejo que ele parece ficar mais calmo com ela, mas não gosto disso. Que
coisa é essa do meu gatinho ficar tranquilo nos braços da minha cunhada?
— Andrea pediu para preparar a piscina, hoje o dia está muito bonito
para tomar um café lá fora — Sophia explica e segue na frente, com Matteo
ao seu lado.
— De onde você conhece a Sophia? — pergunto baixinho para
Chace.
— Naquele dia da corrida ela veio falar comigo — ele explica, então
lembro que ele assistiu do camarote. Provavelmente minha cunhada puxou
assunto, Sophia é bem sociável, e por trabalhar no hospital, está acostumada
com pessoas de fora.
Gabriel descansa uma mão no meio das costas de Chace, conduzindo-
o até o local enquanto eu pego a mão do gatinho, deixando-o no meio de
nós, bem protegido. Assim que chegamos vejo o olhar atento de Lorenzo,
ele repara primeiro para o lugar onde minha mão segura a de Chace, depois
para Gabriel, e só então ergue o olhar para encontrar o meu.
Lorenzo é um homem tradicional, foi criado assim pelos nossos pais e
carregou essa forma de viver, teve um casamento arranjado com uma
mulher à moda antiga, que lhe deu filhos e cuida da casa e das crianças.
Mesmo assim, ele nunca destratou Sophia por não querer ter filhos e
trabalhar fora, ou Gabriel por ser bissexual, porque ele pode até não ter esse
estilo de vida mais liberal, mas entende que precisa aceitar a forma com que
os outros vivem sua vida.
É por isso que entendo seu momento de hesitação antes de se levantar
e nos receber, porque só com uma troca de olhares eu deixo claro que se
Chace não for aceito, isso significa que também não serei, e eu sei que meu
irmão me ama acima de qualquer coisa, essa é minha grande certeza.
— Seja bem-vindo à nossa Família, Chace — Lorenzo estende a mão
formalmente, mesmo que hoje esteja usando um calção e camiseta, ele não
perde a pose de Don da máfia.
— M-muito obrigado, Don Lorenzo — Chace agradece, gaguejando
na primeira palavra.
— Pode me chamar de Lorenzo — meu irmão diz e apresenta sua
família. — Esta é Andrea, minha esposa, e nossos filhos, Gustavo e
Antônio.
Andrea sorri com carinho para Chace e Gustavo imita o pai,
estendendo a mão formalmente para cumprimentá-lo, então Antônio
aparece e daquele jeitinho fofo dele, ergue as mãos em minha direção e
exige atenção. Abaixo-me para pegá-lo no colo e receber seu abraço.
— Tia Ali, que saudade, você sumiu. — Sua voz delicada faz meu
peito apertar, eu não sou a melhor pessoa com crianças, mas Antônio é
muito carinhoso e exige carinho de uma forma que é impossível negar.
— Desculpa pestinha, eu prometo vir mais vezes — ele sorri e aceita
minhas palavras — também estava com saudade.
— Você trouxe o Chace de novo. — Antônio olha para o lado e sorri
para Chace.
— Sim, ele faz parte da nossa família agora — anuncio e Antônio me
olha confuso, então sussurro em seu ouvido, bem baixinho como um
segredo. — Ele é meu namorado.
— Não, tia, o tio Gabriel é seu namorado — ele responde,
desconcertado.
— Tia Alícia tem dois namorados agora — Sophia fala calmamente,
ela e Antônio são muito ligados, por isso ele para um tempo para pensar
sobre o que ela falou, então dá de ombros e me abraça novamente.
— Eu gosto dele — ele sussurra no meu ouvido da mesma forma que
fiz com ele e solto uma gargalhada, sentindo-me mais tranquila, como se a
aprovação de uma criança de sete anos fosse o que precisava para relaxar.
Depois disso Chace ficou mais tranquilo e aproveitamos o café da
manhã. Antônio quis sentar-se do lado dele e tomou para si a
responsabilidade de mantê-lo por dentro dos assuntos, mesmo que não
falemos sobre a máfia ou nada pesado enquanto as crianças estão junto.
Lorenzo e Matteo trocaram alguns olhares, especialmente quando
Gabriel encostava em Chace ou o acariciava sem perceber, mas vi mais
preocupação do que julgamento vindo deles. O dia foi tranquilo e muito
agradável, mas eu só relaxei mesmo quando fomos para a nossa casa.
— Vocês estão bem? — Chace pergunta quando chegamos ao loft e
nos jogamos no sofá, pegando-nos de surpresa — Ficaram tensos o dia
todo, eu fiz algo de errado?
— Claro que não, gatinho — respondo e o envolvo em um abraço. —
Só estávamos preocupados.
— Mas deu tudo certo, né? Quer dizer, acha que eles… gostaram de
mim? — questiona apreensivo e vejo Gabriel sorrir ao beijar o rosto de
Chace.
— Claro que sim — Gabriel responde e sinto Chace relaxar em meus
braços. — Não tem como não gostar de você, garoto.
CAPÍTULO 34

Gabriel
 
— Gabriel, eu preciso de ajuda, Alícia ela… — Chace vem me
receber na porta de casa, o olhar arregalado de medo em seu rosto faz meu
sentido de proteção agir e levo a mão à arma instantaneamente, mas ele me
segura e aponta para o banheiro.
— O que aconteceu? — Saio correndo e quando abro a porta do
banheiro com um chute, encontro Alícia sentada no chão do box com a
cabeça escondida nas mãos, a água quente formando um vapor denso no
lugar fechado. Só quando entro e me ajoelho em sua frente, sem me
importar em me molhar, é que vejo seus lindos olhos verdes cheios de
lágrimas. — Amor, o que aconteceu?
— Eu quero chocolate — ela fala e começa a soluçar ao se jogar em
meus braços, procurando por carinho, então entendo o que está acontecendo
e sorrio mais aliviado. — Acabou o chocolate, Bunny.
— Eu acho que comi o último, me desculpa, Ali — Chace confessa
desesperado da porta, pobre coitado. — Eu vou comprar mais, eu prometo.
— Pede para o Ryan te levar e traz um kit completo com porcarias,
ele sabe o que isso significa. — Indico com a cabeça que ele saia, mas
sorrio para ele ficar tranquilo.
— Ai, que ódio, Bunny, eu estou morrendo de cólica. Juro que assim
que completar 25 anos vou fazer uma laqueadura e tirar essa droga de DIU
— Alícia reclama com raiva, porém continua chorando. — Acho que fui
grossa com o Chace, ele vai ficar magoado comigo.
— Tudo bem, você está dolorida, pode descontar em nós. — Pego
Alícia em meus braços e a ajudo a ficar de pé, mesmo ela reclamando da
dor, termino de lavar seu corpo e o cabelo, depois ajudo-a a se secar e busco
um dos seus pijamas mais fofos, de unicórnio, uma meia de pelúcia e a
pantufa de coelho que ela tanto ama. — Vou preparar a bolsa de água
quente, consegue ir até o sofá?
— Eu não sou uma inválida — responde firme e me encara com fogo
no olhar, então seus ombros caem e ela volta a chorar.
Troco minhas roupas molhadas e deixo-a sozinha no banheiro para se
vestir enquanto preparo um chá bem quente, baixo a temperatura do ar-
condicionado, encho a bolsa de água quente e levo o cobertor para o sofá.
Alícia se joga no meio das cobertas, liga a TV e coloca “Uma linda
mulher” para assistir, é seu filme de comédia romântica favorito e ela assiste
toda vez que fica menstruada e as cólicas são intensas demais. Não é todo
mês, mas acontece com frequência.
Assisto a mulher mais forte que conheço abraçar o coelho de pelúcia
e se encolher nas cobertas, ela aceita a bolsa de água quente e o chá, mas
não abre espaço para eu me deitar do seu lado, portanto sei que quer ficar
sozinha. Não posso nem imaginar como é ser mulher e sofrer com esse
desequilíbrio hormonal, uma hora Alícia está feliz e do nada começa a
chorar, aí tão rapidamente quanto as lágrimas param, volta a ficar feliz,
depois com raiva, é confuso pra caralho.
Resolvo assar um bolo de chocolate até que Chace volte com os doces
e porcarias do mercado. Ryan já conhece Alícia e foi o alvo de seus pedidos
várias vezes, por isso o soldado sabe do que ela gosta e é a melhor opção
para este momento.
Quando o bolo fica pronto e Chace volta do mercado, ele tenta deitar
com ela e pedir desculpas, mas Alícia está uma confusão de lágrimas e
cobertas no sofá. Ela o afasta e o garoto me procura com o olhar confuso.
— Gabriel — Alícia me chama. — Deu algum problema na boate, a
Liz e a Sharon não param de me mandar mensagem, você pode ir até lá
resolver? E leva o Chace contigo, eu quero ficar sozinha.
— Vamos, garoto, eu te explico no caminho. — Seguro a porta aberta
para ele passar e deixo Ryan responsável pela segurança, só quando
estamos no carro que Chace solta uma respiração pesada e me olha, ainda
mais confuso e desesperado que antes. — Ela está menstruada — explico.
— Mas ela não estava assim antes, quero dizer, estamos morando
juntos há um tempo e é a primeira vez que ela fica assim, eu achei que tinha
feito merda, sei lá.
— Não é todo mês, mas quando as cólicas são mais fortes que o
normal, Alícia tira um tempo para si mesma até passar — explico com
calma. — Olha, garoto, ela é forte e geralmente engole sua dor sem
demonstrar nada, por isso quando expressa seu desconforto assim, é porque
deve estar foda, e nós como homens só podemos fazer o que ela pede, seja o
que for.
— Mas a gente já faz isso normalmente — Chace responde brincando
e sorrio.
— Vendo por esse lado, é só mais um dia normal na nossa relação,
mas não se preocupa, ela vai ver mais alguns filmes, chorar, comer as
porcarias e depois vai querer ser abraçada.
Chegamos na boate e como imaginei, Liz e Sharon não tinham
problema algum, Alícia só precisava de uma desculpa para nos tirar de casa.
Chace aproveitou para conversar com Liz sobre o marketing dos eventos
normais, nesse tempo Andrei me chamou e pelo seu olhar sério imagino ser
algo sobre a máfia, então vamos para o escritório da Alícia.
— Fala, russo — digo sem paciência assim que a porta fecha e me
sento na cadeira atrás da mesa.
— Olá, querido Gabriel, como você está? É um lindo dia, não é
mesmo? — Andrei responde com aquele jeito debochado que me tira do
sério. — Olha, acho que nós começamos com o pé esquerdo, por algum
motivo parece que você não gosta de mim.
— Você acha?
— Wow, agora tenho certeza. — Ele ergue os braços e se joga na
cadeira em frente à mesa, dobrando uma perna em cima da outra
confortavelmente.
— Fala logo o que você quer, não tenho o dia todo — repreendo sem
paciência.
— Tudo bem, tudo bem. — Ele ajeita a postura e seu tom fica mais
sério, finalmente acabando com a brincadeira. Honestamente, não sei como
Alícia ainda não deu um tiro nesse desgraçado. — Consegui algumas
informações sobre o incêndio na casa do Chace e acho que você não vai
gostar, mas tenho quase certeza de que o Brigadier da Bratva estava
envolvido e no dia do evento, quando Alícia e eu saímos, vi homens do
Cartel do lado de fora.
O Cartel está sempre rodeando a boate, mas a parte sobre a Bratva é
novidade, o que diabos eles podem ter contra Chace?
— Como você sabe disso?
— Minha fonte disse ter presenciado uma reunião um pouco estranha
onde Zion Sidorov estava ordenando um ataque à duas casas, ele não soube
dizer por que, mas o local corresponde a casa do Chace — explica e posso
sentir sua raiva. — Essa reunião foi meia hora antes do incêndio, mas só
obtive essa informação esta semana.
— Porra, você tinha alguém que sabia sobre o incêndio e poderia ter
impedido essa merda, e o cara segurou essa informação? — Eu me levanto
com raiva, cuspindo as palavras contra ele.
— Não é tão simples assim.
— Vocês dizem ter o controle do mundo todo, mas não sabem o que
acontece dentro da própria organização? Esse homem de sua confiança
poderia…
— Não é um homem, e não, ela não tinha como me avisar antes
porque é uma prisioneira de Zion Sidorov, tá legal? — A mágoa em sua voz
me faz parar para ouvir — Você não sabe de nada sobre nós, então só
agradece, porque essa informação veio com um custo muito alto.
— Que informação? Saber que foi a Bratva que colocou fogo na casa
de Chace não muda porra nenhuma, quais os motivos deles? O que diabos
Zion pode querer com um Outsider? Sem contar que ainda não entendo por
que você não entra lá e exige explicações, não é a droga do filho do
Pakhan?
— O Pakhan não quer se envolver até termos os nomes de todos os
traidores — fala como se discordasse dessa decisão, e posso estar enganado,
mas Andrei parece frustrado por não poder fazer nada. — Enfim, eu acho
que tem mais aí, a Bratva não tem acordos com o Cartel, pelo menos
oficialmente, porém eu andei de olho no território deles, entrei em alguns
clubes e vi gente da minha organização lá dentro.
— Está andando em lugares perigosos, sabe que alguém pode
reconhecer suas tatuagens. — Indico os braços cobertos e a mais notória de
todas, o A tatuado em seu pescoço, uma marca feita pelo próprio pai
quando ele tinha 12 anos para diferenciar os filhos gêmeos.
— Existem umas coisinhas chamadas maquiagem e tatuagem
temporária, que cobre muita coisa. — Andrei pisca debochado. — Bem, já
falei para o seu Don sobre isso, mas ele disse que deveria falar contigo,
porque você tem um motivo a mais para se importar.
A forma com que esse russo debochado fala a palavra “motivo” e
depois abre um sorriso largo faz meu sangue ferver, eu odeio esse cara,
porra eu poderia abrir a sua garganta agora mesmo só para fazê-lo engolir
essas provocações estúpidas.
— Tá legal, desculpa, não precisa me olhar assim.
Andrei se levanta, mas quando vai sair Chace abre a porta e eles
esbarram um no outro. Vejo as mãos tatuadas do russo envolverem o meu
garoto e em dois passos estou do seu lado, puxando a cintura de Chace para
afastá-lo de Andrei e colocá-lo atrás de mim, tudo isso sem tirar os olhos do
desgraçado que encostou nele.
— Você só pode estar brincando com a minha cara, russo desgraçado
— esbravejo e encaro os olhos do maldito com fúria. — Se encostar nele de
novo…
— Gabriel. — Chace envolve meu braço e tenta me afastar de Andrei.
— Gabriel, calma, foi um acidente.
— Boa sorte, garoto. — Andrei sabe quando recuar. No momento que
a porta fecha posso sentir meu sangue ferver, e preciso respirar fundo várias
vezes para me acalmar.
— Fica longe desse… — advirto quando me viro para Chace, mas seu
olhar espantado me contém.
— Andrei não fez nada, ele é sozinho e não parece ter muitos amigos.
— Tenta defender, mas isso só me deixa mais puto. — Ele é legal.
— Não, Chace, ele não é legal. Andrei está aqui para investigar a
máfia russa, ele é filho do líder da Bratva e se aproximou de você por
informações, é o que ele faz, o que todos nós fazemos, você não pode
confiar em ninguém agora…
— Nem em você? — A pergunta sai cheia de emoção e seus olhos
castanhos me encaram com tristeza, porra, eu não queria me descontrolar
assim, não com ele.
— Claro que pode confiar em mim — confesso e envolvo sua cintura
com as duas mãos, colando nossas testas e uma descarga elétrica passa pelo
meu corpo. Sua boca está a centímetros da minha, tão perto que posso sentir
a respiração quente e ofegante. Quando seu olhar encontra o meu, consigo
ler a dúvida e a apreensão em sua face e meu coração dispara no peito. —
Faria tudo por você.
Então ele acaba com a distância entre nós com um beijo que começa
calmo e vacilante, como se testasse minha reação antes de realmente se
entregar, e porra, eu amo demais esse garoto, especialmente quando fica
ousado assim. Por isso deixo que controle o ritmo e o sigo, sentindo o toque
da sua mão descer pelo meu peito enquanto sua boca me devora.
Seguro a parte de trás do seu pescoço e tomo o controle, sentindo o
gosto delicioso dos seus lábios, que se moldam aos meus com perfeição.
Logo estamos perdidos em uma névoa deliciosa de tesão até que a
única coisa que existe neste mundo somos nós, loucos um pelo outro, cada
toque, cada movimento do seu corpo provoca uma reação em mim. Estou
tão duro e pingando que assim que a mão de Chace encosta na minha
ereção, solto um rosnado contra seus lábios e me esfrego mais nele.
— Porra, garoto, é melhor parar antes que…
— Não vou parar então me fode logo, Gabriel — ele implora e morde
meu lábio inferior. — Eu quero… sentir você… lá.
Meu garoto está todo corajoso hoje, porra, como dizer não? Abro os
olhos para ver seu rosto ganhar aquela tonalidade avermelhada que me
desestabiliza, e assim tenho certeza de que faço qualquer coisa por ele.
— Tem certeza? — exijo uma resposta e ele sorri de canto, sabendo
que terá o que queria. — Eu quero te comer tanto, mas tanto, que chega a
doer.
Tranco a porta do escritório e caminho até o sofá rosa, o mesmo que
Alícia e eu usamos naquela primeira noite em que assistimos Chace fazendo
um showzinho particular para nós. Foi tão diferente e impessoal, mas hoje
posso dizer que já existia uma conexão, porra, eu já queria o garoto desde o
seu primeiro rompante de coragem.
Faço Chace sentar-se no sofá e não deixo que pense muito, abro o
botão da sua calça jeans e ele ergue o quadril quando forço o tecido para
baixo, juntamente com a cueca preta, e assim que sua ereção está livre, caio
de boca no seu pau, olhando para cima até encontrar seus olhos castanhos
ainda mais escuros. Sinto meu garoto se contorcer quando o coloco inteiro
na boca, até o fundo da minha garganta, deixo que deslize para dentro até
não aguentar mais e recuar, chupando com gosto, me deliciando com os
sons de prazer que se desprendem da sua boca. Caralho, ele é uma delícia.
— Gabriel… que gostoso. — Chace se descontrola e agarra meus
cabelos na tentativa de tomar o controle, mas não deixo. Assim que sinto
que seus gemidos estão inconstantes e que ele está quase gozando, paro o
que estava fazendo e o viro no sofá, deixando-o de quatro e com aquela
bunda deliciosa apontada para mim.
— Está pronto para mim? — pergunto, sentindo meu corpo todo
pegando fogo enquanto abro minha calça e libero minha ereção.
— Sim… — responde, virando o rosto para me olhar, o maldito está
mordendo o lábio inferior e com aquela tonalidade vermelha na pele que me
deixa louco.
Não deixo que pense muito, tiro o tubo de lubrificante da gaveta do
lado do sofá e um pacote de camisinha, lambuzo meus dedos e passo pela
sua bunda, com carinho para que esteja bem lubrificado, massageio seu anel
com movimentos circulares, provocando até que ele relaxa ao meu toque e
começa a se esfregar, então coloco a pontinha do dedo e ele geme alto.
— Porra, Gabriel — Chace me olha sobre o ombro e seu rosto está
contorcido em prazer, é sexy pra caralho, ainda mais quando ele segura o
lábio inferior entre os dentes e empina a bunda gostosa ainda mais. —
Quero mais.
— Cacete, garoto. — Ele geme mais alto. — Vou comer essa bunda
gostosa até você me implorar para parar.
— Sou todo seu. — Até a sua voz me faz arrepiar.
Porra, eu vou gozar só de assistir esse safado me provocar assim!
Se é mais que ele quer, é isso que vou dar. Coloco mais um dedo e
sinto ele se comprimir, espero até que relaxe e começo a entrar e sair,
abrindo-o e preparando-o para me receber. Porra, já posso sentir como vai
ser me enterrar nele.
Meu coração parece que vai explodir no peito.
— Relaxa pra mim. — Quando ele o faz e está perdido em prazer,
desenrolo a camisinha no meu pau e substituo meus dedos pelo meu
membro, provocando sua entrada. — Vou te foder bem gostoso, porra…
— Sim, por favor — o desgraçado implora, ofegante, porra, ele está
implorando pelo meu pau.
E é isso que faço. Segurando em sua cintura com força, entro devagar
nele, sentindo-o se comprimir ao redor do meu pau, espero que relaxe e
quando o faz, volto a penetrá-lo até estar enterrado fundo na sua bunda.
— Respira — instruo ao perceber que ele está tenso novamente. —
Porra, apertado pra caralho — rosno e assim que Chace relaxa, começo a
foder o meu garoto da forma que sonhei há um tempo e é melhor do que eu
poderia imaginar, ainda mais quando ele geme meu nome, alto, degustando
do meu pau da mesma forma que estou perdido no seu cu.
— Mais, Gabriel, porra, eu quero mais — ele choraminga e solta um
gemido que faz todo o meu corpo vibrar. Levo uma mão ao seu pescoço e
faço Chace erguer o corpo, colando suas costas no meu peito enquanto
domino meu garoto.
Tudo o que esse homem é, neste momento, se resume a uma tentação
maravilhosa que parece ter sido feito especialmente para mim. Porra, a
forma com que seu corpo responde aos meus toques, preciso morder seu
ombro para conter um rosnado enquanto meto com força.
— Caralho, garoto, você é fodidamente perfeito, porra. — Prendo a
mandíbula para me segurar, é tudo intenso pra caralho.
Sinto minhas bolas contraírem e sei que estou perto, é bom demais e
não consigo segurar muito tempo. Por isso levo a mão para o pau de Chace
e começo a esfregá-lo, no mesmo ritmo das estocadas, até que ambos
gozamos praticamente juntos, ofegando e gemendo, entregues.
— Porra, esse é o meu garoto. — Beijo seu pescoço e vejo Chace
sorrir, ele é tão bonito.
Saio dele devagar e tiro a camisinha, amarro e jogo em um canto, sem
forças para sair daqui, ergo as calças e volto para o sofá. Seguro um Chace
desnorteado em meus braços e acaricio seus cabelos, estamos ambos suados
e ofegantes, mas o sorriso largo em seus lábios é contagiante. Porra de
garoto perfeito.
— Você está bem? Não consegui me controlar — avalio sua reação
porque sei que a primeira vez no sexo anal pode ser bem desconfortável.
— Estou ótimo, você consegue me carregar por aí se eu não puder
caminhar — ele brinca e solta uma risadinha tímida. — Foi… maravilhoso.
— Sim, você é maravilhoso — planto um beijo carinhoso em sua
testa e Chace descansa a cabeça em meu peito, sua mão ergue minha
camiseta e acaricia minhas tatuagens, viajando pelo meu torso, seguindo as
marcas em minha pele, e seu toque me faz arrepiar.
— Posso fazer uma pergunta? — questiona com a voz vacilante e eu
já sei o que ele quer saber.
— Claro. — Passo a mão carinhosamente pela sua testa suada para
tirar uma mecha de cabelo rebelde que está caída.
— O que aconteceu? — Ele acaricia meu pescoço e os braços,
indicando as marcas cobertas pelas tatuagens e, por um momento, me
retraio ao seu toque e ele percebe. — Se não quiser falar eu entendo, eu…
não deveria ter perguntado.
— Tudo bem garoto, pode perguntar o que quiser, mas é uma história
triste. — Respiro fundo e me preparo para relembrar aquele inferno que
vivi. — Eu tinha 18 anos quando fui pego em uma emboscada por uma
gangue que estava tentando tomar parte do nosso território, fui torturado
por 3 dias seguidos, vou te poupar dos detalhes sórdidos. — Ele estremece
em meus braços e o aperto com mais força. — Meu pai era o Consigliere na
época e isso fazia de mim um membro valioso da Família.
— Eles queriam saber sobre seu pai?
— No nosso mundo, informação é poder, fui torturado por 3 dias
seguidos, mas não falei nada de importante. — Chace levanta a cabeça para
me olhar, mas o tranquilizo com um meio sorriso. — Lorenzo montou uma
força tarefa e me resgatou, mas os traumas ficaram por muito tempo.
— E ninguém podia te tocar, nem seus pais?
— Não, quando fui levado ao hospital precisei ser sedado para
tratarem das queimaduras, é um processo lento e uma tortura ainda maior,
no fim não suportava que chegassem perto de mim.
— Até Alícia.
— Sim, eu fui o primeiro a chegar quando a resgatamos e ela
simplesmente correu para os meus braços, e naquele momento não vacilei,
não senti medo com o seu toque nem nada, eu prometi que ninguém faria
mal àquela garota novamente. — Ele sorri fazendo meu coração acelerar. —
O restante ela já te contou.
Chace confirma com a cabeça, mas vejo uma pergunta passar pelos
seus olhos e ele fica vermelho.
— Pode perguntar.
— Como você… quero dizer, como tinha…você sabe… relações, sem
alguém poder te tocar? — Esse garoto é uma confusão, uma hora está
implorando para ser fodido e na outra tem vergonha de falar sobre sexo.
— Fiquei muito tempo sem conseguir transar com alguém, depois
entrei no mundo do BDSM e tentei ser um Dominador. Funcionou por um
tempo, especialmente a prática de shibari, mas faltava algo e só entendi o
que era quando Alícia me reivindicou para si.
— Amor. — A palavra sai em um suspiro e ele fica ainda mais
vermelho.
— Sim, faltava amor, mas principalmente, confiança. Eu tentei afastá-
la, afinal ela é quinze anos mais nova, sem contar que é irmã do meu melhor
amigo. Eu realmente tentei — explico minha confusão e Chace concorda
com a cabeça. — Mas ninguém diz não para Alícia.
— Já percebi isso — ele sorri, cúmplice, e seu rosto se ilumina ao
falar dela. — Acho que estou apaixonado por ela.
— Eu sei, garoto. — A confissão faz meu coração bater ainda mais
rápido e uma sensação de pura felicidade me atinge.
— Acho que… estou apaixonado por você também.
Porra, Chace acabou de se declarar, pra mim?
Ergo seu queixo com a mão e acaricio sua bochecha, descendo o
polegar calmamente até esfregar em seus lábios macios, que ele abre e me
inclino para roçar minha boca na dele, sentindo seu beijo, sua entrega, o
gosto delicioso de chocolate que está sempre temperando sua língua macia.
— Eu também te amo, garoto — murmuro contra seus lábios e sinto
ele ficar tenso, os olhos castanhos encontram os meus e porra, sua emoção
me faz feliz pra caralho. — Agora vamos para casa, que a nossa mulher já
deve estar pronta para ser cuidada.
— Ela vai te matar se ouvir você chamando-a de “nossa mulher” —
Chace brinca e faz a menção das aspas com as mãos.
— Então é melhor ficar só entre nós. — Pisco para ele, que sorri e
volta a me beijar antes de se levantar.
— Ela me assustou hoje — o garoto confessa com a expressão
perturbada.
— Com o tempo você se se acostuma — tranquilizo-o e ele respira
fundo, relaxando os ombros. Ele é tão incrivelmente confuso, de uma forma
única, como só o meu garoto consegue ser.
CAPÍTULO 35

Alícia
 
Ser mulher às vezes é uma desgraça mesmo. Desde que coloquei o
DIU de cobre minhas cólicas aumentaram muito, tem meses que não sinto
quase nada, mas outros que me derrubam. E dessa vez foi difícil para mim
mesma me aguentar, por isso precisei de um tempo sozinha e mandei os
dois saírem de casa, eu só queria assistir a Julia Roberts pegando o Richard
Gere.
Claro que, depois de me afogar em lágrimas e doces, fiquei feliz
quando eles voltaram e se enfiaram embaixo das cobertas comigo, e mais
ainda quando ambos me beijaram e sussurraram “eu te amo” no meu
ouvido. Droga de hormônios que me fizeram chorar feito uma condenada
com essa declaração dupla dos meus homens.
A cada dia que passa, ficamos mais próximos, não só fisicamente,
mas criamos uma rotina que funciona. Até comprei uma cama maior e que
comporta nós três e meu coelho de pelúcia, que na maioria das noites acaba
no chão mesmo.
Gabriel conseguiu comprar o prédio todo e estamos reformando o
segundo e o terceiro piso, teremos uma academia e um escritório enorme,
demorou um pouco, mas consegui deixar meu estúdio como eu queria.
Também preparei uma surpresa para o Chace, pedi para a equipe dar
prioridade a essa parte.
Faz um mês que ele voltou a trabalhar na Malícia comigo, com a
diferença de que agora ele não dança com os meninos, porque ele nunca
gostou realmente dessa parte, e não quero mais forçá-lo a fazer o que não
quer. Tenho planos para o meu gatinho.
Quando a arquiteta saiu da última inspeção, dei meus toques finais.
Coloquei vários quadros com fotos tiradas recentemente e outras mais
antigas, que peguei nas redes sociais, especialmente da família do Chace,
essas coloquei no escritório que montei para ele.
— Vem cá, gatinho, temos uma surpresa para você — chamo Chace,
animada, e coloco um pano cobrindo seus olhos.
— Eu sabia que vocês iam me vendar e amarrar uma hora dessas —
ele brinca, fazendo beicinho e Gabriel sorri. — Eu prefiro enxergar quando
a gente faz essas coisas.
— Safado, tudo é sobre sexo agora? Perdeu a virgindade e ninguém
mais segura — gracejo e pego sua mão para guiá-lo para fora, Gabriel vem
do outro lado e o conduz com uma mão nas suas costas. — Cuidado com os
degraus — aviso e descemos a escada até chegar ao escritório, assim que
entramos deixo Chace bem de frente para a sua mesa — que organizei com
o mais moderno computador do mercado e uma cadeira confortável —,
assim ele terá o melhor suporte para trabalhar.
— Esperamos que goste — Gabriel sussurra no ouvido dele quando
tira a venda de Chace e eu estouro uma bomba de confetes, assustando-o
com a surpresa. Vejo seus olhos arregalarem ao passar pelo local, então ele
me encara, sem entender.
— Este é seu novo escritório, gatinho — explico ao mostrar o lugar,
que está cheio de balões azuis e dourados no teto e uma cesta recheada com
doces, porque ele ama. — Você sabe que te acho incrível, não sabe?
Ele continua me olhando confuso e Gabriel sorri.  Passando um braço
pela cintura de Chace ele o conduz até a parede de fotos.
— Esse lugar todinho é seu, e a partir de agora você não precisa mais
trabalhar como garçom na boate, quero que faça o que você gosta e sabe
fazer de melhor, além de ser meu gatinho. — Pisco e arranco um meio
sorriso envergonhado dele. — Quero que trabalhe no marketing, tanto da
Malícia quanto das minhas redes sociais.
— Você quer que eu trabalhe aqui?
— Sim, ali do lado. — Indico a parede que separa seu escritório do
meu espaço. — Tem meu estúdio de música, então quando eu estiver
criando algo, vamos estar lado a lado, e você sempre pode ir comigo para a
boate se quiser. Contudo, a Liz e eu andamos conversando e ela precisa de
alguém para descarregar essa parte do marketing e não consigo pensar em
ninguém melhor que você.
— Você gosta do meu trabalho? — questiona perplexo, com aqueles
olhos já enchendo de lágrimas e o rosto ficando vermelho.
— Claro que sim. — Eu me jogo em seus braços e beijo o rosto todo
vermelho do meu gatinho. — Chega de contrato ou dívida, não temos mais
nada disso, se quiser podemos estabelecer um salário mensal, mas pra mim
você pode só usar esse cartão aqui.
Estendo o cartão preto que pedi para o banco, minha conta é
praticamente ilimitada.
— Não quero me aproveitar do seu dinheiro só porque estamos em
uma relação — Chace responde confiante e recusa o cartão. — Mas eu
aceito o trabalho. Obrigado, Ali.
— Own, gatinho, eu faço qualquer coisa para te ver feliz — respondo
e beijo sua boca com carinho, que Chace corresponde ao aprofundar o beijo
por um tempo, então seus olhos passam pela parede de fotos e me afasto
para que ele realmente veja tudo o que montei.
— Onde… Como você conseguiu? — aponta para a foto que foi a
mais difícil de encontrar, mas por sorte o padre da paróquia da qual a tia de
Chace fazia parte tinha algumas fotos antigas dele com a sua mãe, tia e tio,
então mandei restaurar, pois estavam em péssimo estado, e fiz um quadro
para ele.
— Você gostou? — Gabriel questiona, mas não precisamos nem
receber uma resposta, a forma com que Chace olha em nossa direção faz
meu coração bater forte, e a mão de Gabriel me segura pela cintura de
forma carinhosa até que Chace corre até nós e se joga em nossos braços,
lágrimas escorrendo pelo seu rosto, mas não é um choro de tristeza e sim de
felicidade.
— Eu amo vocês — confessa e me beija, dessa vez sem se conter,
sinto o salgado das suas lágrimas se misturar ao doce da sua boca e não me
seguro, abro espaço para tocar a sua língua na minha e logo estamos
ofegantes. Ele se esfrega contra mim, sua mão descendo para a minha
bunda até que me levanta e escora minhas costas no peito de Gabriel,
transpasso minhas pernas na cintura de Chace e sinto os beijos de Gabriel
no meu pescoço.
— Nós também amamos você, gatinho — respondo quando ele se
separa dos meus lábios para beijar Gabriel. Logo estamos os três sem roupa
em uma troca de carícias, beijos, toques, que não são só tesão ou sexo, é
amor, puro e verdadeiro.
Tudo acontece tão naturalmente que não precisamos de palavras, nos
movemos em uma sintonia perfeita e no momento em que Chace me coloca
sentada na sua mesa e desliza uma camisinha no pau, Gabriel segura minhas
pernas na cintura de Chace, e assim que o gatinho me invade, firme e
quente, me preenchendo completamente, sinto suas mãos apertando minha
bunda e jogo a cabeça para trás, ele traça um caminho de beijos pelo meu
pescoço até meus peitos, chupando e se deliciando enquanto Gabriel se
junta a nós.
— Você é deliciosa, Alícia — Chace murmura e passa a língua
delicadamente em meu mamilo, provocando arrepios por todo o meu corpo.
Estamos os três gemendo e nos amando juntos, são seis mãos
explorando três corpos suados e perdidos na névoa formada pelo tesão.
Gabriel prepara Chace, arrancando gemidos incontidos do gatinho que me
fazem sorrir, então ele o penetra lentamente, no mesmo ritmo que Chace
entra em mim, em uma conexão fodidamente perfeita de investidas, algo
que nunca senti antes.
Meu olhar encontra o azul intenso de Gabriel na mesma hora que ele
segura minhas pernas com mais força, fazendo-me sentir seu toque,
enquanto Chace beija meu pescoço e geme contra a minha pele. Arrasto as
unhas em suas costas e o sinto estremecer quando ergue o rosto e me
entrega tudo em um olhar.
Somos três pessoas conectadas.
Três amantes.
Três amores.
Três corações que batem como um.
Não existem palavras para falar neste momento a não ser os rosnados
e gemidos incontidos que soltamos. A mesa embaixo de mim balança ao
tentar conter nossos movimentos, mas por sorte ela é reforçada e não
precisamos nos segurar.
Beijo Chace com necessidade, mordendo seu lábio, enquanto Gabriel
explora seu pescoço com adoração. Eu acaricio os cabelos suados do Bunny
e não demora muito para sentir o primeiro orgasmo, que me faz tremer
descontroladamente, enquanto Chace me fode mais rápido e duro, no
mesmo compasso que Gabriel entra e sai dele.
Tudo é sobre prazer e adoração: o sexo, os gemidos, os beijos, as
mordidas e lambidas são expressões de amor e não existe nada além dos
sons de três corpos fazendo amor, duro, forte, intensamente, até que
gozamos praticamente ao mesmo tempo e nos entregamos, sentindo tudo o
que os outros sentem. São três corações batendo acelerados no peito e três
sorrisos satisfeitos assim que nos jogamos no sofá estrategicamente
colocado para momentos assim.
— A gente acabou de… — Chace é o primeiro a encontrar as
palavras e acaricio seu rosto confuso.
— Fazer amor — Gabriel e eu completamos sua frase e sorrimos,
porque não tem como negar, nem fugir, e muito menos esconder o que
sentimos, e caralho, eu nem quero isso, não consigo mais imaginar minha
vida sem eles.
 
***
 
Entramos em uma rotina maravilhosa depois que Chace assumiu a
parte do marketing. Eu realmente nunca gostei disso, acho um saco ficar
editando os vídeos ou gravando conteúdo, mas sempre fazia para manter as
redes atualizadas, não que precise de dinheiro, mas eu gosto de ver os likes
e os comentários.
Agora que tenho meu gatinho para isso, fico só com a parte boa e
recebo toda a atenção que mereço.
Chace ainda vem para a boate comigo quando quer sair de casa um
pouco, ele também começou a usar a academia para fazer exercícios, o que
é ótimo, porque Gabriel e eu adoramos treinar com ele. Fazer o gatinho suar
enquanto ergue aqueles pesos, sem camisa, com aqueles músculos que
começaram a crescer nos últimos tempos, caralho, ele é uma delícia.
Gabriel e eu gostamos mais de lutar, usamos bastante o ringue para
alguns sparing e autodefesa, às vezes só precisamos descontar a frustração
batendo um no outro e está tudo bem, porque sempre fizemos isso e Chace
gosta de assistir, mas não quer aprender. Disse que ainda não está pronto, eu
acho que ele tem medo, mas com o tempo vamos convencê-lo.
Preciso que ele saiba se defender, ou que pelo menos tente. Chace não
perguntou sobre o incêndio e nós não falamos nada, para ele as casas só
pegaram fogo e foi isso que matou sua família.
Nós ainda não temos respostas sobre o que aconteceu na casa dele,
Gabriel me contou o que Andrei falou sobre a Bratva estar envolvida, mas
não faz sentido nenhum. Que droga eles querem com Chace? Mas saber
disso nos deixou ainda mais protetores, não falamos nada para ele, mas
aumentamos a segurança no prédio e ele só sai com os soldados ou com um
de nós dois.
Até resolvermos essa merda toda, Chace está em perigo, e não
podemos correr riscos, não com ele. Por isso é bom que ele esteja
trabalhando em casa, o prédio está cercado e Gabriel finalizou a instalação
dos equipamentos de segurança, então ninguém entra ou sai de lá sem nós
sabermos.
O melhor foi o dia que Chace me pediu para fazer uma tatuagem nele,
e como foi a sua primeira, instruí que fosse algo menor e em um local que
dói menos, então ele pediu uma caveira de gato no antebraço. Passei alguns
dias desenhando e deixando perfeito para marcar a pele do meu gatinho, e
quando chegou o dia ele aguentou bem a dor.
Claro que Gabriel ficou do lado dele e segurou a sua mão, trouxe água
e o distraiu durante as horas em que me concentrei na tatuagem, mas no fim
ele amou o resultado. Foi maravilhoso poder marcar a sua pele com um
desenho meu, e agora o gatinho já quer mais e pensa até em fechar o braço.
Obviamente que não vou negar e já estou preparando um
complemento perfeito para a sua caveira, porque eu amo tatuar e não nego
nada a ele. O que Chace pedir eu dou, com muito gosto.
Eu venho todos os dias para a Malícia, mas só à tarde, para deixar
tudo organizado. Sharon é mais do que capaz de manter o lugar
funcionando à noite e sempre posso acessar as câmeras de casa mesmo,
portanto tenho mais tempo vago para ajudar Gabriel quando temos alguma
cobrança para a Família. Esse momento ainda é só nosso, as eventuais
torturas ou só um espancamento são nosso escape, onde descontamos as
merdas todas e cumprimos o nosso dever como executores.
Hoje precisei vir até a boate para montar o planejamento do mês com
a Liz e a Sharon, elas estão animadas porque o movimento voltou a subir
depois do evento e o incidente do Enzo foi esquecido pela mídia.
Depois de fechar a agenda e encaixar os novos DJs que irão se
apresentar com os residentes, que já fazem show regularmente, deixo as
duas bem ocupadas e resolvo ir até o bar. No caminho encontro Ravi vindo
em minha direção, o olhar preocupado faz todos os meus alertas internos
gritarem.
— O que está fazendo aqui? — questiono, já que ele deveria estar no
loft.
— Chace pediu para vir até a boate, mas quando chegamos aqui ele
disse ter esquecido o notebook no apartamento e me pediu para voltar
buscar, eu o deixei na porta do elevador da garagem, Mali — conta e meu
coração acelera com cada palavra.
— Onde ele está agora?
— Não sei, acabei de voltar e não o encontro em lugar algum, o
segurança disse que ele não entrou.
— Porra, eu falei para não tirar os olhos dele — repreendo e volto
para o meu escritório em um rompante. Liz e Sharon percebem meu estado
e logo se mobilizam para me dar espaço enquanto abro as câmeras de
segurança, — Que horas vocês chegaram?
— Às 16h45, aproximadamente — Ravi responde.
Abro as imagens da garagem e acompanho o SUV dos seguranças
entrar, então Chace desce e parece perceber que esqueceu algo. É nessa
hora que ele volta e fala alguma coisa com Ravi, que está no banco do
motorista, só depois Chace volta a andar em direção ao elevador, mas antes
que ele aperte o botão o SUV sai e algo muito estranho acontece.
Chace tira o celular do bolso e atende, sua expressão leve muda
imediatamente para medo quando ele começa a olhar para os dois lados,
como se procurasse por alguém. Assim que seu olhar recai no portão ele
congela por um momento, como se pensasse em correr, ele passa um tempo
falando com a pessoa no telefone até caminhar lentamente na direção da
saída.
— Porra, para onde ele foi? — falo mais comigo mesma e abro as
imagens das câmeras externas, então meu coração para por um momento ao
reconhecer o motorista do carro preto parado do outro lado da rua, é Jair
Hernanes, o braço direito do chefe do Cartel. Acompanho Chace atravessar
a rua, entregar o celular para Hernanes e entrar no banco de trás. — Merda,
merda, merda.
— O que aconteceu, Mali? — Sharon pergunta preocupada.
— Eu te falei para cuidar dele — esbravejo contra Ravi. — Você
tinha um trabalho, porra.
Ele não responde, só abaixa a cabeça e aceita, mas eu não consigo me
controlar, o desespero e a fúria explodem em meu peito. O que diabos a
droga do Cartel quer com ele?
— Ligue para o meu irmão e para Max, quero saber com quem Chace
estava falando e quero uma força tarefa, AGORA! — ordeno e saio da sala
com o celular em mãos para ligar para Gabriel, mas quando abro a tela vejo
uma mensagem do número do Chace e meu coração para novamente.
“Não vamos machucá-lo se você se entregar sem resistir. Um carro
vermelho está esperando a duas quadras da boate.”
É isso, então? Eles estão usando Chace para chegar até mim? Mas por
quê? Não tenho serventia alguma para eles e muito menos Chace. O Cartel
sabe que meus irmãos não vão entregar nosso território por mim, a Família
vem acima de tudo, porém não tenho escolha, não posso deixar que façam
mal a ele, não por minha culpa.
Por isso tiro todas as facas e armas do meu corpo e deixo meu celular
em cima do bar com um recado para Gabriel:
“Vou fazer isso por ele, porque sei que você virá por nós.”
Saio da Malícia e dispenso os seguranças, eles parecem confusos, mas
não são nem loucos de me contrariarem. Assim que viro a primeira esquina
vejo o carro vermelho estacionado e dois homens com a marca do Cartel
escorados nele.
Eu vou até você, gatinho, e quando Gabriel vier nos salvar, vou matar
cada um dos desgraçados que encostar um dedo no que é meu.
 
CAPÍTULO 36

Gabriel
 
Don Lorenzo e eu tínhamos acabado de sair da reunião com o prefeito
para resolver as taxas de importação quando recebi a notícia que fez meu
mundo desabar por completo: Chace e Alícia estão nas mãos do Cartel.
Partimos diretamente para a mansão onde Matteo estava nos
esperando, Ravi me entregou o celular e o bilhete de Alícia, nesse meio
tempo Max já havia rastreado a ligação que Chace recebeu, confirmando
que veio do número pessoal de Leandro Vasquez.
Não dou dois passos para dentro do escritório do Don quando ele se
vira e me pega pelo pescoço, imprensando-me contra a parede, Lorenzo
desconta toda a sua fúria em mim e preciso lutar contra todos os meus
instintos de proteção para não socar o desgraçado e afastá-lo.
Sinto o local onde seus dedos tocam minha pele queimar, a agonia
acumulando-se rapidamente dentro de mim é como a lava de um vulcão em
erupção, é quase insuportável e ele sabe o que isso está fazendo comigo,
estou a ponto de perder a cabeça.
— É SUA CULPA, ESTÁ ME OUVINDO? — Lorenzo esbraveja, o
olhar injetado de raiva. — Você trouxe aquele Outsider para a vida da
minha irmã, você foi o motivo dela ter se entregado, eu sabia que ia dar
merda, eu te avisei. — Ele aperta meu pescoço ainda mais e quase perco a
cabeça e tiro minha arma, porém Matteo o afasta antes que algo pior
aconteça.
— Calma, Lorenzo, nós vamos resgatar nossa irmã. — Matteo tenta
apaziguar a situação, porém assim que me olha eu sei que também me
culpa, porra, eu me culpo.
— Eu cuidei dela, fiz tudo o que meu pai pediu, eu a mantive
protegida — Lorenzo caminha de um lado para o outro, gritando consigo
mesmo, o olhar perdido em pensamentos enquanto passa as mãos pelo
cabelo. — Porra, nunca deveria ter aceitado essa merda de relacionamento
de vocês, eu te falei para mantê-la a salvo, eu avisei, Gabriel.
— Você acha que não sei, porra? — Perco todo e qualquer controle e
enfrento meu melhor amigo, meu Don. — Eu falhei, caralho, e quando essa
merda toda acabar e eles estiverem a salvo, você pode fazer o que quiser
comigo, mas até lá precisamos manter a calma.
Mesmo que eu esteja explodindo e que tudo o que mais queira seja
pegar minha arma e invadir o covil do Cartel, não posso agir de cabeça
quente e arriscar que alguma coisa aconteça a eles.
— Gabriel está certo, precisamos nos acalmar — Matteo intervém e
toca no ombro de Lorenzo, que agora está de costas para nós.
— Eu fiz o que meu pai pediu, mantive nosso segredo, mantive nossa
irmã a salvo por tantos anos, para no fim ela se entregar por um maldito
Outsider — Lorenzo murmura com dor, sua voz tremendo entre a raiva e
algo a mais, porém não presto mais atenção nisso quando reparo no que ele
acabou de falar.
— Segredo? Do que você está falando? — questiono e Matteo
arregala os olhos, percebendo que o irmão falou demais. — Lorenzo, o que
diabos você está escondendo?
— Não é da sua conta, filho da puta. — Ele tenta fugir do assunto,
mas não adianta.
— Matteo, porque o Cartel está atrás da Alícia? — Finalmente faço a
pergunta que deveria ter feito há muito tempo, porque só agora entendo
qual é o objetivo deles, quem realmente é o alvo.
— Alícia sempre teve um alvo nas costas, desde o momento que
nasceu. — Lorenzo se vira e respira fundo antes de continuar. — O
sequestro dos meus pais nunca teve objetivo territorial, foi vingança.
— Que porra de vingança foi essa?
— Alejandro a queria. No dia do meu casamento eles foram
informados de que Alícia não chegaria junto com a minha noiva e isso
gerou uma troca de motoristas de última hora. O alvo do sequestro era ela e
não meus pais — Lorenzo explica, mas nada faz sentido, porque alguém
sequestraria uma menina, que nem na linha de comando estava, se o
objetivo não era uma troca por território?
— Pouco depois que eu nasci, meus pais acabaram se afastando, o
casamento entrou em colapso e eles fizeram um acordo para manter seu
relacionamento como uma fachada — Matteo explica, mais calmo e
controlado, colocando-se em seu lugar de Consigliere. — Minha mãe
mantinha um amante e meu pai tinha a liberdade de sair para as casas
noturnas.
— Só que o Don não pode simplesmente aparecer assim em qualquer
lugar, as pessoas iriam falar e ele tinha uma imagem a manter, por isso meu
pai frequentava lugares onde ninguém o reconheceria — Lorenzo continua
e todos sabemos de que lugares ele está falando, bordéis e casas de
prostituição mais afastadas e que não pertençam à Família ou aos nossos
inimigos declarados. — Em uma dessas saídas ele acabou encontrando
alguém que chamou sua atenção, mas ela era uma imigrante ilegal.
— Eles tiveram uma noite e quando meu pai voltou para buscá-la no
outro dia, descobriu que ela era a mulher do chefe do Cartel, Alejandro
Vasquez. Carlita havia fugido do marido abusivo e aceitou a ajuda do meu
pai, só que ele não poderia simplesmente trazê-la para a nossa casa —
Matteo conta com mágoa. — Eles passaram um tempo juntos, até que ele
descobriu que ela estava grávida dele.
— Porra, você está me dizendo que Alícia é meia irmã de Leandro
Vasquez? — procuro confirmação, porque se for isso, essa missão será
ainda mais difícil.
— Quando nosso pai descobriu, ele queria abrir o jogo para toda a
Família e assumir a criança, mas as coisas não são assim tão simples, e
pouco tempo depois Alejandro descobriu onde sua mulher estava e mandou
seus homens atrás dela. Meu pai havia colocado seguranças, mas não foi o
suficiente — Lorenzo explica com calma. — Meses se passaram até que
eles conseguiram notícias e descobriram que Carlita havia morrido no parto
e a criança estava nas mãos de Alejandro.
— E como ela veio parar aqui? — questiono tentando juntar todas as
peças dessa história.
— A nova mulher de Alejandro se compadeceu da criança e ajudou
nosso pai a tirá-la de lá, o maldito pretendia usar Alícia como sua criada
para esfregar na cara da nossa Família e torturar Don Vitório — Lorenzo
continua a falar, com mais raiva ainda.
— Mas não pode ser, eu lembro da sua mãe grávida, nós vivíamos
praticamente juntos — expresso minha confusão.
— Quando recuperamos Alícia ela tinha 1 mês de vida. Minha mãe
fingiu uma gravidez inesperada e eles mentiram para todos dizendo que ela
nasceu prematura e com uma doença que prejudicou sua imunidade, então
ninguém podia visitá-la, só depois que ela completou 6 meses e realmente
não fazia mais tanta diferença é que nossa irmã foi apresentada ao restante
da Família. — Matteo me olha com seriedade. — E este foi o mesmo dia
em que Alejandro jurou vingança contra a nossa Família.
— Porra, mas então… — Finalmente caio na real e o desespero toma
conta.
— Eles não vão pedir resgate, Alícia será torturada e morta antes do
próximo dia nascer — Lorenzo anuncia e libera o caos na sala.
— Por que vocês nunca me contaram? Se eu soubesse teria…
— Teria o quê? Controlado teu pau? — Lorenzo repreende com
firmeza. — Porra, Gabriel, eu entreguei minha irmã ao meu melhor homem,
a porra do meu melhor amigo, com o único objetivo de que você a
mantivesse a salvo.
— Eu tinha o direito de saber — confronto com raiva, vejo o olhar
contrariado de Lorenzo e odeio bater de frente com ele. — Deveriam ter me
contado.
— Você não faz ideia do que um segredo assim faz com alguém, acha
que gostamos de mentir para nossa irmã? Esconder uma parte da sua vida?
— Matteo agora me enfrenta. — Você jamais conseguiria ocultar isso dela
sem se remoer de culpa.
Ele tem razão, se eu soubesse jamais teria ficado com Alícia sem
antes contar a ela, o remorso acabaria comigo e com o nosso
relacionamento.
— Porra, precisamos nos mover logo. — Olho para o relógio e vejo
que as horas estão passando e o dia se transformou em noite lá fora.
— Reúnam todos os nossos homens, quero a elite dos soldados
prontos em uma hora, vamos invadir o covil do Cartel e tirar nossa irmã de
lá — Don Lorenzo comanda, respirando fundo na tentativa de manter a
cabeça no lugar.
— Don Lorenzo — Ravi bate na porta —, um dos dançarinos da
Malícia está aqui, ele disse que foi convidado.
— Deixe entrar. — Matteo abre a porta para Andrei se juntar a nós,
dessa vez não há sorrisos debochados ou brincadeiras, o russo está tão puto
quanto nós. — O que você descobriu?
— Zion reuniu sua cota de homens leais e se juntou ao Cartel com o
objetivo de derrubar a Família de Angelis, acabei de receber ordens do
Pakhan para dar um fim a esse motim, nossos homens já estão a postos —
Andrei anuncia sério e confiante. — Tenho ordens para eliminar todos os
traidores.
— Ele sabe sobre Alícia? — pergunto e só preciso olhar para o russo
e ver que sim, ele sabe. Porra, eles confiaram nesse desgraçado, mas não em
mim.
— A Bratva não aceita segredos dos nossos aliados — Andrei explica
calmamente. — Tenho 25 soldados de elite cercando o local onde eles estão
mantendo Alice e Chace, e alguns infiltrados entre os homens de Zion.
Com a Bratva do nosso lado será fácil eliminar o Cartel, porém ainda
corremos o risco de eles usarem Chace ou Alícia para se defenderem, ou
pior, acabarem com a vida dela ainda mais rápido.
O Cartel tem sua base de operações em um dos bairros mais perigosos
de Boston e também o mais afastado, um local onde a polícia não entra e o
governo não existe, eles dominam a área. Segundo Andrei, Leandro
Vasquez está mantendo Alícia e Chace em sua casa, o local é cercado e
protegido pelos homens do Cartel e não será fácil de invadir sem que eles
saibam que estamos chegando.
Andrei abre as imagens de satélite e a planta baixa da mansão
Vasquez e nos mostra o caminho até lá.
— Não tem como entrar sem ser visto — concluo depois de analisar
todas as possibilidades. — Pelo menos não com muita gente, eles têm
câmeras e sensores de aproximação.
— Alícia está sendo mantida no subsolo, em uma sala de tortura. —
Andrei mostra no mapa e será impossível chegar até lá sem matar todos
pelo caminho, e isso leva tempo, que não temos, porque assim que
entrarmos por aquela porta, corremos o risco de Leandro acelerar ainda
mais a sua vingança. — Não recebi mais atualizações, mas ela ainda pode
ter sido movida, meu informante avisou que a Família Vasquez está
preparando uma comemoração.
— E o Chace? — pergunto preocupado e Andrei respira fundo, mas
não me olha nos olhos ao apontar para um dos quartos no segundo andar. —
Por que ele não está com ela?
— Quando estava vindo para cá um dos meus informantes mandou
mais informações — Andrei começa a falar, sua voz toma um tom mais
sério e preocupado. — Eu sei o motivo do Cartel ter atacado a casa do
Chace.
— Fala logo, filho da puta — Matteo é quem corta a ladainha do
russo.
— Chace King é filho ilegítimo de Alejandro Vasquez — anuncia e
todos paralisamos. — Vocês sabem o que isso significa?
Preciso de tempo para processar a informação, porque sim, nós
sabemos a merda que isso implica e agora tudo faz sentido. Porra, Chace é
um irmão Vasquez, uma das crianças espalhadas por aí pelo maldito
Alejandro, que mantinha mulheres pela cidade toda como se fossem seu
harém particular. O desgraçado tem mais de vinte filhos, a maioria
ilegítimos, já que só registrava os que vinham de sua esposa.
Depois que Alejandro morreu, seu filho mais velho ficou responsável
por manter a Família Vasquez unida, ele reuniu todos os filhos e filhas que
encontrou e formou seu círculo interno de aliados.
— Foi por isso que ele entrou naquela merda de carro por conta
própria — Matteo fala. — Leandro fará de tudo para que ele aceite se unir a
eles.
— Pensando bem, isso pode ser uma vantagem para nós — Don
Lorenzo expressa, pensativo. — Se Leandro usar Alícia como forma de
convencer Chace a se unir a eles, isso significa que a manterá viva por mais
tempo.
Não passa despercebida a forma com que ele monta sua frase. Já que
sabemos que ele pode até mantê-la viva, porém o desgraçado a fará sofrer,
seja por vingança ou para fazer com que Chace se alie a eles. Porra, eu sei o
que é ser torturado e só de imaginar o que eles podem fazer com ela, volto a
me desesperar.
Ela não merece passar por isso.
Alícia já tem seus traumas, não precisa suportar uma tortura.
— Hey — Andrei me chama e se aproxima, mas não me toca. —
Alícia é forte pra caralho, e se tem uma coisa que reparei nesse tempo que
passei com vocês, é que a mulher é foda e faz tudo por quem ama, então
coloque a cabeça no lugar e confie nela, porque tenho certeza de que aquela
diabinha só se entregou porque sabia que seus homens fariam de tudo para
tirá-la de lá.
Sim, eu vou resgatar Alícia e tirar meu garoto de lá. Nem que para
isso precise explodir a merda do Cartel, eles são a minha prioridade. Olho
para Matteo e Lorenzo e eles estão com a mesma expressão preocupada que
a minha, porém eu sei que é só sobre a irmã, eles não dão a mínima para o
Chace, e porra, Alícia sabia disso quando se entregou. Será que fez isso
para garantir que o garoto fosse salvo?
— Andrei, você consegue entrar infiltrado com alguns homens? —
Don Lorenzo pergunta.
— Sim, já tenho uma equipe trabalhando em desligar as câmeras de
uma parte da mansão. Como eles estarão em modo de alerta para qualquer
anormalidade, depois que receber o sinal entrarei com mais quatro
soldados.
— Ótimo, precisaremos de reforço lá dentro — Lorenzo confirma —,
porque nós vamos entrar pela porta da frente daquela merda e mostraremos
o que é o inferno para o desgraçado que teve a coragem de tocar em um fio
de cabelo de uma de Angelis.
— Porra, sim — Matteo praticamente grita em antecipação e já
começa a fazer ligações, colocando em movimento a maior operação de
resgate que a máfia já viu em gerações.
— Ravi, leve as mulheres e crianças para o avião, contate o piloto e
fique pronto para a decolagem — Don Lorenzo ordena. — Se alguma coisa
der errado você ficará responsável por levá-los em segurança até a Rússia.
— Sim, Don Lorenzo. — O soldado sai rapidamente para cumprir
suas ordens.
— Espero não precisar pôr esta evacuação em ação, porque isso
significa que falhamos — Lorenzo explica e todos entendem o que ele quer
dizer.
— Nós não vamos falhar, irmão, vamos resgatar nossa diabinha e
acabar com cada um que se colocar em nosso caminho.
CAPÍTULO 37

Chace
 
Uma frase.
Uma ligação.
Milhões de pensamentos e dúvidas. Eu estava quase chamando o
elevador quando meu celular tocou, nem olhei para o número antes de
atender e a voz do outro lado me fez paralisar.
“Eu sei o que aconteceu com a sua família e quem foi o culpado pelo
incêndio”. Uma voz grossa e desconhecida fez todo o meu corpo arrepiar.
“Não foi um acidente, Hermano”.
— Quem está falando? — Olho para os lados para conferir se estou
sozinho.
“Está na hora de você saber a verdade e conhecer a outra parte da
sua família. Tem um carro te esperando do outro lado da rua, entre e venha
até seus irmãos, estamos aguardando ansiosamente.”
— Irmãos? Eu não tenho irmãos — respondo com desconfiança. —
Você deve estar se confundindo…
“Você sabe quem matou sua família?”. Seu questionamento me faz
congelar. “Eles não te falaram nada? O incêndio foi criminoso, mas é claro
que iriam esconder isso de você, já que foram eles quem mandaram matar
sua mãe, sua tia e seu tio, depois encobriram tudo como um simples
acidente.”
Não, ele não pode estar falando a verdade. Alícia e Gabriel não
mentiriam assim para mim, não, eles não fariam isso.
Quando penso em acabar com essa ligação e contar para Alícia, vejo
as notificações de mensagem em meu aparelho e sou bombardeado com
fotos do incêndio, dos corpos da minha mãe e da minha tia, as anotações do
legista me deixam confuso, mas uma em especial chama minha atenção e é
a que aponta os locais de onde ele retirou projéteis.
“Eles foram mortos a tiros muito antes das casas pegarem fogo, seu
tio e sua tia foram encontrados na frente da casa, porque eles tentaram
fugir, mas não conseguiram, os homens da Família de Angelis
assassinaram cada membro da sua família, Hermano.”
Não, é mentira! Tem que ser mentira, eles não fariam isso. Gabriel
estava comigo naquele dia, ele… ele me abraçou, foi ele quem me segurou
e me confortou depois que… Não pode ser verdade, ninguém seria frio o
suficiente para cometer um crime assim e depois agir como se fosse um
acidente.
“Venha até nós e explicaremos tudo, Hermano, eu te darei as
respostas que eles estão escondendo, as provas de tudo o que estou falando,
venha conhecer a sua família, nós estamos esperando há muito tempo por
este momento.”
Família? Que diabos ele está falando?
“Você é um Vasquez, Hermano, e não está sozinho. Venha até nós e
eu explicarei tudo, prometo que estará seguro e se quiser voltar para eles
depois, te deixarei livre para escolher.”
Então eu faço a coisa mais idiota que poderia fazer e sigo as
instruções de um estranho, puta que pariu, eu sei que estou fazendo merda,
mas não consigo parar de pensar nas fotos da autópsia, porque se eles
esconderam os fatos sobre a morte da minha família, o que mais Alícia e
Gabriel esconderam de mim?
Será que foi tudo realmente uma grande mentira? Mas por quê? Eu
não sou ninguém!
Sou levado até o outro lado da cidade, uma parte sombria e
abandonada que nunca vi antes, os dois homens que estão no banco da
frente não falam uma palavra durante o tempo que andamos, eles só
pediram meu celular e o desligaram.
Fico cada vez mais nervoso, eu não deveria ter vindo, mas preciso
saber o que aconteceu com minha família, e se Gabriel e Alícia sabiam
sobre isso e não me falaram, eles estavam mentindo para mim. Será que
tudo foi parte dessa grande mentira? Todos os nossos momentos? Não, é
impossível!
Depois de um tempo o carro chega em frente a um portão muito alto
com guardas armados dos dois lados. Parece a mansão dos de Angelis, mas
é mais sombria e escura. Assim que entramos seguimos direto para a casa,
que parece muito grande. O dia está no fim e quanto mais o sol se esconde
no horizonte, mais o medo se instaura dentro de mim e aquela sensação de
ter feito merda se espalha.
— Seja bem-vindo a sua casa, Hermano. — Um homem muito alto
vestindo um terno todo preto muito chique, sapatos brilhantes e com um
sorriso tenebroso no rosto é quem me recebe. Reconheço sua voz do
telefone, foi ele quem me ligou. — Sou Leandro Vasquez, seu irmão mais
velho.
Leandro percebe que não tenho palavras e solta uma gargalhada que
me faz congelar, droga, a forma com que ele me olha me parece familiar,
assim como o medo que sinto em sua presença. Ele tem os olhos escuros e o
cabelo comprido muito preto com algumas mechas brancas, mas o rosto
quadrado e a forma como seu sorriso não chega aos olhos me deixa
desconfortável.
Um dos homens que estava no carro coloca as mãos nas minhas
costas, assustando-me, então ele faz sinal para andar. Faço o que manda e
sigo logo atrás de Leandro, que caminha calmamente pelo enorme salão
principal até chegarmos em uma porta dupla de madeira. Antes de abrir ele
se vira e me encara com o mesmo sorriso de antes.
— Conheça sua família, Hermano, estamos todos aqui por você —
Leandro fala e abre a porta, dentro do que parece um escritório estão vários
homens e mulheres, todos parecem ser mais velhos que eu e olham
diretamente em minha direção. — Chace King, esta é a sua família.
— Olá, Hermano — uma voz feminina cumprimenta e é seguida por
outras, até que todos falam alguma coisa e eu já não consigo mais decifrar
as palavras quando tudo se transforma em um coral de vozes
desconhecidas.
— Ele é menor do que eu imaginava — alguém comenta.
— Falou o gigantão — outra pessoa brinca e eles começam a rir e
trocar alfinetadas.
Não consigo acompanhar, são tantas pessoas diferentes, tantos rostos
e estilos.
— Chega, chega, deixem o Chace se acostumar com vocês antes de
soltarem a loucura da nossa família em cima dele — Leandro fala em uma
brincadeira, mas todos se calam assim que ele se vira para me encarar. —
Você deve estar confuso, Hermano, está pronto para a verdade?
Eu estou? Não sei, mas de qualquer forma, eu preciso descobrir.
A próxima hora é um emaranhado de informações que não fazem
sentido algum, e ao mesmo tempo parecem tão corretas. Leandro explicou
como seu pai mantinha várias famílias espalhadas pela cidade, tinha filhos
com as mulheres, mas não os assumia até que chegassem aos 25 anos.
Pelo menos esse era o plano, seus únicos filhos legítimos são do
primeiro casamento, Leandro, que é o mais velho, Leon e Luize. Depois a
mãe deles faleceu e eles tiveram mais dois irmãos com a segunda esposa,
Carlos e Emanoel.
Os outros na sala são filhos que foram registrados depois e, assim
como eu, não sabiam que faziam parte da família Vasquez até completarem
25 anos.
São 20 pessoas no total, 20 irmãos e irmãs que agora se unirão para
comandar o império do Cartel deixado por Alejandro Vasquez. Pelo que
entendi, Leandro é o cabeça e todos seguem sua liderança, o homem que
pegou meu celular é Jair Hernanes e serve como sua mão direta.
Algumas partes das informações que Leandro joga em cima de mim
parecem erradas, especialmente sobre o sequestro da Alícia quando ela era
uma criança. Ele disse que quem matou seu pai foram os irmãos dela, mas
não é a mesma coisa que ela me falou, talvez eles não saibam e a Família de
Angelis escondeu esse fato.
Outra coisa que eu não consigo aceitar é a forma com que falam sobre
Alejandro, como um homem bom e amado pela comunidade, como se ele
fosse um santo. Eu tenho poucas lembranças do meu pai, e ao ver uma foto
de Alejandro, tenho quase certeza de ser ele, porém minhas memórias não
batem com a forma com que eles falam dele, muito menos o medo nos
olhos da minha mãe quando ela me confundia com ele. Esse sentimento
ficará gravado para sempre em meu coração.
Se Alejandro é realmente meu pai, o filho da puta não é o mesmo que
estão descrevendo aqui.
Quando ele termina seu discurso falando que Don Lorenzo estava me
usando para que eles não pudessem chegar até mim e recuperar o último
dos irmãos Vasquez, eu vejo a maldade e o fingimento em seu olhar,
principalmente pela forma que Leandro fala, encenando tantos gestos com
as mãos, sorrindo demais e fingindo tristeza.
Não confio nele, mas também não sei no que acreditar. A minha única
certeza é que não deveria ter vindo até aqui.
— Mas você não precisa se preocupar com mais nada, agora que
recuperamos o último Vasquez, nossa família está completa e os de Angelis
vão pagar por todo o mal que te causaram. — Leandro passa um braço pelas
minhas costas e preciso controlar a vontade de me afastar.
— Isso é… muito confuso ainda — começo a falar sentindo todos os
olhares em mim. — Eu acho que preciso de um tempo…
— Claro, Hermano, já providenciamos acomodações para você e no
jantar podemos conversar mais. — Leandro não me dá chance de responder
quando me conduz para fora da sala e fecha a porta. — Luize tomou a
liberdade de preparar seu quarto e deixou algumas roupas para você lá,
pode tomar um banho e absorver tudo o que foi dito hoje.
— Eu queria…
— Teremos uma visita especial para jantar — Leandro me corta e
praticamente me empurra para a escada. — Você vai gostar, tenho certeza,
agora vá e se prepare para as comemorações, Hermano, estamos todos
muito felizes por você finalmente ter se juntado a nós.
— Preciso do meu celular, aquele homem pegou e…
— Depois, Hermano, faça o que estou pedindo — ele me corta
novamente e percebo o tom impaciente em sua voz. — Agora vai.
Assim que subo as escadas vejo um homem esperando com a porta
aberta, a expressão em seu rosto é de desânimo, mas ele só indica o quarto e
quando entro, fecha a porta.
O cômodo é grande e muito luxuoso, passo o olho pela cama e vejo
um terno completo estendido, e pelo tom de voz que Leandro usou antes,
tenho a certeza de que a roupa social não é opcional. Antes de tomar um
banho tento abrir as janelas, porém elas estão trancadas e têm grades do
lado de fora. Isso é uma prisão, e não um quarto.
Tomo um banho e coloco as roupas que estavam na cama, então
começo a procurar alguma coisa que possa usar como arma, gente rica nos
filmes tem aqueles abridores de cartas, não tem? Ou é só em filme de
época? Não lembro de ter visto algo assim na mansão de Angelis, talvez eu
só não tenha procurado direito.
Abro todas as portas e gavetas que encontro, mas para meu desespero,
estão vazias, não encontro uma caneta sequer nesse quarto, e é como se eles
estivessem preparados para isso. Quando vou começar a me desesperar
escuto uma batida na porta e me sento na cama assim que Leandro aparece,
com aquele sorriso que não chega aos olhos ele me avalia dos pés à cabeça.
— Papá ficaria orgulhoso, você é muito parecido com ele, sabia? Esta
noite finalmente todos os Vasquez estarão reunidos e teremos nossa
vingança.
Entendo o que ele quer dizer com vingança assim que chegamos em
um salão que parece estar todo enfeitado para uma festa muito luxuosa, as
mesmas pessoas de antes agora desfilam por aí com roupas sociais e muito
arrumadas. É como um baile de formatura, ou casamento, exceto pela
mulher pendurada no meio da sala, as mãos amarradas em correntes deixam
seu corpo pendido.
Meu coração para de bater no minuto em que reconheço os cabelos
loiros desarrumados, meus olhos passam pelas tatuagens da Alice no País
das Maravilhas, desenhos que reconheço como a palma da minha mão,
então paro assim que vejo o rosto machucado de Alícia e seu olhar encontra
o meu.
— Hey, gatinho. — Sua voz sai baixa e mais fraca do que o normal,
mas ela sorri para mim, mesmo estando com o lábio cortado e cheio de
sangue. — Não se preocupe, você vai ficar bem.
— Ali. — Solto a respiração que nem sabia estar segurando e tento
correr até ela, mas duas mãos me seguram quando estou chegando muito
próximo. A música que estava tocando para e todos os olhares fixam-se em
mim. — Me perdoa, eu não queria…
— Um Vasquez não pede perdão, Hermano — Leandro intervém e
caminha lentamente até Alícia. — Especialmente a uma de Angelis. — Ele
cospe na cara dela com desgosto e tento lutar para me libertar, mas eles são
mais fortes que eu e seguram meus braços com mais força.
— NÃO ENCOSTA NELA, DROGA — grito com desespero. — Ali,
me perdoa, por favor, eu não queria…
— Vai ficar tudo bem, amor — ela responde com calma, mas encara
Leandro como se pudesse matá-lo só com o olhar.
— Amor? — Leandro parece surpreso ao olhar entre Alícia e eu. —
Você só pode estar de brincadeira comigo. — Ele solta uma gargalhada que
chama a atenção de todos. — Hermanos, nosso menino só me deixa mais
orgulhoso a cada segundo, escutem essa, Chace estava fodendo a
princesinha de Angelis, bem debaixo do nariz do executor.
— Cala a boca, desgraçado. — Tento me soltar.
Gritos entusiasmados ressoam pela sala, mas eu não estou ouvindo,
não dou a mínima para o que eles entenderam dessa merda, só consigo
olhar para Alícia e meu peito dói com a culpa. Eu a coloquei em perigo, ela
está aqui por mim, sua pele tão linda e macia está machucada por minha
culpa, ela jamais vai me perdoar, droga, Gabriel vai me matar, eles… Eu
jamais vou me perdoar.
— Muito bem, muito bem, agora eu acho que preciso te contar só
mais um detalhe — Leandro volta a falar com aquele tom falso de
brincadeira. — Alícia de Angelis é minha meia-irmã.
O quê? Como assim?
— Isso é mentira, eu não sou nada sua — Alícia contradiz com raiva.
— Chace, não acredite em nada que esse desgraçado está falando, ele só
quer confundi-lo.
— Não pode ser, ela… eu… — questiono confuso, sem conseguir
traduzir em palavras o que minha mente está pensando agora.
— São irmãos? — Leandro pergunta fingindo espanto, então volta a
rir, assim como as outras pessoas. — Desculpa, pessoal, não posso deixar
ele desesperado assim. Não Hermano, infelizmente essa veio por parte da
minha mãe, aquela vagabunda que abandonou seus filhos para fugir com
um italiano.
— O QUE DIABOS VOCÊ ESTÁ FALANDO, FILHO DA PUTA?
— Alícia grita com raiva para Leandro, que não lhe dá atenção, só continua
rindo e debochando dela até que a porta da frente é aberta.
— Chegamos tarde para a festa? — Um homem loiro, muito magro e
com tatuagens no rosto e nas mãos encara Alícia com diversão quando
cumprimenta Leandro. Ele está com um sobretudo escuro e anda pelo lugar
como se mandasse ali, o riso prepotente em seu rosto me faz congelar.
— Zion, chegou bem na hora, estávamos prontos para começar com a
atração principal — Leandro responde. — Eles virão por ela.
— Estou contando com isso. — Zion aceita um copo com bebida e
assisto a tudo isso tentando lutar contra os homens que me seguram. — Eu
falei que você teria seu irmão de volta. — O russo ergue o copo em minha
direção. — Minha parte no acordo foi cumprida, agora faça a sua.
— Eles virão, e aqueles malditos italianos nem desconfiam da nossa
aliança, virão com tudo o que têm achando que podem nos derrubar
sozinhos. — Leandro anda até Alícia e segura o queixo dela com força,
forçando seu rosto para cima, mas ela não se dá por vencida e o encara com
firmeza no olhar. — Não vejo a hora de acabar com você e terminar a
vingança que meu pai começou.
— Faça o melhor que conseguir, quando minha Família chegar, vocês
estarão com os dias contados — Alícia ameaça e todos riem, como se fosse
brincadeira, mas ela se mantém firme.
— Então, Hermano, vai parar de lutar contra sua família e se unir a
nós? — Leandro pergunta com um olhar contrariado a mim. — Ou terei que
te trancar no quarto até que mude de ideia?
— Eu não sou um de vocês! — Enfrento-o, reunindo toda a coragem
que consigo. — Me perdoa, Ali — consigo falar enquanto os homens que
estavam me segurando me arrastam de volta para o quarto.
CAPÍTULO 38

Gabriel
 
Nós somos mais fortes que o Cartel, temos mais soldados, mais
armas, somos mais organizados e poderíamos terminar com isso
rapidamente, mas eles têm Alícia e Chace, qualquer movimento precipitado
será recebido com retaliação.
Don Lorenzo sabe os riscos que corremos, é por esse mesmo motivo
que Andrei entrou primeiro na mansão, seus homens infiltrados
conseguiram abrir caminho para que sua equipe entrasse sem ser vista, lá de
dentro Andrei teve acesso à sala de monitoramento e conseguiu desligar os
alarmes.
O tempo que esperamos pelo seu sinal — do lado de fora dos portões
— foi uma tortura, até que ele finalmente ligou os comunicadores.
“Eles estão no salão principal, parece que fizeram uma festa para
receber vocês”. Andrei fala pelo ponto de comunicação. “Alícia está
amarrada no centro da sala, cercada pelos Vasquez, todos estão armados,
Zion também está aqui com um grupo de soldados, tenho dois infiltrados
entre eles.”
— Algum ponto cego? — Matteo pergunta.
“Poucos, vocês terão que entrar pela frente, assim concentrarão
todos os esforços em um lugar e mandarei meus homens pelos fundos”.
Andrei coordena a operação. “Chace está em um quarto no segundo piso,
eu consigo chegar até ele, mas preciso de uma distração que atraia os
soldados.”
Chace! Seu nome faz todo o meu corpo estremecer, quero perguntar
como ele está, se parece machucado ou assustado, mas preciso me manter
calado e focado na missão.
— Vamos entregar o que eles querem e derrubar os portões, se estão
nos esperando vão nos deixar entrar. Um combate rápido vai servir para que
usem Alícia como moeda de troca ou pelo menos saiam de dentro da
mansão, assim que estivermos em negociação, você age por dentro e
elimina o máximo de soldados que conseguir — Don Lorenzo ordena. —
Será um banho de sangue, e não quero um filho da puta vivo no final desse
dia.
A última parte é uma certeza, assim que esse dia acabar, terei enviado
o maior número possível de almas para o inferno.
“É disso que estou falando”. Andrei responde animado. “Eles têm
soldados escondidos do lado de fora dos portões, fiquem atentos, são
homens da Bratva e vão tentar cercá-los na entrada”.
— Estou contando com isso, quando pensarem que nos pegaram de
surpresa vão baixar a guarda — Matteo complementa animado, já sentindo
a adrenalina em antecipação. — Caralho, vamos logo com isso.
Estamos em cinco carros blindados e seguimos a toda velocidade para
o portão, o primeiro jipe consegue derrubar as grades sem muito esforço e
somos recebidos com uma rajada de tiros.
Logo os soldados que ficaram para trás eliminam os do portão e nos
seguem até a entrada da mansão Vasquez.
Eu não consigo sentir nada, desligo tudo ao meu redor e me concentro
neles, meu único objetivo é tirá-los de lá a salvo. Não vejo a movimentação,
nem escuto os tiros disparados pelos nossos soldados quando entramos, os
coletes à prova de balas não servem para muita coisa, mas são uma proteção
a mais.
Assim que estamos com metade dos nossos homens na porta da
mansão os soldados da Bratva que estavam escondidos nos cercam por trás,
como havíamos antecipado. Leandro Vasques e seus irmãos e irmãs
aparecem na porta da mansão, com Zion ao seu lado exibindo um sorriso
largo no rosto.
Ele pensa que tudo está sobre o seu controle.
— Don Lorenzo de Angelis, que honra recebê-lo em nossa humilde
residência — Leandro faz seu teatrinho falando diretamente com Lorenzo,
que está na linha de frente. Droga, ele é um alvo fácil, mas isso atrai a
atenção deles para ele e Matteo ao seu lado. — Nossa irmãzinha está
ansiosa para uma reunião familiar.
— Corta essa merda, Vasquez — Lorenzo responde com autoridade.
— O que você quer em troca dela?
Leandro e seus irmãos começam a rir muito alto, como se o que o
Don falou fosse uma piada, eles claramente pensam que têm tudo sob o seu
controle.
— Acha que iremos negociar alguma coisa hoje? — Leandro
responde e faz um sinal com a mão, logo seus homens estão nos cercando
em todos os lados. — Por que eu negociaria com um homem morto?
Lorenzo e Matteo fingem surpresa e nossos homens se apressam em
cercá-los.
— Tenho um acordo com Mikhail Petrov, você não pode agir contra
nós, Zion — Don Lorenzo se dirige ao russo, que solta uma gargalhada alta
e faz sinal para seus homens entrarem em ação.
— O Petrov não responde mais por esta organização — Zion adverte
com o olhar firme em Lorenzo. — Deveria ter acabado com aqueles
covardes há muito tempo, mas a hora deles ainda vai chegar, não se
preocupe com isso, logo todos vocês se encontrarão no inferno.
Mantenho-me atento ao ponto de comunicação e escuto a
movimentação de Andrei e seus homens dentro da mansão, ele está à
procura do quarto em que eles mantêm Chace. Sons de luta e corpos se
chocando são a única coisa que escuto, até que tudo fica em silêncio e meu
coração para por um segundo.
“Tenho Chace a salvo, estamos seguindo para o salão principal, se
preparem para agir assim que ouvirem os tiros”. Andrei comunica e respiro
fundo pela primeira vez desde que entramos aqui. Chace está a salvo, agora
vou buscar minha mulher.
— Exatamente, mas vamos voltar à pergunta que você me fez antes:
por que negociar com um homem morto? — Don Lorenzo responde e seu
meio sorriso é meu sinal.
A batalha real começa agora, ergo minha arma e sou seguido pelos
nossos homens.
O primeiro a ser abatido é o líder do Cartel, Leandro Vasquez, com o
melhor tiro da minha vida, bem no meio dos olhos do desgraçado e quando
seu corpo cai, todo o inferno está a solta. Os homens de Andrei entram em
jogo e abatem os que estavam nos cercando por trás, nossos homens fazem
o mesmo e vejo Zion arregalar os olhos ao perceber que seu plano não
funcionou, então ele corre para dentro da mansão.
— Protejam o Don — ordeno e os soldados se jogam na frente da
Família de Angelis, assumindo a linha de frente na troca de tiros. — Não
quero um maldito Vasquez vivo quando essa merda acabar.
O restante dos Vasquez tenta correr ao perceber que estamos em
maior número e que seu líder caiu, mas assim que entram na mansão são
recebidos por Andrei e seus homens. O russo é bom com uma arma e
consegue abrir caminho para que nós entremos, sigo atirando e eliminando
mais homens do Cartel.
Meus soldados me dão cobertura enquanto corro diretamente até o
maior salão, porra, eu preciso chegar até ela, eu preciso tirá-la daqui. Vejo a
corrente pendurada na viga de concreto e bem no fim Alícia está presa pelos
pulsos.
— Bunny, eu sabia que você viria me salvar — Alícia fala assim que
me aproximo, sua voz sai fraca e cansada, vejo as marcas nela e meu ódio
só aumenta enquanto seguro seu corpo, aliviando a pressão em seus braços.
Um soldado aparece com um alicate e corta as correntes que prendem os
pulsos dela.
— Estou aqui agora, amor — Afirmo e a seguro protetoramente
contra meu peito, como fiz anos atrás. — Você está a salvo.
— Chace, eles o levaram para cima. — Ela me olha assustada e
aponta para as escadas.
— Ele está a salvo — aviso e ela finalmente sorri, aliviada. — Você
consegue andar?
— Sim, me dá uma arma, esses putos vão pagar por isso — ela exige
quando fica de pé, ainda que um pouco hesitante pela dor, esfrega os pulsos
e testa o movimento das mãos. Paro por um momento, mas seu olhar firme
no meu não deixa dúvidas, então entrego uma arma e munição extra para
ela. — Onde estão meus irmãos?
Alícia começa a se mover e atirar contra os homens do Cartel, ela
acerta um que estava disparando na direção de Matteo, dou cobertura e vejo
uma mulher atirando contra nossos homens, de onde estou consigo acertá-la
no braço e depois Alícia finaliza com um tiro certeiro na cabeça.
— Boa, amor — elogio orgulhoso e ela sorri de canto enquanto
procura a próxima vítima, essa diabinha tem uma mira incrível.
O lugar ainda está cheio, mas depois que Leandro caiu, seus irmãos
recuaram. Vejo alguns corpos pelo chão, a maioria de pessoas
desconhecidas, outros de rostos familiares que apertam meu peito, mas não
temos tempo para isso agora.
— Andrei, onde está o Chace? — questiono pelo ponto de
comunicação.
“A salvo, meu soldado está com ele, preciso encontrar Zion”. Ele
responde e faz uma varredura pela sala.
— ALÍCIA. — A voz firme de Don Lorenzo nos faz olhar para a
porta. — CUIDADO.
E como um borrão vejo Zion nos fundos do salão, a arma apontada
diretamente em nossa direção. Não tenho tempo para pensar, nem consigo
entender o que acontece a seguir. Assim que escuto o tiro procuro Alícia
para protegê-la, mas ela é mais rápida.
Andrei se joga em cima de Zion e o impede de atirar novamente, mas
a merda já está feita. Vejo tudo em câmera lenta: em um momento estou me
preparando para me jogar na frente dela, e no outro Alícia corre para a
frente e se coloca na linha de tiro.
O projétil a acerta e ela arregala os olhos ao sentir a dor enquanto seu
corpo, já cheio de machucados, cai com um baque no chão de mármore e
uma poça de sangue começa a se formar embaixo dela.
Porra, Alícia levou um tiro por mim.
— ALÍCIA, NÃO! — Chego até ela em um instante e a seguro em
meus braços, logo seus irmãos estão do meu lado, gritando desesperados.
— Amor, aguenta firme, continua comigo, por favor, porra.
— Bunny… — ela chama com a voz fraca, seus olhos enchem de
lágrimas conforme o rosto vai perdendo a cor. — Cuida dele, cuida do
nosso garoto.
Não, não, não, não…
— Porra, por que você entrou na frente? — esbravejo.
— Eu disse… que sempre… vou te proteger…
— Matteo, ligue para Sophia, prepare a emergência — Lorenzo
ordena, mas Matteo está paralisado com a visão da irmã em meus braços, o
olhar vidrado no sangue que sai do ferimento. — AGORA, PORRA,
VAMOS.
Ele levanta e pega o celular, mas eu só consigo ver a mancha de
sangue na barriga de Alícia, sua camiseta rosa agora está ensopada com o
líquido pegajoso vermelho que não para de sair.
— ACORDA, GABRIEL. — Sinto a força da mão de Lorenzo atingir
meu rosto e isso me faz sair do torpor desesperador em que me encontro. —
Precisamos levá-la para o hospital.
Levanto-me rapidamente com Alícia em meus braços e saio correndo
até o carro que nos espera do lado de fora, Lorenzo entra comigo e ordena
que Matteo fique para acabar com os últimos homens do Cartel.
Olho para frente e vejo Chace correndo em nossa direção. Seu olhar
desesperado encontra o meu e paro Lorenzo quando ele vai fechar a porta,
um segundo depois Chace está dentro do carro e o motorista segue
rapidamente para o hospital.
— Alícia, ela… — ele começa a perguntar, mas logo seus olhos
recaem sobre o sangue na camiseta de Alícia e sinto seu desespero saindo
com as lágrimas que escorrem pelo seu rosto. — É minha culpa, Gabriel,
me perdoa eu…
— Cala a boca, filho da puta, já não fez merda o suficiente por um
dia? — Lorenzo esbraveja com Chace, o olhar injetado de fúria e a
adrenalina ainda fluindo. Ele precisa descontar em alguém, mas não vou
deixar que fale assim com o meu garoto.
— Lorenzo — a voz fraca de Alícia faz todos prenderem a respiração
—, não fala assim… com o meu gatinho — ela repreende o irmão, lutando
para ficar acordada. Seus olhos verdes piscam e vejo a força que ela faz
para mantê-los abertos.
— Ali, fica calada uma vez na vida, nós já estamos chegando ao
hospital, vai ficar tudo bem. — Lorenzo segura sua mão e acaricia seu
rosto, vejo os olhos dele se encherem de lágrimas e sua voz embaralhar com
a dor. — Eu vou cuidar de você, irmã.
— Eu sei, você sempre… cuidou. — Ela respira com dificuldade
antes de perder a consciência e fechar os olhos.
Meu coração para de bater quando sinto seu corpo amolecer em meus
braços.
— PORRA, NÃO, Alícia, por favor não. — Faço pressão no
ferimento, tentando conter ao máximo o sangramento até que chegamos ao
hospital. Sophia deixou a equipe preparada para nós e assim que o carro
para os enfermeiros tiram Alícia dos meus braços e a levam para dentro.
Somos barrados ao tentar segui-la e Lorenzo quase atira em um dos
seguranças, mas consegue se conter a tempo. Um enfermeiro nos indica
uma sala de espera na ala particular e é assim que as piores horas da minha
vida começam.
Sophia chega logo depois e nos avisa que irá se juntar à equipe
médica e nos manterá atualizados, mas eu não consigo pensar em nada, é
como se respirar doesse sem ela aqui, cada segundo que passa me deixa
mais angustiado.
Meu olhar encontra o de Chace e sinto sua dor, porra ele está tão
aflito quanto eu. Por isso vou até o garoto, que está sentado no sofá
esfregando as mãos no cabelo em um choro convulsivo.
— Gabriel, eu não queria isso — Chace começa a se justificar entre
soluços. — Ele me mandou fotos da minha mãe, disse que elas foram
assassinadas e que vocês estavam escondendo de mim, porque foram vocês
que mataram minha família — ele explica em uma respiração só. — Eu…
Eu fiquei confuso, não sabia o que pensar, me perdoa Gabriel.
— Hey, vem cá. — Envolvo seu corpo em meus braços e deixo que
chore contra o meu peito. — Deveríamos ter te contado.
— Você sabia que elas foram assassinadas? — Ele se afasta para
poder me olhar e vejo a mágoa e a dor na sua expressão. — Por que
esconderam isso de mim?
— Desculpa, nós não tínhamos um culpado ainda e não queríamos te
preocupar — murmuro e acaricio seu rosto. — Íamos contar quando tudo
estivesse resolvido.
Ele para por um momento, as lágrimas ainda escorrendo
descontroladamente pelo seu rosto, mas então Chace envolve meu pescoço
e me abraça.
— Eu entendo, mas posso lidar com essas merdas — sussurra. —
Achei… achei que vocês estavam só me usando.
— E por isso resolveu se entregar para o Cartel? — Lorenzo
intervém, o tom acusatório e firme me faz ferver de ódio. — É sua culpa
que Alícia está entre a vida e a morte agora, e eu juro que se minha irmã
não sobreviver, você será o próximo a ir para o inferno.
— Chega. — Viro-me para encontrar meu amigo, meu Don, e o
enfrento. — Se pensar em fazer algo contra o meu garoto, terá que passar
por cima do meu cadáver primeiro.
— Porra, Gabriel, então é assim? Ele é mais importante que minha
irmã?
— Chace é tão importante quanto ela, e não pense que Alícia vai te
perdoar se algo acontecer a ele, não quando souber que manteve segredos
dela a vida toda — aponto sua falha e ele me encara magoado, mas Lorenzo
sabe que é verdade. E quando Alícia sair dessa, porque ela vai sair, eu sei
que vai, ele terá que enfrentá-la.
Nessa hora uma comoção chama atenção e Matteo entra na sala
segurando o braço.
— Ela está bem? — ele pergunta olhando de mim para Lorenzo. —
Cadê a nossa irmã?
— Ainda em cirurgia — Lorenzo responde e vai até o irmão. — Você
levou um tiro, precisa ser atendido.
— Eu tô bem — Matteo desconversa, fingindo força, mas o sangue
escorre do seu ombro e começa a formar um rastro no chão. — Foi de
raspão.
— Para de ser teimoso — Lorenzo chama uma enfermeira, que logo
leva Matteo para ser atendido.
Os minutos se transformam em horas e ainda não temos uma resposta.
Matteo só precisou de alguns pontos e não quis ficar no quarto, então está
sentado na sala de espera com Lorenzo ao seu lado. A cada momento um
deles atende o celular e sai da sala, mas ninguém fala nada. Três horas
depois Sophia passa pelas portas, o rosto cansado e triste faz meu coração
parar e Chace segura minha mão enquanto aguardamos ela falar.
— Ela foi atingida no abdômen e perdeu muito sangue. Durante a
cirurgia Alícia sofreu uma parada cardíaca, mas conseguimos trazê-la de
volta — avisa com dor. — Os médicos ainda estão contendo o sangramento,
preciso voltar lá.
— Ela vai ficar bem? — Matteo pergunta, quase implorando por um
pouco de esperança. — Amor…
— Vamos fazer o que pudermos para salvá-la, agora preciso voltar. —
Ela tenta dar um sorriso para o marido, mas a situação é grave.
Doze horas de cirurgia…
Chace já não tinha mais lágrimas para derramar.
Lorenzo ameaçou a metade do hospital e a outra metade fugia do
nosso grupo.
Matteo esbravejou pelos corredores e se manteve ocupado tentando
resolver as merdas decorrentes da invasão, nós matamos muita gente, o
Cartel se desfez e os sobreviventes fugiram. Andrei ficou com Zion e o
levou para receber a justiça da Bratva.
O momento em que Sophia saiu pela última vez com um sorriso
cansado no rosto foi quando senti a primeira lágrima escorrer pelo meu
rosto, mas só quando ela falou que Alícia ficaria bem é que meu coração
voltou a bater, porra, sem ela não existe vida em meu peito.
Chace se jogou em meus braços, aliviado por saber que ela vai sair
dessa. Mesmo que Sophia tenha dito que Alícia ainda não está fora de
perigo e que vai passar um tempo na UTI enquanto seu corpo se recupera,
ainda assim sentimos o alívio.
— Ela não pode receber visitar na UTI — Sophia explica quando
Lorenzo pede para ver a irmã. — Eu acho que vocês podem ir para casa e
descansar um pouco, amanhã já posso liberar a entrada, porém ela ainda
ficará sedada por um tempo.
Lorenzo tenta insistir para ver a irmã, mas não adianta e Sophia é
firme em sua posição, portanto Matteo e Lorenzo voltam para a mansão.
Com um último olhar de repreensão para Chace e eu, o Don indica que
ainda temos assuntos a serem resolvidos, mas que nos dará um tempo.
 
CAPÍTULO 39

Alícia
 
Todo o meu corpo dói e minha cabeça parece que vai explodir. As
lembranças de tudo o que aconteceu voltam como uma explosão na minha
mente.
Onde eles estão?
Chace está bem?
Gabriel? Onde eles estão?
Escuto o bip das máquinas e a primeira coisa que vejo ao abrir os
olhos é o teto cinza, devo estar no hospital, droga. Há quanto tempo estou
aqui?
— Alícia. — Uma voz feminina conhecida chama minha atenção e
lentamente viro a cabeça para encontrar minha cunhada em um jaleco
branco. — Seja bem-vinda de volta, cunhadinha. — Ela sorri e quero sorrir
também, mas não consigo.
Tento falar, chamar por eles, mas minha garganta está seca e a voz
não sai.
— Você nos deu um bom susto, não tente falar agora. — Sophia
segura minha mão com carinho.
— Ga… Gab… — tento falar novamente, mas minha voz falha e
quero socar alguma coisa, caralho, por que eu não consigo falar?
— Gabriel está aqui, ele não saiu do seu lado nessas duas semanas —
Sophia conta e seus olhos enchem de lágrimas. — Nenhum deles saiu.
Lorenzo, Matteo, Chace, estão todos aqui esperando por você.
Duas semanas? Eu fiquei desacordada por todo este tempo?
Sinto meus olhos arderem e não contenho as lágrimas, eles estão bem,
todos eles. Meu peito aperta com a emoção e sinto uma pontada de dor na
barriga quando começo a chorar. Sophia percebe e pede para eu me
acalmar, porque meu corpo passou por uma cirurgia complicada.
Eu tento, mas não consigo parar de chorar, eu quero falar com eles,
preciso ver seus rostos, sentir o toque reconfortante dos meus amores.
— Ali, você não pode se agitar assim — Sophia tenta novamente me
acalmar, mas não funciona e começo a lutar contra os tubos e aparelhos, até
que vejo ela colocar algo em meu soro e logo depois meu corpo relaxa,
então perco a consciência e volto para os braços da escuridão.
 
***
2 dias depois
 
— Estou bem, Sophia — reclamo quando minha cunhada entra no
quarto, desde que acordei pela primeira vez ela não saiu do meu lado, mas
como fiquei muito agitada, Sophia achou melhor me deixar descansar mais
um tempo. — Por favor, eu quero ver eles, prometo ficar calma.
— Se você se alterar de novo, eu juro que seguro todo mundo lá fora
por mais uma semana — ela responde séria, mas vejo um resquício de
sorriso em seu rosto.
— Eu prometo, por favor — imploro, minha voz está mais fraca e
baixa que o normal, mas pelo menos consigo falar.
— Certo, quem você quer que eu chame primeiro?
— Gabriel e Chace — respondo de uma vez, já sentindo a ansiedade
aflorar com a perspectiva de vê-los novamente, e preciso respirar fundo
para minha cunhada não perceber.
— Só é permitida uma pessoa por vez, Ali, você vai ter que escolher.
— Não me passa despercebida a brincadeira que ela acabou de fazer, ainda
mais quando ela ri logo depois. — Só enquanto estiver na UTI, semana que
vem você vai para o quarto e eles podem ficar com você.
— Posso ver um de cada vez, mas os dois hoje? — pergunto
moldando suas regras para conseguir o que eu quero. — Eu juro que é
rapidinho.
— Você é mimada demais, cunhadinha — Sophia sorri, mas acena
com a cabeça concordando. — Meia hora cada um, e nada de grandes
emoções, eu vou estar do lado de fora e se perceber alguma alteração nos
seus monitores, mando quem estiver aqui embora e só vai voltar na próxima
semana.
— Eu prometo me controlar. — Ergo a mão e mostro o dedinho, que
ela engancha no dela selando a promessa, só então Sophia sai.
Eu achei que estava pronta, mas ver o meu gatinho tentando controlar
as lágrimas me quebra por dentro, Chace se aproxima da cama com o olhar
acuado e os ombros caídos.
— Gatinho, vem cá. — Levanto a mão chamando por ele, que leva
um tempo até criar coragem. — Você está bem? Me perdoa por não ter te
falado sobre sua família, não deveríamos ter escondido o que sabíamos de
você.
— Ali. — Chace solta uma respiração longa e pega minha mão, seu
toque me acalma, mesmo que ele esteja tremendo e se esforçando ao
máximo para não chorar. — Eu que preciso pedir perdão, você está aqui por
minha culpa, se eu não tivesse…
— Não — interrompo com a voz firme. — Não quero ouvir nada
disso, se tivéssemos aberto o jogo contigo você não teria entrado naquele
carro.
— Desculpa. — Uma lágrima escorre pelo seu rosto e quero me
levantar e secar, mas Sophia está do outro lado da porta de vidro e o olhar
atento me segura na cama, então só aperto a mão de Chace e me controlo.
— Você está bem? Tem alguma coisa que posso fazer? Sophia disse que
não podemos trazer nada aqui, mas quando você for para o quarto particular
podemos levar algumas coisas de casa.
— Vou ficar bem, não se preocupe. — Sorrio para tranquilizá-lo,
então pergunto sobre os últimos dias e Chace vai se acalmando enquanto
fala. Claro que Sophia me manteve atualizada desde que eu acordei, porque
não a deixei em paz até descobrir o que havia acontecido depois que levei o
tiro.
— Chace, querido, você precisa ir agora — Sophia avisa e faz sinal
para o relógio.
— Eu te amo. — Ele se aproxima e me beija delicadamente nos
lábios, sua testa encosta na minha e posso sentir a respiração pesada do meu
gatinho, seu cheiro e o calor da sua pele me confortam e fazem meu coração
acelerar. Antes de se afastar ele acaricia meu rosto e força um sorriso.
— Também te amo, gatinho — respondo e aperto sua mão. — Chama
o Gabriel pra mim?
— Ele está ansioso para te ver — Chace responde antes de sair.
Não tenho tempo para respirar até que Gabriel entra no quarto, os
olhos azuis brilhantes encontram os meus e sei que ele estava chorando. Em
dois passos meu homem segura minha mão e me beija com a mesma
saudade que sinto dele, sua boca roça carinhosamente na minha até que ele
se afasta e encosta a testa na minha.
— Bunny… — Solto a respiração e sinto meus olhos arderem
novamente.
— Porra, Alícia, por que você entrou na frente? — repreende com dor
na voz e se afasta para me olhar. — Aquele tiro era meu.
— Teu é um caralho, ninguém machuca meu homem — respondo e
sorrio. — Eu estou bem, amor, foi só um tiro.
— Nunca mais faça isso comigo, entendeu? — Sua voz treme de
emoção e eu entendo sua dor, porque se fosse o contrário eu estaria dizendo
a mesma coisa. — Não posso viver sem você.
Droga, eu prometi que iria me segurar, mas não consigo mais
controlar as lágrimas e deixo que saiam enquanto meu amor me abraça
carinhosamente, cuidando para não me apertar.
— Tenho tantas perguntas — digo controlando a ansiedade. —
Leandro Vasquez disse que Chace é irmão dele.
— Infelizmente sim, Chace aceitou fazer um exame de DNA e
comparar o resultado com o de Leandro, eles são irmãos.
— Então… Eu sou o motivo pelo qual Chace cresceu sem o pai —
comento algo que vem me incomodando.
— Não, amor, não vá por esse lado — Gabriel adverte. — Alejandro
era um monstro que mantinha várias mulheres praticamente como
prisioneiras, ele abusava delas até que geravam um filho, você sabe a
história dos irmãos Vasquez. Chace só seria mais um entre eles.
— E como ele está realmente com tudo isso? Ele pareceu abatido,
Bunny.
— O garoto vai ficar bem, estamos preocupados com você. — Gabriel
beija meu rosto. — Lorenzo quer falar com você — comenta depois de um
tempo e preciso respirar fundo para continuar esta conversa.
— É verdade, então?
— Sim.
— Você sabia?
— Não — responde com a mandíbula cerrada e vejo a mágoa em seu
olhar. — Eles me contaram quando descobrimos que você estava nas mãos
do Cartel.
— Eu não entendo, de verdade. Por que mentir para mim a vida toda?
— pergunto magoada. — Quem era ela? O que aconteceu? Por que
esconder minha história?
— É melhor você deixar que seus irmãos te expliquem.
— Eu não quero falar com eles, quero que você me conte — exijo,
porque não estou pronta para enfrentar meus irmãos em uma cama de
hospital, e também porque estou magoada demais com eles. — Eu tenho o
direito de saber.
— Tudo bem, mas primeiro quero a sua palavra de que vai conversar
com os teus irmãos depois. — Seu olhar severo me faz engolir a reclamação
e concordar, só depois disso Gabriel conta sobre minha mãe biológica e
como meu pai se envolveu com ela.
Eu realmente não sei como reagir a essa quantidade de informações,
mas deixo Gabriel falar tudo o que ele sabe. Sei que ele também está puto
por terem escondido isso de nós, porra, eu tô a ponto de explodir.
É uma parte da minha vida, da minha história, que simplesmente não
me contaram.
— Como você está? — ele questiona preocupado quando fico um
tempo sem falar nada.
— É estranho, parece que acabei de conhecer uma Alícia diferente,
uma que não reconheço — confesso, confusa. — Preciso de tempo para
pensar.
— Tire o tempo que precisar. — Ele beija minha testa novamente,
então Sophia bate na porta avisando que o tempo acabou e eu a odeio agora,
porque ao mesmo tempo que sei que preciso ficar sozinha e absorver tudo
isso, dói me despedir dele. — Vou estar ali no fim do corredor — sussurra
em meu ouvido como se pudesse ler meus pensamentos.
— Eu te amo, Bunny — murmuro quando ele me beija antes de sair.
Depois que ele saiu, passei um bom tempo pensando em toda a minha
vida desde o sequestro, e uma frase que Alejandro disse pouco depois de
matar minha mãe, ou a mulher que eu achava ser minha mãe, martela na
minha cabeça. Ele disse: “Ela é o motivo da guerra”.
Esta frase sempre me pareceu estranha, mas nunca confiei nas minhas
lembranças, afinal eu era muito pequena quando tudo aconteceu, é difícil
confiar nestas memórias e até nos sonhos que tenho daquele dia. Mas agora,
sabendo de tudo, minha mente está agitada e confusa demais, imagino como
Chace deve estar se sentindo, afinal ele também descobriu uma parte da sua
história.
Queria estar com ele neste momento, mas sei que Gabriel não vai
deixar que nada aconteça ao meu gatinho, e espero que meus irmãos não
tentem culpá-lo, porque se eu souber que Lorenzo ou Matteo abriram a boca
para falar alguma merda sobre ele, eu juro que não vou perdoá-los.
Os dias no hospital são um saco, puta que pariu, que tédio. Não tem
nada para fazer, meu corpo dói, os remédios me deixam zonza e eu durmo
mal pra caralho. Essa merda só melhorou um pouco depois que eles tiraram
o dreno e Sophia finalmente me levou para o quarto particular.
Aqui Chace e Gabriel podem ficar comigo, estou tão aliviada por tê-
los ao meu lado, senti tanta saudade dos dois, a falta que eles fazem é
imensa. Chace trouxe meu coelho de pelúcia e uma coberta peluda rosa, o
que me ajudou demais a dormir, já que as enfermeiras proibiram qualquer
um dos dois de subir na cama comigo depois que eles tentaram, mais de
uma vez.
O pessoal da boate enviou flores e um cartão, consegui conversar com
eles um pouco em chamada de vídeo, mas logo me emocionei demais e
desliguei.
Chace e Gabriel me ajudam com tudo, até ir ao banheiro, porque
ainda dói demais para caminhar, droga de tiro bem dado. Eu não vejo a hora
de sair daqui. Aos poucos Sophia está me liberando para caminhar pelos
corredores e já sei que vou precisar de fisioterapia, mas eu quero ir para
casa, quero minha cama, com meus dois amores nela.
Lorenzo e Matteo vêm todos os dias para me ver, mas eu ainda não
estou pronta para enfrentar os dois. Coitada da minha cunhada, ela precisa
controlar Matteo e ir contra Don Lorenzo só para me deixar calma. Sophia é
um anjo, ela não saiu do meu lado na UTI e acompanha a evolução do meu
quadro de perto.
Já faz 1 mês que eliminamos o Cartel, 30 dias dentro deste hospital
infernal. Hoje Andrea trouxe os meninos, que estavam desesperados para
me ver. Gustavo até ficou mais calmo durante a visita e seus olhos
encheram de água quando entrou, mas ele não se aproximou muito e ficou
ao lado da mãe. Antônio, por outro lado, veio correndo até a cama e Sophia
o colocou sentado do meu lado.
— Tia Ali, você está bem? — Antônio pergunta com o olhar
brilhando e pega minha mão. — A mamãe e a tia Sophi não deixaram a
gente vir antes, elas disseram que não podia.
— Estou bem, querido, foi só um susto — respondo sentindo meus
olhos encherem de lágrimas. — Que saudade que eu estava de vocês, vem
cá, me dá um abraço.
Puxo o menino para os meus braços e ele relaxa no meu peito,
Antônio é um garoto muito especial e sensível, ele fala o que pensa e expõe
seus sentimentos.
— Mano, pode vir, a tia Ali está bem, olha, ela já pode até abraçar —
Antônio chama seu irmão, que também vem me abraçar. Gustavo tem um
jeito mais bruto e contido, mas sinto-o relaxar quando o aperto.
— O papai está preocupado com você, tia — Antônio comenta
daquela forma direta dele. — Sabia que ele nem dorme mais? E está com
olheiras horríveis, né, mamãe? Conta pra tia que o papai não sai do
escritório mais.
— Antônio, deixa a tia respirar um pouco. — Andrea se aproxima e
tira os filhos da minha cama com carinho, então ela pega minha mão e vejo
as lágrimas em seus olhos. — É bom te ver bem, Alícia.
Droga, preciso conter as lágrimas para não ficar emotiva e começo a
conversar com os meninos. Antônio me conta as últimas novidades, ele está
sempre atento ao que acontece, e Gabriel discorre sobre suas aulas e
treinamento. A hora passa muito rápido, mas eles prometem voltar logo.
Depois que saem me pego pensando sobre meus irmãos e como eles
sempre fizeram tudo por mim, até suas mulheres me acolheram. Andrea foi
praticamente uma mãe para mim, mesmo que eu tenha traçado uma linha
quando era mais nova e a coloquei somente como cunhada, ela cuidou de
mim depois que eles se casaram e Lorenzo assumiu os negócios.
Foi ela quem correu atrás da Alícia fujona por um bom tempo, que
me levou ao cinema, ao shopping, ao parque. Depois que Sophia se casou
com Matteo elas se uniram para acolher uma adolescente malcriada e
mimada. Lembro até hoje que foi Sophia quem falou sobre menstruação,
sexo, como me proteger. Todas essas coisas, foi ela quem me ensinou, e sei
que posso contar com elas.
— Amanhã quero ver meus irmãos — anuncio e Gabriel me olha
surpreso, mas concorda com a cabeça e Chace parece aliviado.
Lorenzo e Matteo chegam cedo e posso ver que não estão nada bem.
Além das olheiras intensas, os dois estão tão contidos e com os ombros
caídos, que nem parecem os mafiosos poderosos que são.
— Ergam a porra dessas cabeças antes de entrarem — aviso quando
eles me olham. — Não aceito falar com dois cachorrinhos com o rabo entre
as pernas, ou melhoram essas caras ou podem dar meia volta e sair daqui.
— Cala a boca, diabinha. — Matteo é o primeiro a se aproximar e me
abraçar, sinto sua respiração em meus cabelos e a forma com que seus
ombros relaxam quando correspondo ao abraço. — Me perdoa, irmã, por
favor — sussurra com tanta dor na voz que faz meu peito apertar.
— Alícia, eu… — Lorenzo começa ao falar e se aproxima do outro
lado da cama com cautela, mas ergo a mão para que se cale, porque quem
vai falar primeiro sou eu.
— Quero deixar bem claro que ainda estou magoada com vocês por
terem escondido uma parte da minha vida, que eu tinha o direito de saber —
discorro tentando controlar a mágoa, mas deixo que vejam que estou
falando sério. — Mas ainda preciso saber, por que esconder isso de mim?
— Primeiro foi porque nosso pai exigiu que não contássemos nada,
ele não queria que você crescesse com a sombra do seu passado. Depois
que eles morreram, bem, nós ficamos com medo de te contar e você não
aceitar bem — Lorenzo explica com a voz calma. — E aí o tempo foi
passando e sempre deixamos para depois.
— Sabe o que é pior? Eu entendo a preocupação comigo e em como
eu iria reagir à notícia quando eu era adolescente, porque sei que não fui
fácil de criar e dei muito trabalho a vocês. — Olho para eles e respiro fundo
antes de voltar a falar: — Mas me senti diminuída, porra, eu entrei para a
máfia, me tornei a droga da executora, eu achei que vocês me viam como
uma de vocês, que me reconheciam como uma de Angelis, que me
respeitavam.
— É claro que você é uma de nós, Alícia — Matteo corrige.
— Eu sei que foi difícil para vocês me criarem depois que nossos pais
morreram, vocês eram novos e ainda não estavam prontos para isso, e sei
que fizeram o melhor que podiam, de verdade. — Seguro a mão de Matteo
e chamo Lorenzo para que pegue minha outra mão. — Sabem que eu amo
vocês, não sabem?
— Caralho, diabinha, se me fizer chorar você vai me pagar. — Matteo
esfrega os olhos para conter as lágrimas e sorrio.
— Desculpa, Alícia, eu deveria ter te contado quando você voltou da
Inglaterra — Lorenzo fala e pega minha mão. — Te amo tanto, irmã, não
queria te ver sofrer, por favor, me perdoa.
— Eu sei, só preciso de um tempo para me acostumar com isso, vocês
entendem? — pergunto e eles confirmam. — Agora é melhor os dois se
recuperarem dessa cara de enterro, porque eu não vou morrer tão cedo.
Eles sorriem e me abraçam com cuidado, sei que ainda temos um
longo caminho pela frente, não consigo perdoar tão facilmente e eles sabem
disso, mas não vou afastá-los. Eles são minha família e ninguém é perfeito,
todo mundo erra nessa vida.
CAPÍTULO 40

Chace
 
Don Lorenzo me chamou para conversar quando Alícia estava na UTI
e achei que ele ia me matar, ou sei lá, pelo menos me bater, nem contei para
o Gabriel sobre o encontro por medo dele fazer alguma coisa.
Naquele momento eu achei que merecia a punição que o Don quisesse
me dar, porque foi por minha causa que Alícia estava no hospital, mas
contrariando todas as minhas perspectivas, Don Lorenzo me recebeu para
uma conversa mesmo.
Pela primeira vez vi o irmão mais velho da Alícia e não o Don da
Família de Angelis. Ele não me ameaçou, pelo menos não abertamente, mas
deixou claro que ficaria de olho em mim, especialmente agora que o Cartel
se dissipou. Também prometi que aceitaria aulas de luta e tiro, pelo menos
para aprender a me defender. Não é como se eu fosse entrar para a máfia,
ele sabe que não tenho estômago para isso, mas não vou sair da vida de
Alícia e Gabriel, então preciso aprender a viver no mundo deles.
Gabriel ficou no hospital o tempo todo, Sophia até tentou mandá-lo
embora, mas não teve jeito. Ele tomava banho no hotel que fica na frente do
hospital e logo voltava para a sala de espera, o homem dormiu por semanas
no sofá desconfortável, até que Ali saiu da UTI e foi para o quarto
particular, lá eles colocaram uma cama para ele.
Eu me dividi entre o hospital e a boate, sabia que Alícia não iria
querer que seu reinado desmoronasse enquanto ela estava se recuperando,
então trabalhei com Sharon e Liz para manter o local funcionando. Foram
dias intensos e difíceis, fiquei preocupado com Alícia e com Gabriel, e
ainda tive que absorver o fato de que meu pai era o líder do Cartel.
Eu sabia que era alguém que não valia nada, mas Alejandro Vasquez
conseguiu se superar nesse quesito, o maldito mantinha várias mulheres
pela cidade só para ter de quem abusar. Droga, eu tenho nojo dessa parte da
minha vida, sinto raiva por ser seu filho e alívio por Alícia ter acabado com
ele.
Depois de quase dois meses naquele hospital, Alícia finalmente está
liberada para voltar para casa, e preparamos uma pequena surpresa para ela.
Todos os funcionários da Malícia vieram para recebê-la, assim como seus
irmãos e cunhadas.
— Ela está vindo — Sharon anuncia e todos se preparam, estamos no
escuro, só esperando ela chegar.
No momento que Gabriel abre a porta e Alícia entra, ligamos as luzes
e estouramos as bombas de confete com gritos animados de boas-vindas,
mas ela não parece muito surpresa. Nem quando envolvo seu corpo em
meus braços e beijo seu rosto delicadamente Alícia sorri feliz.
— Ele te contou não foi? — pergunto, mas nem precisava, porque
Gabriel está com um sorriso culpado no rosto.
— Ela odeia surpresas, eu te falei — ele diz, como se isso explicasse
tudo.
— Para alguém que passou dois meses comendo comida de hospital,
você continua uma grande gostosa, docinho — Andrei é quem vem abraçá-
la primeiro, ele parece realmente feliz por vê-la bem. — Desculpa por isso
— ele sussurra e só escuto por estar ao lado deles.
— Só me garanta que o filho da puta sofreu e está desculpado —
Alícia responde severamente.
— Sabe que sim.
— Tira as mãos dela, russo — Gabriel avisa com a voz séria demais
para uma brincadeira.
— Relaxa, Bunny. — Alícia sai dos braços de Andrei e dá um tapinha
no peito dele. — Eu não gosto de loiros.
Depois disso seus amigos e família vêm recebê-la, todos estavam com
saudade e muito preocupados com ela. Alícia é maravilhosa e ver a
quantidade de pessoas que a admiram e amam essa mulher me faz ficar
emocionado.
— Relaxa, garoto — Gabriel parece perceber meu estado e acaricia
minhas costas carinhosamente, beijando minha testa antes de falar. — Ela
está em casa agora.
Sinto meus olhos arderem e as lágrimas escorrem sem que eu possa
segurar, eu prometi que não iria chorar. Falhei miseravelmente e não faz
nem dez minutos que ela está em casa.
Alícia amou a festa, eu sabia que ela ia gostar de ser o centro das
atenções, porque é ali que ela deve estar mesmo, recebendo atenção e
carinho das pessoas que a amam e sentiram sua falta. Foi emocionante.
Gabriel e eu tentamos dar espaço, já que nós a víamos todo dia no hospital e
o pessoal ficou esse tempo todo sem poder visitá-la, mas é quase impossível
não roubar um beijo dela de vez em quando.
Depois que todos foram embora percebi o quanto o loft parecia vazio
sem ela, sem suas risadas, sem me mandar fazer alguma coisa ou pedir com
carinho para ser mimada. Eu vim para cá todos os dias, mesmo que doesse
ficar aqui sem eles, porque Gabriel se recusou a voltar sem ela.
O homem pode ser grande, forte, fechado, um mafioso bem badboy,
mas dentro daquele peito todo definido bate um coração emocionado. Ele é
maravilhoso e foi meu suporte nesses dias, mas não aguentou vir para casa
sem ela. Assisti seu olhar perder o brilho todas as vezes que Sophia se
recusava a deixá-lo entrar, ele quase invadiu a UTI no primeiro dia, precisei
segurá-lo.
— Eu daria tudo por um banho de banheira agora — Alícia comenta
do sofá enquanto Gabriel e eu recolhemos os copos e organizamos a
bagunça em que a casa ficou.
— Não até que os cortes estejam cicatrizados, Sophia proibiu —
Gabriel responde e trocamos um olhar. — Mas a gente ainda pode te ajudar
com uma boa ducha.
— Meus dois amores vão me dar banho, é isso? — Ela se vira para
nos olhar e o sorriso safado não me passa despercebido. — Agora que estou
em casa vocês não tem mais como usar o hospital como desculpa.
— Só banho, Sophia proibiu essa parte também. — Corto seus
pensamentos e ela logo bufa, contrariada.
— Caralho, estou há dois meses sem transar, mas um pouco e volto a
ser virgem — ela reclama e solto uma gargalhada com a brincadeira. —
Você ri porque está bem comido, gatinho. Droga, eu também quero transar,
de que adianta ter dois homens gostosos na minha cama se não posso usar
nenhum de vocês?
— Acha que a gente teve cabeça para pensar em transar enquanto
você estava no hospital, diabinha? — Gabriel caminha até ela e acaricia seu
rosto com carinho, fazendo Alícia arregalar os olhos, surpresa. — Relaxa,
logo você vai estar curada e vamos foder até matar a saudade.
— Vocês não transaram nenhuma vez em dois meses? — ela
questiona, ainda assustada. — Porra, devem estar com as bolas roxas.
Seu comentário nos leva a soltar gargalhadas altas, e sim minhas
bolas estão ficando roxas, porque punheta nenhuma se compara a fazer
amor com eles. Porque gozar por gozar não é o suficiente quando já
experimentei os amores da minha vida.
Fazer amor é como comer o melhor chocolate do mundo, ter a
experiência do doce na medida certa em um paladar que não estava
acostumado a isso te faz querer mais, porque nos acostumamos com o que é
bom. Imagina com algo tão incrível e intenso quanto o amor?
Sim, eu viciei no primeiro beijo, no primeiro toque, no primeiro
orgasmo, droga, eu sou deles desde o primeiro olhar.
Amo a forma com que Gabriel consegue se manter centrado, como
ele pensa antes de agir, como é realmente a razão entre nós, mas também é
aquele que aprendeu a cozinhar, que cuida da segurança e nos deixa
tranquilos. E o que eu mais amo é que, mesmo estando sério 99% do tempo,
o sorriso dele, quando vem, é verdadeiro e tem a capacidade de iluminar o
ambiente e aquecer meu peito.
Alícia é completamente oposta a ele, uma mulher extrovertida e
mutável. Uma hora ela pode estar sorrindo de forma leve e feliz e no
segundo seguinte assume a expressão séria e intensa de quem quer matar
alguém, e ela realmente pode. Sua gargalhada solta e sincera faz meu
coração acelerar, seus abraços e demonstrações de carinho são como ela,
intensos e possessivos.
Não existe como escolher entre eles, e sou o cara mais feliz do mundo
por não precisar fazer isso, porque eu amo os dois, com todo o meu
coração. Amo cada característica que os faz serem únicos, amo como eles
se amam e como me acolhem, transformando nossa união em uma família.
Quando estamos juntos eu me sinto completo, me sinto em casa.
Porque eu acho que amor é isso: a certeza de que existe um lugar
nesse mundo tão grande que posso chamar de casa, e o meu é em qualquer
lugar em que Alícia e Gabriel estiverem, eles são meu lar.
Fim.
EPÍLOGO

Alícia
Um ano depois.
 
O que aconteceu neste ano?
Vamos lá que vou resumir.
Andrei voltou para a Rússia, mas não sem uma marca minha. Ele me
deu total liberdade para criar a arte e tatuar uma parte da sua coxa direita
que ainda estava em branco, foi uma delícia, preciso confessar. Gabriel
ficou puto e Chace riu muito do russo debochado se contorcendo de dor.
Nós tivemos um casamento, mas não tenha ideias, porque não foi o
nosso. Rick e Kevin finalmente uniram as escovas de dentes em uma linda
celebração na praia, obviamente fui madrinha, com Gabriel e Chace como
padrinhos, e foi um dia maravilhoso que levarei para sempre comigo.
Tatiana se tornou uma grande amiga e confidente, eu ainda não gosto
de chamá-la de minha psicóloga, porque não posso catalogar nossos
encontros como profissionais já que, de vez em quando, envolvem bebidas e
pizza, mas ela me ajudou demais a entender e aceitar meu passado, e
também a perdoar meus irmãos.
Foi um processo difícil e muito longo, e ainda não estou
completamente bem, porém sigo evoluindo e com certeza, muito dessa
evolução é por causa dela.
Uma das coisas que mais mudou para mim depois que descobri toda a
história sobre minha mãe biológica foi a data certa do meu aniversário, e
fiquei puta. Sempre achei que eu fosse do signo de escorpião, já que
comemorava no dia 14 de novembro, mas nunca realmente me senti
escorpiana além da parte sexual.
Agora que sei que meu aniversário é dia 14 de outubro, tudo faz
sentido, porque sou libriana, com certeza. Eu sou elegante e gosto de me
vestir bem e me sentir bonita, sou romântica — mais o menos —, uma
artista, mas o principal é que sou indecisa para um caralho, tão indecisa que
tenho dois namorados e jamais conseguiria escolher um só.
É brincadeira, mas nem tanto.
Enfim, realmente combina muito mais comigo e parece que sei quem
eu sou, até fiz todo meu mapa astral de novo. É um alívio saber mais sobre
mim mesma.
Meus irmãos fizeram uma festa na mansão para comemorar meu
aniversário, desta vez na data certa, com todo o luxo e glamour possível.
Eles sabem muito bem que eu gosto de celebrar mais um ano de vida e que
é o meu dia especial, e tenho certeza de que a festa foi muito maior que as
outras porque ainda estão com a consciência pesada.
Eles são minha família, e me amam muito, sempre cuidaram de mim
e tudo o que fizeram foi pensando em me proteger, sei disso e consigo me
colocar no lugar deles, mas mesmo assim fiquei magoada.
Por mais que eu tenha amado passar o dia sendo homenageada, estou
esperando ansiosamente pela festinha da noite que meus dois homens
prepararam para mim. Eu sei que vai ter algo especial, porque Gabriel me
contou, mas Chace o fez manter segredo sobre os detalhes, me deixando
ansiosa a semana toda.
— Agora vou pôr uma venda nos seus olhos — Chace avisa, mais
animado do que deveria, quando chegamos a porta de um dos quartos da
Malícia. — Posso?
— Seja rápido, gatinho, que se demorar mais um pouco vou entrar
nessa sala sozinha — comento e Gabriel aperta minha mão.
— Relaxa, amor, você vai gostar — ele me tranquiliza enquanto
Chace amarra o tecido nos meus olhos, meu coração acelera por um
momento, mas respiro fundo e me acalmo.
Escuto uma música baixa e identifico a letra de “Alice” da Avril
Lavigne e já posso começar a pular de alegria, porque além de ser uma das
minhas músicas favoritas, ela confirma que essa festinha vai ser a melhor do
mundo.
— Está pronta, amor? — Gabriel pergunta, sinto sua respiração muito
próxima do meu ouvido e me arrepio.
— Você não faz ideia — respondo ansiosa, então eles fazem um
suspense. A música aumenta e quando o refrão está chegando, ele tira a
venda dos meus olhos e a voz de Avril estoura no alto-falante.
I'm freaking out (estou enlouquecendo)
Where am I now? (onde eu estou agora?)
Upside down (de cabeça para baixo)
And I can't stop it now (não posso parar isso agora)
It can't stop me now (isso não pode me parar agora)
O maior quarto da Malícia foi todo decorado para parecer o cenário
do filme da Alice no País das Maravilhas, do Tim Burton. Uma mistura
maravilhosa entre preto, roxo, azul, rosa e verde faz a composição com
vários bichos de pelúcia de todos os personagens do filme e eu não consigo
conter a minha felicidade.
Sinto-me como a porra de uma criança que não consegue conter a
animação e começo a dar pulos pelo lugar, vejo os doces em uma mesa e
vários drinks, todos na mesma temática, assim como frases do livro escritas
nas paredes. A primeira chama minha atenção.
— “A única forma de chegar ao impossível e acreditar que é
possível.” — Leio em voz alta e olho para Gabriel, eu acreditei que o
Coelho Branco fosse me salvar e ele realmente foi.
— “Quando acordei hoje de manhã, eu sabia quem eu era, mas acho
que já mudei muitas vezes desde então.” — Chace lê a frase ao lado e me
envolve em seus braços, fazendo-me olhar diretamente dentro dos seus
olhos. — Você me fez descobrir quem eu era e me deu liberdade para
escolher quem eu quero ser, eu te amo tanto, Alícia.
— Own, gatinho, eu também te amo, tanto, mas tanto, que eu sei que
te sufoco às vezes, mas é por amor, eu juro. — Beijo seus lábios em
agradecimento.
— Pode me sufocar o quanto quiser, ainda mais se estiver com uma
perna de cada lado da minha cabeça — ele responde brincando e dou uma
mordida no seu lábio.
— “Entenda os seus medos, mas jamais deixe que eles sufoquem os
seus sonhos.” — Gabriel me abraça por trás e recita a frase que ele mais
gosta e que combina tanto com ele que não precisa nem de explicações. —
Te amo, diabinha, e isso aqui é para você.
Chace troca um olhar intenso com Gabriel e ambos me soltam e se
afastam, só então percebo que tem um bolo gigante do outro lado do quarto,
e quando digo gigante eu quero dizer que é maior que eu em altura. Todo
feito na temática da Alice e no topo tem uma boneca fofa da garota com o
Coelho e o Gatinho ao seu lado.
Quando volto a olhar para os dois homens, eles estão sem camisa e
tirando as calças, o olhar concentrado em mim, mas a expressão de Chace
todo envergonhado e Gabriel com um sorriso de canto me faz ter certeza de
que eles estão aprontando mais alguma coisa.
— Pronta para mais uma parte do seu presente? — Chace pergunta
enquanto abaixa a cueca e libera seu pau, que já está duro e preparado para
a ação.
— Quero deixar claro que fui obrigado a fazer isso — Gabriel
comenta, mas faz o mesmo, então ele passa o que parece ser uma tiara para
Chace e coloca outra em sua própria cabeça.
Eu só posso estar delirando.
Não é possível, meus olhos estão vendo coisa, só pode.
— Eu não lembro de ter usado alguma droga hoje e considero que
bebi muito pouco para ter sintomas de alucinação — comento ainda sem
acreditar que estou vendo Chace com uma tiara de orelhas brancas de
gatinho na cabeça. Do seu lado Gabriel está com a sua, de orelhas brancas
de coelho.
— Não é você que me chama de gatinho e ele de Bunny? — Chace
cria coragem para falar e troca um olhar com Gabriel. — E não é só isso.
Eles se viram lentamente e o que eu vejo faz meu queixo cair.
Não pode ser!
Não é possível…
Eu não acredito que meu gatinho está com um plug anal com um rabo
branco de gato e todo peludo saindo bem do meio da sua bunda.
— Essa ideia não foi minha — Gabriel reclama e vejo o rabinho
branco de coelho em sua bunda. Caralho, eles fizeram isso por mim.
— Eu não acredito nisso. — Solto o ar com um sorriso enorme no
rosto quando eles se viram para me encarar, um todo rabugento e o outro
com um sorriso encantador naquele rostinho vermelho safado. — Vocês são
realmente tudo para mim.
— E não acabou. — Chace me para quando vou me jogar nos braços
dele e aponta para o bolo. — O que tem ali é só para você, aproveite ao
máximo, amor.
— Um bolo todo para mim? — Ergo a sobrancelha, confusa.
Neste momento, o bolo se abre no meio e de dentro saem duas
mulheres maravilhosas, a primeira de cabelos vermelhos e uma lingerie
minúscula está fantasiada de Chapeleiro Maluco, com um chapéu do
personagem e uma gravata borboleta enorme.
Já a segunda claramente é a Rainha de Copas, seu cabelo é de um tom
vermelho quase cereja, ela tem o batom em formato de coração e a lingerie
toda estampada com o símbolo de copas, além, é claro, da pequena coroa
torta em sua cabeça.
Elas saem do bolo e sorriem enquanto caminham em minha direção,
caralho, elas são gostosas demais e parecem me comer com os olhos.
— Olá, garotas, um gatinho me falou que vocês são meus presentes
de aniversário. — Recebo um beijo provocante da primeira, que vou
chamar de Chapeleira, enquanto ela começa a abrir o zíper do meu vestido,
seus dedos acariciam minhas costas nuas conforme o tecido vai caindo do
meu corpo e suspiro com a sensação maravilhosa.
— Estamos aqui para fazer seu dia mais especial, Mali — A outra
mulher se aproxima com um sorriso safado naquela boquinha deliciosa e
começa a beijar meu pescoço, sua mão desce lentamente pela lateral do meu
corpo enquanto a Chapeleira tira meu vestido, deixando-me de salto alto e
lingerie.
Do canto do olho vejo Gabriel sentar-se no sofá de couro preto, seu
olhar firme em mim não deixa dúvidas de que ele está gostando do show.
Meu Bunny sempre gostou de assistir, mas essa brincadeira aqui é para
mim.
— Gatinho, vem aqui um pouco — chamo Chace que se aproxima
cautelosamente, coloco uma mão na cintura da mulher que está na minha
frente e a movo calmamente para o lado. — Sabe que está uma delícia com
esse rabo, não sabe? — falo e ele fica vermelho de vergonha, droga eu amo
quando ele fica assim.
— Eu sabia que você ia gostar — ele responde e me beija, mordendo
meu lábio como o grande safado que eu sei que ele é, seu pau roça na minha
cintura e preciso me controlar para não cair de joelhos e chupar meu
gatinho.
— Agora eu quero que você faça uma coisa por mim — comento e
abaixo ainda mais minha voz enquanto beijo seu rostinho bonito e mordo o
lóbulo da sua orelha. — Senta gostoso no Bunny.
— Com prazer.
Sinto sua respiração acelerar contra o meu pescoço, então ele me
beija novamente, mais firme e necessitado. Aproveito para tomar sua boca
deliciosa e sentir o gosto doce que só Chace tem antes dele se afastar e fazer
o que eu mandei.
— Agora sim a festinha pode começar — aviso e tomo a boca da
Copas na minha, seus lábios se moldam aos meus em um beijo delicioso,
logo suas mãos estão em mim e sinto seus peitos grandes se espremendo
contra os meus, a Chapeleira atrás de nós segue uma linha de beijos pelo
meu pescoço e começa a tirar meu sutiã com uma mão, enquanto a outra
viaja para o centro das minhas pernas.
É maravilhoso sentir dois pares de mãos delicadas me tocando, duas
bocas em mim, dois corpos se esfregando ao meu, ainda mais quando vejo
meus dois homens com tanto tesão quanto eu. Chace faz exatamente o que
falei e tira o plug enquanto Gabriel coloca a camisinha e se prepara para
recebê-lo.
As mulheres e eu caminhamos até a cama, nos livrando de cada uma
das peças de roupa pelo caminho, até que somos três corpos nus pegando
fogo de tesão. Enquanto uma me beija a outra faz o seu caminho até o meio
das minhas pernas, eu estou encharcada e fico ainda mais ao sentir o olhar
deles em nós.
Chace se coloca de costas para Gabriel, que o segura pela cintura e
beija seu pescoço com adoração enquanto o penetra delicadamente, mas o
olhar deles está em mim, assim como minha atenção está nos meus homens.
Vejo a boca aberta do gatinho e escuto seus gemidos, Gabriel praticamente
rosna enquanto o fode, e porra, é uma visão gostosa pra caralho, ainda mais
quando tenho as duas mulheres para mim, me dando prazer como se eu
fosse uma rainha, e é bem assim que me sinto agora, a porra da mulher mais
sortuda do mundo.
A visão dos meus dois homens, os amores da minha vida, entregues
um ao outro com tanta intensidade e paixão, me leva ao paraíso.
Agarro os cabelos da Chapeleira, que me chupa com vontade. Sua
língua trabalha na minha boceta enquanto a outra me beija, levo a mão para
o meio das pernas de Copas e ela geme contra a minha boca, fazendo-me
arrepiar com o seu prazer.
Encontro seus peitos grandes e macios e lambo com vontade os
mamilos eriçados, é quase impossível me concentrar quando a Chapeleira
coloca dois dedos na minha boceta e começa a bater sua língua em meu
clitóris, mais rápido, mais firme, chupando com tanto gosto que já consigo
me sentir no paraíso.
A música alta se completa com os sons de cinco pessoas em uma
névoa de prazer. Chace e Gabriel gemem alto, muito alto. Quando
percebem que estou me contorcendo na cama, nossos olhares se encontram
e nos conectam no momento em que sinto o primeiro orgasmo tomar conta
do meu corpo, me forço a ficar com os olhos abertos, mas é impossível.
A Chapeleira não para de me torturar com a sua boquinha deliciosa,
minhas pernas tremem, mas ela me segura no lugar, tirando tudo de mim,
chupando cada gota do meu prazer, enquanto a Copas se esbalda em meus
peitos e se esfrega na minha mão. Elas são boas demais juntas e
intensificam ainda mais as ondas de prazer que dominam toda a minha
existência.
— Geme gostoso para nós, Mali, mostra para eles o quanto você está
gostando do seu presente — Copas sussurra em meu ouvido. — Você é tão
gostosa, esse corpinho é uma delícia, sabia?
Ela nem precisa falar, porque já não controlo os sons que saem da
minha garganta e deixo que as sensações tomem conta até sentir meu corpo
amolecer. As duas me beijam e acariciam cada centímetro da minha pele
com aquele sorriso safado.
— Bom trabalho, garotas — elogio enquanto minha respiração volta
ao normal e meu coração quase sai pela boca. — Agora vocês podem
aproveitar uma à outra, como as boas garotas que eu sei que são.
— Sim, Mali — Copas responde e toma a boca da Chapeleira, dando-
me a visão das duas em um beijo gostoso pra caralho.
Com essa imagem em mente, saio da cama e vou até os meus homens,
perdidos no próprio prazer. Chace está com a boca entreaberta e cavalga
gostoso no pau de Gabriel, que o segura com firmeza, ajudando a controlar
seus movimentos. Eu amo assistir eles fodendo assim, tão perdidos e
entregues um ao outro, mas agora quero participar.
— Está gostoso, gatinho? — murmuro contra os lábios de Chace e
sua resposta é um gemido delicioso antes de me beijar. Sua boca me devora
com tanto desejo que sei que ele está quase gozando. — Você quer mais?
— Sim, porra — ele responde e sai de cima de Gabriel, que tira o
preservativo usado para me receber. Já sabendo o que eu quero, o Bunny
toma a minha boca, mordendo meu lábio inferior e provocando aquela
dorzinha deliciosa, para depois chupar o mesmo lugar e me fazer arrepiar.
Coloco um joelho de cada lado do corpo de Gabriel e deixo que seu
pau deslize para dentro da minha boceta, que já está prontinha para recebê-
lo, logo depois sinto Chace abrindo minha bunda e passando lubrificante.
Seus dedos trabalham cuidadosamente para estimular meu anel até que
estou rebolando contra a sua mão, subindo e descendo no pau de Gabriel.
— Você quer sentir nós dois, amor? — Gabriel pergunta e me segura
com firmeza pela cintura, controlando meus movimentos enquanto me beija
com adoração. Escuto o barulho do pacote de preservativo atrás de mim e
rebolo, ansiosa por recebê-los.
— Sim, porra, quero meus dois homens — imploro com necessidade
e vejo o sorriso satisfeito de Gabriel na mesma hora em que Chace substitui
os dedos pelo seu pau, me preenchendo completamente, até que sinto os
dois dentro de mim, e porra, é a melhor sensação do mundo.
— Consigo sentir você dentro dela, caralho — Chace murmura e
morde meu pescoço. Sua respiração quente e ofegante me faz tremer
enquanto sinto eles entrando e saindo de mim, suas mãos apertam meus
peitos e ele estimula os mamilos eriçados.
— Caralho, eu vou gozar — aviso com a voz rouca de tesão. Gabriel
beija meu pescoço, roçando a barba pela minha pele, já Chace leva a mão
até o meu clitóris inchado e sensível e começa a esfregá-lo com
movimentos circulares, me levando a porra do paraíso.
— Goza gostoso, amor — Gabriel rosna contra minha boca e aumenta
a intensidade das estocadas. Chace faz o mesmo e logo estamos perdidos
em gemidos e prazer, os sons dos nossos corpos se chocando são uma
serenata deliciosa, e assim que sinto Gabriel estremecer embaixo de mim,
seu pau me enchendo de porra, vou aos céus e me entrego ao prazer.
Chace não demora e logo nos acompanha, se derramando no
preservativo enquanto morde meu ombro, até que ele sai de mim e se deita
ao lado de Gabriel, que me segura contra seu peito e acaricia meus cabelos
suados.
— Feliz aniversário, amor — Gabriel murmura com um sorriso e a
respiração ofegante.
Duas bocas me beijam e quatro mãos acariciam meu corpo, o cheiro
familiar do perfume de Gabriel misturado ao doce da boca de Chace me faz
relaxar, porque sei que é aqui o meu lugar, nos braços dos meus dois
amores.
É aqui, com eles, que tenho a certeza de finalmente estar vivendo no
País das Maravilhas que tanto sonhei, com o meu Bunny e o meu gatinho.
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Se você ficou curiosa com alguns nomes citados, trago notícias:
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Livro 1: NASCIDA PARA PROTEGER (Daniele Corleone e Lucas
Costello)
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Em um mundo dominado por homens, uma mulher jamais pode
comandar. 
Daniele Corleone é a única filha do Capo mais poderoso de New
York, Alphonse Corleone — o líder da Família Genovese —, mas por
nascer mulher não tem direito a herdar o cargo do pai.
Apresentada aos terrores dessa vida cedo demais, com dez anos de
idade matou um monstro para defender sua mãe. Sua vida muda
completamente quando seu pai lhe dá uma escolha: seguir os passos de
todas as mulheres em seu mundo, tornando-se esposa do futuro Capo, ou
entrar para a máfia e arriscar tudo em um caminho jamais seguido, para ser
a próxima liderança da Família.
Lucas Costello é o filho do Consigliere e tem uma nova missão:
treinar e proteger uma menina de dez anos de idade. O que no começo pode
parecer algo simples se torna a missão mais importante da sua vida, já que o
seu futuro e o dela estão conectados. 
Se ela fracassar, ele não terá mais lugar naquele mundo.
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É SOBRE TORNAR-SE UM LÍDER EM UM JOGO ONDE AS
APOSTAS SÃO DE VIDA OU MORTE.
ALPHONSE CORLEONE é o único filho de Don Corleone, chefe da
Família Genovese e o homem mais temido e poderoso de New York. Ele
aprendeu cedo que é só mais um peão no tabuleiro de seu pai. Será
moldado, manipulado e usado em um jogo de poder perigoso.
AMÉLIA BIANCHI foi criada para ser a mulher perfeita, sua prisão
particular tirou dela o poder de escolha, em uma tentativa de moldá-la como
uma boneca, a casca bonita por fora e vazia por dentro. Ela terá que lutar
contra tudo o que foi ensinada para encontrar a própria voz e libertar-se das
grades douradas em que viveu a vida toda.
Um contrato de casamento, feito desde o dia em que eles nasceram,
garantirá a união entre duas famílias e o controle da cidade de New York
pela Família Genovese.
Ele precisará ser forte e lutar pelo poder para proteger o amor da sua
vida, mesmo que para isso precise se tornar um monstro ainda pior que seu
próprio pai.
Neste jogo não existe a possibilidade de fracasso, as apostas são altas
e no final, somente um rei pode continuar de pé.
Aviso: Nascido para liderar, livro 2 da série Caminhos de um Capo, é
um volume único e pode ser lido separadamente. Como a história se passa
antes do livro 1, Nascida para Proteger, você pode escolher a ordem de
leitura, mas ambos estão interligados.
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RICARDO MORETTI é o único filho do Capo e aceitou o acordo que
unificará a máfia na Sicília e acabará com uma guerra de gerações: casar-se
com a herdeira da Família rival.
O que ninguém sabe é que seu coração pertence a outra pessoa.
GIAN CARLO STEWART perdeu a mãe quando criança e foi criado
pela família Moretti, ele tem a mesma idade de Ricardo e cresceram juntos,
formando uma linda amizade. Gian foi treinado para assumir o cargo de
Consigliere quando seu amigo se tornar Capo.
Quando adolescentes, foram enviados ao colégio interno para fugir da
guerra, lá descobriram um sentimento ainda maior entre eles, e da amizade
nasceu o amor.
Eles estão juntos desde os quinze anos e precisaram esconder sua
relação por todo esse tempo, sabem que seu amor é proibido — ainda mais
dentro da máfia —, mas quem pode controlar o coração?
Para garantir a paz, vão sacrificar sua própria felicidade e tentarão
esconder seu relacionamento, porém até quando isso será possível?
É SOBRE AMOR E AMIZADE
É SOBRE A FAMÍLIA QUE ESCOLHEMOS
É SOBRE APOIAR E ESTAR AO LADO DE QUEM SE AMA
Aviso: Nascido para Amar, livro 3 da série Caminhos de um Capo, é
um volume único e pode ser lido separadamente.
A PSICÓLOGA DA MÁFIA

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LUANA MASSERIA é a filha do chefe de segurança da Família
Genovese, a máfia que comanda New York. Ela é uma psicóloga respeitada
na cidade. O que ninguém sabe é que ela é a psicóloga da filha do Capo,
Daniele Corleone.
Depois de perder os pais em um curto espaço de tempo, sem família,
com apenas uma amiga e nenhum relacionamento amoroso, a mulher se vê
triste e solitária na cidade de pedra.
YURI SAITO é um psicopata e tem plena consciência desse fato.
Dono de um ego enorme e um senso de moral deturpado, o homem estava
entediado em sua vida de luxo e riqueza.
Até que aparece a oportunidade para entrar em um novo jogo, algo
diferente de tudo o que ele já fez e que trará um novo propósito para sua
vida: se infiltrar na rotina de uma psicóloga e vigiá-la sem que ela saiba.
Será que ele conseguirá esconder sua verdadeira face diante de uma
profissional qualificada?
Ela é a presa perfeita, mas ele não é o único predador nessa caçada.
Um thriller psicológico com a máfia de plano de fundo, personagens
complexos e envolventes, um mistério a ser desvendado e um
relacionamento explosivo.
Você vai entrar na mente de um psicopata e entender seu
envolvimento com a psicóloga de forma única e arrepiante.
A PSICÓLOGA DA MÁFIA é um spin-off da série Caminhos de um
Capo, que pode ser lido de forma independente, porém os personagens que
aparecem aqui fazem parte de um mesmo universo.
AGRADECIMENTOS

Quero agradecer do fundo do coração aos meus amigos que me


apoiam a continuar escrevendo, sem julgamentos, e sempre com uma
palavra de carinho.
À minha mãe, que me incentivou a ler e que comprou Harry Potter
para uma menina que acabou se apaixonando pelos livros por causa daquele
mundo encantado. Obrigada, mãe, sei que se estivesse viva estaria
comemorando comigo e com orgulho de mais esta conquista.
Quero deixar um agradecimento amplo e especial a todas as autoras
que conversam comigo, trocam experiências e publicam suas histórias, ler
livros nacionais é o que me dá força e confiança para publicar.
À todas as autoras do Milícia das Gostosas, que era para ser um grupo
de amigo secreto de Natal, e acabou se tornando um lugar de apoio e
companheirismo.
Às autoras que me apoiam e inspiram a cada dia.
Às bookstan maravilhosas que me apoiam e às parceiras lindas que
foram incríveis neste lançamento!
Agora às minhas MAFIOSAS, que estão no grupo do whats e surtam
comigo todos os dias, vocês não têm ideia do quanto são importantes na
minha vida e de como me motivam a continuar.
À minha revisora, Elen Arcangelo, por embarcar nesta jornada
comigo e não me largar, seu trabalho é incrível.
A beta mais incrível e surtada que já tive, May obrigada por fazer de
Malícia uma experiência única, por abraçar cada um dos personagens e
surtar comigo em cada plot.
E agora quero agradecer a você, que deu uma chance ao meu livro e
se aventurou nesta nova leitura, obrigada de coração.
Indiana Massardo é uma libriana romântica, leitora voraz de
romances e tem 28 anos. Formada em Engenharia Civil, não segue a
profissão, é artista há mais de 5 anos. Trabalhando com arte realista em
aquarela no perfil oficial @indymassardo, agora também segue na carreira
de escritora no perfil @autoraindymassardo.
Atualmente vive sozinha com seus gatos e cachorros, sonha em ter
uma estabilidade financeira para poder viver mais tranquilamente.
Este é seu sexto livro publicado e está muito orgulhosa do mundo que
criou e dos personagens fortes que nasceram disso.
Promete muitos lançamentos dentro deste universo, especialmente
com personagens femininas fortes e muito clichê invertido.
 
 

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