Você está na página 1de 8

Nutrição e Dietética I

Introdução ao Planejamento Dietético


Profa. Danielly Ferraz

Conceitos em Dietética:

Dieta = palavra de origem grega (“díaita”), que significa “modo de vida”.

Historicamente, o termo “dieta” esteve ligado à restrição de nutrientes, visando suprir carências
ou eliminar excessos. Quando associada a doenças, a dieta caracteriza-se por alterações na
consistência e inclusão ou exclusão de alimentos. No entanto, o conceito e a utilização do termo
têm se modificado muito ao longo dos anos.

No final da década de 90, o termo “dieta” foi adotado para conceituar uma alimentação
adequada e que atende as necessidades nutricionais do indivíduo. Passou a ser utilizado tanto
na Nutrição Clínica, quanto para caracterizar uma alimentação saudável.

Na prática, o que significa planejar uma dieta?

Dispor alimentos de forma organizada e baseada em critérios científicos, culturais e pessoais,


considerando as inúmeras variáveis que contemplam uma alimentação que possa ser adotada
e incorporada aos hábitos de vida de um indivíduo, tanto na promoção de saúde, quanto na
prevenção de doenças.

Por onde começar? Relembrando o que devemos considerar ao elaborar um plano alimentar:

✓ Idade, sexo e momento biológico do indivíduo


✓ Prática regular de atividade física (frequência e intensidade)
✓ Inserção socioeconômica do indivíduo
✓ Práticas alimentares culturalmente identificadas
✓ Disponibilidade de alimentos, safra, regionalidade
✓ Hábitos, crenças e preferências de paladar (o que se come?)

1
✓ Habilidades culinárias e locais onde as refeições são realizadas
✓ Fatores psicossociais, emocionais e comportamentais (como se come?)
✓ A percepção do outro sobre seus sinais de fome e saciedade, mas validando também o
comer por prazer
✓ Identificar em que estágio de prontidão para mudança de hábitos e comportamento o
outro se encontra
✓ O foco deve ser em bem estar e saúde, não apenas no peso corporal (a perda de peso
vem como consequência de uma alimentação saudável)
✓ Partir de uma proposta colaborativa, baseada em escuta ativa, com o nutricionista
ouvindo mais do que falando. É essencial saber ouvir as necessidades e queixas do
indivíduo para quem a dieta está sendo planejada.

As bases do planejamento dietético:

O Guia Alimentar para a População Brasileira (2014) recomenda que a base da


alimentação seja composta por uma grande variedade de alimentos in natura ou minimamente
processados, predominantemente de origem vegetal e por preparações culinárias feitas com
esses alimentos e ingredientes culinários (estes últimos usados com moderação). Os alimentos
processados podem integrar a alimentação desde que consumidos em pequenas quantidades e
sempre como parte ou acompanhamento de preparações culinárias com base em alimentos in
natura ou minimamente processados. Já os alimentos ultraprocessados devem ser evitados.
Esse padrão de composição de refeições deverá nortear o planejamento dietético.

Nesse contexto, se faz necessária a leitura do capítulo 3 do Guia Alimentar (“Dos Alimentos
à Refeição), que traz orientações sobre como combinar alimentos na forma de refeições. Essas
orientações se baseiam em refeições consumidas por uma parcela substancial da população
brasileira que ainda baseia sua alimentação em alimentos in natura ou minimamente
processados e em preparações culinárias feitas com esses alimentos. Conhecer os grupos de
alimentos que constituem as refeições e as principais fontes alimentares de macro e
micronutrientes é essencial ao planejamento dietético.

Para além das questões mencionadas anteriormente, podemos orientar um passo-a-passo do


planejamento dietético:

Passo 1:

Qual o diagnóstico nutricional do indivíduo para quem o plano alimentar será realizado? Calcular
o IMC e classificar segundo os critérios a seguir.

2
Passo 2:

Determinação do valor energético total (VET) do plano alimentar, a partir do cálculo da


necessidade de energia diária. Considerar as variáveis: sexo, idade, peso (avaliar qual peso
utilizar na fórmula – o atual ou o “ideal”?) e nível de atividade física. Avalie se a quantidade de
energia consumida usualmente (a partir do relato) é compatível com a necessidade calculada.

OBS: Para o cálculo do “peso ideal” (teórico!), considere o IMC médio de eutrofia: 20,8 kg/m2
para mulheres e 22 kg/m2 para homens. Ou justifique qualquer outro peso utilizado!

3
Passo 3:

A partir valor energético total (VET) calculado para um plano alimentar, vamos calcular a
quantidade (em g) de macronutrientes (CHO, PTN e LIP) que podemos sugerir, de acordo com
as recomendações nutricionais da FAO/OMS (2003)?

Exemplo: digamos que o cálculo do VET tenha sido de 2.500 kcal.

CHO = 55 a 75% de 2.500 kcal = 1375 a 1875 kcal vem de CHO = (÷4) 343,75 a 468,75g de CHO.

PTN = 10 a 15% de 2.500 kcal = 250 a 375 kcal vem de PTN = (÷4) 62,5 a 93,75g de PTN.

LIP = 15 a 30% de 2.500 kcal = 375 kcal a 750 kcal vem de LIP = (÷9) 41,7 a 83,3g de LIP.

Passo 4:

Distribuir o VET entre as refeições. Como fazer?

Não é regra, mas podemos nos orientar pela recomendação a seguir, desde que essa distribuição
faça sentido para o indivíduo para quem o plano alimentar está sendo realizado!

(Philippi, 2013)

O que isso significa?

Ao distribuir as 2.500 kcal do exemplo acima em 5 refeições, por exemplo, podemos sugerir:

- Café da manhã (refeição principal): 20% de 2.500 kcal = 500 kcal

- Lanche da manhã (lanche intermediário): 10% de 2.500 kcal = 250 kcal

- Almoço (refeição principal): 30% de 2.500 kcal = 750 kcal

- Lanche da tarde (lanche intermediário): 10% de 2.500 kcal = 250 kcal

- Jantar (refeição principal): 30% de 2.500 kcal = 750 kcal

OBS: Lembrando que é preciso fechar os 100%!

4
Passo 5:

Sugerir os alimentos e preparações culinárias que podem compor cada uma das refeições do
plano alimentar (com base no capítulo 3 do Guia), com a indicação de quantidades (em medidas
caseiras, preferencialmente), de modo a atingir as recomendações nutricionais (inicialmente
trabalharemos para alcançar a adequação percentual de ingestão de macronutrientes, de
acordo com a FAO/OMS 2003). Considerar sempre a apresentação da dieta em relação a
consistência, cor, sabor e temperatura dos alimentos.

Exercício de exemplo:
Paciente do sexo feminino, sedentária, 58 anos de idade, 1,62m de estatura e 85 kg. Foi
recentemente encaminhada ao Ambulatório de Nutrição de um Hospital Universitário. Durante
a consulta, foi possível obter informações diversas sobre a composição das refeições realizadas,
horários, preferências, aversões, habilidades culinárias e outras informações sobre hábitos e
rotina alimentar. A partir da aplicação de questionários de consumo alimentar, foi constatada
uma ingestão energética de aproximadamente 2.800 kcal/dia, distribuídas em 4 refeições
diárias. Além disso, a paciente relatou baixa ingestão de frutas e hortaliças e elevado consumo
de alimentos ultraprocessados. Sugira um rascunho de plano alimentar para essa paciente,
seguindo os passos acima.

(será realizado com a turma nos encontros síncronos da semana)

Passo 1:

IMC = 85 / (1,62)2 = 32,4 kg/m2 (Obesidade Grau I)

Passo 2:

Determinação do VET do plano alimentar. Trata-se de uma paciente com obesidade, se


utilizarmos o peso atual, o cálculo irá superestimar sua necessidade de energia. Possibilidades:

(1) *Cálculo utilizando o peso “ideal” baseado no IMC médio de eutrofia:

20,8 = P / (1,62)2 = 54,4 kg

TMR = 8,7 x P + 879

TMR = 8,7 x (54,4) + 879

TMR = 1352,28 kcal

NED = TMR x Fator atividade física

NED = 1352,28 x 1,56 = 2109,55 kcal

Outra possibilidade:

5
(2) *Cálculo utilizando o peso “ideal” baseado no IMC máximo de eutrofia (24,9 kg/m 2)

24,9 = P / (1,62)2 = 65,2 kg

TMR = 8,7 x P + 879

TMR = 8,7 x (65,2) + 879

TMR = 1446,24 kcal

NED = TMR x Fator atividade física

NED = 1446,24 x 1,56 = 2256,13 kcal

O valor energético total (VET) do plano alimentar deve ser baseado do cálculo da necessidade
de energia diária (NED) do indivíduo. Nesse caso, qual dos valores devemos utilizar?
Considerando o estado nutricional da paciente e a ingestão energética relatada (cerca de 2800
kcal/dia), que está acima da sua necessidade diária, poderíamos utilizar o valor obtido no
segundo cálculo (2256 kcal). Assim, haverá restrição energética, porém menos severa do que se
considerássemos o peso “ideal” de 54,4 kg no cálculo na NED (primeiro cálculo). Nesse caso,
poderíamos considerar até mesmo a possibilidade de utilizar na fórmula um peso compatível
com IMC na faixa de sobrepeso (lembrando que a paciente tem obesidade, costuma ingerir 2800
kcal/dia e pode ser difícil fazer uma restrição energética maior em um primeiro momento). Ou
seja, outras possibilidades de cálculo podem ser aceitas desde que devidamente justificadas.
Veja o exemplo a seguir.

Uma terceira possibilidade:

(3) *Cálculo utilizando o peso “ideal” baseado no IMC máximo de sobrepeso (29,9 kg/m 2)

29,9 = P / (1,62)2 = 78,3 kg

TMR = 8,7 x P + 879

TMR = 8,7 x (78,3) + 879

TMR = 1560,21 kcal

NED = TMR x Fator atividade física

NED = 1560,21 x 1,56 = 2433,9 kcal

Das três possibilidades de peso utilizadas na fórmula:

6
(1) Utilizando o peso “ideal” baseado no IMC médio de eutrofia (54,4 kg)

Resultou em 2109,55 kcal

(2) Utilizando o peso “ideal” baseado no IMC máximo da faixa de eutrofia (65,2 kg)

Resultou em 2256,13 kcal

(3) Utilizando o peso “ideal” baseado no IMC máximo da faixa de sobrepeso (78,3 kg)

Resultou em 2433,9 kcal

Se a paciente costuma ingerir 2800kcal/dia, qual dos valores acima se aproxima mais dessa
ingestão (para que a restrição energética seja a menos severa possível, o que pode promover
melhor adesão ao plano alimentar sugerido)?

Com base nessa justificativa, o valor de 2434 kcal (arredondado) pode ser o estabelecido para o
VET.

Passo 3:

Fazendo a distribuição de macronutrientes. Com base nas recomendações da FAO/OMS (2003),


podemos estabelecer os percentuais de ingestão de macronutrientes, da seguinte forma:

60% para CHO; 15% para PTN; 25% para LIP (ou outros valores dentro da faixa de referência)

- 60% de 2434 kcal = 1460,4 kcal proveniente de CHO = 365,1g de CHO (= 1460,4 ÷ 4)

- 15% de 2434 kcal = 365,1 kcal proveniente de PTN = 91,3g de PTN (= 365,1 ÷ 4)

- 25% de 2434 kcal = 608,5 kcal proveniente de LIP = 67,6g de LIP (= 608,5 ÷ 9)

Ou seja, ao sugerir a distribuição de alimentos e preparações culinárias nas refeições do plano


alimentar, os valores (em g) de CHO, LIP e PTN devem ser somados ao final, de modo a alcançar
os valores acima (ou o mais próximo possível). Assim, a adequação% de ingestão planejada
poderá ser alcançada.

Passo 4:

Como distribuir o VET de 2434 kcal, nas quatro refeições que a paciente relata fazer ao longo do
dia (lembrando que podemos sugerir um fracionamento maior, com mais refeições)?

Por exemplo, digamos que a paciente realize o café da manhã, almoço, lanche da tarde e jantar.

7
- Café da manhã (refeição principal): 20% de 2434 kcal = 486,8 kcal

- Almoço (refeição principal): 35% de 2434 kcal = 851,9 kcal

- Lanche da tarde (lanche intermediário): 15% de 2434 kcal = 365,1 kcal

- Jantar (refeição principal): 30% de 2434 kcal = 730,2 kcal

Outras faixas de distribuição % do VET entre as refeições podem ser utilizadas, seguindo as
orientações do roteiro.

Passo 5:

Cada aluno pode elaborar a sua sugestão de plano alimentar para este caso. Faremos uma
demonstração de como adequar, que será disponibilizada em breve.

Você também pode gostar