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EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA ___

VARA CÍVEL DA COMARCA DE TRAMANDAÍ – RS

MARIA ADI PRADO SEVERO, brasileira, viúva,


pensionista, portadora do RG 9024153539, inscrita no CPF
sob o número 261.960.770-15, residente e domiciliada no
endereço Rua Rebouças, 702, Bairro Zona Nova,
Tramandaí/RS, telefone número (51) 98436-2804, não
possui e-mail, por meio da Defensoria Pública do Estado,
vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência,
propor a presente

AÇÃO ANULATÓRIA DE NEGÓCIO JURÍDICO, COM


PEDIDO DE RESSARCIMENTO DE VALORES

em face do BANRISUL – BANCO DO ESTADO DO RIO


GRANDE DO SUL S/A, pessoa jurídica de direito privado,
inscrita no CNPJ/MF sob o nº 92.702.067/0001-96, com
sede à Rua Capitão Montanha, nº 177, em Porto
Alegre/RS, CEP 90.010-040, consoante fundamentos de
fato e de direito a seguir expostos:

I. DOS FATOS

A demandante, senhora Maria Adi, foi ao banco Banrisul,


com o intuito de efetuar empréstimos bancários, situações ocorridas nas datas
de 26 de julho de 2018 e 03 de outubro de 2018.

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Os mútuos foram estipulados nos valores de R$ 10.542,84
(dez mil e quinhentos e quarenta e dois reais com oitenta e quatro centavos),
bem como no importe de R$ 14.576,27 (quatorze mil e quinhentos e setenta e
seis reais com vinte e sete centavos).

Referidas transações foram desenvolvidas em agência


bancária da cidade de Tramandaí/RS. Á época, não foi detalhada a forma de
negociação, por isso a idosa imaginou que receberia os valores integrais,
quando, em verdade, apenas assumia mais dívidas, visando o pagamento de
pendências econômicas passadas.

A forma de pactuação foi desvantajosa e inútil, já que os


valores seriam destinados à preservação de uma vida digna, dado que a idosa
recebe quantia ínfima de um salário mínimo nacional, mas acabaram servindo
apenas para renegociar débitos pretéritos, objeto que não era da autora.

No mais, a demandante é semianalfabeta, com precária


instrução escolar, tendo apenas a quinta série do ensino fundamental, além de
ser pessoa muito humilde, que sobrevive com muita dificuldade e idosa, tendo
dificuldade de compreensão dos termos de negociações e renegociações tão
complexas.

Por isso, não teve condições de diferenciar os contratos


firmados, isto é, desconhece a linguagem do mercado financeiro e seus típicos
contratos de adesão. Tanto é verdade que se imaginasse serem baixos os
valores que os mútuos proporcionariam a si diretamente, jamais teria feito o
acordo.

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Diante disso, a medida correta é a anulação do
empréstimo e, consequentemente, a devolução dos valores descontados, em
função da negociata.

II. DO DIREITO

A) DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO


CONSUMIDOR (LEI N.º 8.078/90): SÚMULA 297 DO STJ E ADIN 2.591 DO
STF

Inicialmente, impende ressaltar que há, na espécie,


inequívoca relação consumerista entre a autora e a instituição ré, de tal sorte
que, ao caso, impõe-se a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor
(Lei n.º 8.078/90).

As partes se amoldam com perfeição aos conceitos legais


de consumidor e fornecedor, nos termos dos arts. 2 o e 3o, do CDC. Ademais, a
relação estabelecida se enquadra na conceituação de relação de consumo,
apresentando todos os aspectos necessários para a aplicabilidade do codex
consumerista, vez que esta legislação visa coibir infrações inequivocamente
cometidas no caso em exame, qual seja, a previsão de cláusulas contratuais
abusivas, que denotam uma hipersuficiência por parte do estabelecimento
comercial.

Esse contexto conduz a uma inexorável desigualdade


material que clama pela incidência do CDC.

B) DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA

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Corolário lógico da aplicabilidade do CDC ao caso objeto
desta demanda é a inversão do ônus probatório, conforme dispõe o art. 6 o, VIII,
do CDC, verbis:

Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:


(...)
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos,
inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu
favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for
verossímil a alegação ou quando for ele
hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de
experiências;

A inversão do ônus da prova, em favor do consumidor,


está alicerçada na aplicação do princípio constitucional da isonomia, “pois o
consumidor, como parte reconhecidamente mais fraca e vulnerável na relação
de consumo (CDC 4º I), tem de ser tratado de forma diferente, a fim de que seja
alcançada a igualdade real entre os partícipes da relação de consumo. O inciso
comentado amolda-se perfeitamente ao princípio constitucional da isonomia, na
medida em que trata desigualmente os desiguais, desigualdade essa
reconhecida pela própria lei.” 1

Dessa feita, requer-se, desde já, o deferimento da inversão


do ônus da prova, com fulcro no art. 6º, VIII c/c art. 51, VI, ambos do CDC.

C) DO DIREITO À ANULAÇÃO DO CONTRATO

1
Nery & Nery, Comentários ao CPC, nota ao art. 6º do CDC, 4ª ed. Ed. RT, p. 1.805

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Se tratando de pessoa semianalfabeta, em absoluta
vulnerabilidade financeira, social e sistêmica, a qual não consegue discernir a
relação de negócio jurídico existente, faz-se necessária a anulação do contrato.

Não estando presenta testemunha em favor do requerido é


cabível colacionar o disposto no art. 595 do CC:

Art. 595. No contrato de prestação de serviço,


quando qualquer das partes não souber ler, nem
escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo
e subscrito por duas testemunhas.

O fato de a autora não ser alfabetizado não a torna incapaz


no sentido legal e não impede de contratar. Contudo, em razão da sua
presumida vulnerabilidade, o artigo supracitado do Código Civil, exige alguns
requisitos para a celebração do contrato, os quais não foram observados no
caso em tela.

Art. 166, CC. É nulo o negócio jurídico quanto:


[…]
IV – não revestir a forma prescrita em lei;

Dessa feita, como o contrato não se revestiu da forma


prescrita em lei, nulo se torna.

D) DEVOLUÇÃO DOS VALORES COBRADOS

Tendo em vista a declaração de nulidade do contrato,


deve-se analisar a questão dos respectivos valores já pagos pela requerida.

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Uma vez anulado o contrato, as partes devem retornar ao
“status quo”, ou, no caso de impossibilidade, ser indenizadas com o equivalente,
consoante determina o art. 182 do CC. Assim, deverão ser restituídos, na forma
simples, os valores pagos pelo autor.

“Art. 182, CC. Anulado o negócio jurídico, restituir-


se-ão as partes ao estado em que antes dele se
achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão
indenizadas com o equivalente.

O requerido deverá ser condenado à devolução, das


parcelas mensais já pagas, desde a data da pactuação do contrato, corrigidas
monetariamente e acrescidas dos juros de mora, dados esses que deverão ser
elucidados durante o trâmite do processo.

III. GRATUIDADE DA JUSTIÇA

O art. 98, do Código de Processo Civil, prevê que a:

“pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira,


com insuficiência de recursos para pagar as custas,
as despesas processuais e os honorários
advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na
forma da lei.”

De acordo com a declaração em anexo, a parte autora não


dispõe de recursos para arcar com as custas e despesas processuais, bem
como os demais encargos da sucumbência, sem prejuízo do sustento próprio ou
de suas famílias.

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Nesses termos, postula a concessão do benefício da
gratuidade da justiça, compreensivo a todos os atos do processo até a decisão
final do litígio, em todas as instâncias; os inerentes ao exercício da ampla
defesa e do contraditório, bem como quaisquer despesas e emolumentos
devidos em decorrência da prática de atos notariais ou registrais necessários à
efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o
benefício tenha sido concedido.

IV. AUDIÊNCIA PRELIMINAR DE CONCILIAÇÃO

A parte demandante manifesta interesse em audiência de


conciliação, a ser designada pelo juízo, consignando-se a necessidade de
intimação pessoal da parte assistida para comparecimento ao ato posto que os
termos da composição somente por ela podem ser declarados, a teor do
disposto nos arts. 186, §2º, e 334, §§ 9º e 10, do Código de Processo Civil, e do
art. 128, XI, da Lei Complementar n. 80/94.

V. DOS PEDIDOS

Diante do exposto, requer:

a) recebimento da presente ação, com os documentos que


a acompanham, e a imediata concessão do benefício da gratuidade à autora,
nos termos do art. 98, do CPC (declaração de hipossuficiência em anexo);

b) a designação de audiência de conciliação, com a


intimação pessoal dos demandantes e a citação das demandadas com
antecedência de vinte dias e a advertência de que o não-comparecimento ou a

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falta de justificativa implicará ato atentatório à dignidade da justiça (CPC, art.
334, §8º);

c) a procedência integral da ação, para anular os negócios


jurídicos realizados entre as partes, condenando a demandada a ressarcir a
autora pelos valores das parcelas pagas, corrigidos pelo IGP-M, a contar da
data dos descontos e acrescidos de juros de mora, a contar da citação;

d) a condenação do requerido ao pagamento das


despesas processuais e honorários advocatícios a serem arbitrados por Vossa
Excelência e destinados ao FADEP, por meio de guia de recolhimento retirado
pelo site www.sefaz.rs.gov.br, código 712 – BANRISUL;

e) a produção de toda e qualquer modalidade de prova em


Direito admitida, em especial, a documental e pericial;

f) a intimação pessoal do Defensor Público, a contagem


em dobro dos prazos processuais, bem como sejam observadas as demais
prerrogativas institucionais insertas na Lei Complementar n. 80/94.

Dá-se à causa o valor de R$ 25.119,11.

Nesses termos, pede deferimento.

Tramandaí, 16 de fevereiro de 2020.

Clóvis A. P. Bozza Neto,


Defensor Público.

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