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Copyright © 2023 – Jéssica Silva

Lançado anteriormente como QUERIDA AURORA


Revisão: Amanda Mont’Alverne
Capa: Ctrl Designer
Diagramação: Jéssica Silva
(js_diagramacaoebanner)

O titular do direito autoral da obra literária a seguir proíbe


terminantemente: cópia, adição, redução, exibição, troca,
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de 2-4 anos e/ou multa.
Redes Sociais
Nota da Autora
Sinopse
Dedicatória
Capítulo 01
Capítulo 02
Capítulo 03
Capitulo 04
Capítulo 05
Capítulo 06
Capítulo 07
Capítulo 08
Capítulo 09
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Capítulo 45
Capítulo 46
Capítulo 47
Capítulo 48
Capítulo 49
Capítulo 50
Capítulo 51
Epílogo
Outras Obras
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Oi leitor, bem-vindo!
Se é sua primeira vez lendo um livro meu, prazer, meu nome
é Jéssica e eu escrevo livros que sempre tocam o coração de
alguma forma.
Se você já é de casa, muito obrigada pelo companheirismo
de sempre.
Este livro contará a história de Fernando e Aurora, filhos de
Manu e Caio, personagens do livro O desejo de Manuela, disponível
na minha página na Amazon. Se quiser conhecer a história deles,
fique à vontade, te prometo um romance que vai deixar seu coração
quentinho.
Nossos personagens foram criados como irmãos adotivos,
então peço que se esse tema não lhe agrade, por favor, não leia o
livro.
São inúmeras camadas que compõem essa relação e
garanto que o pecado de Aurora se transformará em sua salvação.
Preparem-se para fortes emoções.

Boa leitura ♡
Aurora e seu irmão, Fernando, sempre foram muito unidos.
Tendo sido adotada quando ainda era uma recém-nascida e
acolhida pelos pais do rapaz, tornaram-se, desde muito novos,
melhores amigos e confidentes um do outro; ao seu lado ela sempre
se sentiu segura e protegida. E o que menos esperava era um dia
perceber que o que sentia por ele estava além de um simples amor
fraternal. E mesmo sabendo que não eram irmãos de sangue, ela se
sentia suja por tal sentimento que aflorava em seu coração. Confusa
e perdida, Aurora tentará se afastar dele, usando todas as
artimanhas possíveis. Mas Fernando, que logo confessará amá-la
na mesma proporção, não permitirá isso.
Fantasmas do passado ressurgirão, deixando-a ainda mais
atordoada, e ela descobrirá segredos que nunca havia imaginado. E
diante de seus olhos, verá a sua vida, aparentemente perfeita,
desmoronar.
O que fará quando tudo o que acreditava ser verdade se
revelar uma grande mentira e os traumas de sua nova vida a
impedirem de ser completa como antes? Será o amor capaz de
apagar as mágoas e lhe dar um novo recomeço?
Dedico este livro a todos que acreditam que o verdadeiro
amor é capaz de superar barreiras, vencer preconceitos e muitas
vezes, curar feridas que nem foi ele que causou.
O som alto do vizinho, em vez de me irritar, me faz querer
levantar e dançar.
— Foco, Aurora, você precisa terminar esse livro ou Mari vai
te xingar novamente — digo a mim mesma.

Foi um sacrifício convencê-la a me emprestar, ela morre de


medo de estragarem seus preciosos tesouros. Lembro-me de um
dia que deu um baita sermão em uma antiga “amiga” por ter
devolvido o livro que emprestou com marcas de caneta na capa.
Desde então ela não emprestava pra mais ninguém.
A música que está tocando agora é eletrônica e meus dedos
se movem involuntariamente. Olho para a porta do meu quarto, para
ter certeza de que está fechada, e então me levanto e começo a me
requebrar de um lado para o outro, seguindo a batida da música.
Meus cabelos balançam junto comigo e observo, divertida, meus
passos no reflexo do espelho.
— Requebra mais, Aurora! — Escuto a voz de Nando e me
volto para ele, encontrando-o sorrindo com o celular na mão.
— Nando, você estava gravando?! — Ele nega, mas a risada
o entrega. — Eu não acredito em você! Me mostra seu celular.
Vou até ele e tento pegar o aparelho de suas mãos, mas ele
desvia.

— Se você me pegar, deixo você ver. — Nando começa a


correr pelo quarto.
— Nando, para de agir como uma criança. — Mas mesmo
contrariada, corro atrás dele.

— Era você que estava se requebrando na frente do espelho


igual uma adolescente, não eu.
— Claro, você dançando mais parece um robô que precisa de
óleo.
O seu riso ecoa em meu quarto. Sempre gostei desse som.
Só não gosto do fato de ser mais rápido que eu. Apesar de termos a
mesma idade, sou menor do que ele, era pra ser mais ágil. Já estou
começando a suar e não gosto disso. Uma ideia vem à minha
mente. Preciso usar meus dotes teatrais. Finjo que torci o pé e me
sento na cama, gemendo de dor. Nando para a sua fuga e vem até
mim, o rosto pálido pela preocupação. Não deveria fazer isso com
ele, mas sei muito bem o seu ponto fraco. E ele sou eu, pois sou
uma irmã.
— Onde está doendo? — Seus dedos envolvem o meu
tornozelo, o toque tão suave que mal sinto, e um calor estranho se
espalha pelo meu corpo. Com um suspiro, eu ignoro a sensação e
aproveito a sua distração para tomar o celular. Em um segundo,
apago rapidamente o vídeo. — Aurora, você me enganou? — Ele
sobe em cima de mim e começa a me fazer cócegas. — Eu estava
aqui, preocupado com você. Mulher sem coração.

O som da minha gargalhada se mistura com a dele e tento


afastá-lo, em vão. E quando Nando aproxima o rosto do meu, sinto
meu coração acelerar e minha respiração ficar mais pesada. O que
há de errado comigo? Meus olhos estão fixos nos seus. É estranho
pensar que mesmo não sendo meu irmão de sangue, nossos olhos
têm a mesma cor. Um azul tão lindo que parece mais um céu no dia
de verão. Não sei por quanto tempo ficamos ali nos encarando.
— Você está bem? Suas bochechas estão coradas. — Seu
hálito quente e sua voz baixa me fazem arrepiar.
— Saia de cima de mim. — As palavras saem um pouco
rudes e Nando se levanta com a testa franzida.
— O que foi? Você ficou brava comigo?

— Não é nada.
Me levanto e vou até a janela. Olho para o céu e tento
reorganizar meus pensamentos, meus sentimentos.

— Ei. Você sabe que pode me contar qualquer coisa. — Ele


vem até mim e sua mão segura a minha. Olho para Nando sem
entender o que está acontecendo aqui dentro do meu peito e a puxo
de volta. — Além de irmãos, somos amigos, Aurora. Se tiver algo te
incomodando, é só me avisar que darei um jeito.
— Já falei que não é nada. — Cruzo meus braços.

Vejo pela janela Henry estacionar o carro em frente a nossa


casa. Um sorriso se forma em meu rosto. Já estava com saudades.
— Seu namorado mané chegou, foi? — Ele também olha
para fora.
— Ele não é mané, Nando — o repreendo.

— Se você diz. — Ele dá de ombros. — Eu não gosto dele. É


perfeitinho demais. Pra mim, é tudo fingimento. Agora vou pro meu
quarto, não quero dar de cara com ele. — Dá um beijo na minha
bochecha e sai.
Me sento na cama e solto um longo suspiro. Fico olhando
para as minhas mãos, perdida em meus pensamentos. O que foi
aquilo que senti? Seu toque e sua aproximação fizeram meu
coração acelerar. Mas por quê?
Henry e eu já estamos namorando há dois anos. O conheci
em um churrasco na casa de uma conhecida e logo de cara ele já
chamou a minha atenção, tanto por sua beleza morena quanto pela
simpatia. Manu e Caio aceitaram o meu namoro com ele super bem,
apesar de Caio ter dito, com todas as palavras, que se Henry me
machucasse, iria acabar com ele. Mas nunca senti por ele, ou por
outro homem, algo parecido com o que rolou a minutos atrás com
Fernando. Eu devo estar ficando louca. Fico lendo esses livros de
romance erótico de Mari e depois fico desse jeito. Vendo coisa onde
não tem. Onde não se pode ter.
— Oi, amor. — Henry vem em minha direção e beija os meus
lábios, um beijo rápido, contido.
— Oi, como você está?
Ele se senta ao meu lado e me abraça. Ultimamente estamos
nos vendo tão pouco que até de seu perfume amadeirado senti falta,
e olha que nem sou fã desse tipo. Prefiro os cítricos. Como o de
Nando.
— Estou melhor agora que estou com você. — Sorrio ao
ouvir essas palavras. — E você? Parece pensativa. Aconteceu
alguma coisa?
— Estou bem. Não aconteceu nada. — Tento sorrir para ele.
— A que devo a sua ilustre visita?
— Vou precisar viajar até a casa do meu pai. Aconteceu um
problema lá com a família perfeita dele — diz em um tom irônico.

— E seu trabalho? Você sabe quanto tempo vai ficar por lá?
— Consigo terminar o projeto do novo cliente em qualquer
lugar, amor. — Beija minha cabeça. — Só preciso do meu notebook,
papel e lápis. E quanto ao tempo, não tenho certeza, mas acho que
uma semana.
Me solto dos seus braços e o encaro sem acreditar.

— Uma semana? Não faz muito tempo que voltou de lá. —


Cruzo os braços. Apesar de querer que a relação com o pai e a
nova família melhore, também quero que meu namorado fique
comigo.
— Eu sei, mas meu pai está precisando da minha ajuda,
amor. Eu não posso deixá-lo na mão. — Ele acaricia a minha
bochecha.

— Engraçado. Seis meses atrás você nem ligava pra ele.


Agora vive mais lá do que aqui comigo — digo, tirando a sua mão
do meu rosto.
— Amor... Nós dois tivemos uma boa conversa e decidimos
que nossa relação merecia uma nova chance. Agora que estamos
bem, estou tentando ajudar no que for possível, mesmo ainda não
gostando da mulher dele. — Segurando meu queixo, ele levanta
meu rosto e me olha nos olhos. — Você mesma disse que deveria
tentar melhorar as coisas com ele, lembra?
Eu suspiro, ainda contrariada, mas entendendo o seu ponto.
— Vou sentir sua falta — é o que acabo dizendo, e o abraço.

— Eu também vou sentir a sua. — Henry beija a minha testa.


— Agora vou arrumar minhas malas. A viagem pra Bahia é
demorada.
Antes que ele possa se levantar, seguro o seu braço e o puxo
para um beijo, mas quando está ficando mais intenso e profundo,
ele para. Eu queria mais, mas pelo jeito, Henry não. Isso me
desanima mais do que gostaria de admitir. As coisas entre nós já
não são como antes. Às vezes é como se estivesse andando de
biquíni no meio do Alasca de tão frio. O fogo, o desejo e a paixão
parecem não existir mais.
— Tchau, amor. Assim que chegar lá, te ligo. — Ele se
levanta e caminha até a porta, sem nem mesmo esperar a minha
resposta.
— Tá — murmuro, vendo-o sumir.
Já irritada, me levanto e coloco o livro de Mari dentro da
gaveta da cômoda. Ler esse tipo de coisa sem ter meu namorado
por perto é tortura. Preciso me distrair. Vou para a sala e vejo Manu
e Caio sentados no sofá, abraçados. Formam um casal tão lindo...
Serei eternamente grata por terem me adotado quando minha mãe
morreu. Quando eu era criança, os chamava de pai e mãe, mas
depois que cresci, preferi me referir a eles pelo nome mesmo.
Me sento ao lado deles no sofá.
— Alguém não está com uma cara boa. Henry foi embora
rápido. Vocês brigaram? — Sinto a preocupação na voz de Caio.
— Ele vai viajar pra casa do pai de novo.
— Já estou começando a achar estranho ele ir pra lá tantas
vezes — Manu diz e eu me vejo obrigada a concordar.
— Está chegando a hora do jantar. Que tal uma pizza? Hoje é
sábado — Caio sugere e eu sei que está tentando me animar.
— Pode ser. Vou tomar um banho e já desço. — Me levanto e
sigo para as escadas.
Assim que passo em frente ao quarto de Nando, o escuto
xingando sem parar. Preocupada, vou até a sua porta e bato, mas
ele não responde. Abro a porta devagar e entro. O quarto de Nando
é a cara dele. Limpo e organizado. Cada coisa tem o seu devido
lugar. Vejo-o em frente ao computador. Vou até ele e toco o seu
ombro, e ele se vira para mim com uma expressão assustada. Estou
sorrindo, mas assim que avisto o que está na tela, meu sorriso
cessa.
É uma foto de Henry beijando outra garota.
Lágrimas se formam em meus olhos com o sentimento de
traição que cresce em meu peito. Eu não posso acreditar. Não quero
acreditar nisso.
Nando se levanta e me abraça. Ali no calor de seus braços,
me permito desabafar.

— Eu planejava te contar de outra forma. Não era pra ser


assim. Acabei de receber essa foto.
— Ele me traiu, Nando — sussurro em meio ao soluço.

— Infelizmente sim — diz no mesmo tom. Me afasto de seus


braços e vejo em seus olhos como me ver assim o afeta. Nando me
leva até a cama e, quando me sento, ele limpa as minhas lágrimas.
— Como conseguiu a foto?

— Foi uma colega que tem essa garota nas redes sociais que
tirou print e me mandou. Eu sinto muito, Aurora, mas pela data, foi
semana passada.
Nesse momento todas as peças se encaixam em minha
cabeça. Me sinto a pessoa mais burra de todo o planeta. Eu ignorei
os sinais, achei que só estávamos atravessando uma fase ruim em
nosso relacionamento.
— Ele não estava indo pra casa do pai dele, Nando. —
Encaro minhas mãos. — Estava indo ficar com outra. Como sou
idio... — Seu dedo indicador toca meus lábios me impedindo de
completar a frase.
— Você não é nada disso. Você é alegre, divertida e muito
inteligente. E sempre ilumina tudo ao seu redor. — Sinto minhas
bochechas queimarem. Sempre fico sem jeito quando me elogia
desse jeito. — Você é maravilhosa, Aurora. O idiota é ele por perder
uma garota como você.
Seu rosto está a poucos centímetros do meu e ele me olha
com uma intensidade que me atordoa. Meu coração acelera quando
a sua mão toca o meu queixo, com a mesma suavidade de antes, e
os meus olhos, inconscientemente, se fecham. Os pensamentos
embaralhados demais para compreendê-los. Sinto os seus lábios
tocarem os meus com delicadeza e só então a realidade me
encontra.
Nando está realmente me beijando?
Os lábios de Nando ainda estão colados aos meus. Nosso
beijo é doce e gentil, e a sensação é tão boa — tão diferente dos
outros que já experimentei. Quando minha ficha cai e percebo que o
que estamos fazendo é errado, me afasto rapidamente e tento voltar
a respirar.
— Meu Deus. Isso é loucura! — Me levanto da cama
nervosa.
— Desculpa, foi culpa minha. — Ele abaixa a cabeça, as
bochechas corando com a vergonha.
E estou ainda mais envergonhada que ele, por ter sentido o
que senti. Acabei de cometer um enorme pecado. Eu beijei meu
irmão.

— Só esquece, Nando. Isso nunca aconteceu. Está me


ouvindo? Nunca.
Sem ter coragem de olhar em seu rosto novamente, saio do
quarto em disparada. Nando me chama, mas o ignoro. Entro no meu
e tranco a porta, querendo me esconder do mundo.
— Que droga! — Me jogo na cama e afundo o rosto no
travesseiro, soltando um grito.
Deixo as lágrimas caírem. Estou confusa e com o coração em
pedaços. Henry me enganou durante todo esse tempo, jogou
nossos dois anos no lixo! Ele foi o meu primeiro namorado, o
homem a quem me entreguei por amor. Tenho consciência de que
as coisas não estavam tão boas, mas nunca imaginei que ele
chegaria a esse ponto. Seria tão mais fácil se tivesse terminado
antes. Ele sabe o quanto abomino a palavra "traição". Tudo o que
sempre pedi a ele foi sinceridade.

Toco meus lábios e a lembrança do beijo vem a minha


cabeça. Eu não posso deixar que isso aconteça novamente. Nando
é meu irmão. Mesmo não tendo o mesmo sangue que ele, é isso o
que nós somos. Fecho meus olhos e sinto as lágrimas rolarem por
minha face. Como minha vida pode ter mudado tanto de uma hora
pra outra?

Acordo com os olhos ardendo. Me sento na cama, pego meu


celular debaixo do travesseiro e vejo que já é quase meia-noite. Há
chamadas não atendidas de Henry e só de olhar seu nome na tela,
com vários corações ao lado, dói o meu peito. Bloqueio o celular, me
levanto e vou até o guarda-roupa, separo uma camisola e vou direto
para o banho. Me forço a não derramar nenhuma lágrima. Henry
não merece nenhuma delas. Não vou ficar aqui sofrendo e chorando
por um homem que não foi capaz de me proporcionar o mínimo, que
é sua lealdade. Se ele me traiu foi por ser um mal caráter. Preciso
colocar na cabeça que o problema não estava em mim e sim nele.
Quando finalizo, abro a porta do quarto e vejo que as luzes já
estão apagadas. Todos já devem estar dormindo. Decido descer até
a cozinha para arrumar algo para comer. Abro a porta da geladeira e
vejo um prato com dois pedaços de pizza e um pequeno bilhete ao
lado. Pego-o e começo a ler.
“Pequena, guardamos pra você. Espero que esteja melhor.
Nando nos contou sobre Henry. Te amamos. Caio”
Não sei se fico feliz por não ter que explicar o que aconteceu
ou se fico com raiva por Nando ter contado. Dentro de mim parece
que se passou um furacão bagunçando tudo. Sei que vai demorar
um pouco pra colocar cada coisa de volta em seu devido lugar. E ter
Manu e Caio me apoiando fará toda a diferença.

Dobro o bilhete e o coloco na bancada. Esquento minha pizza


no micro-ondas e me sirvo de um copo de Coca. Me sento à mesa e
começo a comer. Apesar de estar parada comendo tranquilamente,
minha mente está a mil por hora. É como se ainda estivesse
processando tudo o que aconteceu nessas últimas horas. Não sei o
que mais está me deixando atordoada, a traição ou o beijo.
— Posso me sentar com você? — Levo um susto ao ver
Nando em pé ao meu lado. — Desculpa, não queria te assustar.
Não consigo dormir.

Por que será que não consegue? Será que aquele beijo
também significou algo para ele? Será que as mesmas dúvidas que
pairam na minha cabeça também estão na dele? Minha cabeça
parece que vai explodir! Queria que tudo isso não tivesse
acontecido. Queria minha vida perfeita de volta.
— Pode sentar. Você está na sua casa. — Aponto para a
cadeira.
— Estou na nossa casa, Aurora. — Ele se senta e fica me
observando.
— Não vou conseguir comer com você me encarando. Quer
um pedaço? — Levanto o garfo com o último pedaço de pizza.

— Obrigado, já comi mais cedo. Eu te chamei, mas não


respondeu então deduzi que havia dormido. — O jeito que me olha
já revela que quer conversar sobre algo. Ou melhor, sobre o que
aconteceu mais cedo. Eu o conheço muito bem, mas não sei se
estou preparada pra isso. — Aurora... Eu não sei como dizer isso,
mas não quero que nada entre nós mude. O que aconteceu mais
cedo foi algo de impulso, sei que deixei você ainda mais atordoada,
eu não deveria ter feito aquilo.
— Realmente não deveria — digo baixinho, encarando o
prato vazio.
— É que te ver chorar daquele jeito mexeu comigo, e ver
seus olhos inchados do jeito que estão agora… — Nando segura
meu rosto e me faz encará-lo. Por que não consigo mais vê-lo como
antes? Isso é errado demais. — Me faz querer ir até onde aquele
imbecil está e acabar com ele — diz, cerrando os punhos.
— Já falei pra você que temos que esquecer o que
aconteceu. Vamos seguir em frente, Nando. Não precisa se
preocupar. — Minha mão já se move para a dele, quase que
inconscientemente, mas hesito e, por fim, desisto. E isso não passa
despercebido a ele, que observa cada movimento meu.
— Não consegue nem me tocar e fala pra seguimos em
frente? — Seu olhar é triste e sua voz, baixa.
Me levanto, fingindo não ouvi-lo, e levo a louça até a pia.
Então murmuro um “boa noite, Nando” e parto rapidamente para as
escadas.

Minha vontade nesse momento é sumir. Eu sei que, mesmo


afirmando o contrário, nosso relacionamento jamais voltará a ser
como antes. Cometemos um erro e não tem como voltar no
passado. Entro rapidamente no quarto, sigo para o banheiro e
escovo os dentes. Em seguida, me olho no espelho e percebo como
estou um caco. Em questão de horas, perdi todo o equilíbrio que
demorei anos para juntar. Suspiro e me arrasto até a cama,
aconchegando-me sob as cobertas, rezando pra que a noite de
sono reestabeleça tudo que está confuso aqui dentro.
Não consigo dormir. Me viro de um lado para o outro na cama
e aperto a cabeça contra o travesseiro e tento não pensar em nada,
mas a lembrança do que aconteceu continua voltando à minha
mente, se repetindo sem me dar um único segundo de descanso.
Devo estar ficando louco. Como pude beijar minha própria irmã?
Aurora e eu sempre fomos muito ligados, companheiros um do
outro. E agora vejo que coloquei tudo a perder por causa de um
simples beijo. Por um sentimento que só eu devo estar sentindo.
Não consegui me controlar. Quando dei por mim, meus lábios
já estavam colados aos dela. E foi tão bom e tão errado ao mesmo
tempo.
Cansado de esperar o sono vir, me levanto e vou até a
cozinha pegar um copo d'água. Ao abrir a porta do meu quarto, vejo
que a do dela também está aberta. Penso em entrar, mas logo
desisto. Mas, para a minha surpresa, assim que desço as escadas e
noto a luz ligada, vejo Aurora sentada à mesa, comendo, perdida
em seus pensamentos. Mesmo não tendo certeza do que dizer, sei
que preciso conversar com ela.
Meu olhar passeia pelo seu corpo. Aurora está usando uma
camisola de seda rosa e seus cabelos estão presos em um coque; a
pele branquinha está muito à mostra. Mas por que estou prestando
tanta atenção nisso? Parece que depois daquele beijo algo se
desencadeou dentro de mim e me deixou assim. Que droga! O que
estou fazendo?
Mas não posso evitar. Enquanto ela come, fico, em silêncio,
admirando-a. E vejo que seus olhos estão inchados. Culpa daquele
idiota do Henry. Como ele teve coragem de trair uma garota como
ela? Aurora é a garota mais incrível que conheço. Tudo o que eu
queria era parti-lo ao meio. Como pode ser tão otário?
— Posso me sentar com você? — pergunto e, em pouco
tempo, percebo que me reaproximar de Aurora não será tão fácil
como esperava.
Quando ela fica com receio de me tocar, sinto meu coração
se quebrar no peito. Quero continuar conversando, mas Aurora foge
novamente. Uma certeza eu tenho: não vou deixá-la se afastar de
mim. Me levanto e vou até o quarto dela, decidido a resolver isso de
uma vez por todas. Entro devagar e a vejo encolhida, a luz de sua
luminária em formato da Torre Eiffel iluminando o local. Meu coração
se aperta ao perceber que está chorando.
— Nando, o que está fazendo aqui? — murmura assim que
me vê.
Me sento ao seu lado e acaricio seus cabelos dourados.

— Não quero que se distancie de mim novamente, Aurora.


Pare de fugir. Eu quero cuidar de você. Sei que seu coração está
despedaçado. Lembra de quando você tinha medo dos trovões e ia
correndo pro meu quarto pra dormir comigo? — Ela balança a
cabeça, confirmando. — E quando alguém te irritava na escola,
quem era que te defendia no mesmo instante?
— Você. — Sua voz sai embargada.
— Eu sempre estive ao seu lado e sempre estarei. Não existe
Nando sem Aurora.
Ela abre um pequeno sorriso.

E eu não estou mentindo. Aurora sempre esteve ao meu lado


desde quando nasci. Não tenho ideia de como seria a vida sem ela.
E me nego a descobrir como é.
— Lembra quando caí da bicicleta na primeira vez que andei
sem rodinhas? Manu te deu uma bronca daquelas — Aurora diz,
ainda sorrindo, e acabo rindo da lembrança.
— Sim. Mas você a convenceu que fui forçado a te deixar
andar na minha bicicleta, mesmo não sendo verdade. Fui eu que te
desafiei a andar nela. Sabe por que você fez isso?
— Porque somos parceiros — fala, baixinho.
Eu assinto.
— Um nunca quer ver o outro na pior, mesmo que isso
signifique aguentar as consequências de uma coisa que não fez. —
Mesmo não sabendo se devo continuar aqui tão próximo a ela, faço
a pergunta que está entalada em minha garganta. — Posso me
deitar do seu lado, como fazíamos quando éramos pequenos?
Aurora não responde de imediato e isso me deixa apreensivo.
Quando vai mais para o lado e levanta o edredom rosa, solto um
suspiro aliviado. Tiro meus chinelos e me deito ao seu lado. Ficamos
virados um para o outro em silêncio por um tempo.
— Eu queria tirar essa dor do seu peito. Não gosto de te ver
assim desanimada. — Acaricio sua bochecha. Sua pele é tão macia
e gostosa de tocar. Pare com isso, Fernando! grita meu
subconsciente. Então afasto minha mão.
— Preciso confessar que não estou assim apenas por Henry,
mas... — Ela não completa a frase, mas já sei o que iria dizer.
Aquele beijo também despertou algo dentro dela. Só não sei se para
ela é bom ou ruim.
— Posso te perguntar uma coisa?
— Pode.
— Você sentiu alguma coisa quando te beijei? Eu sei que
você pediu pra esquecer o que aconteceu, mas quero muito saber.
— Olho em seus olhos. — Eu preciso muito saber, Aurora.
— Não sei se é uma boa entrar nesse assunto novamente,
Nando.
— Só me responde isso, por favor.
— Estou confusa com o que senti. Nós somos irmãos. Nunca
era pra ter acontecido aquilo.

— Mas aconteceu. E pra ser sincero com você, estou com


vontade de te beijar novamente. — As palavras saem sem que eu
tenha qualquer controle sobre elas e Aurora me olha surpresa. Sem
esperar uma resposta e sentindo meu coração pulsar
descontroladamente, encosto nossos lábios.
Nesse momento, já estou por cima dela na cama. Nosso beijo
é maravilhoso. O gosto de Aurora é diferente. Seus dedos entram
por minha camisa, as unhas arranhando minhas costas. Ela me
excita como nenhuma outra. Enquanto a beijo, uma de minhas mãos
passeia pelo seu corpo, tocando-a como se pudesse desaparecer a
qualquer momento. Encosto a ponta do dedo em seus seios e vou
descendo até a cintura. Separo os nossos lábios e olho em seus
olhos; brilhantes, tão perdidos quanto os meus. Sua respiração está
irregular, pesada e vejo quando a expressão muda em seu rosto e
os primeiros traços de pânico começam a surgir.
— O que estamos fazendo, Nando? — ela pergunta.

Tentando esconder a decepção, me afasto e me deito ao seu


lado. É claro que ela está arrependida.
— Pra ser sincero, nem eu sei — confesso. — Pode parecer
loucura, mas a sensação de estar com você em meus braços é tão
boa.

— E se Caio e Manu descobrirem? Não quero decepcionar


nenhum dos dois. — Aurora recua, distanciando-se cada vez mais
de mim, e se senta. — Não quero ser uma decepção pra eles.
— Você nunca será uma decepção — murmuro. — Eles te
amam e sentem muito orgulho de você. Assim como eu.
— Acho que é melhor ir para o seu quarto, Nando — ela diz,
fugindo do meu olhar.

— Você não vai tentar me afastar novamente nem me pedir


pra esquecer o que aconteceu aqui, né?
Mesmo sabendo que Aurora é legalmente minha irmã, não
consigo mais vê-la da mesma forma. Agora tudo mudou. Nós
mudamos. E por que isso deveria ser errado?

— Não vou te pedir pra esquecer e nem vou te afastar — ela


diz, mas não sinto nenhum pingo de firmeza em suas palavras.
— Aurora, não faz isso comigo. — Seguro seu rosto e a faço
olhar para mim novamente. — Quero ficar com você, nem que seja
escondido.
Aproximo nossos rostos e a beijo. E quando os seus lábios se
movem com os meus, devagar, hesitantes, meu peito se aperta com
o gosto de despedida em minha língua. Ela se afasta e acaricia a
minha bochecha. Há tristeza em seu olhar.
— Boa noite, Nando — ela sussurra.

— Você tem certeza que quer que eu vá? — pergunto


baixinho e ela assente.
Mesmo contra minha vontade, me levanto, calço meus
chinelos e saio do seu quarto sem fazer barulho. Volto para o meu e
me deito com as mãos embaixo da cabeça.
Tudo isso está parecendo uma montanha-russa. Uma hora as
coisas fluem bem, na outra tudo desmorona. Não sei o que fazer!
Ela diz estar confusa com tudo isso, mas eu também estou. Mesmo
assim, quero ficar ao seu lado. Por que ela não compreende que
não há mal quando não somos irmãos de sangue? Por que insiste
em me manter longe?
Eu nunca desejei uma mulher como desejo Aurora. Nunca
senti por nenhuma outra o que sinto quando seus lábios estão
colados aos meus. Ou quando a vejo sorrir pra mim, ou quando diz
que eu sou seu melhor amigo e confidente. Eu espero que tudo isso
se resolva e ela possa perceber que negar o que está sentindo só
irá ferir nós dois. Se tudo isso for um grande pecado eu não ligo, por
ela, vou para o inferno feliz.

Acordo meio atordoado. Não consegui dormir bem essa noite.


Me levanto e vou ao banheiro, tomo um banho e me arrumo. Hoje é
domingo então a família toda estará reunida em volta da mesa.
Mesmo sabendo que vejo Aurora todos os dias desde que nasci,
hoje me sinto nervoso. É diferente. Tenho medo dela se quer
conseguir me dirigir a palavra. De não me olhar nos olhos. Não
sorrir pra mim. Respiro fundo e abro a porta do quarto. Eu preciso
ter coragem de enfrentar as consequências dos meus atos. Fui eu
que a beijei, não só uma vez, mas duas. Eu fui atrás dela em seu
quarto. Eu toquei seu corpo. Por alguns segundos encaro a porta de
seu quarto que está fechada. Respiro fundo e sigo meu caminho.
— Bom dia — digo, me sentando à mesa.

Percebo que só meus pais estão presentes. Aurora ainda


deve estar dormindo.
— Vejo que nenhum dos dois acordou muito bem hoje —
minha mãe fala, preocupada.

Então quer dizer que Aurora já acordou. Será que já voltou


para o quarto?
— Só estou com dor de cabeça, mãe. Não precisa se
preocupar. — Sorrio na tentativa de tranquilizá-la. — Aurora já
tomou café?
— Já. Ela se levantou cedo, tomou um café rápido e foi pra
casa de Camila. — Minha mãe me serve um pedaço de pão e
agradeço.
Aurora está me evitando. Mesmo sabendo da grande chance
disso acontecer, não consigo evitar de sentir um aperto no peito.
Uma mistura de arrependimento e culpa.
— Como rolou tudo aquilo com o vagabundo do Henry, ela
deve estar precisando de um tempo com sua melhor amiga. Tenho
dó daquele garoto. Quando ele aparecer na minha frente... — Meu
pai balança a cabeça, com um sorriso perigoso nos lábios.
— Caio, você não vai dar uma surra nele! Já conversamos
sobre isso. — Minha mãe cruza os braços e o encara, séria.
— E eu já disse que não garanto nada. Aquele moleque
safado machucou minha filha e não vai sair impune. Pode ter
certeza disso.
Enquanto os dois discutem sobre dar uma surra em Henry ou
não — se bem que ele merece, e eu até ajudaria meu pai com isso
— meu pensamento está em Aurora. Estará mesmo buscando
consolo com a amiga ou uma fuga?

Estou deitada no colo de Mari e ela tenta me animar. Hoje


estou me sentindo pior que ontem. Eu prometi a mim mesma que
nunca mais iria acontecer nada entre Nando e eu, mas bastou ele
pedir pra se deitar ao meu lado que aceitei. Mesmo sabendo do
perigo, mesmo sabendo que algo mudou entre nós. Quando ele
estava sobre mim, me beijando intensamente, quando sua mão me
tocava como se fosse tudo o que ele mais desejava no mundo, me
senti tão bem. Por alguns minutos era só Nando e Aurora, duas
pessoas descobrindo novos sentimentos, novos desejos. E não
Nando e Aurora, irmãos adotivos. Eu suspiro.
— Amiga, não fica assim. Pensa pelo lado bom. É melhor ter
descoberto agora do que nunca descobrir e Henry te enganar por
anos. Você já falou com ele?

— Não. Ele me ligou várias vezes, mas não tive coragem de


atender.
Meu celular começa a tocar e sei que é ele. Mari o toma de
minha mão e atende. Fico sem entender.
— Oi, Henry. Ela não pode atender. Agora estamos na casa
de uns amigos. Aurora está na piscina nadando com Júlio. Sim,
esse Júlio mesmo. Você já vai voltar pra casa?! Mas ela disse que
você ficaria uma semana fora. Vou avisar, espera aí... Aurora,
amiga! — Ela faz uma pausa. — Henry, ela está muito distraída
conversando, mas depois eu aviso. Até. Tchau!
— Não acredito que fez isso. Ele morre de ciúmes de Júlio.
Mari abre um grande sorriso.
— Eu sei. Você tinha que ouvir, ele ficou louco.

Eu rio.
— Você é maravilhosa, Mari! — Me sento e a abraço.
— Nós somos. Mas sinto que não é só isso que está te
incomodando. — Ela segura minhas mãos. — Aconteceu mais
alguma coisa?
Mari me conhece tão bem. Ela, Nando e eu sempre fomos
muito ligados. Crescemos juntos e seus pais são nossos padrinhos.
— Aconteceu uma coisa ontem que me deixou mais
atordoada.
Mari me olha com curiosidade.
— Coloca tudo pra fora. Você sabe que não vou te julgar.
Respiro fundo para tomar coragem de entrar nesse assunto.
— Nando e eu nos beijamos.
Mari fica literalmente de boca aberta. Eu sei que ela já
aprontou muito nessa vida, bem mais que eu, mas também sei que
nunca beijou seu irmão, ou meio irmão, até porque ela não tem
nenhum dos dois.
— Menina, que babado! Me conte os detalhes.
Nós duas nos deitamos na cama e ficamos olhando para o
teto.

— Eu te contei como descobri sobre Henry, mas omiti a parte


do beijo. Quando estava sentada na cama dele, estava com os
olhos fechados, sentindo seu toque. Nem sei por que fiz isso, mas
Nando aproximou seus lábios dos meus e me beijou.
— O que você sentiu? Seja sincera.
— Eu gostei muito! Isso me deixou ainda mais confusa. Ele é
meu irmão! — Coloco as mãos no rosto, a angústia me consumindo.
— Nem sei o que dizer sobre isso. É muita coisa pra uma
pessoa só! Nem sei como você não surta.
— Mas estou a ponto de enlouquecer — admito. — E ainda
tem mais. — Mari se vira para mim. — Nando foi ao meu quarto
após uma conversa rápida que tivemos na cozinha. Já era de
madrugada.
— Vocês...?
— Não! Mas foi por tão pouco. Estava tão perdida no
momento. Sério, Mari, Nando me deixou louca de desejo. — Solto
um suspiro só de lembrar de seu toque, seus beijos. — Já estou há
bastante tempo na seca. Nem me lembro quando foi a última vez
que Henry e eu transamos. Não sei se isso ajudou a deixar que algo
tão errado acontecesse.
— Ai, amiga. Eu não te julgo, Nando é um pedaço de mau
caminho, igual ao pai.
— Mari! — exclamo em tom de repreensão. Ela se vira para
mim.
— Amiga, eu não tenho culpa se os dois são gostosos.
Pegaria pai e filho juntos se eles quisessem. — Ela dá um
sorrisinho. — Só não dou em cima deles por respeito a você e sua
mãe.
— Mari, você é muito safada!
— Só sou realista. — Dá uma piscadela. — Agora, voltando
ao assunto, o que vai fazer em relação a Nando? E ao Henry?
— Ainda não sei sobre Nando. Vou tentar evitá-lo ao máximo,
até entender tudo. E claro que vou terminar com Henry assim que o
vir pessoalmente. Vou esfregar aquela foto na cara dele. Mas pra
isso preciso falar com Nando, pra que ele me envie. Sabe qual a
pior coisa, Mari?
— Não faço ideia.
— Nando disse que quer ficar comigo mesmo que seja
escondido.
— Se fosse eu, já estava afogando minhas mágoas no leite,
se é que me entende.
— Você não disse isso! — Olho para ela incrédula.
— Ah, eu disse sim! E você me ama pelo jeito que sou, então
não reclame.
— Esse assunto é muito sério, Mari. — Seu olhar agora
transborda compaixão. — Nando é meu irmão. Isso não é certo.
Não poderia sentir por ele nada além de um amor fraternal.
— Aurora, você sempre foi uma boa filha e irmã. Sempre
seguiu as regras. A única coisa errada que fez na vida foi roubar
uma caneta da Paloma no quinto ano do fundamental e porque eu te
desafiei na hora do intervalo. — A lembrança desse dia vem a
minha mente. Me senti horrível por isso. Mesmo sabendo que era só
uma caneta.

— E no dia seguinte eu pedi pra Manu comprar duas e


devolvi a ela. — Mari balança a cabeça concordando.
— Sei que se ficarem juntos terão que enfrentar uma barra,
mas se está com medo por causa de seus pais, eu acho que seria
uma grande surpresa pra eles assim como foi para mim, apenas
isso.

— E se eles acharem que desrespeitei nossa família? Caio e


Manu são tudo pra mim. Não suportaria envergonhá-los. O mundo
inteiro irá nos julgar se isso for além.
— Tem que parar de se importar tanto com a opinião dos
outros. Já faz tempo que parei com isso e minha vida melhorou
bastante. Precisa tentar, Aurora. — Ela me olha nos olhos. — O que
eles pensam de você não define quem você realmente é. —
Ficamos um tempo em silêncio encarando o teto. — Nando será o
pecado de Aurora — sussurra. — Isso é excitante.

— Você não tem jeito, Mari. — Balanço a cabeça. Ela dá de


ombros.
— Tive uma ideia! Vamos nos levantar, separar uma roupa
bem bonita, fazer o cabelo e uma maquiagem perfeita, pra quando
Henry chegar, ver o que realmente perdeu. Ele vai se arrepender
amargamente de ter te traído.

— Não sei o que faria sem você. — A abraço e beijo sua


bochecha.
— Nós somos irmãs. Mas não vamos nos pegar! — Mari ri da
própria piada. Essa menina é impossível. — Agora vamos começar
nosso programa de beleza.
Mari começa escolhendo um vestido preto muito curto de
couro, bem colado ao corpo. Ela diz que tem que ser algo bem
sensual, para Henry ficar excitado assim que me encontrar. Só para
ter a dor de me ver e saber que não poderá mais me tocar. Depois
de arrumar meu cabelo e fazer a maquiagem, ficamos no quarto por
horas ouvindo música e cantando. Fico feliz por ter decidido vir para
cá logo cedo.
Meus padrinhos dão uma passadinha aqui no quarto. Ricardo
diz que já irá ligar para a funerária, porque quando Caio colocar as
mãos em Henry, não sobrará nada. Nós rimos, mas depois penso se
Caio poderá mesmo fazer alguma coisa com ele. Mas então me
lembro que, se acontecer algo, não será culpa minha. Eu sempre fui
fiel a ele durante esses dois anos, já ele... Camila entra e nos traz
comida e passa um tempo conversando com nós duas. Mari puxou
muito à mãe em questão de personalidade, mas também tem muito
de Ricardo. Ela é uma mistura exata dos dois, e é perfeita até em
suas imperfeições.

— Vamos pegar todas essas roupas — Mari aponta para as


roupas que estão sobre a cama — e vamos tirar fotos novas pra
você colocar nas suas redes sociais. Ainda mais agora que vai ficar
solteira.
— Vai dar muito trabalho, Mari! — Me jogo em cima da pilha
de roupas.

Ela me lança um olhar de repreensão, pois estou


bagunçando meus cabelos, e no mesmo instante me sento.
— Estou te oferecendo meu serviço gratuito e você está
reclamando só por ter de trocar de roupa? — Mari leva as mãos à
cintura. — Meu amor, sua amiga é uma fotógrafa profissional. Faça
proveito disso.
— Me desculpa, fotógrafa profissional — digo bem-
humorada. — Posso escolher mais três peças de roupa? Se for
colocar tudo que está na cama, Henry vai chegar e ainda estaremos
aqui.
— Tá bom! Só espera aqui que vou buscar algumas coisas
de iluminação na garagem. — Mari sai correndo do quarto.

Pego meu celular e vejo que tem várias mensagens de Henry


perguntando onde estou, o que estou fazendo e com quem estou. A
última diz que em quarenta minutos ele estará aqui. Quer dizer, lá
em casa. Faço questão de visualizar e não responder. Me olho no
espelho e quase fico surpresa ao me dar conta de como esse
vestido me deixa bonita. Será que Nando vai gostar quando me vir
com ele? Nem sei porque pensei nisso. Nando conseguiu bagunçar
a minha mente.
— Ei, gostosa! Vamos começar as fotos.

Na maioria das fotos saio rindo. Não consigo me segurar,


Mari fica fazendo gracinha e depois reclama que não estão
sensuais. Mas acredito que não há nada mais chamativo em uma
mulher que um belo sorriso. Quando terminamos, Mari e eu nos
sentamos na cama e ficamos admirando o trabalho excepcional da
minha amiga. Ela é uma fotógrafa excelente. As fotos ficaram
perfeitas.
— Amiga, todas ficaram muito boas – obviamente, porque fui
eu que tirei –, mas essa com o vestido, a que está com o dedo na
boca e cara de safada, é pra deixar qualquer homem louco!

— Você que me mandou fazer essa cara, sua boba. — A


empurro na cama e nós duas rimos.
— Pelo menos uma foto sensual nós conseguimos — diz,
sem desviar os olhos da câmera.

— Agora tenho que ir, ou Henry chegará lá antes de mim.


— Não deixe nem por um segundo que ele te faça sentir que
é culpada pela traição, está me ouvindo? — Balanço a cabeça,
concordando. — Mostre a ele a mulher forte que é. O que ele
perdeu e nunca mais terá.

— Pode deixar.
Após me despedir da família toda e agradecer pelo carinho,
sigo meu caminho para casa. Meu estômago está se revirando. Sei
que será difícil enfrentar Henry. Não tem como apagar tudo o que
vivemos nesses últimos anos, mas preciso ser forte. Não vou
derramar nenhuma lágrima em sua presença. Assim que chego,
vejo Henry descendo do carro. Chegamos praticamente juntos. Ele
me olha dos pés à cabeça, admirado. Nunca havia usado um
vestido assim tão chamativo. Mari tem razão, preciso ousar mais,
aproveitar do corpo que tenho. E é isso que irei fazer a partir de
hoje.

— Onde você estava? E com essa roupa? Tentei falar com


você o dia todo. O que está acontecendo, amor? — Ele vem até
mim e tenta me dar um beijo, mas viro o rosto e cruzo os braços. —
Aurora, não estou gostando disso.
— Nós precisamos conversar. Você...
Sou interrompida pelo barulho da porta se abrindo com
violência e, quando nos viramos, vemos Caio saindo de casa
bufando. Nunca o tinha visto tão furioso. Ele vem até nós, segura
Henry pelo colarinho e o arrasta para dentro. Sigo os dois até a sala,
onde Caio o joga no sofá e dá um soco em seu rosto.
— Você é um moleque safado! — Caio desfere outro soco,
que faz seus lábios sangrarem.
Henry está sem reação. Dá para ver em seus olhos que não
está entendendo nada. E está com muito medo.
— Chega, Caio! — Manu entra na frente e faz com ele se
acalme um pouco.
— Eu não sei o que está acontecendo. Não fiz nada! —
Henry limpa o canto dos lábios.
— Isso aqui é nada!? — Nando, que eu nem notei quando
apareceu, pega o celular e mostra a foto.

Henry fica branco. Parece ter visto um fantasma. Ele se vira


para mim e se levanta. Nesse momento, me seguro para não chorar
novamente. Estou me sentindo tão humilhada.
— Não é nada do que parece, Aurora. Você sabe que amo só
você. Isso deve ser montagem. — Ele tenta chegar mais perto, mas
Nando o impede. — Nós vamos resolver isso juntos — diz olhando
em meus olhos.
Caio dá uma risada irônica.
— Você não chega mais perto dela, seu.... Olha, eu nem
tenho palavras pra descrever o que você é. Qualquer insulto ou
palavrão vai parecer um elogio. — Caio coloca o dedo em seu peito.
E com uma voz capaz de colocar medo em qualquer um, diz: — Se
te vir perto dela de novo, eu te quebro e não vai ter como Manuela
me impedir. Isso que ganhou hoje não é nem um terço do que
realmente quero fazer com você por ferir o coração da minha
menina.
— Ele já entendeu o recado, Caio — Manu diz, afastando-o
dele.
— Me perdoa, Aurora. Fui fraco, mas não quero te perder.

Eu me forço a me manter firme. A não chorar. A não deixá-lo


me ver sofrendo.
— Não. Tudo entre nós acabou no momento em que você
ficou com outra. Agora tudo o que quero é esquecer que já
estivemos juntos.

Henry tenta dar um passo em minha direção, mas para


quando ouve Caio bufar.
— Meu pai já deu o recado dele — Nando diz, aproximando-
se rapidamente dele. — Agora falta o meu.
Ele dá um soco atrás do outro em Henry até ele cair no chão,
atordoado. Por um instante, penso que ele irá revidar, mas parece
ter um pouco de consciência da sua desvantagem. E não vou
mentir, vê-lo ali caído no chão com o rabo entre as pernas é muito
bom.
— Não vou conseguir segurar os dois! — Manu diz, ainda
agarrando Caio, que parece louco para se juntar ao filho.
— Já deu, Nando. — Eu o puxo e olho para Henry e para o
sangue em seu rosto. — É melhor você ir embora.
Ele assente.
— Você vai sentir minha falta, Aurora — murmura assim que
põe o pé na porta.

— Menino, se você não quiser morrer hoje, sugiro que corra


— Manu diz e Henry sai como um foguete.
— Você está muito bonita — Nando fala baixinho, tentando
mudar o foco de tudo que acabou de acontecer na nossa frente.
Percebo que ainda estou segurando sua mão, então a solto.
— Estou me sentindo mais relaxado agora. — Caio abre um
grande sorriso.

— Já eu estou tensa. Vou tomar um banho de banheira pra


relaxar — Manu diz, dando um sorriso malicioso ao marido.
— Vejo vocês depois — é o que ele diz, mal nos olhando
enquanto a segue.
Me sento no sofá e Nando faz o mesmo, acomodando-se
muito perto de mim. Sinto meu coração acelerar no mesmo instante.
— Aurora, não consigo ficar longe de você, ainda mais te
vendo assim com esse vestido. — Seu olhar percorre meu corpo. E
mesmo sem ao menos me tocar, me arrepio toda.
— Nando, não podemos. — Mas no fundo, eu sei que minhas
emoções contradizem as palavras, principalmente com ele me
olhando com tanta admiração e desejo.
— Mas eu quero e sei que você também quer. — Nando
chega perto do meu ouvido. — Sua pele está arrepiada, Aurora. Ela
está pedindo meu toque.

Nesse momento, minha respiração falha.


Deus! Que mulher em sã consciência conseguiria aguentar
uma provocação dessa?
Quando dou por mim, já estamos aos amassos no sofá.
Nando me beija com urgência, como se sua vida dependesse disso.
Sua mão toca meu corpo intensamente e minha vontade é de
arrancar suas roupas e me entregar a ele aqui mesmo. Seus lábios
agora exploram meu pescoço e deixo um gemido baixo escapar.

— Não geme assim. Tudo o que queria agora era te arrastar


pro meu quarto e beijar cada parte do seu corpo. — Sua voz rouca
no meu ouvido deixa transparecer o tamanho de seu desejo.
Meu corpo parece pegar fogo. Escutamos passos vindo das
escadas e nos afastamos rapidamente. Arrumo minha roupa e meus
cabelos e Nando coloca uma almofada em seu colo, para ninguém
ver o volume que se formou. Apesar do momento tenso, não
consigo conter o riso. Ele me olha com os olhos semicerrados e um
sorriso malicioso.
— Vou começar a fazer o jantar. Vocês querem algo
especial? — Manu pergunta, sem tirar os olhos do celular que está
em sua mão.
— O que você fizer pra nós está bom — Nando diz.
— Tudo bem, então. — Ela dá de ombros e vai a caminho da
cozinha.

— Preciso de um banho gelado. — Nando suspira.


Ele se levanta, mas antes de ir, se aproxima do meu ouvido.

— Eu preciso de você, Aurora. Eu quero você e sei que


também me quer. Pare de lutar contra isso. — Me dá um selinho e
se vai.
Me jogo para trás no sofá sem acreditar que cai em tentação
novamente. Mari tem toda razão: Nando é realmente o meu pecado.
Assim que o táxi me deixa em frente ao prédio, me pergunto
se não deveria ter avisado antes. Espero não estar incomodando.
Entro no estúdio de Mari, meu olhar percorre o local e noto as
mudanças que fez desde a última vez que estive aqui. Ele é tão
estiloso quanto ela. Não vejo a hora de inaugurar a minha loja. Ter o
meu cantinho. Vejo que está realizando um ensaio fotográfico de
uma gestante. Ela escolheu o tema branca de neve e digo com toda
certeza que combinou muito bem.
Mari sorri para mim e retribuo com um aceno. Me sento na
cadeira, pois não quero atrapalhar seu trabalho, e fico admirando a
gestante. Pelo tamanho de sua barriga, já dá pra saber que está
perto de dar a luz. O jeito carinhoso que olha para a barriga me faz
pensar se minha mãe também olhava assim pra mim. Manu nunca
me deixou faltar amor, mas queria muito ter tido a oportunidade de
conhecer a mulher que me deu a vida. Queria ao menos ter uma
foto, mas nem isso tenho. A única coisa que sei sobre ela é que era
uma mãe solo.

Por muitas vezes me perguntei o motivo de meu pai não me


querer. Mas tem a hipótese dele não saber da minha existência.
Talvez Dulce não tenha contado a ele. Ele poderia ser casado ou
algo do tipo. Será que se soubesse que tem uma filha teria cuidado
de mim quando minha mãe partiu após o parto? Se bem que se isso
tivesse acontecido, não teria conhecido Manu e Caio e não teria
Nando na minha vida. Já pensei em investigar mais sobre os meus
pais, mas o medo não deixou. Prefiro seguir com a família que Deus
me deu. Com a vida que até dois dias atrás estava perfeita.
— Pode ir se trocar, querida. As fotos ficaram incríveis. —
Sorrindo, a mulher assente e se retira. Me levanto e vou até Mari. —
Oi, amiga, como está? — Ela me abraça.

— Mais atordoada que ontem.


— E eu nem sabia que isso era possível. — Nós rimos, mas
meu riso é de nervosismo. — Só espera essa cliente sair que vamos
conversar um pouco. A próxima só chega daqui uma hora.

— Pelo visto, a promoção que fez para o ensaio de gestantes


foi um sucesso.
— E como foi. — Ela segura minha mão e me leva até o sofá
e nos sentamos. — E para o seu conhecimento, todas estão
adorando os vestidos que fez. A maioria dos ensaios são com o
tema de alguma princesa da Disney. Tenho que agradecer pelo
vestido e pela ideia. — Mari me abraça. — Você é meu amuleto da
sorte.

— Não sabe como fico feliz. Tive essa ideia quando estava
pela milésima vez assistindo o filme da Bela e a Fera com Nando. —
Sorrio ao me lembrar. — Nando passou o dia comigo assistindo
todos os live-action existentes das princesas da Disney. E eu sei
que não gosta, só fez isso para me agradar. Até cancelou a partida
de futebol pra ficar comigo. Estava muito melancólica devido
aqueles dias.
— Eu acho... Na verdade, tenho certeza que não há nada
nesse mundo que esse homem não faria por você.
— Eu... — Não termino a frase e dou um leve aceno para
Mari. Sua cliente está de pé bem atrás dela. Ela se levanta e nos
apresenta. Após se despedir, ela fecha a porta e volta para o sofá.
— Menina, eu daria de tudo pra estar lá e ver Caio todo bravo
batendo no traidor. Com aqueles braços fortes...

— Mari, você precisa parar de babar no meu pai. — A


empurro de leve com o ombro.
— Eu tento. Mas parece que fica mais lindo com o passar dos
anos. Até sua mãe sabe da admiração que tenho por ele. É com
respeito, amiga. Jamais daria em cima dele. — Mari tira os sapatos
e estica suas pernas sobre o sofá. — Mas vamos voltar ao assunto
principal. Aconteceu algo a mais ontem?

— Sim. Eu beijei Fernando novamente. Quer dizer, eu deixei


que ele me beijasse. Mas eu também queria. — Me afundo no sofá.
— Mari, eu não sei mais o que fazer. Quando estou longe dele, sinto
que posso parar com isso, que é um erro que não deve se repetir,
mas quando estamos juntos, quando ele me olha intensamente, me
sinto fraca.
— Conte-me mais.
— Ontem ele disse: Eu preciso de você, Aurora. Eu quero
você e sei que também me quer. Pare de lutar contra isso. Depois
me deu um selinho e se foi.
— E você quer? — Apenas a encaro sem responder. —
Aurora, seja sincera, não vou te julgar, nunca fiz isso e com certeza
não farei agora. Eu sei como isso está te deixando confusa, só
quero te ajudar a enxergar as coisas.

— Eu quero Mari — digo em voz baixa. — Eu nunca quis me


entregar a um homem como quero para Fernando. — Sinto uma
lágrima rolar no canto do meu olho. Mari se inclina e a limpa com o
polegar. — Mas sei que não é o certo.
— Acha que ele não seria um bom companheiro?
— Não é isso. Eu sei que seria o melhor — digo com
sinceridade. — Fernando é um homem maravilhoso. Apesar de ter
apenas 23 anos, é muito responsável e sempre me tratou como uma
verdadeira princesa.
— Então dê uma chance a ele. A vocês. — Mari pega a bolsa
que está ao seu lado e tira uma barra de chocolate de dentro. Ela
quebra um pedaço e me entrega. — Chocolate vai bem com tudo.
— E se não der certo? — Levo um pedaço até a boca.
— Há sempre a chance de algo em nossa vida não dar certo
e mesmo assim nós tentamos. — Nisso ela tem razão. Pego mais
um pedaço de seu chocolate. Mari é viciada nesses chocolates
belga. E eu entendo o motivo. — Amiga, o dia de amanhã é e
sempre será uma incerteza. Tudo pode dar certo ou dar errado.
Temos que tentar viver da melhor maneira possível. Se estar com
Fernando te faz bem, nada mais importa.

— Namorar um professor de filosofia realmente mexeu com


você. — Ela ri.
— Você não tem ideia. Ele adora quando falo assim. Diz que
o excita.
— Eu não precisava saber desse detalhe. — Faço uma
careta e Mari gargalha.
— Falando sério agora. Você precisa se perguntar se está
pronta para enfrentar todo o preconceito que virá. A vida de vocês
não será mais a mesma.

Encaro meu reflexo no espelho. Esse vestido ficou melhor do


que imaginei. Minhas mãos tocam a seda preta que está colada ao
meu corpo. Mari e eu iremos sair pra comemorar que fechou uma
parceria com uma loja de grife da cidade. Durante as últimas
semanas, pouco interagi com Nando. Ele está trabalhando bastante
na loja de Caio e sempre que chega estou fora e quando retorno ele
já está dormindo de tão cansado. Sei que isso não é justo com
nenhum dos dois, mas estou dando um tempo para saber se é isso
mesmo o que queremos. Talvez eu devesse tê-lo avisado que me
distanciei por esse motivo.
Escuto alguém buzinar em frente a casa e sei que é Mari.
Pego minha bolsa e assim que estou saindo do quarto, esbarro em
Caio.
— Se machucou? — Ele me avalia dos pés à cabeça com um
olhar preocupado. Balanço a cabeça negando. — Você está muito
linda, filha.
— Obrigada. — Sorrio para ele. — Mari está me esperando.
Devo chegar tarde hoje. Você avisa Manu?
— Aviso sim. Tome cuidado, Aurora. Qualquer coisa é só me
ligar que vou te buscar. — Assinto e dou um beijo em sua bochecha.
Começo a caminhar e ao ver que a porta do quarto de Nando está
aberta, olho para dentro, mas não o encontro. — Ele também saiu.
Pelo visto, os dois irão se divertir essa noite.
— Sabe se ele saiu com alguém? — A pergunta sai sem que
eu perceba.

— Não sei se iria encontrar alguma garota. Ele não disse


nada.
— Tudo bem. Espero que a noite dele seja boa. — Aceno
para Caio e sigo meu caminho.
Nando não é muito de frequentar baladas, ele curte outro tipo
de diversão. Só sai pra festas quando é alguma comemoração. Hoje
estou saindo pra comemorar com Mari, mas Nando está saindo pra
comemorar o quê? E principalmente com quem? Sei que não
deveria ficar enciumada, mas não consigo evitar que esse
sentimento se espalhe pelo meu corpo.
— Oi, amiga, está linda — diz Mari assim que entro no carro
e beijo sua bochecha.
— Você também está perfeita. — Toco os cachos de seus
cabelos. Sempre achei eles tão lindos.
— Vamos aproveitar a noite. Mas me lembre de não
exagerar. Ou terá que dirigir.
— Sabe que não gosto, Mari. Só faço isso em caso de
emergência.

— Eu estar embriagada é uma emergência. — Nós rimos.


Mari dá partida. Enquanto seguimos pela estrada, só consigo
pensar em Nando. Talvez essa distância tenha servido pra ele
perceber que aquilo que aconteceu foi passageiro. Carência ou algo
do tipo. Ele finalmente se tocou e está seguindo a vida
normalmente.
— No que está pensando?
— Nando também saiu essa noite. Caio que me avisou.

— Você ainda está fugindo dele, né? — Assinto. — Não que


seja ruim ter você lá em casa no período da noite, mas acho que
está na hora de parar com isso, Aurora.
— Vou parar. — Não sei se isso é mesmo verdade. — É que
eu precisava de um tempo. E ainda tinha Henry que ficava me
mandando mensagem.
— Você não o bloqueou?
— Sim. Mas ele sempre dava um jeitinho. Cria um perfil falso,
trocava de número. Mas deu uma parada após ameaçar contar a
Caio que estava me importunando.
— O medo de levar uma surra falou mais alto. — Balanço a
cabeça concordando. Mari estaciona o carro, solta o cinto e se vira
para mim. — Você sentiria ciúmes se visse Nando com outra
garota? Se o visse beijando, tocando outra? — Só de imaginar a
cena sinto meu sangue ferver e não era pra ser assim. Nunca senti
ciúmes dele nesse sentido.
— Não quero pensar em Nando nas próximas horas. — Solto
meu cinto. — Vamos nos divertir um pouco, Mari.

Desembarcamos, entramos na boate e seguimos para o bar.


Olho para minha amiga que está sorrindo enquanto beberica sua
Margarita de espumante.
— Tá bom. — Coloco minha taça em cima do balcão. — O
que a senhorita está aprontando?

— Eu?! — Ela leva a mão ao peito. — Nunca apronto nada.


— Pisca e toma mais um pouco da bebida.
— Aurora. — Meu coração dispara ao ouvir a voz de Nando.
Me viro e lá está ele, todo arrumado e cheiroso. Deus, como ele
está perfumado. — Você não vai fugir de mim hoje. Nós precisamos
conversar.
Chego em casa e a primeira coisa que faço é perguntar sobre
Aurora à nossa mãe. E mais uma vez ela diz que está com Mari no
estúdio. Desanimado, subo para o quarto. Não aguento mais essa
distância. Eu pensei que as coisas entre nós iriam melhorar após
aquele amasso no sofá, mas parece que tudo piorou.
Estou trabalhando até tarde essa semana. Meu pai está
passando a gerência da loja para mim e estou me esforçando pra
conseguir pegar o ritmo. Tudo o que queria após um dia cansativo
de trabalho era chegar em casa e ouvi-la cantarolando em seu
quarto. Ir até lá e a ver rodeada de desenhos, lápis e tecidos. Tiro
do bolso a trufa que comprei para ela e a coloco junto com as outras
dos dias anteriores. Me sento na cama e solto um longo suspiro.

— Está tudo bem, meu amor? — Olho para a porta e vejo


minha mãe com um olhar preocupado.
— Só estou cansado, mãe.

— Seu pai está te dando muito trabalho, não é? — Ela


caminha até mim e se senta ao meu lado. Começo a tirar meus
sapatos.
— Não é culpa dele. Se vou cuidar da gerência da loja daqui
pra frente, é natural ter mais trabalho.
— É somente isso que está lhe incomodando?
Por um momento penso em contar a ela o que estou
sentindo. Nunca escondi nada de minha mãe, mas isso não é algo
somente sobre mim, mas também sobre Aurora.
— Estou enrolado com uma garota que estou gostando. —
Suas sobrancelhas se erguem.

— Faz tempo que não te vejo realmente interessado em


alguém. — Ela abre um grande sorriso. Apesar de meus
relacionamentos não durarem muito, minha mãe sempre tratou
muito bem minhas namoradas.
— É complicado gostar de alguém que não sabe se quer ou
não ficar com você. — Me jogo para trás na cama.
— Essa garota deve ter algum problema, então — diz em um
tom brincalhão, se virando para mim. — Como pode não ter certeza
se quer ficar com um homem tão especial como você?
Sorrio para minha mãe.

— Acho que ela não sabe se vale o risco. — Suas


sobrancelhas se unem. Ela não está entendendo nada. — Ela não é
casada, mãe, pode ficar tranquila.
— Por um momento pensei besteira. — Ela sorri sem jeito. —
Mas sei que meu menino não se envolveria em algo desse tipo.
Você e Aurora são os melhores filhos que uma mãe poderia ter. Não
mudaria nada em vocês dois.
Por um momento, sinto um aperto no coração. Eu me
pergunto o que minha mãe diria se contasse quem é a garota.
— Falando nela... Você sabe se está tudo bem? Não a vejo
mais com tanta frequência. Estou com saudade.
— Acho que ela está precisando ocupar a cabeça após o que
aconteceu com Henry. Por isso tem passado bastante tempo com
Mari. — Só de ouvir o nome desse cara, sinto ódio. — Ela também
tem passado bastante tempo acompanhando a reforma da loja. Dei
uma passada lá ontem e está ficando muito linda.
— Entendi. — No fundo, eu sei que Aurora só está fazendo
isso pra se manter longe de mim. — Estou feliz por ela conseguir
realizar seu sonho. — Sou sincero. Ver Aurora feliz me faz feliz.

— Todo nós estamos. Agora vou finalizar o jantar. — Ela se


levanta, mas antes de sair se vira para mim. — Nando, nem tudo na
vida são flores, infelizmente aparecerão alguns espinhos. Se você
gosta muito dessa garota, então lute por ela.
— É isso o que farei. — Sorrindo, ela assente.

Novamente sozinho, pego meu celular e começo a digitar.


Eu: Precisamos conversar, Aurora. Você tem que parar de
fugir de mim.

Aurora: Estou muito ocupada, Nando. Chegarei em casa


tarde.
Digito e apago várias vezes. Não sei ao certo o que escrever.
Prefiro falar com ela pessoalmente.

— Obrigado por vir me encontrar — digo a Mari assim que se


senta à mesa. — Eu preciso da sua ajuda.
— Não precisa agradecer. E já imaginava que iria me ligar.

— Aurora está me evitando, Mari. Não sei mais o que fazer. E


não tem como pedir conselhos aos meus pais. Eles não fazem ideia
do que está acontecendo.
— Eu já pensei em algo no caminho para cá. — Meu coração
se enche de esperança. Eu sabia que ela poderia me ajudar. — Vou
te contar o plano, mas saiba que estará me devendo.
— Se você me ajudar, farei qualquer coisa que me pedir.

— Cuidar bem da minha amiga já será o suficiente, pelo


menos por enquanto. — Sorrio para ela, que devolve o gesto. —
Aurora acha que não percebo, mas sei que não está bem. — Ouvir
isso me aperta o peito. Tudo o que não quero é fazer Aurora sofrer.
— A distância de você também está fazendo mal a ela. E farei o que
for preciso para colocar um sorriso no rosto daquela menina.

Não gosto de frequentar esse tipo de lugar, sou mais um


show ou barzinho, mas não iria mudar os planos de Mari. Eu
realmente espero que isso dê certo. Não sei mais o que fazer pra
Aurora entender que eu preciso dela. Da sua amizade, sua
presença e de seus beijos. Eu poderia gritar para todos que estão
aqui que a desejo com cada pedacinho do meu ser. Até em seu
quarto já fui durante a madrugada, mas a porta sempre estava
trancada. É como se meu coração corresse até ela e sempre
batesse nessa barreira.
Do piso superior consigo ver Aurora e Mari entrando no local.
Meu olhar percorre todo o corpo da minha garota, ela está tão linda.
Gosto quando ela usa esse tipo de roupa que valoriza o seu corpo.
Mas percebo que não sou o único a admirá-la e isso me deixa
enciumado. No momento em que sorri para Mari, sinto meu coração
errar a batida. Já faz um tempo que não vejo esse sorriso que
sempre melhora o meu dia.

Tento controlar minha respiração, mas não consigo. Cada


passo que dou em sua direção meu nervosismo aumenta. Aurora
está de costas para mim e me forço a não encarar descaradamente
sua bunda, que está incrivelmente chamativa nesse vestido de
seda. Por um breve momento não consigo me controlar e meu olhar
desce por seu corpo e Mari percebe. Ela começa a rir e me sinto
envergonhado por ter sido pego no flagra.
— Aurora. — Ela se vira para mim e percebo por seu olhar o
quanto está surpresa por me ver aqui. Tenho certeza que se
soubesse que iria me encontrar, ela teria dado um jeito de não
aparecer. — Você não vai fugir de mim hoje. Nós precisamos
conversar.

— Eu vou dar uma volta — diz Mari. Aurora segura o braço


da amiga. Com um sorriso no rosto, Mari segura sua mão e a coloca
sobre a minha. Só de sentir sua pele macia mais uma vez sinto meu
coração aquecer. — Aproveitem a noite. — Logo ela some no meio
do povo.
Aurora me encara em completo silêncio. Seu olhar desce até
nossas mãos e ela a puxa. Odeio quando faz isso, quando tenta
fingir que não está sentindo o mesmo que eu.

— Não sabia que iria te encontrar aqui. — Aurora coloca uma


mecha de cabelo atrás da orelha. E ela faz isso quando está
nervosa. — Pensei que você estaria em um encontro.
— Um encontro? — Ela assente. — Talvez seja mesmo um
encontro. — Aurora me olha confusa. — Eu vim encontrar você. —
Suas bochechas coram. Levo minha mão até ela, mas Aurora dá um
passo para trás. Suspiro me sentindo frustrado.

— Os outros podem ver.


Apesar de querer dizer que pouco me importo com isso,
tenho que ir com calma. Se algo realmente acontecer entre nós,
como espero que aconteça, quero que sejamos nós a contar aos
nossos pais e não um bando de gente fofoqueira.

— Desculpe. — Enfio as mãos no bolso na tentativa de me


controlar. — Quer dar uma volta? Aqui será muito difícil conversar.
— Eu não quero deixar Mari sozinha. — Aponto para o outro
lado da boate onde ela está aos beijos com o namorado. Aurora ri e
balança a cabeça. — Ela pensou em tudo.
— Então, vamos? — Aurora assente. Ela caminha na frente e
eu vou bem atrás. Olho para Mari que nesse momento faz um joinha
com a mão. Tenho que agradecer muito a ela por ter me ajudado.
— Aonde vamos? — Aurora pergunta assim que alcançamos
meu carro.
— O que acha daquele barzinho onde assistimos a copa
junto com o pessoal? Você gostou de lá.

— É perfeito. — Abro a porta do carro, ela sorri e agradece


antes de entrar.
Não demora para estarmos nos sentando em uma das mesas
livres do bar. Um rapaz está no palco cantando um pagode.
Enquanto Aurora curte a música, peço uma porção de camarão e
mandioca frita, pois me lembro bem o quanto ela gostou. Quando
estamos sozinhos novamente, volto minha atenção a ela.
— Você está com raiva de mim? Está tentando me punir por
algo?
— Não estou com raiva de você e nem querendo puni-lo.
— Mas é o que parece. Eu nunca fiquei tanto tempo longe de
você e olha que moramos na mesma casa. — Seu olhar se desvia
do meu. — Aurora, olha pra mim — peço em uma voz baixa. E
assim ela faz. — Acreditei que as coisas iam melhorar entre nós.
— Eu precisava de um tempo pra pensar e queria te dar um
tempo. — Olho para ela confuso.
— Eu não preciso de um tempo, Aurora, e sim de você. Não
tenho dúvida do que quero. Do que desejo.
— E se você se arrepender depois? Se perceber que foi algo
passageiro? As coisas entre nós já estão bem complicadas, Nando.
Se deixarmos ir além, se passar dos beijos, não terá como voltar
atrás.
— Você...

— Aurora? — Fecho o punho com força quando Alice nos


interrompe. Deveria ter escolhido outro lugar. Ou até mesmo
conversado no carro. A probabilidade de encontrar um conhecido
em um sábado à noite é muito grande.
— Que coincidência encontrar os dois irmãos aqui — diz
Bernardo. — Podemos nos sentar com vocês?

— Sim. — Aurora sorri para os dois. Olho para ela sem


acreditar que está fugindo da conversa novamente. Mas de hoje não
passava, a gente ia finalizar essa conversa em algum momento da
noite de hoje ou eu não me chamava Fernando.

Não sei se foi uma boa ideia aceitar com que os gêmeos
Alice e Bernardo se sentassem à mesa conosco. Sei que fui covarde
e só queria uma desculpa pra não continuar a conversa com Nando
e ele também percebeu. Eu vi o jeito que olhou para mim. Mas o tiro
realmente saiu pela culatra. Alice está dando em cima dele na maior
cara de pau.
— Você está bem? — pergunta Bernardo.

— Não está com uma cara muito boa, Aurora —


complementa Alice.
— Estou com um pouco de dor de cabeça. Acho que vou pra
casa.
— Então vamos. — Nando se levanta.

— Bernardo poderia levá-la — sugere Alice. Seu irmão


balança a cabeça concordando. Mas isso significaria que Nando
ficaria aqui com ela. Olho para ele. Se ele quiser se dar bem essa
noite é só aceitar.
— Eu também já estou cansado. Essa semana foi tensa. —
Ele esfrega a nuca.

— Que pena. — Suspira Alice. — Podemos marcar alguma


coisa durante a semana? — Sinto meu sangue ferver com essa
simples pergunta.
— Podemos sim. Eu te envio uma mensagem. — Nando
sorri.

Após nos despedir, seguimos para seu carro. Essa noite foi
muito diferente do que imaginei e estou aqui dentro do carro,
finalizando a noite muito irritada.
— Ficou com ciúmes? — Nando pergunta baixinho enquanto
continua a encarar a estrada.

— Não — minto.
— Por que pra você é tão difícil assumir o que sente? —
Sinto o desapontamento em sua voz.
Não respondo sua pergunta. Fico em silêncio até chegarmos
em casa. Assim que entramos, percebo que as luzes estão
desligadas. Manu e Caio já devem estar dormindo. Quando piso no
primeiro degrau, sinto sua mão segurar meu braço e me viro para
Nando.
— Eu não quero viver assim, Aurora. — Sua voz é um misto
de tristeza e raiva. — Eu vou para o meu quarto tomar um banho.
Se eu for até o seu e a porta estiver trancada, eu te deixarei em paz.
Não tocarei mais nesse assunto. — Nando me dá um selinho. É
como se estivesse se despedindo. — Agora tudo está em suas
mãos. — Ele sobe as escadas e me deixa ali totalmente paralisada
sem saber o que fazer após esse ultimato.
Enquanto a água quente cai sobre meu corpo, penso se
realmente tomei a decisão certa. Essa porta será como meu
coração. Deixá-la destrancada demonstra que estou disposta a
arriscar toda a minha vida para ter Nando ao meu lado. E não como
meu irmão, mas sim meu companheiro. Ele não estava blefando.
Agora é tudo ou nada.
Me enrolo na toalha e ao sair do banheiro, encaro aquele
pedaço de madeira que tem o poder de mudar completamente as
nossas vidas. Meu estômago está doendo, minhas mãos estão
suando. Me troco e vou até o espelho. Escolhi um conjunto que é
meu favorito, um shortinho de seda rosa e um top de renda preto.
Passo um hidratante no meu corpo enquanto minhas dúvidas
continuam a borbulhar em minha mente. O que faço agora? Finjo
que estou dormindo para ver se ele me acorda? Deixo tudo escuro
ou deixo a luminária ligada?
Passo minhas mãos pelo cabelo, sentindo que vou
enlouquecer, e respiro fundo, tentando acalmar meus nervos.
Decido apagar a luz e me deitar na cama. Pra que tanto drama? É
só deitar e esperar. Só isso. Me ajeito sob a coberta.
As vezes que fiz sexo com Henry era sempre o básico. Agora
me pergunto: será que sei transar direito? E se eu passar vergonha?
E se Nando se arrepender depois? Será que isso vai mesmo
acontecer?
Acabo ficando mais nervosa ainda. Escuto o som da porta
abrindo lentamente e, logo depois, sendo trancada. Meu coração
parece que vai sair pela boca. Fico com medo de Nando conseguir
ouvir, de tão acelerado que está. Como desliguei a luminária, o
quarto está muito escuro. Escuto um barulho um pouco mais alto.

— Quem colocou esse guarda-roupa aqui?! — Nando


resmunga baixinho.
Acabo rindo e relaxando um pouco mais. Sinto o lado do
colchão afundar e suas mãos me buscam em meio à escuridão.

— Oi, baby — Nando fala, a voz cheia de carinho. — Você


não trancou a porta.
— Não, Nando. Eu não tranquei. — Segurando meu rosto
com delicadeza, ele me beija. Um beijo calmo e cheio de
sentimentos. Quando afasta seus lábios dos meus, me pego
sorrindo.

— Não acha que está muito escuro aqui?


— Você prefere ligar a luminária?

— Sim, eu quero te ver. — Estou sorrindo igual uma idiota.


— Pode ligar, então.
Pouco tempo depois, o quarto já está mais claro. Nando sorri
lindamente para mim. Não sei como consegui me manter afastada
dele por tanto tempo. Senti falta do carinho que transmite toda vez
que me olha.
— Agora sim. Olha como você está linda! Não teria como te
admirar no escuro. — Nando me deixa tão sem graça quando fala
assim. — Aurora, só quero te pedir uma coisa. — Sua mão acaricia
minha bochecha. — Não me afaste mais de você. — Ele aproxima
seu corpo do meu e olha bem nos meus olhos. — Eu quero ficar
com você, e não só hoje. Quero você todos os dias. — Essa última
parte diz perto do meu ouvido, e sinto meu corpo todo se acender.
— Tenho medo de você se arrepender — digo em um
sussurro.

— Eu irei me arrepender. — Meu coração dói ao ouvir essas


palavras. — Irei me arrepender se não puder fazê-la minha o quanto
antes.
Segurando meu rosto, Nando me beija. Diferente do beijo
anterior, esse é tão intenso e arrebatador. Nenhum homem me
beijou com tanto desejo como Fernando me beija.

Sua mão acaricia a lateral do meu corpo e, ao chegar dentro


do meu shortinho, ele interrompe o beijo e suspira.
— Por Deus, Aurora, você está sem calcinha. — Seus olhos
estão em chamas e sinto seus dedos se movimentarem lentamente
sobre minha intimidade. — Está tão excitada.

Deixo um gemido baixo escapar quando seu movimento se


intensifica. Nando beija meu pescoço e dá leves mordidas. Isso está
tão gostoso.
— Você gosta assim, baby? — Balanço a cabeça
concordando. Tenho medo de abrir a boca e fazer muito barulho. —
Vou te venerar do jeito que merece, minha Aurora. — A voz dele
está tão sexy. Nando parece até outra pessoa. — Você quer?

— Eu quero, Nando. — Ele abre um grande sorriso de


satisfação.
— Vamos nos livrar dessas roupas. — Nando se senta e faço
o mesmo. Ele segura a bainha do meu top e com calma, começa a
tirá-lo do meu corpo. Me sinto envergonhada. Não consigo olhar em
seus olhos. — Você é muito linda, não precisa ficar envergonhada.
— Seus dedos sobem por minha barriga, me fazendo prender a
respiração. Nando segura meus seios e seus dedos apertam
levemente meus mamilos. Mordo meu lábio inferior com todas as
sensações que estou sentindo. — Deite-se — pede e assim faço.
Nando se ajoelha entre minhas pernas. Meu coração bate
descontroladamente. Segurando em cada lado do shortinho, ele o
tira. Acabo me contraindo quando beija minha coxa. — Só relaxa. —
diz me olhando nos olhos. Ele vai subindo beijos até chegar entre
minhas pernas. — Alguém já te chupou? — Balanço a cabeça
negando. — Nem acredito que serei o primeiro.
Forço minha cabeça no travesseiro quando sinto seus lábios
quentes tocar minha pele. Nando segura minhas coxas, as
mantendo bem abertas enquanto me tortura com sua boca. Mordo
meu lábio para abafar o gemido quando sinto sua língua ir o mais
fundo possível. Sim, é exatamente como imaginei quando lia nos
livros de Mari. Eu queria parar o tempo nesse exato momento pra
conseguir curtir ainda mais essa sensação. Meu corpo todo
estremece enquanto Nando continua ali me devorando. Ele sobe
beijando meu corpo, fica sobre mim e sussurra em meu ouvido:
— Eu fui o primeiro e serei o único a sentir seu gosto em
meus lábios. — Essas palavras me despertam algo que nunca havia
sentido antes.
— Nós já terminamos? — pergunto só para provocar. Nando
ri balançando a cabeça.
— Realmente acha que já estou satisfeito? — Ele move a
cintura e sinto a sua ereção roçar em mim. — Nunca desejei uma
mulher como te desejo, Aurora. Eu poderia passar o resto da minha
vida nesse quarto com você em meus braços.
— Eu preciso de mais. — Seguro sua nuca e o puxo para um
beijo. — Nando — gemo entre o beijo quando o sinto se encaixar
em mim.

— Tão deliciosa. — Suas mãos seguram as minhas acima da


cabeça. Seu movimento vai ficando mais intenso. — Eu esperei
tanto por isso. — Seus lábios descem por meu pescoço e sinto
coisas inimagináveis. Eu também sinto que poderia passar o resto
da minha vida aqui sentindo seu corpo sobre o meu. Sua testa cola
na minha. Olho profundamente em seus olhos. Estou tão perto...
— Ahh, Nando... — As palavras saem sozinhas da minha
boca quando, mais uma vez, atinjo o prazer.
— Você é minha, Aurora. Minha delícia! Minha perdição! Só
minha! — Sua voz está mais rouca que antes.
Seus movimentos vão desacelerando e ele se deita na cama
ao meu lado, ofegante. Nem consigo acreditar que realmente
fizemos sexo. E que foi incrível.
— Você é perfeita. — Nando beija a minha cabeça e me puxa
para seus braços.
Nesse momento, percebo que o Nando doce, calmo e
protetor está de volta. E não sei de qual dos dois eu gosto mais.

— Como vai ser nossa relação a partir de agora, Nando?


— A certeza que tenho é que vamos ficar juntos, mesmo
sendo escondido no começo. Vamos preparar nossos pais pra
receber a notícia.
— E se eles não aprovarem? Legalmente somos irmão,
Nando. Tenho medo de acabar afetando a relação que tenho com
eles.
— Os dois nos amam, então, mesmo se não aceitarem de
cara, com o tempo irão se acostumar. Eu não vou ficar longe de
você. Está me ouvindo, Aurora? Eu quero ficar com você, não
importa o que tenhamos que enfrentar. Chega de Aurora e Nando
irmãos. Agora é Aurora e Nando casal. Se bem que estou afirmando
sem nem perguntar se é isso o que você quer. — Levanto meu rosto
e olho em seus olhos ao ouvi-lo. — Você quer, Aurora? Você será
minha assim como eu sou seu?
Sinto tanta sinceridade em suas palavras. Eu também quero
isso. Também quero nós. Mas tenho tanto medo de decepcionar
Caio e Manu. Vejo em seus olhos que fica aflito com minha demora
em responder. Essa decisão mudará minha vida completamente!
— Aurora, eu estou aqui, disposto a tudo pra ficar com você,
até ir contra meus pais se for preciso, mas tenho que ter certeza de
que você também quer.
— Eu quero. Apesar de ter medo, quero ficar com você. —
Um grande sorriso se forma em seu rosto. — Você fica mais lindo
ainda quando sorri.
— Assim vai me deixar sem graça. — Dou um selinho em
seus lábios. Nando envolve sua mão em meus cabelos e me
pressiona contra ele. — Vamos enfrentar tudo juntos, Aurora.
Abro os olhos e a primeira coisa que faço é sorrir só de me
lembrar de tudo que aconteceu na noite passada. Nando foi perfeito!
Por um momento, sinto um peso na consciência. Nando e eu
passamos a noite fazendo safadeza sob o mesmo teto que nossos
pais. Mas o que os olhos não veem o coração não sente, não é
mesmo? Sei que vou direto para o inferno por causa disso. Mas não
posso dizer que estou arrependida. Foi a melhor noite da minha
vida. Olho para o relógio e já são nove horas. Manu já deve ter ido
para a confeitaria e Caio junto com Nando para a loja.
Manu já tem cinco confeitarias espalhadas pelo Brasil,
enquanto Caio tem uma loja aqui na nossa cidade e outra em São
Paulo. Manu me contou que deve tudo isso a um dinheiro que a
mãe de Caio deixou para eles de herança, mas disse que esse
dinheiro também trouxe algumas coisas ruins. Já tentei me
aprofundar no assunto, mas ela sempre desconversa.
Me levanto e tomo um banho bem gostoso. Depois de me
trocar e tomar café, decido começar a trabalhar. Pego meus lápis e
várias folhas. Falta pouco para abrir minha própria loja de roupas.
Como estou inspirada, vai ser moleza fazer o restante dos croquis.
Agora só falta os vestidos de festa. Vou até meu ateliê, que Caio
montou especialmente para mim em um cômodo ao lado da
garagem. Nele há duas mesas, uma para desenhar e outra para
costurar. Começo a desenhar, admirada com as ideias que vem à
mente com tanta facilidade. Decido fazer três modelos, só para
começar.
Após horas desenhando, enfim eles estão prontos. Olho
fascinada para os desenhos sobre a mesa. Decidi fazer um
vermelho, um verde esmeralda e um azul marinho. E posso dizer
que ficaram incríveis.

Vou até a cozinha preparar algo para comer. Após preparar


risoto de brócolis, me sento à mesa e trato de me alimentar, e
quando estou terminando, ouço a campainha tocar. Assim que abro
a porta, dou de cara com Henry segurando um enorme buquê de
rosas.
— O que você quer?! — pergunto, rude.

— Eu quero você. — Ele estende o buquê em minha direção.


— Estou com saudade, Aurora.
— Henry, eu não vou pegar isso. Pode levar essas flores
embora. Você só gastou dinheiro à toa. — Empurro o buquê que
ainda está em suas mãos.

— Para de fazer drama, Aurora. Foi só um caso. Coisa de


sexo e nada mais.
Começo a rir.

— Que merda, Henry. Você está tentando se justificar assim?


Me deixa em paz! Vai embora. — Tento fechar a porta, mas ele não
deixa.
— Nós ainda não terminamos. Vamos resolver isso!
— Você não disse que eu iria sentir sua falta? Mas quem está
aqui na minha porta é você. — Henry bufa. — Se você não for
embora agora, vou chamar os seguranças do condomínio.
— Eu vou, mas não é a última vez que me verá. — Ele afasta
o pé que me impedia de fechar a porta.
— Só tenho uma coisa pra te dizer: me esquece! — Bato a
porta com força e a tranco.

Volto para a cozinha e tento lavar a louça que sujei, mas não
consigo por muito tempo. Escuto a campainha tocar novamente.
— MEU DEUS! — Já irritada, encho um pote com água.
Henry vai tomar um banho agora.

Vou até a entrada, giro a maçaneta bem devagar e, assim


que vejo as flores, jogo a água que estava no pote. Escuto um
resmungo baixo e começo a rir sem parar.
— Aurora, por que você me molhou?!

No mesmo instante, paro de rir.


— Nando!?

Ele abaixa o buquê e vejo em seu rosto que está irritado.


— Se não gosta de rosas, é só falar. Sou um grande idiota! —
Nando entra em casa pisando duro.
— Eu pensei que fosse Henry. — Abaixo a cabeça
envergonhada. — Me desculpa.

— Por que seria ele? — questiona, confuso.


— Faz pouco tempo que ele saiu daqui. Henry veio me pedir
pra voltar e trouxe um buquê de rosas vermelhas igual ao seu, por
isso pensei que fosse ele.

Nando revira os olhos.


— É muito descarado mesmo. Ele veio nesse horário pois
sabia que você estaria sozinha. Parece que a surra que demos nele
não foi suficiente. — Ele coloca as flores em cima da mesinha de
centro na sala e tira a camisa molhada. Não consigo desviar o olhar.
— O que você está fazendo em casa nesse horário?

— Nosso pai pediu pra vir buscar uns papéis no escritório —


responde. Sem olhar em meus olhos, ele pega a camisa e passa
sobre o peito, enxugando o restante da água.
Como um gesto tão simples pode parecer tão sensual? Me
vejo hipnotizada e sinto um calor subir por minhas pernas.

— Está gostando da vista, baby? — A voz grave de Nando


me tira de meus pensamentos.
— Até que é bonitinho. — Dou de ombros e ele ri e vem em
minha direção.
Segurando minha nuca, Nando me beija com intensidade.
Quando seus lábios descem até meu pescoço, o desejo só
aumenta. Assim que ele se afasta, meu corpo já sente a falta de seu
toque.
— Aurora, me tira uma dúvida. Nós não usamos camisinha
noite passada. Você toma anticoncepcional?

— Tomo, Nando. Eu tomo todo dia certinho no mesmo


horário.
Ele assente e lhe dou um selinho. Nando me abraça.
— Queria ficar com você, mas tenho que voltar o quanto
antes. — Ele beija minha testa e se afasta.

— Eu entendo.
Pego as rosas que deixou na sala e vou até a cozinha.
Escolho um vaso, as coloco nele e o levo até meu ateliê. Fico
admirando-as por um tempo até sentir os braços de Nando
envolverem minha cintura.
— Espero que tenha gostado, mesmo sendo o tipo de flores
que Henry trouxe.
Me viro para ele e vejo que já colocou outra camisa.

— Pode ser o mesmo tipo de flor, mas elas representam


coisas bem diferentes.
Nando assente sorrindo.
— Esses são seus últimos desenhos? — Aponta para a
mesa.
— São. Você gostou?
— Adorei. Estão muito lindos. Você tem muito talento. —
Estou com um sorriso enorme no rosto. — A inauguração é daqui a
uma semana, né?
— Sim. Alex que cuidou da decoração do lugar. Como é ele
que planeja as lojas de Manu, ela pediu que ele fizesse isso pra mim
também. Ele é um arquiteto muito bom.

Nando balança a cabeça concordando.


— Eu sempre gostei dele e de Larissa, mas não gosto muito
do Adam. Ainda bem que ele está fora do Brasil. — Olho para ele
surpresa.
— Por qual motivo? Pra mim vocês se davam tão bem.
Ele me aperta em seus braços.
— Eu me lembro que ele foi seu primeiro amor na
adolescência. Mesmo sendo dois anos mais novo que nós, você
sempre foi encantada por ele.

— Nando, você tem ciúmes dele? — Ele vira o rosto. — Você


tem, eu não sabia. Que coisa fofa! — Seguro seu rosto e dou vários
selinhos, e ele acaba rindo.
— Agora tenho que ir. Já demorei demais aqui. Daqui a
pouco nosso pai liga preocupado. Até mais tarde.
Dou um último beijo.

— Até mais tarde. — Ele beija minha mão e então se vai.

Com os modelos já prontos, começo a separar os tecidos que


irei usar. Após algumas horas, o primeiro vestido ganha forma. Optei
por começar com o vermelho, que será todo no mesmo tecido.
Escuto meu celular tocar e coloco a tesoura em cima da
mesa. Vejo que é uma mensagem de Mari. Ela diz estar chegando.
Peço para que assim que chegar, venha até o ateliê. Não demora
muito e escuto passos.

— Oi! — Mari me abraça. — Estava aqui perto, então decidi


vir te ver. Esse vestido vai ficar maravilhoso. — Ela pega o desenho
que está sobre a mesa. — Imagina ele no meu corpo.
— Pode deixar que faço um desse pra você e te dou no dia
do seu aniversário, como ele já está próximo.
Mari sorri.
— Eu vou amar! Agora quero saber como estão as coisas
entre você e Nando. — Ela vai até a poltrona que há lá e se senta.
— Mari... Essa noite foi muito louca. — Só de me lembrar, já
sinto minhas bochechas queimarem.

— Pode me contar tudo!


Passo os próximos minutos contando a Mari o que
aconteceu. Nossa amizade sempre foi assim. Uma não esconde
nada da outra, nem mesmo as coisas pervertidas.
— Quem diria que Nando, com aquela carinha de sério e
comportado, seria tão intenso na cama. Olha, fiquei toda arrepiada!
— Ela estica o braço e aponta para os pelinhos todos ouriçados. —
Quando sair daqui, vou logo encontrar Rafael. Preciso apagar o fogo
que subiu em mim.
— Mari, você não existe.

— Amiga, é sério. Eu não imaginava que ele era assim. Você


tirou a sorte grande. Agora aproveite. Faça-o passar toda noite no
seu quarto. Só cuidado pra não ficar assada. Mas se isso acontecer,
tenho uma pomada muito boa. — Nós rimos.
— Só espero não me arrepender.

Mari dá um tapinha no meu ombro.


— Garota, você gozou várias vezes em uma noite. Nando fez
o que Henry não fez em dois anos. Você vai se arrepender é de não
ter ficado com ele antes.

Acabo rindo, mas Mari tem razão. Nando fez eu me sentir a


mulher mais desejada do mundo. Me fez descobrir sensações
novas, e eu amei.
— Mas fico com receio por estarmos fazendo isso com
nossos pais tão perto.

— Caio e Manu também transam. — Ela dá de ombros.


— Mas eles não foram criados como irmãos. Não transam às
escondidas.
— Nem começa. — Mari me joga um pedaço de tecido. — E
essas rosas? — Ela aponta para o vaso. Sei que está querendo
mudar de assunto.

— Foi Nando que me deu. — Só de me lembrar que joguei


água nele... Coitadinho.
— Ele está caidinho por você.
— Ai, amiga, eu espero que sim, porque eu estou por ele.
Você acredita que Nando disse que tem ciúmes do Adam? — Mari
abre um sorriso suspeito.

— Espero que ele controle esse ciúme, porque Rafael me


contou mais cedo que Adam volta para o Brasil amanhã.
Já estamos todos reunidos em volta da mesa, jantando.
Manu e Caio conversam sobre algo que não faço ideia do que seria.
Estou distraída pensando em minha loja e em algumas ideias para
novos desenhos quando sinto o pé de Nando descer e subir pela
minha perna. Quando levanto meu rosto, ele está me olhando com
um sorriso irredutível que o deixa ainda mais lindo. Meu coração
erra uma batida só em vê-lo sorrindo assim para mim. Sorte minha
que Manu e Caio estão ocupados demais para notar a intensidade
em nossos olhares.
— Filha, você ficou sabendo que Adam vai voltar para o
Brasil amanhã? — Manu pergunta, chamando nossa atenção, e no
mesmo instante o sorriso de Nando se desfaz.

— Mari me contou mais cedo — respondo e Nando arqueia a


sobrancelha.
— Lembra que você era apaixonada por ele? — Caio
comenta.

— Já faz anos. Éramos adolescentes. Agora é passado. —


Forço um sorriso.
— Mas era fofo. Você suspirava pela casa, escrevia o nome
dele no caderno... Engraçado seu primeiro amor ter sido logo o filho
do Alex — Caio diz e Manu revira os olhos.
— Caio, já se passaram anos. Ele já está casado com Larissa
e já tem uma família. Quando você vai esquecer o que passou?
— Quando eu morrer. — Caio começa a rir.
— Eu vou para o quarto, com licença. — Manu se levanta
brava e começa a andar.

— Princesa, eu estava brincando! Amor, vem aqui. — Caio


vai atrás dela.
Logo os dois estão correndo, subindo as escadas aos risos.
Vai entender!
— Fiquei tão feliz em saber que Adam está de volta — Nando
fala com ironia e dá um sorriso afetado.
— O ciclo vai se repetir. — Ele me olha sem entender. —
Caio tinha ciúme de Alex e você tem ciúme de Adam.

Me levanto e começo a tirar a mesa e Nando se põe de pé


para me ajudar. E enquanto lavo a louça, ele vai enxugando.
— Você ainda sente alguma coisa por ele? — pergunta com
uma voz contida.
— Sério que está me perguntando isso, Fernando?

— É uma pergunta simples. É só responder sim ou não.


— Já falei que é passado, Nando. Faz quatro anos que não
vejo Adam. Nós ainda trocamos algumas mensagens. Somos
amigos, lembra? — Ele se mantém em silêncio. — Você, eu, Mari e
Adam. — Tento refrescar sua memória. — Você só está implicando
com ele agora porque estamos ficando. Vocês sempre se deram
bem. Não quero que isso mude por causa de uma coisa que nem
sabemos se vai dar certo. — Me arrependo do que disse ao ver a
sua cara e acabo suspirando. — Eu não quis dizer isso.
— Tranquilo. — Ele dá de ombros e continua a secar a louça
em silêncio.

Assim que terminamos, Nando sai da cozinha o mais rápido


possível. Subo para o meu quarto e me preparo para dormir. Estou
com tanta raiva de mim mesma. Não poderia ter falado aquilo. Fico
pensando que, se fosse o contrário, eu também ficaria enciumada.
Só de pensar em Nando e seu primeiro amor, Yara, já sinto coisas
ruins subirem pelo meu corpo.
Passo um tempo esperando por ele, mas percebo que não
virá. Ele ficou magoado. Tenho que dar um jeito de consertar essa
situação.

Após o café da manhã, decido continuar a confeccionar meus


vestidos, e assim passo o dia inteiro. Hoje a nova empregada que
Manu contratou começou a trabalhar, então não tive que me
preocupar em preparar o almoço. Ela é bem simpática. Comemos
juntas e conversamos bastante.
No fim da tarde, minhas mãos já estão doendo. Mergulhei no
trabalho para tentar não pensar em Nando. Quando está perto do
horário de chegarem, tomo um banho e vou até a cozinha ajudar
Celina a preparar o café da tarde. Decido fazer o bolo que Nando
mais gosta para tentar me redimir. Como Manu é uma grande
confeiteira, ela já me ensinou muitas coisas. Com o bolo enfim
pronto, deixo esfriar um pouco e depois coloco a cobertura de doce
de leite e o ponho sobre a mesa.
— Esse seu bolo ficou muito bonito, Aurora. Sua mãe te
ensinou muito bem — Celina diz enquanto o admira.
— Esse é o sabor preferido de Nando. Ontem falei uma coisa
que o magoou e espero que isso o deixe mais feliz ou pelo menos
com menos raiva de mim.
Celina coloca a mão em meu ombro.

— Irmãos brigam, é normal. Logo ele se esquece e vocês


fazem as pazes. — Se ela soubesse que nossa briga não foi por
causa de coisas de irmãos, e sim de casal... Fico imaginando
quando todos souberem. Será que vão nos julgar? — Agora você
parece preocupada. — Celina segura a minha mão.
— Não é nada demais, pode ficar tranquila. — Abro um
pequeno sorriso.
Escuto alguém abrir a porta. Peço licença a Celina e vou até
lá, e dou de cara com Manu, Caio, Nando e Adam. Nando não está
com uma expressão nada boa.
— Olha quem passou lá na confeitaria pra me ver e disse que
estava com saudade de você — Manu fala, batendo no ombro de
Adam.
Ele está com um grande sorriso no rosto. Para falar a
verdade, eu estava com saudade dele. Adam é uma parte
importante do nosso quarteto. Vou até ele e o abraço.
— Você está a cara de sua mãe.
Ele ri do meu comentário.
— Sua mãe disse a mesma coisa. Estava com muita saudade
sua. Dos dois — ele completa, olhando de mim para Nando que,
para o seu crédito, abre um pequeno sorriso.
— Vou lá no quarto colocar o celular pra carregar, já volto. —
Nando sobe correndo as escadas.
— Vamos pra cozinha. Sei que estão todos famintos. —
Manu nos conduz para lá.
— Como anda a vida? — Adam pergunta, envolvendo seu
braço em meu pescoço.
— Corrida. — Nós rimos.

— Contei a ele que você vai abrir sua própria loja — Caio
fala, todo orgulhoso.
Manu faz questão de Adam se sentar ao meu lado à mesa.
Esses dois estão tentando nos juntar. Nando vem e se senta na
minha frente.

— Bolo de churros! — ele fala, empolgado. — Obrigado,


Celina.
— Não fui eu que preparei, foi Aurora. Ela fez com muito
carinho pra você.
Nando me olha surpreso, mas também grato.
— Sempre admirei esse relacionamento de irmãos entre os
dois — Adam diz, olhando de um para o outro, e Manu e Caio
concordam com a cabeça.
Vários sentimentos se misturam dentro de mim ao ouvir
essas palavras. Olho de relance para Nando e me pergunto se
também sentiu uma pontinha de culpa. Começamos a comer
enquanto conversamos. Nando já comeu dois pedaços de bolo, o
que me deixa muito feliz.
— Você sabia que Aurora está solteira? — quando Manu fala
isso, Nando engasga, e Caio dá leves batidas em suas costas.
E eu me seguro para não encará-lo por tempo demais. Se ele
continuar assim, vai acabar nos entregando.
— Não sabia que você e Henry haviam terminado — Adam
diz, segurando a minha mão, e eu a afasto sutilmente, disfarçando.
Vejo Nando esconder um sorrisinho.
— Nem fala o nome daquele moleque. Só de pensar nele,
meu sangue ferve. — Caio cerra os punhos.
— Vejo que ele aprontou feio.

— Mas agora já é passado — Manu diz. — Agora Aurora está


livre do embuste e pronta pra um novo ou antigo amor.
Tem como ser mais óbvio e constrangedor?
Após um café muito longo, Adam decide ir embora e Manu
insiste que eu o acompanhe até a porta. Quando ele vai embora, me
jogo no sofá e solto um longo suspiro.
— Filha, seu pai e eu vamos passar uns dias em São Paulo.
Temos que resolver uma questão nas filiais. Mas estaremos de volta
um dia antes de sua loja inaugurar. — Manu se senta ao meu lado.
— Mas se der algum problema, você pode nos ligar que viremos
correndo te ajudar.
— Sim, não hesite em nos ligar se precisar de qualquer coisa.
— Caio se senta do outro lado. — Você sabe que é muito importante
pra nós, né?
Balanço minha cabeça positivamente e eles me abraçam.
Adoro quando eles fazem isso. Sinto tanto amor e carinho vindo
deles.
— Agora vamos arrumar nossas malas. — Caio dá um beijo
em minha cabeça e os dois sobem para o quarto.
Me deito um pouco no sofá e fico olhando minhas redes
sociais.
— Obrigado pelo bolo. — Ouço a voz de Nando, me trazendo
de volta à realidade e o encaro. Ele está sorrindo. — Estava muito
bom. — E então se acomoda ao meu lado. — Parece que vamos
passar quase uma semana sozinhos... — ele começa e sinto meu
coração aquecer.
— Você não está mais com raiva de mim?
— Não estava com raiva de você. É difícil explicar, Aurora.
Nós precisamos conversar. Vamos fazer isso amanhã quando
chegar do serviço.
— Você não pode me visitar de noite?
— Hoje não. — Abaixo a cabeça desanimada e Nando aperta
a minha mão. — Paciência, minha cara. — Ele beija a minha testa e
se levanta. — Vejo você depois. — E sai da sala.

Uma semana! Uma semana sozinha com Nando nessa casa


enorme. Me sinto animada e nervosa ao mesmo tempo.
Após o jantar, peço a Manu para vir comigo ao quarto.
Preciso muito conversar com ela. Não dá para ficar assim. Não
quero que nem ela nem Adam criem expectativa. O único homem
com quem quero algo é meu irmão adotivo. Mas ela não saberá
dessa parte, pelo menos não por enquanto. Assim que entramos,
fecho a porta e nos sentamos na cama, frente a frente.
— O que você quer conversar, pequena? Aconteceu alguma
coisa? — Posso sentir em seu tom de voz que está preocupada.
— Manu, você sabe que amo muito vocês. Nenhuma palavra
no mundo resumiria o que sinto por essa família. — Ela segura
minha mão. — Mas quero te contar que já estou gostando de outra
pessoa e meu coração não está disponível.
— Eu não imaginava — diz sem graça. — É bom saber que
não está sofrendo por aquele traidor.

— Eu realmente não estou. E o que senti por Adam foi muito


bom, mas é passado. Foi um amor de adolescente. Agora somos
somente amigos e quero que isso continue assim. Se continuar me
empurrando pra ele, podemos acabar prejudicando tanto nossa
amizade quanto meu relacionamento com a nova pessoa que estou
gostando. — É estranho falar em voz alta que temos um
relacionamento. Mesmo que seja secreto.
— Me desculpe, não quero ser uma mãe chata. Sinto muito
mesmo, Aurora. Isso nunca mais vai acontecer. Não deveria ter
tentado juntar vocês dois — ela fala envergonhada e faço carinho
em sua mão.

— Você é uma mãe maravilhosa, mas ninguém é perfeito.


Todos temos um defeitinho aqui e ali. Lembra que foi você quem me
disse isso?
Ela balança a cabeça, confirmando, e eu a abraço.
— Agora me diz, quem é o felizardo que está conquistando
esse coraçãozinho? — Ela aponta para o meu peito.
— Ainda não posso contar, mas em breve vocês saberão. —
Manu me encara com os olhos semicerrados. — Eu prometo que
em breve contarei a vocês. — Levanto minha mão como se fizesse
um juramento.

— Vou aguardar ansiosa. E espero que esse rapaz realmente


te mereça. Você é uma princesa e tem que ser tratada como tal. —
Manu beija minha bochecha. — Não se esqueça, se precisar de nós
é só ligar.
Depois de mais um abraço rápido, ela se levanta e sai do
quarto. Me sinto tão aliviada de ter lhe contado pelo menos uma
parte. Mas sei que o mais difícil ainda está por vir.

Tomo um banho e vou direto para a cama. Como sei que


Nando não virá hoje, deixo a porta trancada. Pego meu celular e
fone e fico assistindo a uma série até o sono bater.
Manu e Caio saíram bem cedo de casa e Nando já foi
trabalhar. Ainda tenho dois vestidos para terminar, mas minhas
mãos estão doendo muito, por isso decido tirar o dia para
descansar. Pego o livro de Mari, determinada a terminá-lo ainda
hoje.
Após algumas horas, enfim termino. A sensação de finalizar
um bom livro e ficar com o coração quentinho é tão bom. Desço
para almoçar com Celina e quando chego à cozinha, ela já está
arrumando a mesa.

— Oi, querida. — Celina abre um grande sorriso.


Celina é um pouco mais velha que Manu. Parece uma mulher
muito experiente sobre esses assuntos da vida. Simpatizei com ela
assim que a conheci.

— Oi, você quer ajuda pra terminar de pôr a mesa?


— Já estou terminando, muito obrigada. Pode se sentar que
já vamos almoçar.

Manu sempre deixou claro que aqui todas as empregadas


são tratadas com muito respeito e carinho. Como sou a única a ficar
o dia todo em casa, pelo menos até a minha loja abrir, me apego
muito a cada uma. A nossa empregada anterior, Maria, só deixou
nossa casa porque iria mudar para a sua cidade natal, em
Pernambuco.
Logo já estamos sentadas à mesa da cozinha almoçando. Eu
adoro ter companhia. Celina preparou uma deliciosa costela com
mandioca que derrete na boca. Ela é uma cozinheira de mão cheia.

— Celina, você poderia me dar um conselho? — Ela balança


a cabeça confirmando. — Estou apaixonada por uma pessoa, mas
estou com medo de contar a Manu e a Caio quem é. E até de
assumir o que realmente estou sentindo à eles.
— Aurora, minha linda, é só você ser sincera com seus pais,
abrir seu coração. Eu sei que esse rapaz é o Fernando. — Olho
para ela surpresa. — Eu percebi assim que vi vocês dois juntos. Os
olhares, não tem como disfarçar. Quando olhamos pra pessoa que
amamos, deixamos transparecer os sentimentos. Acho que seus
pais não perceberam ainda, mas logo isso vai acontecer. Então
sugiro que vocês dois conversem com eles quando retornarem da
viagem. Se eles descobrirem por outra pessoa ou por um flagra ou
algo do tipo, eles se sentirão muito desapontados.
— Você tem razão, vou fazer isso. Você achou estranho, já
que fomos criados como irmãos? — pergunto, mesmo temendo a
resposta.

— Ninguém manda no coração, Aurora, e vocês só têm o


mesmo sobrenome, não o mesmo sangue. Não é pecado algum.
Todos merecem ser felizes. Se sua felicidade é estar com ele, não
deixe sua insegurança e o medo de julgamento te impedir de ser
feliz. — Celina leva a mão até o meu rosto, e é só aí que percebo
que estou chorando. — O amor é um sentimento lindo. Não importa
se é um homem com uma mulher, duas mulheres, dois homens, ele
não deve ser reprimido de jeito nenhum.
Me levanto, vou até Celina e a abraço. Ela só está na casa há
um dia e já conseguiu conquistar minha admiração.
— Muito obrigada, isso era tudo que precisava ouvir — digo,
com toda sinceridade.
Continuamos almoçando enquanto conversamos. Depois a
ajudo a arrumar tudo e volto para o meu quarto. Tomo um banho e
me arrumo, pois logo Nando estará em casa. Quando vou saindo do
quarto, escuto meu celular tocar. É Adam. Respiro fundo e decido
que vou contar tudo a ele. Tudo o que sinto e o que estou tentando
esconder de todos. Ele é meu amigo, vai conseguir guardar esse
segredo. Pelo menos por enquanto.
Penso em Aurora o dia todo. Não consigo tirá-la do meu
pensamento. Ela acha ruim ter ciúme de Adam, mas não consigo
evitar, é mais forte que eu. Estou nervoso e animado ao mesmo
tempo com a possibilidade de passar tanto tempo sozinho com ela.
Estaciono o carro na garagem e, antes de sair, respiro fundo. Estou
parecendo um adolescente.
Entro em casa, pergunto à Celina onde Aurora está e ela
abre um sorriso sugestivo ao dizer que está no quarto. Acho meio
estranho, mas não digo nada. Subo rapidamente e posso vê-la
sentada na cama, virada para a janela. Está falando ao telefone.
— Adam, estou sendo sincera. É amor. Eu sei que é amor.
Tentei mentir pra mim mesma dizendo que não era nada, mas eu o
amo...

Não quero acreditar no que acabei de escutar. Acabo


deixando a caixa de bombons que comprei para ela cair no chão e
quando ouve o barulho, Aurora se vira para mim assustada. Saio do
quarto e vou para o meu sem nem ao menos respirar enquanto
ando e tranco a porta quando passo por ela.
— Você é um idiota, Fernando! Um burro — murmuro
sozinho, sentindo o sangue ferver dentro de minhas veias e meu
coração acelerar.
Pouco tempo depois, escuto batidas na porta.
— Nando, abre a porta! — Aurora fala do outro lado, mas não
me movo.
— Vai embora, Aurora. Eu escutei o que você disse. Você
falou que o ama, que ainda ama o Adam. — Sinto meus olhos
arderem. Eu criei expectativas. Acreditei que ela estava realmente
gostando de mim.
— Nando, por favor, não é o que você está pensando. Você
só ouviu uma parte da conversa. Me deixa entrar.
Respiro fundo tentando acalmar meu coração, ou o que
restou dele. Destranco a porta e me sento na cama. E, com o
coração em pedaços, a observo entrar, fechar a porta e se
aproximar de mim.
— Você me enganou — digo antes que ela possa me tocar.
— Falou que não sentia mais nada por ele. Você mentiu, me fez de
idiota! — Me levanto.
— Me escuta! Você nem está me dando a chance de falar.

— Não precisa falar nada! Só sai do meu quarto e vamos


fazer o que você queria desde o começo. Vamos fingir que nada
aconteceu. — As palavras saem rudes e Aurora vem em minha
direção, nervosa.
— Que porra, Nando! Você está complicando tudo.
— Pode ir, Aurora. Eu prometo que não vou te incomodar
mais. — A afasto de mim.
— Fernando, você está muito alterado. — Aurora coloca a
mão no meu rosto, me forçando a olhá-la nos olhos.
— Sabe por que estou assim?! Porque te amo, Aurora, e não
é de hoje. Percebi que não te amo como irmão. Aquele beijo só
serviu pra ter certeza do que já sentia. Eu te amo com cada
pedacinho do meu maldito coração. — Aurora está imóvel, me
encarando com os olhos marejados. — Você já se perguntou por
que de uns tempos pra cá não saio com mais ninguém? Ou por que
gosto de passar todo meu tempo livre ao seu lado? É porque te
amo! E odeio te amar tanto assim.
Agora as cartas já estão sobre a mesa. Eu assumi para ela o
que sinto e suas mãos ainda estão em meu rosto. Aurora me
acaricia, e só de sentir seu toque, meu coração acelera. É como se
seu carinho fosse capaz de juntar todos os pedaços que haviam se
partido.
— Eu também te amo, Nando. Não sei quando nossa
amizade e irmandade virou amor dentro de mim, mas não adianta
negar, eu sei do fundo do meu coração que eu também te amo. —
Algumas lágrimas rolam, molhando seu lindo rosto. Enxugo cada
uma com cuidado. — Era de você que estava falando. Em meu
coração só existe espaço para um homem e ele é você, Fernando
Alves.

Quando Aurora me beija, sinto como se tivessem me


devolvido minha outra metade. O que sinto por ela é tão forte. Por
um momento, realmente achei que ela não sentia nada por mim. E
essa com certeza foi a pior dor que já senti na vida. Assim que
terminamos o beijo, ela me abraça forte e eu retribuo.
— Eu te amo, Fernando. Te amo muito — ela sussurra.
— Eu também te amo, Aurora. Te amo como nunca amei uma
mulher na vida. — Dou um beijo em sua cabeça. — Você quer
namorar comigo? — pergunto em seu ouvido.
— Eu quero. — Ela levanta o rosto e sorri para mim. — É
tudo que quero nesse momento.
Dessa vez sou eu que a beijo. Já virei dependente dos seus
lábios, dos seus toques. Aurora segura a bainha da minha camisa e
me empurra com delicadeza para tirá-la. Sem pressa, começamos a
nos despir, nos deleitando com cada movimento, cada segundo
juntos. Quando ela está só de lingerie, eu me vejo admirando-a.
Minha Aurora é tão linda, tão perfeita.

Abaixo uma alça de seu sutiã e beijo seu ombro. Ela solta um
suspiro. Faço o mesmo com o outro ombro e vou subindo até o seu
pescoço, enquanto a livro do sutiã e a seguro em meus braços.
Sorrio contra a sua pele e a levo até a cama. Me livro de sua
calcinha. Deito-a sobre os lençóis e não consigo desviar meus olhos
dos seus. A sensação de me perder em seu olhar, azul como duas
piscinas refletindo o céu turquesa, é indescritível.
— Eu te amo. Sinto que posso repetir isso pro resto da minha
vida. Eu quero repetir essas palavras pra você até o fim de nossas
vidas, Aurora.

Uma lágrima escorre no canto de seus olhos e eu a limpo


com o meu polegar.
— Me faça ser sua, Nando — pede, a voz enrouquecida pela
excitação.

Eu volto a beijá-la. Desço minha mão até o meio de suas


pernas e sentir a umidade e o calor me faz enlouquecer. Seguro
meu pau e esfrego em seu clitóris. Seus gemidos são a melhor
melodia existente. Vou deslizando para dentro dela. Aurora está tão
molhada, tão gostosa e começo a me mover em um lento vai e vem.
Eu quero dar a ela todo o prazer que ela merece. Desço e começo a
beijar seu pescoço. Como adoro fazer isso... Sinto-a se contrair em
meus braços. Sua respiração acelera cada vez mais, e desço mais
um pouco, passando minha língua em seu mamilo e fazendo
círculos e depois o chupando.
— Ahh, Nando... — Aurora geme, arqueando as costas.

É tão gostoso vê-la assim.


— Você gosta, baby? — pergunto, intensificando o
movimento da minha língua.

— Eu amo. — Quase não consigo ouvir sua voz.


— E se eu fizer isso? — Levo uma mão ao meio de suas
pernas e começo a massagear seu clitóris, em leves movimentos
circulares. — Fica mais gostoso?

Aurora morde os lábios rosados e balança a cabeça


confirmando. Caramba, que visão maravilhosa. Já sinto que não irei
conseguir me segurar por muito tempo. Volto a beijar seus lábios e
meu dedo continua a tocá-la no mesmo ritmo que meu quadril.
Estou tão entregue a ela quanto ela a mim.
Mordendo meu lábio interior, Aurora solta um gemido e
estremece em meus braços. Esse é o meu fim. Acabo gozando
junto com ela. Com um suspiro, deito ao seu lado e a puxo para um
abraço.

— Sei que já falei isso muitas vezes, mas eu te amo, minha


Aurora.
Ela levanta o rosto e sorri para mim.
— Eu também te amo, meu Nando. — Sua mão acaricia
minha bochecha e acabo sorrindo. — Você pode repetir isso
quantas vezes quiser, nunca vou enjoar de ouvir.
Ficamos um tempo abraçados, só sentindo o calor do corpo
um do outro. Isso é tão bom.
— Nando, eu estava falando pro Adam que eu sei que o que
sinto por você é amor, que tentei negar isso a mim mesma, e que eu
te amo. Não quero mais passar por aquela situação constrangedora
de ontem, por isso me abri com ele.
Nesse momento me sinto tão idiota. Deduzi tudo errado.

— Eu não sei o que dizer. Dei um show por nada — falo sem
jeito e Aurora ri.
— Mas isso fez você se abrir, e eu também. Então não foi
uma coisa assim tão ruim.
— Você tem razão.
Ela sorri.
Aurora passa a mão sobre meu peito e vai deslizando para
baixo. Quando penso que irá me tocar, ela para.
— Nando?
— Sim? — Seguro seu queixo e a faço me encarar. — Não
precisa ter vergonha.
— É que tenho receio de não gostar do jeito que faço as
coisas.
— É totalmente impossível eu não gostar de algo que faça. —
Seguro sua mão e a levo até meu pau. Olhando em seus olhos,
começo a subir e descer nossas mãos cada vez mais rápido.
Quando percebo que já está mais confiante, a solto. Minha mão vai
até o bico de seu seio e massageio seu mamilo sem desviar o olhar.
— Não tem ideia de como está gostoso. — Quando sinto que estou
perto de gozar, a interrompo, segurando sua mão. — O que você
quer fazer agora, baby? — pergunto só para provocá-la, pois está
estampado em seus olhos o que ela quer.
— Eu quero ficar em cima de você — cochicha no meu
ouvido e morde a ponta da minha orelha.
— Eu sou seu, você pode fazer o que quiser comigo. — E
realmente estou de corpo e alma entregue a essa mulher.
Aurora sobe em cima de mim e coloca uma perna de cada
lado. Começa a se esfregar e quando vê que já não aguento mais a
provocação, enfim levanta o quadril e a penetro devagar. Amo essa
sensação. Sua cintura se move para frente e para trás, seus lábios
encontram os meus e seu beijo é tão intenso e ardente. Seus lábios
vão até o meu pescoço, me fazendo arrepiar todo.

— Você é tão gostosa. — Enrosco meus dedos em seus


cabelos e a faço me olhar nos olhos. — Você é só minha?
— Sim — diz em meio aos gemidos. — Somente sua, Nando.
Com as mãos em meu abdômen, ela rebola de um jeito tão
gostoso. Aperto forte sua bunda e ela morde o lábio inferior. Sei que
está se contendo para não fazer muito barulho, afinal, não estamos
sozinhos. Quando começa a subir e descer devagar, não consigo
me segurar mais. Movimento meu quadril, indo o mais fundo
possível. Aurora se curva e me beija, e levo minhas mãos aos seus
seios e os aperto com firmeza e cuidado, para não machucá-la.
— Quero que se comunique comigo, Aurora. Diga o que está
sentindo. Se está gostando — sussurro em seu ouvido.
— Está gostoso, Nando. Não para. — Sua voz manhosa só
me faz aumentar o ritmo.
Aurora cola sua testa na minha e seus olhos transbordam
desejo e luxúria.
— Goza comigo, baby. — Passo minha língua em seus
lábios. — Goza pra mim.
Sinto sua mão segurar meu ombro com força e estamos
entregues ao prazer que um dá ao outro. Ofegante, ela se deita em
meu peito, ainda me olhando.
— Agora vou precisar de outro banho — ela fala e depois ri.
— Eu posso dar banho em você, se você quiser.
Ela cora.
— Vai ser a primeira vez que tomarei banho com alguém.
Acho que ficarei com vergonha.
— Aurora, você está nua em meus braços, comigo ainda
dentro de você! Você vai ficar com vergonha de um simples banho?!
— Nós rimos.
— Você tem razão.
— E posso dizer uma coisa? Seu corpo é perfeito.
Um grande sorriso se forma em seu rosto.
Ela se levanta e estende a mão para mim, e junto vamos para
o banheiro.

Estamos na sala assistindo a um filme de comédia, comendo


pipoca e tomando uma Coca geladinha. Aurora ri sem parar. Seu
sorriso tem um poder tão grande sobre mim. Tudo que quero é ficar
ao seu lado pelo resto da minha vida.
Minha mão vai até o seu rosto e eu acaricio sua bochecha.
Ela se vira e seus olhos encontram os meus.
— Você é tão linda. Tão perfeita. Não quero ficar sem você
nem um segundo. Não quero nem imaginar um dia da minha vida
longe de você.
— Eu nunca vou me afastar de você — Aurora diz de um jeito
carinhoso.
— Você promete pra mim?
— Eu prometo.
Rolo na cama e sinto o cheiro de Nando no meu travesseiro.
Pego-o e o abraço. Foi tão bom dormir com ele ao meu lado. Ao
lembrar de tudo que aconteceu, acabo sorrindo.
— Aurora, querida! — Escuto Celina me chamar do outro
lado da porta.
— Pode entrar!
Não demora e a porta é aberta.

— Tem uma visita te esperando lá embaixo.


— Visita uma hora dessa?
Celina ri.
— Aurora, já é quase meio-dia. — Olho para ela sem
acreditar que dormi tanto assim. — Se troque que peço pra pessoa
esperar.
— Ok, obrigada.

Ela assente sorrindo e sai.


Me troco o mais rápido possível e vou até o banheiro. Estou
curiosa pra saber quem é a pessoa que veio me visitar. Quando
desço as escadas, dou de cara com Adam. Ele me olha preocupado
e não consigo entender.
— Bom dia, Adam. — Dou um beijo em sua bochecha.
— Bom dia, Aurora. Nós podemos conversar?
— Sim, vamos nos sentar no sofá. — Vamos junto até lá e
nos sentamos frente a frente. — Aconteceu alguma coisa? Você
parece preocupado.

— Eu estou preocupado com você.


Olho para ele confusa.

— Mas estou bem. Nunca estive melhor!


Adam segura a minha mão.

— Esse relacionamento entre vocês não vai dar certo.


No mesmo instante, entendo que ele está falando de Nando.
— E por que não daria? A gente se ama e quer ficar juntos.
— Já estou ficando nervosa.

— Aurora, ele é seu irmão! — fala rispidamente e puxo minha


mão para longe da dele.
— Adam, você sabe que sou adotada, né? — Ele balança a
cabeça confirmando. — Então não temos o mesmo sangue, só
nosso sobrenome é igual. Manu e Caio não são meus pais
biológicos.
— Mesmo assim! Isso é estranho, Aurora. Como seus pais
vão apresentá-los? Olha, esse é meu filho — começa, gesticulando
com as mãos — e essa é minha filha. Os dois são um casal.
Não posso acreditar que estou escutando isso de alguém que
achei que entenderia meu lado. Eu sabia que haveria preconceito,
mas não esperava que viesse de um de nossos amigos. Uma das
primeiras pessoas que sabe sobre nós está nos julgando. Como
será quando contarmos ao resto do mundo?
— Você sabe que nunca poderá se casar com ele, não sabe?
A lei proíbe. Porque vocês são irmãos. — Adam dá ênfase às
últimas palavras.

Eu nunca tinha pensado nisso. Sinto uma dorzinha em meu


peito e o cubro com a mão, tentando não mostrar o quão mexida
com isso estou. Sempre tive o sonho de me casar, de desenhar meu
próprio vestido e tudo mais...
— Eu sei que estou sendo duro, mas você precisa pensar
bem, ver se é isso que você quer pra sua vida. — Cada palavra que
sai de sua boca parece esmagar meu coração. — Será que você
não está confundindo os sentimentos? Isso é normal, vocês são
muito apegados um ao outro.

Em minha cabeça se passam várias coisas. Estou me


sentindo atordoada. A felicidade que sentia quando acordei já
desapareceu.
— Você sabe que Nando é homem. Nós sentimos tesão fácil.
Não estou querendo dizer que seja isso... — Ele levanta as mãos.
— Mas pode ser que ele sinta só atração física por você. Ele acabou
se confundindo e você também. Você tem que parar isso enquanto é
tempo, Aurora. Pense no desgosto que darão aos seus pais, seus
familiares que sempre cuidaram de você com todo carinho.

Sinto meu rosto molhado de lágrimas. Há um misto de


emoções dentro de mim. Adam, com os olhos tão tristes quanto os
meus devem estar, as enxuga e me puxa para um abraço.
— Só estou falando isso porque sou seu amigo e estou
tentando abrir seus olhos — ele diz.
— Aurora?! Você está bem? — Ouço a voz de Nando e me
afasto de Adam.
— O que está fazendo aqui? — pergunto.

— Estou no horário de almoço, então vim ficar com você. —


Ele vem até mim e se senta ao meu lado, ignorando completamente
a presença de Adam. — Não gosto de te ver chorar.
No mesmo instante Nando me abraça e no calor de seus
braços deixo minhas lágrimas caírem. E se Adam tiver razão? Se
isso tudo for loucura? Uma atração momentânea? Estou com medo.
— Ei, baby, não fica assim — pede, com um carinho
inconfundível em seu tom.
— Oi, Fernando — Adam nos interrompe.
— O que vocês estavam conversando? — Nando indaga,
sem esconder o descontentamento.
— Estava a alertando sobre esse relacionamento incabível de
vocês.
— E o que você tem a ver com isso?! O que sentimos só diz
respeito a nós dois, Adam.
— Estou tentando ajudar Aurora.
Sinto Nando respirar fundo.
— Você já ouviu aquele ditado: muito ajuda quem não
atrapalha?
— Quem está atrapalhando aqui é você, que está deixando
ela confusa.
Vejo Nando cerrar os punhos.
Os ânimos de ambos estão exaltados. Me solto dos braços
de Nando e me endireito no sofá e, nervosa, noto como os dois se
encaram. Quando me preparo para falar algo, Nando fala primeiro.
— Saia da minha casa, Adam! Antes que eu perca a cabeça.
— Eu vou porque tenho educação. — Seu olhar se volta para
mim. — Pensa bem no que te falei. Tchau, Aurora. — Ele beija
minha bochecha e vai em direção a porta.
— Nando, você acha que o que sente por mim é só atração
física? Apenas tesão?
Ele me olha como se tivesse falado a maior besteira do
mundo.
— Eu te amo. Claro que tenho muita atração física por você,
mas não é só isso. — Sua mão vem até minha bochecha. — Aquele
dia que te beijei, senti como se algo estivesse mudando dentro de
mim, então depois percebi que era algo que já sentia há muito
tempo, só não assumia. Me senti confuso no começo, mas tudo foi
se encaixando. Era como um jogo de quebra-cabeça. Eu só
precisava colocar as peças no lugar. Não importa o que Adam tenha
te falado, eu enfrento qualquer coisa se você estiver ao meu lado.
Eu só preciso de você e mais ninguém.

Volto a abraçá-lo. Não sei como deixei Adam colocar isso na


minha cabeça. É claro que nos amamos, que isso é de verdade.
Consigo sentir sinceridade em tudo que Nando diz.
— Vamos almoçar, pombinhos? — Nos viramos em direção a
voz de Celina e ela está com um grande sorriso.

— Já estamos indo — Nando responde, se levanta e me


oferece sua mão.
Vamos de mãos dadas para a cozinha e nosso almoço juntos
é rápido. Conversamos com Celina e ela nos dá vários conselhos.
Simplesmente virei fã dessa mulher maravilhosa que ela é. Quando
Nando volta ao trabalho, eu resolvo ir até o ateliê terminar meus
vestidos. Assim passo o restante da tarde, mas algumas coisas que
Adam me falou ainda ficaram em minha cabeça. Próximo ao horário
de Nando chegar, vou até meu quarto tomar banho.
Já pronta, me deito um pouco na cama, pego meu celular e
ligo para Mari.
— Oi, amiga, acabei de finalizar uma sessão de fotos. —
Sinto empolgação em seu tom de voz.
— Oi, estou te atrapalhando?
— Não, bobinha. Já terminamos. Estou aqui no estúdio só
admirando a vista. As fotos foram pra um catálogo de cuecas e só
tem boy gostoso pra todo lado. Acho que morri e vim parar no céu!
Eu amo meu emprego. — Nós rimos.
— Queria conversar com você um pouco, pode passar aqui
em casa mais tarde?

— Posso. Aconteceu alguma coisa?


— Vou fazer um resumo, aqui te conto com detalhes. Eu falei
ontem pro Adam que estava com Nando e hoje de manhã ele
apareceu aqui em casa...
— Você não deveria ter dito a ele, Aurora — Mari me
repreende.
— Mari, eu pensei que ele iria entender meu lado, assim
como você, mas foi diferente.
— O que ele fez? Vou lá na casa dele agora! Vou dar na cara
dele, chutar seu saco tão forte que ele não poderá nem ter filhos.
— Mari! — Não consigo me controlar e acabo rindo, pois sei
que ela realmente teria coragem de fazer isso.
— Amiga, é sério, por você faço qualquer coisa.

— Eu sei, por isso e outros motivos que te amo. Mas é


melhor te contar tudo pessoalmente. Que tal comermos pizza? Se
você quiser, pode trazer Rafael. Enquanto converso com você e
explico tudo, ele faz companhia pro Nando. O que você acha?
— Ótima ideia! Ele já deve estar terminando de dar aula na
faculdade. Vou mandar uma mensagem pra ele. Só vou passar em
casa primeiro e me arrumar.

— Ok, vou estar esperando. Te amo, amiga.


— Eu também.
Encerro a ligação e coloco o celular sobre a cama.
— Posso entrar? Você está nua?! — Ouço a voz de Nando e
me levanto da cama sorrindo.

— Pode entrar. — Ele abre a porta. — Não estou nua.


— Puxa, que pena! — Ele balança a cabeça, realmente
parecendo decepcionado.
Vou até ele.
— Seu bobo. — Dou um beijo em seus lábios e Nando
envolve seu braço em minha cintura e me puxa para ele. — Mari e
Rafael vêm mais tarde pra comer pizza com a gente.
— Certo. Agora vou tomar um banho e já volta pra continuar
de onde paramos, a menos que você queira tomar um banho
comigo? — Nando balança as sobrancelhas de um jeito sugestivo.

— Acabei de tomar banho — falo e ele faz bico. — Podemos


tomar um antes de dormir. — Dou uma piscadela e Nando sorri
largamente.
— Posso esperar um pouco, mas saiba que durante o banho
vou estar pensando em você. — Ele me dá um beijo no pescoço e
sai do quarto.

Só de ouvir essas palavras e pensar nele todo molhado, já


me sobe um fogo. Minha vontade é correr atrás dele, mas ouço a
campainha tocar. Como Celina saiu mais cedo, só estamos nós dois
em casa. Desço as escadas e vou em direção a porta, e assim que
a abro, me deparo com uma mulher que nunca vi antes. Sua pele é
branquinha, seus olhos têm o mesmo tom que os meus e os cabelos
são extremamente vermelhos. Ela parece um pouco abatida.
— Oi, Aurora, como você está?
A confusão me preenche ao encará-la e ouvir o meu nome
sair de seus lábios. Como ela pode me conhecer se eu nunca a vi
antes? Ela me olha com o que parece ser admiração, o que me
confunde ainda mais. É como se... eu fosse importante para ela.
— Desculpa, mas não me lembro da senhora. A senhora me
conhece?
Ela abaixa a cabeça por um breve momento.
— Sim, sou amiga da sua mãe. Vi você quando era recém-
nascida. Você se tornou uma linda mulher, tenho certeza de que
seus pais têm muito orgulho de você.

Bem, faz sentido. Isso explica eu não reconhecê-la.


— Obrigada, eu espero que eles realmente tenham orgulho
de mim. — Abro um sorriso. — A senhora quer entrar? — Abro mais
a porta, lhe dando passagem.
Ela entra e se senta no sofá, e percebo que está um pouco
tensa. Me sento de frente para ela no outro sofá.
— Qual é o seu nome?
A mulher abre um pequeno sorriso.

— Dirce. Manu está em casa?


— Não, ela e Caio estão em São Paulo resolvendo assuntos
de trabalho. Se quiser te passo o número deles. — Dirce balança a
cabeça, concordando. — Vou pegar meu celular. Já volto.

Ela assente.
Subo rápido até o quarto, pego meu celular e desço. Eu
preciso urgentemente gravar o novo número de Manu, se bem que
poderia ter passado o de Caio. Quando chego na sala, a vejo
passando os dedos sob os olhos, como se estivesse enxugando
lágrimas. Fico preocupada.
— A senhora está bem? Precisa de alguma coisa?
— Estou bem, sim, é que hoje o dia foi difícil. Aurora, você
não chama Caio e Manu de pai e mãe?

Volto a me sentar no sofá.


— Chamava quando era criança, mas agora prefiro chamá-
los pelo nome. Não que isso diminua o amor e respeito que tenho
pelos dois. Eles com certeza são os melhores pais do mundo. —
Acabo sorrindo e vejo que Dirce também.
— Aurora, eu estava pensando... — Nando entra na sala e
para quando vê Dirce. — Não sabia que tínhamos visitas. — Ele
logo se recupera e se aproxima dela, estendendo a mão para
cumprimentá-la. — Muito prazer, eu sou Fernando.

— Eu sou Dirce. Você é a cara do seu pai, mas com os olhos


meigos de sua mãe. — Nando olha para ela confuso. — Como
estava dizendo a Aurora, vi vocês bebês. Peguei vocês dois no colo.
Já conheço Caio e Manu de muitos anos.
Nando assente e se senta ao meu lado.
Conversamos um pouco sobre coisas do dia a dia, e vez ou
outra pego Nando me olhando com tanto carinho que é impossível
não notar. Não vejo a hora de poder assumir para todos que
estamos juntos.

— Então, Dirce, você quer anotar o número de telefone dela?


Ela parece um pouco perdida em seus pensamentos.

— Sim, pode falar o número, por favor. — Dirce pega um


celular na bolsa e vai anotando. — Muito obrigada, Aurora, você é
um amor. Agora já vou indo, mas antes, posso dar um abraço em
vocês?
Nando e eu nos entreolhamos antes de concordarmos, e
então ela abraça Nando, e depois me rodeia com seus braços; e,
mesmo não sabendo explicar, sinto que não é um abraço como
qualquer outro.
Nós a acompanhamos até a porta e Nando a abre.
— Muito obrigada por me receberem tão bem. Espero vê-los
em breve.

— Foi um prazer conhecê-la — diz Nando com simpatia.


— Sim, também adorei te conhecer — eu digo e Dirce abre
um grande sorriso.
Ela acena em despedida e nós fazemos o mesmo. Assim que
se vai, Nando fecha a porta e me abraça.

— Gostei dessa senhora, parece ser boa pessoa. O que você


achou dela?
Envolvo meus braços em seu pescoço.

— Eu também gostei, mas ela parecia abatida. Manu e Caio


nunca falaram sobre essa Dirce.
Nando me beija.
— Vai ver eles esqueceram. Não tem como falar de todos os
amigos que já tiveram na vida. — Ele dá de ombros.

— Você tem razão.


Nando me levanta em seus braços e me leva até o sofá, e
então me deita e fica em cima de mim, me olhando.
— Assim vou ficar com vergonha. Para de me encarar. —
Tapo seus olhos com minhas mãos.
— Não! Eu gosto de admirar você, minha Aurora. — Tiro
minhas mãos e Nando sorri daquele jeito que eu adoro.

— Amo quando me chama de minha Aurora. — Acaricio sua


bochecha.
— Minha Aurora, minha Aurora, só minha.

Seguro sua nuca e o trago para mim.


Iniciamos um beijo, que logo vai ficando mais intenso. A mão
de Nando já passeia sobre meu corpo, me fazendo ferver. Mesmo
ele estando de calça jeans, consigo sentir sua ereção. Seus lábios
descem até o meu pescoço e um gemido de prazer me escapa.
— Que tal uma rapidinha antes deles chegarem? — Nando
morde minha orelha. Mas antes de responder, a campainha toca.
— Acho que vamos ter que continuar mais tarde, meu amor.
— Dou um último beijo em seus lábios.
— Difícil essa vida! — ele resmunga.

Nando se senta, pega a almofada e coloca no colo. Arrumo


meus cabelos e minha roupa, que estão totalmente bagunçados, e
vou até a porta. Assim que abro, vejo Mari e Rafael sorrindo.
— Amiga, eu trouxe um pote de sorvete pra irmos comendo
enquanto conversamos. É seu favorito, de beijinho. — Mari levanta
a sacola que está em sua mão.
— Que maravilha. Entrem, por favor!
Os dois entram e Rafa me dá um beijo no rosto. Mari faz o
mesmo.
Eles vão até Nando cumprimentá-lo.
— Vamos jogar? — Nando pergunta a Rafa.
— Se você estiver pronto pra perder como da última vez. —
Os dois riem.

Rafa é um pouco mais velho que nós, mas seu jeito de ser
combina muito com o nosso. Ele é bem alegre, do mesmo jeito que
Mari. Eles fazem um par perfeito.
— Vamos lá na cozinha pegar duas colheres e subir pro
quarto — digo e Mari concorda.

Assim que chegamos no quarto, nos sentamos frente a frente


e colocamos o pote de sorvete no meio para que nós duas
possamos comer.
— Pode desabafar, amiga. Coloca tudo pra fora. Quero saber
tudo nos mínimos detalhes — Mari fala e depois leva uma colher
cheia de sorvete à boca.

Parada agora em frente a essa porta, penso mil vezes se


aperto a campainha ou não. Será que estou fazendo a coisa certa?
Será que Manu vai gostar de me ver? Será que eles ficarão
orgulhosos pelo que já conquistei?
Agora tenho minha casa e consegui um emprego de
doméstica. Sei que não poderei proporcionar a Aurora o estilo de
vida que Manu e Caio dão, mas eu quero tanto falar com minha
filha, ser ao menos sua amiga. Mas não vou me revelar. Quero
antes conquistar sua confiança. Chegar agora e jogar toda a
verdade em seu colo seria traumatizante. E eu mesma fiz Caio e
Manu prometerem que não iriam contar a ela sobre mim.
Aurora deve pensar que sua mãe está morta. Nem sei se
Manu contou a ela meu nome, então acho melhor usar um nome
falso. Respiro fundo e toco a campainha. Quando a porta é aberta,
vejo uma linda moça de cabelos loiros e olhos idênticos aos meus.
Sinto meu coração acelerar. Esperei tanto por esse momento. Minha
princesinha está tão linda! E parece tão feliz. Tenho vontade de
abraçá-la e dizer o quanto eu a amo, que fiz tudo isso para ela
poder ter um futuro. Mas não posso.
Ouvir Aurora dizer que não se lembra de mim dói tanto.
Queria que tudo tivesse sido diferente e que eu a tivesse visto
crescer, mas foi preciso me entregar à polícia. Hoje posso andar na
rua de cabeça erguida, pois paguei por todo o mal que fiz. Não devo
mais nada à sociedade. A todo tempo tento segurar o choro. É muita
emoção vê-los após todos esses anos. Estou tão orgulhosa dela e
de quem se tornou. Quando ela fala do amor e da admiração que
sente por Manu e por Caio, percebo que fiz a escolha certa.
Ao ver Nando, me lembro tanto de Caio. Ele tem o mesmo
charme do pai, só que de um jeito mais sério. E o modo como ele
olha para a irmã me faz pensar que há algo acontecendo entre os
dois. Será que estão apaixonados? Não acharia estranho se um se
apaixonasse pelo outro.
A ironia do destino... Eu tentei separar Manu e Caio para
poder ficar com ele e felizmente não consegui, e agora minha filha e
o filho deles podem estar apaixonados.
Quando abraço Nando, sinto a mesma coisa de quando
abracei Manu. Já quando abraço minha filha, sinto tanta felicidade.
Saio daquela casa com a certeza de que quero me aproximar
dela e, quem sabe um dia, poder contar toda a verdade. Mas
primeiro preciso falar com Manu e Caio. Espero que eles não achem
ruim eu ter vindo até aqui. Queria falar pessoalmente com os dois,
mas como estão viajando, nosso primeiro contato após anos será
por telefone.
Caio e eu estamos deitados na cama do hotel descansando
— havíamos acabado de chegar da rua — quando escuto meu
celular tocar. Número desconhecido. Eu atendo.
— Alô, quem fala?

— Manu?
Sinto meu coração acelerar ao reconhecer a voz.
— Dulce, como você está? Onde você está? Faz tanto tempo
que não nos falamos — falo tudo apressadamente e a escuto rir.
Caio me olha surpreso ao ouvir o nome de Dulce.
— Eu também estava com saudade. Estou bem, acabei de
chegar em casa. Manu, eu preciso conversar com você e Caio
pessoalmente.

— Como você conseguiu meu novo número? — pergunto,


confusa.
— Aurora que me passou. — Na hora meu coração erra uma
batida. — Eu não falei nada de mais pra ela, pode ficar tranquila.
— Mas ela sabe seu nome, eu já falei a ela. Deus, Dulce, ela
vai ligar os nomes.
Caio me olha preocupado e meus olhos se enchem d'água.
— Manu, se acalma, eu inventei um nome. Aurora está tão
linda e Nando também!
— Dulce, me manda seu endereço, vamos agora te
encontrar. Precisamos muito conversar.

— Vou te mandar, mas tenta ficar calma, eu não vou fazer


nada que prejudique vocês ou ela, pode confiar em mim.
— Eu sei, mas tenho medo, Dulce. — A ouço suspirar. — Vou
arrumar minhas coisas e então pegamos a estrada.

— Ok, estou esperando vocês. Até mais.


— Até.

Encerro a ligação e fico um tempo encarando o celular.


Dentro da minha cabeça e do meu coração, tudo está fora do lugar.
— Manu, respira ou você vai ter um troço. — Caio me abraça.
— Dulce foi lá em casa, Caio. Ela viu Aurora e Nando. E se
Aurora souber que mentimos pra ela? Ela vai nos odiar. Não
deveríamos ter aceitado mentir. — As lágrimas já rolam sem parar.
— Princesa, tenta não sofrer antecipadamente. — Caio
levanta meu rosto e limpa minhas lágrimas. — Nós fizemos nosso
melhor por ela. Temos que ter fé que se algo acontecer, Aurora
levará isso em conta.
— Não vou aguentar se ela se afastar de mim, Caio. Dulce
ainda mudou de vida, se redimiu, mas tem Miguel. Imagine como ela
vai ficar quando souber o que ele era, que já tentou te matar. — Me
lembrar de tudo o que passamos quando aquele ser estava vivo faz
meu coração se apertar. — Que Dulce foi presa por assassinar o pai
dela.
— Miguel era um demônio! Dulce se livrou dele pra manter
Aurora em segurança, meu amor. Se acalma, vamos dar um jeito,
sempre damos, e dessa vez não será diferente.

O abraço apertado de Caio me faz recuperar a força e a


esperança.
Nos levantamos e começamos a arrumar nossas coisas. Meu
celular apita e o pego rapidamente. Vejo que é uma mensagem de
Dulce. Pelo endereço enviado, ela está na cidade vizinha, na
mesma cidade onde ficou quando a escondemos de Miguel.

Já estamos há um tempo na estrada. Estou sentindo uma


mistura de emoções. Pelo que mostra no GPS, já não falta muito
para chegarmos ao endereço.

— Nós enfrentamos tudo juntos, agora não será diferente. —


Caio estende a mão em minha direção e entrelaço nossos dedos. —
Lembra que você é meu porto seguro, Manu.
— E você é o meu.
Ele me olha rapidamente e sorri.

Caio estaciona o carro em frente a uma pequena casa


amarela de portões brancos e nós descemos. Avisto Dulce parada
ao lado do portão. Ela parece tensa e me olha com os olhos já
cheios de lágrimas. Nos abraçamos e nos permitimos chorar no
ombro da outra.
— Muito obrigada, Manu, muito obrigada mesmo — diz em
meio ao soluço. — Nada que eu diga vai expressar minha gratidão.
Aurora se tornou uma mulher incrível graças a vocês.
— Não precisa agradecer, eu a amo tanto. Não quero ficar
sem ela.
— Você não vai ficar sem ela, meu amor. — Caio acaricia
minhas costas e Dulce se afasta, me olhando nos olhos.

— Caio tem razão. Eu não quero tirar ela de você, nem nada
do tipo. — Dulce segura minha mão. — Agora vamos entrar, é
melhor conversar lá dentro.
Entramos juntos e nos sentamos no sofá.

— Como está sua vida? Não nos falamos desde a última vez
que fui te visitar, muitos anos atrás. Você falou que não queria mais
ter nenhuma ligação com a gente.
Dulce me olha triste.
— Desculpa, Manu, eu não queria te ver indo naquele lugar.
Você se sujeitava a uma revista humilhante só pra me visitar. Achei
melhor falar isso pra você não voltar mais, e com os anos Aurora
poderia desconfiar. Só tentei fazer o melhor por vocês. — Ela
segura minha mão com carinho. — Nunca parei de pensar em
vocês. Eu não tenho mais ninguém no mundo, vocês são minha
família.
— O que você achou de Aurora? — Caio pergunta e na hora
ela abre um sorriso.
— Ela está linda! Conversei pouco tempo com ela e com
Nando, mas dá pra ver que os dois são pessoas maravilhosas.
Vocês souberam criá-los muito bem. Não esperava menos de vocês.
Caio me olha todo orgulhoso.
— E você está trabalhando? — pergunto e Dulce faz que sim
com a cabeça.
— Estou há um tempo trabalhando como empregada
doméstica em uma casa aqui da cidade. Eu gosto do trabalho, o
pessoal de lá me trata muito bem e não me julga por ser ex-
presidiária.
— Você sabe que se precisar de um emprego ou qualquer
coisa pode procurar a gente, né? — Caio diz e Dulce o olha com os
olhos marejados.

— Eu não sei o que de bom fiz na vida pra merecer vocês.


Mas muito obrigada, de coração. Eu quero conquistar minhas coisas
sozinha. — Sua atenção se volta para mim. — Manu, eu tentei me
manter longe, mas senti tanta falta de vocês e queria tanto ver
minha filha... Espero que não fiquem chateados comigo. — Dulce
abaixa a cabeça. — Eu não aguentava mais vê-la somente nas fotos
das redes sociais.
— Pra falar a verdade, eu entrei em desespero quando você
falou que tinha pegado meu número com Aurora, mas agora já
estou mais calma. O que tenho medo, Dulce, é de Aurora descobrir
tudo e ficar com raiva por termos mentido, falando que você havia
morrido. E quando souber quem Miguel era e como ele morreu... Eu
não sei o que vou fazer se ela tentar se afastar de nós. — Minha voz
vacila só de pensar em ficar sem minha filha.
Caio me abraça e acaricia meu cabelo.
— Eu não vou falar nada sem o consentimento de vocês, eu
fiz vocês mentirem pra ela. Eu só quero ao menos ser amiga da
minha filha, poder fazer parte de sua vida. Se vocês me permitirem.

— Nenhum dos dois te impediria de chegar perto dela, só


temos que ir com cuidado — Caio diz e eu concordo.
— Muito obrigada, vocês não têm noção de como isso é
importante pra mim. — Dulce sorri largamente. — Só tem uma coisa
que queria perguntar a vocês.

— Sim, pode perguntar — respondo


— Nando e Aurora... Eles se amam, não é?
— Claro que se amam, eles são irmãos. — Caio ri.
— Não. Estou falando de amor de homem e mulher. — Eu
rio. Isso é totalmente improvável. Mas o jeito que Dulce me olha... —
Vai me dizer que vocês não repararam nisso?
— Nando e Aurora?! — Caio parece mais confuso que eu. —
Mas não pode ser!
— E por que não, Caio? Eu não vejo problema nenhum! Fico
feliz que minha filha encontre um bom homem e se mantenha longe
de gente como Miguel. Aquele não merece nem ser chamado de
pai.

Nessa hora, parece que tudo se encaixa na minha cabeça.


— A garota que Nando falou... e o novo amor de Aurora. Um
falou sobre o outro para mim. — Caio me olha surpreso. — Você
percebeu a cara feia que Nando ficou quando levamos Adam com a
gente pra casa? É isso! Aurora não quis falar quem era quando
questionei. E Nando também não.

Caio cruza os braços, ainda incrédulo.


— Caio, pensa comigo! Se fosse pra Aurora namorar com
alguém, se casar e ter uma família, você não iria querer que fosse
alguém como Nando? — Dulce pergunta.
Ele hesita, e então encolhe os ombros.
— Sim... Nando é um homem de respeito, honesto,
trabalhador...
— Carinhoso, sabe tratar bem uma mulher — complemento.
— Nando é perfeito pra ela, ao contrário de Henry.
— Quem é esse Henry? Ele fez Aurora sofrer? — Dulce
questiona, já nervosa.
— Henry é o ex-namorado dela. Você acredita que ele a
traiu? Só de me lembrar... — Balanço a cabeça negativamente.
— Que safado!

— Nando e eu já demos um jeito nele — Caio fala todo


orgulhoso e Dulce ri.
— Ainda não acredito que não tínhamos reparado que os
dois estavam se gostando.
— É muito estranho pensar neles como um casal — Caio diz.
— Deve ser por isso que eles não falaram nada ainda, mas
está estampado na cara dos dois que eles se gostam — diz Dulce.
— Tenham paciência com eles, por favor. Se minha suspeita for
mesmo verdade, já imagino como será difícil para os dois
assumirem isso perante essa sociedade hipócrita.
— Você tem razão — digo.
Só de imaginar alguém apontando o dedo para os dois,
julgando meus filhos... Ainda estou assimilando essa nova
informação, mas se for mesmo verdade, sei que defenderei os dois
de qualquer pessoa maldosa que ouse cruzar nossos caminhos.
— Vocês sabem que não mandamos em nossos corações. E
sabem exatamente como é estar apaixonado, amar alguém e ser
amado da mesma forma. Já eu não posso dizer o mesmo. Acho que
nunca fui amada de verdade. — Dulce se entristece.
— Dulce, ainda está em tempo. Quem sabe aparece alguém
que faça seu coração disparar e que dê o valor que você merece?
Você é linda! E merece ser feliz.
— Manu, você é incrível. — Dulce me abraça.

— Já está tarde, acho melhor irmos pra casa. É perigoso ficar


na estrada tarde da noite. — Caio se levanta e nós duas fazemos o
mesmo.
— Vamos manter o contato. Vou marcar um almoço lá em
casa. Pra reunirmos toda a família. — Dulce assente animada. —
Aos poucos você será introduzida a vida de nossa menina.
— Eu agradeço muito.

Após nós despedimos de Dulce e voltamos para a estrada.


Durante todo o trajeto, Caio e eu conversamos sobre nossos filhos
serem um casal amoroso. Não vou mentir, a notícia nos pegou de
surpresa, mas demos a nossa palavra que iremos tratar essa
situação de mente e coração aberto. Ao chegarmos em casa me
sinto ainda mais nervosa. Assim que abrimos a porta, damos de
cara com Nando e Aurora grudados no sofá. Ela está sentada entre
suas pernas e ele acaricia calmamente seus cabelos. Até que
finalmente notam a nossa presença e empalidecem. Caio aperta a
minha mão e sei que vai aprontar.
— Que merda é essa, Fernando?! — pergunta com rudeza e
os dois se afastam.
Meu coração parece que vai sair pela boca. Não posso
acreditar que meus pais nos pegaram em flagrante. Eu não queria
que descobrissem dessa forma. Me sinto horrível por fazer Aurora
passar por isso.
— Estou esperando, Fernando. Me explica o que está
acontecendo aqui! — Meu pai parece furioso.
Os dois se sentam no sofá à nossa frente e eu olho de
esguelha para Aurora, que está tão assustada quanto eu. Seguro a
sua mão e respiro fundo, tomando coragem para colocar tudo para
fora. Não será do jeito que imaginei, mas não vou deixar ninguém
nos separar, nem mesmo meus pais.
— Pai, eu sei que pode parecer loucura, mas eu amo Aurora,
e não é como irmão. Já sentia isso há um tempo, porém só assumi
a mim mesmo há alguns dias. Peço que vocês me entendam, mas
se não conseguirem, que pelo menos aceitem nosso
relacionamento. Eu vou ficar com ela, não importa o preço que
tenha que pagar. Estou disposto a enfrentar qualquer coisa, desde
que ela esteja ao meu lado. — Vejo os olhos de minha mãe se
encherem de lágrimas e isso corta o meu coração. — Me desculpa,
mãe, eu não queria te causar desgosto, mas eu amo tanto Aurora
que meu peito dói só de pensar em ficar longe dela um dia sequer.
Fui eu que tomei a iniciativa. Eu a beijei e ali pude perceber que
amo essa garota com todas as minhas forças.
— E você, Aurora, o que tem a dizer sobre isso? — minha
mãe pergunta, limpando as lágrimas.

Aurora abaixa a cabeça e aperta minha mão.


— Eu juro que tentei lutar contra esse sentimento, tentei me
afastar dele. No começo, achei que realmente era loucura, mas hoje
posso dizer com toda a certeza do mundo que amo Fernando do
mesmo jeito que ele me ama. Lutei contra esse sentimento por
medo de decepcionar vocês, e por medo dos julgamentos. Íamos
contar a vocês, não agora, mas íamos. Não queria envergonhá-los.
— Lágrimas começam a cair de seus olhos.
Abraço Aurora e beijo a sua cabeça, e meus pais nos olham
atentamente, intensamente.
— Então vocês realmente se amam? — meu pai pergunta,
sério, e sua pergunta parece mais uma afirmação do que qualquer
outra coisa.

Aurora e eu balançamos a cabeça, confirmando.


— Você tem duas opções, Fernando. — Ele me mostra dois
dedos. — Se ficar com Aurora, você perde o emprego na loja e
também terá que sair de casa de mãos vazias.

Aurora me olha assustada.


— Qual é a segunda opção? — Mesmo já sabendo o que
será, quero ouvir direto dele.
— Agora, se decidir acabar com essa palhaçada, essa pouca
vergonha, seguimos nossas vidas normalmente e fingimos que isso
nunca aconteceu. — Meu coração se aperta só de pensar nessa
hipótese. — Você se manterá afastado dela e o único
relacionamento que terão será o de irmãos.
Minha mãe parece atormentada, mas se mantém calada.

— Vamos, Aurora! — Me levanto segurando a sua mão. —


Precisarei da sua ajuda pra arrumar minhas coisas o mais rápido
possível.
— Não, Nando, você vai perder tudo por minha causa — diz
desesperada.

— Eu já fiz minha escolha, e ela é você — digo com firmeza e


abraço Aurora. — Nós vamos conseguir, eu garanto isso.
— Chega, Caio, eu não aguento mais! — minha mãe fala,
vindo até nós. — Seu pai não está falando sério, ele só queria te
testar pra ver se isso era sério mesmo. — Minha mãe abraça
Aurora, que ainda está abalada com tudo.

Não posso acreditar nisso. Eu quase morri do coração por


nada!
— Desculpa, filho, mas precisava ter a prova de que esse
amor é verdadeiro. Estou tão orgulhoso de você. Não pensou duas
vezes, escolheu o amor e não o dinheiro. — Meu pai me abraça e
só então me permito respirar aliviado.

— Pai, acho que vai ter que buscar minha alma lá no céu.
Aqui só tem o corpo.
Ele ri sem jeito.
— Não vamos julgar vocês por estarem apaixonados. Como
disse uma amiga: ninguém manda no coração. Eu só quero que
vocês sejam muito felizes! — Minha mãe abraça nós dois de uma
vez. — E quero que saibam que estamos com vocês para o que der
e vier. — Olho para meu pai, que balança a cabeça concordando. —
Nem dá pra acreditar. Meus filhos estão juntos como um casal, e eu
nem tinha reparado nisso. Que tal fazermos um jantar bem gostoso?
— Manu, já é quase meia-noite! — meu pai fala. Ela olha
para ele de cara fechada.
— Eu ainda não jantei, e você também não. E vocês? —
pergunta a Aurora e eu.

— Comemos pizza mais cedo com Mari e Rafa, mas já estou


com fome — Aurora responde.
— Vamos todos pra cozinha preparar algo bem gostoso. —
Ela segura a minha mão e a de Aurora e nos leva até a cozinha. —
Vamos, Caio, você também vai ajudar, não vai fugir.
— Tá bom! — ele resmunga.
Ficamos os quatro na cozinha conversando enquanto
preparamos o jantar. Nem parece que pouco tempo atrás meu
mundo estava desmoronando. Mas se fosse realmente verdade o
que meu pai havia falado, não teria dúvida, sairia de casa com a
cabeça erguida, pois estaria lutando pelo amor da minha vida.

Olho para Aurora admirado. Ela sorri sem parar com as


palhaçadas que meu pai faz, e que sorriso lindo. Como já estamos
terminando, os dois começam a pôr a mesa.
— Como eu não tinha reparado nesse olhar antes? — minha
mãe pergunta e acabo sorrindo.

— Eu nunca amei alguém como a amo, mãe. Sério! Não


sabia que dava pra sentir um amor tão forte assim. Sinto que seria
capaz de qualquer coisa pra vê-la sorrir, mantê-la segura. Devo
estar parecendo um bobo. — Balanço a cabeça, mas com um
sorriso no rosto.
— Não está parecendo um bobo, filho. Você descobriu o que
é um amor verdadeiro e isso é lindo.
Dou um beijo em sua testa. Eu não poderia ter pais melhores
que esses.
— E aí, o rango sai? Já terminamos de arrumar a mesa —
meu pai fala, parando ao nosso lado.
— Pra quem falou que já estava tarde pra jantar, você parece
bem faminto, né, senhor Caio Alves? — provoca. Os dois sorriem.
Me pergunto se era isso que queria dizer. Se é assim que olho para
Aurora. Dá pra sentir o amor só nesse olhar.
— Esse cheiro de macarronada e bife acebolado está me
matando. — Aurora vem para perto de nós, pega um pedacinho do
bife e leva à boca.
— Podem se sentar que já vou colocar a comida na mesa —
minha mãe diz, e eu sorrio em expectativa.

Já estamos subindo para o quarto após o jantar. E o melhor


de tudo é a consciência de que não precisamos mais nos esconder.
Não há mais segredos em nossa família. Nossos pais aceitaram
nosso relacionamento e disseram com todas as letras que irão nos
defender de tudo e de todos.

— Boa noite, amo vocês. — Minha mãe me dá um beijo e um


abraço, faz o mesmo em Aurora e vai em direção ao seu quarto.
— Boa noite, pombinhos, e se cuidem. Não quero netos cedo
demais.
— Pai!

Ele ri da minha cara, entra no quarto e fecha a porta.


Me viro pra Aurora e a abraço, e ela envolve o meu pescoço
com seus braços.

— Você quer dormir no seu quarto ou no meu? — pergunto e


ela arqueia uma sobrancelha.
— E é assim agora?
Eu assinto.
— É só acordarmos antes deles e irmos cada um para o seu
quarto. Só quero dormir ao seu lado. — Dou um beijo em seu
pescoço.
— Só vou escovar meus dentes. Te espero no meu quarto. —
Ela pisca e me dá um selinho.
Após escovar os dentes, espero alguns minutos, pego meu
celular e vou até seu quarto. Quando chego lá, Aurora já está
debaixo do edredom, com um sorriso no rosto. Ela abre espaço para
mim e eu me deito ao seu lado. Aurora se aconchega em meu peito
e coloca uma perna em cima da minha. Acho que nenhuma palavra
no mundo descreveria a felicidade que estou sentindo por não
precisar esconder o que realmente sinto por ela.
— Nando, você estava mesmo disposto a abrir mão de tudo
pra poder ficar comigo? — pergunta baixinho.

— Estava. Eu te falei que quero ficar com você e iria até


contra meus pais se fosse preciso. Eu te amo, baby. Te amo mais
que a mim mesmo.
— Eu também te amo, Nando, como nunca imaginei que
amaria. Você é minha outra metade. — Aurora levanta o rosto e
encosta os lábios nos meus.
O beijo de minha Aurora tem tudo o que preciso: carinho,
amor, desejo e paixão.
Amanhã enfim é a inauguração da minha lojinha e estou tão
feliz. Hoje vim só para dar uma última revisada, não quero que nada
esteja fora do lugar. Quero perfeição. Alguns dos vestidos de festa
estão na vitrine e vi várias pessoas de olho quando passavam na
rua. Espero que a inauguração seja um sucesso, quero muito
orgulhar minha família.
Daqui a pouco Nando sairá do trabalho e passará aqui para
me buscar. Nosso relacionamento está mais forte do que nunca e
agora não escondemos de ninguém que estamos juntos. É um
sentimento de liberdade tão bom. Apesar de algumas pessoas
olharem torto para nós e até soltarem piadas de mau gosto,
estamos seguindo em frente de cabeça erguida. Caio e Manu nos
dão total apoio e quando um dos dois nos vê em uma situação
constrangedora, fica super irritado e parte para nos defender.
Tudo que tenho que fazer é agradecer a Deus por ter me
dado pais tão maravilhosos. Não mudaria nada em nenhum dos
dois. Nando tem tanto deles. Às vezes queria saber se puxei para o
lado da minha mãe ou do meu pai.

Após verificar tudo pela terceira vez e deixar as roupas


impecáveis nos manequins, vou até o caixa onde deixei meu celular.
Me abaixo para pegar minha bolsa atrás do balcão e escuto a porta
da loja se abrir. Pelo horário, sei que não é Nando. Ainda faltam uns
dez minutos para ele sair do trabalho.
— Desculpa, a loja ainda não inaugurou. — Quando olho em
direção a porta, não consigo acreditar. Só pode ser brincadeira com
a minha cara.

— Vim falar com você. Esclarecer algumas coisas. — Henry


vem pisando firme em minha direção.
— Sério, Henry?! Você se deu ao trabalho de vir aqui pra
encher meu saco? — Irritada, enfio o celular na bolsa. — Pensei
que já tinha superado. Segue sua vida, cara! Arruma uma
namorada, ou começa a namorar a garota com quem você me traía.
Só me esquece, pelo amor de Deus!

— Aurora, você está namorando o seu irmão?! Que


safadeza. — Sinto sua mão apertar o meu braço. — Você já deixava
ele te comer quando estávamos juntos? Se fazia de santa e
recatada, mas dava pra dois ao mesmo tempo, aposto. Tem ideia do
que estão falando de mim por aí?
Meu sangue ferve ao ouvir suas palavras. Como ele tem a
audácia de falar comigo desse jeito? Ele acha que sou o quê?
Quando dou por mim, já havia dado na cara dele e sinto a palma da
minha mão arder. Henry me olha furioso e segura meu outro braço.

— Você está ficando maluca? — Seu olhar está sombrio, mas


não o deixo me intimidar.
— Maluco é você! Se não me soltar agora, vou começar a
gritar. Henry, você está cheirando a bebida, está fora de si. Me solta
agora! — falo o mais firme possível.

— Eu sinto sua falta. — Sua voz agora é melancólica. —


Você não pode namorar seu irmão, você tem que voltar pra mim. Eu
fui seu primeiro homem. Eu te fiz mulher, Aurora.
Eu não quero acreditar que isso está acontecendo. Que ódio
que estou sentindo. Chato, bêbado e ainda agressivo... Essas são
as piores combinações.
— Henry, a única coisa que você fez foi tirar minha
virgindade, pois nem sequer um orgasmo você conseguiu me
proporcionar. Já de Nando, não posso dizer o mesmo. Mas, pra ser
sincera com você, nós só fizemos isso quando já estávamos
separados. Ao contrário de você, eu tenho minha consciência limpa.
— Henry fica vermelho e aperta ainda mais o meu braço. — Ele já
deve estar chegando junto com Caio e Manu. Os três vão passar
aqui pra me buscar, então se prepara pra levar outra surra, como da
última vez.

— Você é uma vagabunda! — Ele me solta com tanta


brutalidade, que me desequilibro e caio no chão. — A gente ainda
não terminou.
— Está me ameaçando, Henry? — Me levanto e o encaro.

— É só um aviso!
Assim que Henry sai, me sento na cadeira. E só então
percebo que estou com as minhas mãos tremendo. Como esse
idiota sabia que eu estava aqui na loja? Agora terei que tomar
cuidado redobrado. Sinto meu estômago embrulhar. Na hora da
raiva, falei coisas que não devia, só alimentei mais essa loucura
dele.
Passo minhas mãos no local onde ele apertou e levanto as
mangas da blusa vendo que ficaram algumas marcas. Escuto a
porta sendo aberta novamente e respiro aliviada quando vejo meu
amor entrar sorrindo para mim.
— A loja ficou tão linda. É a sua cara — ele fala, e eu me
levanto e vou até Nando. O abraço forte. — O que foi? Aconteceu
alguma coisa? — Seus olhos são pura preocupação.
— Só estou cansada. Não imaginei que organizar a loja seria
tão trabalhoso. — Dou um sorriso e Nando beija minha cabeça.
— Vai ser daí pra pior. Sua loja vai ser um sucesso. Você é
uma excelente estilista e vai conquistar o mundo!

— Obrigada. — Dou um selinho em seus lábios e volto a


abraçá-lo.
Como eu amo esse homem! Nando me faz sentir segura e
protegida.

Henry parecia ser tão bom quando começamos a namorar,


mas agora está se mostrando uma pessoa totalmente diferente.
Parece estar possuído por um espírito maligno.
— Vamos pra casa que amanhã é seu grande dia!
Eu concordo com um aceno.
Pego minha bolsa, tranco tudo e vamos para casa.
Felizmente não vou trabalhar sozinha, terei uma funcionária comigo,
que ficará no caixa. Isso me deixa um pouco mais tranquila.
Chegando em casa e subo direto para o meu quarto. Não
demora para Nando entrar e se sentar ao meu lado na cama.
— Tem certeza que não aconteceu nada, Aurora? Eu te
conheço como a palma da minha mão. Você não está assim por
causa da loja. Me conta o que houve. — Nando passa a mão em
meu braço e encosta onde Henry machucou. Acabo soltando um
gemido de dor. — Você está machucada? — Ele me olha mais
preocupado ainda.
— Não é nada. Não precisa se preocupar.
Me levanto da cama e Nando vem até mim e levanta a
manga da minha blusa. Ele vê a marca, que agora está bem mais
escura. Minha pele é muito branca então qualquer coisa já fica
marcado.
— Quem fez isso com você? — Seus dedos tocam com
cuidado o local.
— Promete pra mim que você não vai surtar?

Sua respiração fica mais pesada e Nando cerra os punhos.


— Aurora, me conte tudo o que aconteceu agora! — O tom
de sua voz muda.
— Mas primeiro você tem que prometer que não vai surtar.
Ele respira e inspira.

— Pode falar, eu não vou surtar. — Nando dá um sorriso


forçado.
Seguro sua mão, o levo até a cama e ali conto tudo nos
mínimos detalhes. Já que é para falar, resolvo contar tudo.
— Eu vou matar ele! — Nando se levanta, segura a minha
mão e me leva até o escritório onde Manu e Caio estão lendo alguns
documentos.
— Aconteceu alguma coisa? — Manu nos olha preocupada, e
a mesma expressão está estampada no rosto de Caio.
— Olhem isso! — Nando levanta a manga da minha blusa
novamente. — Mãe, você leva ela até a delegacia pra abrir um
boletim de ocorrência?
— Quem fez isso com você, minha filha? — Manu pergunta,
vindo o mais rápido possível em minha direção, e Caio faz o
mesmo.
— Foi o Henry — respondo baixinho.

Nando sai do escritório pisando firme.


— Onde você vai, Fernando?! — Manu questiona.
— Eu vou acabar com ele e vai ser agora! — responde, já a
uma boa distância de nós.
— Caio, vá atrás dele, pelo amor de Deus. — Manu dá um
tapinha em seu braço e Caio pega a chave do carro e sai dali em
disparada. — Enquanto Caio cuida de Fernando, nós duas vamos
pra delegacia, torcendo pra Caio conseguir evitar uma tragédia.
Meu coração está tão apertado nesse momento. Estou
preocupada com Nando. Que ele não faça nada para se arrepender
depois.
O ódio que estou sentindo é tão grande. Como aquele lixo
teve coragem de machucar a minha Aurora e ainda falar aquelas
barbaridades para ela? Tudo que quero é acabar com ele, fazê-lo
pagar por tê-la machucado. Não sei nem como estou conseguindo
dirigir sem causar nenhum acidente. Já vi pelo retrovisor que meu
pai está me seguindo, mas nada nem ninguém vai me impedir de
dar o que aquele vagabundo merece. Assim que estaciono em
frente a sua casa, vejo seu carro na garagem.
Desço, vou até a porta e começo a tocar a campainha sem
parar. E, de relance, vejo meu pai estacionar o carro atrás do meu.

— Já vai! Mas que droga! — Escuto o traste falar e assim que


abre a porta, me olha surpreso. — Olha que visita inusitada! Oi,
cunhado. Cadê a safada da Aurora pra fazermos um sexo a três? —
Ele abre um sorriso.
Isso me deixa ainda mais furioso. Vejo que uma garrafa de
vodca quase vazia está em sua mão.

— O negócio é entre você e eu! — O empurro para dentro e


Henry cai de bunda no chão e começa a rir.
— Se sou eu e você, por que seu papai também está aqui?
— Ele aponta para o meu pai, que está bem ao meu lado de braços
cruzados.
— Henry, Henry... — Meu pai balança a cabeça. — Você não
sabe a vontade que estou de quebrar a sua cara, de dar tanto soco
na sua boca até não ter dente nenhum sobrando nela.

Vejo Henry engolir em seco e tentar se levantar, mas sem


muito sucesso.
— Mas hoje é seu dia de sorte. — Ele coloca a mão no meu
ombro. — Como você já está bêbado e se eu começasse a te bater,
não iria conseguir parar mais até ver que você não está
respirando....
— Pai, termina logo esse discurso. — Já estou impaciente.
— Calma, filho, primeiro a gente mexe com o psicológico
dele. Continuando, Henry, como não quero ir preso, pois sou muito
bonito pra ir pra cadeia, e também não conseguiria ficar anos longe
da Manu, vou deixar Nando cuidar de você sozinho. Mas vou dar um
último aviso muito importante. — Meu pai vai até ele, se abaixa e
fica bem perto do seu rosto. Ele olha profundamente em seus olhos.
— Se você encostar um dedo sequer em Aurora de novo, eu vou
quebrar seu pescoço com minhas próprias mãos. E não duvide! Eu
tenho coragem suficiente pra fazer isso. — Ele dá um tapinha em
seu ombro. — Pode ficar tranquilo que você não morre hoje.

Meu pai se levanta e vem até mim.


— Você vai bater pra ele aprender a nunca mais machucar
uma mulher, mas não vai passar dos limites. Eu estou aqui pra
garantir isso. Ele é todo seu. — Meu pai aponta para Henry, que
mais parece uma criança assustada.

— Se você me machucar eu vou te processar! — declara.


— Eu tenho um ótimo advogado e pago a indenização com
todo prazer — meu pai fala e ri enquanto fecha a porta.
— Você vai pagar pelas marcas que deixou nos braços de
Aurora.
Não demora para toda a minha raiva estar sendo descontada
em forma de socos. Meu pai fala comigo, mas é como se ele
estivesse longe, só ouço ruídos. Pego a garrafa que ele havia
segurado, bato-a no chão, quebrando o fundo, e me impulsiono para
enfiá-la na garganta do infeliz, desejando vê-lo sangrar até não
haver uma única gota de sangue em seu corpo, mas antes que eu
possa concretizar meus pensamentos, sinto a mão de meu pai
agarrar o meu braço.
— Chega! Você não vai fazer isso. Não vou deixar você
estragar a sua vida por causa de um lixo como ele. — Meu pai tenta
tirar a garrafa quebrada da minha mão. — Nando, solta isso agora!
— ordena com firmeza. — Sua mãe, eu e Aurora queremos você em
casa, e não na cadeia.
Quando meu pai diz isso, parece que enfim volto a mim. Lhe
entrego a garrafa e me levanto. Vejo Henry cuspir um pouco de
sangue no chão e isso, mesmo não sendo o bastante, ainda me dá
uma satisfação.
— O último recado foi dado, Henry — meu pai começa a
dizer. — Espero que isso não se repita, senão você já sabe. — Ele
me conduz para fora da casa e paramos em frente aos nossos
carros. — Você cortou sua mão, filho.
Olho para onde meu pai está apontando e vejo um pequeno
corte.

— Nem notei. Mas tenho uma toalhinha no porta luvas...


Vamos pra casa? Quero ver como Aurora está.
Meu pai abre um sorriso, concordando.
Assim que entro no carro, enrolo a toalha na mão e sigo meu
caminho. Estaciono na garagem e entro rapidamente, mas minha
mãe e Aurora não estão. Ainda devem estar na delegacia. Subo até
o quarto, faço um curativo no ferimento e olho minha roupa, que
está suja de sangue. Separo uma limpa e tomo um banho para me
livrar do que aconteceu essa noite. Com a água caindo sobre meu
corpo, penso no que quase fiz. Se meu pai não estivesse lá, eu o
teria matado. Perdi completamente o controle, só conseguia pensar
nas marcas no braço de Aurora e nas merdas que ele disse a ela.
Já de banho tomado e arrumado, desço até a sala para
esperar as duas chegarem. Quando enfim a porta é aberta, vou até
elas.
— Como você está?
— Estou bem — Aurora responde. — Fizemos o B.O e
também os exames necessários. E você não fez nenhuma besteira,
né?

Faço um carinho em seu rosto e sei que faria qualquer coisa


por essa mulher.
— Fernando Alves, por que tem um curativo na sua mão? —
Minha mãe segura a minha mão e avalia o curativo.
— Foi um corte pequeno, mãe. Nada demais. E Henry ainda
está inteiro. Machucado, mas inteiro. E, principalmente, vivo.
Ela respira aliviada e meu pai se junta a nós na sala.

— Princesa, eu fui com ele. Não deixaria Nando passar dos


limites. — Ele abraça minha mãe.
— E você fez alguma coisa contra ele? — No momento em
que minha mãe pergunta a meu pai, lembro de tudo o que ele falou
e não sei como Henry não se mijou de medo.
— Eu não. Só fiquei observando, pra garantir que as coisas
não saíssem de controle. — Minha mãe olha para ele com os olhos
semicerrados. — Eu não encostei nele, Manu. O garoto já estava
bêbado, não aguentaria os dois. E se começasse a bater nele, não
iria conseguir parar. Então achei melhor não me envolver.
— Que bom. Eu liguei para o nosso advogado e ele nos
encontrou na delegacia. Aurora já tem uma medida protetiva. Henry
não pode chegar perto dela nem falar com ela nas redes sociais.
Nenhuma comunicação entre os dois, nem aproximação. — Ela dá
um selinho nele. — Vou descansar um pouco. Se precisarem de
alguma coisa, só me chamarem, meus amores.
Aurora e eu concordamos. Ela segura a mão de meu pai e os
dois sobem para o quarto.

Aurora e eu nos sentamos no sofá e eu a abraço.


— Seus braços ainda estão doendo?

— Um pouco, mas logo passa. Eu fiquei tão preocupada com


você. Fiquei com medo de fazer uma loucura.
Dou um beijo em seus lábios.

— Eu não fiz porque nosso pai estava lá. Nunca imaginei


ficar com tanta raiva. Fiquei cego, Aurora. Não sei como nosso pai
conseguiu se controlar... Acho que ele sabia que um dos dois teria
que manter o controle, senão Henry não estaria vivo agora.
Aurora deita sua cabeça em meu peito e sinto meu coração
aquecer.
— Espero que isso não aconteça mais. Eu fiquei com medo
dele me bater ou fazer algo pior. Na hora da raiva, falei coisas que
não devia. Sorte que já estava perto da hora de você ir me buscar
— diz baixinho.
— Espero que depois do que aconteceu hoje, ele entenda
que é pra se manter afastado de você. — Seguro seu rosto e olho
profundamente em seus olhos. — Podem fazer qualquer coisa
comigo, qualquer coisa mesmo, mas não com você. Só de imaginar
alguém te machucando eu perco o juízo. Você é tudo pra mim, baby.
Você é o ar que respiro, o sol que me aquece, a luz que ilumina meu
mundo.
Vejo uma lágrima cair no canto de seus olhos e a enxugo.
— Eu te amo — Aurora sussurra.
— Eu também te amo. — Beijo minha Aurora.
Agradeço por meu pai ter me parado a tempo, ou teria
estragado minha vida e ainda ficaria longe da minha Aurora. Isso
seria pior do que perder a liberdade.
Meu corpo está em chamas. Sinto ele estremecer assim que
atinjo o limite do prazer. Nando continua com seus movimentos
fortes e precisos e nossos corpos se encaixam de um jeito tão
gostoso. Sua respiração acelera mais ainda e nesse momento sei
que também se satisfez. Já conheço muito bem meu homem. Com
calma ele abaixa minha perna e seu braço se envolve em minha
cintura. Sentir seu nariz em minha nuca me faz cócegas. Temos
sorte que o quarto de Manu e Caio fica bem afastado dos nossos e
podemos aproveitar nossas noites juntos.
— Eu te amo — sussurra em meu ouvido. Me viro para
Nando. Ele se deita de barriga pra cima e já entendo o que quer.

— Eu também te amo. — Deito minha cabeça em seu peito e


acaricio seu rosto, enquanto olhamos profundamente nos olhos um
do outro.
Eu poderia facilmente me perder nesse olhar. Ninguém nunca
me olhou assim, com tanta ternura, amor e admiração.

— Estava pensando em comprar um apartamento — ele diz e


meu coração aperta.
Será que ele está querendo se afastar de mim? Sou uma
namorada muito grudenta? Saio de cima do seu peito e me viro para
o outro lado da cama.
— Ei, por que saiu? — Nando pergunta, e sua mão segura
minha cintura.
— Você quer se afastar de mim. — As palavras quase não
saem.
— Nunca na minha vida me afastaria de você por vontade
própria. — Um beijo suave é dado em meu pescoço, me fazendo
arrepiar. Me viro para ele.
— Então por que quer sair de casa? — pergunto, já com a
voz embargada.
— Baby, eu quero comprar um apartamento pra morarmos
juntos. Só nós dois. O que acha? Você quer morar comigo?
Nesse momento, por mais que a bolha de felicidade que nos
encontramos seja incrível, me lembro que não poderemos nos
casar, como todos os casais. Acho que Nando sabe disso, por isso a
proposta. Mas só de pensar em ter um cantinho só nosso, nossa
casa, sinto meu peito se enche de felicidade.
— Você quer mesmo que eu vá morar com você?
Sua mão acaricia meu rosto com carinho.
— Eu quero dormir e acordar ao seu lado o resto da minha
vida. Se você aceitar, serei o homem mais feliz do mundo. Sei que
não poderei te oferecer tudo o que sonhou: um casamento, festa e
tudo mais. Mas te amo tanto, minha Aurora. Se você achar que está
cedo...
O interrompo com um beijo.
— Eu quero morar com você.
Nando sorri largamente. Segurando meu rosto, ele dá vários
beijos.
— Eu juro que tentarei ser o melhor companheiro pra você.

— Você já é, meu amor.

Já é fim de tarde. Íris, minha funcionária, que já é minha


amiga de anos, está finalizando uma venda. Eu estou mostrando
alguns modelos dos vestidos de festa para uma linda moça morena
que parece ser um pouco mais velha que eu. Sinto que já a havia
visto em algum lugar.
— Esse será o vestido do meu jantar de noivado. Estou tão
animada! — Ela realmente parece eufórica.

Sinto uma pontinha de inveja, pois sei que não poderei


passar por essa etapa na minha vida. Meu relacionamento com
Nando está bem fora do comum.
— Qual o seu favorito? Se quiser experimentar, posso ver se
precisa de algum reparo.
A bela morena sorri largamente.
— Eu amei esse azul. Esse decote coração e essa fenda
lateral... — Ela passa a mão pelo tecido. — Ele é perfeito!
— Então vamos até o provador no fundo da loja. — Pego o
vestido com cuidado e vamos até o provador juntas. — Você poderia
me falar seu nome? Seria mais fácil para nos comunicarmos.

— Claro. Meu nome é Luana. — Ela estende a mão e eu a


cumprimento.
— Muito prazer, Luana, eu sou Aurora.
Sorrimos uma para a outra.
— Quem desenha esses vestidos? Queria muito conhecer a
designer. Eu não sou daqui da cidade, só estou aqui devido a esse
jantar na casa dos meus pais.

— Fico feliz que gostou dos meus vestidos. Todos os


modelos são meus — falo orgulhosa de mim mesma.
— Assim que olhei aqueles modelos na vitrine, me apaixonei.
Você tem muito talento! — Não consigo conter o sorriso. Ter nosso
trabalho reconhecido é tão bom. — Agora vou vesti-lo pra você dar
uma olhada.

Lhe entrego o vestido e ela entra no provador.


Estou tão orgulhosa. Meu primeiro dia e já recebi um elogio
desse. Ela realmente ficou encantada pelo vestido. Estou doida para
contar para minha família. Principalmente para Nando.
— Aurora, que perfeição! — Luana abre a cortina do provador
com um grande sorriso.
Ela ficou muito linda. O vestido ficou perfeito em seu corpo.
— Querida, eu sou modelo e posso dizer com toda a certeza
que você fará muito sucesso. Nunca imaginei encontrar um vestido
assim nessa cidade. — Luana faz várias poses em frente ao
espelho.
— É muito importante pra mim ouvir isso de uma cliente.
Esse é o primeiro vestido de festa que estou vendendo. Abri minha
loja hoje.
— Aurora, eu vou te dar uma ajuda. — Olho para ela confusa
e a vejo pegar o celular e fazer uma pose em frente ao espelho, e
depois começar a digitar no celular. — Estou postando nas minhas
redes sociais e marcando a loja. Não é possível que entre vinte
milhões de seguidores não tenha ninguém que seja dessa cidade ou
das proximidades.
Fico em choque! Luana é uma modelo famosa e eu nem
reparei nisso. Eu sigo várias modelos, como pude não perceber?!
— Nem tenho como te agradecer! — Seguro a sua mão.

— Para, sua boba! Quando estiver bem famosa, não se


esqueça de mim. Quero desfilar seus modelos um dia.
Nos abraçamos.
— Nunca imaginei uma modelo famosa na minha loja. Isso
parece um sonho! — falo, ainda incrédula.
— Meu amor, eu não sou uma das mais famosas do Brasil,
mas dou pro gasto. Agora me deixe tirar esse vestido maravilhoso.
Tenho que terminar de planejar meu jantar. — Luana dá um tapinha
em meu braço e volta ao provador.
Não sei se é destino, sorte ou até mesmo Deus, mas estou
muito feliz. Modelos assim cobram uma fortuna para fazer
propaganda de uma loja e eu acabei de ganhar isso de graça? Me
sento no banquinho que há aqui e respiro fundo para não surtar.
Após Luana pagar o vestido e me entregar um cartão, faço
questão de levá-la até a porta e aceno para ela quando está
partindo. Nesse momento, eu sei que comecei com o pé direito.

Estou dentro do carro de Nando a caminho de casa. Nem


consigo acreditar que vendi todos os vestidos de festa em um dia. A
foto que Luana compartilhou e marcou a minha loja, “Belo Encanto”,
já está com mais de cinco milhões de curtidas. Minhas bochechas
estão doendo de tanto sorrir.
— Nando, eu preciso juntar todos os modelos de vestido que
já tenho desenhado e começar a tirá-los do papel. Eu não sei se vou
conseguir dar conta.
Nando segura minha mão.
— Você vai dar conta, sim! Eu acredito em você e te ajudo se
precisar. — Ele leva minha mão até a boca e a beija.

— Eu não sei o que faria sem você. — Deito minha cabeça


em seu ombro por um instante. — Nessa correria, não vou ter tempo
pra arrumar nosso apartamento. Você já falou da sua ideia pra Caio
e Manu?
— Ainda não. Estou criando coragem.

— Está com medo deles acharem ruim? Dizer que é cedo? —


Nando balança a cabeça. — Então o que seria?
— Estou com medo de nossa mãe chorar demais e acabar
parando no hospital por desidratação.
Nós rimos.
Assim que entramos em casa, damos de cara com Manu,
Caio e Dirce sentados no sofá conversando. Assim que nos veem,
parecem mudar de assunto. Durante essa semana, Dirce tem nos
visitado bastante e já nos tornamos bem próximas. Gosto do jeito
carinhoso que nos trata.

— Aí está meu casal favorito! — Ela vem até mim, me abraça


e depois faz o mesmo com Nando.
— Como você está? — Entrelaço meu braço no dela e nos
sentamos no sofá.
Nando senta de um lado, Dirce do outro e eu no meio.
— Estou ótima, e muito feliz em saber o sucesso que está
sendo sua loja. Manu já me colocou a par de tudo. Você merece
tudo de melhor que há no mundo.
— Nós estamos muito orgulhosos de vocês. Sempre
soubemos que você nasceu pra brilhar e conquistar o mundo, filha
— Manu diz emocionada, e Caio balança a cabeça concordando.
— Assim vocês me farão chorar.
Os dois abrem espaço entre eles no sofá e eu já sei muito
bem para quê. Me levanto, vou até eles e sento no meio, e sorrio
quando me abraçam. Sinto meu coração tão cheio de amor. Quando
olho para Dirce, vejo uma lágrima cair no canto de seus olhos e ela
rapidamente a enxuga.
— Eu tenho os melhores pais do mundo — falo, ainda envolta
nesse abraço aconchegante.
— Nós temos. Não esqueça de mim — Nando fala,
chamando nossa atenção.
— Como poderia esquecer do amor da minha vida!?

Ele abre um sorriso tão lindo, o sorriso pelo qual sou tão
apaixonada.
— O que acha de irmos ajudar Celina na cozinha, Dirce? —
Manu pergunta, as duas se levantam e vão de braços dados até lá.

— Eu vou tomar um banho. — Nando se levanta do sofá.


— Eu também vou! — digo no automático e Caio nos olha
com as sobrancelhas arqueadas. — Não quis dizer que íamos tomar
banho juntos ou algo do tipo — tento me corrigir, mas as palavras
saem tão emboladas que ele ri.
— Só não façam muito barulho. — Caio dá uma piscadela e
sinto minhas bochechas queimarem.

Nando segura a minha mão e pisca de volta para Caio. Deus,


esses dois são terríveis, Nando teve mesmo de quem puxar!
Após dias bem corridos, as coisas se acalmaram na loja. No
começo foi difícil dar conta de tudo mas, com muito trabalho e
dedicação, deu tudo certo.
Estamos a caminho de nossa casa. Não dá nem para
acreditar! Quando Nando contou a Manu e a Caio que estava
querendo comprar um apartamento para morarmos juntos foi um
alvoroço. Tentaram nos convencer que a casa era grande o
suficiente para nós quatro, que não precisava disso. Mas, após uma
longa conversa, enfim eles entenderam que queríamos um cantinho
só nosso. Eles só aceitaram com uma condição: que a casa fosse
um presente dado por eles. Falaram que casa térrea tem bem mais
privacidade que apartamento. Nós aceitamos, desde que não fosse
nenhum exagero. Queremos uma casa não muito grande, já que
somos só nós dois.

A casa não fica muito distante do conjunto residencial em que


eles moram. Isso já era de se esperar. Nunca que iriam nos colocar
em um lugar longe deles. E eu gosto disso.
Assim que chegamos em frente ao endereço, fico encantada
com a fachada. Ela é bem moderna, com uma grande porta branca
que combina com a pintura. Acredito que não faz muito tempo que
foi construída. Nando estaciona o carro na garagem e Caio para o
dele em frente ao nosso novo lar.
— Prontos para conhecerem a casa de vocês? — Manu
pergunta, toda empolgada, e balança a chave que está em sua mão.
— Sim, estou muito animada — respondo. Nando segura a
minha mão e sorri.
Manu abre a porta e gesticula para que nós dois entremos
primeiro. A sala já é linda! É toda em tons claros. Tem um grande
sofá está encostado na parede e há uma mesinha de centro com
alguns itens de decoração. No lindo rack branco há o videogame de
Nando, mas o que mais chama a atenção é a grande televisão.
— Eu vou jogar muito nessa TV! — Nando avisa, animado.
— Agora vamos ver a cozinha. — Manu nos conduz até lá.
Um lindo armário planejado na cor branca e bege toma toda
uma parede. Os eletrodomésticos são em inox, e há uma grande pia
em granito no mesmo tom dos armários e, no centro, uma mesa
branca de vidro de quatro lugares. Já me vejo aqui, fazendo minhas
refeições com Nando.
— Você gostou? — Manu pergunta, parecendo ansiosa.
— É perfeita!
— Será que essa mesa é resistente? — Caio indaga e nós
três nos viramos para ele, confusos. — Desculpa, eu pensei alto. É
que ela parece tão frágil. Será que aguenta vocês dois em cima
dela? — Ele leva a mão ao queixo.
— Caio!? — Manu bate a mão no rosto e Caio cai na
gargalhada.
— Coisas acontecem em todo lugar da casa, temos que estar
prevenidos. — Ele dá de ombros ainda rindo.
Nesse momento não sei se rio ou se enfio minha cabeça
embaixo da terra. Só sei de uma coisa: vou sentir muito a falta
desses dois.
— Ignorem ele. Vamos até o quarto. — Manu começa a
andar e nós a seguimos.

— Vamos até o melhor cômodo da casa, o que mais será


usado. Se bem que também tem o banheiro!
— Caio, você está impossível hoje — Manu resmunga, mas
dá um sorriso. — Aqui está o ninho de amor de vocês!

Que quarto maravilhoso! Diferente dos outros cômodos, ele


tem tons mais escuros: uma cama tão grande que caberia três
pessoas e um guarda-roupa todo espelhado o compõem.
— Vai dar pra ver todo o movimento pelo espelho. — Caio
balança a sobrancelha.

— Eu desisto! — Manu levanta as mãos em sinal de rendição


e Caio vai até ela e a abraça.
— Só estou implicando com você. — Ele beija seu pescoço.
— Você sabe que gosto de te ver assim nervosinha.

— Lembre que estamos aqui — eu digo.


Vejo muito bem que Nando puxou todo o fogo dos pais. E,
para dizer a verdade, eu amo.
Manu nos mostra o banheiro e o quarto de hóspedes, que
também pode ser transformado em quarto de bebê. Agora que ela
levantou essa questão de bebê fico me perguntando como seria.
Diante a lei, Nando e eu ainda somos irmãos. Como iríamos
registrar um filho nosso? Nem sei se isso é legal. Mas não vou ficar
pensando nisso agora. Temos alguns anos pela frente.
Voltamos à sala e nos sentamos no sofá.
— Então é isso. Essa é a nova casa de vocês. — Seu sorriso
aos poucos vai se desfazendo. — Meus filhos estão me
abandonando. — Ela faz bico.
— Nunca vamos te abandonar. Estamos a poucos minutos de
distância, mãe — Nando fala, tentando confortá-la.

— Vai ser muito estranho não ter vocês lá. A casa vai ficar
tão vazia. — Caio segura a mão de Manu. — Se bem que tem um
lado bom.
— Então me diga, que não vejo nenhum! — Manu cruza os
braços.

— A gente pode correr pelado pela casa. — Caio rouba um


selinho dela.
— O pai de vocês não tem jeito. Meu Deus!

Nós rimos.
Tive tanto medo de decepcionar quando soubessem do
nosso relacionamento, mas no fim fui surpreendida positivamente.
Eles nos mostraram mais uma vez o quanto nos amam.
— Vamos começar a carregar as caixas que estão no carro e
colocar as roupas no lugar antes que seu pai solte mais alguma
piadinha. — Manu se levanta e nós fazemos o mesmo.

Nossa casa já está totalmente arrumada e as roupas e


objetos pessoais já estão em seus devidos lugares. Como já está
próximo ao horário de jantar, vamos até a cozinha, que já está
abastecida, e começamos a preparar algo para comermos. Saber
que a primeira refeição servida em nossa casa é para a família
completa enche meu peito de alegria.
Após nosso jantar em família, acompanhamos os dois até a
porta.
— Obrigada por tudo que fizeram por nós. — Abraço Manu.
— Vocês são incríveis.
— Eu te amo tanto, filha. Você e Nando são meus tesouros.
Se precisarem de qualquer coisa, é só me chamar que venho
correndo. — Manu dá um beijo na minha cabeça e em seguida vai
até Nando e o abraça.
— Minha pequena, espero do fundo do meu coração que
vocês sejam muito felizes nessa nova etapa da vida. — Caio me
abraça forte. — Nós sempre estaremos aqui pra ajudar vocês em
tudo que precisarem. Apesar de ser assim brincalhão e às vezes
inconveniente, quero que saiba que um dos dias mais felizes da
minha vida foi quando você me chamou de pai pela primeira vez.
Sinto meus olhos encherem d’água.
— Eu estava tentando não chorar — digo baixinho,
pressionando meu rosto contra seu peito. Caio acaricia meu cabelo
e beija minha cabeça.

— Assim meu coração não aguenta. — Manu se junta a nós


no abraço e logo Nando faz o mesmo.
Ficamos um tempo ali juntos e quando nos afastamos, todos
estão com os olhos marejados.
— Cuide bem dela, filho. — Caio coloca a mão no ombro de
Nando. — Vocês são meu orgulho.
— Pode deixar, pai, eu tive o melhor exemplo de como um
marido deve ser. — Caio sorri largamente.
Eles vão em direção ao carro, acenam em despedida e dão
partida.
Nando fecha a porta e se vira para mim.
— Pronta pra viver o resto da sua vida ao meu lado?
Envolvo meus braços em sua cintura.
— Mais pronta que isso, impossível!

Voltar para casa e saber que meus filhos não estarão mais lá
é tão estranho. Meu coração de mãe se aperta em pensar o que irão
enfrentar daqui pra frente. O preconceito já era grande quando
estavam namorando, agora com eles morando juntos será ainda
pior. Já briguei com tantas "amigas" que tentaram me convencer a
não apoiar esse relacionamento. Até me aconselharam a me afastar
dos dois até que parem com essa "monstruosidade". Elas não
conseguem ver o que eu vejo. Não enxergo mais Aurora e Nando
como irmão. Agora só consigo vê-los como um casal que se amam
e se respeitam.
Meus pais e minha irmã também ficaram surpresos com a
novidade. Meu pai foi quem mais se chocou, mas após uma longa
conversa por telefone, ele entendeu melhor. Meu filho encontrou o
amor de sua vida. Isso não acontece com todos. Muitos passam
pelo mundo sem saber o que é um amor verdadeiro, ainda mais um
amor correspondido na mesma proporção. Sei que criamos os filhos
para o mundo, mas é tão difícil essa separação.

Aurora e Nando estão começando a trilhar um caminho que


pode parecer difícil às vezes, mas com amor, sinceridade e
companheirismo conseguirão enfrentar tudo. Eles só precisam estar
juntos. Um encontrará no outro a força necessária para ultrapassar
cada obstáculo que será colocado em seu caminho. A vida a dois é
cheia de altos e baixos, uma verdadeira montanha-russa, mas tudo
vale a pena no final.
— Acho que fizemos um bom trabalho — Caio fala, com um
sorriso no rosto.
— Fizemos, meu amor. Nós fizemos.

Ele segura minha mão e a beija.


Estou terminando meu banho e me sinto nervosa mesmo
sem motivo. Nando e eu já dormimos juntos, mas dessa vez é
diferente. Não precisarei me conter e ele também não. A partir de
hoje estamos completamente livres. Após me enxugar, passo um
hidratante no corpo todo e visto uma camisola de seda vermelha.
Não coloquei calcinha, pois sei que isso o excita e gosto de vê-lo
perdendo o controle. Dou uma penteada no cabelo e abro a porta do
banheiro. Vejo Nando na cama, me esperando.
Ele me olha dos pés à cabeça e já me sinto ferver só com a
intensidade desse olhar. Vou até a cama e me deito ao seu lado.
Nando se vira para mim.

— Você é tão linda. Por dentro e por fora. — Sua mão


acaricia meu rosto e vai descendo até meu seio. Nando o aperta
levemente. — Eu quero fazer tantas coisas com você, baby. Agora
não precisamos nos preocupar com o barulho. — Ele se aproxima
do meu ouvido. — Eu adoro te ouvir gemer, principalmente quando
meu nome sai em meio aos seus gemidos. — Meu corpo todo se
arrepia no mesmo instante.
— Será que poderíamos considerar essas primeiras noites
como uma lua de mel? — Nando sorri com malícia enquanto
assente. — É bom saber.
Tanta coisa mudou desde que começamos a namorar. Já não
me sinto tão tímida como antes. E gosto muito disso.
— Você me deixa doido, Aurora. Eu quero você sem nada,
toda nua na nossa cama.
Me ajoelho na cama e tiro a camisola lentamente, com Nando
observando cada movimento meu. Mesmo estando coberto com o
lençol de seda, consigo ver seu volume e isso me deixa ainda mais
ansiosa.

— Sem calcinha... — diz baixinho, enquanto me devora com


o olhar. — Eu poderia passar o resto de minha vida aqui te
admirando.
Nando se ajoelha na cama e vejo que também está sem
nada. Ele fala de mim, mas vê-lo assim com esse corpo maravilhoso
e duro é muita tentação.

— Quer fazer algo novo na nossa primeira noite sozinhos? —


Mesmo sentindo o nervosismo revirar meu estômago, eu assinto. —
Sente-se na cama e abra bem as pernas pra mim. Pode encostar as
costas na cabeceira se quiser. — Assim eu faço.
Meu corpo todo anseia por seu toque. Nando fica de joelhos
na minha frente e me forço a não toca-lo. Não vou interromper.
Quero que ele diga qual será o próximo passo.
— Quero que se toque. — Olho para ele sem jeito. O pedido
me instiga, mas também me deixa nervosa. — Vamos, baby, eu
quero ver isso. Você é minha mulher, não precisa ficar com
vergonha. Eu quero ter essa visão. Se ficar melhor pra você, eu te
dou os comandos e você vai fazendo.
— Ok, pode ser assim. — Eu nem reconheço minha própria
voz.
— Segure seus seios e os massageie devagar. — Mesmo
com um pouco de vergonha eu faço, e a sensação é boa. — Isso,
baby, agora uma mão você vai descer devagar do seio até o meio
das pernas.
Faço o que Nando manda e quando minha mão chega à
minha intimidade, posso sentir o quanto estou molhada. Nando me
olha fascinado. Ele leva a mão até sua ereção e começa a subir e
descer. Essa visão com certeza se tornou uma das minhas favoritas.

— Agora você vai deslizar o dedo levemente no clitóris. Bem


devagar, fazendo círculos. — Essa voz rouca me dando ordens está
me deixando louca.
Começo a fazer o que Nando disse e gemidos me escapam.
Fecho meus olhos, perdida no prazer.

— Que visão... Ah, baby, você não sabe o quão gostosa você
é. — Olho para Nando e vejo ele acelerar o ritmo. — Deslize um
dedo pra dentro e faça um vai e vem. Comece devagar e vá
acelerando — pede e eu o obedeço. Meu dedo entra e sai cada vez
mais rápido, sentindo a umidade e a quentura. O curvo, atingindo o
ponto exato que me faz ver estrelas.
— Estou perto, Nando... — sussurro.

— Você só vai gozar quando eu deixar.


Olho para ele e mordo o lábio. Esse homem está querendo
acabar comigo. Estou literalmente vivendo uma cena hot de um dos
livros que li.

— Não sei se consigo me segurar — digo, manhosa.


Nando e eu soltamos gemidos baixos e meu olhar se fixa em
sua mão, que sobe e desce em um ritmo frenético. Tão maravilhoso
o meu homem.
— Goza agora comigo, Aurora!
Vejo esse homem maravilhoso entregue à luxúria do
momento e seu pau pulsar, liberando todo seu prazer.
Acelero o ritmo e sinto meu corpo todo tremer.

— Nando... — Fecho meus olhos.


Ainda sentindo meu corpo todo tremer de prazer, abro os
olhos e Nando me olha atentamente.
— Perfeita! — ele murmura.
Estico minhas pernas, me permitindo relaxar. Me surpreendo
quando Nando segura minha mão e leva meu dedo melado até a
boca. Ele o chupa enquanto me olha nos olhos.

— Nós ainda não terminamos, baby! — Nando me dá um


beijo ardente e ao se afastar sussurra em meu ouvido: — Agora vou
te chupar até gozar pela segunda vez, mas agora na minha boca.

Estou na cozinha preparando nosso café da manhã. Nando


ainda está dormindo. Ontem à noite foi tudo tão intenso! Só de me
lembrar do que aconteceu, meu corpo todo esquenta. Nando me faz
sentir coisas, fazer coisas que nunca imaginei. Depois de todas as
loucuras que fizemos na cama, tivemos que trocar os lençóis e
tomar um bom banho para podermos dormir. Agora eu entendo
Mari. Sexo assim é muito mais gostoso. Lembro então que preciso
convidar minha amiga pra vir conhecer nossa casa. Também tenho
que convidar Dirce. Ela vai amar conhecer nosso cantinho.
— Que cheiro delicioso!
Me viro e vejo Nando entrando na cozinha, só de bermuda de
malha.
— Bom dia, meu amor! — Vou até ele e beijo seus lábios. —
Tem de tudo um pouco. Café, suco, bolo, pão, frutas... — Aponto pra
cada item. — Nosso primeiro café da manhã juntos tem que ser
perfeito.
Nando se senta na cadeira e me puxa, me fazendo sentar em
seu colo, e solto um gritinho, pois me pega desprevenida.
— Vou te dar café da manhã na boca — fala, com um sorriso
de lado.
— Vou ficar mal-acostumada. — Passo minha mão em seus
cabelos.

— Ah, baby, eu faço qualquer coisa por você. É só me pedir.


O que você quer comer primeiro?
— Pode ser um pedaço de bolo.
Nando sorri.
Ele corta dois pedaços, coloca em seu prato e começa a
cortar em pedaços pequenos com o garfo.
— Abra a boquinha pra que eu possa te alimentar. — Nando
coloca o pedaço de bolo com cuidado na minha boca.
Pego todo o bolo devagar olhando em seus olhos, enquanto
Nando olha fixamente para os meus lábios. Ele come um pedaço e
me dá outro na boca.
Nunca imaginei na vida ser tratada assim. Quando
terminamos, ele pega um morango e leva até a minha boca. Mordo
ele lentamente e passo minha língua em volta dos meus lábios.
Posso sentir Nando ficando duro embaixo de mim e dou uma
rebolada leve em seu colo.

— Você está querendo me provocar?


— Talvez. — Dou uma piscadela.

Nando passa o nariz em meu pescoço, me fazendo arrepiar.


— Eu posso jogar esse jogo também — sussurra em meu
ouvido.
— E como você vai fazer isso? — sussurro de volta e mordo
sua orelha.
— Aurora, você está brincando com fogo.
— Talvez esteja querendo me queimar — retruco.
Já estou fora de mim. Ele afasta algumas coisas da mesa,
segura minha cintura, me coloca sentada sobre ela e abre minhas
pernas.
— Vamos ver quanto fogo você aguenta. — Com um sorriso
safado, ele coloca minha calcinha de lado, mela o dedo indicador na
cobertura do bolo e esfregar em meu clitóris. — Eu amo cobertura
de brigadeiro. — Nando se abaixa e começa a chupar meu clitóris
com vontade.
— Que gostoso — as palavras saem sem que eu perceba.
Seguro seu cabelo, o incentivando a continuar, e Nando leva
um dedo para dentro e começa um vai e vem enquanto me chupa,
como se não houvesse nada melhor no mundo. Minha mão livre
aperta a borda da mesa enquanto meu corpo estremece. Fernando
se afasta com um sorriso de satisfação estampado no rosto.
— Agora a segunda parte. — Suas mãos abaixam as alças
da minha camisola. — Eu também amo Nutella. — Ele pega o pote
e com uma colherzinha passa uma boa quantidade em meus
mamilos. Nando segura meus seios e começa a chupar um por vez.
Faz isso com tanta vontade que sinto uma mistura de dor e prazer.
Gemo sem pudor. Nando leva uma mão até sua bermuda e libera
sua ereção. Segurando em minha cintura, me tira de cima da mesa
e me coloca em seu colo de pernas abertas. Vou me encaixando
nele devagar. — Se continuasse iria gozar sem nem ao menos estar
dentro de você. — Morde meu lábio. — Rebola gostoso pra mim.
Começo a mover minha cintura em movimento circulares.
Com uma mão de cada lado da minha bunda, ele me ajuda a manter
o ritmo.
— Baby... Você é o meu maior sonho que se tornou
realidade. — Nando joga a cabeça para trás.

Colo minha testa na dele e olhamos nos olhos um do outro.


— Nando — chamo seu nome quando suas mãos apertam
meus seios. — Eu vou... — Não consigo terminar a frase e explodo
em um orgasmo intenso. Deito minha cabeça em seu ombro e fico
ali até meu corpo se acalmar.
— Vou amar se todos os cafés da manhã forem assim. —
Nando beija meu ombro.
— Agora estou com mais fome. — Saio de cima dele, arrumo
minhas roupas e me sento na cadeira ao seu lado. — O que vamos
fazer hoje? É nosso primeiro dia em casa e temos o domingo todo
pra aproveitar.

— Tenho várias ideias. — Ele me olha maliciosamente e sei


muito bem o que está pensando.
Desse jeito vou ter que pedir a pomada de Mari emprestada.
E a ideia nunca me pareceu tão boa.
Nando me deixa na loja e depois segue para o seu trabalho.
Cumprimento Íris e abro a loja e não demora para o primeiro cliente
chegar. Só tenho a agradecer a Luana pela propaganda que fez.
Nós ainda mantemos contato e estou terminando de desenhar um
modelo exclusivo para ela usar na inauguração de um museu fora
do país. Essa será uma grande oportunidade, pois meus vestidos
ficarão conhecidos internacionalmente.
— Aurora, seu cliente fiel acabou de chegar. — Íris aponta
discretamente para a porta.

Lá vejo o senhor Lopes, um cliente muito especial para mim;


ele vem direto na loja comprar roupa para sua filha. Ele tem um
pouco de sotaque, pois faz pouco tempo que veio do México para
cá. É um senhor muito simpático, sempre muito educado e aparenta
ter muito dinheiro, pois está sempre vestido com roupas de marca e
joias caras.
— Bom dia, senhor Lopes.

Ele abre um sorriso assim que me vê.


— Querida Aurora, me chame de Alonzo. Não precisa dessa
formalidade toda. — Ele beija minha mão e sorrimos um para o
outro.
— O que procura hoje? Alguma festa, jantar importante?

— Sim, minha esposa e eu vamos comemorar nosso


aniversário de casamento — diz animado. — Estamos completando
dois anos de casados. Apesar de termos uma grande diferença de
idade, somos muito felizes.
— Diferença de idade? — Penso em voz alta.

— Sim, querida, eu tenho sessenta e dois anos e ela tem


trinta.
Juro que imaginei que a esposa dele fosse uma senhorinha
bem simpática, mas estava enganada. Mas quem sou eu para
julgar?
— Então todos os vestidos e roupas que o senhor compra na
loja também são pra ela? — acabo perguntando sem pensar.
— Sim, eu gosto de vê-la muito bem vestida. E suas roupas
são estupendas. Ela e minha filha Victoria ficam lindas.

— Fico muito feliz em saber. Vamos que vou mostrar ao


senhor os modelos que tenho disponíveis. — O levo até os vestidos
e começo a mostrar um por um. — A filha do senhor tem quantos
anos?
— Ela tem trinta anos. — Acabo me engasgando com minha
própria saliva. Ele ri. — Pois é. Minha filha e minha esposa têm a
mesma idade. Já estou acostumado com esse tipo de reação.
Apesar de tudo, elas se dão muito bem.
— Qual o senhor mais gostou? — Tento mudar de assunto.
— Ah, sim. Vou levar esse vermelho que tem um lindo decote
pra minha esposa e esse preto de alcinhas pra minha filha, pois hoje
iremos jantar em família. — Separo os dois vestidos e os levo até o
balcão para embalar. Alonzo me acompanha. — E como anda a
vida, querida?
Perfeita.

Eu sorrio para ele.


— Melhor do que está, impossível. Agora estou morando
junto com meu namorado. Estamos muito felizes.

Ele sorri.
— Fico muito contente em saber que sua vida está tão boa
assim. — Alonzo vai até Íris e paga a compra enquanto termino de
embalar.

— Aqui está. — Entrego a sacola.


— Muito obrigado, querida, até mais. — Ele beija minha mão,
se despede de Íris e sai.

— Ele é tão simpático, né?!


Balanço a cabeça, concordando com Íris.
O restante da nossa tarde se passa assim, atendendo
clientes e finalizando meu desenho quando a loja está vazia.
Perto da hora de ir embora, recebo uma ligação de Nando
informando que terá que ficar até mais tarde no trabalho devido a
alguns problemas que terá que resolver, e que em casa me
explicará direitinho. Me despeço de Íris e quando já estou para
chamar um táxi para casa, vejo Adam do outro lado da rua. Ele está
junto com Mari. Assim que me veem, acenam. Atravesso a rua e
vou até eles.
— O que fazem por aqui? — Abraço Mari e depois Adam.

— Sabíamos o horário que a loja fecha, então decidimos vir


chamar você e Nando pra tomar um café e comer um bolo na
lanchonete aqui perto. O que acha? — Adam questiona.
— Nando vai ficar até mais tarde na loja. Estava a ponto de
chamar um táxi.

— Então vamos nos três. Nando não ficará com ciúmes, eu


vou estar junto.
Concordo com Mari.
— Então vamos. — Adam oferece o braço e cada uma
segura de um lado.
Começamos a caminhar e vamos até uma pequena
lanchonete que há ali na esquina. O lugar tem uma pegada mais
vintage. É muito bonito. Vamos até o balcão e fazemos nossos
pedidos. Quando estão prontos, procuramos uma mesa próxima a
janela e nos sentamos.

— Temos que marcar uma festinha na sua casa nova — Mari


sugere.
— Sim, é que esse fim de semana foi corrido.
Lembranças de tudo o que Nando e eu já fizemos passam
como um filme na minha cabeça. Dou um gole no café, tentando
disfarçar meu sorriso.
— Eu entendo, amiga. Vocês estão praticamente de lua de
mel. Imagino as barbaridades que já fizeram dentro daquela casa, e
olha que só estão morando juntos há pouco tempo. — Mari ri.
Essa menina deve estar lendo minha mente, não é possível!

— Eu não quero saber da vida sexual dos dois. — Adam


revira os olhos.
— Para de ser chato! — Mari dá um tapa em seu braço e ele
resmunga. — Você tem que superar isso. Os dois se amam e
ninguém tem porra nenhuma a ver com isso.
— Tá, não precisa ficar nervosa. — Adam levanta as mãos
em sinal de rendição.
— Obrigada, amiga. — Mari dá uma piscadela. — E o senhor
— aponto para Adam —, se ainda quiser manter essa amizade de
anos, sugiro que aceite de vez minha relação com Nando. Ele é o
amor da minha vida e vamos ficar juntos pra sempre — digo com
firmeza.
— Desculpa, é que ainda estou me acostumando. Mas a
amizade de vocês é muito importante pra mim. — Vejo ele ficar sem
jeito.
— Bem melhor assim! Agora vamos tirar uma foto. — Mari
pega o celular. Eu fico no meio e ela e Adam nos lados.
— O ruim de ter uma amiga fotógrafa é isso. Toda
oportunidade que tem é uma foto diferente — falo só pra implicar,
pois amo esse jeito de Mari.
— Vocês reclamam de barriga cheia — fala e depois leva um
pedaço de bolo até a boca.
Ficamos conversando por mais ou menos uma hora. Depois,
cada um segue seu caminho. Como ninguém está de carro, eu e
Adam chamamos um táxi e Mari manda mensagem para Rafael ir
buscá-la. Penso em mandar uma mensagem para Nando, mas fico
com receio de atrapalhar. Vai que está resolvendo algo muito
importante.
Chegando em frente a nossa casa, vejo que o carro de
Nando já está estacionado ali. Entro em casa, fecho a porta e coloco
minha bolsa no sofá. Começo a procurá-lo e o encontro no quarto,
deitado na cama, mexendo no celular. Dá para ver que tomou banho
há pouco tempo, pois seu cabelo ainda está molhado. Tiro meus
sapatos e subo na cama. Quando vou beijá-lo, ele vira o rosto.
— O que foi? Aconteceu alguma coisa? — Me sento na cama
e o encaro.
— Foi bom o café de vocês dois? — Seu tom é sério.
— Dois? Mari também estava com a gente. Éramos nós três.
— Aqui ele só marcou você. — Nando vira o celular em
minha direção.
Vejo a foto que Mari tirou, mas Adam a cortou e só deixou a
parte de nós dois juntos, e ainda colocou na legenda: companhia
melhor eu desconheço.
— Não pode ser sério isso. Adam está querendo tirar uma
com a minha cara, só pode! — digo irritada. — Se bem que os dois
estão errados.
Nando me olha confuso e se senta na cama.
— Me explica, então.
— Adam errou em cortar a foto e fazer parecer um encontro a
dois, mas você também está errado de ficar com todo esse ciúme.
— Me aperta o peito saber que ele não confia em mim como confio
nele. — Nós estamos juntos agora.

Me levanto e vou até a sala, pego meu celular na bolsa e


volto para o quarto. Procuro na galeria a foto original que estávamos
os três juntos e mostro para Nando. Felizmente, Mari mandou a foto
para os dois.
— Essa foi a foto tirada. — Nando pega o celular da minha
mão. — Depois de um dia cansativo de trabalho, essa era a
recepção que eu menos esperava.
— Aurora... — Levanto minha mão o interrompendo.

— Eu confio plenamente em você, Fernando, e você precisa


confiar em mim ou esse relacionamento não dará certo. Vou tomar
banho.
Nervosa, vou até o banheiro, tiro minha roupa o mais rápido
possível e entro debaixo da água quentinha. Deixo algumas
lágrimas caírem, mas não são de tristeza, e sim de raiva. Fecho os
olhos e respiro fundo, tentando me acalmar.
— Me desculpa? — Escuto a voz de Nando, abro meus olhos
e o vejo ali, do lado de fora do box, com a cabeça baixa.

— Tá — é tudo que respondo.


Pego o xampu e começo a lavar meu cabelo. Em seguida,
passo o condicionador. Nando fica ali acompanhando os
movimentos.
— Você já pediu desculpas e eu aceitei. Pode ir. — Faço sinal
para ele sair.
Vejo Nando começar a tirar a roupa.
Que droga, isso aí já é golpe baixo.
— Eu não quero ficar brigado com você, baby. — Ele entra no
box e vem até mim.

Nando entra debaixo d’água junto comigo.


— Eu não consigo controlar o ciúme que tenho, mas vou
tentar melhorar, eu prometo. Você é tudo pra mim, minha Aurora. —
Sua voz soa baixa no meu ouvido. Ele tenta me beijar, mas viro o
rosto. — Não faz isso. Eu te amo, baby, não sou perfeito, mas juro
que vou melhorar por você. — Sua mão segura meu rosto. — Dou
minha palavra.
Ele aproxima seu rosto lentamente. Quando seus lábios
encontraram os meus, Nando explora cada pedacinho da minha
boca e suas mãos vão até minha bunda. Já nem lembro mais o
motivo pelo qual estava brava minutos atrás e fazemos um uso
muito melhor desse tempo debaixo do chuveiro.
O dia não está muito bom. A chuva cai sem parar. Logo hoje
que tenho que entregar os vestidos que foram encomendados. Eu
nunca gostei de dirigir, mas após tanto Nando insistir, decidi ter meu
próprio carro. Agora que sou oficialmente uma mulher de negócios,
não posso ficar dependendo de táxi.
— Você vai assim nessa chuva?
Me viro para Íris.
— Eu preciso. Senhora Silvana deixou bem claro que a
entrega tem que ser feita hoje. — Íris assente. — Me ajuda a chegar
no carro com o guarda-chuva?

— Claro. Tem um bem grande no fundo da loja. Vou pegar.


Pego os três vestidos que já estão embalados, penduro no
braço e fico na porta da loja. Íris me ajuda a chegar no carro, que
está estacionado ali na frente. Coloco os vestidos no banco de trás
e entro rapidamente. Agradeço a ela pela ajuda e começo a dirigir. A
chuva fica mais forte, o que me deixa preocupada, mas felizmente já
estou chegando no endereço. Me apresento na portaria do
condomínio e logo minha entrada é autorizada.
Estaciono o carro na entrada da casa, que é coberta. Isso
não é uma casa e sim uma mansão. É ainda maior que a casa de
Manu. Saio do carro, dou uma arrumada na roupa, pego os vestidos
e toco a campainha. Logo a porta logo é aberta e uma simpática
senhora me atende.
— Boa tarde, vim trazer os vestidos que foram
encomendados pela senhora Silvana. — Mostro as sacolas que
estão em minha mão.

— Sim, pode entrar. — A senhora abre mais a porta. — Ela


está no andar de cima. Vou te levar até lá.
Eu concordo com um aceno.

Subimos até o andar de cima e noto que a casa é tão linda


por dentro quanto por fora. Dá para ver que tudo aqui é muito caro.
Paramos em frente a uma das várias portas que há aqui. A senhora
dá três batidas suaves e depois a abre, e adentramos um cômodo
que mais parece um enorme closet. Há também um grande espelho
e alguns pufes pelo chão. E sentada em um deles, está uma linda
mulher de longos cabelos pretos. Seu vestido é azul bem curto e
colado ao corpo.
— Você deve ser a Aurora.

Balanço a cabeça, confirmando, e a moça vem em minha


direção. O som do seu salto alto ecoa pelo cômodo. Ela me dá um
breve abraço. A senhora que me recepcionou se retira, deixando
nós duas sozinhas.
— Estou louca pra ver como ficaram os vestidos.

— Eu espero que a senhora goste. — Entrego as sacolas.


— Por favor, não me chame de senhora, pois me sinto uma
idosa. Pode me chamar de Silvana. Nós temos quase a mesma
idade, querida Aurora.
Quando ela me chama assim, me lembro de Alonzo. Ele que
me chama assim todas as vezes. Será que essa é a mulher dele?
Silvana começa a abrir as sacolas e olha os vestidos atentamente,
um por um. O sorriso no seu rosto é tão grande que já percebo que
gostou.
— Eles são perfeitos. — Silvana cola o vestido vermelho bem
decotado ao corpo e se olha no espelho.

— Fico muito feliz que tenha gostado, a senho... Desculpe,


você quer experimentar pra ver se precisa de algum ajuste?
Sem cerimônia, a moça começa a se despir na minha frente.
Me sinto incomodada e me viro para o outro lado.

— Querida, não precisa se envergonhar. Nós somos


mulheres. Fique tranquila!
Mesmo falando isso, ainda me sinto sem jeito. Jamais me
trocaria na frente de uma pessoa que nem conheço, mesmo sendo
outra mulher. Após ela experimentar todos os vestidos, vemos que
ficaram ótimos. Não precisam de alteração alguma.

— Agora já vou indo! Muito obrigada por comprar na minha


loja. Se precisar de algo é só me mandar mensagem. Aqui nesse
cartão tem meu número pessoal. — Pego o cartão na minha bolsa e
a entrego.
— Querida, antes que você vá, posso lhe apresentar meu
marido e minha filha? Eles querem muito te conhecer. Enquanto
isso, podemos tomar um suco e você espera essa chuva passar. É
perigoso ficar dirigindo no meio da tempestade. — Apesar de achar
um tanto estranho, ela tem razão. Ficar dirigindo com essa chuva
toda não é seguro, ainda mais para mim que não tenho tanta
prática.
— Tudo bem. — Ela me oferece o braço.
Descemos juntas as escadas, seguimos por um longo
corredor e paramos em frente a uma grande porta de madeira.
Silvana a abre e adentramos a sala e lá está um homem de costas,
sentado em uma cadeira, e ao seu lado há uma mulher loira muito
bonita.
— Amor, olha quem está aqui! — Silvana fala, animada.

Quando o homem se vira, minha suspeita se confirma. É


Alonzo. Ele abre um grande sorriso e me sinto confusa por eles não
terem me contado logo.
— Querida Aurora, é um prazer vê-la novamente. — Alonzo
se levanta, vem até mim e me abraça.
— Eu suspeitei que seria sua casa e sua esposa, mas por
que não me falaram antes? Não precisava desse suspense.
Alonzo me conduz até a cadeira e eu me sento. Os três me
encaram de um jeito estranho. Algo dentro de mim me diz para sair
daqui o mais rápido possível.
— Aurora, essa é minha filha, Victoria. Sua prima.
Olho para ele confusa.
— Estou muito feliz em finalmente te conhecer. — A loira
tenta segurar minha mão, mas me esquivo.
— Deve estar acontecendo algum engano. — Me levanto
atordoada e vou em direção a porta.
— Aurora, seu pai, Miguel, era meu irmão gêmeo.

Sinto minhas pernas fraquejarem. Me seguro na pequena


mesa de madeira perto da porta e Alonzo se aproxima e me ajuda a
voltar à cadeira.
— Silvana, traga um copo d’água pra ela — Alonzo pede e no
mesmo instante ela sai do escritório.

— Eu vou deixar vocês conversarem à vontade. Foi um


prazer te conhecer, prima. Até depois. — Victoria acena em
despedida e também se retira.
— Então você realmente é irmão do meu pai? Como ele é?
Onde ele está? Por que não quis cuidar de mim quando minha mãe
morreu? — pergunto tudo de uma vez, e lágrimas já brotam em
meus olhos.

Alonzo abaixa a cabeça, puxa uma cadeira e se senta na


minha frente.
— Aurora, muita coisa que lhe contaram não é verdade. Meu
irmão foi assassinado. — As lágrimas que tentava segurar agora se
libertam, molhando minha face. — E querida, sua mãe não morreu
quando você nasceu.
— Como?! Manu e Caio me disseram que ela está morta.
Eles não podem ter mentido pra mim. — Balanço a cabeça,
incrédula.
— Aqui está a água. — Silvana me entrega o copo. — Você
quer a pasta, amor? — Ela indaga a Alonzo, que faz que sim com a
cabeça.
Não demora e ela entrega uma pasta preta a ele.
— Aqui está toda a verdade. — Alonzo abre o documento e
me entrega.
Começo a olhar foto por foto. Há imagens de Manu, Caio e
Dirce; fichas de um hospital em nome de minha mãe, Dulce
Sanchez; e fotos de um homem bonito ao lado de uma ruiva. Olho
bem para a foto e vejo que é Dirce.
— Sim, essa é sua mãe, Dulce, e seu pai, Miguel. Nós somos
sua verdadeira família.
Passo minha mão sobre a foto que agora está molhada com
todas as minhas lágrimas.
— Eles mentiram pra mim. Toda minha vida foi uma mentira.
Como meu pai foi assassinado? — Minha voz sai baixa.
— Dulce o matou. — Levo minha mão à boca, totalmente em
choque. — Ela estava na cadeia. Soube da sua existência faz pouco
tempo. A informação que chegou aos meus ouvidos foi que você
havia morrido ainda na barriga dela, mas quando ela saiu da cadeia,
decidi investigar a fundo e enfim soube de toda a verdade. Meu
irmão tinha seus problemas, era um bandido, mas era meu irmão. —
E enquanto ele fala, eu continuo a chorar. — Você é tudo o que
sobrou dele. Demorei pra tomar coragem pra vir te ver e contar tudo,
mas agora estou aqui.

— Deus! Essa história fica cada vez pior. — Começo a sentir


falta de ar.
— Aurora, você está bem? Querida, você está ficando
vermelha. — Alonzo tira o copo da minha mão e entrega a Silvana.
— Eu não estou conseguindo respirar — falo com dificuldade.
Tento algumas vezes puxar o ar, mas está tão difícil. Me
levanto e corro para o lado de fora da casa. Ali inspiro e expiro.
Tudo está parecendo uma grande loucura! Vejo Alonzo vindo atrás
de mim e corro para o meu carro. Entro nele e saio em disparada,
sem lhe dar chance de me seguir.

A chuva ainda cai forte, no mesmo ritmo que as minhas


lágrimas.
Meu pai era um bandido, minha mãe uma assassina e meus
pais adotivos dois mentirosos.
Aperto o volante com força e solto o grito mais forte que
meus pulmões conseguem. Fecho os olhos por um breve momento.
Escuto uma buzina, e quando os abro, vejo um caminhão vindo em
minha direção. Para desviar dele, jogo o carro para o lado, que cai
na ribanceira. Nesse momento sinto todo o meu corpo doer e minha
visão escurecer.
— Nando… — é tudo o que consigo dizer antes de me perder
no vazio.
De uma hora para outra, sinto uma dor no peito, uma aflição.
Vou até o banheiro da loja, lavo meu rosto e respiro fundo, tentando
afastar essa sensação, mas ela não passa. Mando uma mensagem
para minha mãe e para Aurora, para saber se está tudo bem com
elas e logo minha mãe responde, mas Aurora não.
Já aflito, ligo na loja e Íris atende. Ela me informa que faz um
tempo que Aurora saiu para fazer a entrega dos vestidos, que ela
falou durante toda a semana muito feliz e animada. Caminho até a
entrada da loja e vejo que a chuva está forte. Na hora me preocupo
mais ainda. Aurora não tem muita experiência dirigindo.

— Oi, filho, está tudo bem? — Ouço a voz do meu pai. Me


viro e o vejo vindo em minha direção.
— O pior é que não sei. — Seu olhar deixa evidente que ele
não está entendendo nada. — Estou com uma sensação ruim.
Enviei mensagem pra Aurora, mas ela não responde.

— Você já ligou na loja?


Balanço a cabeça, confirmando.
— Íris disse que ela foi entregar os vestidos de uma cliente,
aquela que queria um atendimento diferenciado.
Meu pai balança a cabeça como se recordasse das várias
vezes que Aurora comentou sobre esse pedido.

— Você sabe onde seria a entrega? — Assinto. — Você pode


ir até lá e eu cuido de tudo por aqui.
— Eu vou, então, só pra tirar essa sensação ruim. Não
demoro. Só preciso saber que ela está bem.

— Tome cuidado, a chuva parece que não vai passar tão


cedo. Assim que conseguir falar com ela, me manda mensagem ou
me liga. Agora fiquei preocupado.
— Pode deixar! — respondo já saindo da loja e indo até o
estacionamento.

Nem me importo com a chuva. O carro não está muito longe,


então corro até ele, ligo o GPS, seguindo o endereço anotado no
bilhete que Aurora havia deixado no porta-luvas. Ela já havia
decorado e colocou ali por acaso, e eu sou grato por isso.
A sensação ruim não passa. Parece que meu coração está
sendo esmagado. Nunca senti nada desse jeito. No meio do
caminho, mesmo com a chuva forte, consigo ver vários carros e os
bombeiros. Por um instante, meu coração para de bater e eu sei que
ali está o amor da minha vida.

Estaciono o carro próximo a eles, saio andando o mais rápido


possível em meio à chuva, olho a ribanceira e lá embaixo está seu
carro. É uma das piores visões da minha vida. Meu mundo desaba
ali. Já não controlo minha respiração, mas tudo piora quando vejo
os bombeiros retirarem dos escombros uma Aurora desacordada,
com a roupa vermelha com todo o seu sangue.
Começo a descer desesperado. Não sei como não caio com
aquela terra molhada, acho que é a adrenalina. Um policial tenta me
segurar e fala algo que não entendo. Minha mente está a mil.
— Ela é minha mulher! É minha Aurora!
O policial vê meu desespero e me deixa passar.

Me ajoelho ali ao lado da maca. Ela está tão machucada,


parece ainda mais frágil. Queria tanto abraçar meu amor, ouvi-la
falando que me ama. As lágrimas são tantas que não consigo
enxergar direito. Minha respiração está irregular, como se alguém
estivesse me sufocando. Olho para o bombeiro que está prendendo
Aurora na maca.
— Pelo amor de Deus, salva ela. Não deixa ela morrer, por
favor. Eu não aguentaria perdê-la. — Tamanho é meu desespero
nesse momento.

Eu não me vejo sem Aurora. Não existe Nando sem Aurora,


isso é um fato.
— O senhor tem que tentar se acalmar, vamos levá-la para o
hospital agora mesmo. — O bombeiro leva a mão até meu ombro e
dá uma leve pressão tentando me acalmar. — Podem levar! — ele
diz para os outros bombeiros.

Essa cena horrível nunca vai sair da minha cabeça: Aurora


desacordada toda machucada sendo levada para dentro de uma
ambulância. Acompanho tudo de perto. Quando já está acomodada
dentro, corro até meu carro para poder acompanhá-los. Se eu não
tivesse insistido que ela comprasse um carro, se ela estivesse em
um táxi, isso não teria acontecido.
— É tudo culpa minha! — Bato com força a mão no volante.

Os minutos parecem horas. Quando enfim chegamos ao


hospital, estaciono e vou correndo até onde a ambulância parou,
mas quando estou no meio do caminho, um guarda me impede de
entrar.
— Sinto muito, nessa área não se pode entrar
acompanhante. O senhor terá que ir até a recepção fazer a ficha e
aguardar notícias.
— Moço, por favor, eu quero ficar ao lado dela — imploro.
— Sinto muito, são regras do hospital. Quanto antes for à
recepção, mais rápido terá notícias.

— O senhor tem razão.


Vou o mais rápido possível até a recepção, mostro meu
documento e explico o ocorrido. A atendente me entrega um crachá.
Agradeço e vou até a área de espera. Tento ficar sentado, mas a
ansiedade não me deixa ficar parado.

— Tenho que ligar pro meu pai — falo comigo mesmo,


baixinho.
Explico o ocorrido por cima. Não quero e não tenho
condições nesse momento de ficar conversando por telefone. Meu
pai já entra em desespero, mas não tem ninguém melhor que ele
para dar a notícia a minha mãe.
Já estou há um tempo andando de um lado para o outro
nessa sala de espera. Minha roupa já secou, e a lama está por toda
parte, mas nem ligo. Meu coração ainda bate em ritmo acelerado.
Vou até a janela e vejo a chuva que ainda persiste em cair.
Fecho meus olhos com tanta força que chega a doer.
— Por favor, não a leve. Por favor! — sussurro pedindo aos
céus.
— Filho!
Reconheço na hora aquela voz que agora está abafada pela
tristeza. Me viro e vejo minha mãe vindo em minha direção. Sua
feição é de partir o coração. Olho para meu pai e ele também está
do mesmo jeito. Minha mãe me abraça forte. Ela chora tanto que
chega a soluçar. Esse sem dúvidas está sendo o pior dia da minha
vida.
— Já tem alguma notícia? — meu pai pergunta.
— Nada ainda — respondo.
Guio minha mãe até as cadeiras e ela se senta. Fico ao seu
lado.

— Eu vou atrás de notícias, já volto. — Meu pai sai da sala


rapidamente.
— Minha pequena tem que ficar bem. Vocês são tudo pra
mim, se perder um de vocês eu morro.
— Mãe, pelo amor de Deus, não fala isso. Eu não vou perder
nenhuma das duas. — Abraço minha mãe e acaricio seus cabelos.
Apesar do medo que estou sentindo, não quero deixar
transparecer. Quero parecer forte mesmo estando despedaçado por
dentro.
Meu pai retorna e ao seu lado há uma enfermeira dando uma
bronca nele por estar fazendo escândalo. Se a situação não fosse
tão trágica, até que seria engraçado.
— Vou ver se tem como o doutor vir falar com vocês — a
enfermeira diz.
— Muito obrigado, era isso que estava querendo desde o
início — meu pai diz antes dela sair.
Escuto uma voz exaltada e não demora para ver Dirce
entrando pela porta. Ela está com os olhos inchados e vermelhos,
como todos nós. Assim que minha mãe a vê, vai ao seu encontro e
as duas se abraçam.
Eu sei que Dirce é amiga da família, mas seu desespero está
se igualando ao da minha mãe. Após elas se separarem, Dirce nos
cumprimenta, e todos nós ficamos ali sentados à espera de notícias.
E depois do que parece uma eternidade, o doutor entra na sala. Nos
levantamos e vamos até ele.
— Como minha filha está, doutor? — minha mãe é a primeira
a falar.
O médico não faz uma cara muito boa, o que me deixa ainda
mais nervoso. Ele analisa a ficha que está em sua mão.
— Infelizmente a senhorita Aurora Alves teve duas costelas
fraturadas e a perna, que ficou presa nas ferragens, está quebrada.
— Coitada da minha menina. — Minha mãe busca consolo
nos braços do meu pai.

— Isso nós podemos tratar, com o tempo, mas infelizmente a


criança que ela estava esperando não sobreviveu. Ele não resistiu
ao forte impacto.
Todos olhamos para ele surpresos.
— Aurora estava grávida? — questiono e o doutor confirma
com a cabeça.
— Ela estava grávida de pouco mais de duas semanas. Início
de gravidez já é difícil, e um acidente dessa proporção... As chances
de o feto sobreviver eram mínimas. Eu sinto muito. Ela está sedada,
mas, assim que acordar, deixarei um familiar por vez visitá-la.
Qualquer coisa, é só me procurar. E, novamente, sinto muito pela
perda.
Vou até a cadeira e me sento ainda sem acreditar. Nós
iríamos ter um filho!? Um bebê meu e dela. Aurora sempre sonhou
em ter uma família. Minha mente está uma confusão. Meu pai vem
até mim, se abaixa, me abraça e as lágrimas voltaram a cair. Eu não
perdi Aurora, mas hoje perdemos um pedacinho de nós dois.
Ainda estamos na sala de espera, aguardando a autorização
para poder ver Aurora. Essa espera está me corroendo por dentro.
Será que ela sabia do bebê? Será tão difícil contar isso a ela. Que
Deus me dê forças.
— O que você está fazendo aqui?
Levanto a cabeça e vejo Dirce de pé em frente a porta
encarando um senhor. Ela o olha com nojo e desprezo, e ele
devolve o olhar na mesma intensidade.
Meus pais parecem que estão vendo um fantasma. Os dois
se levantam e vão até eles.

— Você não havia morrido? — minha mãe pergunta.


Estou me sentindo totalmente perdido. Não estou entendendo
nada!
— Esse é Alonzo, irmão gêmeo de Miguel — Dirce explica.
— Muito prazer em conhecer vocês pessoalmente — o
senhor fala com sarcasmo. — Como minha sobrinha está?
— Sobrinha?! — digo surpreso.
Todos se viram para mim e parece que só então se
lembraram que não estão sozinhos. Me levanto e vou até eles.
— Você deve ser o Fernando, companheiro de Aurora. Muito
prazer. — Ele estende a mão e nos cumprimentamos. — Eu sou
Alonzo, irmão gêmeo do falecido Miguel, pai de Aurora. Ela estava
comigo antes do acidente. Eu tentei ir atrás dela, mas Aurora saiu
muito rápido.
— Você falou alguma coisa pra ela? — Dirce questiona
assustada.
— Sim, ela merecia saber toda a verdade. Vocês mentiram
pra ela por muito tempo. Ela sabe que você é a mãe dela e que
esses dois mentiram dizendo que você havia morrido — diz olhando
para Dirce.
Não consigo acreditar que ela é Dulce, a mãe biológica de
Aurora. Mas agora parando pra pensar, dá pra ver que as duas
realmente tem semelhanças.

Dulce vai para cima do homem e meu pai a segura. Uma


enfermeira entra rapidamente na sala.
— O que está acontecendo aqui? Será que vou ter que
chamar o segurança e expulsar todos? — pergunta.

Nós balançamos a cabeça negando. Ela assente e sai da


sala. Nos sentamos nas cadeiras. Eu já nem sei o que estou
sentindo mais. Que dia louco! Imagino como minha Aurora deve ter
ficado ao saber de tudo isso. Vou até o tal de Alonzo e me sento ao
seu lado.
— Vou te contar uma coisa — digo, e Alonzo me olha
atentamente. — Aurora estava grávida e perdeu o bebê nesse
maldito acidente. Você tem noção de que ela poderia ter morrido!?
Como você teve coragem de jogar todas essas coisas em cima dela
de uma vez? Imagina como ela ficou. Você não tem coração?
— Não tinha como saber que iria acontecer esse acidente. Eu
sinto muito pela perda, mas ela merecia saber a verdade — diz em
um tom sério.
— Nós íamos contar a ela, mas com cuidado. Você não tinha
o direito de aparecer aqui e contar tudo — meu pai fala
rispidamente.
— Eu quero que Aurora venha morar comigo e com minha
família.
Acabo rindo do comentário de Alonzo.

— Aurora não vai sair daqui. Ela vai ficar conosco. Comigo!
— digo firme.
— Com licença, a paciente já despertou. Ela está chamando
por Fernando — a enfermeira diz e eu me levanto. — Vou levá-lo
até ela.

Sigo-a por alguns corredores e paramos em frente a uma das


várias portas que há ali. A enfermeira abre e eu agradeço e entro,
vendo Aurora lá dentro com os olhos fechados. Pego uma cadeira,
me sento ao seu lado e faço carinho em seu cabelo. Me dói tanto
vê-la com uma sonda no braço, com a pele branquinha toda
marcada. Ela abre os olhos lentamente. Como eu tive medo de não
ver esses lindos olhos azuis novamente.
— Oi, baby. Estou aqui com você. Como está se sentindo? —
sussurro.

Algumas lágrimas caem de seus olhos.


— Meu corpo ainda dói um pouco. Nando, minha vida foi uma
mentira. Eu não sei mais quem sou. — Sua voz sai baixa.
— Você é a minha Aurora, amor da minha vida, luz que
ilumina meu dia! Fiquei com tanto medo de te perder. Não sei o que
faria da minha vida sem você.
Aurora passa a mão em meu rosto. Como é bom sentir seu
toque, ouvir sua voz. Coloco minha mão sobre a dela e fecho meus
olhos por um instante. Logo sinto as lágrimas molharem meu rosto.
— Não chora, eu estou aqui. Você é a única coisa da minha
vida que tenho certeza que não é uma mentira — Aurora diz com
carinho e dou um beijo em sua testa.
— Eu já fiquei sabendo da história. Imagino como sua cabeça
deve estar. Quem diria que Dirce é Dulce. Que na verdade quem já
havia morrido era seu pai, não sua mãe. Imagino como você deve
estar confusa, meu amor.
— Nando, foi ela quem matou meu pai. E meu tio me contou
que ele era um bandido. Que família maravilhosa eu tenho. — Sinto
sarcasmo em seu tom de voz.

— Dessa parte eu não sabia, mas isso não muda o que você
é e nem o que sentimos por você. Eu não sei por qual motivo eles
resolveram mentir, mas devem ter algum. Nossos pais te amam,
Aurora. Você tinha que ver como eles estavam quando chegaram
aqui.
— Não quero falar com ninguém por enquanto, só quero você
ao meu lado. Não me deixa sozinha, por favor.

Levo sua mão até meu peito.


— Uma certeza você pode ter é que eu nunca vou te deixar
sozinha. — Dou vários beijos em sua mão e Aurora sorri em meio às
lágrimas. — É tão bom te ver sorrindo. Seu tio falou que quer te
levar pra morar com ele. Você não vai me deixar, não é? Eu não
suportaria ficar sem você.

— Sabia que seu nome foi a última coisa que disse antes de
apagar? Eu fiquei com medo de nunca mais te ver, de não termos
um futuro juntos. — Só de pensar nisso, sinto meu coração ser
esmagado novamente. — Nunca mais quero ter essa sensação.
Então a resposta é não. Eu não vou sair do seu lado.
Acabo sorrindo com sua resposta.
— Eu tenho que te perguntar uma coisa. — Aurora me olha
com atenção. — Você sabia que estava grávida?

Pela expressão de surpresa que ela faz, percebo que não.


— Eu... eu estava? — Sua voz quase não sai.

— Sim, de poucas semanas. Mas infelizmente ele não


resistiu. O médico falou que o impacto foi muito forte. Início de
gravidez é o período mais arriscado. Eu sinto muito por ter que te
dar essa notícia.
Aurora fica olhando para o teto, com as lágrimas caindo uma
a uma. Como queria tirar essa dor de seu peito. Se ela já estava
destruída antes, imagina agora.
— Eu não deveria ter entrado naquele carro no estado que
estava. Eu matei nosso filho, Nando — sussurra.
— Nunca mais fala isso. Não foi culpa sua.

— Foi sim! Se não tivesse fugido da casa de Alonzo como


uma doida no meio da tempestade, isso não teria acontecido. Eu
sou uma assassina, igual a minha mãe.
— Meu amor, olha pra mim. — Quando nossos olhares se
encontram, faço um carinho em sua bochecha. — Você não é uma
assassina e não teve culpa pelo acidente. Não teve culpa por ter
perdido nosso bebê.
— Eu aqui achando que o dia não tinha como piorar.
— Mas estou aqui ao seu lado pra cuidar de você e te ajudar
a superar. — Beijo sua mão. — Você tem certeza que não quer ver
ninguém? Estão todos na sala de espera preocupados com você.
— Não quero. Só quero ficar aqui quietinha com você ao meu
lado — diz desanimada.
Dou um beijo suave em seus lábios.
Fico segurando uma de suas mãos e permanecemos
calados. Aurora volta a olhar para o teto, parecendo perdida em
seus pensamentos. Sua outra mão pousa na barriga e a acaricia. É
tão difícil, mas tenho que ser forte por ela.

A enfermeira que me trouxe ao quarto aparece e informa que


o horário de visita acabou.
— Agora tenho que ir. Amanhã estarei aqui no primeiro
horário. Não esquece que te amo, você é tudo pra mim. — Beijo sua
testa e depois seus lábios.

— Eu também te amo. Até amanhã.


Esse será o momento mais difícil de nossas vidas, do nosso
relacionamento, mas uma certeza eu tenho: não vou desistir de nós,
não vou desistir dela. Vou ficar ao lado de Aurora até ela se
recuperar. Se tem uma coisa que aprendi com o relacionamento dos
meus pais é que não importa o que aconteça, um sempre será o
porto seguro do outro, e eu serei o de Aurora.
Alguns dias se passam e amanhã enfim Aurora receberá alta
médica. Não vejo a hora de poder levá-la para casa. Sinto tanto sua
falta. Já me acostumei a dormir ao seu lado, a acordar e ver aquele
sorriso lindo. Se bem que nem sei mais o que é sorrir. Ela está
diferente, tudo que aconteceu mexeu demais com ela. Eu não a
julgo, pois imagino como seria se fosse comigo. Mas está sendo
bem difícil.
Nem nossos pais ela quer ver. Os dois estão arrasados com
essa distância. O único que a vê todos os dias nos dois horários de
visita sou eu, e às vezes Mari também vai visitá-la. Mas ultimamente
ela tem trabalhado bastante. Com nossos avós e minha tia Vivi ela
conversa por chamada de vídeo, mas bem pouco. Como agora
estão morando na Bahia, só assim para nos vermos com frequência.
Até adiantei minhas férias para poder ficar com ela esse
tempo que estará com a perna engessada.
Bato à porta e assim que abro, a vejo sentada na cadeira de
rodas olhando pela janela. A enfermeira deve tê-la ajudado. Me
aproximo com calma e me sento ao seu lado. Seu olhar está
distante.
— Oi, baby. Como está se sentindo hoje? — Beijo sua
bochecha. Aurora apenas dá de ombros e abaixa a cabeça. — Me
corta o coração te ver assim. Eu quero tanto minha Aurora de volta.
Minha menina alegre, que ama cantar e dançar.
Vejo uma lágrima cair de seus olhos.
— Acho melhor a gente se separar — sussurra e volta a olhar
pela janela.
Ouvir isso saindo de sua boca é como receber um tapa na
cara.

— Não, Aurora. Eu não vou me separar de você — digo com


calma, porém com firmeza.
— Fernando, você entende que eu matei seu filho? Eu sou
uma pessoa horrível, como minha mãe. Está no sangue. Acho
melhor eu ir embora, talvez eu possa morar com meu tio Alonzo.
Meu coração acelera só de imaginar Aurora indo embora.
Seguro seu rosto e a faço olhar em meus olhos.
— Foi um acidente. Você jamais faria algo desse tipo
propositalmente. Lembre-se que eu te conheço muito bem, sei como
minha Aurora é. — Encosto nossas testas. — Não me peça pra ficar
longe de você, pois eu não consigo.
— E se for o melhor pra nós? Melhor pra você?
— O melhor pra nós, o melhor pra mim, é ficarmos juntos —
digo olhando em seus olhos. Quero que veja que estou sendo
sincero. — Só está confusa com tudo o que descobriu. Ir morar com
um homem que não conhece em outro país não é a coisa certa a se
fazer. — Aurora suspira. Ela sabe que estou certo. — Como te
disse, baby, você precisa saber a história toda pra tirar alguma
conclusão. — Beijo sua testa. — E pense que se você for embora,
vai levar meu coração junto. É impossível uma pessoa sobreviver
sem um.
Um pequeno sorriso se forma em seus lábios. Vê-la sorrir
novamente, mesmo sendo por pouco tempo, me fez tão bem.
— Eu preciso de você. Vamos enfrentar tudo isso juntos.
Estou aqui pra te apoiar. Serei seu alicerce, seu apoio e o que mais
quiser que eu seja.

Levo sua mão ao meu peito para que ela possa sentir como
está acelerado. Com a outra seguro seu rosto e acaricio sua
bochecha. Seus olhos azuis estão fixos nos meus. Vou aproximando
meu rosto devagar e por um momento Aurora recua. Isso fez meu
peito doer tanto. Mas não vou desistir assim tão fácil. Continuo a me
aproximar, e enfim quando nossos lábios se tocam, sinto todas as
coisas boas que só ela me proporciona.
Nosso beijo é doce, suave e transborda paixão. Eu quero
mostrar a ela o que somos juntos. Que um complementa o outro.
Quando terminamos, colo minha testa na dela novamente e fecho
os olhos.

— Você é o amor da minha vida. O presente que Deus me


deu. Eu sei que está difícil, mas vamos superar — sussurro. — Eu
sempre vou estar aqui pra você, por você.
Abraço Aurora e sentir seu corpo assim tão próximo ao meu é
tudo o que preciso. É como se os dois corações se tornassem
apenas um. Essa mulher realmente não tem ideia do quanto eu a
amo, quanto preciso de sua companhia, de seu amor.
— Me desculpa — diz baixinho.
— Eu não tenho que te desculpar por nada. Relacionamentos
são assim. Nem tudo é um mar de rosas. — Beijo o topo de sua
cabeça. — Eu te amo demais, Aurora, e eu vou te amar pra sempre.
Ouvi-la dizer que queria se separar partiu meu coração, mas ele é
seu mesmo. Você pode fazer o que quiser com ele. Só não me peça
nunca mais pra ficar longe de você.
Dessa vez é ela que me beija. O que para muitos seria um
simples beijo, para mim é tudo; é a certeza de que ela não vai me
deixar; que ela também precisa de mim, assim como preciso dela.
— Eu te amo, Nando.

Vejo lágrimas caírem de seus olhos e as enxugo uma por


uma. Não importa quantas lágrimas caiam durante a vida, eu
sempre estarei lá pra enxugá-las, para tentar arrancar um sorriso
desse lindo rosto.
— Eu também te amo muito, baby. Te amo sem tamanho,
sem medida.

— Com licença. — Uma enfermeira entra no quarto. — Está


na hora dos remédios. E é bom você voltar pra cama, precisa de
bastante repouso.
A enfermeira entrega dois comprimidos e um copo com água
para Aurora. Após tomar o remédio, eu me levanto e a pego em
meus braços. A enfermeira me olha surpresa.
Será que devia ter perguntado primeiro se podia? Agora já
foi.
— Que cavalheiro! Você tem muita sorte, Aurora — a
enfermeira fala.

— Eu tenho mesmo — diz olhando para mim.


Não consigo evitar e acabo sorrindo, e ela sorri também. A
enfermeira ajeita os lençóis, então a coloco com cuidado na cama.
— Qualquer coisa é só me chamar. Vou deixar os pombinhos
a sós.
Assim que ela sai da sala, pego uma cadeira e posiciono ao
lado da cama.
— Não vejo a hora de te levar pra casa. Aquele lugar fica tão
sem graça sem você — digo segurando sua mão e a beijo.
— Eu também quero muito ir pra casa. Não aguento mais
ficar aqui nesse hospital. Sinto falta da nossa cama, do cheirinho da
nossa casa. E principalmente de você.

Ouvir isso fez meu peito se encher de alegria.


— Obrigada por não desistir de mim. Não desistir de nós. Eu
me senti muito culpada, Nando, e ainda me sinto. Eu ter me
machucado é uma coisa, agora perder um bebê por uma
irresponsabilidade minha é difícil demais. Eu sou muito idi...

Levo meu dedo até sua boca, a impedindo de falar aquilo.


— Você não é nada disso que iria falar. Cobre-se menos,
Aurora. Tudo acontece por um motivo. Podemos não entender
agora, mas um dia entenderemos, ou ao menos aceitaremos. Nós
podemos ter quantos filhos você quiser. Podemos comprar uma
casa do mesmo tamanho da dos nossos pais e encher de crianças.
Podemos até montar um time de futebol se você quiser.
Aurora sorri lindamente.
— Acho que exagerou um pouquinho, amor — diz, ainda
sorrindo.
— Eu topo qualquer coisa se você estiver ao meu lado.
Aurora leva sua mão até minha bochecha e coloco a minha
sobre a dela.
— Você é tão maravilhoso. Eu tenho muita sorte por ter você.

— Nós temos sorte por termos um ao outro. — Dou um beijo


em seus lábios. — Amanhã enfim você irá pra casa, pro nosso lar.
Eu só quero que pense bem sobre tudo o que está acontecendo.
Nossos pais querem muito conversar com você. Eles te amam
muito, Aurora. Isso você não tem como negar.
— Eu sei, Nando, mas em minha cabeça está tudo uma
bagunça.
— Talvez conversar com eles e esclarecer tudo coloque as
coisas no lugar. Pensa com carinho, baby.
Aurora assente e dou um beijo em sua mão.
— Sabe, estou sentindo tanta falta de te ouvir cantar — digo
e Aurora abre um sorriso tímido. — Você pode cantar um pouquinho
pra mim? Por favor.

— Ok, deita aqui. — Ela bate com a palma da mão ao seu


lado. — Vamos, Nando, deite aqui comigo. Tem espaço pra nós
dois.
Aurora vai um pouco mais para o lado e me deito com
cuidado pra não a machucar. Deixo os pés para fora da cama.

— Que música quer ouvir? — pergunta.


— Qualquer uma, só quero ouvir sua voz.
Fico ali admirando Aurora cantar uma de suas músicas
favoritas. Sua voz traz conforto ao meu coração. Eu sei o que quero
para o resto da minha vida: tê-la em meus braços para sempre. E
farei todo o possível pra que isso aconteça.
Enfim estamos indo para casa. Minha vida virou de cabeça
para baixo nesses últimos dias. Eu não sei o que faria se não
tivesse Nando ao meu lado, ele me faz ter forças pra seguir em
frente. Quando penso em desistir de tudo, é ele que segura minha
mão. Nesse momento da minha vida, ele é o único em quem posso
confiar.
Antes de sairmos do hospital, falamos com meus avós e
minha tia Viviane por chamada de vídeo. Estamos nos vendo pouco
e só assim para matar a saudade. Eles tentaram me convencer a
falar com Caio e Manu, mas pedi pra não ficarem forçando isso. Eu
vou falar com eles quando estiver pronta.

Sinto falta de ter meus avós por perto, mas como agora tia
Viviane está grávida do terceiro filho, eles se mudaram para lá para
poderem ajudá-la.
Com meu tio Alonzo, falei apenas uma vez, por telefone. Ele
insiste em me levar com ele para o México. Já disse várias vezes
que não vou mudar de ideia, não vou deixar Nando. Sei que fiquei
distante por um tempo... Isso porque sinto um vazio no peito e
mesmo ele pedindo todos os dias para não me culpar pelo que
aconteceu, eu não consigo. Penso muito no bebê que agora não
temos por uma irresponsabilidade minha. Sinto que sou culpada
pela morte de um pedaço de nós dois.
— Chegamos, baby — diz ao estacionar o carro na garagem.
— Estava com saudade de casa. — Abro um sorriso.
— E eu estava com saudade de ter você em casa. — Nando
me dá um selinho. — Vou abrir as portas, já volto.

— Nando, eu posso ir com as muletas.


— Meu amor, eu te levo no colo, não tem problema algum. Eu
estou aqui pra cuidar de você. Não quero que faça esforço. Você
ainda não está cem por cento.
Vendo Nando assim todo carinhoso e cuidadoso, me
pergunto se eu realmente mereço esse homem. Será que estou a
sua altura?
Com cuidado, ele me pega em seus braços e com o pé fecha
a porta do carro. Me aconchego em seu peito, e é tão reconfortante
sentir seu cheirinho e ouvir as batidas do seu coração.

Fico sentada na cama e Nando vai até o guarda-roupa e


pega mais travesseiros.
— Nossa mãe trouxe uma cadeira pra ficar mais fácil pra
você tomar banho.
— Ela não é minha mãe! Eu não tenho mãe — respondo e
então meus olhos ficam marejados.

Nando vem até mim e se senta ao meu lado. Não tenho


coragem de olhar em seus olhos.
— Você sabe que isso não é verdade. — Sua voz é
carregada de carinho. Nando segura meu queixo e levanta meu
rosto. — Manu te ama demais e nesse tempo pude ver como Dulce
também te ama. Você não tem ideia de como os três estão sofrendo
com essa distância.
— Todos eles mentiram pra mim. Quem ama não mente. —
As lágrimas que segurava agora caem pelo meu rosto.

— Mas quem ama protege. Eu sei que mentir não é o jeito


certo de resolver as coisas, eles erraram, mas tudo isso foi tentando
te proteger. Quando souber de tudo, tenho certeza que irá entender.
— Nando me abraça.
Esse amor que temos um pelo outro é tão puro e verdadeiro.
Nando é meu ar, meu chão, minha luz no fim do túnel. O homem da
minha vida.

— Não existe Aurora sem Nando — sussurro olhando em


seus olhos.
— Nem Nando sem Aurora — complementa, sorrindo.

Eu nunca pensei que esses amores verdadeiros e


avassaladores como nos livros realmente existissem, mas Fernando
está aqui na minha frente para me mostrar que tudo na vida é
questão de achar a pessoa certa.
— Eu te amo, minha Aurora. — Sua testa está colada à
minha.

— Eu também te amo demais.


Ficamos um tempo ali abraçados, só curtindo a presença um
do outro. Repouso minha cabeça em seu peito enquanto Nando
acaricia meus cabelos. Eu não sei como será daqui pra frente, mas
sei que não estarei sozinha.
— Que tal um banho? Tirar essa roupa de hospital, lavar bem
esse cabelo? — sugere. — Eu quero dar banho em você, cuidar de
você com carinho até ficar completamente curada.

— Eu adoraria.
— Vou arrumar tudo. — Nando beija minha testa e se
levanta.
Vejo ele caminhar pelo quarto. Nando vai até o guarda-roupa,
separa um vestido leve, um conjunto de lingerie, creme de pentear e
pente, e coloca tudo em cima da cama. E ainda confere. Fico
admirada. Parece que ele irá cuidar de um bebê. Eu sei que ele
seria um ótimo pai, assim como Caio é. Ou como ele foi. Não sei ao
certo o que pensar sobre eles, a única coisa que tenho certeza é
que tirei de Nando a chance de conhecer nosso filho.
Nando vai até o banheiro e escuto o barulho de algumas
coisas sendo arrastada, provavelmente a cadeira de banho. Quando
retorna, ele está com um saco transparente na mão. Com cuidado,
começa a tirar minha roupa. Me sinto um pouco envergonhada, pois
algumas marcas do acidente ainda mancham meu corpo. Nando se
abaixa, coloca meu pé dentro da sacola e fecha a ponta, para não
molhar o gesso.
— Baby, você é a mulher mais linda do mundo. Não se
preocupe, logo essas marcas sumirão. — Nando passa a ponta do
dedo em um corte na coxa, onde levei seis pontos. — E mesmo se
ficar alguma cicatriz, ela servirá pra me lembrar que eu poderia ter
te perdido, mas Deus foi tão bom que resolveu deixar esse anjo aqui
comigo. — Ele se abaixa e beija uma das marcas roxas. — Eu amo
você, Aurora. Amo cada pedacinho seu. Nada disso mudou.

— Queria poder lhe dizer algo bonito que pudesse transmitir


em palavras o que me faz sentir, Fernando Alves. — Minha mão
toca seu rosto. — Mas acho que nada seria capaz de descrever o
quão bem você me faz.

Nando vai seguindo meus comandos na cozinha. Ele está


preparando nosso almoço. Para todo lugar dentro de casa, ele quer
me levar no colo, mesmo falando que não precisa. Já estou me
sentindo um bebê.
— Agora você pica a cebola, joga um pouco de óleo na
panela e frita ela junto com o alho picado — digo e ele balança a
cabeça, concordando.

— Nossa, não lembrava que cebola era tão ardida assim.


Misericórdia! — resmunga baixo.
Ao se virar, posso ver que seus olhos estão cheios d’água.

— Chora não, amor, eu estou aqui — zombo.


— Muito engraçadinha. Da próxima vez, vou usar um óculos
de sol pra cortar a cebola. — Nós rimos.
Logo sobe o cheirinho gostoso de cebola fritando e meu
estômago ronca. Nando não tem muita experiência na cozinha, mas
só essa preocupação que tem em fazer tudo para me agradar
derrete meu coração.
— Agora você joga a carne moída e um pouco de tempero.
Tem coentro na geladeira. Você pode picar e colocar um pouco
também. Depois mexe até ela ficar sequinha.

— Sim, senhora. Esse será o melhor macarrão que você


comerá na vida!
— Disso eu tenho certeza.
Nando deixa a panela no fogo, vem até mim, me dá um beijo
e volta correndo para o fogão.
Com o macarrão e o molho já prontos, ele pega uma travessa
grande no armário, o coloca dentro, depois joga o molho por cima,
corta algumas tirinhas de pimentão vermelho e faz uma decoração
no centro. Ele está tão centrado. É lindo de se ver.
— Aqui está, baby. O melhor macarrão do mundo! — diz todo
orgulhoso.
— Está com uma aparência muito boa, parabéns! — Bato
palmas, e Nando faz uma reverência. Sorrimos um pro outro. Não
sei como sequer pensei em ir embora. Em deixar para trás o único
homem a que já amei com todo o meu coração.
— Qualquer coisa por você. — Beija minha testa com
carinho. — Vou pegar os pratos e talheres.
Ele se senta ao meu lado e começa a comer. Está tão
delicioso. Nando não para de me surpreender.

— Fazemos uma boa dupla.


Balanço a cabeça, concordando, pois estou com a boca cheia
de macarrão.

Após o almoço, ele arruma toda a cozinha e me sinto


incomodada por não poder ajudá-lo. Não gosto de ficar só
observando. Já vejo o quão difícil será passar esses dias em
repouso.
— Pronto! — Nando enxuga as mãos no pano de prato. —
Agora que você já está de banho tomado e alimentada e a cozinha
está limpa, vamos pro quarto pra você descansar.
— Estou me sentindo uma criança.
Nando me pega em seus braços.
— Eu gosto de cuidar de você. Posso fazer isso pelo resto da
vida se for preciso.

Ao chegar no quarto, me coloca na cama e arruma meus


travesseiros. Ficamos ali, deitados juntos até ouvirmos a campainha
tocar, então ele se levanta e vai atender. Me pergunto quem será a
visita. Sei que não é Mari. Ela me avisou que não daria pra passar
aqui hoje e também achou melhor me deixar descansar no meu
primeiro dia em casa. Quando olho para a porta do quarto, vejo
Nando, Manu e Caio. Os dois estão com uma expressão triste e vê-
los desse jeito parte meu coração. Sempre fui acostumada a ver os
dois sorrindo e felizes.
— Filha, nós podemos conversar? — Manu pergunta com a
voz embargada.
Caio e Manu ainda esperam a minha resposta. Não sei ao
certo se quero falar com eles agora, mas também não posso
expulsá-los. A tristeza que transborda de seus olhos me faz querer ir
até eles e abraçá-los, mas toda a mentira que me contaram me
impede de fazer isso. Um conflito se instala dentro de mim.
— Por favor, filha, nos dê a chance de falar com você. — Vejo
as lágrimas surgirem nos olhos de Caio.
Ele, que sempre foi o mais brincalhão e o mais alegre da
família, está tão abatido. Meu coração se parte em dois.
— Tudo bem.

Um pequeno sorriso se forma nos rostos dos três.


Caio e Manu vem até mim e se sentam na ponta da cama.
Nando me ajuda a me sentar.
— Obrigada, meu amor. — Acaricio seu rosto.
— Vou deixar vocês conversarem sozinhos — Nando diz, já
indo em direção a porta.
— Não! Fica comigo? — Estendo minha mão em sua direção.
Ele assente, se senta ao meu lado entrelaçando nossos
dedos e beija minha mão.
Ficamos um tempo em silêncio. Até que Manu começa a
falar.
— Filha, eu juro que fiz tudo isso pro seu próprio bem. Eu não
queria mentir sobre Dulce ter morrido, mas fizemos uma promessa a
ela. No dia em que fomos ao hospital te buscar, conversamos e ela
nos fez prometer que não iríamos lhe contar a verdade. — Lágrimas
caem de seus olhos e estou me segurando para não chorar. — Eu
não deveria ter aceitado esse pedido. Eu me apaixonei por você no
primeiro instante em que te vi. Parecia uma bonequinha que
precisava de alguém para amar e cuidar.

Caio abraça Manu, tentando confortá-la e seguro forte a mão


de Nando. Meu coração está acelerado e eu não sei o que fazer
nesse momento. Se bem que eu queria dizer a eles que só agora
me dei conta de que a saudade que estava sentindo deles era bem
maior. Senti falta de ouvir suas vozes, do jeito carinhoso que me
olham.
— Fui eu que convenci Manu a aceitar o pedido de Dulce. Na
hora, realmente achei que essa era a melhor opção — Caio diz,
desanimado, com os olhos marejados. — Se você quer culpar
alguém, culpe a mim. Mas pelo amor de Deus, Aurora, não
mantenha sua mãe longe de você. Eu não aguento mais acordar no
meio da madrugada e ouvi-la chorar porque sente sua falta. Vê-la
chorar enquanto olha as fotos de vocês quando eram pequenos me
machuca tanto. — Nessa hora já não dá para segurar mais as
lágrimas. — Podem fazer o que quiserem comigo, eu aguento. É ver
Manu assim que me destrói.

— Eu estou muito confusa com tudo isso.


— E nós estamos aqui pra te contar toda a verdade — diz
Caio. — Por onde quer começar?
— Podemos começar por meu pai. — Ele assente. — Por
que minha mãe o matou? Ele realmente era um bandido? —
pergunto com a voz baixa.
Manu se afasta de Caio e respira fundo, parecendo tomar
coragem.

— Vou te contar toda a história, filha. Não iremos te esconder


mais nada.
Balanço a cabeça concordando.

Essa é a hora. Enfim, vou saber tudo. Saber minha


verdadeira história.
Ficamos ali muito tempo conversando. Manu me conta tudo,
nos mínimos detalhes. Ainda estou em choque com tudo que me foi
dito. Meu pai era um monstro! Ele nunca me quis, eu sempre fui um
estorvo para ele. Tudo o que ele fez com Dulce, a tentativa de matar
Caio, sequestrar minha tia Viviane, fora outras milhares de coisas...
Tudo parece loucura demais.

— Filha, juro pela minha vida que nunca fizemos nada pra te
prejudicar. Ao contrário, Caio e eu sempre tentamos fazer de tudo
por vocês.
— Os dois são nossos filhos! — diz Caio com firmeza. —
Nando de sangue, você de coração. Não existe nada no mundo que
não faríamos pra ver vocês bem. Por favor, nos perdoe.

Os três me olham ansiosos pela resposta. Depois de saber


de tudo e me lembrar da minha criação e de todo o amor, carinho e
cuidado que tiveram comigo, só tenho uma coisa a dizer:
— Eu perdoo vocês. E peço desculpas por mantê-los
afastados de mim.
Caio e Manu vêm até mim sorrindo em meio às lágrimas.
Eles me abraçam com cuidado.
Parece que tirei um peso das costas. Eu amo tanto os dois.
Foi loucura me manter longe todo esse tempo. Só fiz eles sofrerem.
— Nós te amamos muito, minha pequena. Você sempre foi a
menina dos meus olhos — Caio sussurra.

— Sentimos tanto a sua falta! Nunca mais quero ficar longe


de você. — Manu dá vários beijos em minha bochecha e acabo
rindo.
— Eu amo muito vocês. — Essas palavras vem direto do meu
coração. — Amo quando estamos assim todos juntos!
Nos afastamos e Manu segura minhas mãos.
— Nós também, minha filha. — Manu sorri largamente. —
Como você está se sentindo? A cadeira que comprei serviu bem?
— Não estou sentindo dor, tomo meu remédio certinho. E a
cadeira foi muito útil — respondo.
— Eu sinto muito pelo bebê. Imagino como deve ter sido
difícil saber de tudo isso e ainda perder um filho — Caio diz
cabisbaixo.
— Eu não deveria ter entrado naquele carro no estado que
estava. Quando Alonzo me contou tudo, tive um ataque de pânico,
estava difícil de respirar. Tudo que queria era fugir dali. Corri pra fora
da casa tentando recuperar minhas forças. Quando vi que ele
estava vindo até mim, corri para o carro. A chuva estava muito forte
e, pra piorar, minha vista estava embaçada devido às lágrimas. Foi
tudo muito rápido. Pra desviar de um caminhão, joguei o carro pro
acostamento. — Meu peito dói em lembrar de tudo aquilo. — Eu não
sabia que estava grávida. Se eu soubesse...
— Minha filha, eu sei que esse momento é difícil, que nada
que te diga vai fazer essa dor passar, mas estamos aqui com você
pra te ajudar a superar. Tudo acontece com algum propósito, tanto
as coisas boas quanto as ruins. — Manu beija minha testa. — Nós
te amamos muito. Você é e sempre será nossa pequena. No tempo
certo vocês terão um príncipe ou uma princesinha que trará muita
felicidade pra nossa família.
— Filha, você vai falar com Dulce? — Caio questiona depois
de um tempo.
— Vou, mas não hoje. Já vivi muitas emoções por um dia.
Os dois assentem.
— Agora vamos indo pra te deixar descansar. Amanhã
passamos aqui após o trabalho pra ver como está. Se precisar de
qualquer coisa, independentemente do horário, pode me ligar ou
ligar pro seu pai. Eu te amo, minha filha. — Manu me abraça.
— Eu também te amo, mãe.
Ela me olha surpresa.
— Fazia tanto tempo que não me chamava assim. — Manu
sorri com os olhinhos brilhando e beija minha testa.
— Até amanhã, minha pequena. — Caio beija minha
bochecha.
Após nos despedirmos, Nando os leva até a porta.
Com o coração mais leve, me deito na cama, puxo o
edredom e me cubro. Já está começando a anoitecer. Os dias estão
quentes, mas à noite a temperatura cai bastante. Ligo a TV e coloco
em um filme de ação que está passando. Meu celular toca. O pego
de cima da cabeceira e vejo que é Mari.
— Oi, amiga, como está se sentindo hoje?
— Oi, estou bem. Quando vem me ver? Já estou com
saudade.
— Fico tão feliz que esteja melhor. Amanhã mesmo passo na
sua casa. Meus pais vão aí comigo te ver. Adam também quer ir,
mas está com medo de você ou Nando o expulsarem por conta da
brincadeira idiota que ele fez aquela última vez que nos vimos.
— Eu nunca iria expulsá-lo, e Nando também não. Nós temos
educação. Ele errou, mas já é passado. Se ele quiser vir com vocês,
tudo bem.

— Vou avisá-lo, então. Até amanhã, amiga. Eu te amo.


— Até amiga, eu também.
Realmente achei estranho Adam não ter ido me visitar no
hospital, se bem que ele vem me evitando desde aquele dia. Mas
agora está explicado. A pessoa apronta e depois fica com medo.
— Baby, trouxe um cházinho de hortelã pra você.
Vejo Nando entrando no quarto com uma xícara em cima de
um pires. Ele anda devagar para não derramar.
— Você realmente existe ou é uma ilusão da minha cabeça?
— digo e ele ri.
Me sento na cama e Nando me entrega o chá.
— Não está muito quente. Eu dei uma esfriada antes de
trazer. — Ele se senta ao meu lado.
— Obrigada, obrigada por todo esse carinho e cuidado. Por
cuidar sempre tão bem de mim e me fazer tão feliz — digo tudo
olhando em seus olhos.

Nando me dá um selinho.
— É tão bom ver esse brilho de volta em seus olhos. — Sua
mão acaricia meu rosto. — Agora beba seu chá antes que esfrie.
Espero que não esteja muito doce. Se bem que dizem que quando
uma pessoa está apaixonada, ela adoça demais as coisas. E mais
apaixonado do que sou por você é impossível.
Abro um grande sorriso instantaneamente e agradeço aos
céus pela pessoa que meu coração escolheu para amar.
Acordo ofegante após ter um pesadelo. Vai ser difícil
esquecer aquele acidente. As cenas ficam se repetindo quase todas
as noites quando deito para dormir.
— Está tudo bem? — Escuto a voz sonolenta de Nando. Não
queria tê-lo acordado.
— Só um pesadelo. Pode voltar a dormir. — Ele estica o
braço.
Coloco minha cabeça em seu peito e ele acaricia meus
cabelos. Ficamos um tempo em silêncio.

— Sabe, baby, eu estava pensando... se você mudasse seu


sobrenome para o sobrenome Sanchez, que é o de Dulce, nós
poderíamos nos casar do jeito que você sempre sonhou.
Mudar meu sobrenome? Me tornar Aurora Sanchez?
— Não quero trocar meu sobrenome, Nando — digo baixinho.
— Baby, pensa um pouco. Você só será Aurora Sanchez por
pouco tempo. Quando nos casarmos, você volta a ser Aurora Alves.
Mas agora não minha irmã, e sim minha esposa. Não que um
pedaço de papel mude alguma coisa. Eu sei que sempre foi seu
sonho se casar na igreja com um lindo vestido desenhado por essas
maravilhosas mãos. — Nando beija minha mão. — Pensa com
carinho. Eu quero realizar esse seu sonho. Eu quero realizar todos
os seus sonhos, desejos, fantasias. Tudo.
— Eu prometo que vou pensar. Mas primeiro preciso
conversar com Dulce, ver se isso é possível. Eu nem sei o que vou
falar pra ela quando nos encontrarmos. — Suspiro. — Nunca pensei
em ver minha mãe biológica pessoalmente. Cresci achando que ela
havia morrido. Eu a conheci como Dirce, a amiga de nossos pais.
Agora verei Dulce, a minha mãe biológica que passou por várias
coisas ruins só pra que eu pudesse vir ao mundo saudável. Não sei
como explicar o que estou sentindo.
— Tenta descansar agora. Uma boa noite de sono vai te
ajudar a colocar tudo no devido lugar. Eu te amo. Boa noite, minha
Aurora.
— Boa noite, meu amor. — Beijo seus lábios e me aconchego
em seus braços.

Acordo e quando olho para o lado, não vejo Nando ali.


Chamo algumas vezes seu nome e nada. Me sento na cama e noto
um bilhete em cima da mesa de cabeceira.

“Bom dia, baby. Fui até a padaria pegar pães fresquinhos,


pois sei que você gosta. Não demoro. ♡ ”
Com um sorriso no rosto, me levanto, pego a muleta que está
ao lado da cama e sigo para o banheiro. Após me vestir, vou para a
sala. Fico sentada no sofá, assistindo, até ouvir batidas na porta.
Demora um pouco, mas enfim a abro e tenho uma surpresa ao ver
Dulce na minha frente, com os olhos vermelhos. Devia estar
chorando.
Como eu não consegui ver a semelhança entre nós antes?
Principalmente os olhos. Deus, eu estou na frente da minha mãe!
Em minha cabeça parece passar um filme de tudo o que Manu e
Caio me contaram. O tanto que ela sofreu nas mãos de Miguel.
Tudo que consigo fazer é puxá-la para um abraço.
— Filha... minha filha... — sua voz sai como um sussurro.

Ouvi-la me chamando assim é tão bom. Eu estou abraçando


minha mãe! Só achei que isso seria possível na minha imaginação,
mas agora é verdade. Ela não está morta. Está aqui comigo.
Lágrimas rolam pelo meu rosto sem parar. Ficamos em silêncio,
chorando no ombro uma da outra.
— Vamos nos sentar, você já está há muito tempo em pé —
comenta enquanto se afasta.
Vamos até o sofá e nos sentamos lado a lado.
— Eu nem sei o que dizer. Nunca imaginei viver esse
momento. Manu e Caio me contaram tudo o que aconteceu com
você durante a gravidez. Eu sinto muito por ter passado por tudo
aquilo.

Segurando minha mão com carinho, ela abre um pequeno


sorriso.
— Filha, eu sei que posso não ser uma mãe perfeita, mas a
partir do momento que descobri que estava grávida, algo mudou
dentro de mim. A primeira vez que você se mexeu na minha barriga
foi um dos momentos mais mágicos da minha vida. Minha gravidez
não foi fácil. Em muitos momentos eu não sabia o que seria de
nosso futuro, não sabia sequer se teríamos um futuro, mas sempre
dei o meu melhor para garantir que você chegasse a esse mundo.
Matar Miguel foi necessário pra ter a certeza de que você poderia
crescer em paz. Que teria uma vida diferente da minha. E olha como
você está hoje. — Sua mão acaricia minha bochecha. — Uma
mulher linda, educada, que ama seus pais adotivos, que segue a
carreira que gosta.
— E que tem um homem que é completamente apaixonado
por ela e não mediria esforços pra fazê-la feliz.

Me viro e vejo Nando próximo a porta com algumas sacolas


na mão. Ele sorri e vem até nós.
— Oi, Dulce — a cumprimenta. — Vamos tomar café? —
pergunta e faço que sim com a cabeça.
— Você quer se juntar a nós, mãe?
Vejo seus olhos brilharem ao ouvir essas palavras saírem da
minha boca. Com os olhos cheios d'água, ela balança a cabeça
confirmando.

O que eu poderia pedir mais na vida?


Tenho duas mães que me amam, um pai maravilhoso e um
companheiro perfeito.

Meus padrinhos haviam acabado de ir embora junto com


nossos pais. Adam e Mari decidiram ficar um pouco mais. Estamos
na sala. Nando, sentado ao meu lado em um sofá, e Adam ao lado
de Mari no outro.
— Então... O clima ficou estranho agora que estamos só nós
quatro — Mari diz, quebrando o silêncio.
— Também acho. — Olho para Nando, que dá de ombros.
Ele me puxa para mais perto do seu corpo, como se temesse que
Adam pudesse me levar para longe a qualquer momento.
— Eu já pedi desculpas pelo que fiz aquele dia — Adam fala
baixinho.
— Eu sei, e nós já desculpamos — Nando diz, sério. — Mas
isso não quer dizer que esqueci. Você sabia o quanto eu ficaria com
ciúmes e fez assim mesmo, só pra provocar.

— Não tenho culpa se você é assim tão inseguro com seu


relacionamento. — Um sorriso presunçoso se forma no rosto de
Adam e Nando cerra os punhos.
— Vocês dois podem parar agora! — Mari olha de um para o
outro. — É pra isso que você pediu pra vir, Adam? Se soubesse que
iria ficar de gracinha não tinha nem te trazido.
— Desculpa, eu não resisti. — Adam abaixa a cabeça.
— Aurora e eu vamos nos casar. — Olho para Nando
surpresa. Era segredo. Só Dulce sabia, por enquanto.
— Boa piada. — Adam ri e Mari lhe repreende com o olhar.
— Você está testando minha paciência — Nando diz nervoso.
— Aurora vai trocar o sobrenome dela pra Sanchez e então iremos
nos casar e ela voltará a ser Aurora Alves, mas minha esposa.

Mari abre um grande sorriso e vem até mim, me abraça forte


e depois abraça Nando. Olho para Adam esperando que ele
também nos parabenize. Nós somos amigos, não deveríamos estar
assim, brigando um com o outro.
— Se é isso mesmo o que você quer, parabéns — diz, sem
um pingo de sinceridade.
— Sabe, Adam — Nando se inclina em sua direção e apoia
os cotovelos nas coxas —, eu não entendo. Apesar de ser o mais
novo de nós quatro, você teve a sorte de ser o primeiro amor de
Aurora e não aproveitou a oportunidade. E, se me lembro bem, foi
você que disse a ela que era só amizade, e que não queria nada
além disso. Lembro que foi nos meus braços que ela chorou.
— Nos meus também! — acrescenta Mari, e Nando assente.
Eu estou completamente imóvel. Não sei o que falar ou fazer
nesse momento.

— Mesmo assim, continuamos amigos — continua Fernando.


— Sei que éramos adolescentes e muito jovens, mas aí você volta
para o Brasil após quatro anos fora, curtindo e “estudando”. —
Nando faz aspas com os dedos. — E quando descobre que é
comigo que ela quer ficar, você enfim tem interesses amorosos por
ela?
Adam abre a boca, mas Nando não dá tempo para que uma
palavra seja dita, e continua:

— Para, amigo, que já está ficando chato. Aurora me ama do


mesmo jeito que a amo. Você teve a oportunidade e não aproveitou.
Bola pra frente! Seja homem de verdade e respeite nosso
relacionamento. — Nando entrelaça nossos dedos. — Aurora não é
um prêmio e isso não é uma competição. Estou cansado disso! Não
quero mais suas brincadeiras infantis, nem acabar brigando com ela
por causa disso. É comigo que ela vai dormir e acordar todos os
dias, e é comigo que ela vai se casar e formar uma família. Sou eu
que vou ver esse sorriso lindo ao acordar e antes de dormir. Você
pode ter sido o primeiro amor que ela teve, o primeiro homem que
fez seu coração bater descontroladamente, mas eu serei o último.
Olho para Mari de boca aberta após o discurso de Nando. Ela
está tão impressionada quanto eu. Adam fica em silêncio.
— Caramba! Eu também quero uma declaração de amor
dessa. — Mari se joga para trás no sofá.
— Eu acho que está na hora de ir. — Adam se levanta,
aparentemente atordoado. — Desculpa novamente.
Sem olhar para nós, ele vai em direção a porta e sai.
— Eu vou atrás dele pra ajudar a catar os cacos do chão! —
Mari se levanta rindo. — Amo vocês! — diz após beijar a bochecha
de cada um.
Nando me abraça e beija minha cabeça. Posso sentir que
seu coração está disparado, parece uma escola de samba.

— Desculpa se falei demais. Precisava muito tirar tudo o que


já estava guardado em meu peito há muito tempo, e essa foi a
oportunidade perfeita.
— Não precisa se desculpar, acho que agora sim ele
percebeu que já deu. — Me afasto de seus braços e olho em seus
lindos olhos azuis. — Creio que, após isso, nunca mais pensará em
fazer qualquer gracinha. Você acabou com ele!
Nós rimos.
— Eu só fui sincero. Você não é o prêmio de uma
competição. Você é minha Aurora, o amor da minha vida.
Levanto meu rosto e Nando olha em meus olhos; sua mão
acaricia minha bochecha, então ele me beija. Seus lábios tocam os
meus com carinho e ternura. Se alguém algum dia me perguntasse
o que é para mim a definição de amor, com certeza eu diria seu
nome.
Hoje enfim é o dia de tirar esse maldito gesso e agradeço aos
céus por isso. Após uma consulta onde foi realizado um último
check up, fui liberada. Estou feliz, pois agora poderei voltar à minha
vida normal. Apesar de gostar de ficar com Nando em casa, eu
quero voltar a trabalhar.
Olho para a receita de algumas vitaminas que estão na minha
mão. Aurora Sanchez. Já faz uma semana que meu nome mudou.
Nosso casamento está marcado para daqui a dois meses e já estou
trabalhando no meu vestido de noiva e nos das madrinhas.

Todos da família estão muito felizes. Tudo se encaixou. Meus


pais estão do meu lado, o homem que amo também, e tenho meus
amigos. Depois daquela noite, Adam se tocou e voltamos a nos dar
bem. Meu tio Alonzo voltou para o México duas semanas atrás. Nos
falamos por telefone duas vezes por semana, e contei as novidades
a ele. No começo, não pareceu muito feliz, mas a escolha é minha.
A vida é minha e é desse jeito que quero viver.
Assim que entramos no carro, abro a bolsa para guardar a
receita e procuro meu celular, mas não o acho.
— Nando, acho que deixei meu celular no consultório. Vou
buscar, já volto!
— Eu pego pra você, meu amor. Não demoro. — Nando me
dá um beijo e sai do carro.

Fico olhando dentro da bolsa, só pra ter certeza de que o


restante das coisas estão aqui. A porta do carro é aberta.
— Que rapidez! Eu... — Olho para o lado, mas não é Nando
que entra. — O que está fazendo aqui?!

— Nós precisamos conversar. É um assunto muito sério.


Algo dentro de mim me diz que não é coisa boa. Inspiro e
expiro várias vezes, tentando afastar o pânico que começa a tomar
conta do meu coração. Tomando coragem, decido enfim perguntar:
— Que assunto sério? — Tento parecer calma. — Nando logo
estará de volta, e ele vai achar estranho você aqui no carro. Como
sabia que eu estava aqui?
— Isso não importa. Você está correndo perigo, Aurora.
Precisa vir comigo para o México — diz meu tio, com uma
expressão que faz meu coração errar uma batida.

— Eu não posso. Estou com o casamento marcado pra daqui


a dois meses. Eu já te falei mil vezes que quero ficar aqui com
minha família e com meu noivo. — Mostro a aliança de noivado que
Nando me deu algumas noites antes. É um lindo anel de ouro com
um delicado diamante.
— Aurora. — Alonzo segura a minha mão. — Eu preciso que
venha comigo. Se não fizer isso, todos os que você ama estarão em
perigo, principalmente seus pais e Fernando.
Nesse momento, é como se tirassem meu chão; meu peito se
aperta tanto que o ar me falta. Meus pais, meu amor. Acho que a
expressão de terror e confusão estão estampada em meu rosto,
pois Alonzo respira fundo e fala:
— Vou te contar tudo, mas não aqui. Invente uma desculpa
pro Fernando e vá a esse hotel. — Alonzo me entrega um cartão —
Estou te esperando lá, não demore. Quanto menos ele souber, mais
fácil será pra você se afastar dele. — Alonzo beija minha testa e sai
do carro tão rápido quanto entrou.
Me afastar? Acho que não conseguiria viver longe dele, longe
da minha família. Não demora e escuto a porta do carro se abrir
novamente. Tenho um sobressalto, pois estava perdida em meus
pensamentos.

— Está tudo bem, baby? — Nando me olha com


preocupação.
— Sim, só estava distraída. — Seguro seu rosto e lhe dou um
beijo.

Não um beijo qualquer. Um beijo que demonstra o quanto ele


é importante para mim; o quanto eu o amo. Encosto minha testa na
sua e respiro fundo, sentindo o cheiro que só ele tem, que me faz
arrepiar. Meus olhos se enchem de lágrimas. O que será que está
acontecendo? Meu tio estava no México, até onde eu sabia.
— Estou ficando preocupado. — Nando afasta o rosto e olha
em meus olhos. — Tem certeza de que está bem?

— Tenho sim, devo estar emotiva pois aqueles dias estão se


aproximando. Não se preocupa. — Me forço a sorrir.
— Quer passar em algum lugar pra comprar doces e
chocolate?

Sorrio com seu questionamento. Ele sempre tentando me


agradar.
— Na verdade, estou pensando em ir até a papelaria olhar os
modelos de convites pro casamento. Você poderia me deixar lá?
— Você não quer que fique com você e te ajude a escolher o
modelo? — Sinto um pouco de tristeza em sua voz.
— Eu prefiro escolher sozinha, se não tiver problema.
— Tudo bem. — É tudo o que diz antes de ligar o carro e sair
do estacionamento do hospital.

Me viro para a janela e olho as pessoas felizes ao lado de


fora conversando, andando de mãos dadas com seus
companheiros. Fico tão perdida que nem vejo quando Nando
estaciona o carro em frente a papelaria da cidade. Só percebo
quando sua mão toca a minha.
— Assim que terminar me avisa que venho te buscar. Tudo
bem?

— Ok. — Dou um beijo em seus lábios.


Espero ele sumir de vista para pegar o celular e pedir um táxi.
Não demora muito para estar em frente ao hotel. Me apresento na
recepção, onde me é informado o quarto, e, com o coração na mão,
entro no elevador e subo até a suíte principal.

Parada em frente a porta, engulo em seco ao imaginar que


minha vida pode mudar drasticamente com essa conversa. Bato à
porta e logo ela é aberta e meu tio me conduz para dentro. Me sento
no sofá.
— Quer algo pra beber, querida? — pergunta, indo até o
barzinho.
Balanço a cabeça, negando, e Alonzo se serve de whisky e
se senta ao meu lado.
— Então? Me conte tudo.
Ele assente.
— Você sabe que seu pai era um homem que fazia coisas
erradas. Tráfico, estelionato, entre outras coisas. Ele estava muito
endividado quando morreu. Eu paguei as contas dele, mas... —
Alonzo respira fundo. — Seu pai fez uma coisa muito ruim a um dos
piores traficantes do México, que era “seu amigo”. — Ele vira toda a
bebida de uma vez. Parece pensar que isso lhe dará coragem para
continuar a história. — Ele abusou da única filha de Santoro. Na
época ela tinha 15 anos. — Estremeço ao ouvir aquilo. — Miguel fez
isso na última vez que foi ao México, um pouco antes de ser morto.
A filha de Santoro, Carmem, escondeu o acontecido por um tempo.
Quando a verdade veio à tona um pouco depois que seu pai morreu,
Santoro foi até minha casa e matou minha esposa, Rosalinda, mãe
de Victoria. — Os olhos de Lorenzo se enchem de lágrimas e sinto
um aperto no coração. Ele não tinha nada a ver com o que
aconteceu. — Eu implorei... me ajoelhei aos seus pés para que ele
não matasse minha filha.
— Eu sinto muito — consigo dizer, e ele continua.

— Por isso quis que viesse morar comigo assim que descobri
que estava viva, mas como vi que realmente estava feliz aqui com
sua família e seu companheiro, decidi que manteria sua existência
em segredo. Paguei uma boa quantia ao detetive que contratei pra
que ele não contasse a ninguém. Fiz minha esposa e minha filha
prometerem que manteriam segredo, e assim fizeram. — Alonzo
passa a mão no cabelo. Parece atordoado. — Mas ontem fiquei
sabendo que o detetive foi encontrado morto. Não sei o motivo de
seu assassinato, mas desconfio que Santoro deve estar perto de
descobrir que você está viva. Ele vai querer mais vingança. Aurora,
e eu só vou conseguir te manter segura se for comigo embora.
— Por que não contou isso no início? — Minha voz quase
não sai.

— Achei que conseguiria esconder sua existência, mas falhei.


Santoro é um homem frio, louco e sem limites. Se você acha que
Miguel era ruim, Santoro é mil vezes pior. Eu só sei que ele ainda
não sabe sobre você porque ainda está viva.
Essa última frase me abala completamente. Se já não
estivesse sentada, cairia no chão pois meus joelhos parecem
gelatinas e minhas mãos tremem.
— Ele não terá piedade. Santoro não tem coração. Miguel
traiu sua confiança, e matar minha esposa não foi o suficiente pra
ele. Assim que souber que está viva e bem, ele acabará com sua
família, pra te fazer sofrer, e depois acabará com você. —
Segurando minhas mãos trêmulas, ele me olha nos olhos. — Eu te
contei toda a verdade daquele jeito pra você ficar com raiva de sua
família e vir morar comigo. Sei que pareço o vilão da história, mas
não sou. Você é tudo o que sobrou de meu irmão e vou fazer de
tudo pra te proteger. Meu dinheiro foi conquistado com meu
trabalho, eu nunca me meti nessas coisas erradas, mas agora não
tem como fugir desse mundo onde Miguel me obrigou a entrar. —
Lágrimas continuam a cair. Estou com tanto medo. — Eu preciso de
tempo, tempo pra acabar com Santoro. Pra enfim vingar minha
esposa e te manter segura.
— Quanto tempo? — sussurro.
— Eu não sei. — Essa pequena frase aperta meu coração. —
Vou usar cada centavo do meu dinheiro pra contratar os melhores
nesse ramo. Eu prometo que assim que tudo acabar, te trago de
volta para o Brasil, pra sua família. Vou manter pessoas vigiando
sua família aqui, mas ele vai querer você, não eles.
Eu preciso ir e deixar Nando e meus pais para que eles
fiquem seguros. Mas como irei fazer isso sem contar toda a história?
Isso pode levar semanas, meses e até anos. Se Santoro é assim tão
poderoso, seria difícil planejar uma armadilha para matá-lo.

Abraço Alonzo, que corresponde. Eu não tenho outra


escolha. Se acontecesse alguma coisa com minha família, eu
morreria. Já fui a causadora da morte do nosso filho, não posso
arriscar. Dulce fez tantos sacrifícios por mim, agora chegou a minha
vez de salvar quem eu amo.
— Eu vou com você.
Minha cabeça parece que vai explodir. Não posso acreditar
que terei que me afastar das pessoas que amo, sem ao menos
poder explicar o motivo. Não posso arriscar que tentem fazer algo
que os comprometa mais ainda. Não posso arriscar minha família.
Se Santoro vir atrás deles só para tentar me atingir...
Meu tio me mostrou um arquivo com várias informações
sobre Santoro, tudo o que conseguiu juntar nesses últimos dias. O
homem é realmente o demônio em pessoa. Tantas atrocidades... Ele
mata desde criança até pessoas de idade. Sangue de inocentes
corre em suas mãos. Mas não o da minha família. Eu farei de tudo
para mantê-los seguros. Tudo que pedi ao meu tio foi uma noite
para passar ao lado de Nando, e ele aceitou. Mas disse que
partiremos amanhã de manhã. Não podemos perder mais tempo.
Não mando mensagem para Nando ir me buscar, apenas
peço que meu tio me leve para casa.
Amanhã será o dia em que Nando retornará ao trabalho, e
hoje é seu último dia de férias.

E o nosso último juntos.


Foram vinte e três anos o vendo todos os dias. Como vou
sobreviver esse tempo sem ele? Sem ouvir sua voz, sentir seu
corpo contra o meu, sem sua amizade, seu amor? Eu prometi não ir
embora, prometi que ficaríamos juntos pelo resto de nossas vidas. E
agora tenho que partir para ter a certeza de que ele permanecerá
vivo.
Assim que abro a porta de casa, o vejo deitado no sofá
jogando. Ao perceber minha presença, ele se levanta e vem até
mim.

— Você demorou. Por que não me mandou mensagem?


— Desculpa, perdi a noção do tempo. Eu vim de táxi, não
queria te incomodar. — Seus braços me envolvem e Nando cola
nossos corpos.

— Já te falei que não é incômodo algum cuidar de você,


baby. — Seu nariz roça a curva do meu pescoço. — Já estava com
saudade.
Se essa será nossa despedida — não um adeus, um até logo
—, eu irei fazer valer a pena cada segundo.

Jogo a bolsa no sofá e beijo Nando como se fosse a última


vez. Envolvo meus braços em seu pescoço e suas mãos levantam
meu vestido e apertam minha bunda. Só basta um toque para que
nossos corpos peguem fogo. Nando me levanta e cruzo minhas
pernas em volta de sua cintura. Não demora e estou pressionada
contra a parede. Seus lábios percorrem meu pescoço até a curva
entre meus seios.
Já posso sentir sua ereção roçar o tecido fino da minha
calcinha. Sua boca volta aos meus lábios. Um gemido baixo escapa
quando Nando se esfrega em mim.

— Eu quero, Nando... — Outro gemido escapa, me


impedindo de falar.
— O que você quer, baby? Diz pra mim. — Sua voz rouca
contra meu ouvido me faz fechar os olhos.
— Tudo. Quero tudo o que nunca fizemos, e quero fazer
amor com você de todas as formas possíveis. — Me aproximo de
seu ouvido. — Quero que todo o meu corpo sinta seu toque.

— Se era pra me deixar louco de tesão, você conseguiu.


Nando me coloca no chão e se afasta. Sinto meu corpo
pegando fogo. Vejo ele afastar a mesinha de centro e jogar algumas
almofadas sobre o tapete felpudo que fica no centro da sala. Seu
olhar volta para mim, e se ele pudesse me despir só com os olhos,
eu já estaria nua.

Ainda me encontro encostada na parede, com a respiração


irregular, quando o vejo se ajoelhar na minha frente.
— Segura em meu ombro se precisar — diz, levantando o
vestido.
Sinto seu dedo colocando minha calcinha de lado. Quando a
primeira passada de língua é dada, meu corpo se contrai. Nando
levanta o rosto e olha em meus olhos, e juro que posso ver a chama
do desejo brilhando ali. Sem cerimônia, ele ergue uma de minhas
pernas e começa a me chupar; cada cantinho de mim sente o poder
de sua língua.
Gemidos ecoam pelo cômodo e os seus dedos começam a
me penetrar. Os dois entram e saem em um ritmo lento e gostoso
enquanto sua língua e seus lábios trabalham em conjunto. Meu
corpo treme e o prazer me atinge em cheio. Chamo seu nome.
Nando abaixa a minha perna e, aos poucos, vou me recuperando da
sensação. Sua mão desliza até minha cintura e seus dedos se
prendem em minha calcinha. Ele a tira, e depois tira minhas
sandálias. Ao se levantar, despe o meu vestido e meu sutiã. Estou
completamente nua e ofegante na frente do meu grande amor.
— Tão linda! — Seus olhos brilham intensamente conforme
se afasta.
Nando começa a se despir lentamente, como se quisesse me
provocar, e sinto meu corpo pedir por ele novamente. Esfrego uma
coxa na outra, tentando reprimir a pulsação no meio de minhas
pernas assim que ele tira a cueca. Sua mão é estendida em minha
direção e Nando me conduz até o tapete, e me instrui a me colocar
de quatro. Eu estou totalmente exposta ao meu homem. Não
importa quanto tempo ficaremos separados, ele sempre será meu e
eu dele.

— Você quer tudo? Tudo o que nunca fizemos? — Viro a


cabeça para ele e a balanço, consentindo. — Então só relaxa.
Não sei ao certo o que virá, mas sei que ele não me
machucará, que será cuidadoso comigo. Meu corpo estremece ao
sentir sua língua novamente em mim, me provocando. Mas fico mais
surpresa ainda quando ela me percorre por cada canto, e sua boca
desce sobre minhas costas.
A ponta de seu dedo acaricia a entrada de meu ânus
enquanto sua boca se delicia com meu clitóris. Com cuidado, Nando
vai introduzindo o dedo e sinto seu pau deslizar para dentro de mim,
me preenchendo por completo. Já acostumada com a sensação,
começo a me movimentar. Seu pau saia e entra lentamente e o
dedo se move com precisão. Sinto que estou perto de gozar
novamente quando seus movimentos param.
— Não, Nando, continua.
Consigo ouvi-lo rir, satisfeito.
— Calma, baby.
Viro a cabeça para ele e o vejo pegar uma camisinha na
carteira que está em cima da mesinha. Ele a coloca com facilidade
naquela maravilha.
— Fique de joelhos em frente ao sofá e apoie os cotovelos
nele — orienta.
Assim eu faço. De lado, vejo Nando vindo até mim, e beijos
começam a ser distribuídos em minhas costas, fazendo meu corpo
reacender.

— Vou devagar, amor. Prometo não te machucar. Só relaxa.


Quando sinto seu pau entrando devagarinho, centímetro por
centímetro, sinto um pouco de dor e gemo baixinho.

— Quer parar? É só falar que paro. Continuamos de outro


jeito.
— Não. Continua.
Tento relaxar o máximo possível. Enfim, quando seu pau já
me preenche de um jeito gostoso que nunca imaginei que seria,
Nando começa a mover a cintura suavemente. Sua mão acaricia
meu clitóris e sinto que posso ver estrelas. O prazer é tanto que
aperto o estofado do sofá com força. Meus gemidos se misturam
aos dele. É uma sinfonia de prazer.
Sinto sua língua deslizar por minhas costas.

— Nando... caramba... — Meu corpo treme e, pela segunda


vez, gozo.
— Eu quero gozar dentro de você, minha Aurora — sussurra.
Ainda sentindo meu corpo pulsar, Nando sai de dentro de
mim, retira a camisinha, esfrega a cabecinha em meu clitóris
sensível e me penetra novamente. Segurando em minha cintura, ele
vai o mais fundo possível, e esse entra e sai é tão gostoso. Eu
quero senti-lo se entregar ao prazer assim como eu.

Sua mão envolve meus cabelos e seus lábios beijam e


arranham meu pescoço enquanto continua as investidas. Com uma
de suas mãos livre, ele a leva até meus seios e pressiona meu
mamilo.
— Gostosa. Minha!

Sinto que estou próxima. Sua respiração acelera.


— Goza de novo pra mim. Goza comigo. — Sua voz rouca
em meu ouvido faz eu me entregar ao prazer novamente. Chamo
seu nome baixinho. — Amo te ouvir chamando meu nome enquanto
treme de prazer.

Ofegante e completamente satisfeitos, nós dois nos deitamos


no tapete sobre as almofadas. Nando me abraça e, em seus braços,
permito as lágrimas rolarem.
— Eu te machuquei? — Vejo a preocupação em seus olhos.
— Não, não me machucou. Estou bem. Eu te amo. Te amo
muito.
Seus lábios tocam minha testa. Um beijo terno e cheio de
amor que faz meu coração se partir só de pensar em deixá-lo.

— Eu também te amo. Te amarei pra sempre.


Levanto meu rosto, acaricio sua bochecha e o beijo.
Eu posso ir embora, mas meu coração vai ficar aqui. Com
ele.
Já é madrugada. Nando está dormindo tranquilamente. Fiquei
um tempo o admirando antes de levantar e pegar um papel e uma
caneta. Vou para a cozinha e tento pensar em como dizer que
partirei, mas que uma hora irei retornar. Algumas lágrimas caem e
molham o papel. Encosto a caneta na folha e começo a escrever.
“Meu grande amigo, meu verdadeiro amor,
Eu sei que isso vai doer. Sei que vai parecer que estão
arrancando seu coração do peito, pois é o que estou sentindo nesse
exato momento.
Eu queria ficar aqui. Queria poder me casar, viajar com você
pra nossa lua de mel, mas não será possível. Não por enquanto.
Eu tenho que partir por forças maiores. Por favor, não pense
em nenhum momento que não te amo. Não sei quanto tempo terei
que ficar afastada, mas saiba que cada pedacinho de mim estará
pensando em você, desejando você.
Não estou sendo sequestrada nem nada do tipo. Só preciso
de um tempo longe de tudo e de todos. Quando retornar, te contarei
tudo nos mínimos detalhes, eu prometo.
Tente manter a calma. Eu voltarei assim que possível.
Voltarei pra você, pros seus braços. Ontem você me amou de forma
intensa e vou guardar esse dia em meu coração. Vou me lembrar de
nossos momentos felizes, me lembrar de suas carícias, de seu jeito
de cuidar de mim. Eu te amo como nunca imaginei amar alguém na
vida. E é por amor a você e nossa família que estou partindo.
Por favor, não esqueça de mim. Me espere. E,
principalmente, se cuide. Cuide de nossos pais e de Dulce por mim.

Com amor,
Aurora.”
Nesse momento já estou soluçando. Cruzo os braços sobre a
mesa e apoio a cabeça sobre ela.
Amor, um sentimento tão intenso, capaz de te dar forças
quando mais se precisa; tão puro e verdadeiro que pode abalar sua
estrutura e mudar sua vida. Eu mataria por amor, eu morreria por
amor. Amor à minha família, amor ao meu homem, que agora dorme
tranquilamente em nossa cama; em nosso ninho de amor.

Enquanto observo Nando se arrumar, um nó se forma em


minha garganta. Não sei quanto tempo ficarei longe, mas algo me
diz que não conseguirei voltar tão rápido como gostaria. Seguro a
vontade de chorar e respiro fundo várias e várias vezes.
— Já estou indo, amor. Até mais tarde. Vou trazer uns
chocolates pra você. — Nando vem até mim e me dá um selinho.
— Eu te amo. Nunca se esqueça disso. — Me sento na cama
e o abraço.

— Amor, essa TPM está te deixando mais emotiva que o


normal. — Beija minha cabeça. — À noite ficaremos grudadinhos
comendo chocolate e assistindo TV. E eu também te amo muito, te
amo mais que a mim mesmo.
Seguro seu rosto e lhe dou nosso último beijo. Essa é a
nossa despedida.

Quando Nando se levanta e sai pela porta, permito que


minhas lágrimas caiam.
Me levanto, me troco e começo a arrumar as poucas coisas
que levarei. Pego a carta que está na gaveta e a coloco sobre a
mesa da cozinha. Não posso simplesmente sumir e não dizer nada.
Tenho que pelo menos deixá-lo ciente de que irei voltar. Dou uma
última olhada em toda a casa. Pego a camisa que Nando usou essa
noite e levo-a ao nariz, inalando seu cheiro. Como vou sentir falta de
tudo isso.

Enfio a camisa na mochila e vou até a entrada da casa, pois


o horário combinado com meu tio já chegou. Tranco a porta e coloco
a chave no bolso da mochila.
— Um dia voltarei. Eu vou voltar. Bem, com saúde e inteira —
digo a mim mesma.

Vou até o carro preto com vidros escuros e assim que entro,
vejo meu tio e dois seguranças; um dirigindo e o outro ao seu lado,
no banco do passageiro.
— Você está fazendo a coisa certa, querida. Está protegendo
quem você ama. Do mesmo jeito que protegerei você com minha
vida. — Alonzo segura minha mão.

— Eu estou fazendo a coisa certa — tento me convencer


disso.
“Meu coração ficará com você.”
Após um tempo na estrada, chegamos ao aeroporto
particular, onde um jatinho nos espera. Meu tio faz questão de
carregar minha mochila.
Quando coloco o primeiro pé na escada, sinto uma dor forte
no estômago que me faz desabar. Meu tio grita meu nome, me pega
em seus braços e me leva para dentro do jatinho. Olhando para a
minha barriga, posso ver o sangue escorrer. De onde veio esse tiro?
Eu não ouvi barulho nenhum!
Alguns tiros são trocados e, com agilidade, os seguranças
fecham a porta. Gritos e ordens ecoam ali dentro. Não consigo
entender o que falam em espanhol.

— Você vai ficar bem. Eu vou cuidar de você — meu tio fala
com a voz trêmula enquanto me abraça.
E a escuridão me abraça tão forte quanto ele.

É difícil voltar ao trabalho após ficar um mês com minha


Aurora em casa. Sinto falta de ouvir sua voz, vê-la sorrir. Enfim, a
vida nos deu uma trégua. Passamos por tantas coisas nesses
últimos meses. Coisas boas e ruins.

Enquanto dirijo, lembranças do sexo de ontem tomam minha


mente. Foi tudo tão gostoso e intenso. Espero que ela também
esteja com todo esse desejo quando formos comemorar nossa lua
de mel. Aurora ainda não sabe, mas vamos para Campos do
Jordão. Ela não quer sair do país, mas que um lugar inesquecível,
então pensei em levá-la até lá. Um lugar novo, lindo e especial.
No caminho para casa, passo na Americanas e compro
vários chocolates diferentes e alguns Fini. Aurora está sensível
devido a TPM, e eu quero mimá-la, como sempre faço. Sei que esse
período é difícil para as mulheres.
Chegando em casa, chamo seu nome, mas ela não
responde. Começo a andar pelos cômodos, mas nada. Ligo em seu
celular e ouço o seu toque vindo do quarto. Talvez tenha saído e
esquecido de levar. Decido ir até a cozinha colocar os chocolates na
geladeira. E quando a alcanço, vejo uma carta sobre a mesa. Pego
o papel e começo a ler.
Um pânico toma conta de mim. Corro até o quarto abro o
guarda-roupa e vejo que sua mochila não está lá. Olho na gaveta
onde guarda seus documentos, e também está vazia.
Sinto minha respiração falhar.
Ela foi embora? Ela me deixou?
Por quê?
Será que não fui o parceiro que ela esperava?

Na carta ela diz que me ama, mas que precisa se afastar. E


eu não entendo. Qual seria o motivo que a fez partir e me deixar
sozinho? Me abandonar em meio à escuridão e à dor que agora
dominam meu peito?
Ontem foi uma despedida.

Me sento na cama e sinto minhas mãos tremendo. Leio


várias vezes a carta. E cada vez que faço isso, é como se meu
coração se partisse mais e mais. Tento entender, achar alguma
pista. Pego meu celular e ligo para minha mãe. Não demora para
ela atender.
— Oi, meu amor.
— Mãe, Aurora me deixou. Ela fugiu. — As lágrimas que
tentei segurar agora escorrem pelo meu rosto. — Precisamos
encontrá-la.
Abro as portas que dão acesso à sacada do meu quarto e
sinto a brisa me refrescar. O dia está quente e abafado, mas quando
cheguei aqui no México ainda era início de primavera e o calor não
era tanto como agora. De qualquer forma, eu mal saio deste
cômodo, que, com o tempo, acabou se tornando meu refúgio. Para
tentar me distrair, passo horas desenhando, apesar de nada que
faço parecer me agradar.
Olho para o céu azul sem nenhuma nuvem e me lembro dos
olhos de Nando. Sinto tanto a sua falta. Choro toda noite pensando
em minha família. Sinto saudade de cada um deles. De nossas
conversas, nossos momentos juntos. Nem comendo direito estou,
com a preocupação que parece fechar minha garganta.

Me sento na cadeira e a luz do sol bate no pequeno diamante


em meu dedo, fazendo-o brilhar, e mais uma vez me lembro do
brilho nos olhos de Nando quando se ajoelhou e me pediu em
casamento. Acabo sorrindo entre as lágrimas. Eu sabia que ia sentir
sua falta, só não imaginava que seria tão dolorosa ao ponto de me
enfraquecer mais a cada segundo.
— Bom dia! — Escuto a voz de Juan e quando olho para
baixo, vejo-o acenar animadamente para mim. Aceno de volta e
enxugo minhas lágrimas. Me levanto, vou até a grade e olho para
ele. Juan é um dos seguranças da casa, bastante simpático e
divertido, além de muito bonito. Ele me lembra Mari. Deve ser por
isso que nos damos bem. Juan faz eu me sentir em casa. — Jogue
suas tranças, Rapunzel! — grita, fazendo uma encenação
exagerada.
— Só você pra me fazer rir. — Balanço a cabeça.

— Estou à disposição, milady — diz, fazendo uma reverência


desajeitada.
Escuto a porta do meu quarto se abrir e já imagino quem
seja. Logo Vic está encostada na grade comigo. Nos tornamos boas
amigas durante esses meses. Não como Mari e eu, mas ela é a
única pessoa com quem converso além de Juan. Todas as noites
antes de dormir, Vic me traz um chá na cama para me ajudar com
os pesadelos que ando tendo ultimamente. A maioria deles é com
minha família sendo refém de Santoro, sendo torturada; sangue,
gritos... Nunca mais tive uma noite de sono tranquila.
— Já está jogando seu charme em cima da minha prima de
novo, Juan? — ela pergunta.
— Eu?! Jamais! Assim você me ofende. — Juan leva a mão
ao peito.

— Deixa meu pai ver que você está fora do seu posto.
— Eu também tenho horário de descanso, Vic. Não se
esqueça. Agora vou tomar um café. Até mais, belas moças. — Juan
pisca e se vai.

— Ele é um fofo, não é? — Vic suspira.


— É. Você gosta dele? — pergunto.
— Não sei. — Dá de ombros.
— Como não sabe?
— Não sabendo! — Ela ri. — Vim te arrastar para tomar café
e não aceito não como resposta. Papai e Silvana estão nos
esperando. Você precisa comer, Aurora. Está tão fraca e magra. —
Seu olhar percorre meu corpo e eu abro a boca para protestar, mas
ela está certa.
Estou um caco. Tudo que quero é voltar para casa. Levo a
mão até a barriga, para a pequena cicatriz onde a bala acertou
naquele dia e por sorte não atingiu um órgão vital. Felizmente um
dos funcionários do meu tio que estava no avião era médico e
conseguiu realizar os primeiros socorros. Nunca vou me esquecer
do pânico que senti.
Segurando meu braço, Vic me leva pelos corredores da
grande casa. O chão polido mais parece um espelho e, mesmo a
propriedade sendo linda e refinada, não é meu lar. Após
cumprimentarmos meu tio e sua esposa, que já começaram a tomar
seu café da manhã, nos sentamos e Vic coloca torradas e pão em
meu prato sem eu ao menos pedir.

— Como está se sentindo hoje, querida? — pergunta Silvana.


Apenas dou de ombros e levo uma torrada à boca. Eu já
cansei dessa maldita pergunta todos os dias. O que querem que eu
diga? Minha aparência e meu estado emocional já demonstram
como estou me sentindo. Eu só preciso que eles resolvam tudo isso
o quanto antes para voltar para casa. A governanta Milagros se
aproxima de nós com o telefone na mão.

— Senhor, ele está no telefone — diz ao meu tio baixinho.


O olhar de Alonzo encontra o meu e não resta dúvida de
quem é. Meu tio pega o telefone.
— Bom dia, Alonzo. Desculpa incomodar mais uma vez. —
Meu coração acelera só de ouvir sua voz. A voz que tantas vezes
sussurrou em meu ouvido dizendo que me ama. — Tem alguma
novidade? Alguma notícia da minha Aurora?
Meus olhos ardem com as lágrimas que lutam para cair. Sua
voz está tão triste, dá para sentir sua dor. Minha vontade é pegar o
telefone e dizer que estou aqui, que estou morrendo de saudade,
que penso nele a cada segundo.
— Nenhuma novidade, infelizmente — responde e ouço seu
longo suspiro do outro lado da linha.
Vic segura minha mão sobre a mesa, tentando me confortar.
— Eu vou contratar outro detetive. Não é possível que ela
tenha sumido assim sem deixar rastros. — Ele faz uma pausa antes
de continuar. — Tudo o que quero é trazê-la de volta pra casa.
Só pelo tom de sua voz, sei que Nando está chorando. Por
minha culpa. Sem querer, parti o coração do único homem que amo
de verdade.

— Eu posso lhe indicar outro. Também quero encontrar


minha sobrinha. Meu detetive está procurando por ela — Alonzo diz,
fingindo preocupação.
Sem aguentar ouvir mais uma palavra, me levanto e corro de
volta para meu quarto, tranco a porta e me encolho no chão ao lado
da cama, encostando meus joelhos no peito.
Eu quero que tudo isso acabe! Quero voltar para casa.
Fecho os olhos e as lembranças daquele dia voltam à minha
mente. Da última vez que o vi. Pego meu celular e entro no perfil
falso que criei só para poder acompanhar minha família e ver como
estão. Entro no perfil de Nando.
"Eu não sei onde você está, nem o que está passando, mas
se estiver vendo isso, só quero lhe pedir que volte pra mim. Volte
pra casa.”
Continuo a rolar a tela e ler uma por uma as publicações.
"Sinto que estou morrendo um pouco a cada dia sem você."
"Eu queria voltar no tempo, no dia que nos amamos pela
última vez, pra grudar em você e não te deixar partir."
"Estou te esperando. Se puder, volte o quanto antes e me
devolva a alegria de viver."
"Saudade de acordar e ver seu sorriso"
Bloqueio a tela do celular. Uma ânsia sobe até minha
garganta e corro para o banheiro e coloco para fora as poucas
coisas que havia comido. Essa é minha rotina diária nos últimos
dias. Um médico de confiança de meu tio veio me examinar e disse
que não tenho nada fisicamente, que é tudo da minha cabeça e dos
meus sentimentos. Já fiz teste de gravidez e felizmente não estou
grávida. Escovo os dentes e volto para a cama. Abraço o
travesseiro. A voz de Nando ecoa em minha cabeça várias e várias
vezes e sinto que vou enlouquecer. Eu preciso falar com ele ou ouvir
mais um pouco sua voz. Não aguento mais.
Decidida, pego meu celular, vou nas configurações e coloco
como restrito. E com as mãos trêmulas, digito seu número e espero
para ouvir a voz do dono dos meus pensamentos.
Me sinto nervosa só de pensar em ouvi-lo falando comigo.
Será que é uma boa ideia? Eu não vou passar nenhuma
informação, só quero ouvir sua voz, conversar um pouco. No
segundo toque, Nando atende.
— Alô. — Um longo silêncio se faz. — Alô? Aurora, é você?
— As lágrimas voltam a cair. Ouvi-lo chamando meu nome desse
jeito desesperado aperta meu peito. Um soluço escapa e não resta
dúvidas de que agora Nando sabe quem sou. — Meu amor, fala
comigo. Eu preciso tanto ouvir sua voz. Eu sinto sua falta.

— Nando... — Minha voz falha. Ouço ele suspirar.


— Baby, onde você está? — pergunta, com a voz
embargada. — Eu vou te buscar. Seja qual for o problema, eu
resolvo. Te protejo com minha vida, se for preciso.

— Não posso, Nando. Estou fazendo isso pra manter vocês


seguros.
— Aurora, esses dias longe de você estão sendo os piores da
minha vida. Não existe Nando sem Aurora.
Ouvir isso faz meu coração se partir em vários pedacinhos.
— E nem Aurora sem Nando — digo baixinho em meio aos
soluços.
— Eu te amo. Me diz onde está, eu imploro.
Batidas fortes soam na porta e ouço meu tio chamando meu
nome. E na hora me dá um medo de Nando ouvi-lo. Eu coloquei
tudo em risco. Encerro a ligação no mesmo instante, limpo as
lágrimas e vou até a porta. Estava falando aos sussurros, não tem
como ele ter ouvido do lado de fora. Assim que abro, meu tio entra
como um furacão.
— Não deveria ter ligado pra ele! — Ele segura meu braço
com força, o rosto furioso. Ele nunca havia me tratado assim. — Eu
tento te salvar e você estraga tudo, Aurora. Você saiu de lá pra
mantê-los seguros, eu pensei que você tivesse noção da gravidade
do que está acontecendo. Estou colocando minha vida e a da minha
família em risco pra te manter a salvo — grita.
— Tio, você está me machucando. — Parece que só ao me
ouvir ele percebe o que está fazendo e me solta, afastando-se de
mim. Subo na cama e me encosto na cabeceira. Olho para o meu
braço e vejo a marca vermelha em minha pele. — Como sabia que
estava falando com Fernando?

Ele se senta na cama e, aparentemente mais calmo, tenta


segurar minha mão, mas me afasto.
— Aurora, eu não vou te machucar, me desculpa. Perdi o
controle. É que as coisas andam difíceis. Santoro é mais poderoso
que eu e já está nesse mundo há anos. Eu não sou nada
comparado a ele. A única coisa que temos ao nosso lado é o
dinheiro. Estou contratando seguranças experientes e bem
recomendados. — Meu tio solta um longo suspiro a passa a mão
pelo rosto. — Até um matador de aluguel contratei, mas, pra minha
infelicidade, ele foi pego pelo pessoal de Santoro. E você pode
imaginar o que aconteceu com ele. Não sei como souberam dele,
mas todos os planos que fazemos fracassam, como se ele já
conhecesse cada um deles antes de ser colocado em ação. Temos
que ficar atentos. Eu mudei a minha vida e da minha família só pra
te manter segura. Prometo não perder mais o controle, mas terei
que levar seu celular.
Ele se levanta, pega o aparelho de cima da cômoda e vai até
a porta. E quando o vejo levando-o, me bate um desespero. Como
vou saber como anda minha família?

— Não, por favor. — Me levanto e vou até ele. Paro na sua


frente e agarro sua mão. — Prometo não ligar mais pra ele, não
ligarei pra ninguém. Essa foi a primeira e última vez. Me desculpa,
tio, eu fui burra. Não vai acontecer novamente.
— Sinto muito, querida, isso é para o seu próprio bem. Tudo
o que estou fazendo é pra te manter em segurança até pegarmos
aquele bandido. — Meu tio beija minha testa.

— Tio, por favor?


Sem dar mais uma palavra, ele se retira do quarto e fecha a
porta atrás dele. Volto para a cama e abraço o travesseiro. Eu não
devia ter ligado para Nando. Se ele ouviu a voz do meu tio, virá
atrás de mim e vai se colocar em perigo. Meu tio tem razão, passei
tanto tempo tentando ser forte para colocar tudo a perder agora. Se
algo acontecer com ele ou com meus pais por minha culpa, não vou
me perdoar.

Acordo e pouso a mão ao meu lado na cama, e mais uma vez


sinto aquele vazio tomar meu peito. O mesmo vazio que sinto toda
noite antes de dormir. Eu queria que tudo isso fosse um grande
pesadelo. Queria acordar e ter Aurora aqui em meus braços. Poder
dizer o quanto a amo e ouvir sua voz, tocar seu corpo, ver aqueles
lindos olhos azuis brilharem para mim. Sinto falta de tudo
relacionado a ela. Os dias se arrastam sem Aurora aqui. Para mim,
parece que se passaram anos.
Eu só quero saber onde ela está e se está bem. Algo dentro
de mim me diz que ela está em perigo, que está precisando de mim.
Eu só quero uma pista, uma direção para seguir. Encaro o teto com
lágrimas rolando pelo rosto e nem sei como ainda consigo chorar.

Tudo o que o detetive conseguiu até agora foi a gravação


dela saindo de casa e entrando em um carro preto, com a placa
clonada. No vídeo, ela encarava a porta de nossa casa, e imagino
como foi difícil para ela ir embora. No começo fomos até atrás de
Henry para saber se ele estava envolvido, mas o coitado entrou em
pânico assim que nos viu. Fiz questão de verificar toda a sua casa
só para ter certeza de que ela não estava lá. Vasculhamos a cidade
toda tentando encontrá-la. Até Dulce foi ao México na casa de
Alonzo e nada.
Minha mãe nem dorme mais direito e meu pai, assim como
eu, tenta de toda maneira encontrá-la. Meu pai disse que devíamos
contratar um detetive chamado Ivan, mas ficamos sabendo que
agora ele está trabalhando fora do Brasil e só retornará daqui a
alguns meses. Mesmo Aurora deixando no bilhete que estava indo
por vontade própria, algo dentro de mim está me alertando. Ela foi
forçada, algo a obrigou a ir embora.
Tomado pelo desespero, decido ligar para Alonzo pela
terceira vez nessa semana. E enquanto falamos, em mais uma de
nossas conversas breves, acabo chorando. Ao encerrar a ligação,
volto para a cama e cruzo os braços sobre o rosto. Minha cabeça
parece que vai explodir.
Ao ouvir meu celular tocar, pego-o rapidamente e vejo que
não aparece o número. Uma pontada de esperança toma meu
corpo. Com as mãos trêmulas, deslizo o dedo pela tela e aceito a
ligação. Meu coração parece que vai sair do peito, pois logo de cara
reconheço o som de sua respiração. Eu quero ouvir sua voz.
Quando Aurora soluça, é como se alguém tivesse enfiado um
punhal no meu peito. Nesse momento sinto que tenho forças para
enfrentar o que for pra tê-la de volta.
Nossa conversa não demora muito, mas ouvir sua voz após
todo esse tempo me faz bem. Eu só quero que Aurora me diga onde
está que irei buscá-la, mas ela se nega a me contar. Antes de ela
finalizar a ligação, ouço batidas e alguém chamando por ela. Essa
voz... Apesar de ter escutado bem baixo, tenho certeza de já ter
ouvido antes. Eu preciso me concentrar e trazer Aurora para casa
custe o que custar.
Já anoiteceu e eu continuo no quarto. Após chorar mais um
pouco, preocupada com o que aquela ligação pode causar, consegui
tirar um cochilo. Nem tomei café da tarde e o que almocei foram
duas bananas e uma maçã. Minha barriga ronca alto e coloco a mão
sobre ela. Se tudo tivesse sido diferente, era para ter uma
barriguinha aqui. Às vezes não entendemos o porquê de as coisas
acontecerem, mas agora vejo que se estivesse grávida nesse
momento da minha vida, tudo seria ainda mais difícil.
Encaro o teto, tentando descobrir como meu tio sabia que eu
estava falando com Nando. Será que meu celular tem uma escuta
ou algo do tipo? A barriga ronca mais uma vez e me forço a levantar
e ir até a cozinha procurar algo para comer. Saio do quarto e não
ouço nada além dos meus passos. As portas dos quartos estão
fechadas e acredito eu que devam ter saído.

Desço as escadas com calma, me segurando no corrimão.


Minhas pernas estão fracas. E quando estou chegando no último
degrau, elas cedem. Mas antes que meu corpo encontre o chão,
sinto alguém me segurar.
— Você está bem? — Juan me coloca de pé. — Você está
pálida, Aurora. Comeu alguma coisa hoje?
— Sim. Minha pressão deve ter caído. Obrigada por me
ajudar. — Sorrio.

— Imagina. Estava fazendo a ronda pela casa. Sua família


saiu pra um evento e vai chegar tarde, então pediram pra que eu
ficasse de olho em você. Não em você exatamente — ele se corrige,
coçando a nuca. — Na sua segurança. Vamos à cozinha que eu
preparo algo pra você comer. Os empregados já foram dispensados.
— Não precisa, eu me viro. — Minha barriga faz mais um
barulho constrangedor e olho para Juan sem jeito. Ele sorri.

— Não seja orgulhosa. Sei fazer um delicioso taco e tenho


certeza que você vai gostar. — Juan me oferece o braço. — Só
amizade, Aurora. Eu sei que você já tem alguém. Pode ficar
tranquila.
Assinto.

Entrelaço meu braço no dele e vamos até a cozinha, e lá me


sento à mesa e Juan vai até a geladeira. Enquanto ele separa as
coisas, me vejo perdida em pensamentos encarando minha aliança.
Será que isso já está para acabar? Meu tio disse que todos os
planos estão dando errado. Será que tem alguém passando
informações para Santoro? Não, acho que ele saberia ou ao menos
desconfiaria. Não sei por quanto tempo fico assim. Só volto à
realidade quando um prato com dois belos tacos é colocado na
minha frente, junto com um copo de suco.
— Obrigada, parece estar delicioso — digo, sentindo minha
boca salivar.

Juan sorri e se senta à minha frente. Começo a comer e não


demoro para terminar. Estava muito gostoso. Fazia tempo que não
comia com tanta vontade. Quando olho para Juan, vejo que está
sorrindo.
— Está sujo aqui. — Com o guardanapo, ele limpa o canto de
meus lábios. Sorrio sem jeito. — É uma receita secreta de família.
Minha mãe que me ensinou.
Vejo o brilho em seu olhar ao falar da família e no mesmo
instante penso na minha, em como sinto falta deles. Manu também
faz tanta comida gostosa. Sempre fomos fãs de seus sanduíches.
Lembro de quantos ela já fez quando Nando e eu éramos pequenos.
Ele sempre pedia para ela tirar as rebarbas dos pães de forma, e
Manu com toda paciência tirava. Até que começou a entregar para
ele já sem. Uma lágrima solitária rola, e com o polegar Juan a
enxuga.

— Eu só quero voltar pra casa. Ver minha família, meu amor.


É muito difícil. Eu sabia que demoraria, mas não imaginei que seria
tanto assim. — Um longo silêncio se estende — Hoje eu liguei para
Nando.
Juan me olha surpreso.

— Você falou com ele?


— Pouca coisa. Foi tão bom ouvir sua voz. Em todo o
momento eu chorei. Foi a primeira vez que conversamos desde que
saí de casa. — Juan segura minha mão sobre a mesa. — O mais
estranho foi que meu tio chegou lá na hora. Não sei se Nando ouviu
sua voz. Não sei nem como ele sabia o que estava acontecendo.

— Você tem que tomar cuidado, Aurora. Não coloque sua


vida em risco. — Juan se levanta e leva o prato e o copo até a pia e
começa a lavar.
— Eu sei. Não dei nenhuma informação. E coloquei número
restrito. Foi a primeira vez que usei o celular que meu tio me deu pra
fazer ligação. Antes só usava pra mexer em minhas redes sociais.
Mas agora meu tio pegou de volta e estou incomunicável. — Dou de
ombros.

— Sinto muito.
Me levanto e vou até Juan, que está ao lado da pia. Apesar
de tantas coisas ruins, estou feliz por ter conhecido ele. Juan é uma
pessoa boa, e quando voltar para casa vou sentir falta de sua
companhia.
— Obrigada por sua amizade e por sempre se preocupar
comigo.
— Imagina. Amigos são pra essas coisas.
Fico na ponta dos pés e beijo sua bochecha. Juan sorri para
mim.
— Boa noite, milady.
— Boa noite, Juan.
Subo para meu quarto, separo algumas folhas e começo a
fazer a única coisa que me distrai. Desenhar. Olho para o relógio e
já é quase meia-noite. Escuto batidas na porta e Vic entra com uma
xícara de chá na mão.
— Oi, vim trazer seu cházinho. — Sorri.
— Entre. Sente-se um pouco. — Bato com a mão ao meu
lado.
Vic me entrega a xícara e o delicioso aroma do chá invade
minhas narinas. Todas as noites ela me traz a bebida, cujos cheiro e
sabor são diferentes de todos os que já provei e senti antes. Ela me
diz que mistura algumas ervas.
— Não vou perguntar como você está, porque sei que não
gosta.
Balanço a cabeça, concordando. Tomo um pouco do chá e
agradeço mentalmente por ela me conhecer.
— Vic, posso te perguntar uma coisa? E você me promete
falar a verdade?
— Claro. O que é?
— Como seu pai sabia que estava no telefone e falando com
Nando? — Vic desvia o olhar. — Você prometeu.

— Tudo bem. Meu pai sabia que você poderia usar o telefone
pra falar com eles, então deixou grampeado. Ele te deu esse voto
de confiança, Aurora, você não deveria ter feito aquilo. Lembra
como foi difícil convencê-lo a deixar você ficar com um celular?
— Lembro. É que estou com tanta saudade de casa e de
Nando... Você não imagina como é ficar tanto tempo longe de quem
amamos. — Tomo mais um pouco de chá.

— Estou há anos longe da pessoa que mais amava no


mundo. — Sinto meu peito se apertar com seu comentário. Por um
momento, esqueci do que aconteceu com sua mãe. — Eu queria ter
minha mãe ao meu lado. Eu tive que crescer sem ela, graças a seu
pai. — Sinto um pouco de rispidez em sua voz, mas não a culpo. A
morte de sua mãe é culpa de Miguel.
— Eu sinto muito, prima. — Seguro sua mão.
— Tudo bem, agora tome todo o seu chá. Amanhã estaremos
só nós duas em casa. Meu pai e Silvana vão a uma cidade vizinha,
atrás de um homem. Não sei direito. É sobre essas coisas erradas
que ele faz agora. — Vic solta um suspiro.
Me sinto um pouco culpada. Se não fosse por mim, meu tio
não teria entrado nessa vida. Se bem que a culpa é de Miguel. Se
não fosse um monstro, nada disso teria acontecido. Não posso me
culpar por algo que meu pai foi o responsável. Eu não posso pagar
por seus pecados. Tomo o restante do chá e lhe entrego a xícara.

— Amanhã podemos ficar um pouco na piscina, o que você


acha? Podemos tirar um tempo pra descansar. Comer algumas
besteirinhas. Vai ser divertido — ela sugere.
— Não estou no pique.
— Aurora, durante todo esse tempo que está aqui, nunca
aceitou ir na piscina comigo. Só fica nesse quarto. Vamos aproveitar
o verão. Se continuar assim, quando voltar pra casa estará doente.
Você quer voltar debilitada ou saudável? Quer que Nando te veja
assim?
Vic tem razão. Eu preciso começar a me cuidar, me alimentar
direito. Não quero que nem Nando, nem nossos pais me vejam
assim. Quero voltar para casa do mesmo jeito que saí. Só peço aos
céus para que não demore para acontecer. Sinto que estou ficando
louca longe da minha família.
— Tudo bem, amanhã podemos passar um tempinho na
piscina.
Animada, Vic me dá um beijo na bochecha.

— Obrigada, prima. Prometo que será muito divertido. — Um


grande sorriso se forma em seu rosto. — Até amanhã.
— Até amanhã.

Começo a juntar minhas coisas e coloco meu estojo e meus


desenhos no guarda-roupa. Daqui a pouco terei que pedir a meu tio
para comprar mais folhas de sulfite. De repente, sinto meu
estômago embrulhar e corro até o banheiro, colocando tudo para
fora. Um mal-estar toma todo o meu corpo e eu torço para estar
melhor amanhã, para que possa passar um tempo com Vic como
combinamos. Será que voltando a me alimentar bem isso irá
passará? Espero que sim.
Vic e eu tomamos café da manhã juntas enquanto
conversamos. Apesar de ter dito que iria me alimentar melhor,
quanto mais eu como, mais me sinto mal. Será que isso é mesmo
emocional? Como o máximo que consigo e subimos para nossos
quartos para colocarmos nossas roupas de banho. Tenho algumas
que ela me presenteou, mas nunca usei. Visto um biquíni preto e me
olho no espelho. Não consigo me reconhecer. Meu corpo está tão
diferente. Teria vergonha de ficar sem roupa na frente de Nando
estando desse jeito, com os ossos dos ombros e da cintura tão
visíveis. Embaraçada com minha imagem, visto uma saída-de-praia
por cima.
— Vamos, prima? — pergunta Vic, entrando no banheiro.

Olho para ela e vejo a perfeição em pessoa. Seu corpo está


lindo em um biquíni vermelho com detalhes dourados, e vendo mais
uma vez meu reflexo no espelho, um peso parece cair sobre os
meus ombros.
— Vamos, já estou pronta. — Forço um sorriso.

Não sei se vou entrar na água ou ao menos tirar essa saída-


de-praia, mas, juntas, vamos até a área da piscina e Vic corre para
se jogar nela. Eu apenas me sento na beirada e deixo meus pés
tocarem a água. O sol já está forte, aquecendo todo o meu corpo e
refletindo em Vic, que mais parece uma sereia nadando.
— Você viu Juan? — pergunto a ela quando para ao meu
lado.
— Ele está de folga hoje. Já está sentindo saudade dele? —
Vic ergue as sobrancelhas.
— Claro, ele é meu amigo. Ele me lembra Mari e é tão
divertido e engraçado que consegue me animar com facilidade —
me defendo, e então suspiro. — Sinto tanta saudade da minha
amiga. Será que ela também está sentindo a minha? — Encaro o
céu.
— Você teria coragem de ficar com ele? — Ela sai da água e
se senta ao meu lado.
— Claro que não! — Olho para Vic indignada com essa
pergunta. — Nunca trairia Nando. Ele é o amor da minha vida, só
tenho olhos pra ele e mais ninguém. E você, tem algum namorado?
Ou gosta de alguém?

É estranho estar aqui há tanto tempo e Vic nunca ter falado


de algum homem. Eu já falei tanto de Nando para ela.
— Estou saindo com uma pessoa. Só não posso falar pra
você quem é.

— Por quê? — Cruzo meus braços. — Pensei que


compartilhávamos segredos uma com a outra. Ele é algum bandido?
Vic ri.
— Não vou falar sobre ele. É um segredo meu. Mas posso te
dizer que o amo e que ele também me ama. Em breve pretendo me
mudar dessa casa e iremos morar juntos. — Um sorriso se forma
em seu rosto.
— Isso é bom. Espero que seja muito feliz,
independentemente de quem seja. Por que nunca vejo você com
amigos?
— Você está bem comunicativa hoje. — Apenas dou de
ombros. — Tenho alguns colegas, mas nenhum amigo de verdade.
Quer dizer, meu único amigo é o meu amor. E pra mim está bom.
— Claro que meu amigo mais íntimo é Nando, que também é
meu amor, mas ainda tenho Mari, Adam e Íris. Fora meus pais. —
Balanço meus pés na água. — Não vejo a hora de reencontrar todos
eles.
— Você é tão sortuda. — Não sei se é impressão minha ou
se o tom de sua voz saiu mesmo com uma falsa simpatia. — Tem
uma vida tão perfeita. Bem melhor que a minha. — Vic sorri. Deve
ser impressão mesmo.

— Tinha uma vida perfeita. — Solto uma lufada de ar. — Se


não fosse tudo isso, estaria em minha casa com meu Nando que já
seria meu marido. — Ergo minha mão onde está minha aliança e
admiro a pequena pedra brilhante. Não vejo a hora de trocar esse
solitário por uma aliança de ouro. — Também estaria cuidando da
minha loja e fazendo minha marca de roupa ficar ainda mais
conhecida. Espero que a loja ainda esteja bombando. Estaria com
meu pai, que é o melhor do mundo e com minhas mães. As duas
são bem diferentes, mas amo elas por igual.
Sem falar nada, Vic volta para a água. Ela passa um bom
tempo sem olhar em minha direção, em silêncio. Será que a ofendi
falando da minha família? Não disse nada para jogar na sua cara ou
algo do tipo, jamais faria isso. Eu gosto dela e não a magoaria de
propósito. Seu silêncio e sua indiferença me fazem ficar
desanimada. Decido voltar para dentro da casa, mas quando me
levanto, um estrondo me assusta. Olho em volta e vejo os
seguranças correndo em direção ao portão principal.

— Vic, está acontecendo alguma coisa.


Ela sai da água, se seca e veste a saída-de-praia que está
em cima da espreguiçadeira. Quando escuto o som de tiros, sinto o
pânico tomar conta do meu corpo. Eu sei que estão aqui para me
pegar.
— Isso foi tiro, Aurora! — Ela me olha assustada. — Vamos
entrar.
Segurando minha mão, Vic me leva para dentro da casa. O
medo é tanto que não consigo respirar direito. Nos trancamos em
seu quarto e ficamos abaixadas ao lado da cama. Minhas mãos
estão tremendo e não sei o que Santoro vai fazer comigo se
conseguir me pegar. Fecho meus olhos e tapo meus ouvidos com as
mãos quando o barulho se intensifica.
— Eu não quero morrer. Não quero morrer — repito a mesma
coisa várias vezes.
Ouço batidas na porta e olho para Vic desesperada. Ela se
levanta.
— Não abra, Vic! — peço, sentindo o pânico em cada
pedacinho do meu corpo.

— Aurora, um bandido não bateria na porta. — Ela a


destranca.
Me encolho e envolvo meus braços em volta dos joelhos.
Minha respiração está tão irregular que parece que corri uma
maratona. A porta é aberta e vejo Martin, o chefe da segurança.
Nunca fui com a cara dele e ele também nunca fez questão de ser
simpático comigo, e com as várias cicatrizes em seu rosto, ele
parece muito sombrio.

— A casa está sendo invadida, precisamos sair daqui agora


— diz em um tom firme.
— Vamos, Aurora. — Vic estende a mão em minha direção.
— Temos que fugir. — Encaro sua mão. — Você quer fugir ou deixar
o pessoal de Santoro te pegar?
Me levanto e seguro sua mão. Começamos a seguir Martin
pelo corredor da mansão, e mais barulhos de tiros me fazem gritar.
Vic aperta minha mão e Martin segue com a arma em punho.
— Vamos sair pela porta da cozinha. Ela fica próximo a
garagem e sairemos pelo portão dos fundos. Eles ainda estão na
entrada principal.
— Você tem certeza que isso dará certo? — pergunto.
— Eu sei o que faço, menina — responde rude.

Ao sairmos pela porta da cozinha, um homem encapuzado


aparece na nossa frente com uma arma na mão e Martin no mesmo
instante o atinge na perna e o homem cai gritando. Corremos até o
carro mais próximo. Martin o destrava e entramos rapidamente.
Mais barulhos de tiro ecoam.
— Vocês duas se deitem aí no banco de trás. Só se levantem
quando eu mandar — ordena ele.

Vic e eu nos abaixamos e eu fecho os olhos, pedindo para


isso acabar logo de uma vez. O barulho vai ficando para trás, mas
continuamos abaixadas, obedecendo às ordens de Martin. Não sei
quantos minutos se passam até o carro enfim ser estacionado.
Respiro aliviada. Devemos ter chegado em um lugar seguro.
— Podem descer.

Nos levantamos e eu olho em volta. Parece que estamos


dentro da garagem de uma casa. Será um dos imóveis do meu tio?
Saímos e eu fico parada ao lado da porta.
— Onde estamos, Vic? — Estou apreensiva. Algo dentro de
mim está em alerta. Os dois ficam de pé perto de uma porta de
madeira que creio dar acesso a casa. — Vic, onde estamos? —
Minhas mãos voltam a tremer. Não estou gostando do jeito que os
dois estão me olhando.
A porta é aberta e homens encapuzados entram, com armas
na mão. Não é o pessoal do meu tio. Se fosse, não estariam
cobrindo o rosto para não serem reconhecidos. Meus olhos se
enchem de lágrimas quando vejo o homem que parece ser o líder
entrando com um sorriso diabólico no rosto. E então o reconheço.
— Olá, Aurora.
— Santoro — sussurro, sem controlar as lágrimas.
Chegou meu fim.
Minha mente está a mil e meu coração partido em dois. Estou
sentada em uma cadeira dentro da casa e minhas mãos estão
amarradas com uma corda, assim como meus pés. O meu pior
pesadelo se tornou realidade. Eu fui traída por alguém que confiava.
Pensei que minha prima queria me proteger como meu tio, mas
estava completamente enganada.
— Por que fez isso comigo? — pergunto a Vic, que continua
a me encarar. As lágrimas não param de cair. — Pensei que éramos
amigas.

— Você acha que iria ser tão idiota quanto meu pai? Ele
protegeu a filha do homem que causou a morte de minha mãe! —
Sua voz é puro ódio.
— Não faz sentido você estar ao lado do homem que a
assassinou. — Meu olhar vai diretamente para Santoro, que está
com os braços cruzados encostado em uma parede, observando
tudo.

— Eu sei. Não tem como mudar o passado, mas a partir do


momento que meu pai me colocou em perigo pra proteger você,
decidi que me juntaria ao meu inimigo pra me vingar — ela diz tudo
com uma calma. Nem parece que está fazendo algo errado. — De
você e dele. Dois coelhos com uma cajadada só! — Ela se aproxima
de mim e vejo o ódio em seus olhos. Ela soube disfarçar muito bem.
— Eu adorei te ver sofrer dia após dia. Te ver definhar na minha
frente. Sabe como é crescer sem uma mãe? Claro que não sabe.
Você teve Manuela do seu lado e depois Dulce. Enquanto eu não
tenho nenhuma, você tem duas. Que ironia.
Eu nunca senti tanta mágoa vindo de uma pessoa como
estou sentindo agora. Vic respira fundo.

— Aí vai meu pai e arrisca tudo pra te manter segura. Aquele


idiota, burro. Colocou você acima de mim! — Sua voz se altera. —
Eu coloquei uma câmera em seu quarto, e era tão divertido te ver
chorar noite após noite. Te ver desabar no chão quando estava
fraca. — Ela sorri, o que faz meu peito doer e um soluço escapar. —
Meu pai se sente culpado por não ter conseguido tirar seu maldito
pai do mundo do crime. E por você, que merecia morrer, ele entrou
nesse mundo que tanto odeia. Tudo pra ele ficou mais difícil, você
não imagina como. Ele não está acostumado com essa vida, ele não
nasceu pra isso. Seu maldito pai sim nasceu pra ser um bandido
sem escrúpulos. Mas meu pai não. Meu pai é um homem bom
fazendo coisas ruins. — Vic limpa as lágrimas — Mas agora chegou
sua hora. Hora de pagar por tudo.
— Eu nunca fiz mal a vocês! Estava seguindo minha vida em
paz. Eu não tenho culpa pelo que meu pai fez. Pelo amor de Deus,
me deixa voltar pra casa — imploro.

— Você se perguntou várias vezes por que estava passando


mal ultimamente, não é? Aquele chá que levava pra você todas as
noites tinha uma coisinha especial. Cortesia de Santoro. — Ela
aponta para o homem carrancudo. — Além de vingança, vamos
ganhar um bom dinheiro.
— Falando em dinheiro, a mala está ali no canto. — Aponta
Santoro. — Quatro milhões. Acho que é o bastante pra vocês
fugirem juntos.
Martin segura a mão de Vic e só então eu percebo que estão
juntos. Era dele que ela estava falando. Que nojo! Minha barriga
está revirando tanto que sinto vontade de vomitar. Inclino minha
cabeça para o lado e coloco tudo para fora.
— Que nojo! — grita minha prima.

Santoro vem até mim e sinto meu rosto arder com a força de
seu tapa.
— Você sujou minha casa, vadia! — Segurando meu rosto
com força, me encara. — Você tem ideia do que senti quando minha
filha contou as coisas horríveis que seu pai fez com ela? Minha
inocente menina violentada por um homem que considerava meu
amigo. — Ele me desfere outro tapa e eu fecho os olhos, implorando
para acordar desse pesadelo.

— Eu não tive culpa — digo. — Por favor, me deixa ir


embora!
Santoro ignora meu pedido e se afasta.

— Infelizmente, Dulce chegou mais rápido e conseguiu


acabar com Miguel primeiro. Eu queria tanto ter feito aquele homem
sofrer até seu último suspiro. Minha filha sofreu nas mãos de seu pai
e você sofrerá nas minhas. Quando soube de sua existência, meu
coração se encheu de felicidade. Enfim teria minha vingança. Matar
a esposa de Alonzo não foi o suficiente pra mim — diz friamente,
sem se importar com a garota ali. Vejo Vic engolir em seco.
— Nos já vamos indo. Tem um jatinho nos esperando —
Martin diz, puxando Vic para seus braços, provavelmente sabendo
que a machuca ouvir essas palavras.

— Vic, por favor! — grito.


— Esperem — diz Santoro. — Quero dar uma coisa a vocês
antes de irem embora.
— Não precisa se preocupar — Vic diz, apertando a mão de
seu namorado. Os dois parecem nervosos.
— Faço questão. — Santoro sorri e, no segundo seguinte,
dispara dois tiros, um em cada.

Em choque, encaro os corpos caídos no chão e, mais uma


vez, me pergunto porque Vic fez isso. Ela assinou sua própria
sentença
— Levem os corpos e jogue em frente a casa de Alonzo. Ele
vai aprender a não tentar competir comigo.
Os homens começam a arrastar os corpos como se fossem
sacos de lixo. E apesar de tudo, me sinto mal por ela. Pouco tempo
atrás, estávamos rindo na piscina e agora Vic está morta e logo
serei a próxima. Quando estamos a sós, olho para Santoro e vejo
tanto ódio em seus olhos negros que me assusta ainda mais.
— O que vai fazer comigo? — pergunto com um fiapo de voz.

— Estou decidindo, mas tenho certeza que não será nada


bom... Pra você. — Um sorriso medonho se forma em seu rosto. —
Tem que ser algo que te faça sofrer e querer morrer. Um tiro seria
fácil e rápido demais.
Sinto o ar me faltar. A incerteza do que está por vir faz meu
coração doer.
— Você tem uma filha. Se fosse o contrário, gostaria que ela
pagasse pelas consequências de algo que não fez?
Ele me golpeia mais uma vez, com fúria, e o sangue se
espalha pela minha boca.
— Nunca mais fale da minha filha! — Para a minha surpresa,
seus olhos se enchem de lágrimas não derramadas. — Depois da
violência que sofreu, ela entrou em depressão profunda, e nada que
fiz pôde trazê-la de volta. Ela se suicidou. Por causa do maldito do
seu pai! — Ele aperta meu pescoço.
— Pare, por favor — digo com dificuldade. — Por favor. — E
só quando estou prestes a desmaiar, ele me solta e sinto a
respiração arranhar para sair.
— Vou te levar ao seu novo quarto — ele diz. — Se tentar
fugir, você morre na hora. A casa pode parecer vazia aqui dentro,
mas lá fora está rodeada por meus homens. — Ele segura meu
braço com força e me leva até um cômodo onde há somente um
colchonete. — Aqui está, todo decorado do jeito que você merece.
— Com brutalidade, me joga no chão.
Passo a mão sobre meu pulso, onde uma marca vermelha se
formou. Assim que Santoro sai, vou desesperada até a porta e
começo a bater nela sem parar.
— Me deixa ir embora, por favor! — Fico ali até não ter mais
voz. E já esgotada, me deito no colchonete. É tão fino que parece
que estou deitada no chão. — Quero minha casa. Quero minha
família. Quero meu Nando — murmuro para o nada.

Não sei quanto tempo se passa, mas estou com fome, sede e
frio. Que mal eu fiz na vida para merecer isso? Escuto o barulho da
porta sendo destrancada e me sento, com medo do que pode
acontecer. Quando a porta é aberta, Santoro entra com uma
bandeja.
— Coma! Não quero que morra... ainda.
A bandeja é colocada no chão. E nela há um pão e um copo
com água. Penso em não comer, mas sei que irei desmaiar se fizer
isso. Santoro vai até uma porta no canto do quarto e a destranca.
— Aqui é o banheiro. Sem espelhos, sem janelas nem nada
que possa te ajudar a fugir ou a se matar. — Santoro se aproxima e
passa a mão em minha bochecha. Me distancio. — Será que
deveria fazer com você o mesmo que seu pai fez com minha filha?
— Sinto meu corpo tremer só de imaginar esse homem me tocando.
Balanço a cabeça com lágrimas nos olhos. — Acho que iria me
divertir. Pagaria na mesma moeda. — Sua mão se enrola em meu
cabelo.
— Não... Não faça isso, por favor. Eu imploro.

Seu sorriso se alarga. Ele solta meu cabelo.


— Só queria ver o pânico em seus olhos. Não vou fazer isso.
Por enquanto. — Ele pega a bandeja. — Amanhã eu volto. Não
fique com saudade.
Me levanto e corro para o banheiro. Jogo água no rosto, e
quando passo a mão nos lábios, posso sentir que está inchado.
Fecho os olhos e só consigo chorar sem parar. Volto para o
colchonete e me encolho, envolvendo meus braços nos joelhos.
Está frio aqui e não tem nenhum cobertor. À noite meus dentes
começam a bater, o que só aumenta a dor no lábio cortado. Não
consigo dormir, com os pensamentos permeados pelas coisas que
Santoro pode fazer comigo. E o único segundo em que tenho paz é
quando imagino o rosto de Nando. Seu sorriso. É ele que me dá
combustível pra aguentar tudo que estou vivendo.

A porta é aberta e uma mulher com os cabelos loiros presos


em um coque e vestida com roupas sociais impecáveis entra com
uma bandeja enorme de comida.
— Bom dia, eu sou Yolanda. Você tem que comer tudo.
Santoro quer que ganhe corpo, que fique mais forte — diz, seu
sotaque quase imperceptível, e coloca a bandeja no chão.
Olho para ela confusa.

— Pra quê?
— Para o leilão que irá acontecer daqui a uma semana. —
Yolanda me observa com curiosidade. — Você é mesmo muito
bonita, apesar desse ferimento na boca e de estar magra demais.
Também tem marcas em seu pescoço. — Levo a mão até ele e me
lembro de Santoro o apertando. — Acho que será preciso duas
semanas até você estar perfeita.
— Ele vai me levar ao leilão pra que eu o acompanhe? —
Não estou entendendo nada.

A loira ri como se tivesse contado uma piada.


— Você irá participar do leilão. Será um leilão de garotas —
diz com naturalidade, como se não fosse a coisa mais absurda.
— Quê?! Vai haver um leilão de mulheres? Ele vai me
vender?
Ele vai fazer o mesmo que Vic tentou fazer. Vai me trocar por
dinheiro. Deus, o que eu faço agora?
Eu não quero acreditar que serei vendida como uma peça de
roupa, como um objeto qualquer. Isso é desumano. Eu nunca mais
verei minha família, nunca voltarei para casa.
— Esses leilões arrecadam milhões. E você com toda essa
beleza vai chamar muita atenção, então coma. — Yolanda começa a
avaliar as próprias unhas.
— Não consigo. — Minha garganta realmente parece estar
fechada.
— Garota, é melhor você começar a comer. Ou quer que ele
venha aqui te obrigar? Ele não será tão paciente como eu. Essas
marcas que deixou em você não são nada comparadas ao que
gosta de fazer. Você o pegou de bom-humor.

Se aquele era o bom-humor dele, nem quero saber como é


de mau-humor. Me forço a comer o que a mulher trouxe enquanto
penso que irá me vender a um estranho que fará o que quiser
comigo e com meu corpo. Sem perceber, estou mais uma vez
chorando.
— Não seja dramática! — Yolanda revira os olhos. — Na
melhor das hipóteses, você será o brinquedo sexual de algum
bilionário. Na pior, será o brinquedo de vários. — Ela sorri.
— Como você consegue ser tão ruim assim? Mulheres não
são mercadorias pra estarem em um leilão. Você também é mulher
e compactua com isso. Não entendo!

— Se você começar a me dar sermão, irei deixar mais


marcas em seu belo rosto — fala com uma frieza que me faz
arrepiar.
Abaixo minha cabeça e continuo me forçando a comer. Não
quero apanhar de mais ninguém. Assim que termino, sinto meu
estômago embrulhar e a comida tentar voltar.
— Se vomitar, farei você comer de novo. Você que sabe. —
Me concentro na respiração, tentando me acalmar. Logo a ânsia
passa. — Boa menina. Mais tarde eu volto com mais comida e
produtos pra higiene pessoal. — Yolanda pega a bandeja, me olha
novamente dos pés a cabeça e sorri. — Realmente vale um bom
dinheiro.
Quando a porta é fechada, corro para o banheiro e coloco
tudo para fora. Aquela droga que Vic me dava com certeza ainda
está em meu organismo. Sentada no chão, fecho os olhos. Eu não
sei mais o que fazer. Tudo que quero nesse momento é morrer.

Ontem Santoro veio até meu quarto ver como estava. E


quando pedi que me deixasse ir embora e voltar para minha família,
ele me deu um chute tão forte que ainda sinto minha coxa latejar. Eu
não sei mais o que faço. Sinto que vou ficar louca! As ânsias
finalmente pararam e acho que o efeito do chá drogado finalmente
passou. Yolanda continua me trazendo comida três vezes ao dia,
durante esses dois dias que passei aqui. Presa nesse quarto, não
consigo saber que horas são, e não tenho nem acesso a luz solar.
Me baseio apenas nos momentos em que ela traz a comida.
Ouço a porta ser destrancada, mas acabei de tomar café
então sei que não é ela. Corro até o canto do quarto e fico ali
abaixada.

— Aurora! Trouxe uma amiguinha pra te fazer companhia. —


Santoro entra arrastando uma garota pelo cabelo.
— Por favor, me leva de volta — diz ela, chorando.

Ela é bonita, com a pele negra e o cabelo volumoso e


cacheado. Seus olhos estão vermelhos de tanto chorar. Me
pergunto a história dessa garota e como veio parar aqui.
— Cala a boca! Já estou ficando irritado. — Ele a joga no
colchonete, e fico observando a cena horrorizada com tal
brutalidade. — Você é muito bonita. Ela não é bonita, Aurora? —
Não respondo e Santoro se vira para mim. — Está surda, porra?! —
Continuo calada. Santoro saca a arma e aponta para a cabeça dela.
— Tem certeza que não vai responder?

— Sim... Ela é bonita, muito bonita. Por favor, guarde a arma


— peço, tentando não irritá-lo.
Ele coloca a arma na cintura e volta seu olhar para a moça
que chora sem parar. Segurando seu cabelo, ele a faz ficar
ajoelhada na sua frente.

— Não tão bonita quanto você, Aurora. Você ainda é minha


favorita, vai me render muito dinheiro. Mas essa vadiazinha dá pro
gasto. Você é virgem? Diga a verdade, não se atreva a mentir pra
mim. — A garota balança a cabeça, negando. — Que pena, valeria
mais se fosse. Vocês duas estão com sorte, não posso ficar muito
tempo aqui. Tenho que ir para Cancun ainda hoje. Não sintam minha
falta. Eu volto logo.
Ele sai batendo a porta com força. Dou graças a Deus por
não estarmos mais em sua presença.
— Qual é seu nome? — pergunta a moça.
— É Aurora. E o seu?

— Rosa. — Ela se aproxima. — Você também foi levada de


casa após o pessoal de Santoro matar sua família?
Essa pergunta me atinge em cheio. Foi isso o que fizeram
com ela? Mataram a família e depois a levaram? Não consigo
imaginar o tamanho de sua dor.

— Não, fui entregue a ele por minha falecida prima. —


Seguro sua mão. — Sinto muito por sua família.
— Obrigada. Sinto muito por você estar aqui e por sua prima.
Você sabe o que vão fazer com a gente? Não entendi direito o que
ele quis dizer com aquelas coisas.
— Vão nos vender em um leilão — sussurro.

Dulce e eu estamos no carro em frente a entrada da grande


mansão de Alonzo. Eu não contei aos nossos pais sobre minha
suspeita porque minha mãe está sofrendo demais e não quis lhe dar
falsas esperanças.
— Você tem certeza que a voz que ouviu era a dele? —
pergunta Dulce, avaliando o local.
— Sim, fiquei dois dias tentando me lembrar de onde
conhecia a voz. Tenho certeza.
Estou nervoso só de pensar que Aurora está ali dentro. Que
estou tão perto dela.
— Eu vim aqui na casa dele assim que Aurora se foi.
Vasculhei a casa e nada — diz Dulce.
— Alonzo pode ter imaginado que você faria isso e a
escondeu em outro lugar. Só não sei por que estão fazendo isso.
Mas chegou a hora de descobrirmos — digo com firmeza e Dulce
assente.
Descemos do carro e vamos até o portão. Dulce toca o
interfone e logo um segurança abre e nos permite entrar.
— Da primeira vez que vim aqui, havia vários seguranças,
agora está tão vazio — comenta Dulce.

Somos levados para sala, onde encontramos Alonzo e sua


esposa. Ele está um caco, parece arrasado e suas olheiras estão
evidentes sob os olhos.
— Cadê Aurora? — pergunto rispidamente.
Dulce segura meu braço, tentando me acalmar.
— Alonzo, Nando recebeu uma ligação em que teve certeza
de que era minha filha, e antes de desligar, ele ouviu sua voz. Vou
lhe perguntar só uma vez e espero que fale a verdade: minha filha
está aqui?
Alonzo se encosta no sofá e nos encara.
— Não, ela não está aqui — responde desanimado.
— Eu não acredito! Eu vou procurá-la. — Começo a andar
pelo cômodo.
— Fique à vontade — diz ele, apontando para a casa.
— Vou ver lá em cima. Você olha aqui embaixo.
Dulce assente.
Subo correndo as escadas e começo a olhar cada quarto,
não deixo passar nada. Antes de entrar no último cômodo do andar,
respiro fundo, pois já estou entrando em desespero. Estava certo de
que Aurora estava aqui. Ao entrar no quarto que está com a porta
entreaberta, consigo sentir o seu cheiro. Fecho os olhos e o inspiro.
O cheiro da minha Aurora faz meu coração acelerar e meus olhos
ficarem marejados.
— Aurora, você está aqui?! Meu amor, eu vim te buscar! —
Vou até a porta do banheiro, que está fechada. Ela deve estar ali.
Bato na porta. — Baby, você está aí? — Giro a maçaneta e entro no
cômodo. Vazio. Ela esteve aqui, eu tenho certeza.

Vou até o guarda-roupa e assim que abro a porta, algumas


folhas caem no chão e me abaixo para pegá-las. São desenhos
dela. Estão diferentes, mas ainda reconheço seus traços e sua
assinatura neles. Segurando as folhas, desço furioso até a sala.
— Nada aqui embaixo — diz Dulce assim que me vê.

Passo por ela e vou até Alonzo, que continua sentado. Jogo
as folhas nele. Alonzo olha para elas com tristeza e o seguro pelo
colarinho para levantá-lo.
— Cadê Aurora, porra?! — grito.
— Cadê minha filha, Alonzo? Você mentiu. Quando vim aqui,
disse que não sabia de nada. Você a escondeu por todo esse
tempo. Por quê? — A voz de Dulce se altera.
Seu olhar vai de Dulce para mim. Ele olha para minha mão,
que o segura com força.
— Me solte, Fernando, ou não digo nada.
Contra minha vontade, solto Alonzo e o jogo de volta no sofá.
Passo a mão pelo cabelo, tentando controlar a raiva.
— Pode começar a falar — Dulce diz, se sentando à sua
frente.
— Eu estava tentando protegê-la. — Olho para ele totalmente
confuso. — Vou explicar a vocês com todos os detalhes o que
aconteceu.
Concordo e me sento ao lado de Dulce. E a cada informação
que Alonzo nos dá, meu peito dói mais e mais. Tudo desaba quando
ele conta sobre a traição de sua filha e seu homem de confiança.
Eles entregaram minha Aurora a um traficante e, apesar de já terem
pago a dívida com a própria vida, ainda assim sinto um ódio mortal
por eles. Não consigo conter a raiva e vou para cima de Alonzo, e
ele não faz nada para se defender.
— Você não teve capacidade de protegê-la, seu maldito. Se
tivesse nos avisado, eu moveria céus e terra pra manter meu amor a
salvo. — Minha mão se suja de sangue quando outro soco atinge
sua boca.
— Você está machucando ele, Fernando! — grita Silvana,
tentando me segurar.

— Você não vai se intrometer. — Vejo Dulce segurar seu


braço e girá-lo para trás, imobilizando Silvana. — Você quer ver tudo
o que aprendi dentro da cadeia? — A mulher então se afasta. — Foi
o que imaginei.
Olho de volta para Alonzo e em seu olhar posso ver que está
tão destruído por dentro quanto por fora. Eu recuo.

— Eu juro que tentei fazer o melhor por ela. Eu amo minha


sobrinha e nunca imaginei que minha filha iria se aliar ao homem
que matou sua mãe. E que no fim a matou. — Abaixa a cabeça e
deixa as lágrimas caírem. — Nenhuma palavra no mundo vai
expressar a dor que estou sentindo. Fernando, esses machucados
que fez em mim agora não são nada comparados a como estou por
dentro. Se quiser me matar, não irei impedir.
— Não vou carregar sua morte em minhas costas. Você teria
ajudado mais se tivesse contado a nós o que estava acontecendo.
Aurora é inocente e foi manipulada por você. — Começo a caminhar
até a porta.
— Fernando, ele é muito poderoso. Não sei nem se Aurora
ainda está viva.

Essas palavras me atingem em cheio e meu peito dói tanto


que parece estar sendo rasgado.
— Ela está! Eu sei que está. Você é um covarde. — Seguro a
mão de Dulce e volto a andar.

— Aonde vamos?
— Salvar minha Aurora.
Esses dias têm sido um tormento. Não consigo dormir direito,
minha cabeça só foca em Aurora e em tudo o que pode estar
passando. Dia após dia, sinto meu peito sendo rasgado cada vez
mais por não saber o que aquele bandido está fazendo com ela, se
ela está se alimentando. Só de pensar em meu amor com fome ou
frio, sinto o ar faltar em meus pulmões. Sei que ela é uma mulher
forte, e estou pedindo aos céus para aguentar um pouco mais e se
manter firme até ser resgatada. Eu vou salvar minha Aurora, não
importa o que tenha que fazer e a quem tenha que enfrentar. Ela vai
voltar para casa nem que seja a última coisa que eu faça.
Dulce descobriu por fontes seguras que Aurora está viva e
que Santoro irá vendê-la em breve em um de seus leilões. E desde
que descobrimos isso, nosso plano de resgate teve início.
Pego as lentes de contato e as ponho. No começo era
estranho usá-las e me irritavam muito, mas me forcei a ficar com
elas durante um bom tempo até me acostumar, para que meus
olhos não fiquem vermelhos ou lacrimejando. Devem parecer
naturais. Você tem que ser frio, calculista, indiferente e,
principalmente, se sentir superior a qualquer um; as palavras de
Ivan ecoam na minha cabeça. Esse tem que ser o meu novo eu
enquanto estivermos entre eles.
Dulce já me disse tantas coisas horríveis sobre esse Santoro
que já sinto um pavor de imaginá-lo tocando Aurora, agredindo-a ou
tentando... Aperto o mármore frio da pia, fecho os olhos e abaixo a
cabeça.

— Respira, Nando. — Dulce toca meu ombro. — Trouxe a


maquininha. Vamos cortar seu cabelo antes de você e Ivan irem.
Eu assinto e me sento na cadeira que há aqui. Dulce está me
ajudando a manter a sanidade. Aurora depende de nós e eu tenho
um papel muito importante a cumprir. Não posso fraquejar agora.
Tento limpar minha mente e me concentrar no papel que irei
interpretar hoje. Lembro que na escola nunca gostei de participar de
peças de teatro nem nada do tipo, já Aurora sempre gostou de
mostrar os vários talentos que tem. Eu sinto tanto sua falta, de seu
cheiro, sua voz. Sinto falta de tudo sobre ela.
Estamos a caminho do primeiro leilão que irei participar e
estou nervoso, muito nervoso. Tenho medo de fazer algo errado e
de perceberem que não sou o homem que disse ser. Apesar de ter
conversado várias vezes com Dulce e Ivan sobre como devo agir e
falar, ainda assim bate uma insegurança. Penso nas várias
mulheres que estarão lá e na liberdade que foi roubada delas, nas
famílias que devem estar sofrendo assim como nós. Mulheres sendo
vendidas como se fossem objetos, e não seres humanos com
sentimentos e sonhos que não serão concretizados.
— Vai dar tudo certo. — Ivan me olha pelo retrovisor.

— Assim espero. — Olho para a máscara preta em minha


mão. — Tudo que quero é levar Aurora de volta pra casa sã e salva.
— E você vai conseguir. O plano está bem elaborado e todos
estamos dando nosso melhor. Você só precisa se lembrar de tudo o
que conversamos. — Volto minha atenção a ele. — Hoje, como será
sua primeira participação, eles irão ficar de olho em cada movimento
seu, até em sua respiração. Todas as cabines têm câmeras, por isso
não fale comigo como amigo, me trate como seu subordinado. Não
se preocupe em ser grosseiro, não levarei nada para o lado pessoal.
A partir do momento em que entrarmos naquele lugar, seremos
pessoas totalmente diferentes. — Aperto a máscara em minha mão.
Ser uma pessoa diferente é o que me preocupa. Mas não posso
falhar. Esse é o primeiro passo para trazer minha Aurora de volta. —
Eles não vacilam, Fernando. Você tem que parecer tranquilo e
confiante, como se já participasse disso há muito tempo.
— Acho que o mais difícil pra mim será ignorar as moças que
estão lá. Queria poder salvar cada uma delas. — Passo a mão no
rosto, sentindo que a partir de hoje não serei mais o mesmo. Estou
dando um passo em direção a escuridão e a um mundo totalmente
novo no qual nenhuma vida tem valor; tudo o que importa é o
dinheiro. — Quantas garotas irei comprar essa noite? — Só de dizer
a palavra comprar, sinto um gosto amargo na boca.

— Você pode dar lance em duas. Sei que parece errado o


que vou dizer, mas estamos aqui com um objetivo. Você terá que
avaliar cada uma delas como se fosse realmente uma mercadoria.
Encontre a mais bela e que tenha mais curvas. Essas seriam as
mulheres que Eros levaria para suas festas particulares. — Assinto.
— Só a taxa de participação nesse leilão foi de dois milhões, por
isso é fácil perceber que só terá pessoas de poder. Você poderá dar
bons lances, mas sempre em garotas que Eros escolheria. As
melhores, por assim dizer, sempre ficam para o final. Elas têm um
tratamento diferente. Geralmente são as mais belas, as joias
preciosas dos traficantes. — Nesse momento penso em Aurora.
Será que ele irá tratá-la assim? Se ela for sua "joia", ele não irá
machucá-la. — Essas são sempre as mais caras. Os lances são
altos e um quer mostrar que pode mais que o outro.
— Entendi. Pode ficar tranquilo que irei seguir suas ordens.

Já próximos ao endereço, coloco minha máscara e Ivan a


dele. Minha roupa é a mais cara que encontramos, toda preta para
combinar com a máscara que só mostra meus olhos. A partir do
momento em que me visto assim, eu me transformo em Eros. Ele é
um homem de poder, de muito dinheiro e de uma grande arrogância.
Ele não se importa com nada e nem ninguém.
Ivan é o primeiro a sair do carro e após um tempo de
conversa com um dos funcionários da casa, abre a porta do
passageiro e eu saio de cabeça erguida, sem olhar para os lados e
muito menos para meros empregados. Chegou a hora de encenar.
Irei fazer isso por você, minha Aurora.

Somos guiados até uma pequena sala toda preta, com uma
parede de espelho que vai do teto ao chão. Me sento na grande
poltrona que está virada para ela e Ivan fica de pé atrás de mim, em
silêncio. Uma luz é ligada, revelando que atrás desse vidro há uma
espécie de octógono bem iluminado. Um homem logo aparece ali no
centro. Ele usa uma bela máscara de ouro e o microfone em sua
mão parece ser do mesmo material.
Após um discurso que faz meu estômago embrulhar, uma
mulher entra na sala usando apenas uma lingerie vermelha
combinando com a máscara. Ela me entrega um tablet que deve
custar os olhos da cara e eu seguro seu queixo e a olho dos pés a
cabeça, como se realmente tivesse me interessado por ela. Um
grande sorriso se forma em seu rosto quando a solto e o leilão
começa. Uma música baixa e sensual começa a tocar e uma mulher
é levada até o centro. Consigo ver o pânico e o desespero em seus
olhos. Ela parece estar perdida, meio desnorteada, provavelmente
drogada. As mulheres mudam, mas o olhar é sempre o mesmo. Me
mantenho calmo, mas por dentro me sinto quase doente, em
remorso por não poder ajudar todas elas. A única coisa boa é que
irei salvar ao menos duas.

No tablet acompanho todos os lances que estão dando. A


primeira mulher que escolho está sendo bem disputada e vejo que
os lances por ela estão subindo rápido. Ela é muito bonita e a roupa
vermelha pareceu chamar mais atenção. Meu último lance é na
última. Ela é a joia da noite, como disse Ivan. Foi uma disputa
acirrada, mas Eros não aceita derrota. O que ele quer, ele
consegue. Me levanto ao ouvir batidas na porta e dois homens
entram segurando os braços das mulheres que "comprei". Eles as
fazem se ajoelhar aos meus pés. Me aproximo das duas e seguro
um queixo em cada mão, sufocando a tristeza ao ver o medo
estampado em seus rostos.

— Soy Eros, su dueño[1].


Rosa está dormindo ao meu lado, dividindo o colchonete
comigo e nos mantendo fracamente aquecidas com a coberta que
Yolanda trouxe. Durante esses dias que se passaram, nos
aproximamos mais, aproveitando nossos últimos momentos de paz
antes do pesadelo recomeçar. Felizmente não vimos Santoro nos
últimos dias. Fiquei com tanto medo dele querer terminar o que
começou aquele dia. Nós tivemos sorte.
Me sento e encaro minhas coxas. Eu ganhei bastante peso,
como eles queriam, e meu corpo enfim voltou ao que era antes.
Yolanda nos faz comer sempre no mesmo horário e com fartura. E
as manchas e machucados também sumiram. Ela estava cuidando
disso também, o que significa que Santoro pode nos levar ao leilão
a qualquer momento. Ele ficou furioso por ter que adiar alguns dias
por causa dos meus machucados.

— Aurora, eu não quero ser leiloada — Rosa sussurra. —


Não quero ser escrava de ninguém. Não quero um estranho tocando
meu corpo.
Me deito ao seu lado e a abraço, tentando acalmá-la mesmo
estando com medo.
— Eu também não quero isso. Nós vamos dar um jeito,
vamos tentar fugir e pedir ajuda. Nós vamos conseguir. Não perca a
esperança.
Eu não sei se estou dizendo isso para convencê-la ou
convencer a mim mesma. Não sei qual será nosso destino. Só um
milagre para nos salvar. Queria acordar desse pesadelo, olhar para
o lado e ver Nando deitado sorrindo para mim. Me pergunto como
ele deve estar agora. Só de pensar que há uma grande
possibilidade de não vê-lo mais, nem a minha família...

A porta é aberta com força, nos assustando, e Rosa e eu nos


sentamos rapidamente. Santoro entra acompanhado de Yolanda.
— Boa tarde, minhas preciosas. — O sorriso em seu rosto
me causa medo. — Vocês acreditariam se dissesse que alguns dos
nossos clientes já viram as fotos de vocês e já querem fazer um
lance? — Eu estremeço. — Eu sabia que vocês me renderiam um
bom dinheiro. — Santoro vem em minha direção e segura meu
queixo. — Aquelas fotos em sua rede social renderam vários
elogios.
Na hora me lembro das fotos que Mari tirou para jogarmos na
cara de Henry o que ele estava perdendo. Aquele problema não era
nada comparado com isso.
— Sabe, Aurora, toda vez que te vejo, sinto uma vontade
enorme de te dar uma surra até ver seu corpinho lindo — sua mão
desce até meu seio e eu arregalo os olhos e tento recuar, mas já
estou encostada na parede — estirado no chão, coberto de sangue.
Eu queria te ver engasgando com ele e morrendo sufocada —
sussurra. — Mas isso seria muito fácil. — Santoro se afasta e solto
a respiração que estava presa. — Essa vingança, apesar de
prazerosa, não iria te causar muito sofrimento. Então, estou
pensando em avaliar muito bem quem será seu comprador. Levarei
em conta não somente o dinheiro que vai pagar, mas também sua
reputação. Eu quero que você sofra até seu último suspiro. Também
pensei em trazer seu noivo e ir cortando ele na sua frente
O pânico que sinto é indescritível e tento afastar essa
imagem da cabeça.
— Não! Por favor, não faz nada com ele. Você já tem a mim.
Ele não tem nada a ver com o que aconteceu.

Santoro ri do meu desespero.


— E tem Manuela e Dulce. Vic disse que você tem duas
mães. Eu poderia fazer tantas coisas com as duas. Eu sei que Dulce
é uma puta safada, será que Manuela também é? — Posso ver
malícia em seu olhar.

— Você tem a mim, porra! — grito e sinto a mão de Rosa


segurar a minha. Ela me olha assustada, como se me pedisse para
ficar quieta. — Deixe-os em paz. Você já tem a mim. Por favor, eu
faço o que você quiser.
Vejo a satisfação em seus olhos ao me ver implorar. Um
homem entra no quarto com uma cadeira e a coloca na frente de
Santoro, e ele se senta. Yolanda, como uma boa cadelinha, fica ali
do seu lado.

— Qualquer coisa? — Santoro bate o dedo no queixo e sorri.


— Meus sapatos não estão muito limpos. — Ele olha para os pés.
Seu sapato preto social está impecável. — Pode limpá-los, minha
preciosa.
Vou andando até ele e me ajoelho aos seus pés.

— Limpar com o quê? — pergunto ainda sem entender.


Santoro se curva para a frente, segurando meu rosto.
— Com a língua! — ele diz e Yolanda ri. — Faça isso que
pouparei sua família. E pode ter certeza de que não volto atrás
quando dou minha palavra.
Me abaixo e com lágrimas nos olhos, faço o que me manda.
Escuto as gargalhadas dos dois ecoarem pelo cômodo e sua mão
se enrola em meu cabelo, me fazendo ficar ajoelhada novamente.
— Eu não ia te contar, mas fiquei sabendo que um homem de
muito poder chamado Eros está querendo você. Fontes confiáveis
me disseram que ele já comprou quatro mulheres na última semana.
— Aquele sorriso sombrio se forma em seu rosto. — Só que elas já
estão mortas.
Olho para ele assustada.
— Ele as compra pra matar depois? — pergunta Rosa.

— Vou lhe explicar, Rosa. Me disseram que Eros gosta de


dar festas para os amigos. E nessas festas o prato principal são as
mulheres, se é que me entende. — Santoro pisca — Muitas delas
não sobrevivem nem até o final, então são substituídas. Eu espero,
Aurora, que você aguente pelo menos algumas horas. — Ele me
joga no chão e se levanta, e Yolanda pega a cadeira. — Adorei
visitar vocês. Já estava com saudades. — Os dois se viram para a
porta. — Já ia esquecendo, o leilão é amanhã à noite.
Quando os dois saem, me encosto na parede com as
lágrimas caindo sem parar. Nesse momento eu tenho a certeza de
que irei morrer. Para mim não existe saída. Rosa para na minha
frente, me abraça e chora junto comigo. Eu só queria ter a chance
de me despedir de todos que amo. Eu daria minha vida por eles, e é
isso que irá acontecer. Após minha partida, minha família viverá em
paz, pois Santoro enfim conseguirá concluir sua vingança. Esse é o
único consolo que sinto.
Não percebo que adormeci no chão, no colo de Rosa, até
despertar horas depois com o som da porta sendo aberta. É
Yolanda trazendo o nosso jantar e Rosa e eu comemos em total
silêncio. Quando terminamos, ela se retira sem falar nada, e, de
mãos dadas, nos encostamos na parede.
— Qual é seu maior arrependimento, Rosa? — pergunto
baixinho.
Acho que quando você está próximo da morte, essas
perguntas vêm à cabeça.
— Não ter falado para os meus pais o quanto eu os amava.
Estava brigada com eles porque não queriam me deixar namorar. A
última coisa que disse a eles era que os odiava e que eram os
piores pais do mundo. — Já estou chorando e Rosa também. — E
isso era mentira. Eles eram os melhores. O garoto com quem queria
namorar não leva uma vida honesta, por isso implicavam com ele.
Mas agora, depois de viver tudo isso, eu vejo o quanto estavam
certos. E você?

— O maior arrependimento é ter vindo pra essa cidade, e


também ter afastado meus pais quando sofri o acidente. Eu poderia
ter aproveitado aquele tempo com eles.
Passei dias sem falar com meus pais e agora daria de tudo
para vê-los novamente. Só queria ouvir a doce voz da Manu, a
firmeza na voz de Dulce e o tom brincalhão de Caio. Sorrio em meio
às lágrimas.
— Obrigada, Rosa, por sua amizade. Seria bem mais difícil
passar por tudo isso sozinha. Espero realmente que você consiga
ajuda. Vou orar para o homem que te levar não te fazer mal. Pra
você conseguir fugir na primeira oportunidade e enfim conseguir ser
livre novamente.
Rosa me olha, e posso ver que isso é o que ela também está
pedindo em suas orações.

Essa noite não dormimos, ficamos em claro. Nenhuma das


duas consegue fechar os olhos por nenhum segundo. Penso tantas
vezes em pedir a Rosa para acabar com minha vida, mas não tenho
coragem. Ela não irá carregar esse fardo por minha causa,
independentemente de quanto tempo viva. A porta é aberta, e pelos
passos de salto alto já sei que é Yolanda.
— Vocês estão horríveis! Cheias de olheiras e com os olhos
inchados. Sorte que o leilão é só à noite, dá tempo de dar um jeito
na cara de vocês.

Rosa e eu não fazemos questão de responder, nem ao


menos de olhar para ela. Só quando ouvimos mais passos, olhamos
para a porta, onde está Santoro.
— Vamos! Tem um pessoal esperando pra dar um jeito nessa
aparência horrível de vocês. Não tem como entregar o produto
assim, todo estragado — diz.

Nos levantamos e vamos até ele. Somos conduzidas até um


salão enorme, com outras quatro garotas que parecem tão abatidas
quanto nós. Os olhares delas estão distantes, parecendo sem vida.
Há pessoas cuidando de seus cabelos, unhas e roupas.
— Eu só trabalho com produtos de qualidade, Aurora. Você
realmente achou que pagariam milhões por mulheres sujas e
fedendo? — Fico em silêncio. Um homem vem até nós com um
copo de água e dois comprimidos na mão. — Peguem cada uma um
e engulam. — Olho para Santoro. — Agora!
Fazemos o que manda logo começo a sentir que meu corpo
está diferente. Minha cabeça parece mais leve e as coisas ao meu
redor ganham novas cores. Me pego rindo mesmo sem motivo.
— Isso, Aurora, quero ver você sorrindo pra nossos
compradores. — Ouço a voz de Santoro, mas parece estar longe. —
Podem levar as duas e começar os preparativos, quero que Eros se
encante por ela assim que a vir essa noite.
O efeito da droga enfim está passando. Olho para o meu
reflexo no espelho e nem me reconheço. Me vestiram em um
vestido vermelho muito curto e justo, que marca demais o meu
corpo. A maquiagem, mesmo que profissional, é exagerada. E em
meus pés há um par de scarpins pretos. Meus cabelos estão soltos
com cachos, e até minhas unhas estão pintadas de vermelho.
Em minha mente só vem recortes de memória. Sei que me
deram banho e me depilaram inteira. Estou mesmo parecendo uma
acompanhante de luxo, uma boneca prestes a ser entregue ao seu
dono. Levo a mão ao rosto, querendo borrar esse maldito batom
vermelho, mas sou impedida quando seguraram meu pulso com
força.

— Nem pense nisso. — Olho para o lado e vejo o demônio


me encarando com os olhos brilhando. — Você está perfeita. Espero
mesmo que esse tal de Eros dê um bom lance por você. Você
sofrerá o que minha filha sofreu e ainda receberei um bom dinheiro.
Sou um gênio!
Olho em volta procurando por Rosa e a encontro a algumas
cadeiras de distância, vestida como eu, só que de amarelo, o que
destaca mais a sua pele negra. Em minha mente só consigo pedir
para que ela tenha mais sorte que eu. Continuo olhando ao redor,
vendo todas as outras meninas vestidas com roupas idênticas, mas
de cores diferentes.
— Vamos levá-las. Daqui a pouco os clientes já começam a
chegar — Santoro diz aos empregados, então se vira para mim. —
Hoje estou sentindo que a noite vai render.
Todas nós somos levadas até uma van, mas antes que possa
entrar, Santoro segura meu braço.
— Você vai comigo em meu carro. Tenho que ficar de olho
em minha galinha dos ovos de ouro.

Rosa segura minha mão por um breve momento e vejo o


medo estampado em seus olhos. Me pergunto se os meus também
estão assim. Tudo que consigo fazer é gesticular um “boa sorte”
com os lábios antes de Santoro me puxar. Ele fica ao meu lado no
banco de trás e dois seguranças na frente, e posso ver um carro na
escolta. A cada segundo que passa, sinto que estou cada vez mais
perto do fim. Cada semáforo que passamos é como se desse um
passo em direção à morte. Sinto minhas mãos suarem.
— Você conhece os compradores? — pergunto sem olhar em
seus olhos.

— Não, todos mantém a identidade em sigilo. Homens com


muito dinheiro não querem o nome relacionado com esse tipo de
coisa. A maioria são empresários ou herdeiros de grande família.
Assim como Eros. Até o nome eles mudam. Usam pseudônimos.
Mas todos são investigados pra saber se não são da polícia ou algo
do tipo. Então fique tranquila que não vai aparecer ninguém pra te
salvar. — Um sorriso se forma em seu rosto.
Fico olhando pela janela. Se pudesse voltar atrás, teria feito
tantas coisas diferentes. Teria falado mais eu te amos, teria
perdoado mais, teria vivido mais aventuras. Só de pensar que não
vou nem chegar a me casar com Nando, que não vamos ter nosso
time de futebol, me dá um aperto no coração. É como se alguém
estivesse enfiando a mão aqui dentro do meu peito e o arrancando
comigo ainda viva.
Ficamos um bom tempo na estrada, em meio ao nada, até o
carro entrar em uma enorme mansão, tão grande que se perde de
vista. A van já está aqui e as meninas descem escoltadas por seus
capangas. Ao sairmos, vejo Yolanda vindo até nós com aquele
sorriso cínico. Como uma mulher pode compactuar com isso? Eu
nunca vou entender.

— Aí está nossa grande estrela da noite. — Seu olhar vai dos


meus pés ao meu cabelo. — Ainda estou impressionada com o
resultado.
— Agora vamos. — Segurando meu braço, Santoro me leva
até uma minúscula sala, onde há somente uma cadeira. — Você vai
ficar aqui até chegar sua vez. Você será a última. Iremos fechar a
noite com chave de ouro. — Ele se abaixa e olha fixamente em
meus olhos. — Espero que você sofra até seu último suspiro. Que
cada segundo de dor se prorrogue o máximo possível, que você
peça a morte e ela não venha te buscar.
Cada palavra que sai da sua boca é como ácido tocando
minha pele. Engulo o choro e devolvo o olhar.
— Vai se foder! — digo com toda raiva reprimida que
acumulei durante esses dias. Eu sei que ele não me machucará,
não nesse momento.

Rindo, Santoro sai da sala e fecha a porta. E logo posso ouvir


sua voz lá fora. Parece estar falando em um microfone.
— Queridos clientes e amigos, essa noite será especial.
Temos uma grande variedade de moças, algumas até virgens. Não
vou me prolongar mais. Divirtam-se e não se esqueçam que o
melhor sempre fica pro final.
Após isso, não ouço mais nada. Está um silêncio tão grande
que poderia ouvir uma agulha caindo no chão. Bato meu pé no chão
sem parar. Tudo começa a piorar e vem a sensação de engasgo,
tontura, náusea e falta de ar. Eu sei que estou tendo um ataque de
pânico. Parece que as paredes estão se fechando contra mim. Não
tento me acalmar, só peço para meu coração parar logo de vez e
me poupar do que está por vir. O ataque passa e eu continuo a
respirar. Levo um susto quando ouço a porta se abrir.
— Chegou a hora — diz Yolanda.
Me nego a me levantar e ao seu sinal, o homem que está ao
lado da porta entra e segurando meu braço, começa a me arrastar
por um corredor escuro. Uma porta é aberta e sou empurrada para
dentro da sala bem iluminada. Olho em volta e só vejo espelhos.
Meu coração está muito acelerado. A sala tem um formato de
octógono e em cada parede há um pequeno letreiro digital. Escuto a
voz de Santoro novamente.
— Como prometido, aqui está a nossa preferida. Aurora
Alves. Vinte e três anos de pura beleza. Podem ver que ela é mais
bela pessoalmente do que pelas fotos. Então, senhores, podem
começar os lances!
Os letreiros começaram a piscar. Eu não consigo
acompanhar, é muito rápido. Só olho de um para o outro assustada.
Os valores vão aumentando cada vez mais. Então param. Olho para
o letreiro, onde o número 60.000.000,00 pisca. A porta é aberta e o
rapaz que me levou até lá segura meu braço e começa a me
arrastar novamente. Yolanda está lá fora esperando.
— Você bateu o recorde da casa! Santoro deve estar muito
feliz. Ainda mais que o maior valor foi dado por Eros.

Uma lágrima desliza do canto dos meus olhos. Será que essa
é minha última noite viva? Paramos em frente a uma porta.
— Seu novo dono está lá dentro — diz ela, segurando a
maçaneta da porta.
Sou empurrada para dentro e me deparo com dois homens.
Um está sentado e o outro de pé ao lado da porta. Os dois estão
vestidos de preto, com luvas e usam máscaras, o que me
impossibilita de ver seus rostos. Só consigo ver os olhos castanhos
do homem que está sentado na cadeira, como se fosse seu trono.
Esse deve ser o maldito Eros. Nenhum deles se move por um bom
tempo. Então o homem se levanta e vem em minha direção. Cada
passo que ele dá faz meu medo aumentar. Ele parece irradiar poder.
Me encosto na porta, ofegante. Seu rosto se aproxima do meu e
desvio o olhar e viro o rosto.
— Oi, baby, estava com saudade? — pergunta baixinho.
Me falta o ar quando eu o encaro. Será que estou delirando?
Estou de pé em frente a cama encarando a roupa de Eros.
Está tudo impecável como sempre. Acho que essa é a única coisa
que temos em comum. No começo, foi difícil me acostumar com
essa personalidade; Eros é tão diferente de mim, no jeito de agir e
de pensar... Eu realmente mudo quando coloco essa roupa e essa
máscara. Mas tudo isso tem um propósito: trazer Aurora de volta
para nós. Estamos cem por cento empenhados nisso. Sei que ainda
faltam algumas horas para ir ao meu último leilão e resgatar minha
mulher, mas já estou preparado para dar o maior lance possível.
Não deixarei nenhum outro sequer pensar que terá chance de levá-
la para casa. Ela voltará conosco amanhã. Não irei decepcionar
minha família, muito menos a mulher que amo.
Não sei se Santoro já falou de Eros para Aurora. Dulce disse
que ele não iria perder a oportunidade de fazer uma tortura
psicológica com ela, que ele gosta desses joguinhos. Minha Aurora
sempre foi tão doce e gentil. Sei que voltará diferente para casa e
que tudo isso deixará marcas nela, assim como deixará em mim,
mas não me importo. Quero Aurora de volta à minha vida, e irei
ajudá-la a passar por tudo isso. Estarei ao seu lado. Ela terá todo o
apoio de nossa família, que tanto a ama.
Ela deve estar apavorada achando que irá parar nas mãos de
um homem cruel e sem escrúpulos. Mal sabe que irá voltar para
mim, para os braços do homem que a ama e que faria qualquer
coisa por ela. A fama de Eros não demorou para se espalhar, graças
aos leilões que fui e também a ajuda de Dulce. Tivemos que
inventar uma história bem convincente. O medo que as mulheres
me olham quando me veem se transforma em gratidão todas as
vezes em que dizemos a elas que estão livres. Claro que não deixo
que vejam meu rosto nem o de Ivan, mas gosto de dar a notícia
pessoalmente, e a única coisa que peço em troca é que não
comentem nada do que aconteceu. Esses momentos se tornaram
meus favoritos nesses últimos dias. São os únicos em que me
permito sentir um pouco de felicidade.
— Eu vou sim, Caio — diz Dulce enquanto entra no meu
quarto. — Nando, diga a eles que irei junto.

Logo meus pais, Ivan e Ricardo entram também e percebo


que todos estão com os ânimos exaltados.
— É muito perigoso — Ivan diz.
— Se Dulce for, eu também vou. — Minha mãe cruza os
braços e meu pai passa a mão no rosto, que está vermelho. Pelo
jeito, essa discussão já está rolando há um tempo.
— Nenhuma das duas vai — digo com firmeza, tentando
encerrar a discussão.

— Não é justo! — Dulce caminha e para na minha frente. —


Nando, quero ir com você buscar minha filha. Eu estive ao seu lado
todo esse tempo. — Seus olhos ficam marejados, o que deixa meu
coração apertado, mas não irei voltar atrás. — Por favor, me deixe ir
com você?
— Não posso, Dulce. Vocês duas ficarão aqui em segurança,
esperando.
Visivelmente irritada, ela se senta na cama com os braços
cruzados.
— Mas podemos ficar no carro esperando. Usaremos
máscara, touca e o que for preciso — insiste minha mãe.

— Princesa... — Meu pai segura seu rosto entre as mãos. —


Não vou deixar você ir a um lugar daquele. É muito arriscado. — Ele
a beija. — Manuela, se acontecer algo com você eu morro. Por
favor, fique aqui com Dulce. Nós vamos trazer nossa menina. Eu
garanto isso.
Minha atenção vai até Dulce, que está na cama encarando as
mãos. Percebo que Ivan dá um passo em sua direção, mas de
repente para e volta para onde estava. Não consigo entender e
decido ir até ela. Me sento ao seu lado e seguro sua mão.

— Dulce, eu sei que é uma mulher forte e que quer ajudar a


trazer Aurora de volta pra casa, mas saiba que você já fez muita
coisa. Se conseguimos chegar até aqui, o mérito também é seu.
Fique com minha mãe em segurança, por mim. — Dulce me olha
com carinho. — Preciso ficar concentrado, e se vocês estiverem lá
não conseguirei.
— Fernando tem razão — diz Ivan ao se aproximar. — Hoje é
tudo ou nada. Vocês ajudarão mais ficando aqui em segurança.

As duas olham de Ivan para mim e assentem. Isso me deixa


mais tranquilo. Já tenho muita coisa para me preocupar.

Fecho o último botão da camisa preta e encaro minha


aparência no espelho. É a última vez em que me transformarei em
Eros, a última vez que irei me infiltrar nesse mundo nojento e
asqueroso. Foi um caminho difícil até aqui, mas sei que faria tudo
novamente se o resultado for trazer meu amor de volta para casa.
— É estranho te ver assim. — Minha mãe me encara no
espelho. — Me acostumei a ver os olhos azuis do meu menino. —
Ela se aproxima e pega as abotoaduras de ouro que estão em cima
da cômoda. — Deixe-me te ajudar. — Estendo meus pulsos a ela.
— Essa roupa parece ter uma energia pesada. Ela te deixa sombrio.
— Isso é bom. Eros é tudo de ruim que poderia existir no
mundo.
— Por que escolheu Eros?
— No grego, o termo “Eros” significa “desejar com muito
amor”, e é o que sinto por Aurora. — Minha mãe sorri. — E Eros é o
deus grego do amor e do desejo. Ele era filho da deusa do amor,
Afrodite, um imortal de beleza inigualável. — Dou de ombros —
Achei que o nome combinaria com a arrogância dele. O nome tem
pontos que combinam comigo e com ele. — Quando ela termina, eu
agradeço e beijo sua cabeça.

— Promete pra mim que vai se cuidar? — pede, com a voz


embargada.
A envolvo em meus braços.

— Eu prometo, mãe. Vamos todos voltar pra casa juntos


amanhã. — Me afasto e limpo suas lágrimas. — Agora tenho que ir.
— Pego a máscara e as luvas de cima da cama. Falta menos de
uma hora para o leilão.
Encontramos o restante do pessoal. Meu pai, Ivan e Ricardo
já estão prontos para partir. Dou um último beijo em minha mãe e
vou até Dulce, que está se esforçando ao máximo para não chorar.
— Não se preocupe, eu juro por minha vida que vamos trazê-
la de volta. Você confia em mim? — Dulce acena com a cabeça.
Beijo sua testa, assim como fiz com minha mãe. — Até daqui a
algumas horas.
Começamos a caminhar até o elevador e seguimos até os
carros. Desta vez não terá somente um. Quero um carro grande que
caiba muita gente, e vejo que Ivan conseguiu. Vamos nós três no
carro de Eros, o que sempre usamos nos leilões, e Ricardo vai no
outro. Meu pai irá ficar como o motorista, Ivan ao seu lado e eu no
banco de trás.
— Você não nos contou o porquê de dois carros — diz meu
pai ao dar partida.
— Hoje mais cedo conversei com Alonzo por telefone e
contei minha ideia a ele. Como é ele que está bancando tudo,
precisava saber se estava de acordo. Não irei salvar somente
Aurora, hoje irei levar todas as garotas que estiverem ali. — Vejo
pelo retrovisor que os olhos de meu pai brilham em lágrimas.
— Eu tenho muito orgulho de você. — Essa simples frase me
faz ficar emocionado.

Próximo ao endereço, colocamos nossas máscaras. Esse


leilão será em uma mansão ainda maior do que as anteriores. A
rotina é seguida: Ivan sai primeiro, conversa com um dos homens e
depois abre a porta. Dou uma olhada rápida para meu pai, que
balança a cabeça como se estivesse dizendo que irei conseguir.
Cada passo para dentro desse lugar faz meu coração disparar ainda
mais. Por fora estou calmo, mas por dentro estou um turbilhão de
emoções. Irei ver meu amor daqui a poucas horas. Entro no
pequeno quadrado luxuoso e me acomodo. O centro da sala se
ilumina e ali vejo a face do homem que tanto odeio e que gostaria
de matar com minhas próprias mãos. Santoro está elegante em um
terno preto e máscara de ouro, percebi que isso é tradição entre
eles. Aperto os braços da poltrona, sentindo meu sangue ferver. Só
peço para os minutos passarem logo para finalmente poder vê-la.
— Queridos clientes e amigos, essa noite será especial.
Temos uma grande variedade de moças, algumas até virgens. — O
sorriso malicioso em seu rosto me faz cerrar os dentes, na tentativa
de conter meu ódio. — Não vou me prolongar mais. Divirtam-se e
não se esqueçam que o melhor sempre fica pro final.
Os tablets são entregues e o leilão começa. Algumas são
mais fáceis de conseguir dar o lance maior, outras dão um pouco
mais de trabalho, mas estou determinado a salvar todas. Não
importa o tanto de dinheiro que irei gastar. Alonzo concordou com
minha ideia, vamos salvar todas. Uma longa pausa é dada e minha
respiração acelera. É a vez dela, eu sinto isso. A porta é aberta e
vejo meu amor sendo jogado ali. Meu coração parece errar as
batidas. Estou com tanta saudade. Minha vontade é de me levantar
e ir até ela e tirá-la dali o mais rápido possível. Vejo o pânico em
seus olhos, e ela olha em volta com uma expressão que faz meu
coração doer. Me forço a não deixar uma lágrima sequer cair.
Preciso me manter firme. A voz de Santoro ecoa dentro do pequeno
cômodo.
— Como prometido, aqui está a nossa preferida. Aurora
Alves. Vinte e três anos de pura beleza. Podem ver que ela é mais
bela pessoalmente do que pelas fotos. Então, senhores, podem
começar os lances!
O lance maior dessa noite foi de dez milhões, então decido já
começar com quinze. Mas logo outro dá um lance maior e o
desespero bate. Aumento mais cinco e outro cobre o meu valor. Não
será tão fácil como pensei, mas não desistirei. Os lances continuam
a subir sem parar e em sessenta milhões ele para. Solto um suspiro
aliviado. Eu consegui. Olho para a frente e vejo Aurora parada ali,
encarando o que acredito ser o letreiro. Ela está tão perto. Só mais
um pouquinho e a levarei para longe deste lugar, meu amor.
Um homem entra na sala e com brutalidade segura seu braço
e começa a levá-la dali. Tento controlar a respiração, afinal, não
posso dar bandeira agora que estamos tão perto. A porta é aberta e
Aurora é empurrada para dentro da sala. Fico um bom tempo sem
conseguir me mover. Sei que se levantar agora irei fazer algo
errado. Espero meu corpo e coração se acalmarem e só então me
ponho de pé. Com passos firmes e seguros, caminho até ela. Aurora
se encosta na porta, ofegante, e posso sentir com clareza o seu
medo. Chego bem perto e ela desvia o olhar e vira o rosto. Seu
cheiro está diferente, mas mesmo assim, ainda é minha Aurora,
meu amor. Eu não deveria dizer nada, mas quero livrá-la desse
medo que está irradiando de seu corpo. Então digo baixinho:
— Oi, baby, estava com saudade?
Sinto minhas pernas cederem e as lágrimas caírem uma após
a outra. Eu não consigo acreditar que Nando está aqui na minha
frente. Mas ele não se abaixa, não me pega em seus braços. Será
que ouvi coisas? O homem continua de pé em silêncio,
completamente imóvel. Devo estar delirando. Vejo o outro homem
se abaixar.
— Há câmeras na sala. Não fale nada, ele não pode
demonstrar sentimentos. Temos que sair rápido — diz, tão baixo que
quase não consigo ouvir.

É Nando! Meu Nando está na minha frente. Mas como? Me


levanto com a ajuda do desconhecido. Eu quero abraçá-lo, tocá-lo,
mas não posso. Me pergunto se para ele também está sendo uma
tortura estar tão perto e ao mesmo tempo tão longe. Nando parece
até outra pessoa. Ele sai pela porta pisando firme e vou atrás,
puxada pelo homem que o acompanha. Eu preciso fingir que não
quero ir com eles. Passamos por alguns homens na entrada da
mansão, e um grande carro de luxo com vidros pretos está nos
esperando.
A porta é aberta e sou jogada no banco de trás com
brutalidade. O homem pede desculpas baixinho. Eu sei que isso é
tudo encenação, mas me lembro das tantas vezes que fui jogada
assim ultimamente e meu coração se aperta. Posso estar voltando
para casa, mas não sou mais a mesma. Será que Nando ainda irá
me amar com todos esses traumas que adquiri nesse pouco tempo?
Sento no banco e os dois entram em seguida. Posso ver que
até o motorista está de máscara. Quando saímos da mansão,
Nando tira a máscara. Não acredito que estou vendo ele
novamente. Seus braços me envolvem e eu choro tanto que começo
a soluçar. Nando segura meu rosto e distribui vários beijos por ele.

— Deus, eu senti tanto a sua falta. Tive tanto medo desse


plano não dar certo. — Seus lábios tocam os meus e suas lágrimas
se misturam às minhas. Me sinto vivendo novamente, não apenas
existindo. — Eu te amo, minha Aurora. Nunca mais quero ficar longe
de você. Nunca mais. — Sua mão acaricia minha bochecha — Foi
tão difícil te ver naquele lugar, saber que passou dias nas mãos
daquele bandido. Me perdoa por não ter conseguido te tirar de lá
antes, tudo teve que ser bem planejado. — Encosta sua testa na
minha e suspira — Minha vontade era invadir a casa dele e te levar
de lá, mas não seria assim fácil.
Volto a abraçá-lo e encosto minha cabeça em seu peito. Foco
no som de seus batimentos cardíacos, que estão tão acelerados
quanto os meus. Meu Nando me salvou.
— Eu pensei que nunca mais iria te ver. Me desculpa ter ido
embora, eu só queria manter vocês a salvo. Eu fui burra, Nando, fui
ingênua, mas agora aprendi a lição. — E como aprendi.
Sua mão acaricia meus cabelos. Olho para a frente, tentando
saber quem está com ele e os dois retiram as máscaras. Não
reconheço o homem que entrou com Nando, que agora está no
banco do passageiro, mas aquele que está dirigindo não tem como
confundir. Me solto dos braços de Nando e abraço o motorista do
jeito que dá.
— Oi, pai — falo com a voz embargada.
— Oi, minha pequena — Caio fala, emocionado. — Senti sua
falta.

— E eu senti a sua. Muito, muito. — Beijo sua bochecha


molhada.
Volto a me sentar e Nando me abraça novamente. Nunca
imaginei que estaria de volta em seus braços, com seu cheiro, seu
toque... Parece que fiquei sem isso por anos e não apenas meses.

— Muito prazer, Aurora, eu sou Ivan. — O homem estende a


mão e nos cumprimentamos.
Eu já ouvi esse nome, só não lembro onde. Tento puxar na
memória.

— Você que encontrou minha mãe quando Miguel a levou,


não foi?
— Sim, fui eu. — Ivan sorri — Assim que Nando soube o que
havia acontecido com você, ele foi até a Alemanha atrás de mim.
Felizmente já estava finalizando um caso de sequestro que pensei
que demoraria mais, então assim que terminei, começamos nossa
operação. Foram dias bem corridos. O plano foi bem complexo, mas
tudo deu certo no final. Agora tente descansar um pouco.

Assinto.
— E Manu? E Dulce? — pergunto a Nando.
— Elas estão nos esperando no hotel. As duas queriam vir,
mas seria muito arriscado.

— Jamais deixaria Manu se colocar em risco desse jeito —


diz Caio. — Apesar de ter sido uma luta convencê-la a ficar lá
esperando. Ela e Dulce. — Caio suspira de um jeito engraçado,
como se lembrar daquilo já o cansasse, e acabo sorrindo. Um
sorriso verdadeiro, que há muito tempo não se abria em meus
lábios.
— Você está machucada? — pergunta Nando, baixinho. —
Ele tentou...?

— Estou bem. E não, ele não abusou de mim. Não


fisicamente — murmuro. — Mas vivi coisas que não vou conseguir
esquecer.
— Não consigo nem imaginar como foi difícil pra você passar
por tudo isso. Eu estou com você! Se tiver que passar noites em
claro, passarei ao seu lado. Se tiver que chorar, estarei lá pra te
consolar. Vamos passar por isso juntos, Aurora. Não importa o
tempo que demore. — As lágrimas voltam a cair. — Nós estamos
aqui agora e vamos te ajudar com esses traumas. Você não está
sozinha, e nunca estará. — Segurando meu queixo, Nando olha em
meus olhos. — Você é minha vida. Eu enfrentaria qualquer coisa,
qualquer um, pra te ter de volta. Pra te ver bem.
Nando me ama de um jeito que nunca imaginei ser amada.
Ele é o homem da minha vida, e apesar de estar quebrada por
dentro, sei que ele conseguirá me ajudar a colar cada pedacinho.
— Obrigada, meu amor, muito obrigada — é tudo o que
consigo dizer nesse momento.

Minha mente vai até Rosa. Como estará a minha amiga?


— Eu fiz uma amiga. O nome dela é Rosa. Não sei quem a
levou. Eu queria ter tido o poder de salvá-la.
Fecho os olhos e lembro dos nossos momentos juntas. Rosa
me deu força quando tanto precisei.
— E se eu te disser que Eros fez todos os maiores lances
essa noite?
Levanto minha cabeça e olho para Nando surpresa. Ele não
salvou só a mim, ele salvou todas elas!
— Tem um carro ali atrás. — Nando aponta, e eu realmente
vejo um grande carro nos seguindo. — Elas estão lá, mas devem
estar com medo, pois não sabem quem sou eu. Tio Ricardo está no
volante. Ele também fez questão de participar do seu resgate.
Todos estão aqui por mim, para me salvar. Se alguém um dia
me perguntasse o que era amor, eu contaria essa história, em que
todos se colocaram em risco para me salvar. Em que Nando se
infiltrou em um mundo sombrio para resgatar a mulher que ama.

— Como arrumou tanto dinheiro? Só no meu lance foi


sessenta milhões. — Eu sei que temos dinheiro, mas não tanto
assim.
— Alonzo bancou tudo. Tanto hoje quanto as quatro garotas
dessa semana. Agora deve estar praticamente falido. Mas fez
questão de ao menos bancar. Seu tio é um covarde filho da puta,
mas pelo menos abriu o bolso.

Não sei o que sentir, meu sentimento por Alonzo está muito
confuso.
— Mesmo se ele não tivesse feito isso, eu daria um jeito —
diz Caio. Nando concorda com a cabeça.
— Rosa está em segurança — digo, ainda sem acreditar.
— Está sim. — Sorrimos um para o outro. — Eu não
conseguiria olhar para as garotas que entravam na sala e pensar
que você seria salva e elas não. Ivan vai ajudar cada uma a voltar
pra casa ou tentar recomeçar em outro lugar.
— Eu nem tenho como agradecer a vocês por isso.
— Nunca desistiria de você, filha. Se esse plano não tivesse
dado certo, nós teríamos pensado em outro, mas nunca iríamos
desistir de recuperar você. — Caio me fazendo chorar novamente.
— Eu te amo — Nando sussurra em meu ouvido.
Passo a mão em seu rosto e lhe dou um beijo.
— Eu também te amo muito. Seus olhos... Eles estão
castanhos. É estranho — comento.

— É lente. Essa última semana usei bastante. Eu fui em


lugares que nunca imaginei ir em toda minha vida e vivi uma vida
totalmente diferente. Eu não era o Nando, e sim Eros. Foi difícil,
mas faria tudo de novo pra ter você aqui comigo. Eu não mediria
esforços, faria qualquer coisa pra te salvar. Qualquer coisa mesmo.
Ele se infiltrou nesse mundo com a ajuda de Ivan só para me
resgatar daquele pesadelo.

— Você parecia diferente, não te reconheci. Eros parecia o


homem que foi descrito por Santoro. Você me deu medo
O jeito que Nando me olha parte meu coração. Eu nunca
havia sentido medo dele antes.
— Desculpa, baby, eu tive que entrar no personagem. Minha
vontade era me ajoelhar na sua frente e te abraçar e nunca mais
soltar. Aqueles minutos foram uns dos piores da minha vida, Aurora.
Eu participei de dois leilões aqui no México e dois na Argentina.
Toda vez que via uma garota naquela situação, ficava com medo de
não conseguir te salvar, de algum louco te levar. — Nando beija
meus lábios com carinho e cuidado é como se quisesse confirmar
que ainda é ele. Quando se afasta, sorrio.
— E as garotas? As histórias que ouvi não foram boas.

Sinto um arrepio ao me lembrar do que Santoro disse. As


festas, os abusos, as mortes. Acho que Nando vê o pânico em meus
olhos.
— Respira, meu amor. — Ele inspira e expira fundo, fundo
me fazendo acompanhá-lo — Já passou, ninguém mais vai te
machucar. Eu prometo.
— Aurora. — Olho para Ivan — Tudo que ouviu sobre Eros
eram boatos. Dulce falou com algumas pessoas que deviam favores
a ela e essas pessoas espalharam as informações. Fizemos chegar
até o pessoal de confiança de Santoro. Nós compramos duas
garotas em cada leilão para reforçar a história. Passando dois dias,
elas eram libertas. Não fizemos nada de ruim com elas. Só
tínhamos que fazer parecer real para que Santoro achasse Eros um
comprador perfeito pra você. Que achasse que ele era a pior pessoa
do mundo. E felizmente conseguimos.
Assinto.
— Essa semana, quando não estava nos leilões, ficava
trancado em um apartamento junto com Dulce — Nando diz. —
Ficávamos esperando Ivan orientar os próximos passos,
repassando o que seria feito. O restante de nossa família só chegou
na cidade ontem. Ficamos em outra cidade pra não levantar
suspeita. Dulce usava peruca e outras coisas pra não ser
reconhecida. Cada passo era muito bem pensado. Ivan é realmente
muito competente. — Nando sorri, olhando para o homem no banco
da frente.
— Imagina, só faço meu trabalho da melhor forma possível —
diz ele e posso sentir o orgulho em seu tom de voz. — Amo o que
faço. Esses reencontros fazem tudo valer a pena.

— Será que vão conseguir prender Santoro algum dia? —


pergunto desanimada.
— Pela minha investigação, ele costuma ficar um tempo
comemorando na mansão. Enviei a localização pra um amigo da
polícia local assim que saímos. Agora é torcer pra conseguirem
chegar lá antes que ele fuja — diz Ivan. — Os leilões são sempre
em lugares diferentes, nunca no mesmo endereço. Já estão
tentando pegar Santoro há um bom tempo. Mas ele conhece bem a
polícia e tem gente infiltrada lá. Não queria uma troca de tiros com
todos vocês presentes. Já passaram traumas demais.

Nós concordamos.
Assim que o carro é estacionado na entrada do hotel, sinto
meu coração acelerar. Minhas duas mães estão lá me esperando.
Aperto a mão de Nando, que corresponde, como se dissesse que
está comigo para o que der e vier. Respiro fundo. Enfim verei minha
família reunida novamente.
A porta do apartamento é aberta e no mesmo instante vejo
minhas duas mães correndo em minha direção. Corro até elas e nos
encontramos no meio do caminho. E, como descontroladas,
começamos a chorar. Ficamos um longo tempo assim, abraçadas e
agradecendo a Deus por estarmos juntas novamente.
— Minha filha, minha filhinha, não acredito que você está
aqui na minha frente. — Manu segura meu rosto e beija minha testa.
— Eu amo vocês. Amo muito cada uma. Eu senti tanta
saudade.
— Nós também te amamos, filha. Eu daria a minha vida pra
salvar a sua. — Dulce me aperta nos braços.
Eu não tenho dúvidas. Graças a ela tudo isso deu certo no
final.
— Você quer tomar um banho, tirar essa roupa, comer
alguma coisa? — pergunta Nando, se aproximando de nós.
Me solto dos braços das duas e me viro para ele, abraçando
sua cintura.
— Eu adoraria me livrar dessas roupas. Mas antes quero
saber para onde levaram as meninas.
— Ivan já reservou dois quartos. Ele e Ricardo estão
cuidando delas. Vamos passar essa noite aqui e amanhã de manhã
voltamos pra casa. Rosa vai ficar bem, pode ficar tranquila.
— Tente descansar um pouco, filha — diz Manu, acariciando
meu ombro. — Tem roupa limpa em cima da cama. Trouxe de casa.
— Vou pedir pra trazerem algo pra vocês comerem. — Dulce
beija minha testa. — Qualquer coisa é só bater no quarto ao lado.
Do lado direito é o meu e no esquerdo de Manu e Caio. À sua frente
fica Ivan e Ricardo.

— Você está segura, não vamos deixar ninguém chegar perto


de você novamente — diz Caio enquanto abraça Manu.
— Obrigada, novamente, todos vocês. Nada que eu diga ou
faça vai demonstrar o tamanho da gratidão que estou sentindo.

Damos um abraço em grupo. Eu estava com tanta saudade


disso, faz meu coração se aquecer. Não há nada que eu ame mais
no mundo do que a minha família. Nando leva todos até a porta e a
tranca em seguida. Eu me sento na cama.
— Eu posso te dar banho? — pergunta Nando.
Balanço a cabeça confirmando. Ele se abaixa e me ajuda a
tirar os sapatos e as joias. Segurando minha mão, me leva até o
banheiro e jogamos sapatos, joias, vestido e roupa íntima no lixo. Eu
não quero nada que me lembre aquele lugar. Já basta as
lembranças que irão me atormentar.
É estranho me ver nua na frente de Nando novamente. Acho
que ele percebe meu desconforto.
— Quer que eu saia? — pergunta, preocupado.
— Não me deixe sozinha. — Seguro sua mão — Você pode
deixar a porta do banheiro aberta? Não quero me sentir presa. Já
será difícil passar a noite nesse quarto de hotel.
Nando assente. Ele liga o chuveiro, verifica a temperatura e
eu entro na água enquanto ele abre a porta do banheiro. Fecho os
olhos, deixando a água morna levar cada toque que pessoas
desconhecidas deram em meu corpo quando me preparavam para
essa noite. Esfrego a mão no rosto, tentando tirar a maquiagem. E
quando dou por mim, já estou soluçando, as lágrimas se misturando
com a água.
Nando toca o meu ombro e quando abro os olhos, ele está na
minha frente, ainda vestido, e me abraça debaixo do chuveiro.
— Eu estou com você. Não vou deixar ninguém te machucar.
Eu te amo e vou te proteger pra sempre.

Sua voz suave e cheia de amor faz eu me acalmar. Me faz


perceber que eu não estou mais naquele pesadelo. Quando nos
afastamos, percebo que seu olhar se fixa em minha barriga. Seus
dedos tocam a cicatriz.
— Foi um tiro — digo em voz baixa. Nando não diz nada,
mas seu olhar já revela o quanto sente por ter passado por tudo
isso. — É mais uma cicatriz pra conta. — Nando encosta sua testa
na minha e suspira.

— É mais uma cicatriz para amar. — Levanta o rosto e me


olha nos olhos. — Se eu fizer qualquer coisa que te incomode, você
me avisa, tudo bem?
Eu concordo e Nando pega a bucha de banho, coloca
sabonete líquido e me ajuda a lavar meu corpo. Tira toda aquela
maquiagem e depois lava meu cabelo. Tudo sempre com carinho e
cuidado. Me lembro de quando ele cuidou de mim após o acidente.
Sempre tão paciente, tão perfeito. Foi por isso que fiz aquela
escolha. Eu sacrificaria qualquer coisa para manter Nando a salvo.
Eu me sacrificaria por ele como ele se sacrificaria por mim sem
pensar duas vezes.
Enquanto me seca, Nando tira a roupa molhada, se enrola
em uma toalha e vai até o quarto buscar nossas roupas. Já estou
terminando de me vestir quando ouço batidas na porta. Olho para
ele assustada. Nando termina de colocar a camisa rapidamente.
— Deve ser a comida — diz, tentando me tranquilizar — Vou
olhar pelo olho mágico antes de abrir a porta. Pode ficar tranquila.
— Tudo bem. — Beijo seus lábios antes que ele saia.
Escuto Nando falando com alguém e decido esperar ele
terminar para sair do banheiro. Enquanto isso, penteio meu cabelo.
Em cima da pia há uma nécessaire com tudo o que precisarei. Creio
que foi Manu que deixou ali.
— A comida chegou. — Ele entra e envolve seus braços em
minha cintura e beija meu ombro; um beijo leve e cheio de amor.

— Vamos, eu já terminei. — Coloco a escova de volta na pia.


Me sento na cama e cruzo as pernas. Nando pega a bandeja
e coloca sobre os lençóis, e nela há dois pratos cobertos com
cloche. Assim que os tira, o cheirinho da comida se espalha pelo
quarto. Estou morrendo de fome. A última vez que comi foi no café
da manhã. Ele se senta e começamos a comer.
— Está gostoso? — pergunta ele.
Só consigo balançar a cabeça confirmando, porque estou
com a boca cheia. Vejo ele sorrir e levo minha mão ao seu rosto.
Acaricio sua bochecha e Nando fecha os olhos por um momento,
colocando sua mão sobre a minha.
— Senti tanta falta do seu toque. — Ao abrir os olhos, ele
sorri. — Não quero nunca mais ficar sem ele.
— E não vai ficar. Eu juro. Dou minha palavra.
— Gostei dessa promessa. Agora coma, baby, ou vai esfriar.
Voltamos a comer em um silêncio acolhedor. Ao terminarmos,
colocamos os pratos cobertos na bandeja.

Já é quase meia-noite. Me sento na cama e olho para a porta


fechada, me sentindo sufocada e começo a respirar com dificuldade.
Nando estende a mão em minha direção e quando levanto o
rosto, posso ver o quanto lhe faz mal me ver assim. Mas não
consigo evitar. Coloco minha mão sobre a dele, me levanto e vamos
até as grandes cortinas. Ao abrir, vejo duas portas de vidro que dão
acesso à sacada. Vou até a grade e olho para o céu cheio de
estrelas. Fecho os olhos, sentindo a brisa e a liberdade. Meu
coração se aquieta e minha respiração volta ao normal.
— Baby. — Me viro para Nando. Ele está deitado na
espreguiçadeira com uma manta em cima do corpo. Sorrio ao vê-lo
assim — Arrumei nossa cama.
— Ela parece perfeita.
Vou até ele e me aconchego ao seu lado. Ficamos encarando
o céu enquanto ele acaricia meus cabelos.
— Amanhã estaremos em casa. Na nossa cama. Ela ficou
tão vazia sem você. Minha vida ficou sem sentido sem você.
Me viro para ele e encaro seus lindos olhos azuis que tanto
amo, que tanto senti falta.
— Eu pensei em você a cada segundo desde o momento em
que coloquei o pé pra fora de casa. Eu realmente achei que estava
fazendo o certo. Eu realmente achei. — Meus olhos se enchem de
lágrimas.
— Eu sei.
Fecho os olhos quando sinto seus dedos enxugando minhas
lágrimas. Seus lábios tocam os meus em um beijo calmo. Nando
não o aprofunda nem tenta ir além, e isso me faz amá-lo ainda mais.
Eu não conseguiria fazer nada mais que isso. E não sei quanto
tempo vai demorar para tudo voltar ao normal. Não vou conseguir
fazer sexo com Nando do jeito que gostava antes. Se ele segurar
meu pescoço, pensarei em Santoro, se segurar meu braço com
força, pensarei nele novamente. Isso está me deixando com medo.
Medo de não conseguir me entregar a ele novamente.
— Não precisa se preocupar com isso — diz baixinho, me
olhando nos olhos. — Eu sei no que está pensando. Só quero que
faça isso quando estiver segura. Eu esperarei o tempo que for
preciso. Eu só preciso de você, minha Aurora. Só você.
Se tivesse que resumir essa noite em uma só palavra seria:
dor.
Mesmo em meus braços, Aurora não conseguiu dormir
direito. Vez ou outra contava um pouco do que passou durante
esses dias. Acho que precisava desabafar. Eu só fiquei ali ouvindo.
Por fora me mantinha calmo, mas por dentro um turbilhão de
sentimentos tomava meu corpo. Cada lágrima que caía de seus
olhos e cada soluço que tentava abafar eram torturantes. Me senti
caindo em um abismo, indo cada vez mais fundo.

Queria eu mesmo acabar com Santoro e com Yolanda.


Queria vê-los sofrer. Eles têm que pagar pelo que fizeram com
minha Aurora. Não só com ela, mas também com todas as mulheres
que já passaram por isso. Ouço uma batida leve na porta e me
levanto devagar, pois já amanheceu e faz menos de duas horas que
Aurora está dormindo. Quando o sol começou a nascer, a levei para
a cama.
Ao abrir a porta, dou de cara com Dulce. Ela olha para dentro
do quarto e vê Aurora dormindo, aponta para o corredor, e encosto a
porta com cuidado para segui-la, mas sem me afastar muito.
— Como ela passou a noite? — pergunta.
— Foi difícil. Ela só conseguiu dormir quando já estava
amanhecendo. — Solto um longo suspiro. — Tudo o que ela me
contou essa noite... Deus, ela sofreu tanto em tão pouco tempo. Eu
queria apagar tudo isso de sua memória. Queria deixar esse tempo
em branco.

Sua mão vai até meu ombro.


— Eu realmente imagino o que ela passou na mão daqueles
abutres. Eu os conheço muito bem. Vim aqui pois tenho que te dar
uma notícia. — Olho para Dulce com atenção. — Ontem
conseguiram levar Santoro e Yolanda. Alguns de seus capangas
morreram na mansão mesmo, no confronto.
— Eles poderiam ter morrido também — digo.
— A parte boa, Nando — ela continua —, é que Yolanda foi
ferida e não resistiu, morreu essa manhã. Santoro está em estado
grave no hospital. Mas não sobreviverá — diz com convicção.

— Como pode ter tanta certeza?


— Por que eu mesma vou acabar com ele. — Vejo o ódio
brilhar em seus olhos azuis. Eles são como os de Aurora, mas
contém algo mais. — Não dormi essa noite, já estou com todo o
plano arquitetado. Já fiz minhas ligações e estou indo para o
hospital agora.

— Eu vou com você.


Dulce sorri largamente.
— Eu imaginei que diria isso. Vamos usar o carro de Eros,
escuro e com placa clonada.

Assinto.
Sinto alívio em saber que Yolanda está morta, mas saber que
o verme de Santoro ainda respira me enche de ódio.
— Vou pedir para meus pais ficarem com Aurora enquanto
saímos. Não quero que acorde e veja que está sozinha.

— Vou ficar aqui na porta enquanto você vai chamá-los.


Nando, não conte a eles o que vamos fazer. Diga apenas que
iremos resolver algumas coisas.
— Pode deixar.

Vou até o quarto de meus pais e bato na porta, e não demora


para ela ser aberta e meu pai aparecer.

Estamos com o carro estacionado em um beco na parte de


trás do hospital. A porta é aberta e uma mulher entra rapidamente,
me assustando, pois não a vi se aproximar. Devia estar distraído.
Ela está com uma roupa de enfermeira e uma sacola na mão. Fico
olhando as duas pelo retrovisor.
— Quanto tempo, Dulce — diz, e a abraça. — Trouxe tudo o
que irá precisar. Tem um uniforme que não uso mais, máscara,
touca, uma peruca morena e um crachá falso. Te expliquei como
entrar e chegar no quarto dele. Você precisa ser rápida. Pra sua
sorte, a câmera do quarto de Santoro e dessa entrada parou de
funcionar misteriosamente essa manhã. — O sorriso que a moça já
deixa claro que não foi tão misteriosamente assim.
— Eles o trouxeram para um dos piores hospitais da cidade
— comenta Dulce — Acho que não estão querendo que sobreviva.
Só vou dar uma forcinha.
— Você estará vingando minha irmã — diz a moça, com a
voz embargada, e Dulce a abraça.
Fico imaginando que atrocidades ele poderia ter feito com
ela.
— Obrigada, Guadalupe. Sabia que poderia contar com você.
— As duas se afastam. — Agora volte ao seu trabalho, não quero
que arrisque mais ainda seu emprego.

Assentindo, a moça sai do carro.


— Nando, feche os olhos, pois irei me trocar.

Fecho os olhos e a imagem de Aurora chorando aquela noite


toma minha mente. Dulce matou Miguel para mantê-la segura,
agora acabará com Santoro pelo mesmo motivo. Sei que não é
certo tirar a vida de outra pessoa, mas nunca a julgarei por isso,
pois sei que seria capaz de fazer o mesmo.
— Pronto.

Sua voz me tira de meus pensamentos. Abro meus olhos e


vejo o quanto ela está diferente. Acabo rindo e Dulce me olha sem
entender nada.
— Está parecendo aquelas atrizes de novela mexicana, mas
você seria a vilã.

Nós rimos.
— Não ligo em voltar a ser a vilã se isso garantir a paz da
minha filha. Esse pedacinho de mim ainda está aqui dentro e
sempre vem à tona quando o assunto é Aurora. — Sua mão vai até
a porta do carro, e antes de descer ela diz: — Sabe, Nando,
ninguém é cem por cento bonzinho. A maioria só disfarça muito
bem.
Os minutos parecem se arrastar. Será que Dulce irá
conseguir? E se alguma coisa der errado? Esse tempo que
passamos juntos nos aproximou muito. Apesar de já ter feito muitas
coisas ruins, eu a admiro demais. A porta é aberta e lá está ela. Ligo
o carro e saio o mais rápido que posso. Dou algumas voltas no
quarteirão, próximo ao nosso hotel, e assim que estaciono na
garagem, fecho os olhos para que ela possa se trocar novamente.
Quando avisa que já está pronta, me viro para ela. Não aguento
mais esperar.
— Conseguiu?

— Sim. Santoro não está mais entre nós, agora está fazendo
companhia ao diabo. Creio que vão se tornar grandes amigos. —
Um sorriso se forma em seu rosto.
— Você se sente mal quando faz isso? Tirar a vida de outra
pessoa? Eu já quase fiz isso, quando Henry machucou Aurora. Se
não fosse meu pai, teria ido até o fim.
— Se for por um bom motivo, não sinto. Faria o que fosse
preciso pra manter Aurora segura. Eu consegui protegê-la de
Miguel, mas infelizmente não de Santoro. Mesmo morto, aquele
homem conseguiu traumatizar minha filha e sinto que falhei com ela.
— Seus olhos se enchem de lágrimas.
— Não sinta, você é uma ótima mãe. — Seguro sua mão e
ela sorri. — Tenho certeza de que ela te ama muito e que tem
orgulho de ser sua filha.
Subimos, e ao nos aproximarmos do quarto de Aurora, posso
ver a porta aberta, e a cena a seguir faz meu coração se encher de
alegria. Aurora e nossos pais estão sentados na cama, ao lado de
uma das moças que salvamos. Rosa, imagino. Estão todos
conversando e rindo, e ela parece feliz.
— Por ela, Nando. Por ela faço qualquer coisa, enfrentaria
qualquer um — Dulce diz baixinho.

— Eu entendo. Entendo muito bem.


Sorrio quando o olhar de Aurora encontra o meu. Ela acena,
nos chamando, e vamos até ela. Me sento ao seu lado e Dulce se
ajeita em um cantinho.
— Essa é Rosa — ela diz. — E Rosa, esse é Nando.
Estendo a mão e nos cumprimentamos.
— Prazer em conhecer o irmão noivo de Aurora. — As duas
se olham e sorriem, como se isso fosse uma piada interna.
— É um prazer conhecê-la também. — Sorrio para ela e
então me viro pra Aurora. — Você já tomou café?
— Sim, já tomei. Onde vocês estavam? — pergunta,
franzindo o cenho.
— Resolvendo uns assuntos particulares — responde Dulce.
— Você conseguiu dormir um pouco?

— Sim. Quando vamos voltar pra casa?


— Daqui a uma hora — diz Caio e ouço um celular tocar. — É
o meu. — Pega aparelho. — É Ivan, vou ali fora atender.

— Rosa vai se mudar para o Brasil — diz, animada,


segurando a mão da amiga. — Ela não tem ninguém aqui, então irá
pra lá com sua nova família.
Vejo os olhos dela ficarem marejados quando Aurora diz isso.
— Vocês não vão acreditar — diz meu pai, se sentando na
cama. — Santoro e sua comparsa estão mortos. Vão fazer
companhia para Miguel no inferno. Já foram tarde. Quando
voltarmos pra casa, darei uma festa.

Todos riem de seu comentário e vejo Aurora e Rosa


suspirarem, uma segurando a mão da outra.
— Pessoal, vamos começar a arrumar nossas malas pra não
nos atrasarmos para o voo. — Minha mãe se levanta e o restante
faz o mesmo. — Nos vemos daqui a pouco, meus filhos.

Logo estamos só nós dois abraçados na cama. Inspiro seu


cheiro — o cheiro natural que exala de seu corpo, e que tanto senti
falta esses meses.
— Está ansiosa pra voltar pra casa? — Acaricio seus lindos
cabelos.

Aurora é tão linda. Cada pedacinho dela parece ter sido


desenhado especialmente para me encantar. Seus traços delicados,
seus olhos azuis, seus lábios rosados. Eu poderia ficar olhando seu
rosto por horas e não me cansaria.
— Sim, não vejo a hora de sair dessa cidade e nunca mais
voltar. Estou com saudades da nossa casa. Como anda a minha
loja? E Mari? Adam? E Camila?
Rio de seu bombardeio de perguntas.
— A loja ainda está funcionando normalmente, nossa mãe
fez questão de cuidar dela pra você. Contratou até uma nova
funcionária. E quanto a Mari, ela está bem e com muita saudade.
Ela queria vir, mas Ricardo e Camila não deixaram. Camila está
maravilhosa como sempre. E Adam continua sendo um pé no saco.
— Aurora dá um tapa em meu ombro. — Só estou sendo sincero.

— Pensei que já havíamos resolvido isso.


Levo minha mão ao seu rosto e acaricio sua bochecha.
— Nós já resolvemos, mas isso não quer dizer que ele seja a
minha pessoa preferida no mundo.
— E quem é sua pessoa preferida no mundo? — Seu sorriso
deixa evidente que ela já sabe a resposta.
— Você, minha Aurora. Você é a minha pessoa preferida.
Sempre foi e sempre será. — Ela morde o lábio, tentando disfarçar o
sorriso. — Agora estou com muita vontade de te beijar. Posso?

— Claro que pode.


Sorrio com sua resposta, aproximo meu rosto do seu e beijo
minha mulher.
Nem posso acreditar que estamos voltando para casa. Nando
está comigo e minha família está ao meu lado. Olho pela janela do
avião e vejo o sol brilhando. Senti falta disso. Uma coisa tão simples
como essa me fez uma falta enorme, para ver como não damos o
devido valor às coisas.
— O que acha de quando chegarmos em casa passarmos o
dia na cama comendo besteira? — Nando sugere.
— Vou adorar. — Me viro para ele e lhe dou um selinho — Só
temos que ver onde Rosa vai ficar até arrumar um emprego.
— Ela pode ficar no meu antigo apartamento, eu ainda tenho
a chave — Caio diz do banco da frente. — Faz pouco tempo que
fizemos uma reforma nele.

— Boa ideia. E quanto ao trabalho, Rosa pode trabalhar ou


na minha confeitaria ou em sua loja. Ela escolhe — acrescenta
Manu.
— Vocês sempre pensam em tudo — diz Nando, visivelmente
orgulhoso.
Manu e Caio riem.
— Nós tentamos — respondem.

Eles fazem um casal tão perfeito. Olho para a poltrona atrás


de mim, onde Rosa está sentada ao lado de minha mãe.
— O apartamento você já tem, agora é só escolher onde quer
trabalhar.

Rosa estende a mão entre as poltronas e eu a seguro.


— Eu quero trabalhar com você, se não tiver problema.
Sorrio, pois já imaginava que ela escolheria isso. E gosto
muito da ideia de tê-la em minha loja.
— Então trabalharemos juntas.

Quando solto sua mão e me endireito, vejo que Nando está


me encarando sorrindo. Olho para ele estreitando os olhos.
— O que foi?
Meu sorriso se desfaz quando vejo uma lágrima cair de seus
olhos, mas ele ainda sorri.

— É tão bom te ver sorrindo assim. — Sua voz sai como um


sussurro.
Deito minha cabeça em seu ombro e Nando beija minha
testa. Seguro sua mão e entrelaço nossos dedos.

— Estou sorrindo assim graças a você. Porque você não


desistiu de mim.
Segurando meu queixo, Nando me faz olhar em seus olhos.

— Nunca. Nunca desistiria de você, minha Aurora. Não tenha


dúvidas sobre isso. Quando foi embora, pensei até que teria feito
algo errado, que você não aguentava minhas crises de ciúmes.
Prometi que iria mudar isso em mim se você voltasse pra casa, pra
mim.
Seu olhar transborda tantos sentimentos que me pergunto se
isso é mesmo amor ou se vai além.

— Jamais me afastaria de você por vontade própria. Nenhum


relacionamento é perfeito, todos têm brigas e discussões, mas as
nossas nunca foram pesadas a ponto de pensar em te deixar por
isso. Você sabe que te amo muito, que você é o homem da minha
vida. Naquele lugar os únicos momentos de paz eram quando
pensava em você, em todos os momentos bons que passamos
juntos. Que não foram poucos. — Ele sorri concordando. Aproximo
meu rosto do seu e o beijo. — Amo você do jeito que você é.
— Também amo você do jeitinho que você é, minha Aurora.
— Nando me dá um selinho.

Me deito em seu peito e seus braços me envolvem em um


abraço apertado. Sinto que posso ficar aqui o resto da vida.

Assim que colocamos os pés no aeroporto, de longe vejo


uma linda morena de cabelos cacheados correndo com os braços
abertos em minha direção.
— Vai lá — me incentiva Nando.
Sorrio pra ele e corro em direção a minha amiga. Mari sorri
mesmo com lágrimas rolando em seu rosto.

— Amiga, estava com tanta saudade! — diz, me abraçando


forte. — Eu queria ter ido junto, mas meu pai não deixou. Quase me
enfiei dentro da mala dele, só que era muito pequena.
Nos afastamos rindo e limpamos as lágrimas uma da outra.
— Também estava com muitas saudades suas. E não tenho
dúvidas de que você teria coragem de fazer uma loucura dessas.
Vejo Camila se aproximando de nós. Ela não está sozinha,
Adam está ao seu lado.

— Você está bem? — pergunta Mari.


— Na medida do possível, estou. Quero lhe apresentar uma
pessoa. — Aceno para Rosa, a chamando, e ela se aproxima. —
Mari, essa é Rosa, minha amiga. Ela faz parte da nossa família
agora.
Rosa estende a mão para cumprimentar Mari, mas ela a puxa
para um abraço. Logo as duas estão conversando como se já se
conhecessem há muito tempo. Mari tem esse poder de encantar as
pessoas e fazê-las se sentirem à vontade.
— Estava com saudades e muito preocupado — diz Adam ao
me abraçar. — Todos ficamos apavorados quando você sumiu. Me
desculpe por não ter ido junto, mas imaginei que não seria bem-
vindo.
— Tudo bem, Adam, eu também estava com muita saudade
de todos.
Ao nos afastarmos, minha madrinha me abraça e me balança
de um lado para o outro. Nós rimos.
— Minha Barbie de cabelos cacheados estava tão ansiosa
pra vê-la novamente. Vou ser mais uma a dizer que estava com
saudade. Você fez muita falta. — Camila se afasta e me olha nos
olhos. — Nunca mais suma desse jeito. Se precisar de alguém pra
conversar sobre qualquer coisa, pode contar comigo.
— Muito obrigada, eu amo muito todos vocês — digo.
— Eu também quero beijo! — diz Ricardo e Camila vai até ele
sorrindo e o beija.
Nando entrelaça nossos dedos.
— Que tal todos almoçarmos juntos antes de voltarmos pra
casa? — Manu sugere.

— É uma ótima ideia — diz Camila.


Logo estamos todos em um restaurante do aeroporto. Todos
felizes e animados, principalmente eu.

Ao abrir a porta de casa, fecho os olhos por um breve


momento, sentindo aquele cheirinho familiar. Meu peito se enche de
felicidade. Eu disse que ia voltar e realmente voltei. Graças a toda a
minha família. Sinto Nando me abraçar por trás e sua cabeça
repousa em meu ombro.

— Bem-vinda de volta à nossa casa — sussurra e beija


minha bochecha.
Entramos na sala, me sento no sofá e Nando coloca as malas
no canto da parede. Minha mente vai até aquele dia, nossa
despedida, as coisas que fizemos. Sinto um frio na barriga. Eu
quero voltar a ser aquela Aurora, quero voltar a me entregar de
corpo e alma para Nando novamente. Tiro meus sapatos, me deito
no sofá E Nando liga a TV e sai da sala, mas logo está de volta com
uma manta nas mãos. Ele me cobre e se ajoelha na minha frente,
seus dedos acariciando minha bochecha.
— Posso me deitar com você? — pede baixinho e abre um
sorriso tão fofo que faz meu coração dar uma cambalhota.
— Pode sim. — Seu sorriso se alarga. Vou um pouco mais
para frente e o vejo tirar os sapatos e com cuidado se deitar atrás de
mim. Nando cola seu corpo no meu e seu braço repousa sobre a
minha cintura. — Nando...
— Oi, minha Aurora.
— Nós ainda vamos nos casar?
Ele segura minha mão.
Minha linda aliança de noivado não está mais lá e isso me
deixa triste. Ela era tão perfeita e significava tanto para mim.

— Se você quiser, nós vamos. Não há nada mais que eu


queira agora do que me casar com você. Podemos remarcar a data
ou se quiser vamos amanhã mesmo no cartório. Fica ao seu critério.
Me viro para Nando e beijo a ponta de seu nariz, ele ri.
— Então amanhã faremos isso. — Sinto uma insegurança
tomar meu peito — Mas será que você não vai se arrepender? — O
vejo franzir o cenho, parecendo confuso — E se eu não for mais a
mulher por quem você se apaixonou?
— Sabe o que vejo quando te olho? Vejo a menina doce que
cresceu ao meu lado, a menina que me conquistou e me fez amá-la.
Não só como irmã, mas como mulher. Vejo também uma mulher que
passou muitas coisas ruins no último ano e mesmo assim consegue
sorrir. — Seu polegar seca minha lágrima. — Eu olho pra você,
Aurora, e vejo a minha amada. Nada disso mudou. Eu te amo agora
mais do que amava quando saiu por aquela porta. — Ele aponta
para ela. — Você pode estar se sentindo diferente, mas toda vez
que sorri, mostra que minha Aurora está aí. Pode estar machucada,
mas está aí dentro. E pra dizer a verdade, perdi as contas de
quantas vezes já te vi sorrir hoje. E foi a primeira vez em dias que
me senti em paz. Agora que estou aqui com você em nossa casa,
em meus braços, sinto que estou a ponto de explodir de tanta
felicidade.
— Nando, nem sei o que dizer. — Me aconchego em seu
peito. — Você é tão perfeito. — O ouço rir. — Estou falando sério.
Você é tudo o que uma mulher poderia querer na vida. E eu sou a
sortuda que você escolheu.
A vida está voltando ao normal. Voltei para a loja, e como
agora tenho três funcionárias, me dedico só a desenhar. Montei um
pequeno ateliê no fundo e me mantenho bem ocupada, ainda mais
agora que estou para finalizar meu vestido de noiva. Faltam apenas
duas semanas para meu sobrenome voltar a ser Alves e estou
ansiosa para isso acontecer.
Estou me recuperando bem. O apoio de toda a família e
também de uma boa profissional fez toda a diferença. Doutora
Milena é uma excelente psicóloga. Manu e Caio fizeram questão de
pagar as sessões, tanto as minhas quanto as de Rosa. Uma sempre
apoia a outra no momento em que lembranças ruins tendem a nos
atormentar.

Uma vez por semana realizamos a noite das meninas. Mari,


Rosa e eu passamos a noite comendo besteira e falando sobre a
vida. Muitas vezes, Mari deixa Rosa perplexa com alguma coisa que
diz, principalmente sobre os homens, mas com o tempo ela está se
acostumando, e isso é muito bom, pois amo as duas por igual.
Mesmo tendo conhecido Rosa há pouco mais de dois meses.
Com o tempo, os sonhos perturbadores estão diminuindo,
mas sempre que eles acontecem, Nando está lá ao meu lado para
me abraçar e dizer que tudo vai ficar bem e que ninguém mais vai
me machucar. Ele sempre fica alerta durante a noite. Às vezes
acordo de madrugada e o pego me observando, e quando
questionado, diz que estava acordado para caso eu precisasse dele.
Já tentei convencê-lo de que não é necessário, mas ele sempre diz
que esse assunto não está aberto a discussão. E o que menos
quero é discutir com ele. Nando tem sido tudo para mim.
— Nossa, esse vestido está ficando perfeito.

Me viro surpresa ao ouvir a voz de Mari. Me afasto do


manequim, coloco os alfinetes sobre a mesa e vou até ela.
— Adorei a surpresa. — Abraço minha amiga.

— Vim dar uma passadinha aqui pra ver se já almoçou. Você


anda tão focada nesse vestido que estou sabendo que não está se
alimentando direito — diz, levando as mãos à cintura com uma
expressão séria no rosto.
E é verdade. Eu quero que esse vestido fique perfeito, então
estou dedicando todas as minhas horas vagas a ele, porque ainda
tenho que fazer as peças exclusivas da loja. Me alimentar, na
maioria das vezes, fica em segundo plano.

— Vamos comer onde?


Pego minha bolsa e meu celular.

Mari sorri largamente, entrelaçando meu braço no seu. Aviso


às meninas que estou saindo para almoçar e vou com Mari até seu
carro.
— O que está a fim de comer? — pergunta assim que
entramos no veículo.
— Estou com vontade de comer batata recheada com muito
queijo. — Mari se vira para mim e me olha com desconfiança. —
Sem chances! — digo, já imaginando o que está se passando em
sua cabeça.
— Por que? — Desvio meu olhar — Amiga, pode me contar
qualquer coisa.

— Nando e eu... Nós... Não consegui ainda. Muitas vezes eu


quero, mas me bate uma insegurança, então recuo.
— Entendo como deve ser difícil. — Sua voz sai baixa e me
viro para Mari novamente.

— Às vezes me pergunto se isso deixa Nando frustrado. Eu


vejo que ele fica excitado e na maioria das vezes tenta disfarçar,
mas você sabe que não tem como. — Aponto para baixo para que
ela me entenda. Solto um suspiro, me afundando no banco, e sua
mão segura a minha com carinho.
— Vocês já conversaram sobre isso?

— Sim, e sempre que entramos nesse assunto, Nando diz


que irá esperar o tempo necessário, e que nunca irá me forçar a
fazer o que não queira.
— Amiga, você tem um homem ao seu lado que te ama, que
foi até outro país atrás de você, que se infiltrou em um esquema
perigoso, mudou de nome, se meteu com gente da pior espécie,
tudo isso pra te ter de volta. Você realmente acha que esperar
alguns meses pra transar vai frustrá-lo?

Abaixo a cabeça envergonhada. Mari tem razão. Tenho que


tirar essa insegurança de dentro de mim.
— Nando não era o mesmo quando você não estava aqui.
Aurora, ele parecia um louco! Quando não estava trabalhando,
passava várias horas rodando de carro por aí só pra tentar te
encontrar. Se não estava na rua, ficava em casa isolado. Sério, eu
nunca vi um amor tão grande quanto o dele por você. Nem mesmo o
dos meus pais, e eu admiro muito isso nele. Então tire esse
pensamento da cabeça. — Seu olhar vai até o novo anel de noivado
que Nando me deu, igualzinho ao anterior. — Esse homem te ama.
Então não deixe sua insegurança colocar coisas em sua cabeça.
— Obrigada por abrir meus olhos.

Nos abraçamos.
— Está vendo? Não sou só um rostinho bonito, também sei
dar bons conselhos. — Mari pisca, coloca o cinto e liga o carro.
— Você é perfeita! — Beijo sua bochecha.
— Nós somos, amiga.
Vamos até uma lanchonete onde vende a melhor batata
recheada da cidade, que fica a cinco quadras da loja. Quando
estamos chegando, vemos Henry passando com o carro no sentido
oposto. Ele não nos vê.
— Nando me disse que vocês foram atrás do Henry quando
fui embora. Como foi isso?
Mari estaciona o carro e solta o cinto de segurança.
— Vamos descer e fazer nossos pedidos, e enquanto
esperamos te conto tudo. Pode ser?
Balanço a cabeça, concordando. Entramos e realizamos
nossos pedidos e, após nos sentarmos em uma mesa no canto, olho
para Mari e gesticulo com as mãos para ela começar a contar o que
aconteceu. Nando não quis me contar e nem deixou nossos pais
contarem.
— Assim que Nando leu sua carta de despedida, ele ligou pra
Manu dizendo que você o tinha abandonado. — Meu coração se
aperta só de imaginar a dor que ele sentiu. Tentei ser clara na carta,
mas sabia que ele pensaria que o estava deixando porque queria,
não porque precisava. — E quando Manu ficou sabendo da carta,
ela foi pra sua casa e no caminho ligou pra minha mãe, e não
demorou pra estarmos todos lá tentando achar alguma pista sobre
seu paradeiro. Amiga, você não contou nem pra mim. — Sinto uma
pontada de decepção em sua voz. — Eu sempre guardei seus
segredos. Não seria diferente dessa vez.
— Mari, foi tudo de última hora. Estava desesperada, não
sabia o que fazer. Confiei cegamente em meu tio. Não que a culpa
de tudo seja só dele. É muito complicado. — Sinto meus olhos
arderem.
Nosso pedido é entregue e agradecemos ao garçom, que
logo se retira.
— Me desculpa, sei que é difícil tocar nesse assunto. Fui
indelicada. Você tinha os seus motivos. Agora voltando à história. —
Mari dá uma garfada em sua batata e faço o mesmo na minha. —
Nando colocou na cabeça que Henry havia feito algo a você por
causa do casamento de vocês. Fomos todos atrás dele em sua
casa, não podíamos deixar Nando sozinho, ele estava fora de si. —
Mari ri e olho para ela confusa. — Quando Henry abriu a porta e viu
toda a família, ele ficou branco como um papel. Ainda mais quando
Nando foi pra cima dele.

— Nando bateu nele de novo?


— O coitado nem abriu a boca e Nando já chegou
empurrando o cara e perguntando o que ele tinha feito com você. Se
ele tivesse te machucado, iria matá-lo. Henry só repetia que não
tinha te visto desde aquele dia em que foi atrás de você na loja.
Nando só se aquietou quando vasculhou a casa dele, e antes de
sairmos de lá ainda o ameaçou. — Mari ri novamente.
— Amiga, para de rir. — Não consigo evitar e acabo rindo
também.
— Você tinha que ver a cara do Henry, nem parecia que é
mais velho que Nando. Ele estava se cagando de medo. Nando
parecia um Pinscher raivoso.
Acabo me engasgando com a batata e Mari dá um tapinha
em minhas costas. Caímos na gargalhada.
— Por isso eu digo que aquele homem te ama demais. Ele
enfrentaria qualquer um, Aurora, só pra te ter de volta em sua vida.
Não é a falta daquilo que vai abalar o que ele sente por você. Leve o
tempo que for necessário, ele vai te esperar. Ele só precisa estar ao
seu lado.
— Ele sempre diz isso. — Sorrio encarando meu prato. — Se
me dissessem dois anos atrás que Nando e eu seríamos um casal,
eu chamaria a pessoa de louca, mas agora, mais que nunca, vejo
que fomos feitos um para o outro.
Após um banho, coloco uma roupa mais confortável. Pego
algumas folhas em meu estojo e decido rabiscar em cima da cama.
Me deito de bruços. O lápis desliza pela folha em branco e a forma
de um lindo maiô frente única se forma. Nunca havia desenhado
uma roupa de banho, mas como o verão se aproxima, decido
arriscar. Me empolgo tanto que nem vejo a hora passar. Sinto uma
mão deslizar por minha perna e me sento na cama rapidamente.
Quando vejo que é Nando, meu corpo se permite relaxar e solto um
suspiro aliviado.
— Desculpa, baby, não queria te assustar. — Se sentando ao
meu lado, Nando segura minhas mãos e beija uma após a outra. —
Como foi seu dia?

— Foi ótimo. — Me curvo e beijo seus lábios. — Almocei com


Mari e adiantei o meu vestido. Olha esses desenhos. — Espalho as
folhas sobre a cama. — Estou tentando algo diferente. O que acha?
Nando olha um por um com muita atenção. Ele sempre
analisa meus desenhos e é sincero. Quando não gosta de algo,
sempre me diz, e se preocupa em usar palavras que não me façam
me sentir triste ou frustrada. Sempre são críticas construtivas.
— Eles estão perfeitos. Se lembra do primeiro desenho que
me mostrou?
A lembrança me faz sorrir. Meu desenho era amador, mas era
tão fofo. Um vestido de baile todo volumoso, rosa e brilhante.

— Sim. Lembro que transformei aquela ideia em um vestido


para a minha boneca favorita. Manu me ajudou a achar um tecido
parecido com o que imaginei e me ensinou a usar a agulha e a
linha. Levou um tempo até conseguir deixá-lo do jeito que queria,
mas fiquei orgulhosa com o resultado. Ainda mais por ser meu
primeiro desenho, criado por minha mente e minhas mãos. Eu não
lembro quantos anos tinha naquela época.
— Onze anos — ele diz e olho para Nando surpresa. Não
esperava que se lembrasse. — Era rosa e brilhante. Você passou
horas trancada no quarto. Assim que terminou, correu pra me
mostrar. Você estava tão empolgada que nem se importou com os
furos que adquiriu nos dedos. Lembro-me que te dei parabéns, mas
logo fui atrás de álcool e algodão pra limpar o sangue.

Sinto meus olhos arderem.


— Você se lembra

— Me lembro de tudo que tenha a ver com você, minha


Aurora. Guardo tudo dentro da minha cabeça. — Ele segura minha
mão e a leva até seu peito, e sinto seu coração acelerar. — E do
meu coração.
Eu não sei o que dizer. Ele sem dúvida é o homem mais lindo
que já vi em toda a minha vida. Não por seus lindos olhos azuis ou
por seus cabelos com leves reflexos dourados, ou mesmo por seu
sorriso perfeito que me faz querer parar no tempo só para admirá-lo
por mais alguns segundos. Mas sim por seu interior. A cada dia o
admiro mais. Posso dizer que já vi todas as suas facetas e amo
cada uma delas com todo o meu ser. Levo minha mão até seu rosto
e meu polegar desliza delicadamente sobre seu queixo. Ele fecha os
olhos por alguns instantes, fazendo parecer que esse carinho é a
melhor coisa do mundo.
— Será que é possível te amar mais a cada dia? — Deixo
meus pensamentos saírem por meus lábios.

— Me pergunto isso a todo momento.


Sua resposta me faz sorrir. Estou parecendo uma criança que
acabou de ganhar o presente que mais queria. E realmente ganhei.
Nando é o melhor presente que a vida poderia me dar.

— Não existe Aurora sem Nando.


Seu rosto se aproxima do meu e estamos tão próximos que
sinto seu hálito quente acariciando minha pele. Estou perdida em
seus olhos e neles quero me afogar.

— Nem Nando sem Aurora — completa, sorrindo. — Eu te


amo.
— Eu também te amo.
Seguro seu rosto entre as mãos e meus lábios tocam os seus
com calma, sem pressa. Suas mãos seguram minha cintura com
tanta leveza que só percebo quando me coloca em seu colo com
uma perna de cada lado. Me afasto, encarando seus lábios que
parecem ainda mais convidativos.
— Eu não vou te machucar, só quero sentir seu corpo
próximo ao meu. — Cada palavra que sai de sua boca e cada
movimento que seus lábios fazem me deixam ainda mais
hipnotizada. — Tudo bem pra você? — Eu assinto. Sua mão vai até
minha bochecha e o dorso de seus dedos a toca. Fecho os olhos,
sentindo o carinho que esse gesto me transmite. — Você é tão linda.
Tão perfeita. A mulher mais linda do mundo é a minha.
Ainda com os olhos fechados, consigo sentir seus dedos
deslizando sobre meu braço, tão devagar que parece que o mundo
está em câmera lenta. Sinto meu coração acelerar e meu sangue
correr mais rápido em minhas veias. Consigo ouvir sua respiração
pesada, assim como a minha está. Sinto suas mãos em minha
cintura e seus lábios em meu ombro.
— Eu te amo — sussurra. E beija a curva de meu pescoço.
Meu corpo todo se arrepia. — Eu te amo. — Beija meu pescoço. —
Eu te amo — diz em meu ouvido. A campainha toca e toda a magia
se desfaz.
— Eu pedi uma pizza. — Sorrio sem jeito e me levanto. —
Vamos jantar. — Estendo minha mão para ele que sem pensar duas
vezes a aceita.

Após pegar o tecido encomendado, sigo de volta para a loja.


E assim que saio do carro com uma grande sacola em mãos, vejo
um homem parado de costas. Ele olha pela vitrine, parecendo
procurar algo ou alguém.
— Juan?! — Ele se vira para mim. — Juan! O que está
fazendo aqui? — Coloco a sacola no chão ao lado da porta e vou
até ele. O abraço forte.
— Bom te ver novamente. Sei que demorei, mas queria ver
com meus próprios olhos que você está bem. — Nos afastamos. —
Eu sinto muito por tudo o que aconteceu. Sinto mais ainda por não
ter conseguido te manter segura. Quando encontrei Vic na noite
anterior, ela me disse que eu estava de folga. Achei estranho, pois
não era o que estava na escala, mas quem diria não a uma folga
extra? Me desculpe.
— Juan, não foi sua culpa. — Seguro sua mão com carinho.
— Não tinha como adivinhar. Ela enganou a todos e pagou pelo erro
que cometeu. Vamos entrar? É melhor conversarmos lá dentro.
Juan pega minha sacola e entramos na loja. O apresento às
meninas, e todas ficam encantadas com sua beleza e simpatia.
Vamos até o fundo, onde fica meu ateliê.
— Pode se sentar. — Aponto para a cadeira que há na frente
da máquina de costura. Puxo o pequeno puff e me sento. — Como
me encontrou?
— Pedi o endereço ao seu tio. Espero que não tenha
problema.
— Não tem. Como ele está? Nunca mais falei com ele.
— Agora está levando uma vida mais simples, não tem todo
aquele dinheiro. Ele e Silvana estão trabalhando e se mudaram do
casarão. Foi difícil convencê-los a me passar seu endereço. Fui até
sua casa, mas não tinha ninguém, mas ele também me passou o da
loja. Como está tudo por aqui?
— Está bem, na medida do possível. Apesar de ter ficado
apenas alguns dias naquele lugar, fiquei muito traumatizada. —
Uma sensação ruim começa a querer tomar meu peito. — Mas não
quero falar disso. E sua família? Você vai ficar aqui no Brasil por
quanto tempo?
— Minha família felizmente está bem. Ainda não sei quanto
tempo ficarei aqui. Fazia muito tempo que não tirava férias, estou
pensando em relaxar um pouco. E seu noivo, como está?
— Está bem. — Sorrio — Nosso casamento é daqui a duas
semanas. Você está convidado.
— Obrigado, irei com muito gosto. É bom te ver sorrindo
assim. Fiquei com saudade do seu sorriso. Esse é bem mais bonito
que os de antigamente. E você está ainda mais linda.
Sorrio sem jeito.
— Esse é o vestido que estou fazendo. — Aponto para o
manequim.
Nos levantamos e vamos até ele. Juan toca o tecido com
cuidado.
— Caramba, Aurora, é lindo. É diferente ver seu desenho
criar vida. Os desenhos de antes nem se comparam a isso. Seu
noivo é um homem de muita sorte.

— Eu que me sinto sortuda por ter Nando na minha vida. —


Encaro o vestido. Logo o estarei usando para entrar na igreja. Esse
pensamento me faz sorrir. — Uns dias são melhores que os outros,
mas em nenhum deles Nando sai do meu lado. Você sabia que foi
ele quem se infiltrou no esquema de leilão pra me salvar?
— Sim, seu tio me contou o que aconteceu. Ele foi muito
corajoso. Esse homem realmente te ama.
— Com licença, desculpa incomodar. — Rosa entra com uma
bandejinha com duas xícaras. — Vocês aceitam um café? — Ela
olha para Juan com curiosidade e interesse.
— Obrigada, amiga — Pego uma xícara e Juan pega a outra.
— Sabia que Rosa veio comigo do México?
— Não sabia. — Quando seu olhar encontra o dela, vejo as
bochechas de Rosa corarem. — Você sente falta do nosso país?
Rosa assente e uma ideia vem à minha cabeça: eu poderia
dar uma forcinha à minha amiga.

— Que tal se saíssemos esse fim de semana, nós quatro?


Posso lhe apresentar a Nando, e tenho certeza de que se darão
muito bem.
— Eu, conhecer seu noivo? — Juan coça a nuca.
— Você não acha uma boa ideia? — pergunto confusa.

— Não, é uma boa ideia sim. Salva meu número aí. Você me
avisa a hora e onde devemos nos encontrar.
Passamos um tempo conversando, com eu sempre incluindo
Rosa. Estou me sentindo uma casamenteira.
— Agora já vou indo. Nem vi as horas passarem. — Juan se
levanta. — Foi um prazer conhecê-la, Rosa.
— Igualmente — diz em voz baixa.
Eu poderia pegar esses dois e colocar em um potinho. É
muita fofura. Será que Juan já notou o interesse dela?
— Vou te levar até a porta.
Juan se despede do restante das meninas e caminhamos
juntos até a entrada.

— Gostei muito de te ver de novo, Juan. A única coisa boa


que conquistei naquele lugar foi sua amizade. Nunca tive a
oportunidade de te agradecer, então farei isso agora. Obrigada por
todos os momentos bons que passamos juntos. Por me fazer rir
quando tudo que queria era chorar com saudade da minha família.
— Não consigo controlar as lágrimas. — Desculpa, ultimamente
ando bem emotiva.
Juan me abraça.
— Não precisa se desculpar. No que precisar pode me
procurar. Sei que tem seu noivo, mas estou aqui como amigo. Não
estou querendo competir com ele nem nada do tipo. Quero que
saiba disso. Se ele te faz feliz, isso me deixa feliz também. Amigos
são assim. — Juan beija minha cabeça
— Obrigada, assim que falar com Nando e combinar nosso
encontro, eu te mando mensagem.
— Ficarei no aguardo. — Ele acena e começa a caminhar.

Volto para dentro da loja e ajudo as meninas a organizarem


tudo para encerrarmos o expediente. No horário exato vejo Nando
entrando na loja. As meninas o cumprimentam ao sair, e pego minha
bolsa e vou até ele.
— Oi, baby. — Me beija. — Pronta pra ir pra casa?

Assinto. Tranco tudo e vamos até o carro.


— Adivinha quem apareceu aqui hoje?
— Quem? — pergunta sem desviar a atenção da estrada.
— Juan.

Pela primeira vez na vida não consigo decifrar sua


expressão.
— Ele veio do México até aqui por qual motivo? Aconteceu
alguma coisa por lá?
— Disse que queria me ver, queria saber que estou bem. Vai
passar um tempo aqui no Brasil. Você tem ciúmes dele? — O
encaro, esperando sua resposta.
— Não — responde rápido demais.
— Apesar de você não acreditar, te asseguro que o que
temos é só amizade. Eu te contei tudo o que passei lá, o quanto ele
me ajudou. Espero que não tenhamos problema.

Nando estende a mão em minha direção e entrelaço nossos


dedos.
— Não teremos problema, eu te garanto. — Beija minha mão.
— Isso é muito bom, pois iremos fazer um encontro duplo
esse fim de semana. — Ele me olha rapidamente.
— Como que ele chegou hoje e já tem um encontro com
alguém?
— Rosa se interessou por ele, então dei uma ajudinha. Minha
amiga é bem tímida, mas seu jeito de olhar pra ele, até o jeito de
falar, deixou evidente o interesse.
— Eu gostei disso. — Nando sorri.
— Imaginei que diria isso, senhor Fernando. — Cutuco sua
costela e ele ri. — Propus um encontro duplo e os dois aceitaram. O
bom é que você já irá conhecê-lo e ver como ele é uma pessoa
especial.
— É a primeira vez que farei isso, e espero que não seja
constrangedor.

— E por que seria? São dois casais de amigos saindo juntos.


Precisamos dar uma forcinha pra Rosa. Tenho certeza de que os
dois farão um ótimo casal. Como foi o restante do trabalho?
— Foi normal. — Dá de ombros.
Nando estaciona na garagem de nossa casa e solta seu
cinto, se vira para mim e sorri.
— Você está feliz? — Levo minha mão até seu rosto.

— Estou, porque apesar de tudo o que aconteceu, ainda


estamos juntos. Eu te amo, minha Aurora. Sei que se voltasse em
outra vida iria te procurar pelo mundo até te encontrar novamente.
Meu celular vibra em cima da mesa e vejo que é uma ligação
de Dulce. Deslizo o dedo sobre a tela e encosto o celular no ouvido,
segurando-o com o ombro, pois minhas mãos estão ocupadas.
— Alô, mãe, tudo bem?
— Oi, minha filha. Estou bem sim, e você, como está se
sentindo hoje?
— Estou bem. Aconteceu alguma coisa?

— Eu tenho uma novidade pra te contar, só que não quero


fazer isso por telefone. Teria como você e Nando virem jantar
comigo hoje?
— Você vai me deixar curiosa até a noite? Que maldade.
Ouço ela rir.
— É por um bom motivo. Coisas importantes temos que falar
pessoalmente. Vocês dois vêm?
— Eu preciso confirmar com Nando, mas creio que ele não
tenha nada combinado pra hoje à noite. Vou falar com ele e já te
mando mensagem confirmando, tudo bem?
— Sem problema, meu amor. Eu te amo, filha, você é a
pessoa mais importante da minha vida. Nunca se esqueça disso.
— Eu também te amo muito, mãe. Beijo.
— Outro.

Coloco a tesoura e os alfinetes em cima da mesa, me sento e


inicio uma chamada para Nando, que no segundo toque já atende.
— Você está bem?
— Estou sim. Respira, Nando.
— Desculpa, é que você dificilmente me liga durante o
expediente.

— Estou atrapalhando? Podemos conversar quando vier me


buscar.
— Não, baby, eu não quis dizer isso. Pode falar, você nunca
me atrapalha.
— Minha mãe quer que a gente vá jantar com ela essa noite.
Falei que veria com você primeiro pra poder confirmar.

— Por mim não tem problema. O curioso é que nosso pai me


contou agora há pouco que ela também convidou os dois para
jantarem. Acho que deve ser algo muito importante.
— Ela parecia animada, deve ser coisa boa.

— O que você acha que é?


— Não faço ideia. Se bem que ultimamente ela anda mais
feliz, mais sorridente.

— Deve ser namorado.


— Seu lado fofoqueiro já desperta, né, Fernando? —
provoco.
— Eu não sou fofoqueiro.

— É sim, todo homem é. Vocês são piores que as mulheres.


— Que absurdo acabei de ouvir. Agora preciso ir, tenho que
criar algumas teorias com nosso pai.
Nós rimos.
— Até mais tarde, te amo.

— Até, minha Aurora. Eu também te amo muito.


Encerro a ligação e mando mensagem para minha mãe
confirmando nossa presença. Será mesmo que após todos esses
anos dona Dulce está amando alguém? Se sim, espero que seja
uma pessoa boa.

Assim que Nando estaciona em frente a casa de Dulce, vejo


o carro de nosso pai já parado a poucos metros. Estou nervosa,
ansiosa e sinto minha barriga doer e minhas mãos suarem. Já
pensei em tantas possibilidades. E se minha mãe ainda tiver o dedo
podre para homens e se apaixonar por outro bandido? Nem quero
pensar nisso.
— Pelo jeito somos os últimos a chegar — comenta Nando.

— Eu precisava comprar algo pra trazer. Não queria vir de


mãos abanando. — Levanto a torta de limão que está em meu colo.
— A favorita de nosso pai.
— Eu sei. Não estou reclamando, baby, foi só um comentário.
— Nando solta o cinto e me dá um selinho. Encaro a entrada da
casa. — Vamos, estou curioso pra saber qual é a novidade.
— Espera — digo antes que ele saia. Nando me olha sem
entender. — E se for mesmo um novo namorado e ele não gostar de
mim? Ou pior, se ele for como Miguel?
Nando coloca uma mecha de cabelo atrás da minha orelha.

— É impossível alguém não gostar de você. Você é a pessoa


mais legal do mundo. — Não consigo conter o sorriso. — E
sinceramente, acho que sua mãe já sofreu demais. Ela não iria
namorar alguém que lembrasse o traste. E nem sabemos se é isso
mesmo. Quanto mais demorarmos pra entrar, mais vai demorar pra
descobrirmos. Sua mãe é uma mulher incrível, Aurora. Ela nunca
colocaria alguém de índole duvidosa em sua vida.
— Você tem razão. Vamos entrar e descobrir. — Solto meu
cinto e dou um selinho em seus lábios.

— É assim que se fala. Estou doido pra saber o que é.


Saímos do carro e ao chegarmos em frente a porta,
conseguimos ouvir os três rindo. Um sorriso se forma em meu rosto
e olho para Nando, que também sorri. Esses três se dão tão bem
que nem parece que um dia foram inimigos.

— Pronta? — pergunta ele, segurando minha mão.


— Pronta.

Com a mão livre, Nando bate na porta. Logo ela é aberta e


vejo o quanto minha mãe está radiante. Seus olhos brilham
intensamente, felizes. A cumprimento com um beijo no rosto e
Nando faz o mesmo. E então entramos. Cumprimentos nossos pais
e percebo que não há mais ninguém na casa, pelo menos por
enquanto.
— Trouxe torta de limão! — Entrego a caixa.
— Puxando o saco do seu pai, Aurora? — pergunta Manu.
— Claro, eu sou o preferido. — Caio estufa o peito. —
Obrigado, filha.
— Tão convencido. — Dulce revira os olhos. — Vocês
querem beber alguma coisa? Vou levar a torta pra geladeira e já
pego.

Olho para Nando, que recusa.


— Por enquanto não, mãe, obrigada.
Assentindo e ela se retira. Nos sentamos ao lado deles no
sofá.
— Ela já disse alguma coisa? — pergunta Nando.

— Ainda não. Chegamos aqui faz uns dez minutos —


responde Caio. — Se for namorado novo, você me deve cem reais.
— Se não for nada relacionado a isso, você que me deve. —
Nando estende a mão e Caio a aperta, concordando.
Manu e eu olhamos para os dois surpresas.
— Não acredito! — A voz de Manu sai um pouco mais alta.
— Não acredita no quê? — questiona Dulce, entrando na
sala. Manu sorri sem jeito.

— Não acredito que não pensei em trazer uma sobremesa


também.
Os dois homens se entreolham e sorriem. Esses dois são
terríveis!
— Não tem problema, eu fiz um pudim e um brigadeirão.
Claro que nem se comparam com os doces deliciosos que você faz,
mas tenho certeza de que estão comestíveis. — Dulce se senta em
uma poltrona. — Eu quero muito agradecer por terem vindo. Vocês
sabem que amo cada um e que vocês são minha família. Sou muito
grata por terem me acolhido mesmo depois de ter errado tanto.
Vocês me mostraram como é se sentir acolhida e amada, por isso
quero compartilhar essa novidade com vocês. — Ela para ao ouvir
um barulho de carro sendo estacionado. — Só um momento.
Dulce se levanta e sai fechando a porta.
— Falei que era namorado! — Caio diz, animado.
— Só espero que seja uma pessoa decente. Dulce merece
um homem de verdade. — Todos balançamos a cabeça,
concordando com Manu.

Aperto a mão de Nando e sinto que meu coração vai sair pela
boca a qualquer momento. A porta é aberta.
— Eu quero apresentar a vocês meu namorado — diz,
apontando para o lado, e eu mal posso acreditar quando vejo Ivan
entrar.

Caio é o primeiro a falar.


— Bem-vindo à família, Ivan.
Minha mãe está namorando o detetive que a salvou anos
atrás; o mesmo que foi junto com eles até o México me resgatar.
Solto o ar que nem percebi que estava segurando. Isso é
maravilhoso!
— Boa noite. E obrigado pela recepção. — Ele envolve o
braço na cintura da minha mãe e ela sorri para ele com os olhos
brilhando.
Ivan, apesar de já ter uma idade mais avançada, ainda é
muito bonito. Dá para ver que cuida do corpo e da aparência, e que
sempre está impecável. Me pergunto quantos anos de diferença os
dois têm. Se bem que o amor não tem idade, e se minha mãe está
feliz, eu também estou. Me levanto e vou até eles.
— Tenho que dizer que estava com medo de ser um homem
que não fosse digno dela — digo. — Ou que fosse como Miguel.
Mas estou feliz em saber que é você o felizardo a conquistar esse
coração. Posso te abraçar?
Minha mãe se afasta quando Ivan assente.

— É muito bom ter sua aprovação. Sua mãe é importante pra


mim e sei o quanto você é importante pra ela.
Sinto, no fundo do meu coração, o quanto ele está sendo
sincero. Ao me afastar, Nando e nossos pais se levantam e o
cumprimentam. Vou até minha mãe a abraço forte.

— Estou feliz por você, mãe. Você merece toda a felicidade


do mundo.
— Obrigada, filha. Nunca na minha vida me senti tão amada
e bem cuidada. É a primeira vez que encontro um homem bom que
me ama como eu sou.
— Quantos anos vocês dois têm de diferença? — pergunta
Caio e ouço Manu o repreender. — É só por curiosidade.
Olho para Nando e não consigo segurar o riso. Claro que
todos pensamos nisso, mas só ele teve coragem de perguntar.

— Quando nos conhecemos, Ivan tinha quarenta e um e eu


vinte e quatro. Hoje ele está com sessenta e cinco e eu, quarenta e
oito. São dezessete anos de diferença. Mas Ivan ainda dá um caldo.
— Minha mãe o abraça. — Vamos todos nos sentar. — Aponta para
o sofá. — Você quer beber alguma coisa, meu amor?
— Não, minha linda, obrigado. — Beija sua testa.
O carinho entre os dois é notável, tanto pelo jeito de se
olharem como na forma de falar um com o outro.

— Isso é tão lindo de se ver — comenta Manu.


— Tenho que confessar a vocês que nossa história não
começou agora. — Olhamos para ela surpresos. Ivan balança a
cabeça, confirmando. — Você se lembra das primeiras palavras que
trocamos?
Ivan assente.

— Eu disse: “Eu sou Ivan e vou te ajudar. Tenta se manter


acordada, já solicitei uma ambulância”. Tirei o lenço do meu bolso e
pressionei onde a bala havia acertado. Você estava tão magra e
abatida. Eu queria cuidar de você desde aquele momento.
Estou segurando as lágrimas que querem cair. Imaginar
minha mãe com uma barriga enorme passando fome, sofrendo
maus-tratos, me corta o coração.

— E eu te pedi pra salvar a minha filha, porque ela não tinha


culpa de nada. Fiz prometer que se eu morresse, você pediria a
Manu que cuidasse dela. E você prometeu e ainda me pediu pra
tentar guardar forças pois minha filha precisava de mim viva. — Ivan
limpa suas lágrimas e eu já não controlo as minhas.
— Eu visitei Dulce no hospital pra saber como estava. Vi
Aurora recém-nascida. — Seu olhar encontra o meu. — Sempre foi
linda, uma verdadeira princesa. Quando Dulce foi presa, a visitei
algumas vezes e confessei a ela o que estava sentindo. Mas foi aí
que ela me afastou. — O brilho foge de seus olhos.

— Eu não queria que ele passasse todos aqueles anos me


visitando na cadeia. Eu já o amava e queria o melhor pra ele. Queria
que Ivan arrumasse uma mulher boa e honesta, construísse uma
família. A família que me contou várias vezes que gostaria de ter.
— Mesmo não querendo, respeitei seu pedido e me afastei
dela, mas nunca a esqueci, e olha que nem havíamos nos beijado
ainda. — Os dois sorriem. — Depois disso, fiquei mais tempo fora
do Brasil pra tentar me distrair, e quando Nando foi atrás de mim e
me contou o ocorrido, entrei em pânico, pois sabia o quanto Dulce
estaria desesperada. Quando nos vimos no México, mesmo depois
de tantos anos, eu senti tudo novamente. Aquele amor, a sensação
de estar onde deveria estar.
Nando aperta minha mão e deito minha cabeça em seu
ombro. Eu nunca imaginaria tudo isso.
— Ali naquela semana voltamos a nos aproximar. Ivan mais
uma vez me mostrou como é me sentir cuidada e amada. Depois
que voltarmos para o Brasil, conversamos e decidimos dar uma
chance a nós dois. E aqui estamos, firmes e fortes abrindo nossos
corações a vocês. Nunca nos importamos com a diferença de idade.
Ivan é o homem da minha vida e eu quero passar todos os meus
dias ao seu lado.
Ivan se levanta e se ajoelha. Todos olhamos para ele na
expectativa.
— Eu também quero isso. — Pega uma caixinha no bolso e
abre, mostrando um lindo anel. — Ia esperar até o fim do jantar, mas
não posso esperar nenhum minuto a mais. Dulce Sanchez, nunca é
tarde pra viver um amor. Você aceita se casar comigo e me fazer o
homem mais feliz da face da terra?

Deus, minha mãe está sendo pedida em casamento?!


— Sim. Sim. Sim — ela repete essa pequena palavra várias
vezes. E a cada sim dito o sorriso de Ivan aumenta mais e mais.
Após parabenizarmos os noivos, minha mãe nos conduz até
a cozinha. Antes tinha uma mãe e um pai, agora terei dois de cada.
É bom demais para ser verdade.
— O que você acha de nos casarmos daqui a dois meses? —
pergunta Ivan a minha mãe. Ela segura sua mão sobre a mesa e o
jeito dos dois se olharem faz meu coração se derreter todo.

— Por mim está ótimo. — Ela lhe dá um beijo rápido. — Dará


tempo de organizar tudo.
— O bolo e docinhos serão por minha conta — diz Manu,
animada. Para mim não é surpresa alguma. O que ela puder fazer
para ajudar minha mãe nesse dia tão especial, ela fará sem medir
esforços. — Eu mesma farei tudo. Será uma grande honra. Faz
tanto tempo que não trabalho em um projeto desse. Ultimamente só
supervisiono. Estou precisando colocar a mão na massa ou ficarei
enferrujada.
— Muito obrigada, minha amiga. Eu nunca pensaria em outra
pessoa pra fazer meu bolo. Nunca imaginei que planejaria meu
próprio casamento. A minha ficha ainda não caiu, é muita felicidade
pra uma pessoa só.

Ivan beija sua mão que está com a aliança.


O carinho que ele a trata mesmo na frente de outras pessoas
é de deixar qualquer um encantado. Conheço muitos homens que
não gostam de demonstrar afeto na frente dos outros, mas não os
homens dessa família. Caio, se pudesse, não deixaria Manu colocar
os pés no chão; em vez disso, ele mesmo a carregaria. Já Nando...
Eu nem tenho o que dizer sobre ele. Não importa o lugar ou a hora,
se ele quiser me beijar ou me confortar, e se sentir que estou
precisando disso, ele fará sem pensar duas vezes. E posso ver que
Ivan não é diferente.
— Quero que o casamento saia do jeito que sempre sonhou,
meu amor. Você tem carta branca pra planejar e escolher tudo.
Quero que esse dia tão especial pra nós seja perfeito.
— Eu vou querer sua opinião. Planejaremos tudo juntos.
Somos uma equipe.
— Sim, nós somos — diz ele sorrindo.
A vida é tão imprevisível. Nunca imaginei que entre esses
dois existisse um amor tão grande. Um amor que resistiu a mais de
vinte anos separados. Isso só demonstra que um amor verdadeiro
nunca morre. Ele pode ficar adormecido, mas sempre estará ali. A
vida pode dar voltas e mais voltas, mas quando é para acontecer, os
caminhos sempre se cruzam novamente.

Após terminarmos de comer a sobremesa, ajudamos a


arrumar a cozinha. Não tinha como nossa noite ficar ainda melhor.
Cheguei aqui cheia de medo e insegurança e agora estou indo
embora com o coração transbordando de amor e felicidade.
— Adorei nosso jantar, mãe. — A abraço. — Muito obrigada
por tudo. A comida estava deliciosa e passar esse tempo junto com
vocês me fez muito bem.

— Obrigada você por ter vindo. E sempre que quiser


aparecer, sabe que as portas estão abertas. Você é e sempre será a
pessoa mais importante da minha vida. Nunca se esqueça disso. Eu
te amo muito.
— Eu também te amo, mãe. — Ela beija minha testa. Vou até
Ivan e o abraço. — Obrigada por proporcionar tanta felicidade à
minha mãe. Tenho certeza de que cuidará muito bem dela.

— Obrigado por me aceitar na família. Tudo o que quero é


cuidar dela até meu último dia de vida. Boa noite, Aurora.
— Boa noite, Ivan.

Após todos se despedirem, cada um vai para seu carro.


Nando mexe no celular rapidamente e depois me entrega, e não
demora para uma mensagem chegar. Assim que leio, não consigo
conter o riso.
— Nosso pai está agradecendo por ser um homem de
palavra e realizar a transferência dos cem reais. — O carro deles
passa ao nosso lado e Caio buzina antes de acelerar. — Não existe
ninguém como ele. Caio é único.

— Pode ter certeza que é. Não existe um pai melhor. —


Balanço a cabeça concordando. — Agora vamos pra casa, baby.
Estou doidinho pra ficar deitado abraçado a você. — Ele me dá um
selinho e liga o carro.
Já de cabelo e maquiagem prontos, agradeço as meninas e
elas sorriem e se retiram. Pedi para que assim que terminassem,
me dessem um tempo sozinha. Me levanto da penteadeira e encaro
meu vestido de noiva, que está no manequim. Ele está tão lindo, do
jeitinho que imaginei. Não tinha como escolher outro modelo. Me
imaginei em um estilo sereia ou até mesmo evasê, mas meu sonho
desde criança sempre foi ter um vestido de princesa, e foi esse que
fiz. O vestido dos meus sonhos.
A saia de tule é longa e volumosa e o decote é feito com
tecidos quase transparentes e dá a ilusão de que é maior. O que se
destaca no decote e nas mangas que terminam na altura do
cotovelo são as rendas delicadas no formato de pequenas rosas.
Me deu tanto trabalho, mas valeu muito a pena. As mesmas rendas
cobrem o busto justo e a cintura alta marca bem meu corpo. Espero
que Nando goste do vestido, pois estou apaixonada por ele.
Esses dias foram tão corridos. Tive que conciliar a loja, os
vestidos e as sessões de terapia. Não faltei nem um dia, sempre no
horário certo estava lá em frente ao consultório. Ainda estou sem
acreditar que consegui terminar tudo a tempo. Também tive que
fazer o vestido de Rosa às pressas. Já a tinha convidado para ser
minha madrinha antes, mas como não gostava de se aproximar de
nenhum homem, não conseguimos escolher um para ser seu par.
Mas isso tudo mudou durante esses dias que se passaram. Após
nosso encontro duplo, Juan passou a buscá-la todos os dias no
trabalho. Ela sempre me conta como ele é um cavalheiro, sempre a
trata com respeito e carinho. Ainda estão se conhecendo melhor,
mas sei que em breve a amizade virará algo mais. Meu plano deu
muito certo.
Tantas coisas aconteceram desde aquele beijo, desde que
Nando demonstrou que o que sentia por mim não era apenas amor
de irmão. Eu pensei que não viveria isso, não viveria esse momento
tão especial. Tenho que me segurar para não chorar e correr o risco
de estragar a maquiagem. Batidas na porta me tiram de meus
pensamentos e aos poucos ela vai se abrindo.
— Filha, viemos te ajudar a colocar o vestido — diz Manu ao
entrar acompanhada de Dulce.
As duas param por um momento e me encaram. Será que
estou com cara de choro ou já estraguei a maquiagem? A resposta
vem quando os olhos das duas se enchem de lágrimas. Elas só
estão emocionadas.

— Você está tão linda! — Dulce limpa o canto dos olhos.


— Uma verdadeira princesa — complementa Manu.

E mais uma vez a emoção me toma e a vontade de chorar


volta. Vou até às duas e às abraço. Eu tenho as melhores mães do
mundo.
— Estou lutando pra não chorar, mas vocês não estão
ajudando. — Minha voz sai embargada. — Eu amo vocês.

— Nós também te amamos.


As duas se afastam e cada uma com bastante cuidado limpa
um lado do meu rosto onde as lágrimas rolam. Fecho os olhos
sentindo o carinho que vem delas. Felicidade é o que me define
hoje.
— Agora vamos colocar esse vestido que logo temos que ir
para a igreja. — Dulce vai até o manequim e começa a retirar o
vestido com a ajuda de Manu.

Coloco um pé após o outro dentro do círculo que se forma


quando abaixam o vestido aberto e com cuidado vão subindo.
Encaixo primeiro o braço do lado de Manu, que sorri quando
termino, e em seguida o lado de Dulce, que mesmo com as lágrimas
rolando, sorri.
— Mãe, assim ficará com a maquiagem toda borrada.

Levo minha mão ao seu rosto e as enxugo enquanto Manu


fecha os botões do vestido.
— Por muitos momentos em minha vida, tive medo de não
conseguir viver esse momento com você, minha princesa. — Ela
toca a delicada coroa em minha cabeça. — Mas agora vou parar de
chorar. Vamos apenas sorrir porque hoje é dia de felicidade. Você
enfim irá se casar com o homem da sua vida.

— Sim, e voltará a se chamar Aurora Alves. — Manu para à


minha frente. — Agora que já está pronta, vamos indo que daqui a
pouco seu pai vem te buscar. Tenho certeza de que todos irão se
impressionar quando virem o quão linda você está. Eu tenho muito
orgulho de você, minha filha. Muito mesmo. — Beija minha
bochecha.
— Eu que tenho orgulho de chamar vocês duas de mãe. As
melhores mães do mundo.

Novamente sozinha, me olho no espelho com um grande


sorriso no rosto. Minhas mãos tocam o corpete e depois a saia.
Ficou do jeito que eu queria. Está perfeito em meu corpo. Dou uma
voltinha e vejo pelo reflexo a saia girar.
— Eu jurei que não iria chorar.
Olho para a porta e vejo Caio enxugando as lágrimas. Não é
porque é meu pai, mas ele está lindo nesse terno preto. É raro vê-lo
em roupas sociais. Se sou uma princesa, ele com certeza é o rei. As
lembranças de quando era criança tomam minha mente. As
brincadeiras, as bagunças, as várias vezes que Manu proibia Nando
e eu de comermos doce antes do jantar e Caio sempre dava um
jeitinho de nos dar escondido. Lembro do dia em que fomos pegos
em flagrante, os três com as caras lambuzadas de chocolate.
Apesar de ter achado engraçado, Manu deu uma bronca nele e
deixou nós três de castigo uma semana sem sobremesa. Essas
lembranças são tão boas. Minha vida com essa família sempre foi
boa. Nunca me faltou amor, cuidado e carinho.
— Não tenho palavras pra descrever como estou
impressionado. Você está linda, filha. — Ele vem em minha direção
e para a poucos centímetros. — Tenho medo de te bagunçar. Não
sou delicado, você sabe disso.
— Pai, me abraça logo!
Seu sorriso se alarga. Caio me envolve em um abraço
apertado. Sempre amei esses abraços de urso dele, que me
envolvem e me fazem querer ficar para sempre na proteção de seus
braços.

— Você sempre foi a menina dos meus olhos. — Espero que


essa maquiagem seja a prova d'água ou sairei daqui igual um
panda. — Quando descobri que Manu estava grávida de um
menino, fiquei muito feliz, mas ainda queria tentar ter uma menina.
Aí você chegou pra completar a nossa família. Eu apoiei Manu
quando decidiu te adotar e não me arrependo disso. Nunca. Nem
por um mísero segundo me arrependi.
Aperto meu pai em meus braços. Não consigo falar, as
lágrimas caem uma após a outra. Sinto tanta gratidão e amor por
esse homem, um amor tão forte. Caio com certeza é o melhor pai do
mundo, nenhum outro chega aos seus pés.
— Eu amo muito você. Obrigada por nunca desistir de mim.
Você sempre foi um pai perfeito: atencioso, alegre, e carinhoso do
seu jeito. — O ouço rir. — Sempre que me via desanimada, fazia
palhaçadas pra me fazer rir. Mas quando precisava, chorava junto
comigo. Assim como Manu e Nando, você sempre foi meu
companheiro.
Caio se afasta um pouco e segura minhas mãos. Seu rosto
está coberto de lágrimas e ele sorri daquele jeito que sempre me faz
pensar se tem alguém nesse mundo que não se encantaria por esse
sorriso.

— Se sua maquiagem borrar sua mãe vai me matar.


Nós rimos.
— Não vai, não. Ela não consegue viver sem você. — Levo
minhas mãos ao seu rosto e limpo suas lágrimas.
— E eu não consigo viver sem ela. E sei que Nando não
consegue viver sem você.
Seu comentário me faz sorrir, pois me sinto do mesmo jeito.
Não consigo viver sem meu Nando.
— Nunca imaginei amar Nando como homem, e quando isso
aconteceu, fiquei com tanto medo de não gostarem, de acabar
decepcionando vocês.

— Você nunca nos decepcionou, filha. Posso lhe garantir


isso. — Caio me olha com tanto carinho que sinto vontade de
abraçá-lo novamente e nunca mais o soltar. — Meus bens mais
preciosos são vocês. Nossa família é minha base. Se sou o que sou
hoje é porque tenho vocês ao meu lado. — Beija minha testa. —
Agora vamos, antes que sua mãe comece a me ligar perguntando
se já estamos chegando na igreja.
Pego meu buquê de tulipas vermelhas e entrelaço meu braço
no dele. Caio me ajuda a entrar na limusine e segura a minha
durante todo o percurso. Quando o carro é estacionado em frente à
igreja, sinto meu coração acelerar.
— Chegou a hora de voltar a ser Aurora Alves. Está pronta,
filha?
Olho para meu pai e sorrio.
— Mais pronta que isso é impossível!
A igreja está cheia, não tem um lugar vazio. Fecho minhas
mãos e sinto o quanto estão suadas. Estou louco para ver como
Aurora está vestida, ela me falou tanto desse vestido que já o
imaginei várias vezes. Mas tenho certeza de que não vai se
comparar com o que irei ver quando aquelas portas se abrirem.
Meus olhos estão marejados e um filme parece passar em minha
cabeça. Passamos por tantas coisas para chegarmos até aqui. Do
nosso primeiro beijo até esse momento foram tantos altos e baixos.
Eu fiz coisas que nunca imaginei, entrei em um mundo sombrio e
perigoso, fui a lugares que só de me lembrar me causam repulsa,
mas sei que faria tudo de novo sem pensar duas vezes só para
poder salvar o meu amor.
As coisas estão indo bem entre nós dois e entre nossa
família. Ela não tem mais pesadelos e dificilmente a vejo chorar.
Agora só faz isso quando vê um filme romântico ou um drama — e
eu os evito exatamente por isso. Sempre sugiro uma de comédia ou
ação, pois prefiro mil vezes suas risadas gostosas que sempre
atingem meu coração em cheio, a ver seus lindos olhos azuis
vermelhos com as lágrimas.
Minha Aurora está voltando a ser a de antes, e isso enche
meu peito de felicidade. A dúvida de como será nossa lua de mel
vem à minha cabeça. Será que ela vai se entregar a mim? Será que
irá me deixar tocá-la? Não importa se fizermos amor ou se apenas
dormirmos juntos, será perfeito. Eu só preciso dela, da minha outra
metade ao meu lado. Só com Aurora me sinto completo.
Meu coração acelera no momento em que a marcha nupcial
começa a tocar. Olho para minha mãe, que sorri largamente, e o
mesmo sorriso está estampado no rosto de Dulce, que está ao seu
lado. Sentindo o coração quase sair pela boca, encaro as grandes
portas de madeira. Inspiro e expiro. Não posso ter um troço logo
agora. Quando enfim as portas se abrem, parece que o mundo está
em câmera lenta. Aurora está perfeita! Admiro cada detalhe, desde
sua coroa até a renda de seu vestido. Está parecendo uma
verdadeira princesa. Poderia parar o mundo nesse momento só
para admirá-la um pouco mais.
Minhas bochechas estão molhadas e as lágrimas caem sem
que eu perceba. E mesmo estando emocionado, sorrio quando o
olhar de Aurora encontra o meu. Ela vem lentamente em minha
direção, acompanhada por nosso pai, e nesse momento queria
poder correr até ela e me ajoelhar aos seus pés. Aurora parece
resplandecer. A igreja luxuosa e bem decorada nem se compara
com a beleza de minha princesa. Minha Aurora. Ela sempre foi
minha desde o dia em que nascemos. Foi minha amiga, minha irmã,
minha amada e agora mais do que nunca, minha mulher.
Nosso pai beija sua testa e com um grande sorriso a entrega
a mim. Olho em seus olhos e parece que estou preso em um transe;
na intensidade de seu olhar e no quanto ele expressa o seu amor
por mim. O mesmo amor que corre em minhas veias e pulsa em
meu coração, que toma cada pedacinho do meu ser, que me faz
pensar nela da hora que acordo até a hora de dormir, e que me faz
sorrir sempre que a vejo focada enquanto se empenha em criar
novos desenhos, ou quando começa a cantarolar uma de suas
músicas favoritas enquanto cozinha.
— Você parece não ser real — enfim consigo dizer algo.
— Você também está lindo — diz e sorri.

Segurando sua mão, nos viramos para o pastor. É iniciada a


cerimônia e cada palavra dita, cada frase de amor que sai de sua
boca, me faz ter mais certeza de tudo. Certeza de que isso é o certo
para nós. Vez ou outra olho para Aurora e vejo seus olhos brilharem.
Sinto uma vontade enorme de beijá-la, mas tenho que esperar o
momento certo. É chegada a hora dos votos e nos viramos um para
o outro. Estou tremendo muito e espero poder mostrar em palavras
o tamanho do amor que sinto aqui dentro.
— Meu amor, minha Aurora, aqui diante de todas as pessoas
importantes de nossas vidas, eu prometo sempre te honrar e
proteger. Ser seu amante, amigo, seu porto seguro. Estar ao seu
lado quando sorrir e te abraçar forte quando as lágrimas vierem a
rolar em seu lindo rosto. — Respiro fundo. — Sempre estarei ao seu
lado e não importa o que aconteça nessa estrada da vida, você
sempre poderá contar comigo. É difícil acreditar que com tantas
opções no mundo, você tenha escolhido a mim para amar. O que
estou querendo dizer, resumindo em poucas palavras, é que não
existe Nando sem Aurora. Eu amo você. — Sorrimos em meio às
lágrimas e eu deslizo a aliança de ouro em seu dedo e beijo o
pequeno círculo dourado.

Eu sei que isso não é nem um terço do que tenho a dizer a


ela, mas estou feliz por ter conseguido expressar em poucas
palavras o meu amor.
— Fernando, eu não sei ao certo por onde começar. Você é a
pessoa que mais me conhece em todo o mundo. Consegue me
entender em apenas um olhar. A ligação que temos é tão grande e
sinto aqui dentro — aponta para o próprio peito — que a cada dia
que se passa fica ainda maior. Não consigo imaginar minha vida
sem você. Não consigo pensar em não ouvir sua voz pela manhã ou
ver o seu sorriso ao despertar. Eu me senti afogar em um mar
gelado e profundo, e na escuridão imaginei que seria meu fim. Mas
sem pensar no perigo, você se lançou nele; foi o mais fundo
possível e segurou minha mão e me levou de volta à superfície.
Obrigada por ser exatamente assim. Por nunca desistir de mim. De
nós. Também não existe Aurora sem Nando. Eu também amo você.
— Ela coloca a aliança em meu dedo.
Suas palavras tocam minha alma. Olho para minha esposa,
na esperança do pastor terminar a cerimônia e enfim poder beijá-la.
— Eu os declaro marido e mulher. Pode beijar a noiva.
— Aleluia! — digo baixinho e Aurora sorri.
Com uma mão, seguro seu delicado rosto e envolvo um
braço em sua cintura para beijar minha mulher. Um beijo calmo e
cheio de sentimento. E mesmo com as palmas e assovios, limpo
minha mente e foco apenas nos lábios de minha amada. O mundo
parece estar em silêncio e só existe nós dois e esse beijo.
— Esperem a lua de mel! — Ouço a voz de nosso pai.

Nos afastamos rindo e eu beijo sua testa. Seguro sua mão e


nos viramos para os convidados, que agora estão de pé batendo
palmas sem parar. Começamos a caminhar e Aurora não tira o
sorriso do rosto, e para dizer a verdade, eu também não.

Entramos no grande salão que, assim como a igreja, está


todo decorado com tulipas brancas. Vamos até a mesa onde um
grande bolo de cinco andares se destaca. Minha esposa olha com
admiração cada detalhe da linda mesa de doces e eu encaro o bolo.
A semelhança na renda desenhada é incrível. Parece que tiraram
um pedaço do vestido de Aurora e cobriram o bolo.
— Sua mãe arrasou, não foi? — Me viro para nossos pais.
Dulce e Ivan estão com eles. — Sua mãe é a melhor confeiteira do
mundo — diz meu pai, com orgulho.
— Com certeza ela é.
— Podem parar, vocês dois. Assim ficarei com vergonha. —
Meu pai beija sua cabeça. — Agora venham aqui que quero
parabenizar o casal. Meus filhinhos estão oficialmente casados.
Abraço minha mãe enquanto Aurora abraça Caio. A felicidade
é tanta que parece que meu peito vai explodir a qualquer momento.
— Você sempre foi a melhor mãe do mundo. — A ouço
fungar. Me afasto e beijo sua testa. — Obrigado por ter trazido
Aurora pra nossa família.
— Você não precisa me agradecer por nada. Eu que sou
grata por ter dois filhos maravilhosos. Não trocaria vocês por nada
nem ninguém.
Sorrindo, ela vai até Aurora e a abraça.

— Agora chegou minha vez. — De braços abertos, meu pai


se aproxima.
Seu abraço é sempre tão forte. Será que Aurora também
sente isso? A proteção. Parece que nosso pai cria uma barreira
entre mim e o mundo, como se aqui em seus braços fosse o lugar
mais seguro do planeta. Sempre senti isso desde pequeno.
— Nem acredito que agora estão casados. Sinto muito
orgulho de você, filho. Você se tornou um homem exemplar, o
homem que sempre sonhei que se tornaria. — Ele se afasta e sua
mão repousa em meu ombro. — Se um dia me dissessem que meus
dois pimentinhas iriam se casar, eu não acreditaria. Lembro quando
os dois corriam pela casa com os bumbuns de fora.
— Pai, isso é constrangedor! — Aurora faz uma careta.
— Foi mal, é que hoje estou emotivo — diz, limpando as
lágrimas.
— Você só tem tamanho, Caio. — Dulce dá um tapinha em
seu peito e me abraça. — Tenho certeza que será o melhor marido
do mundo. Vocês foram feitos um para o outro. No que precisar,
sabe que pode contar comigo.
— Eu sei. Obrigado por me ajudar naquela situação e por...
você sabe.
Dulce se afasta e dá um leve aceno com a cabeça. Eu
sempre serei grato por colocar um fim naquele maldito. Ivan parece
meio sem jeito. Será que está com vergonha de me abraçar? Ele
estende a mão e eu a seguro e o puxo para um abraço.
— Você faz parte da família, não se esqueça disso.

Nos afastamos.
— Ainda estou me acostumando. Parabéns, Nando, tenho
certeza de que serão muito felizes.
Seguro a mão de Aurora, que está ao meu lado.
— Ei, tem uma fila aqui!

Olho atrás de Ivan e Mari acena animada. Vejo todo o


pessoal: nossos padrinhos, Adam e seus pais, Simone, as meninas
que trabalham na loja, Juan de mãos dadas com Rosa, o que me
deixa ainda mais feliz, e, para a minha surpresa, dois convidados
que nunca imaginei que viriam. Alonzo e Silvana. Olho para Aurora,
que parece tão surpresa quanto eu.
— Eles não vão criar problema. Já conversei com os dois
antes de entrarem — Ivan nos tranquiliza.
Após receber a parabenização de todos os convidados, até
mesmo dos que nos surpreenderam, conduzo Aurora até o centro
da pista de dança e nossa valsa começa.
— Você está bem? Ver eles lhe causou algum mal? —
pergunto baixinho em seu ouvido.
— Estou bem, pode ficar tranquilo. Eles não me atingem
mais. O passado ficou para trás. A partir de hoje só quero olhar para
frente, para nosso caminho juntos. Nosso futuro.
Sua resposta me faz sorrir. Olho em seus olhos e sinto que
posso passar o resto de minha vida aqui na pista, conduzindo minha
amada uma música após a outra.
Nenhuma palavra no mundo conseguiria expressar a
felicidade que estou sentindo. Nando é meu marido e eu sou sua
mulher. Tudo valeu a pena. As lutas, os altos e baixos... Passamos
por tantas coisas juntos que tenho certeza de que nada e ninguém
será capaz de nos separar. O que disse é verdade, quero deixar o
passado para trás e focar em nosso futuro, na família que iremos
construir juntos.
As sessões de terapia me ajudaram muito, deveria ter tido
coragem e começado antes. Não vou dizer que já me esqueci de
tudo, que as lembranças não doem, mas com a ajuda de Daniella,
estou aprendendo a conviver com elas, não estou me deixando
abalar. Um dos ensinamentos dela é que não temos como mudar o
nosso passado, temos que viver o presente, o agora. E tenho muito
o que agradecer. O amor que recebo de minha família e de meu
marido faz tudo ser mais fácil.
Após a cerimônia, passamos em casa somente para trocar de
roupa e pegar nossas malas. Estamos chegando no hotel na cidade
de Canoa Quebrada no Ceará, onde passaremos nossa lua de mel.
Estou nervosa. É como se fosse passar minha primeira noite com
Nando. Já faz tanto tempo desde nossa última vez e saber que ele
esperou e não me pressionou me faz amá-lo ainda mais.
Após fazermos o check-in, um funcionário leva nossas malas
até o quarto onde ficaremos. É grande e bem iluminado, e as portas
da sacada estão abertas. Caminho até elas e admiro a bela vista da
praia. Sinto a brisa do mar acariciar meu rosto e fecho os olhos,
sentindo a paz tomar cada pedacinho do meu ser. Meu marido toca
meus braços e sobe as mãos até meus ombros. E seu toque,
apesar de calmo, faz meu corpo todo arrepiar.

— Eu te amo. — Sinto seu hálito quente em minha nuca. Meu


coração acelera. — Eu te amo, Aurora Alves, minha esposa. —
Beija meu pescoço.
Me perco na sensação de seus lábios quentes contra minha
pele. Sua voz está tão gostosa de ouvir. E essas palavras significam
tanto para mim. Eu sou Aurora Alves, esposa de Fernando Alves, o
grande amor da minha vida, minha outra metade, minha âncora. Me
viro para meu marido e vejo tanto amor em seu olhar. Suas pupilas
estão dilatadas.
— Eu também te amo. — Seguro seu rosto e beijo seus
lábios. Suas mãos seguram levemente minha cintura. Encosto
minha testa na dele. — Eu te amo cada dia mais.
Voltamos a nos beijar e meus braços se envolvem em seu
pescoço. Nesse momento só existe nós dois. Seus lábios descem
até meu pescoço. Estou ofegante e sentindo meu corpo todo
aquecer.

— Nando...
No mesmo instante ele se afasta e vejo o conflito estampado
em seu rosto.

— Desculpa, não quero te forçar a nada. Me deixei levar.


Caminho até a sacada e fecho as portas, e em seguida as
cortinas. Me viro para meu marido, que acompanha cada movimento
meu.
— Eu só ia pedir pra você fechar as portas e apagar a luz. —
Sorrio sem jeito.

— É sério?
Assinto. Nando liga um dos abajures e vai até o interruptor
desligar as luzes. Cada passo que ele dá em minha direção faz meu
coração acelerar mais e mais. Suas mãos seguram meu rosto e olho
em seus olhos.

— Lembra que nossa primeira vez foi em seu quarto


iluminado por sua luminária de Torre Eiffel? — Sua voz sai como um
sussurro.
— Sim.

Seus lábios tocam os meus em um beijo rápido.


— Aquela foi uma das melhores noites da minha vida.

Sorrio, pois também foi uma das melhores da minha. Eu me


sinto pronta. Quero sentir seu carinho, seu toque. Voltar a sentir
nossos corpos se tornando um.
— Nando
— Oi, baby. — Sua voz rouca me arrepia inteira.

— Beije-me. Toque-me. Me ame.


Seus lábios voltam a explorar os meus. Minhas mãos sobem
até seus cabelos e sinto meu corpo pegando fogo. Nando beija meu
pescoço e desce até meu ombro, abaixa uma alça do vestido e em
seguida a outra; e, lentamente, começa a me despir. O vestido cai
no chão e Nando me olha dos pés à cabeça. Automaticamente sinto
a falta de seus lábios em minha pele.

— Você é tão linda. — O dorso de seus dedos toca minha


bochecha. — Minha esposa, minha Aurora.
Nando beija minha testa e suas mãos vão até minhas costas,
abrindo o fecho do sutiã. Ele o tira e deixa na beirada da cama. Só a
intensidade de seu olhar e seu simples toque me deixam ofegante.
Segurando cada lado de minha calcinha, com calma e sem tirar
seus olhos dos meus, vai descendo. Ele segura meus tornozelos e
vai subindo os dedos pelas laterais do meu corpo. Nando beija a
cicatriz em minha coxa e em seguida a de minha barriga. Com ele
de pé à minha frente, seguro sua camisa e a tiro de seu corpo. Ao
terminar de despir meu marido, admiro cada detalhe seu.
O abraço e volto a beijá-lo. Seu corpo está quente, assim
como o meu, e sinto sua ereção em minha barriga. Me pegando em
seus braços, Nando me leva até a cama e fica por cima de mim.
— Eu prometo te amar para sempre — sussurra contra meus
lábios. — Cada dia da minha vida será dedicado a você, minha
Aurora.
Sinto as lágrimas caírem dos meus olhos. E quando seus
lábios encontram os meus, sinto o gosto salgado se espalhar por
minha boca. Sua promessa está sendo selada por esse beijo com
sabor de lágrimas e felicidade. Sua mão toca meu seio e vai
descendo por meu corpo. Quando chega ao meio de minhas pernas,
o ouço suspirar. E esse suspiro arrepia minha espinha. Seus dedos
me tocam com calma, como se ele quisesse prolongar esse
momento.

— Nando — gemo seu nome baixinho.


— Caramba, baby, como eu senti falta de ouvir você
gemendo assim. — Seus dedos começam a explorar toda a minha
intimidade. Curvo minhas costas, perdida no prazer que me
proporciona. — Você me quer?

Mordo meu lábio e balanço a cabeça, confirmando. Seu olhar


me diz tudo. Ele quer que eu fale, quer ouvir as palavras de minha
boca.
— Eu quero você, meu marido. Quero muito.
Nando me beija, mas dessa vez é diferente. Ele mostra toda
a sua fome por mim e retribuo o beijo na mesma intensidade. Seus
dedos param de me acariciar e com seu olhar fixo no meu, sinto-o
se encaixar em mim, indo cada vez mais fundo. Seus movimentos
lentos me torturam da maneira mais gostosa que existe. Meus
gemidos baixos parecem combustíveis para ele.
— Eu te amo, Fernando. — Seguro sua nuca e sussurro em
seu ouvido: — Te amo de alma, corpo e coração.

Seu olhar encontra o meu.


— Eu te amo mais que a mim mesmo.

É como se essas palavras tivessem o poder de me levar ao


limite. Cruzo minhas pernas em suas costas enquanto me entrego
ao prazer que toma cada pedacinho de mim. Nando me beija e
geme contra minha boca. Deveria ser pecado ouvi-lo gemer desse
jeito. Tinha me esquecido de como isso é bom. Sorrindo, ele beija
minha testa e se deita ao meu lado. Me aconchego em seu peito.
— Foi bom pra você? — pergunto em um fio de voz.
Segurando meu queixo, Nando levanta meu rosto.

— Foi perfeito.
Um grande sorriso se forma em meu rosto. Volto a me deitar
e envolvo meu braço em sua cintura. Sua mão faz cafuné em minha
cabeça.
— Baby, como você imagina que estaremos daqui a alguns
anos?
Me apoio em meu cotovelo. Quero dizer tudo olhando do em
seus olhos.
— Imagino nossa família crescendo e crianças correndo pela
casa nos chamando de mamãe e papai. — Nando sorri. Levo minha
mão até seu rosto. — Parece até que consigo ouvir as gargalhadas.
Serão tão boas de ouvir como são as suas. Vejo Caio sendo avô e
mimando seus netos, assim como fazia com nós dois. — Seus olhos
ficam marejados. Tenho que me segurar para não chorar. —
Imagino Manu na cozinha ensinando eles a fazerem seu famoso
cupcake de chocolate. Dulce e Ivan os levando ao parquinho. Ivan
ficará sempre atento ao redor pra mantê-los seguros, enquanto
minha mãe defenderá eles das outras crianças e até mesmo dos
outros pais que ousarem olhar torto pra algum deles.
Nós rimos.

— Dulce com certeza faria isso.


— Sim, ela faria. — Deito minha cabeça em sua barriga. — E
como você imagina?

Nando balança a cabeça.


— Se acontecer do jeito que você imaginou será incrível. Não
mudaria nada. Quero que seja exatamente assim.
Hoje é Páscoa, uma das minhas datas favoritas. Me encaro
no espelho do quarto enquanto penteio o cabelo e sorrio ao ver
Nando acordando. Deixei-o dormir até mais tarde, ele anda
trabalhando bastante. Nando se senta na cama e se apoia nas
mãos, e fico impressionada como fica ainda mais lindo com o passar
dos anos. Seu corpo está com mais músculos. Não é mais um
jovem adulto, agora é um homem feito. Meu homem. Meu marido.
Se já amava aquele corpo três anos atrás, quando o toquei pela
primeira vez, hoje amo ainda mais. Ele pisca ao perceber que estou
encarando seu abdômen e sorrio para ele.
Eu não amo somente seu corpo. Amo sua personalidade,
como me faz sentir, como seu cabelo fica bagunçado quando
acorda; amo o jeito que se alonga flexionando os braços, o jeito que
me olha e me faz sentir desejada logo cedo. E amo ainda mais
quando pega nosso filho nos braços com todo o cuidado, como está
fazendo agora.

— Bom dia! Bom dia! Papai te ama. — Beija a testa de nosso


pequeno Dylan.
O jeito que Nando fala com ele é tão fofo de ver. Ele muda o
tom, parece até outra pessoa. Vou até eles, dou um beijo em nosso
filho e outro nele. Me sento ao seu lado e meu anjinho segura meu
dedo com sua pequena mãozinha. Ainda fico impressionada com
sua perfeição. Apesar de ter apenas quatro meses de vida, ele é
bem esperto. Ama ficar acordado e dificilmente chora à noite.
Demorou um bom tempo para conseguir engravidar. Parece
uma coisa. Quando engravidei pela primeira vez, foi depois de
pouco tempo juntos. Mas confesso que foi muito bom passar todos
aqueles meses tentando. Em toda oportunidade que tínhamos,
Nando e eu tentávamos. Tentávamos em cada cômodo de nossa
casa, no chuveiro, no carro e em toda oportunidade que surgia.
Levou um tempo para superar os traumas, mas depois de nossa lua
de mel, tudo foi voltando ao normal. Ainda fazemos amor de um jeito
carinhoso. Nando me ama intensamente e sempre se preocupa se
estou gostando ou se está passando dos meus limites, e isso me faz
amá-lo cada vez mais.

— Bom dia, meu amor. Você se incomoda quando coloco ele


na cama pra dormir conosco quando estamos aqui na casa de
nossos pais?
— Claro que não. — Me olha e sorri. — Já está pronta para
tomarmos café?

— Sim, só estava esperando você acordar. Nosso pequeno


também está pronto. Todos estão nos esperando. — Nando coloca
nosso filho em meus braços.
— Vou me arrumar rapidinho e descemos. — Beija minha
testa e se levanta.

Sua mãozinha vai até o decote da minha blusa e sei que


alguém quer tomar café primeiro. Enquanto Nando se arruma,
amamento nosso bebê. Amamentação é uma das melhores coisas
que pude experimentar, sinto uma ligação tão forte com ele quando
fica me olhando nos olhos e quando sorri como se estivesse
agradecendo pelo alimento recebido. Mas tenho que confessar que
os primeiros dias foram horríveis. Os bicos dos seios doíam e
ficavam machucados, mas agora já estão bem melhores. Levo
minha mão até seu cabelo. É tão liso quanto o de Nando, mas
loirinho como o meu. E seus olhos são como os nossos, azuis. Seu
nariz é tão perfeitinho, mas é seu furinho no queixo que chama
atenção.
Me lembro do dia em que ele nasceu. Estava fazendo meu
discurso para encerrar o desfile de minha nova coleção quando
senti o líquido escorrer entre minhas pernas. Achei que a dorzinha
que estava sentindo era devido a ansiedade. Felizmente minha
família toda estava comigo; eles haviam ido para me prestigiar em
meu primeiro desfile internacional. Nando queria que eu adiasse por
estar muito perto da data de nosso bebê nascer, mas não quis.
Realmente pensei que daria tempo de ir e voltar. Foi uma correria
só. Nosso bebê nasceu na cidade de Nova York. Quem diria que
nosso pequeno nasceria em outro país?

— Estou pronto. — Nando vem até a cama e estende os


braços. — Me deixa levá-lo?
Coloco Dylan no colo do pai com cuidado. Ele está uma
fofura no macacão que Caio lhe deu de presente. É cinza e o tecido
é tão macio e aveludado, e tem duas orelhinhas de coelho na touca.
Caio disse que era especialmente para ele passar sua primeira
páscoa com a gente. Caio o presenteou com o macacão e Ivan lhe
deu um coelho de pelúcia. Os dois são avôs babões. Tudo o que
nosso pequeno faz é motivo de festa. No dia em que contei a eles
que era um menino, já começaram a fazer planos para o futuro. Me
lembro que Caio chorou na primeira vez que o pegou no colo. Para
falar a verdade, todos nós choramos quando o seguramos pela
primeira vez.

Saímos do quarto e descemos até a sala, onde todos estão


reunidos nos esperando. Estão conversando animados. Rosa está
sentada ao lado do marido, e ao nos ver, Juan sorri. Depois que
começaram a namorar, ele decidiu que ficaria aqui no Brasil, pois
Rosa não queria voltar para o México. E após dois anos de namoro,
eles se casaram. A barriguinha de Rosa já está começando a
aparecer e estou animada para saber qual o sexo do bebê. Ao lado
deles estão Rafael e Mari. Ela se levanta ao nos ver chegar e pega
Dylan dos braços do pai.
— Meu Deus! Que coisinha mais fofa. Esse macacão está um
espetáculo!
— Obrigado, eu sei que tenho um bom gosto. — Caio se
aproxima com um sorriso convencido no rosto. Ao olhar para o neto,
seus olhos brilham. — Ficou perfeito nele, filha. Está parecendo um
bonequinho. — Segura sua mãozinha e leva até seu rosto. — É o
homem mais lindo dessa casa, o sortudo que todas aqui querem
pegar no colo e que consegue fazer todas suspirar.
Rimos de seu comentário. Os anos podem se passar, mas
Caio não muda seu jeito de ser. E eu amo muito isso nele.
— Minha vez de segurar! — diz Camila.
— Ah, mãe! Eu acabei de pegar — resmunga Mari.
— Filha, tem que dividir. — Estende os braços.
— Esse menino nem cresceu e já está fazendo as mulheres
brigarem por ele — diz Ricardo, sorrindo. Ele se vira para Rafael. —
Quando vocês me darão netos? Caio passou na minha frente.

— Pai, isso não é uma competição — repreende Mari e


entrega Dylan a sua mãe.
— Claro que não — concorda meu pai. — Mas se fosse, eu
estaria na frente mesmo.
— Está vendo? Caio fica jogando isso na minha cara. Eu
também quero viver isso.

Meu pai leva a mão ao peito como se estivesse ofendido com


a acusação.
— Que calúnia! Eu nem faço esse tipo de coisa. — Ricardo
estreita os olhos e cruza os braços. — Tá, eu não jogo na cara. É
que meu neto se tornou meu assunto favorito. Quando você tiver um
irá entender.
— Vocês estão vendo?!

Todos riem.
— A mesa já está posta — avisa Manu. — Parem de brigar e
vamos comer.

O braço de minha mãe se entrelaça no meu e sorrio para ela,


que retribui.
— Deixei o carrinho ao lado da mesa pra você deixar o bebê,
caso ele durma.
— Obrigada, mãe. Como foi a viagem?
O brilho em seus olhos já diz tudo. Foi perfeita como todas as
outras. Ela e Ivan estão conhecendo vários lugares do mundo e
nessa última semana eles foram para o Chile. Ivan faz minha mãe
tão feliz que dói pensar em quanto tempo ficaram separados. Como
ele prometeu em cima do altar, estão aproveitando cada minuto
juntos.
Comemos enquanto conversamos em um tom moderado,
pois Dylan está dormindo. Não sei quanto tempo passamos nisso.
Olho para cada um sentado à mesa e me sinto a pessoa mais
sortuda do mundo por tê-los ao meu lado. Amo cada um deles. Ao
ver que meu pequeno acordou, Caio se levanta e o pega no colo.
— Já voltamos. — Sem dizer mais nada, sai da sala de
jantar, levando Dylan.
Será que a fralda dele estava suja e eu não percebi?
— Seu pai está aprontando — cochicha minha mãe,
encarando a porta.
Todos ficamos olhando para a porta na expectativa de saber
o que ele vai aprontar. Não fico preocupada, sei muito bem que ele
não irá fazer nada que possa machucar Dylan ou colocá-lo em
perigo. Se pudesse, meu pai o colocaria em uma bolha só para
mantê-lo a salvo do mundo. Está tão silencioso que conseguimos
escutar os passos se aproximando. Ao ver os dois, rio e sinto meus
olhos se encherem de lágrimas. Uma mistura de risos e suspiros
ecoa no cômodo. Caio está vestindo um macacão igualzinho ao de
Dylan. Em um braço está meu filho, e em outro uma grande cesta
com vários ovos de páscoa. Dylan traz um pequeno ovinho de
chocolate. Ele parece estar encantado com o papel colorido da
embalagem. Quero guardar essa cena para sempre em minha
memória.
— Meu Deus, Caio! — Ricardo cai na gargalhada. — Primeiro
foi Papai Noel, agora coelhinho da Páscoa?
— Estou criando recordações com meu neto. — Caio começa
a entregar os ovos. Na hora de entregar o de Ricardo, diz: — Não
tenho culpa se você não tem um neto pra fazer essas coisas.
Seu comentário faz Ricardo revirar os olhos.
— Vou postar fotos suas na internet.
Caio dá de ombros.

— Pode postar, irá fazer um grande sucesso.


Meu pai entrega Dylan a Nando. Encaro os dois homens da
minha vida, que estão sorrindo um para o outro. Parece que Dylan
está mostrando seu ovinho para o pai. O sorriso de Nando é tão
grande que sinto meu peito se encher de alegria e as lágrimas
começam a cair. Nando me olha preocupado e sua mão vai até
minha bochecha. Sorrio para tranquilizá-lo. Me aproximo mais e
abraço os dois.

— Eu amo vocês. — Beijo meu pequeno e depois meu


marido.
— A gente te ama muito mais — afirma e beija minha testa.
Olhando em meus olhos ele diz: — Tudo isso porque você não
trancou a porta aquela noite, baby.
— Não, Nando. Eu não tranquei. E foi a melhor coisa que fiz
na vida.

Fim...
Uma Nova Chance Para Amar

Quando Matheus Oliveira perdeu sua esposa em um trágico


acidente, três anos atrás, toda a sua vida pareceu perder o sentido e
seus dias agora se resumiam a trabalho e mais trabalho; sem
família, sem amigos, sem ninguém que pudesse remendar seus
cacos e torná-lo inteiro novamente.
Até que em uma entrevista de emprego conhece Isabella,
uma cozinheira linda e talentosa que desperta seu interesse.
Isabella Silva, uma mulher que perdeu os pais ainda criança,
luta com unhas e dentes para se sustentar e conseguir realizar seu
sonho de ser uma chef de cozinha reconhecida. O que ela não
esperava era, no meio do caminho, se apaixonar por Matheus, seu
novo chefe. Um homem que vive imerso na dor do luto.
Juntos eles irão descobrir que o amor pode estar onde menos
se espera.

Meu Melhor Amigo

Amigos desde a infância, Ana e Felipe cresceram juntos e sempre


confiaram tudo um ao outro. Mas desde que ele decidiu se mudar
para a casa ao lado da sua, os sentimentos quase fraternais que
acreditara nutrir por Felipe começam a ser colocados em prova.
Agora eles se veem dia e noite, e essa aproximação, mesmo Ana
tentando reprimir, está mexendo com sua cabeça e seu coração, e
ela vive em um dilema:
Confessar o que sente e arriscar a amizade ou esconder suas
emoções e fingir que ele não é nada além de um amigo para ela?
E quando uma noite de prazer é confundida com um sonho, o que
Ana poderá fazer?
A Melhor Amiga Da Minha Irmã

Noah sabe bem como usar sua beleza e charme para conquistar as
mulheres, e com elas não busca nada além do prazer, pois
aprendeu muito cedo que amar também é sofrer, e que se entregar
a outra pessoa é um risco que jamais voltaria a correr. Anos atrás,
ele se apaixonou, e a única garota que já amou na vida o
abandonou, deixando em seu peito apenas as cicatrizes de uma
paixão interrompida.
Mas quando sua irmã anuncia que Aline, o seu amor da
adolescência, está de volta e formará par com ele como sua
madrinha de casamento, Noah terá de provar para si mesmo que as
muralhas que construiu em torno do coração continuam firmes e que
todos os seus sentimentos estão enterrados dentro dele. Ou então
se renderá mais uma vez à paixão.
Poderão duas pessoas que já se machucaram tanto superarem o
passado para viverem o presente?
Em Suas Mãos

Filha dos donos de uma das maiores redes farmacêuticas do


Brasil, Olivia Ortiz está acostumada com o padrão de vida elevado e
com toda a mordomia que o dinheiro pode lhe dar, mas, ainda
assim, acaba se apaixonando por um rapaz humilde, um atendente
de loja, e com ele iniciando um relacionamento secreto que já dura
quase três anos — contrariando à vontade de seus pais, que
querem para ela sempre o melhor.
No entanto, tudo muda radicalmente quando seu pai decide
fazer um acordo de casamento com a família Morelli, prometendo-a
a seu único herdeiro. Desesperada, Olivia conta o plano a seu
amado, em busca de uma solução, e então planejam fugir juntos e
construir uma nova vida em outro lugar. Ela só não esperava que
Benjamin desistisse tão facilmente do relacionamento. Tomada pela
raiva e pela decepção, ela aceita o casamento arranjado.
Dário Morelli é o solteiro mais cobiçado da Itália. Um típico
playboy que ama uma farra e mulheres. Durante o almoço de
noivado, os dois concordam em manter um casamento de fachada
só para agradar os pais. Mas com a convivência, Olivia conhecerá o
verdadeiro Dário e perceberá que ele é muito mais do que os sites
de fofoca mostravam. Ele a fará conhecer um mundo novo, e nesse
mundo ela descobrirá seu verdadeiro poder. O poder do sobrenome
Morelli.
Em Sua Mente

Após descobrir a verdadeira história por trás de seu


casamento arranjado, Olivia decide passar um tempo no Brasil para
tentar espairecer sua mente e pensar em tudo com calma. Mas,
mesmo magoada e com o coração ferido, ela não consegue tirar
Dário da cabeça. E as coisas sairão ainda mais dos eixos quando
novos fatos forem revelados, deixando-a sem saber se deve ou não
seguir em frente com esse casamento.
Dário a fez descobrir seu verdadeiro poder, e agora mais do
que nunca Olivia terá que se mostrar forte para enfrentar o que está
por vir. Novos inimigos surgirão em seu caminho e uma pessoa que
ela nunca imaginou trairá sua família, colocando todos em risco. Ao
ter que decidir quem vive ou morre, ela seguirá seu coração.
Será Olivia capaz de derrotar o homem mais frio e cruel que
já entrou em sua vida?
Elena – Entre o amor e a obsessão

Presa em um casamento sem amor com um homem


controlador e obsessivo, Elena a cada dia se lamenta um pouco
mais ao perceber que foi feita de tola ao acreditar nas promessas de
devoção eterna de Heitor Martinez, o herdeiro da família mais rica e
conhecida do estado de São Paulo e seu marido há quase um ano.
Ele a enredou em uma teia de mentiras e agora a tem em suas
mãos, como se fosse seu dono. Como se sua vida, e não apenas
seu corpo, lhe pertencesse.
E logo Leonardo Ribeiro, um ex-fuzileiro naval, é contratado
por ele para vigiá-la diariamente quando não está por perto, até
mesmo em seu próprio quarto.
Mas o que deveria significar o fim da sua liberdade acaba se
tornando sua salvação.
Pouco a pouco seu novo e taciturno guarda-costas lhe
mostrará o que é o amor de verdade, e Elena se verá dividida entre
a lealdade ao seu casamento e a paixão que continua a abrir
espaço em seu coração.
Será que Leonardo conseguirá libertá-la desse
relacionamento abusivo?
Surpresas Do Destino

Sofia é uma humilde garçonete de dezoito anos que


conseguiu seu primeiro emprego em uma cafeteria no centro da
cidade de São Paulo. Mais velha de cinco filhos, trabalha duro para
ajudar sua mãe no sustento da casa. O que ela não imaginava era,
em pleno Dia dos Namorados, conhecer Théo Costa, um lindo e
charmoso CEO que despertará seu interesse.
Os dois logo iniciam um namoro, e Théo faz com que ela
comece a acreditar que realmente existe amor à primeira vista.
Juntos eles enfrentarão o preconceito por serem de mundos
diferentes. Mas Théo guarda um grande segredo sobre seu
relacionamento passado; e ao ser revelado, colocará o amor dos
dois à prova.
Você acredita em destino, coincidência ou acaso? E amor à
primeira vista, será mesmo que existe?
Apenas Uma Noite

Decidida a passar o dia dos namorados longe do ex traidor e


pegajoso, de última hora Luna embarca em um avião e viaja para
Recife, a cidade que tanto a encantou. E disposta a tirar um tempo
para si, longe de tudo e de todos, ela deixa o celular em casa e se
torna incomunicável. Tudo o que quer é um pouco de paz e
tranquilidade em sua vida, que de uma hora para outra virou de
cabeça para baixo.
O que não imaginava nessa viagem era encontrar um homem
charmoso e misterioso caminhando na praia no meio da madrugada.
Tentando ser uma pessoa diferente, pelo menos por
aquele fim de semana, Luna inventa outro nome para si. A
conversa entre os dois é breve, mas o suficiente para perceber que
a química é instantânea. Mas ela não cai em tentação de primeira.
Ela quer um sinal do destino de que é para acontecer algo entre os
dois. Então desafia Gustavo a encontrá-la na manhã seguinte.
Luna embarca em uma aventura que deixará marcas
profundas em seu coração.
Um Acordo No Natal

Lilly vê seu mundo perfeito desmoronar quando, em plena


noite de Natal, seu namorado Natan termina o relacionamento de
três anos. Com o coração partido e se sentindo completamente
perdida por não compreender suas razões, ela decide se mudar
para São Paulo e recomeçar. E na tentativa de esquecer tudo o que
sofreu e ainda sofre, toma a decisão de se afastar de todos;
principalmente dos homens. Seu foco agora está em sua carreira
profissional.
Um ano se passa e as festas se aproximam novamente,
obrigando-a a voltar para sua cidade e encarar tudo o que deixou
para trás. Contudo, em uma ligação em que tenta tranquilizar seus
pais, ela acaba mentindo ao dizer que já superou o término e está
namorando outro homem. E, com isso, inicia uma busca por um
namorado de mentirinha, e fracassa, pois coloca defeito em todos
os homens ao seu redor. E o que já estava ruim fica ainda pior
quando, na véspera do seu retorno, seu irmão Levi conta que seu ex
está noivo.
Mas uma conversa com seu lindo e misterioso vizinho
acompanhada por uma garrafa de vinho muda totalmente o rumo
dessa história.
O que pode acontecer na época mais mágica do ano?
Proposta Indecente

Liz acredita estar vivendo o melhor momento de sua vida.


Com apenas 22 anos, comprou seu primeiro carro, seu apartamento
e tem um ótimo emprego como secretária em uma das maiores
empresas de publicidade do Brasil. Está tudo indo às mil maravilhas,
até que o que menos espera acontece. Duas pessoas que tinham
toda a sua confiança a traem. Decepcionada e com o coração em
pedaços, ela tem uma ideia: ir atrás do homem que sempre lhe
mostrou interesse e viver com ele uma noite inesquecível.
Apenas uma noite.
Diego Duarte, o CEO dessa empresa, é um homem sedutor
que sabe usar todas as artimanhas possíveis para conquistar uma
mulher. Mas nem todo o seu charme e beleza foram capazes de
fazer sua secretária, Liz, a mulher que por tanto tempo deseja,
ceder às suas investidas. No entanto, tudo muda quando ela
aparece em sua porta e lhe faz uma proposta indecente.

[1] Eu sou Eros, seu dono

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