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Professor Regente: José Alberto Vieira // Professor Assistente: João Pedro Marchante
FONTES DE DIREITO
ENQUADRAMENTO
No âmbito do Estado, evidencia-se que os órgãos legislativos podem produzir leis e
que os órgãos administrativos podem fazer regulamentos. Por sua vez, poder
jurisdicional que é exercido pelos tribunais comporta a resolução de casos concretos
através da aplicação de regras jurídica, mas, nos sistemas pertencentes à família
romano-germânica, não é atribuída aos tribunais a função de criação de direito.
O controlo pelos tribunais da constitucionalidade ou legalidade de fontes do direito
coloca-se num outro plano, porque, neste caso, a sua função não é a de criação de
fontes, mas a de controlo da conformidade legal dessas fontes. A atribuição de uma
eficácia obrigatória geral à decisão que se pronuncia pela inconstitucionalidade ou
ilegalidade de uma noma é uma contrapartida necessária da vinculatividade da regra:
esta só pode deixar de integrar o ordenamento jurídico com uma decisão que esteja
dotada de uma mesma vinculatividade geral.
As fontes de direito necessitam de uma aceitação social (aceptatio legis). Assim, para
que o direito seja efetivo, não basta que um órgão legislativo ou administrativo o
produza, sendo que para isso acontecer mesmo tem de se integrar realmente e na
ordem social e ser aceite pela comunidade; se esta rejeitou o direito (por o mesmo ser
injusto, impraticável ou desadequado), houve produção do direito, mas o mesmo não
alcançou nenhuma efetividade social.
DIREITO INTERNACIONAL
O direito internacional público tem diversas fontes, havendo que distinguir quanto a
elas, entre o direito internacional comum e o direito internacional convencional.
Não existe nenhuma relação hierárquica entre normas cuja fonte é o costume e
aquelas cuja fonte é um tratado, podendo qualquer uma delas revogar a outra, exceto
quando a alguma é reconhecido o valor de jus cogens, ou seja, de norma imperativa.
DIREITO EUROPEU
Sendo Portugal um dos Estados-membros da UE, o direito europeu originário e
derivado que vigora na ordem jurídica Portuguesa é relevante.
A construção das fontes de direito com a Constituição no topo é um modelo clássico
que assenta a soberania dos estados: cada estado é soberano porque a sua ordem
jurídica interna define sistemas de fontes a partir da sua fonte de grau hierárquico mais
elevado, ou seja, a Constituição, matriz reguladora de todo o direito vigente,
relativamente à qual toda e qualquer outra fonte tem de estar em conformidade, sob
pena de inconstitucionalidade.
A ideia tradicional moldada na ideia de que a Constituição, a fonte mais importante a
nível interno, está acima de todas as outras fontes e à qual todas as outras fontes se
subordinam tem nas últimas décadas sido colocado em causa com a afirmação do
direito da União Europeia.
LEI
A lei tem várias acessões da palavra, ou seja, vários significados diferentes, mas que
não se excluem:
Lei enquanto fonte de Direito
o Ato de uma entidade com competência politica para tal e
intencionalmente criador e revelador de normas jurídicas, que culmina
no texto, pelo que a lei como fonte não se confunde com a lei como
norma ou como direito, na medida em que é o ato que está a criar.
o Quando nós dizemos que a lei é um ato, é que a lei é esta sucessão de
micro-atos, sendo que todos eles fazem parte daquele ato, que se
caracteriza pela lei como fonte de Direito.
Lei enquanto Direito
o O ato culmina num texto publicado, na medida em que a lei como
direito é a lei como conjunto de normas apuradas e conhecidas por
interpretação do tal texto em que a lei que o direito como fonte
culmina. Entenda-se, portanto, que a “Lei como fonte” é mãe da “Lei
como direito”.
o O enunciado legal é o enunciado em que culmina todos aqueles atos
que são a lei como fonte.
o Sistema normativo que orienta e regula a ação do homem em
sociedade, criado e aprovado de forma institucionalizada, através de
instituições existentes na comunidade, sendo este sistema dotado de
coercibilidade. É, portanto, o conjunto de normas existentes para
regular a ação do homem, assente na soberania popular e tratando-se
da expressão da vontade relativa dos seus destinatários, por estes
diretamente manifestada ou pelos seus representantes, através da
legitimidade democrática.
A lei é considerada uma fonte imediata pelo art.1.º/n. º1 do Código Civil e consiste em
qualquer enunciado linguístico cujo significado seja uma regra jurídica.
Podemos distinguir leis em sentido material e leis em sentido formal. A lei em
sentido material é qualquer enunciado linguístico cujo significado seja uma regra
jurídica. A lei em sentido formal é o enunciado linguístico cujo significado é uma
regra jurídica e que emana de um órgão com competência legislativa e, portanto, de
um ato legislativo.
São leis em sentido formal:
As leis constitucionais, isto é, aquelas que provêm da Assembleia da República
no exercício de poderes constituintes;
As leis da Assembleia da República, incluindo as leis orgânicas e as leis
reforçadas;
Os decretos-lei do Governo;
Os decretos legislativos-regionais das Assembleias Legislativas Regionais.
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Atos normativos
A toda a lei está subjacente um ato normativo. Este ato normativo pode ser um ato
legislativo ou um ato regulamentar – art. 112.º CRP. Um ato legislativo decorre do
exercício de uma competência legislativa do órgão que o pratica e dá origem a uma
lei em sentido formal; um ato regulamentar decorre do exercício de uma
competência administrativa do órgão que o realiza e produz um regulamento. Do ato
regulamentar, com exceção dos regulamentos independentes, deve constar a lei que
ele visa regulamentar ou que define a competência subjetiva e objetiva para a sua
emissão – art 112º, nº 7 CRP. Isto acontece porque o ato regulamentar serve para
possibilitar a “boa execução das leis” – art 119, c) CRP. O ato legislativo goza de
discricionariedade política, ou seja, ele tem a liberdade de definir os rumos do povo
português. Por sua vez, os regulamentos visam executar essas opções legislativas.
Atos legislativos
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Atos regulamentares
Os atos regulamentares não estão abrangidos pelo imposto no art 112º, nº 5 CRP aos
atos legislativos. Disto resulta que podem ser criados quaisquer atos regulamentares e
pode ser conferida a atos de diferente natureza o poder de, com eficácia externa,
interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos.
Neste tipo de atos, distinguem-se os que emanam do Governo dos restantes, que
provêm de outras entidades.
Provêm do Governos os seguintes regulamentos:
Os decretos e os decretos regulamentares – art 112º, nº 6 e 199º, c), CRP. Os
decretos regulamentares devem ser promulgados pelo PR – art 134º, b) CRP,
devendo esta ocorrer após referendada pelo Governo – art 197º, nº 1, a), CRP.
Os restantes são apenas assinados pelo PR – art 134º, b) CRP
As portarias, os despachos normativos e as resoluções do Conselho de
Ministros. Estes regulamentos não estão previstos na Constituição mas têm
uma base consuetudinária, não necessitando de promulgação presidencial.
São produzidos por outras entidades:
Os regulamentos da administração autónoma (por exemplo, as posturas e os
regulamentos municipais e as posturas e regulamentos das juntas de freguesia);
Os regulamentos da administração indireta, em específico os produzidos pelas
entidades administrativas independentes com função de regular e
supervisionar, como o Banco de Portugal – art 102º CRP;
Os decretos regulamentares regionais, competência do Governo regionais;
Os estatutos, que são regulamentos produzidos por pessoas coletivas de direito
público e que servem para definir a sua organização interna;
Os regimentos, que são regulamentos que definem o modo de funcionar dos
órgãos coletivos;
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Atos atípicos
Para além dos atos legislativos e dos atos regulamentares, podem ainda destacar-se
os atos atípicos. Exemplo destes são os decretos do Presidente da República, as
resoluções da Assembleia e os decretos dos Representantes da República.
As leis são, ao abrigo do art 1º, nº1, 1ª parte, CC, disposições genéricas provindas
dos órgãos estaduais competentes. Disto retira-se que a lei tem de provir de um órgão
estadual com competência para a produzir e que apresenta um número indeterminado
de destinatários. Esta definição não coincide, no entanto, com o sentido de leis formais
nem materiais. Não define uma lei material porque há leis em sentido material que não
provêm de órgãos estaduais (p.e. posturas e regulamentos municipais); não define uma
lei em sentido formal também porque há leis em sentido formal que não provêm de
órgãos estaduais (p.e. decretos legislativos regionais).
NORMA COORPORATIVA
O direito pode vir, também, de organizações corporativas (como ordens profissionais
e federações desportivas, por exemplo), das quais resultam as normas corporativas –
normas ditadas pelos organismos representativos das diferentes categorias morais,
culturais, económicas ou profissionais, no domínio das suas atribuições, bem como os
respetivos estatutos e regulamentos internos (art 1º, nº 2, 2ª parte, CC). Estas normas
corporativas são, no ordenamento jurídico português, fonte imediata de direito – art
1º, 1º CC. Apesar disso, subordinam-se à lei, não podendo contrárias as disposições
legais de carácter imperativo – art 1º, nº 3, CC. As normas corporativas são leis em
sentido material, na medida em que provêm de outras entidades públicas que não os
órgãos que têm poder legislativo.
DOUTRINA
Sebenta IED I – Modalidades e Hierarquias das Fontes de Direito
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JURISPRUDÊNCIA
A função jurisdicional é exercida pelos tribunais, aos quais compete administrar e
aplicar a justiça em nome do povo. A jurisprudência é o resultado da atividade
decisória dos tribunais na resolução dos casos concretos, isto é, é o conjunto das
decisões dos tribunais.
A decisão proferida por um tribunal na apreciação de um caso concreto pode ser
vinculativa na apreciação de casos análogos pelo mesmo ou por outro tribunal: nesta
hipótese, essa decisão constitui um precedente e torna-se uma fonte de Direito. Nos
sistemas de direito romano-germânico o princípio é o de que as decisões dos tribunais
não constituem precedente vinculativo na apreciação de casos idênticos, o que permite
que o juiz de uma ação decidir diferentemente do que decidiu antes numa outra causa
ou do que foi decidido, quanto a casos semelhantes, por outros juízes. Há, no entanto,
que ressalvar a hipótese em que, num processo pendente, um tribunal deva acatar as
decisões proferidas em via de recurso pelos tribunais superiores.
A jurisprudência não é fonte de Direito, mas é sempre uma fonte do conhecimento
do Direito, isto porque qualquer decisão dos tribunais – e, principalmente, dos
tribunais superiores – constitui um modelo para outras decisões sobre a mesma
questão de direito.
Além disso, a jurisprudência adapta constantemente os textos legais à evolução dos
tempos. Sabe-se que, quanto mais antiga for a lei, maior a possibilidade da sua
desatualização; no entanto, a sua aplicação jurisprudencial pode adaptá-la a novas
realidades e dar-lhe um novo significado. À jurisprudência também está reservada uma
importante função na concretização de conceitos indeterminados.
Jurisprudência Constante
A observância dos modelos de decisões estabelecidos nas decisões dos tribunais dá
origem à jurisprudência constante, que concretiza o desejo da interpretação e
aplicação uniformes do direito aos casos análogos, o qual é, aliás, uma imposição do
princípio da igualdade. Falamos em jurisprudência constante quando os tribunais,
sobre a mesma questão de direito, embora não estejam vinculados a tal, proferem a
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Jurisprudência Uniformizada
A jurisprudência uniformizada é aquela que é fixada pelos tribunais supremos, de
modo a evitar o proferimento de decisões contraditórias sobre a mesma questão de
direito. É certo que “cada caso é um caso”, pois que, ainda que os casos sejam
análogos, os factos alegados numa ação são sempre diferentes dos factos alegados
numa outra causa. No entanto, o direito aplicável aos casos análogos deve ser o
mesmo, pelo que se verifica uma contradição entre as decisões quando estas
divergirem sobre o direito aplicável na solução de casos semelhantes. Como esta
contradição põe em causa a interpretação e a aplicação uniformes do direito referidas
no número 3 do artigo 8 do Código Civil e os princípios da igualdade e da confiança, é
necessário encontrar mecanismos que permitam uniformizar a jurisprudência.
A jurisprudência uniformizada – destinada a evitar ou a resolver decisões
contraditórias sobre a mesma questão jurídica – é admissível no âmbito do processo
civil, do processo penal e do contencioso administrativo.
A jurisprudência uniformizada não é obrigatória para os tribunais, nem mesmo para
os tribunais inferiores da ordem a que pertence o tribunal que proferiu o acórdão de
uniformização de jurisprudência. Isto significa que a jurisprudência uniformizada não
pode ser considerada uma fonte de direito.
Em todo o caso, a jurisprudência uniformizada tem, para além de um especial valor
persuasivo, um valor legal específico. No processo civil e no contencioso administrativo
é sempre admissível, qualquer que seja o valor da causa, interpor recurso de decisão
que não siga a jurisprudência uniformizada. No processo penal, o Ministério Público
deve recorrer a qualquer decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo
Tribunal de Justiça.
A jurisprudência uniformizada tem uma eficácia retroativa, dado que ela vai ser
aplicada a factos que foram praticados e a situações que foram constituídas antes
dessa uniformização. Para evitar, com isto, a violação do princípio de confiança
presente no art.
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Professor Regente: José Alberto Vieira // Professor Assistente: João Pedro Marchante
Assentos
O art 2º CC, na sua versão originária, estabelecia que “nos casos declarados na lei,
podem os tribunais fixar, por meio de assentos, doutrina com força obrigatória geral”.
Isto transformava os assentos em fontes de direito. O assento era um acórdão
produzido pelo Supremo Tribunal que tinha força obrigatória geral impondo uma
determinada interpretação de uma fonte de direito, pelo que, dessa forma, esta
decisão tinha valor interpretativo. No entanto, entendendo que este artigo violava o
preceito constitucional presente no art.112.º da CRP ao conferir a atos de natureza
jurisdicional o poder de, com eficácia externa, interpretar ou integrar atos legislativos,
o mesmo foi considerado inconstitucional pelo Tribunal Constitucional.
Jurisprudência Normativa
Os acórdãos com força obrigatória geral são fonte de direito, constituindo a chamada
jurisprudência normativa. A ordem jurídica portuguesa admite como acórdãos do
Tribunal Constitucional que declaram a inconstitucionalidade ou a ilegalidade de
normas, nos termos do art.281.º, n.º1 e n.º3 da CRP, e os acórdãos dos tribunais
administrativos que declaram, com força obrigatória geral, a ilegalidade de regras
administrativas. A jurisprudência só é uma fonte de direito nestas duas situações excecionais.
COSTUME
O costume é uma fonte em cuja formação intervém um elemento fáctico e um
elemento normativo:
Elemento fático: uso ou prática social reiterada, isto é, repetição de condutas
humanas em determinadas situações e circunstâncias;
o art.3.º, n.º 1, CC - um uso contrário á boa fé nunca pode servir de base á
formação de uma fonte consuetudinária.
Elemento normativo: convicção de juridicidade que decorre do sentimento de
que algo deve ser ou não deve ser, porque tal corresponde ao direito (ou a
uma ideia de direito), ou seja, na convicção de que aquela conduta humana
repetida é juridicamente permitida, proibida ou imposta.
Em comparação com a lei, que pode ser eficaz ou ineficaz, consoante seja observada
ou não observada, o costume só podeeficaz. Um costume que não é observado é uma
impossibilidade: se o costume deixa de ser observado, ele deixa necessariamente de
ser vigente.
Sebenta IED I – Modalidades e Hierarquias das Fontes de Direito
Professor Regente: José Alberto Vieira // Professor Assistente: João Pedro Marchante
Modalidades do costume
USOS
Do disposto no art.3.º, n.º1, CC resulta que os usos são uma fonte mediata do direito,
porque os usos que não forem contrários aos princípios da boa fé são juridicamente
atendíveis quando a lei o determine. Um uso que contrarie a boa-fé, nunca pode ser
fonte de direito e o uso só pode ser fonte de direito quando uma fonte imediata lhe
atribuir essa qualidade.
Como exemplos de situações nas quais a lei concede relevância aos usos pode ser
referido o facto de, nos termos do art.218.º CC, o silêncio valer como declaração
negocial quando esse valor lhe for atribuído pelos usos.